XXV Semana – Terça-feira – Tempo Comum – Anos Pares

Tempo Comum – Anos Pares
XXV Semana – Terça-feira
Lectio

Primeira leitura Provérbios 21, 1-6.10-13

1O coração do rei é como água corrente nas mãos do Senhor,Ele o dirigirá para onde quiser. 2Os caminhos do homem parecem-lhe sempre rectos, mas é o Senhor quem pesa os corações. 3A prática da justiça e da equidade é mais agradável ao Senhor que os sacrifícios. 4Olhares altivos, coração soberbo: a lâmpada dos ímpios é o pecado. 5Os projectos do homem diligente têm êxito, mas quem se precipita cai certamente na ruína. 6Os tesouros adquiridos pela mentira são vaidade passageira e laço de morte. 10A alma do ímpio deseja o mal; não terá compaixão do seu próximo. 11Com o castigo do insolente, o ingénuo ficará mais sábio; quando se adverte o sábio, ele adquire mais saber. 12O justo está atento à família do ímpio, e precipita os maus na desventura. 13Aquele que se faz surdo ao clamor do pobre, também um dia clamará e não será ouvido.

O Livro dos Provérbios é uma ampla recolha de máximas e de sentenças, independentes entre si, sem qualquer espécie de fio condutor ideológico, onde está depositada a sabedoria das várias gerações de Israel. O seu objectivo é fazer de todo o israelita um verdadeiro homem: forte, senhor de si mesmo, interiormente livre, trabalhador, hábil, leal. Não é ainda o retrato do homem evangélico. Mas é a base para o ser. Não nos tornamos discípulos sem ser homens. Está aqui o valor deste livro. É bom fazer esta verificação porque, à primeira vista, muitos provérbios poderiam deixar-nos desiludidos. Que valer têm hoje? Há muitos, que espelham o simples bom-senso e que continuam actuais. Mas é importante, sobretudo, o seu valor global. Sugerem comportamentos próprios da fase anterior à Aliança e à sua moral. Mas estamos perante um são humanismo que tem por objectivo criar um homem apto para as opções morais e para os compromissos da Aliança.
As virtudes sugeridas no texto de hoje são as habituais: não presumir de si mesmo, nem da própria rectidão; praticar a justiça, a humildade e a diligência; não ser mentiroso nem violento nos negócios, não fechar os ouvidos ao grito dos pobres. Na Bíblia, o grito do pobre é sempre dirigido ao Senhor. Escutá-lo é, pois, responder em nome do Senhor.

Evangelho: Lucas 8, 19-21

Naquele tempo, 19sua mãe e seus irmãos vieram ter com Ele, mas não podiam aproximar-se por causa da multidão. 20Anunciaram-lhe: «Tua mãe e teus irmãos estão lá fora e querem ver-te.» 21Mas Ele respondeu-lhes: «Minha mãe e meus irmãos são aqueles que ouvem a Palavra de Deus e a põem em prática.»

Lucas apresenta-nos um quadro de rara finura e profundidade. Não denota polémica em relação à família de Jesus, como acontece nos textos paralelos de Mateus e de Marcos. A atenção de Lucas vai para aquilo que, de facto, interessa: a escuta e a prática da Palavra, que criam e definem o verdadeiro sentido de família de Jesus.
Um dia, «Sua mãe e seus irmãos vieram ter com Ele» (v. 19). Lucas usa um verbo que exprime o desejo de ver Jesus. A forma singular realça a figura da Mãe, que é o sujeito. Para o evangelista, a vinda dos familiares é uma ocasião que permite a Jesus pronunciar a sentença sobre os seus verdadeiros parentes: a escuta e a prática da Palavra cria laços mais fortes do que os do sangue. Esta possibilidade, todavia, não exclui os parentes que vieram visitá-l´O. Lucas exalta a família gerada pela Palavra. Mas não menospreza os laços com a família de sangue.

Meditatio

As palavras de Jesus dirigidas àqueles que Lhe anunciam a chegada da sua mãe e dos seus familiares, parecem duras. Mas explicam-se com a sua missão de semeador da Palavra de Deus. Naquele momento, mais do que atender àqueles que Lhe são familiares pelos laços do sangue, o Mestre queria sublinhar os laços que realizam a sua nova «família»: a escuta da Palavra, e o pô-la em prática. São essas atitudes que produz o milagre de nos tornar mãe, irmãos e irmãs de Jesus. Tal como Maria escutou a Palavra e, depois, de tornou Mãe, o mesmo pode acontecer comigo hoje, se acolher a Palavra que me é dirigida. Jesus quer crescer no mundo e o caminho privilegiado sou eu, porque quer crescer em mim, quer que a minha existência seja cada vez mais cristiforme, quer que eu O represente cada vez melhor. Se acolho a sua Palavra, se a contemplo, se a conservo, se lhe deixo espaço, se procuro não esquece-la durante o dia, se faço dela a luz dos meus caminhos, Jesus cresce em mim, à minha volta, no mundo. E posso adquirir a dignidade de Maria, porque O gerarei novamente para o nosso tempo. Quero, pois, ser devoto da Virgem, para que me ensine a receber a Palavra, a dar-lhe carne, a dar-lhe vida, a transformar toda a minha acção em nova geração, em novo crescimento de Jesus em mim e à minha volta.
Maria é o modelo de como se escuta e acolhe na vida a Palavra e: «Feliz d´Aquela que acreditou no cumprimento das palavras do Senhor…» (Lc 1, 45). É a primeira bem-aventurança que ecoa no Evangelho e desce sobre Maria, por meio da palavra de Isabel, cheia de Espírito Santo; é a bem-aventurança da fé, que acolhe a Palavra de Deus e adere a ela com toda a vida. É a bem-aventurança que Jesus, um dia, proclamará: «Felizes… aqueles que escutam a Palavra de Deus e a põe em prática!» (Lc 11, 28); é a «melhor parte» que Maria de Betânia escolheu, sentada aos pés do Senhor, na escuta da sua palavra, e que não lhe será tirada (cf. Lc 10, 38-42).
Não é suficiente escutar a Palavra, é preciso guardá-la e pô-la em prática, como fez a Virgem Maria: «Eis a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a Tua palavra» (Lc 1, 38). «Sede daqueles que põem em prática a palavra – exorta S. Tiago – e não apenas ouvintes, enganando-vos a vós mesmos» (1, 22). É inútil ver-se ao espelho, ver o próprio rosto e depois esquecer-se dele (cf. Tg 1, 23-24).
“Escutar”, em sentido bíblico, é “compreender”, “acolher” na vida, “ir a Jesus”; é “acreditar”, “guardar no coração”; é “obedecer” e “fazer”. A verdadeira “escuta da Palavra” realiza-se quando se ama, não por palavras, mas “com obras e em verdade” (1 Jo 3, 18).

Oratio

Quero, suplicar-Te, hoje, ó Virgem Santa Maria, que me ajudes a receber a Palavra para lhe dar carne, para lhe dar vida. Sabes como estou longe deste ideal de ver a minha vida como geração de Jesus no mundo. Eu, pobre pecador, mergulhado em tantas coisas, posso aproximar-me de Ti, Mãe do meu Salvador, e tornar-me também “mãe” d&acut
e;Aquele que me salva! Parece-me um ideal demasiado elevado, inatingível!
Conduz-me docemente por esse mistério, abre os meus olhos para que vejam as maravilhas que a Palavra pode realizar em mim; dá-me um coração capaz de compreender este mundo novo em que são introduzidos os ouvintes da Palavra. Fica junto a mim, ó Mãe, para que possa continuar, sem medo nem tremor, mas com espanto e gratidão, a tua obra, no começo do novo milénio. Amen.

Contemplatio

O abandono a Deus e à vontade divina é a regra de vida de Maria e nós vemo-la na perturbação e na dúvida fixar-se nesta disposição: «Eis a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a vossa palavra». Estas palavras exprimem o abandono, a docilidade à graça, a conformidade à vontade divina, o sacrifício e a imolação. Com esta resposta, com o seu consentimento, Maria aceitava a dignidade e a honra da maternidade divina, mas ao mesmo tempo também os sofrimentos, os sacrifícios que lhe estavam ligados. Declarava-se pronta a cumprir a vontade de Deus em tudo como sua serva. Era como um voto de vítima e de abandono. Esta disposição é a mais perfeita, é a fonte dos maiores méritos e das melhores graças. Maria proclamou-o mesmo no seu Magnificat: A minha alma louva o Senhor, porque olhou com favor a humildade da sua serva. Deus encontrou muita alegria nesta disposição de Maria. Ela acrescentava: Todas as gerações me hão-de proclamar bem-aventurada.
Durante a sua vida mortal, poucas pessoas a proclamaram bem-aventurada, excepto Isabel e aquela mulher que ergueu a voz no meio do povo, e à qual Jesus respondeu: Bem-aventurados são aqueles que escutam a minha palavra e que a praticam.
A felicidade de Maria durante a sua vida mortal era o sacrifício com Jesus, por Jesus e pelas almas. Ela não era, como o seu Filho, senão um objecto de desprezo, de humilhação e de ignomínia da parte dos inimigos de Deus. Para aqueles que estavam bem dispostos, era um objecto de compaixão e de piedade. O ecce Ancilla era a disposição do seu coração em todos os sacrifícios que teve de fazer: quando da Apresentação no Templo, quando ofereceu o seu Filho em sacrifício e escutou a profecia do velho Simeão; na fuga para o Egipto e assim por diante, em todas as ocasiões, até debaixo da cruz do seu Filho moribundo. Do mesmo modo para o resto da sua vida, consentiu em ser a mãe da Igreja nova fundada no sangue do seu Filho.
A sua graça e os seus méritos aumentavam sempre pela sua fiel cooperação, pela sua pureza, pelo santo e perfeito amor com o qual cumpria a missão que se tornara a sua. (Leão Dehon, OSP 3, p. 328 s.).

Actio

Repete frequentemente e vive hoje a Palavra:
«Minha mãe e meus irmãos são aqueles que ouvem a Palavra de Deus e a põem em prática» (Lc 8, 21).

| Fernando Fonseca, scj |

 

plugins premium WordPress