Tempo do Natal – Quinta-feira depois da Epifania

Primeira leitura: 1 João 4, 19- 5, 4

Caríssimos: 19*Nós amamos, porque Ele nos amou primeiro. 20*Se alguém disser: «Eu amo a Deus», mas tiver ódio ao seu irmão, esse é um mentiroso; pois aquele que não ama o seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê.

21*E nós recebemos dele este mandamento: quem ama a Deus, ame também o seu irmão.

1*Todo aquele que crê que Jesus é o Cristo nasceu de Deus; e todo aquele que ama a Deus Pai ama também aquele que nasceu de Deus. 2É por isto que reconhecemos que amamos os filhos de Deus: se amamos a Deus e cumprimos os

seus mandamentos; 3*pois o amor de Deus consiste precisamente em que guardemos os seus mandamentos; e os seus mandamentos não são uma carga, 4*porque todo aquele que nasceu de Deus vence o mundo. E este é o poder vitorioso que venceu o mundo: a nossa fé.

Neste texto entrelaçam-se dois temas: o amor cristão (vv. 19-21) e a fé em Jesus, componentes de um único mandamento (vv. 1-4; 3, 21). O amor e o ódio são inconciliáveis.

O amor cristão conhece três relações: o amor de Deus para connosco, o nosso amor para com Deus e o nosso amor para com os irmãos. O amor a Deus e aos irmãos estão intimamente ligados: «quem ama a Deus, ame também o seu irmão» (v. 21). Mais: o verdadeiro amor a Deus manifesta-se no amor aos irmãos: «aquele que não ama o seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê» (v. 20). O amor cristão tem a sua origem em Deus, porque «Ele nos amou primeiro» (v. 19), como verdadeiros filhos. Pertence-nos agora corresponder ao amor e gerar amor. Não foi o homem que alcançou a Deus com o seu amor, mas o contrário: Deus veio ao nosso encontro, em Jesus. Se amamos os outros, temos a prova real de que Deus nos alcançou. É fácil ser tentado a refugiar-se no amor de Deus, esquecendo os irmãos. Refugiar-se na esfera do divino, desinteressando-se pela esfera humana, era práticados gnósticos. É pela fé que sabemos que Deus nos ama. O fiel amado, que «nasceu de Deus» (v. 1), ama o Pai e o Filho, mas também todos os irmãos, nascidos de Deus. Só a fé e o amor, nascidos da filiação divina, permitem ao cristão vencer tudo quanto se opõe a Cristo, vivendo os seus mandamentos (vv. 3-4).


 Evangelho: Lucas 4, 14-22a

Naquele tempo: 14Impelido pelo Espírito, Jesus voltou para a Galileia e a sua fama propagou-se por toda a região. 15Ensinava nas sinagogas e todos o elogiavam. 16*Veio a Nazaré, onde tinha sido educado. Segundo o seu costume, entrou em dia de sábado na sinagoga e levantou-se para ler. 17Entregaram-lhe o livro do profeta Isaías e, desenrolando-o, deparou com a passagem em que está escrito: 18*«O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu para anunciar a Boa-Nova aos pobres; enviou-me a proclamar a libertação aos cativos e, aos cegos, a recuperação da vista; a mandar em liberdade os oprimidos, 19a proclamar um ano favorável da parte do Senhor.» 20Depois, enrolou o livro, entregou-o ao responsável e sentou-se. Todos os que estavam na sinagoga tinham os olhos fixos nele. 21*Começou, então, a dizer-lhes: «Cumpriu-se hoje esta passagem da Escritura, que acabais de ouvir.» 22Todos davam testemunho em seu favor e se admiravam com as palavras repletas de graça que saíam da sua boca.

A actividade evangelizadora de Jesus na Galileia caracteriza-se pela força do Espírito, pelo entusiasmo das pessoas que O escutam e pela sua fama que se espalha por toda a parte. Na sinagoga de Nazaré, lê e interpreta Is 61, 1-2, aplicando o texto à sua pessoa, e fazendo dele o texto programático da sua acção como Messias. Com Ele começa, de facto, o ano jubilar (cf. Lv 25, 10); com Ele desceu o Espírito de Deus sobre a terra, que traz a salvação a humanidade: «Cumpriu-se hoje esta passagem da Escritura, que acabais de ouvir» (v. 21).

O Espírito consagrou Jesus como Messias. O Reino que anuncia será a verdade, a liberdade e a novidade do mundo, que fará nascer naqueles que O escutam e seguem. O povo fica admirado com as suas palavras e dá testemunho dele

(v. 22). A libertação trazida por Jesus destina-se particularmente aos pobres, aos oprimidos, aos prisioneiros e aos cegos, porque são os mais disponíveis para acolher a sua mensagem, e a acção do Espírito de Deus. A palavra de Jesus é «alegre notícia» de vida nova para todos os homens. Masé uma palavra exigente, que comporta a cruz e a ressurreição. É no mistério pascalque o crente encontra a plenitude e a comunhão com Deus. É este o êxodo que todo o homem deve realizar na sua vida, se quer também colaborar na libertação dos irmãos, viver no Espírito e participar na glória de Jesus Cristo ressuscitado.

Meditatio

«Cumpriu-se hoje esta passagem da Escritura, que acabais de ouvir.» A liturgia faz-nos tomar consciência da situação privilegiada em que nos encontramos, em relação aos habitantes de Nazaré. Verdadeiramente, o mistério de Cristo cumpriu-se. Quando Jesus pronunciou o seu discurso em Nazaré, a transformação do homem estava apenas a começar. Depois
veio a morte e a ressurreição do Senhor pelas quais se cumpriu toda a Escritura. E nós vivemos o tempo da plenitude, ainda que não vejamos Jesus com os olhos da carne.

João continua a insistir na união entre o amor a Deus e o amor aos irmãos. Todo o evangelho é anúncio do amor de Deus tornado visível na pessoa do Verbo Encarnado, Jesus de Nazaré. Amar a Deus é colocar-se na sua perspectiva. Ele ama todo o ser criado e não hesita em entregar o próprio Filho unigénito para a salvação de todos os homens. Viver para os outros, dar-se, sacrificar-se pelo seu bem é viver como Deus, é actuar o que Jesus quer que façamos.


 Esta fé anima a nossa caridade cristã, mas também se torna uma enorme força de luta contra o pecado que é a exploração, a intolerância, a injustiça, a violência e o egoísmo.

Mas o mal belo testemunho do amor a Deus e aos irmãos é manifestar, não só com palavras, mas também com obras, que estamos no coração de Deus.

Ao encarnar, o Verbo, fez-Se de tal modo solidário com os homens que esvazia ”a Si mesmo” (Fil 2, 7) da glória que possuía na preexistência junto do Pai (cf. Jo 17, 5). Preferiu recebê-la do Pai, como exaltação pelo seu sacrifício (cf. Fil 2, 9), por meio da Ressurreição: “Servo” (Fil 2, 7) torna-Se “Senhor” (Fil 2, 11).

Quanto a S. João, a relação “solidariedade” – revelação é o princípio chave de interpretação do seu Evangelho, a começar pelo Prólogo que nos apresenta “o Verbo feito carne” (1, 14), de Quem “vemos a… glória”, isto é, o amor nas palavras e nas obras, na morte e na ressurreição.

No amor de Cristo, experimentamos o amor do Pai (cf. Jo 1, 18; 1Jo 4, 9-10). Em Cristo “conhecemos e cremos no amor que Deus nos tem” (1Jo 4, 16). Esta experiência e esta fé leva-nos a amar com e como Cristo: em união com Ele e à maneira d´Ele.

Oratio

Louvado sejas, Senhor, porque abriste ao homem, sedento de felicidade, o caminho do amor. Louvado sejas, Senhor dos pequenos e dos pobres que, pelo teu Filho, nos ensinaste que é na vida simples e pobre que nos revelas o teu amor preveniente e generoso. Louvado sejas, Senhor da paz e da vida, porque nos deste o teu perdão, fazendo-nos experimentar a alegria do teu amor e da tua misericórdia.

Dá-nos, Senhor, o teu Espírito de luz e de verdade, para que possamos aprender a caminhar na luz do teu sol que é vida e alegria Que te amemos sempre e cada vez, dando-te o primeiro lugar no nosso coração tantas vezes inquieto e à busca de novidades. Só Tu podes saciar a nossa sede de felicidade e de vida. Fica connosco, Senhor. Sê nosso companheiro de caminhada, porque sem Ti nada podemos fazer, e só em Ti encontramos repouso. Amen.

Contemplatio

Foi um segredo que Deus se reservou, o de saber se Ele nos teria dado o seu Filho na Incarnação no caso de o homem ter perseverado na justiça na qual o tinha criado. A escola seráfica sustenta a afirmativa e nós inclinamo-nos a admiti-la. Nada nos espanta no amor divino. Teria sido um dom menor dar-nos o seu Filho único como irmão, como rei, como pontífice, do que dar-no-lo como resgate. Mas este desígnio de amor que Deus concebeu de viver por assim dizer mais intimamente connosco fazendo-se um dos nossos, de nos elevar mais alto fazendo-se nosso irmão, de nos santificar de um modo mais sublime fazendo-se nosso pontífice, não o teria igualmente concebido se nós não tivéssemos pecado? S. Paulo parece confirmar o nosso sentimento, quando ele diz que o que torna mais admirável o amor de Deus é que Ele quis dar-nos o seu Filho mesmo depois de nós termos pecado (Rom 5, 8). Commendat caritatem suam Deus in nobis quoniam cum adhuc peccatores essemus… Christus pro nobis mortuus est.

Podemos, portanto, pensar, que Deus tinha, mesmo fora das exigências da Redenção, o desígnio de nos dar o seu Filho como nosso rei, nosso irmão e nosso amigo (Leão Dehon, OSP 2, p. 196).


 Actio

Repete frequentemente e vive hoje a palavra: «Nós amamos, porque Ele nos amou primeiro» (1 Jo 4, 19).

 

 

plugins premium WordPress