A emergência climática está a reclamar que cresçamos em desapego. Com efeito, não conseguiremos dar uma resposta adequada ao desafio ecológico, se não aceitarmos previamente que «o meu» se inscreve dentro do «nosso». Só assim conseguiremos desenvolver uma perspectiva mais abrangente da realidade, capaz de ver todo o conjunto, sem se deter na consideração obsessiva de interesses mesquinhos e particulares. Não é sustentável a visão do «eu faço o que quiser com aquilo que é meu e tu não tens nada com isso».
Este desapego brota naturalmente da percepção que «tudo está interrelacionado». Quanto mais nos damos conta da «trama de relações» que nos envolve, mais nos apercebemos que não somos proprietários nem senhores de nada. Aquilo que possuímos está orientado, na sua essência mais profunda, para o bem de todos e somos chamados sempre a pô-lo ao serviço da humanidade.
O desapego é uma consequência lógica do habitarmos «a casa comum», a casa que é de todos, a casa que Deus nos construiu para sermos felizes. Definitivamente, este planeta não é um desses prédios, onde podem viver muitas pessoas sem que nunca se conheçam nem falem entre si, a não ser em aborrecidas reuniões de condóminos. Nesta terra, todos estamos dependentes uns dos outros e esta é precisamente a nossa fortaleza.
Se é verdade que nenhum ser humano é uma ilha isolada, então aquilo que eu faço e também a forma como o faço tem repercussão na natureza. Neste sentido, eu não posso agir como se fosse dono e senhor absoluto das coisas, mas tenho sempre uma responsabilidade social e ecológica, assente na construção do bem comum. «Isto significa também cultivar uma identidade comum, uma história que se conserva e transmite. Desta forma cuida-se do mundo e da qualidade de vida dos mais pobres, com um sentido de solidariedade que é, ao mesmo tempo, consciência de habitar numa casa comum que Deus nos confiou. Estas acções comunitárias, quando exprimem um amor que se doa, podem transformar-se em experiências espirituais intensas» (LS 232).
Esta emergência climática é então uma oportunidade de ouro para nos tornarmos mais solidários e menos autorreferenciais. É um convite a sairmos do nosso casulo protector (ou bunker) e criarmos redes de amizade, de encontro e de partilha do que temos e somos. A natureza tem capacidade para nos sustentar a todos, mas não podemos continuar a tolerar que, a meio do ano, já tenhamos esgotado os recursos naturais que dariam para todo o ano.
Crescer no desapego significa não só que podemos ser mais felizes com menos coisas, mas sobretudo que os nossos desejos se tornaram mais intensos, mais profundos e mais concentrados. É então que compreendemos melhor as palavras de S. Paulo: «aspirai às coisas do alto».
José Domingos Ferreira, scj