Tempo Comum – Anos Ímpares – X Semana – Sábado

Lectio

Primeira leitura: 2 Coríntios 5, 14-21

Irmãos, o amor de Cristo nos absorve completamente, ao pensar que um só morreu por todos e, portanto, todos morreram. 15Ele morreu por todos, a fim de que, os que vivem, não vivam mais para si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou. 16Por conseguinte, de agora em diante, não conhecemos ninguém à maneira humana. Ainda que tenhamos conhecido a Cristo desse modo, agora já não o conhecemos assim. 17Por isso, se alguém está em Cristo, é uma nova criação. O que era antigo passou; eis que surgiram coisas novas. 18Tudo isto vem de Deus, que nos reconciliou consigo por meio de Cristo e nos confiou o ministério da reconciliação. 19Pois foi Deus quem reconciliou o mundo consigo, em Cristo, não imputando aos homens os seus pecados, e pondo em nós a palavra da reconciliação. 20É em nome de Cristo, portanto, que exercemos as funções de embaixadores e é Deus quem, por nosso intermédio, vos exorta. Em nome de Cristo suplicamo-vos: reconciliai-vos com Deus. 21Aquele que não havia conhecido o pecado, Deus o fez pecado por nós, para que nos tornássemos, nele, justiça de Deus.

Paulo continua a reflectir sobre a “novidade” da reconciliação e da graça da morte de Cristo por todos. Estes pensamentos cristológicos têm implicações eclesiológicas. A ligação entre as duas perspectivas, a relação entre Cristo e a igreja, está na reconciliação. Paulo está convencido de que a humanidade pecadora merece a indignação divina. Essa convicção é aperfeiçoada pelo conhecimento messiânico de Cristo, lugar, preço e sinal da reconciliação. É certo que a humanidade é pecadora. Mas Deus tomou a iniciativa de a renovar e aproximar transferindo o pecado para Cristo. A morte de Cristo é a manifestação mais clara do itinerário da reconciliação projectado por Deus. A morte é a encruzilhada de um itinerário cristológico global iniciado na Encarnação (cf. Gl 4, 4) e concluído na Ressurreição (cf. 1 Cor 15, 3-4.20-22). Esta perspectiva de Paulo encontra-se também em 1 Cor 15 e fez escola, como se nota na Carta aos Hebreus.
A consequência eclesiológica é sugerida por algumas afirmações como: «O amor de Cristo nos absorve completamente» (v. 14), «O que era antigo passou; eis que surgiram coisas novas» (v. 17). Nota-se também nos vv. 20-22, onde Paulo fala na entrega do ministério que lhe foi feita, e na função de embaixador de Cristo. A igreja, para o Apóstolo, é a manifestação da reconciliação realizada por meio de Cristo e é espaço de serviço, de anúncio e activação da reconciliação.

Evangelho: Mateus 5, 33-37

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 33«Do mesmo modo, ouvistes o que foi dito aos antigos: Não perjurarás, mas cumprirás diante do Senhor os teus juramentos. 34Eu, porém, digo-vos: Não jureis de maneira nenhuma: nem pelo Céu, que é o trono de Deus, 35nem pela Terra, que é o estrado dos seus pés, nem por Jerusalém, que é a cidade do grande Rei. 36Não jures pela tua cabeça, porque não tens poder de tornar um só dos teus cabelos branco ou preto. 37Seja este o vosso modo de falar: Sim, sim; não, não. Tudo o que for além disto procede do espírito do mal.»

A quarta antítese refere-se ao segundo e ao oitavo mandamento (Ex 20, 7.16; Nm 30, 3ss.; Dt 23, 22-24). Na sociedade judaica abusava-se do juramento (Mt 23, 16-22). Porque não se podia pronunciar o nome divino, contornava-se o obstáculo referindo-se ao céu, à terra, a Jerusalém, à própria cabeça. Mas, mais uma vez, Jesus elimina a casuística ao afirmar: «Seja este o vosso modo de falar: Sim, sim; não, não. Tudo o que for além disto procede do espírito do mal» (v. 37).
Num mundo onde predomina a mentira, seria necessário invocar Deus como testemunha do que afirmamos. Mas o cristão sabe que Deus está sempre presente, que não é preciso chamá-lo como testemunha. «Sim, sim», «não, não», proferidos na presença de Deus, equivalem a um juramento. A Carta de Tiago faz eco deste ensinamento de Cristo, quando diz: «Meus irmãos, não jureis, nem pelo Céu, nem pela Terra, nem façais qualquer outro juramento. Que o vosso «sim» seja sim e que o vosso "não" seja não, para não incorrerdes em condenação» (5, 12).

Meditatio

Paulo afirma na primeira leitura: «Ele morreu por todos, a fim de que, os que vivem, não vivam mais para si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou» (v. 15). A liturgia da Igreja retomou este conceito, transformando-o em oração: «E a fim de vivermos, não já para nós próprios, mas para Ele, que por nós morreu e ressuscitou, de Vós, Pai misericordioso, enviou aos que n´Ele crêem o Espírito Santo…» (Oração eucarística IV). Há uma espécie de troca: Cristo morreu por nós a fim de que possamos viver para Ele. Paulo toma muito a sério a morte de Cristo por todos: «um só morreu por todos e, portanto, todos morreram» (v. 14). Cristo assumiu a nossa morte, mas para a transformar. Morremos numa oferta, e isto faz da nossa morte uma passagem para Deus. É graça que recebemos em Cristo.
Mas a liturgia utiliza uma outra perícopa, que se refere à reconciliação: «Foi Deus quem reconciliou o mundo consigo, em Cristo» (v. 19). Na fórmula da absolvição sacramental, o sacerdote reza: «Deus, Pai de misericórdia, que, pela morte e ressurreição de Cristo, reconciliou o mundo consigo…». A redenção não foi uma luta entre Cristo e Deus, como às vezes se pensa, como se Deus quisesse a nossa perdição, e Cristo tivesse querido evitar tal desgraça, oferecendo a sua vida por nós. Não. Foi Deus que quis reconciliar o mundo consigo. A redenção nasce do coração de Deus: «Tudo vem de Deus», afirma o Apóstolo. E tudo passa pelo coração de Cristo, porque o Pai nos reconcilia «em Cristo». Cristo é fiel ao Pai e realiza a sua vontade. Salva-nos com o Pai, e não contra a vontade do Pai. A graça, o amor, a novidade de vida, brotam do coração do Pai: «Deus, que nos amou e enviou o seu Filho como vítima de expiação pelos nossos pecados» (1 Jo 4, 10).
No evangelho, continuamos a escutar o Sermão da Montanha, uma mensagem que configura uma espécie de bem-aventurança do “sim, sim” e “não, não”. Aquele que, por vontade do Pai nos salvou, exige de nós, seus discípulos, clareza de convicções, de posições e de comportamentos. Não admite em nós aquela conduta que agora expressamos com um neologismo, o “nim”, talvez &uacute
;til a quem prefere equilibrismos, indeterminação, meias tintas, atrasos e adiamentos nebulosos, navegar em águas turvas. A exigência do rabi de Nazaré raia a intolerância: tudo o que for além do “sim, sim” e “não, não», vem do espírito do mal. Mas o «em verdade vos digo», remete para a autoridade das suas palavras e, sobretudo, para a autoridade da sua personalidade. Paulo descobriu que Cristo foi “sim”, que foi o lugar em que todas as promessas de Deus se tornaram “sim” (2 Cor 1, 19s.)

Oratio

Senhor Jesus, escuta a minha oração de louvor ao Pai, que tanto amou o mundo a ponto de Te enviar para o remir. Pela tua morte e ressurreição, a nossa morte é passagem para a vida. Obrigado, Senhor!
Senhor Jesus, eu te bendigo porque vieste ao mundo, não para o condenar, mas para o salvar. Pela tua condenação e morte, fomos libertados para a vida. Obrigado, Senhor!
Senhor Jesus, em Te louvo e agradeço pelo dom do Espírito Santo Consolador, Espírito de verdade. Ele convencerá o mundo do pecado, porque não crê em Ti. Aumenta a minha fé e faz-me apóstolo do amor com que o Pai Te entregou nas mãos dos homens e com que Tu Te ofereceste em sacrifício pela nossa redenção. Amen.

Contemplatio

Ninguém melhor do que S. João explicou a fonte da caridade. Uma parte da sua primeira epístola é sobre este tema: «Deus amou-nos até nos dar o seu Filho por nós. Cristo amou-nos até morrer por nós. Se, portanto, nós amamos Deus e Cristo, devemos amar os homens que lhes são tão caros» (Jo 4, 11). Deus poderia dizer-nos: Como? Eu amo todos os homens até lhes dar o meu Filho por eles e vós não os amais? Então não sois meus filhos, não tendes o meu espírito. «Se alguém diz que ama a Deus e não ama o seu irmão, mente. Não ama verdadeiramente a Deus, quem não ama o seu próximo». «Aliás, acrescenta S. João, Deus deu-nos um mandamento. Se o amamos, quer que amemos também o nosso próximo… e como é que havemos de amar o nosso próximo? Não somente em palavras, mas em obras e em verdade»… Se Deus me amou tanto, como não o amaria? Se o coração de Jesus me amou tanto, como é que não o amaria? Se amo a Deus e a Cristo, como é que não amaria o meu próximo que eles tanto amam? Que farei hoje para o provar? (Leão Dehon, OSP3, p. 199.

Actio

Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
«Foi Deus quem reconciliou o mundo consigo, em Cristo»» (2 Cor 5, 19).

plugins premium WordPress