Liturgia

Week of Mai 8th

  • 06º Domingo da Páscoa - Ano B [atualizado]

    06º Domingo da Páscoa - Ano B [atualizado]

    5 de Maio, 2024

    ANO B

    6.º DOMINGO DA PÁSCOA

    Tema do 6.º Domingo da Páscoa

    A liturgia do sexto Domingo da Páscoa expõe, diante dos nossos olhos, a “rede” de amor que atravessa toda a história da salvação: Deus é a fonte primeira do amor; Ele ama o seu Filho Jesus, comunica-lhe o seu amor e envia-o ao encontro dos homens; Jesus mostrou aos homens, em gestos e palavras, o amor de Deus; os discípulos de Jesus acompanharam-no desde a Galileia até Jerusalém e foram testemunhas do seu amor “até ao extremo”; transformados em Homens Novos pelo amor de Jesus, os discípulos são agora no mundo os arautos do amor de Deus.

    A segunda leitura confirma que Deus é a origem do amor (“Deus é amor”) e que foi d’Ele que partiu essa corrente de amor que nos alcançou, em Jesus e por Jesus. Nós, transformados por esse amor, podemos agora aproximar-nos de Deus, conhecer a Deus e tornarmo-nos filhos de Deus.

    No Evangelho Jesus, em contexto de despedida, deixa aos discípulos “o seu” mandamento fundamental: “amai-vos como Eu vos amei”. Eles são os “amigos” a quem Jesus amou até ao fim e revelou o amor do Pai. A missão dos discípulos é testemunhar, no mundo e na história, esse jeito de viver que aprenderam com Jesus.

    A primeira leitura afirma que a salvação oferecida por Deus através de Jesus Cristo, e levada ao mundo pelos discípulos, se destina a todos os homens e mulheres, sem exceção. Para Deus, o que é decisivo não é a pertença a uma raça ou a um determinado grupo social, mas sim a disponibilidade para acolher o amor de Deus e para dar testem unho desse amor.

     

    LEITURA I – Atos dos Apóstolos 10,25-26.34-35.44-48

    Naqueles dias,
    Pedro chegou a casa de Cornélio.
    Este veio-lhe ao encontro
    e prostrou-se a seus pés.
    Mas Pedro levantou-o, dizendo:
    «Levanta-te, que eu também sou um simples homem».
    Pedro disse-lhe ainda:
    «Na verdade, eu reconheço
    que Deus não faz aceção de pessoas,
    mas, em qualquer nação,
    aquele que O teme e pratica a justiça é-Lhe agradável».
    Ainda Pedro falava,
    quando o Espírito desceu
    sobre todos os que estavam a ouvir a palavra.
    E todos os fiéis convertidos do judaísmo,
    que tinham vindo com Pedro,
    ficaram maravilhados ao verem que o Espírito Santo
    se difundia também sobre os gentios,
    pois ouviam-nos falar em diversas línguas e glorificar a Deus.
    Pedro então declarou:
    «Poderá alguém recusar a água do Batismo
    aos que receberam o Espírito Santo, como nós?»
    E ordenou que fossem batizados em nome de Jesus Cristo.
    Então, pediram-lhe que ficasse alguns dias com eles.

     

    CONTEXTO

    O texto que a liturgia deste sexto domingo da Páscoa nos propõe como primeira leitura integra uma secção do livro dos Atos dos Apóstolos (cf. 9,32-11,18) cujo protagonista é o apóstolo Pedro. Essa secção refere a atividade missionária de Pedro no litoral da costa palestina, entre Jope e Cesareia Marítima, onde Pedro, assumindo o papel de pregador itinerante, vai visitando diversas comunidades cristãs.

    O episódio que nos é proposto situa-nos em Cesareia Marítima, uma cidade construída por Herodes, o Grande, no séc. I a. C., num lugar antigamente designado por “Torre de Estraton”. Cesareia era a sede do poder romano na Palestina, pois era aí que residiam os procuradores romanos da Judeia. No centro da cena está um centurião romano, chamado Cornélio, que era “piedoso e temente a Deus” (At 10,2). Pedro estava em Jope (atual Jafa), um pouco mais a sul, hospedado em casa de Simão, o curtidor (cf. At 9,43); mas, convidado por Cornélio, vai até Cesareia, dirige-se à casa do centurião romano e, encontrando-o reunido com diversos familiares e amigos (cf. At 10,24), anuncia-lhes Jesus.

    A atitude de Pedro deve ter gerado alguma polémica nas comunidades cristãs primitivas, particularmente na comunidade cristã de Jerusalém (cf. At 11,2-3). Para os primeiros cristãos, oriundos do mundo judaico, não era claro que os pagãos pudessem entrar na comunidade cristã. O pagão era considerado um ser impuro, em casa de quem o bom judeu estava proibido de entrar, a fim de não se contaminar. Quereria Deus que a salvação fosse também anunciada aos pagãos?

    Para o autor dos Atos dos Apóstolos, é perfeitamente claro que Deus também quer oferecer a salvação aos pagãos. Para deixar isso bem claro, ele põe Deus a dirigir toda a trama: é Deus que, numa visão, pede a Cornélio que mande chamar Pedro (cf. At 10,1-8); e é Deus que arrebata Pedro “em êxtase” e lhe sugere que poderá ir ao encontro de Cornélio sem ficar contaminado pelo contacto com um pagão (cf. At 10,9-23). A decisão de Pedro de apresentar a proposta de Jesus a uma família pagã será, pouco depois, aprovada pela Igreja de Jerusalém (cf. At 11,18).

    Este episódio tem uma especial importância no esquema imaginado por Lucas para a expansão da Igreja… Cornélio é o primeiro pagão oficialmente admitido na comunidade de Jesus. A conversão de Cornélio marca uma viragem decisiva na proclamação do Evangelho que, a partir deste momento, se abre também aos pagãos.

    A conversão de Cornélio será, basicamente, histórica; as “visões” e os detalhes são, provavelmente, o cenário que Lucas monta para apresentar a sua catequese.

     

    MENSAGEM

    Depois de descrever a receção de Pedro em casa de Cornélio, Lucas põe na boca de Pedro um discurso – do qual, no entanto, a leitura que nos é proposta só apresenta um pequeno extrato – onde ecoa o kerigma (primeiro anúncio, que proclama as verdades fundamentais sobre Jesus) primitivo. Nesse discurso, Pedro anuncia Jesus (vers. 38a), a sua atividade (“andou de lugar em lugar fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos pelo diabo, porque Deus estava com Ele” – vers. 38b), a sua morte (vers. 39b), a sua ressurreição (vers. 40) e a dimensão salvífica da sua ação (vers. 43b). É este o anúncio que Jesus encarregou os primeiros discípulos de testemunharem ao mundo inteiro.

    O nosso texto acentua, especialmente, o facto de a mensagem da salvação se destinar a todas as nações, sem distinção de pessoas, de raças ou de povos. Logo no início do discurso, Pedro reconhece que “Deus não faz aceção de pessoas; em qualquer nação, aquele que O teme e pratica a justiça é-Lhe agradável” (vers. 34-35). Portanto, o anúncio sobre Jesus deve chegar a todos os cantos da terra; a salvação de Deus é para todos os homens e mulheres, sem exceção.

    Depois do anúncio feito por Pedro, acontece a efusão do Espírito “sobre quantos ouviam a Palavra” (vers. 44), sem distinção de judeus ou pagãos (vers. 45). O resultado do dom do Espírito é descrito com os mesmos elementos que apareceram no relato do dia do Pentecostes: todos “falavam línguas” e “glorificavam a Deus” (vers. 46). É a confirmação direta de que Deus oferece a salvação a todos os homens e mulheres, sem distinguir raças, culturas ou nações. Pedro tira, desse facto, as conclusões que se impõem e batiza Cornélio e toda a sua família.

    Os primeiros cristãos, oriundos do mundo judaico e marcados pela mentalidade judaica, consideravam que a salvação era, sobretudo, um dom de Deus para os judeus; os pagãos poderiam eventualmente ter acesso à salvação, desde que se convertessem ao judaísmo, aceitassem a Lei de Moisés e a circuncisão. Mas o Espírito Santo, derramado sobre Cornélio e a sua família, veio mostrar que a salvação oferecida por Deus, trazida por Jesus e testemunhada pelos discípulos, não é património ou monopólio dos judeus ou dos cristãos oriundos do judaísmo; mas é um dom oferecido a todos os que têm o coração aberto às propostas de Deus.

     

    INTERPELAÇÕES

    • Deus vê todos os homens e mulheres como seus filhos e suas filhas muito queridos. Ele não os discrimina pela cor da pele, pela raça, pela nação a que pertencem, pela posição de que disfrutam na sociedade: Ele ama a todos por igual, com um amor sem limites. O seu grande desejo é vê-los caminhar pela vida, livres e felizes, até ao encontro final com Ele. Por isso, Ele oferece-lhes a salvação: chama-os, fala-lhes, abraça-os, indica-lhes os caminhos que devem percorrer, apoia-os e sustenta-os ao longo da caminhada, mostra-lhes a meta a alcançar… A salvação que Ele oferece só não chega àqueles que se fecham no orgulho e na autossuficiência, recusando os dons de Deus. O Batismo foi, para todos nós, o momento do nosso “sim” a Deus e à sua oferta de salvação; mas é preciso que, em cada instante, renovemos esse primeiro “sim” e que vivamos numa permanente disponibilidade para acolher Deus, as suas propostas, os seus dons, o seu amor. Depois do nosso “sim” inicial, continuamos disponíveis para acolher a salvação que Deus nos oferece? Procuramos escutar as indicações que Ele nos dá e caminhar de acordo com elas? Acreditamos firmemente que as propostas de Deus nos conduzem na direção da Vida verdadeira, da Vida eterna, da felicidade sem fim?
    • A ideia de que Deus não exclui ninguém da salvação e não faz aceção de pessoas parece-nos um dado perfeitamente lógico e evidente. Mas, aceitar essa lógica, traz consequências à nossa vida, particularmente à forma como vemos os outros homens e mulheres com quem nos cruzamos nos caminhos da vida. O Deus que ama todos os seus filhos e filhas, sem exceção, convida-nos a acolher todos os irmãos – mesmo os “diferentes”, mesmo os incómodos – com bondade, com compreensão, com amor; o Deus que derrama sobre todos a sua salvação convida-nos a não discriminar “bons” e “maus”, “santos” e “pecadores” (frequentemente, os nossos juízos acerca da “bondade” ou da “maldade” dos outros falham redondamente); o Deus que convida cada homem e cada mulher a integrar a comunidade da salvação diz-nos que temos de acolher e amar todos, independentemente da sua raça, da cor da sua pele, da sua origem, da sua preparação cultural, do seu lugar na escala social. Não apenas em teoria, mas sobretudo nos nossos gestos concretos, somos chamados a anunciar esse mundo de Deus, sem exclusão, sem marginalização, sem intolerância, sem preconceitos. Como vemos e como lidamos com os “diferentes”? Nós, filhos amados de um Deus que não faz aceção de pessoas, alinhamos em preconceitos, em conclusões precipitadas, em juízos defeituosos, em posições ideológicas que dividem, que marginalizam, que segregam pessoas ou grupos humanos?
    • Quando Pedro chega a casa de Cornélio, este veio-lhe ao encontro e prostrou-se a seus pés… Mas Pedro disse-lhe imediatamente: “levanta-te, que eu também sou um simples homem” (vers. 25-26). A atitude humilde de Pedro faz-nos pensar como são ridículas e desprovidas de sentido certas tentativas de afirmação pessoal diante dos irmãos, certas poses de superioridade, a busca de privilégios e de honras, as lutas pelos primeiros lugares… Aqueles a quem, numa comunidade – civil ou religiosa – foi confiada a responsabilidade de presidir, de coordenar, de organizar, de animar, devem sentir-se “simples homens”, humildes instrumentos de Deus. A sua missão é servir, ajudar, cuidar, não procurar privilégios, honrarias, situações que satisfaçam as suas ambições pessoais. Quando sou chamado a uma determinada missão na comunidade, como a encaro? Como é que trato aqueles a quem devo servir no contexto da missão que me foi confiada?

     

    SALMO RESPONSORIAL – Salmo 97 (98)

    Refrão 1: O Senhor manifestou a salvação a todos os povos.

    Refrão 2: Diante dos povos manifestou Deus a salvação.

    Cantai ao Senhor um cântico novo
    pelas maravilhas que Ele operou.
    A sua mão e o seu santo braço
    Lhe deram a vitória.

    O Senhor deu a conhecer a salvação,
    revelou aos olhos das nações a sua justiça.
    Recordou-Se da sua bondade e fidelidade
    em favor da casa de Israel.

    Os confins da terra puderam ver
    a salvação do nosso Deus.
    Aclamai o Senhor, terra inteira,
    exultai de alegria e cantai.

     

    LEITURA II – 1 João 4,7-10

    Caríssimos:
    Amemo-nos uns aos outros,
    porque o amor vem de Deus
    e todo aquele que ama nasceu de Deus e conhece a Deus.
    Quem não ama não conhece a Deus,
    porque Deus é amor.
    Assim se manifestou o amor de Deus para connosco:
    Deus enviou ao mundo o seu Filho Unigénito,
    para que vivamos por Ele.
    Nisto consiste o amor:
    não fomos nós que amámos a Deus,
    mas foi Ele que nos amou
    e enviou o seu Filho
    como vítima de expiação pelos nossos pecados.

     

    CONTEXTO

    Como vimos nos domingos anteriores, a Primeira Carta de João é uma instrução escrita destinada a algumas Igrejas da Ásia Menor nascidas em contexto joânico (quer dizer, ligadas à figura do apóstolo João, que passou os últimos anos da sua vida em Éfeso, cidade situada na costa da Jónia, junto da moderna Selçuk, na atual Turquia). Combate as doutrinas heréticas de seitas pré-gnósticas que, pelo final do séc. I, lançavam a confusão nas comunidades cristãs; e define os princípios fundamentais da vida cristã autêntica.

    Neste contexto de confronto com as heresias pré-gnósticas, uma das questões mais controversas (e à qual o autor da Primeira Carta de João dá uma importância fundamental) era a questão do amor ao próximo. Os hereges pré-gnósticos afirmavam que o essencial da fé residia na vida de comunhão com Deus e negligenciavam as realidades do mundo. Achavam que se podia descobrir “a luz” e estar próximo de Deus, mesmo odiando o próximo (cf. 1 Jo 2,9). Ora, de acordo com o autor da Primeira Carta de João, o amor ao próximo é uma exigência central da experiência cristã. A essência de Deus é amor; e ninguém pode dizer que está em comunhão com Ele se não se deixou contagiar e embeber pelo amor.

    O texto que nos é proposto pertence à terceira parte da carta (cf. 1 Jo 4,7-5,12). Aí, o autor estabelece como critério da vida cristã autêntica a relação entre o amor a Deus e o amor aos irmãos. É nessa dupla dimensão que os cristãos devem encontrar a sua identidade.

     

    MENSAGEM

    Para o autor da Primeira Carta de João há um “dogma” fundamental que se impõe com uma força irresistível e que marca toda a existência cristã: a certeza de que “Deus é amor”. Isso significa que a característica mais marcante do ser de Deus é o amor e que a atividade mais específica de Deus é amar. A prova indesmentível de que Deus é amor é o facto de Ele ter enviado o seu único Filho ao encontro dos homens para lhes dar a Vida (vers. 9). Jesus Cristo, o Filho de Deus que incarnou na história humana, cumprindo o plano do Pai, mostrou em gestos concretos de cura e de cuidado o amor de Deus pelos homens, sobretudo pelos mais pobres, pelos excluídos, pelos marginalizados… Por amor, Ele lutou até à morte para libertar os homens da escravidão, da opressão, do egoísmo, do sofrimento; por amor, Ele caminhou para a cruz e entregou a sua vida até à última gota de sangue; por amor, Ele enfrentou o sepulcro e venceu a morte. Toda a vida de Jesus afirma e garante o imenso amor que Deus nos tem.

    Mais ainda: Deus não esperou que o amássemos para nos amar; amou-nos quando estávamos longe d’Ele, amou-nos apesar do nosso pecado, das nossas escolhas erradas, da nossa indiferença, das nossas revoltas. Deus amou-nos quando o não merecíamos. O amor de Deus é um amor incondicional, gratuito, desinteressado, que não exige nada em troca; é um amor que nos purifica, que nos reabilita e que nos salva (vers. 10).

    Nós, discípulos de Jesus, conhecemos bem o amor de Deus. Vimo-lo presente em Jesus, na sua vida, nas suas palavras, nos seus gestos, na sua morte. E, batizados em Cristo, tornamo-nos filhos queridos desse Deus que ama sem medida. Agora é a Vida de Deus que circula em nós. Ora, se Deus é amor, esse amor deve circular em nós, encher o nosso coração e transparecer nos nossos gestos. A Vida de Deus que circula em nós traduz-se, portanto, em gestos concretos de amor aos irmãos. Para os que nasceram de Deus só há uma forma de viver: amando os irmãos com o mesmo amor incondicional, desinteressado e gratuito que caracteriza o ser de Deus (vers. 7).

     

    INTERPELAÇÕES

    • “Deus é amor” – diz o autor da Primeira Carta de João. Não se trata de uma definição abstrata ou de uma tese académica; é uma constatação que se impõe a partir da contemplação das ações e das intervenções de Deus na história e na vida dos homens. Deus começou por criar o universo, o mundo e os seres humanos com amor e cuidado de artista. Depois, ao longo da história humana, Ele procurou sempre fazer-se presente no caminho dos seus filhos e dar-lhes o seu amor: revelou-lhes o seu rosto, comprometeu-se com eles numa aliança, indicou-lhes os caminhos que eles deviam percorrer para encontrar Vida, avisou-os repetidamente para não enveredarem por caminhos de morte… Chegou mesmo a enviar o seu Filho Unigénito ao encontro dos homens para lhes oferecer a salvação. É verdade: a história da salvação é uma extraordinária história de amor que tem Deus como protagonista. E esta história não está terminada, pois o amor de Deus pelos seus filhos nunca se esgota. Nós continuamos hoje, a cada passo do caminho, a experimentar a realidade desse amor. E é com a certeza do amor sempre fiel de Deus que avançamos, enfrentando as crises, as incertezas, as tempestades e as vicissitudes que marcam a história do nosso tempo. Estamos conscientes disto? Sentimo-nos amparados pelo amor de Deus ao longo do caminho que todos os dias percorremos? Damos testemunho diante dos outros homens e mulheres que caminham ao nosso lado da nossa confiança inquebrantável num Deus que nos ama?
    • “Todo aquele que ama nasceu de Deus e conhece a Deus”. É uma afirmação extraordinária, que talvez nos obrigue a rever alguns dos nossos esquemas mentais. Convida-nos a ver como nossos irmãos, membros da família de Deus, todos aqueles que, por amor, fazem o bem. Os seus nomes podem nem constar nos livros de registos dos batizados que guardamos nos nossos cartórios paroquiais; mas eles “conhecem a Deus”, estão muito próximos de Deus, são de Deus. Como vemos os nossos irmãos e irmãs que estão fora da comunidade cristã ou que levam vidas condenáveis do ponto de vista da moral vigente, mas que procuram servir, amar e cuidar os seres humanos que sofrem? Como consideramos aqueles que, dizendo-se ateus ou agnósticos, defendem os mais fracos, lutam pelos direitos e pela dignidade dos seus irmãos?
    • Se somos “filhos” desse Deus que é amor, “amemo-nos uns aos outros” com um amor igual ao de Deus – amor incondicional, gratuito, desinteressado. Ser “filho de Deus” não significa passar a vida a olhar para o céu, ignorando as dores, as necessidades e as lutas dos irmãos que caminham ao nosso lado; ser “filho de Deus” não é ter apreço pelas “coisas da religião” e ignorar os dramas dos pobres, dos oprimidos, dos marginalizados; ser “filho de Deus” não é tratar bem algumas pessoas que nos “calham bem” ou com as quais nos identificamos mais, e passar ao lado daqueles que não nos agradam ou com as quais não nos identificamos. A vida de Deus que enche os corações dos crentes deve manifestar-se em gestos concretos de solidariedade, de serviço, de dom, em benefício de todos os irmãos. É assim que eu vivo a minha filiação divina, amando todos, sem distinção, em gestos concretos de serviço, de entrega, de doação?

     

    ALELUIA – João 14,23

    Aleluia. Aleluia.

    Se alguém Me ama, guardará a minha palavra.
    Meu Pai o amará e faremos nele a nossa morada.

     

    EVANGELHO – João 15,9-17

    Naquele tempo,
    Disse Jesus aos seus discípulos:
    «Assim como o Pai Me amou, também Eu vos amei.
    Permanecei no meu amor.
    Se guardardes os meus mandamentos,
    permanecereis no meu amor,
    assim como Eu tenho guardado os mandamentos de meu Pai
    e permaneço no seu amor.
    Disse-vos estas coisas,
    para que a minha alegria esteja em vós
    e a vossa alegria seja completa.
    É este o meu mandamento:
    que vos ameis uns aos outros, como Eu vos amei.
    Ninguém tem maior amor
    do que aquele que dá a vida pelos amigos.
    Vós sois meus amigos, se fizerdes o que Eu vos mando.
    Já não vos chamo servos,
    porque o servo não sabe o que faz o seu senhor;
    mas chamo-vos amigos,
    porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi a meu Pai.
    Não fostes vós que Me escolhestes;
    fui eu que vos escolhi e destinei,
    para que vades e deis fruto
    e o vosso fruto permaneça.
    E assim, tudo quanto pedirdes ao Pai em meu nome,
    Ele vo-lo concederá.
    O que vos mando é que vos ameis uns aos outros».

     

    CONTEXTO

    O Evangelho do sexto domingo da Páscoa situa-nos, outra vez, em Jerusalém, numa noite de quinta-feira do mês de Nisan do ano trinta, um dia antes da celebração da Páscoa judaica. Jesus está à mesa com os seus discípulos, numa inolvidável ceia de despedida. É o mesmo cenário do Evangelho que escutamos no passado domingo.

    Sobre Jesus e o seu grupo de discípulos paira a sombra da cruz. Nessa noite, após a ceia, Jesus atravessará o Vale do Cedron, a oriente da cidade, e dirigir-se-á ao Getsemani (“lagar de azeite”), um jardim situado no sopé do Monte das Oliveiras, onde estará alguns momentos em oração. Aí será preso pelos soldados do Templo. Durante essa noite comparecerá diante do Sinédrio, será julgado e condenado à morte. Na manhã do dia seguinte, depois de a sentença ser confirmada pelo governador romano, será crucificado.

    Enquanto convive, à mesa, com os discípulos, Jesus está perfeitamente consciente do que o espera nas próximas horas. Não está preocupado com o que lhe vai acontecer: quando aceitou o projeto do Pai e começou a anunciar o Reino, Ele sabia os riscos que iria correr; mas preocupa-se com aqueles discípulos que estão com Ele à mesa nessa noite de quinta-feira… Que será deles quando o seu Mestre lhes for tirado? Poderão, sem Jesus a mostrar-lhes o caminho a cada passo, levar para a frente o projeto do Reino? Saberão discernir, no meio das crises e tempestades que terão de enfrentar, o que é importante e o que é secundário? Conseguirão manter-se em relação com Jesus?

    Depois da ceia, Jesus fala longamente com os discípulos e deixa-lhes as suas últimas indicações. Relembra-lhes o essencial da mensagem que procurou transmitir-lhes enquanto percorria com eles os caminhos da Galileia e da Judeia; anima-os com a promessa do Espírito; diz-lhes como é que poderão, pelo tempo fora, manter a ligação a Ele e continuar a receber d’Ele Vida. Tudo o que foi dito nessa noite, à volta da mesa, soa a “testamento final”. Os discípulos nunca mais esquecerão aquilo que Jesus disse nessa ceia de despedida.

     

    MENSAGEM

    O texto evangélico deste domingo dá sequência ao que escutamos no domingo anterior. Na “alegoria da videira e dos ramos” (Jo 15,1-8), os discípulos eram convidados a “permanecer em Jesus”; esse “permanecer em Jesus” concretiza-se agora no “permanecer no amor” (Jo 15,9-17): os discípulos devem manter-se unidos a Jesus pelo vínculo do amor.

    A relação do Pai com Jesus é o modelo da relação que Jesus pretende manter com os discípulos. O Pai amou Jesus e demonstrou-Lhe sempre o seu amor; e Jesus correspondeu ao amor do Pai, cumprindo os seus mandamentos. Da mesma forma, Jesus amou os discípulos e demonstrou-lhes sempre o seu amor; e os discípulos devem corresponder ao amor de Jesus, cumprindo os seus mandamentos (vers. 9-10).

    Quais são esses mandamentos do Pai que Jesus procurou cumprir com total fidelidade e obediência? João refere-se aqui, evidentemente, ao cumprimento do projeto de salvação que Deus tinha para os homens e que confiou a Jesus. Jesus, em obediência ao projeto do Pai, veio ao encontro dos homens e caminhou com eles; libertou-os da opressão da Lei e de tudo aquilo que os mantinha prisioneiros das trevas; livrou-os do sofrimento e da doença; salvou-os do egoísmo, do orgulho, da autossuficiência, do comodismo; ensinou-os a escolher a justiça, a verdade, a liberdade; abriu-lhes os olhos para que pudessem caminhar na luz; ensinou-os a viver no amor, a servir, a dar a vida para que todos tenham Vida. O Pai, fonte de amor, “mandou” o Filho salvar os homens de tudo aquilo que lhes roubava a Vida; e o Filho amou os homens “até ao extremo” e deu a sua própria vida para que os homens tivessem Vida em abundância. Por amor, Jesus cumpriu integralmente os “mandamentos” do Pai.

    Da ação de Jesus nasceu o Homem Novo, livre do egoísmo e do pecado, capaz de estabelecer novas relações com os outros homens e com Deus. Os discípulos são o fruto da obra de Jesus. Eles formam uma comunidade de homens livres, que acolheram e assimilaram a proposta salvadora que o Pai lhes apresentou em Jesus. Eles nasceram do amor do Pai, amor que se fez presente na ação, nos gestos, nas palavras de Jesus.

    Agora os discípulos, nascidos da ação salvadora e libertadora de Jesus, estão vinculados a Jesus. Devem, portanto, cumprir os “mandamentos” de Jesus como Jesus cumpriu os “mandamentos” do Pai. Como Jesus, os discípulos devem ser testemunhas da salvação de Deus e levar a libertação aos seus irmãos. Como Jesus, os discípulos devem amar, até ao dom total de si mesmos, para que os seus irmãos tenham Vida. Se o fizerem, estarão sempre em relação com Jesus, ligados a Jesus. Essa relação será fonte permanente de alegria, de realização plena, de Vida verdadeira (vers. 11).

    Assim, a grande indicação que Jesus deixa aos discípulos, o seu grande “mandamento”, é que vivam no amor (“é este o meu mandamento: que vos ameis uns aos outros, como Eu vos amei” – vers. 12). Jesus amou totalmente, até às últimas consequências, até ao dom da vida (vers. 13). Os discípulos devem viver da mesma forma que Jesus viveu: devem amar-se uns aos outros com um amor que é serviço, doação total, entrega radical. Desse amor nasce a comunidade do Reino, a comunidade do mundo novo, que testemunha, através do amor, a salvação de Deus. Deus faz-Se presente no mundo e age para libertar os homens através desse amor desinteressado, gratuito, total, que tem a marca de Jesus e que os discípulos são chamados a testemunhar.

    Como é a relação entre Jesus e esta comunidade de Homens Novos que aprenderam com Jesus a viver no amor e que, amando até ao extremo, são as testemunhas no mundo da salvação de Deus?

    A comunidade de Jesus e dos discípulos é uma comunidade dos “amigos” de Jesus (vers. 14). A relação que Jesus tem com os membros dessa comunidade não é uma relação de “senhor” e de “servos”, mas uma relação de “amigos”, pois o amor colocou Jesus e os discípulos no mesmo plano. Jesus continua a ser o centro do grupo, mas não se põe acima do grupo. Ele é e será sempre o companheiro dos discípulos. Une-os a lealdade e o afeto próprio dos “amigos”.

    Estes “amigos” colaboram todos numa tarefa comum. Têm todos a mesma missão (testemunhar, através do amor, a salvação de Deus) e são todos responsáveis para que a missão se concretize. Os discípulos não são servos a soldo de um senhor, mas amigos que, voluntariamente e cheios de alegria e entusiasmo, colaboram numa tarefa que lhes traz alegria infinita.

    Entre esses “amigos”, há total comunicação e confiança (o “servo” não conhece os planos do “senhor”; mas o “amigo” partilha com o outro “amigo” os seus planos e projetos). Aos seus “amigos”, Jesus comunicou-lhes o projeto de salvação que o Pai tinha para os seres humanos e também a forma de realizar esse projeto (através do amor, da entrega, do dom da vida). Jesus revela Deus aos “amigos”, não através de enunciados sobre o ser de Deus, mas mostrando, com a sua pessoa e a sua atividade, que o Pai é amor sem limites e trabalha em favor do Homem.

    Os discípulos (os “amigos”) são os eleitos de Jesus, aqueles que Ele escolheu, chamou e enviou ao mundo a dar fruto (vers. 16a). Tal não significa que Jesus chame uns e rejeite outros; significa que a iniciativa não é dos discípulos e que a sua aproximação à comunidade do Reino é apenas uma resposta ao desafio que Jesus apresenta.

    O objetivo desse chamamento é a missão (“escolhi-vos e destinei-vos para que vades e deis fruto” – vers. 16b). Jesus não quer constituir uma comunidade fechada, isolada, voltada para si própria, mas uma comunidade que vá ao encontro do mundo, que continue a sua obra, que testemunhe o amor, que leve a todos os homens o projeto libertador e salvador de Deus. O resultado da ação dos discípulos de Jesus será o nascimento do Homem Novo – isto é, de homens adultos, livres, responsáveis, animados pelo Espírito, que reproduzem os gestos de amor de Jesus no meio do mundo. Dessa forma, concretizar-se-á o projeto salvador de Deus. Esse “fruto” deve permanecer – quer dizer, deve tornar-se uma realidade efetivamente presente no mundo, capaz de transformar o mundo e a vida dos homens. Quanto mais forte for a intensidade do vínculo que une os discípulos a Jesus, mais frutos nascerão da ação dos discípulos.

    Nessa ação, os discípulos não estarão sozinhos. O amor do Pai e a união com Jesus sustentarão os discípulos que, no meio do mundo, se empenham em realizar o projeto de salvar o Homem (16c).

    O texto termina com uma nova referência ao mandamento de Jesus: “amai-vos uns aos outros” (vers. 17). O amor partilhado é a condição para estar vinculado a Jesus e para dar fruto. Se este mandamento se cumpre, Jesus estará sempre presente ao lado dos seus discípulos; e, essa presença impulsionará a comunidade e sustentá-la-á na sua atividade em favor do homem.

     

    INTERPELAÇÕES

    • A primeira grande certeza que fica para os discípulos na sequência do que Jesus lhes disse naquela memorável ceia de despedida é que eles não vão andar sozinhos na sua marcha pela história. Jesus acompanhá-los-á em cada pedaço do caminho, sustentando-os com o seu amor, com a sua presença amiga, com as suas palavras luminosas e reconfortantes. Não é fácil para nós, homens e mulheres do séc. XXI, fazermos caminho carregando às costas o fardo pesado dos desafios e dos obstáculos que o nosso tempo nos traz; não é fácil, num contexto hostil e crítico, sentirmo-nos um “pequeno rebanho”, sem influência e sem poder, ignorados pelo mundo e aparentemente incapazes de mudar o rumo da história… Mas há uma coisa que não podemos esquecer: Jesus caminha ao nosso lado, dando-nos coragem e esperança, lutando connosco para vencer as forças da opressão, da injustiça, da violência e da morte. Sentimos que Jesus, vivo e ressuscitado, nos acompanha no caminho e alimenta a nossa esperança? Sentimo-nos pessoalmente ligados a Ele e alimentados pelo seu amor?
    • “É este o meu mandamento: que vos ameis uns aos outros, como Eu vos amei” – disse Jesus aos discípulos ao despedir-se deles. Jesus deu testemunho do amor de Deus em cada gesto que fez e diante de cada homem ou mulher que com Ele se cruzou; por amor aos seus irmãos, Jesus lutou contra tudo aquilo que os fazia sofrer e os impedia de ter Vida; por amor a todos os homens e mulheres de ontem, de hoje e de amanhã, Jesus deu a vida até à última gota de sangue… Ele amou “até ao extremo”, numa doação total. Quem é “de Jesus” é convidado a viver do mesmo jeito, amando e doando a própria vida como Ele fez. É isto que fazemos, é assim que vivemos? Os homens e as mulheres que se cruzam connosco na estrada da vida veem brilhar em nós o amor de Jesus? As nossas comunidades, nascidas do amor de Jesus, são, realmente, cartazes vivos que anunciam e testemunham o amor, ou são espaços de conflito, de divisão, de luta pelos próprios interesses, de realização de projetos egoístas? As pessoas feridas e magoadas que se aproximam das nossas comunidades cristãs são acolhidas com o amor que aprendemos de Jesus, ou são tratadas com indiferença e arrogância?
    • Há quem ache que o caminho apontado por Jesus aos seus discípulos é um caminho de renúncia, de sofrimento, de sacrifício, que obriga a viver alheado de tudo aquilo que é belo, interessante e agradável. Mas não é assim. Tudo o que Jesus propôs aos discípulos vai no sentido de os ajudar a serem felizes: “Disse-vos estas coisas, para que a minha alegria esteja em vós e a vossa alegria seja completa” – disse-lhes Ele. Segundo Jesus, a verdadeira alegria não está nos bens efémeros, nos valores fúteis que não matam a sede de felicidade do ser humano; mas está no dom de si mesmo, no serviço simples e humilde aos irmãos, no cuidado dos mais frágeis, na vida oferecida por amor. Acreditamos nisto? Já fizemos a comparação entre a alegria titubeante que resulta dos valores efémeros e a alegria profunda e duradoura que brota de gestos autênticos de doação, de serviço, de cuidado aos irmãos?
    • Os discípulos são os “amigos” de Jesus. Jesus escolheu-os, chamou-os, partilhou com eles o conhecimento e o projeto do Pai, associou-os à sua missão; estabeleceu com eles uma relação de confiança, de proximidade, de intimidade, de comunhão. A comunidade cristã é uma comunidade de “amigos” reunidos à volta de Jesus. Pode ter irmãos a quem foi confiado o serviço da autoridade; mas não é uma comunidade de “senhores” e de “servos”, de “gente que manda” e “gente que obedece”, de “superiores” e de “súbditos”. É a comunidade dos “amigos” de Jesus, uma comunidade de “iguais”. E Jesus continua, apesar de tudo, a ser o centro e a referência, à volta da qual se constrói a comunidade dos discípulos. A Igreja de Jesus funciona realmente como uma família de “amigos” que se amam, que se ajudam mutuamente no caminho, que partilham projetos e ideais? A Igreja é uma comunidade de “irmãos”, onde todos têm voz, onde a opinião de todos conta e onde todos colaboram na descoberta dos caminhos apontados pelo Espírito? Jesus é, de facto, o centro à volta do qual se articula a vida dos seus “amigos”? Como é que no dia a dia nós, amigos de Jesus, desenvolvemos e aprofundamos o nosso encontro e a nossa comunhão com Ele?
    • “Fui eu que vos escolhi e destinei, para que vades e deis fruto e o vosso fruto permaneça” – disse Jesus aos discípulos. Jesus não chamou os discípulos para os fechar nas sacristias; mas chamou-os para que dessem testemunho no mundo do projeto salvador de Deus. Os “amigos” de Jesus são chamados a mostrar em gestos concretos que Deus ama cada homem e cada mulher – e de forma especial os pobres, os marginalizados, os débeis, os pequenos, os oprimidos; os “amigos” de Jesus são convidados a eliminar o sofrimento, o egoísmo, a miséria, a injustiça, tudo o que oprime e escraviza os irmãos e desfeia o mundo; os “amigos” de Jesus são desafiados a ser arautos da justiça, da paz, da reconciliação, do amor; os “amigos” de Jesus têm como tarefa denunciar os pseudovalores que oprimem e escravizam os homens… Os membros da comunidade do Reino de Deus, transformados em Homens Novos pelo amor de Jesus, têm como missão testemunhar esse mundo novo que Deus quer oferecer aos homens e que Jesus anunciou na sua pessoa, nas suas palavras e nos seus gestos. Estamos, de facto, disponíveis para colaborar com Jesus nessa missão?

     

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 6.º DOMINGO DE PÁSCOA
    (adaptadas, em parte, de “Signes d’aujourd’hui”)

     

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.

    Ao longo dos dias da semana anterior ao 6.º Domingo de Páscoa, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus…

    2. BILHETE DE EVANGELHO.

    Jesus não se contentou em dizer: “amai-vos uns aos outros”. Antes e depois d’Ele, muitos recomendaram isso. Mas Jesus precisa: “como o Pai Me amou, também Eu vos amei”. Tudo está nesta conjunção “como”, porque Jesus pede para vivermos o que Ele próprio viveu. É isso um verdadeiro testemunho. É o testemunho que Ele dá algumas horas antes da sua última refeição, quando lava os pés aos seus discípulos, dizendo-lhes: “é um exemplo que vos dei a fim de que vós façais também como Eu fiz”. Isso chama-se coerência. Jesus manifestou sempre a coerência entre as suas palavras e os seus actos. Se Ele chama os discípulos “amigos” e não “servos”, é porque os faz confidentes do seu pensamento e convivas da sua refeição, e é pelo seu testemunho, o do amor mútuo, que eles serão, por sua vez, autênticos testemunhos.

    3. À ESCUTA DA PALAVRA.

    O amor, sempre o amor… Não haverá exagero, na Igreja, em falar sempre de amor? Muitos cristãos hoje, incluindo muitos jovens, têm saudade de uma religião forte, que ensine a lei, os mandamentos e a exigência da moral, recorrendo a uma estrita disciplina. Evidentemente, para que isso seja eficaz, é preciso falar mais do pecado e insistir na ameaça das punições divinas! Porém… Nestes nove versículos de São João, as palavras “amar”, “amor”, “amigo” aparecem doze vezes! Como fugir a isso? Jesus faz depender tudo de uma fonte primeira: “assim como o Pai Me amou, também Eu vos amei. Permanecei no meu amor”. Falando do amor de Deus, cometemos muito facilmente o erro de transpor para Deus a nossa maneira humana de amar. O amor que conhecemos implica sempre uma reciprocidade: ser amado para amar, receber para dar. Imaginamos então que o amor de Deus por nós depende da nossa maneira de o receber e de lhe responder. Ora, fazendo assim, esquecemos a palavra de São João: “não fomos nós que amámos Deus, foi Ele que primeiro nos amou”. O amor de Deus por nós existe antes de nós. Eu posso recusar este amor, mas Deus jamais deixará de me amar. Nunca poderei esgotar o seu amor. Somente deixando-me amar por Ele, chegarei, pouco a pouco, a amar como Ele me ama!

    4. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE…

    Ser verdadeiro… Tenhamos, nesta semana, a coragem de responder em verdade à declaração de amor que o Senhor nos faz. A cada um de nós, Ele diz: “Escolhi-te”. Sinceramente, no fundo de mim mesmo, o que respondo? Sou verdadeiramente feliz por isso? Como é que esta escolha do Senhor dá fruto?

     

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA

    Grupo Dinamizador:
    José Ornelas, Joaquim Garrido, Manuel Barbosa, Ricardo Freire, António Monteiro
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
    www.dehonianos.org

     

  • 6ª Semana - Segunda-feira - Páscoa

    6ª Semana - Segunda-feira - Páscoa

    6 de Maio, 2024

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 16, 11-15

    Naqueles dias, embarcámos em Tróade e fomos directamente a Samotrácia; no dia seguinte, fomos a Neápoles 12e de lá, a Filipos, cidade de primeira categoria deste distrito da Macedónia, e colónia. Estivemos aí durante alguns dias. 13No dia de sábado, saímos fora de portas, em direcção à margem do rio, onde era costume haver oração. Depois de nos sentarmos, começámos a falar às mulheres que lá se encontravam reunidas. 14Uma das mulheres chamada Lídia, negociante de púrpura, da cidade de Tiatira e temente a Deus, pôs-se a escutar. O Senhor abriu-lhe o coração para aderir ao que Paulo dizia. 15Depois de ter sido baptizada, bem como os de sua casa, fez este pedido: «Se me considerais fiel ao Senhor, vinde ficar a minha casa.» E obrigou-nos a isso.

    Deus conduziu Paulo e seus companheiros para um novo campo de acção, a Macedónia, já na Europa. Em Filipos, os missionários sentem-se como estranhos. A cidade tinha um acentuado carácter romano, pois se tornara colónia do Império desde o ano 42 aC. Com o grego, também se falava o latim. A administração civil ajustava-se ao padrão romano, e não ao grego. Os judeus eram muito poucos, como denota o facto de não haver sinagoga e o costume de se reunirem, no dia de sábado, junto ao rio. Paulo parece encontrar lá apenas mulheres. Entre elas, destaca-se Lídia, uma rica comerciante de púrpura, que parece ter aderido ao judaísmo, pelo menos como ouvinte. Para Lucas, ela é o paralelo feminino de Cornélio, é «uma crente em Deus».
    Ao contrário do que acontecera em Antioquia da Pisídia, onde algumas mulheres tinham tomado parte na revolta contras os missionários, Lídia acolhe-os na sua casa, provavelmente espaçosa, pois «o Senhor lhe abriu o coração para aderir ao que Paulo dizia» (v. 14). É sempre o Senhor que acompanha os seus missionários e torna eficaz a sua palavra.

    Evangelho: João 15, 26 - 16, 4a

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 26Quando vier o Paráclito, o Espírito da Verdade, que procede do Pai, e que Eu vos hei-de enviar da parte do Pai, Ele dará testemunho a meu favor. 27E vós também haveis de dar testemunho, porque estais comigo desde o princípio.» 1«Dei-vos a conhecer estas coisas para não vos perturbardes. 2Sereis expulsos das sinagogas; há-de chegar mesmo a hora em que quem vos matar julgará que presta um serviço a Deus! 3E farão isto por não terem conhecido o Pai nem a mim. 4Deixo-vos ditas estas coisas, para que, quando chegar a hora, vos lembreis de que Eu vo-las tinha dito.

    A perseguição é praticamente a primeira experiência da Igreja. Os discípulos de Jesus foram perseguidos, primeiro pelos judeus e, depois, também pelos pagãos. Jesus tinha-os advertido para essas situações. O mundo opôs-se a Cristo, e irá opor-se também aos cristãos, porque não são do mundo, porque são de Cristo. Além disso, o servo não é mais do que o seu senhor. O ódio do mundo e a perseguição dos discípulos são considerados inevitáveis. Até se julgam fazerem parte daquela intensificação do mal, que preludia o juízo.
    Jesus viveu entre a animosidade e a perseguição. Que podem esperar os seus discípulos, chamados a anunciar a mensagem que O levou à morte? É verdade que nem todos recusaram Jesus e a sua palavra. Alguns amaram-no por causa do testemunho de João Batista, e por causa do testemunho que o próprio Jesus deu de Si mesmo. Por isso, é preciso continuar a testemunhar o Senhor, para que aumente o número dos que O amam. Nessa tarefa, os discípulos são ajudados pelo testemunho do Espírito de verdade que Jesus enviará do Pai. E a poderosa acção do Espírito irá manifestar-se exactamente nas perseguições. Há que não esquecê-lo, quando chegar a hora.

    Meditatio

    Paulo, depois da visão do macedónio que lhe suplicava: «Vem ajudar-nos!» (Act 16, 9), embarca em Tróade e vai para Neápoles, cidade próxima de Filipos, na Macedónia. As primeiras pessoas que escutam a palavra de Deus são mulheres. Entre elas destaca-se «Lídia, negociante de púrpura, e temente a Deus» (v. 14). Esta mulher, não só aderiu às palavras de Paulo e dos seus companheiros, mas, uma vez baptizada, recebeu-os em sua casa.
    A primeira criatura humana a acolher a Palavra foi Maria. Quando a Palavra chegou à Europa, foi também uma mulher, Lídia, que, por primeira, a acolheu, com outras mulheres. Isto é bonito e dá alegria, principalmente às próprias mulheres.
    A vida cristã é tempo de tentação e tempo de testemunho, tempo de luta e tempo de colaboração com o Espírito no testemunho de Cristo Ressuscitado. Como Cristo foi incompreendido, também os seus discípulos o são. Como Cristo foi perseguido e morto, também os cristãos estão sujeitos a sê-lo. O texto evangélico que escutamos hoje dá-nos uma perspectiva «heróica» da vida cristã. O cristão é chamado a dar testemunho em sentido pleno. É chamado a ser «mártir». A realidade de Cristo é tão decisiva para a humanidade e, ao mesmo tempo, tão estranha ao modo comum de pensar, que todo aquele que alinha por Cristo é quase inevitavelmente marginalizado e, por vezes, chega a ser eliminado. A história dos mártires mostra claramente essa realidade.
    Também hoje, os discípulos de Cristo, particularmente os missionários, sofrem, não só pelas dificuldades normais da vida e do apostolado, mas também pela incompreensão e pela hostilidade do mundo, em nome do progresso, da emancipação e da modernização, da libertação de tabus, dos direitos humanos, etc., etc.
    Já o Pe. Dehon recordava, no seu Diário, os seus muitos missionários que sacrificaram a vida: «Alguns morreram generosamente na missão, no Congo, no Brasil» (Diário XLV, 41: Fevereiro de 1925.). E, em Março de 1912, escreve nas Memórias: «Os nossos mortos do Congo, do Brasil, do Equador! No Congo 17 deram a vida pela conversão dos negros. Um santo cardeal dizia-me que só pelo simples facto de irem lá para baixo, expondo-se ao perigo de uma morte iminente, merecer-lhe-ia a palma do martírio» (LC n. 381).
    Se todo o nosso apostolado deve ser «uma oblação agradável a Deus» (Cst. 31), deve sê-lo, de modo muito particular, o apostolado missionário. Se o convite do n. 22 das Constituições: «oferecer-nos ao Pai como oblação viva, santa e agradável», vale para todos os religiosos do Pe. Dehon, deve realizar-se, de modo particular, naqueles que se consagram ao apostolado missionário.

    Oratio

    Senhor, quero hoje, mais uma vez rezar-te com o teu servo Leão Dehon: Dá- me, a força de que preciso. Toca o meu coração pelo teu amor, a fim de que esteja preparado para ultrapassar todas as dificuldades e todas as provações. Sei que nada custa àquele que ama. Para me fortalecer, procurarei o teu amor e recordar-me-ei constantemente das bondades do teu divino Coração. Amen. (OSP 3, p. 447).

    Contemplatio

    O Espírito Santo recordar-nos-á o exemplo de Nosso Senhor o qual nos sustentará.
    Nosso Senhor escolheu-nos como seus apóstolos, para espalharmos o seu amor, para trabalharmos no reino do seu Coração. Atacaremos a corrupção do mundo, o mundo corrompido levantar-se-á contra nós. Mas, se o mundo nos odeia, sabemos que primeiro odiou Nosso Senhor. O servo não é maior que o seu senhor.
    Se perseguiram Nosso Senhor, também nos hão-de perseguir. Como ele, havemos de suportar com paciência as perseguições. As provações hão-de servir para o nosso avanço na virtude, para a nossa santificação.
    As promessas de Nosso Senhor suster-nos-ão também. Sabemos que o socorro nos virá em tempo conveniente e que seremos recompensados por tudo o que tivermos sofrido.
    Nosso Senhor preveniu-nos para que não nos escandalizemos, e para que as provas não nos desencorajem nem nos abatam. O Espírito Santo fortificar-nos-á, iluminar-nos-á. Convencerá o mundo do pecado. Propagando a verdade e a virtude pelos ministros do Evangelho, manifestará a iniquidade do mundo e a justiça cristã.
    Confessaremos a sua doutrina, seguiremos os seus ensinamentos, imitaremos os seus exemplos. Confessá-lo-emos com o coração, com a boca e com a acção. Dirigiremos os nossos pensamentos, os nossos desejos, os nossos projectos para tudo o que possa contribuir para a glória de Deus e para a salvação das almas. Regularemos as nossas palavras segundo a sua lei, evitando tudo o que fira a caridade, a verdade, a humildade. Agiremos como ele fazendo unicamente a vontade do Pai.
    Tenhamos coragem na acção e no sofrimento. As tentações virão e as quedas também. O demónio e o mundo não repousam. A vida tem as suas provas inevitáveis. O Espírito Santo fortificar-nos-á para a luta e para a paciência. Dar-nos-á a força da lei, a da esperança e sobretudo a do amor. Recordar-nos-á a necessidade da expiação, a brevidade da vida, a recompensa do céu; mas acima de tudo unir-nos-á a Nosso Senhor pela caridade. Amando-o, conformar-nos-emos aos seus sentimentos. Sofreremos de boamente com ele e por ele. Nada custa àquele que ama.
    Tenhamos coragem. A vida de amor exclui a tristeza. Vivamos no fervor e no puro amor. O Espírito de amor nos sustentará, se soubermos ir buscá-lo ao Coração de Jesus (Leão Dehon, OSP 3, p. 446s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Dei-vos a conhecer estas coisas para não vos perturbardes» (Jo 16, 1).

  • 6ª Semana - Terça-feira - Páscoa

    6ª Semana - Terça-feira - Páscoa

    7 de Maio, 2024

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 16, 22-34

    Naqueles dias, 22a multidão amotinou-se contra eles; e os estrategos, arrancando-lhes as vestes, mandaram-nos açoitar. 23Depois de lhes terem dado muitas vergastadas, lançaram-nos na prisão, recomendando ao carcereiro que os tivesse sob atenta vigilância. 24Ao receber tal ordem, este meteu-os no calabouço interior e prendeu-lhes os pés no cepo.
    25Cerca da meia-noite, Paulo e Silas, em oração, entoavam louvores a Deus, e os presos escutavam-nos. 26De repente, sentiu-se um violento tremor de terra que abalou os alicerces da prisão. Todas as portas se abriram e as cadeias de todos se desprenderam. 27Acordando em sobressalto, o carcereiro viu as portas da prisão abertas e puxou da espada para se matar, pensando que os presos se tinham evadido. 28Paulo, então, bradou com voz forte: «Não faças nenhum mal a ti mesmo, porque nós estamos todos aqui.» 29O carcereiro pediu luz, correu para dentro da masmorra e lançou-se a tremer, aos pés de Paulo e de Silas. 30Depois, trouxe-os para fora e perguntou: «Senhores, que devo fazer para ser salvo?» 31Eles responderam:
    «Acredita no Senhor Jesus e serás salvo tu e os teus.» 32E anunciaram-lhe a palavra do Senhor, assim como aos que estavam na sua casa. 33O carcereiro, tomando-os consigo, àquela hora da noite, lavou-lhes as feridas e imediatamente se baptizou, ele e todos os seus. 34Depois, levando-os para cima, para a sua casa, pôs-lhes a mesa e entregou-se, com a família, à alegria de ter acreditado em Deus.

    Lucas quer suscitar nos seus leitores a confiança em Deus, que tem mais poder que os homens, e pode transformar as dificuldades em graça. Por isso, «romanceia» muito o seu relato. Paulo e Silas tinham expulsado o espírito pitónico de uma escrava bruxa. Os seus senhores, que assim viram desaparecer uma fonte de rendimento, arrastaram os missionários à presença dos magistrados, e acusaram-nos de criar desordem na cidade, apregoando usos contrários aos dos romanos. Os magistrados, sem grandes investigações, mandaram açoitar os acusados e puseram-nos na prisão, bem vigiados. Mais tarde, invocando a sua cidadania romana, Paulo irá protestar contra os abusos cometidos contra ele. Entretanto, dá-se a clamorosa conversão narrada no texto que hoje escutamos. O testemunho sereno dos prisioneiros, a sua lealdade, a série de eventos extraordinários, impressionam o carcereiro, que pergunta aos apóstolos:
    «Senhores, que devo fazer para ser salvo?» (v. 30). A resposta é simples e directa:
    «Acredita no Senhor Jesus» (v. 31). Assim, depois de Lídia, prosélita judaica, um funcionário romano, entra a fazer parte da comunidade de Filipos, tão cara a Paulo.

    Evangelho: João 16, 5-11

    «Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 5«Agora vou para aquele que me enviou, e ninguém de vós me pergunta: 'Para onde vais?' 6Mas, por vos ter anunciado estas coisas, o vosso coração ficou cheio de tristeza. 7Contudo, digo-vos a verdade: é melhor para vós que Eu vá, pois, se Eu não for, o Paráclito não virá a vós; mas, se Eu for, Eu vo-lo enviarei. 8E, quando Ele vier, dará ao mundo provas irrefutáveis de uma culpa, de uma inocência e de um julgamento: 9de uma culpa, pois não creram em mim; 10de uma inocência, pois Eu vou para o Pai, e já não me vereis; 11de um julgamento, pois o dominador deste mundo ficou condenado.»

    Jesus anuncia a sua partida deste mundo, e afirma que ela é conveniente para os discípulos. Jesus fala da sua morte, que só poderá ser entendida à luz do Espírito Santo. O testemunho de Jesus, que os discípulos hão-de dar, só será possível depois de entenderem quem é Jesus, o que significou a sua presença no meio de nós, e qual foi o sentido da sua morte e da sua ressurreição. E só o Espírito lhes pode dar esse entendimento. Os discípulos hão-de sofrer perseguições. Mas elas serão intoleráveis se não estiverem convencidos e seguros daquilo pelo qual serão perseguidos.
    Além de dar testemunho de Jesus, o Espírito também acusará o mundo de pecado por O ter rejeitado. Os crentes ficarão esclarecidos sobre o erro do mundo, sobre o seu pecado de incredulidade. A condenação de Cristo foi inconsistente. A sua ressurreição condenou o príncipe deste mundo para sempre. Jesus, morto e ressuscitado, é o verdadeiro vencedor.

    Meditatio

    A pregação, em Filipos, teve um começo prometedor. Mas acabou de modo desastroso, quando se levantou um motim contra os missionários, que foram acusados perante as autoridades e lançados na prisão. Paulo, como cidadão romano, estava isento destes processos sumários feitos pelas autoridades locais. Mas, dessa vez, não invocou tal direito. E seguiu-se todo o episódio descrito por Lucas. Enquanto Paulo e Silas cantam os louvores de Deus na prisão, dá-se um terramoto que escancara as portas da mesma. Os apóstolos podiam ter fugido, como pensou o carcereiro. Mas permaneceram na prisão, confiando em Deus e no seu poder para transformar as dificuldades e problemas dos seus missionários em ocasiões de graça. E foi o que aconteceu. O carcereiro converteu-se. E a Igreja teve o primeiro encontro com Roma, representada pelas autoridades da colónia romana de Filipos. Lucas quer mostrar que o cristianismo nunca foi um perigo para a lei e para a ordem no Império. Por isso, Roma deve reconhecer-lhe liberdade para pregar o Evangelho.
    A acção missionária da Igreja está sempre sujeita a vicissitudes idênticas às que Paulo e Silas tiveram de enfrentar. Mas há que prosseguir a missão, confiando em Deus e no seu poder. A história da Igreja mostra-nos como Deus, pela persistência e pela fé dos missionários, faz maravilhas. Lembro-me concretamente da Igreja que está em Moçambique e do que teve de enfrentar, seja durante a guerra colonial, seja durante os primeiros anos da independência do país. Não faltaram dificuldades de toda a ordem, incluindo acusações de colaborar com uma ou outra força durante a guerra colonial, ou de ser um instrumento do imperialismo, depois da independência. Mas a Igreja não se deixou impressionar e permaneceu em nome da fidelidade a Deus, e em nome da fidelidade ao povo. O seu notável papel acabou por ser reconhecido.
    O evangelho faz-nos ver como, enquanto o mundo condena os discípulos de Jesus, o Espírito inverte a situação, revelando o verdadeiro ser do mundo, o seu erro, a sua nulidade. É uma luz que emerge no critério do juízo divino, diferente e até oposto ao do mundo. Perseguidos e condenados pelos tribunais do mundo, os discípulos podem julgar e condenar o mundo, enquanto esperam o juízo final que revelará os termos exactos do entendimento divino.
    Precisamos muito, hoje, deste Espírito que reforça os corações, que torna evidentes as razões para crer, e que dá coragem para nos opormos à mentalidade deste mundo cada vez mais seguro de si, e mais sedutor. Precisamos, sobretudo, que o Espírito nos mostre que muitos sectores do mundo «mundano» têm em si componentes diabólicas, que a batalha entre Cristo e o príncipe deste mundo continua, e que somos chamados a participar nessa luta decisiva dentro de nós, entre nós e à nossa volta.
    É verdade que todos somos criaturas frágeis, cansadas e fatigadas: "cansadas" pela luta contra o mal; "fatigadas" pelo peso da nossa carne fraca, e pelo peso das nossas culpas. Mas Cristo, com misericordiosa bondade, convida-nos a ir a Ele para termos força na luta: «Vinde a Mim, todos vós, que vos estais cansados e oprimidos, e aliviar-vos-ei... Aprendei de Mim que sou manso e humilde de coração e achareis alívio para as vossas almas, pois o Meu jugo é suave e o Meu fardo é leve» (Mt 11, 28-30).
    A nossa luta contra o mal passa pelo anúncio do Evangelho, mas também pelo empenhamento em favor da justiça e da paz entre os homens. Foi que fez o Pe. Dehon, com o seu intenso apostolado social, em S. Quintino. Isto é importante para as pessoas pobres e desprotegidas, mas também é importante para a Igreja, frequentemente sentida como "um corpo estranho", mas que se torna credível quando se compromete seriamente em favor do homem, e na luta pela sua libertação de todas as formas de opressão.

    Oratio

    Veni Sancte Spiritus! Vem Espírito Santo, para que resistamos ao poder do mundo. Vê como somos fracos, como somos tímidos, e como as razões do mundo avançam na conquista dos corações dos jovens e dos menos jovens. Que poderemos fazer, se não vieres em nosso auxílio? Os nossos argumentos passam ao lado de muitos dos nossos contemporâneos, sem lhes beliscar a couraça das seguranças em que põem a sua confiança. Sem o teu Espírito, tornamo-nos como o sal que não salga, ou como a luz que não alumia. Sem o teu Espírito, corremos o risco de nos sentir defensores de uma causa perdida. Enche-nos do teu Paráclito, do teu Advogado, do teu Arguente, do teu Defensor, do teu Consolador, para que não fujamos à luta, não fiquemos desarmados, não nos afoguemos no difuso paganismo que nos envolve. Faz- nos profetas críticos deste mundo, profetas entusiastas do teu mundo, da tua verdade. Amen.

    Contemplatio

    Também neste ponto Nosso Senhor não nos deixará órfãos. Suster-nos-á pelo seu Espírito. As provas virão e muito grandes. Estaremos à mercê do ódio do mundo e das perseguições, mas não tenhamos medo, as perseguições não impedirão nem o cumprimento dos desígnios de Deus nem o estabelecimento do seu reino. O Espírito Santo dará testemunho a Nosso Senhor pela verdade que há-de propagar e pelas obras que há-de inspirar; e nós, fortificados pelo Espírito Santo, daremos também testemunho a Nosso Senhor pregando a verdade e suportando por ela todas as provas e contradições.
    Devemos ser os instrumentos do Espírito Santo para a renovação do mundo. Encontraremos nele todos os socorros necessários para cumprirmos dignamente a nossa missão apostólica. Fortificar-nos-á na verdade, no zelo e na paciência.
    A oração será o canal da nossa força. Rezaremos a Deus com uma fé íntegra e uma viva confiança pelo sucesso das nossas obras, pela salvação das almas e pelo reino do Sagrado Coração. «Pedi e recebereis, diz-nos Nosso Senhor, e a vossa alegria será completa. Pedi em meu nome, com a ajuda do Espírito Santo, meu Pai vos ama, porque vós me amais e vos atenderá» (Leão Dehon, OSP 3, p. 445).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    ,,Se Eu for, Eu enviar-vos-ei O Consolador,,: (Jo 16, 7).

  • 6ª Semana - Quarta-feira - Páscoa

    6ª Semana - Quarta-feira - Páscoa

    8 de Maio, 2024

    Lectio

    Primeira leitura: Act 17, 15. 22-18,1

    Naqueles dias, 15os que acompanhavam Paulo levaram-no a Atenas e regressaram, incumbidos de transmitir a Silas e a Timóteo a ordem de irem reunir-se a Paulo o mais rapidamente possível.
    22De pé, no meio do Areópago, Paulo disse, então: «Atenienses, vejo que sois, em tudo, os mais religiosos dos homens. 23Percorrendo a vossa cidade e examinando os vossos monumentos sagrados, até encontrei um altar com esta inscrição: 'Ao Deus desconhecido.' Pois bem! Aquele que venerais sem o conhecer é esse que eu vos anuncio. 24O Deus que criou o mundo e tudo quanto nele se encontra, Ele, que é o Senhor do Céu e da Terra, não habita em santuários construídos pela mão do homem, 25nem é servido por mãos humanas, como se precisasse de alguma coisa, Ele, que a todos dá a vida, a respiração e tudo mais. 26Fez, a partir de um só homem, todo o género humano, para habitar em toda a face da Terra; e fixou a sequência dos tempos e os limites para a sua habitação, 27a fim de que os homens procurem a Deus e se esforcem por encontrá-lo, mesmo tacteando, embora não se encontre longe de cada um de nós. 28É nele, realmente, que vivemos, nos movemos e existimos, como também o disseram alguns dos vossos poetas: 'Pois nós somos também da sua estirpe.'
    29Se nós somos da raça de Deus, não devemos pensar que a Divindade é semelhante ao ouro, à prata ou à pedra, trabalhados pela arte e engenho do homem. 30Sem ter em conta estes tempos de ignorância, Deus faz saber, agora, a todos os homens e em toda a parte, que todos têm de se arrepender, 31pois fixou um dia em que julgará o universo com justiça, por intermédio de um Homem, que designou, oferecendo a todos um motivo de crédito, com o facto de o ter ressuscitado de entre os mortos.» 32Ao ouvirem falar da ressurreição dos mortos, uns começaram a troçar, enquanto outros disseram: «Ouvir-te-emos falar sobre isso ainda outra vez.» 33Foi assim que Paulo saiu do meio deles. 34Alguns dos homens, no entanto, concordaram com ele e abraçaram a fé, entre os quais Dionísio, o areopagita, e também uma mulher de nome Dâmaris e outros com eles. 1Depois disso, Paulo afastou-se de Atenas e foi para Corinto.

    Em Atenas, Paulo utiliza uma nova técnica para anunciar o Evangelho. Não começa por citar as Escrituras, como entre os judeus, mas começa por referir a religiosidade dos gregos. O discurso no Areópago de Atenas é um exemplo de inculturação, que não atraiçoa a originalidade da mensagem cristã. Mesmo dirigindo-se a estóicos e epicuristas, mesmo citando poetas gregos, Paulo faz um discurso de profeta, anunciando um homem «ressuscitado de entre os mortos» (v. 31). Ainda que se insira na linha dos filósofos e dos poetas, que tinham criticado a idolatria, diz o que eles nem sequer podiam imaginar: a verdade alcança-se por meio de um homem ressuscitado de entre os mortos, que também será o juiz final, isto é, o critério definitivo do bem e do mal.
    Um discurso, tão pouco racional, divide, mais uma vez, o auditório. Muitos afastam-se de riso nos lábios. Mas alguns aderem à mensagem.
    Ao citar este discurso de Paulo, Lucas quer dar um exemplo de como se pode apresentar o Kerygma aos pagãos cultos. Os resultados são sempre idênticos: há quem acolha a Palavra e quem a rejeite. Apesar de tudo, nasce uma comunidade cristã na capital da cultura daquele tempo.

    Evangelho: Jo 16, 12-15

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 12«Tenho ainda muitas coisas a dizer-vos, mas não sois capazes de as compreender por agora. 13Quando Ele vier, o Espírito da Verdade, há-de guiar-vos para a Verdade completa. Ele não falará por si próprio, mas há-de dar-vos a conhecer quanto ouvir e anunciar-vos o que há-de vir.
    14Ele há-de manifestar a minha glória, porque receberá do que é meu e vo-lo dará a conhecer. 15Tudo o que o Pai tem é meu; por isso é que Eu disse: 'Receberá do que é meu e vo-lo dará a conhecer'.»

    Jesus, durante a sua vida terrena, não pôde ensinar muitas coisas aos discípulos, porque não eram capazes de as entender, pelo menos em profundidade. Só o Espírito Santo é o mestre interior e o guia para a verdade completa. A vinda do Espírito Santo inaugurará uma nova fase do conhecimento da palavra de Jesus. O seu ensinamento será dado no íntimo do coração de cada discípulo. Por ele, hão-de conhecer os segredos da verdade de Cristo e interiorizá-los.
    A missão do Espírito será semelhante à de Jesus, mas dirigida para o passado e para o futuro. Como durante a sua vida terrena o Filho nada fez sem o consenso e a unidade do Pai, assim também o Espírito há-de agir em perfeita dependência de Jesus, na Igreja pós-pascal. O Espírito será guia na compreensão da palavra de Jesus e do próprio Jesus; fará ver a realidade de Deus e dos homens como o Pai e o Filho a vêem; fará conhecer a mundo e a história na perspectiva da novidade iniciada com a morte e a ressurreição de Cristo.

    Meditatio

    Paulo verifica que os atenienses são muito religiosos, que sabem muito de religião, que se tinham preocupado em honrar todos os deuses e que, entre muitos erros, tinham tido uma boa inspiração, ao de dedicar um altar «ao Deus desconhecido» (v. 23). A consciência da sua ignorância podia ser uma preparação para acolher a revelação do verdadeiro Deus. Mas, para isso, ainda precisavam do Espírito de verdade, que só é dado por meio do Ressuscitado. Muitos, todavia, não estavam preparados para isso. De facto, «ao ouvirem falar da ressurreição dos mortos, uns começaram a troçar, enquanto outros disseram: «Ouvir-te-emos falar sobre isso ainda outra vez» (v. 32). Mas houve quem estivesse preparado para acolher o Espírito de verdade, concordando com Paulo: «Alguns dos homens, no entanto, concordaram com ele e abraçaram a fé» (v. 34).
    Uma coisa é saber muito sobre religião e repeti-lo como uma teoria qualquer, e outra é fazer experiência de fé, tomando consciência profunda do que é ser salvo por Jesus. Essa experiência e essa consciência são uma graça do Espírito Santo, o Espírito de verdade, segundo as palavras de Jesus. É o Espírito que nos permite fazer a exegese das palavras do Senhor, para caminharmos pela história com a «mente de Deus», isto é, com o seu modo de ver e de julgar, de sentir e de actuar. Essa «mente de Deus» coloca, muitas vezes, os discípulos em confronto com a mentalidade do mundo. O verdadeiro sentido das coisas, da história, dos acontecimentos está reservado àqueles que têm o Espírito, o deixam falar e escutam a sua voz num coração purificado: «Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus» (Mt. 5, 8). As épocas mais criativas da história, para a fé, foram aquelas em que os cristãos se empenharam seriamente na libertação interior, na oração, na santidade.

    As palavras do Senhor realizam-se maximamente nos santos, e são eles que melhorem compreendem as coisas de Deus e o momento histórico em que vivem. Conhecer a realidade segundo Deus é algo de diferente do conhecimento simplesmente racional: é deixar que o Espírito fale num coração vazio de coisas demasiadamente terrenas.
    O Pe. Dehon foi um desses homens que soube ler a realidade à luz de Deus.
    Estudou atentamente as causas dos males da Igreja e da sociedade do seu tempo. Mas não o fez como simples sociólogo ou pastoralista. Fê-lo como verdadeiro místico. Daí que tenha visto no pecado, entendido como recusa do amor, que Deus a todos oferece, e com que pretende ser amado, e quer que nos amemos uns aos outros, a causa mais profunda das deficiências da Igreja e das injustiças sociais. Por essa razão é que, ao falar aos noviços, chegou a afirmar que «a reparação por meio do amor puro é a salvação da Igreja e dos povos, é a solução da actual questão social» (CF III, 46: 25.7.1880). Esta afirmação, desligada da experiência de vida e especialmente do intenso apostolado social do Pe. Dehon, pode-nos parecer, hoje, espiritualismo abstracto. Mas não se trata disso: o Pe. Dehon tinha um sentido muito concreto das realidades que o rodeavam. O seu olhar místico permitia-lhe ver a realidade, mas também os meios concretos, as iniciativas mais adequadas para a transformar segundo Deus.

    Oratio

    Senhor, purifica o meu coração, pela infusão do teu Espírito. Assim poderei compreender «Verdade completa», não só sobre Ti e sobre os teus projectos, mas também sobre o mundo e sobre a história. Purifica o meu olhar interior para que possa ver os teus caminhos, e o meu ouvido interior para que possa escutar a tua vontade. Purifica o meu instinto, para que se oriente para Ti.
    Dá-me um coração desapegado e vazio para Te deixar falar. Dá-me um coração humilde para escutar a voz da tua Igreja. Dá-me a tua luz divina para que saiba julgar o mundo, a sua mentalidade e as suas obras. Purifica-me e ilumina-me, Senhor. Amen.

    Contemplatio

    Nosso Senhor prodigalizou-nos os dons do Espírito como os dons do coração. Enquanto vivia com os seus discípulos, iniciava-os ele mesmo na verdade: Eu sou a verdade. Deixando-os, prometeu-lhes o Espírito da verdade, que os consolaria da sua ausência. É para nós um dom totalmente celeste. Não é somente o dom da fé, é a inteligência e o gosto das verdades reveladas, cuja contemplação luminosa e completa fará a nossa felicidade no céu. É uma luz acrescentada à nossa razão, um horizonte novo e infinito, aberto diante dela, para que ela aí encontre não apenas a resposta às questões do nosso futuro eterno, mas mesmo a solução de uma multidão de problemas naturais. Este dom é múltiplo, compreende a inteligência, a sabedoria e a ciência. É uma participação na vida dos espíritos celestes.
    «Se me amais, guardai os meus mandamentos, disse Nosso Senhor, e enviar-vos-ei o Espírito de verdade, o Espírito santificador, cheio de todas as luzes, de todas as graças e de toda a vida espiritual, o Espírito de verdade, que une os homens a Deus pelo conhecimento e pelo amor. O mundo culpado e corrompido não o pode receber. Sendo dominado pelos sentidos, não o vê nem o conhece; mas vós, vós o conhecereis, ele permanecerá convosco e estará em vós para vos iluminar, vos dirigir, vos fortificar» (Leão Dehon, OSP 3, p. 430).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    ,,Q Espírito da Verdade, há-de guiar-vos para a Verdade completa .. (Jo 16, 13).

  • 6ª Semana - Quinta-feira - Páscoa

    6ª Semana - Quinta-feira - Páscoa

    9 de Maio, 2024

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 18, 1-8

    Naqueles dias, 1Paulo afastou-se de Atenas e foi para Corinto. 2Encontrou ali um judeu chamado Áquila, natural do Ponto, recentemente chegado da Itália com Priscila, sua mulher, porque um édito de Cláudio ordenara que todos os judeus se afastassem de Roma. Paulo foi procurá-los 3e, como eram da mesma profissão - isto é, fabricantes de tendas - ficou em casa deles e começou a trabalhar. 4Todos os sábados dissertava na sinagoga e esforçava-se por convencer, tanto a judeus como a gregos. 5Quando Silas e Timóteo chegaram da Macedónia, Paulo entregou-se à pregação, afirmando e provando aos judeus que Jesus era o Messias. 6Mas, perante a oposição e as blasfémias deles, sacudiu as suas vestes e disse-lhes: «Que o vosso sangue recaia sobre as vossas cabeças. Eu não sou responsável por isso. De futuro, dirigir-me-ei aos pagãos.» 7Retirou-se dali e foi para casa de um certo Tício Justo, homem temente a Deus, cuja casa era contígua à sinagoga. 8No entanto, Crispo, o chefe da sinagoga, acreditou no Senhor, ele e todos os da sua casa; e muitos dos coríntios que ouviam Paulo pregar abraçavam também a fé e recebiam o Baptismo.

    Corinto era uma cidade cosmopolita, mais romana do que grega. Com uma boa situação geográfica, era notável pelo seu comércio, mas também pela sua corrupção. Pela Palavra que lá foi anunciada, surgiu uma das comunidades cristãs mais florescentes. Todavia, essa mesma comunidade, também veio a dar grandes desgostos a Paulo.
    A actividade de Paulo em Corinto foi mais complicada do que Lucas deixa supor. Neste texto, o autor do Actos revela-nos alguns pormenores da vida quotidiana de Paulo e dos primeiros evangelizadores. O Apóstolo sabe um ofício e exerce-o, coisa considerada indigna de um homem culto entre os gregos, mas habitual entre os rabis de Israel, para quem o trabalho era uma boa ocasião para estar com as pessoas e ensinar. Paulo habita com um casal de judeus expulsos de Roma por Cláudio, pelos anos 49-50 da nossa era. Com a chegada de Silas e de Timóteo, Paulo dedica-se exclusivamente à pregação. Começa sempre pelos judeus e, só depois de ser recusado, mais uma vez, é que se volta para os pagãos. Lucas parece continuar preocupado em justificar a passagem aos pagãos. Mas, como sempre acontece, há alguém, mesmo entre os judeus, que acolhe a Palavra. Desta vez é o próprio chefe da sinagoga, com a sua família. E começa a colheita abundante entre os pagãos.

    Evangelho: João 16, 16-20

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 16«Ainda um pouco, e deixareis de me ver; e um pouco mais, e por fim me vereis.» 17Disseram entre si alguns dos discípulos: «Que é isso que Ele nos diz: 'Ainda um pouco, e deixareis de me ver, e um pouco mais, e por fim me vereis'? E também: 'Eu vou para o Pai'?» 18Diziam, pois:
    «Que quer Ele dizer com isto: 'Ainda um pouco'? Não sabemos o que Ele está a anunciar!» 19Jesus, percebendo que o queriam interrogar, disse-lhes: «Estais entre vós a inquirir acerca disto que Eu disse: 'Ainda um pouco, e deixareis de me ver, e um pouco mais, e por fim me vereis'? 20Em verdade, em verdade vos digo: haveis de chorar e lamentar-vos, ao passo que o mundo há-de gozar. Vós haveis de estar tristes, mas a vossa tristeza há-de converter-se em alegria!

    «Ainda um pouco, e deixareis de me ver; e um pouco mais, e por fim me vereis» (v. 16). Estas frases são, no mínimo, ambíguas. Como entendê-las correctamente? Elas referem-se à morte-ressurreição de Jesus, à sua glorificação pelo Pai, à vinda do Espírito e à nova ordem de coisas criada pelo acontecimento de Jesus. João recorre à incompreensão dos discípulos para provocar um esclarecimento posterior das palavras de Jesus. A vida terrena do Mestre está a terminar. A sua vida gloriosa vai começar na ressurreição. O regresso de Jesus não acontecerá só com as aparições depois da ressurreição, mas vai prolongar-se pela sua presença no coração dos crentes. Os discípulos não entendem as palavras de Jesus. Fazem perguntas (cf. v. 17). Jesus responde tentando remover-lhes da alma a tristeza que os assalta e procurando infundir-lhes confiança com uma nova revelação: «a vossa tristeza há-de converter-se em alegria» (v. 20). Depois da tormenta virá a acalmia. A alegria surgirá da mesma causa que provocou a tristeza.

    Meditatio

    As palavras de Jesus, como noutras ocasiões são susceptíveis de várias aplicações. Com uma frase enigmática, Jesus falou de um tempo em que os discípulos não O hão-de ver e de outro tempo em que O hão-de ver, porque Ele vai para o Pai.
    Estas palavras são pronunciadas durante o «discurso de adeus» e aplicam-se, em primeiro lugar, à paixão e à morte de Jesus. Os discípulos vão deixar de vê-lo brevemente porque estará no sepulcro. Será um tempo de tristeza para os amigos de Jesus, e um tempo de triunfo para os seus inimigos: «haveis de chorar e lamentar-vos, ao passo que o mundo há-de gozar» (v. 20). Todavia a ausência de Jesus durará pouco: ao terceiro dia ressuscitará. «Os discípulos encheram-se de alegria por verem o Senhor», anota João ao descrever a aparição de Jesus na tarde do primeiro dia da semana (Jo 20, 20).
    Estas palavras também se aplicam ao mistério da Ascensão e do Pentecostes.
    Ao subir ao Céu, Jesus deixa de estar visivelmente entre os seus, mas, no Pentecostes, inaugura uma nova forma de presença no meio deles, na Igreja. O Espírito santo torna Jesus presente no coração dos fiéis e na comunidade dos mesmos. Já não O vêem como durante a vida terrena, nem sequer como nas aparições depois da Ressurreição, mas vêem-no com o olhar do coração, onde o Espírito O torna presente. E, mais uma vez, a tristeza se transforma em alegria.
    As formas de presença de Jesus entre os seus discípulos vão-se transformando, tornando-se cada vez menos gratificantes sob o ponto de vista humano, mas bem mais profundas, produzindo alegria e paz cada vez maiores. A presença do Espírito estabelece os discípulos na alegria, na paz e no amor.
    Mas as palavras do Senhor podem aplicar-se também à nossa vida: a ausência-presença de Cristo marca o ritmo da nossa vida espiritual. Se é verdade que temos fases em que sentimos a sua ausência, também é verdade que, depois de cada uma delas, voltamos a sentir a sua presença de um modo novo. Essas fases de ausência- presença fazem crescer a nossa relação com Ele. Quando experimentamos a tristeza da sua ausência, interrogamo-nos sobre as razões da mesma e lançamos mão dos meios para O reencontrar. Por outro lado, Jesus quer dar-nos a alegria de reencontrarmos a sua presença. A tristeza da ausência produz a alegria do reencontro: «a vossa tristeza há-de converter-se em alegria!» (v. 20). Há que lembrar- nos deste ritmo quando estamos alegres e quando estamos tristes. Nem a alegria nem a tristeza duram sempre. Sucedem-se para nos fazer caminhar na união a Cristo e, por Ele, na união com o Pai. A meta é o Pai: quando a atingirmos, então sim, a nossa alegria será total e eternamente duradoira.
    O dehoniano, como todo o cristão vive alegre, manifestando a alegria e a bondade de Deus para com todos os homens, porque o Senhor está perto (cf. Fil 4, 4-
    5), o esposo, logo que chegue, o há-de introduzir na alegre festa das núpcias (cf. Mt 25, 10).
    A nossa alegria, e a alegria de Deus, é certamente consequência de uma vida boa, vivida para glória de Deus, nos bons e nos maus momentos, quando sentimos a presença do Senhor e quando sofremos com a sua ausência.
    Paulo lembra-nos a predilecção de Deus por aqueles que, em todas as circunstâncias, são generosos e viver o amor oblativo na relação com Ele e com os irmãos: «Deus ama quem dá com alegria» (2 Cor 9, 7). Viver e irradiar a alegria é a nossa missão de filhos «do Deus da esperança que nos enche de toda a alegria no Espírito Santo» (Rom 15, 13); que quer ser servido «na alegria» (Sl 100(99), 2) e espera ser agradecido «com alegria» (Col 1, 12), porque «o Reino de Deus... não é questão de comida ou de bebida, mas é justiça, paz e alegria no Espírito Santo» (Rom 14, 17).
    É esta, de modo especial, a nossa missão, o nosso estilo de vida de dehonianos, tendo presente o exemplo do Pe. Dehon.

    Oratio

    Obrigado, Senhor, pela alegria das tuas visitas. Obrigado pela tristeza das tuas ausências. Sê bendito para sempre, porque me conheces e sabes orientar a minha vida e atrair-me para Ti. Mas tem compaixão de mim: não me abandones demoradamente à provação para que não desespere da tua consolação. Vem em meu auxílio também quando este mundo me causa excessiva satisfação, para que não me deixe inebriar por ele. Ajuda-me a buscar em Ti a minha consolação e a minha alegria, em todo o tempo e lugar. Amen.

    Contemplatio

    Não vos deixarei sem apoio, sem conselho, sem guia, sem afecto. Prometo-vos o Espírito Santo para me substituir, e, além disso, eu próprio virei de diversos modos. Virei visitar-vos depois da minha ressurreição. O mundo não me verá mais, a minha missão terrestre está terminada; mas vós, vós me vereis ainda vivente.
    Hei-de visitar-vos também pela graça. Iluminados pelo Espírito Santo, acreditareis na minha divindade, reconhecereis que eu estou no meu Pai, que sou um só com Ele na unidade da essência divina; e vós estareis em mim, estareis unidos a mim pela vida da graça, como os membros estão unidos ao seu chefe, como os ramos da vinha estão unidos à cepa, cuja seiva os alimenta; e eu estarei em vós, iluminando-vos, dirigindo-vos, santificando-vos pelo Espírito Santo que vos hei-de enviar.
    Ao deixar-vos corporalmente e segundo as aparências, não vos abandono por isso, fico ainda convosco de diversas maneiras, pela fé, pelo amor, pela graça santificante e pela Eucaristia. Não vos deixo órfãos (Leão Dehon, OSP 3, p. 451).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «A vossa tristeza há-de converter-se em alegria» (Jo 16, 20).

  • 6ª Semana - Sexta-feira - Páscoa

    6ª Semana - Sexta-feira - Páscoa

    10 de Maio, 2024

    Lectio

    Primeira leitura: Act 18, 9-18

    Quando Paulo estava em Corinto, 9certa noite, o Senhor disse a Paulo, numa visão: «Nada temas, continua a falar e não te cales, 10porque Eu estou contigo e ninguém porá as mãos em ti para te fazer mal, pois tenho um povo numeroso nesta cidade.» 11Então, ele ficou lá durante um ano e seis meses, a ensinar-lhes a palavra de Deus.
    12Sendo Galião procônsul da Acaia, levantaram-se os judeus, de comum acordo, contra Paulo e levaram-no ao tribunal. 13«Este homem - disseram eles - induz as pessoas a prestar culto a Deus de uma forma contrária à Lei.» 14Paulo ia abrir a boca, quando Galião disse aos judeus: «Se se tratasse de uma injustiça ou grave delito, escutaria as vossas queixas, ó judeus, como é meu dever. 15Mas como se
    trata de um conflito doutrinal sobre palavras e nomes e acerca de vossa própria Lei, o assunto é convosco. Recuso-me a ser juiz em semelhante questão.» 16E mandou-os sair do tribunal. 17Então todos se apoderaram de Sóstenes, o chefe da sinagoga, e puseram-se a bater-lhe diante do tribunal. E Galião não se importou nada com isso.
    18Depois de se ter demorado ainda algum tempo em Corinto, Paulo despediu- se dos irmãos e embarcou para a Síria, com Priscila e Áquila, rapando a cabeça em Cêncreas, por causa de um voto que tinha feito.

    Galião foi procônsul, isto é, governador da província da Acaia, a partir de Maio do ano 51. Paulo esteve em Corinto até ao Verão de 51. O episódio narrado por Lucas situa-se nesse breve espaço de tempo. Os judeus querem captar a benevolência do governador, acusando Paulo. Mas Galião actua de modo inteligente e diplomático, recusando intrometer-se em questões internas ao judaísmo. Lucas quer, mais uma vez, mostrar a neutralidade do Império em relação aos cristãos. Inicialmente não há hostilidade das autoridades romanas, e Paulo é mesmo salvo por elas, algumas vezes. Estava ainda longe o tempo das perseguições.
    Paulo continua a ter uma vida difícil, mas o Senhor confirma-o na missão que lhe confiou entre os pagãos. Discretamente, o Apóstolo, acompanhado pelo casal de Priscila e Áquila, que lhe dera trabalho, embarca para a Síria, rumo a Jerusalém e a Antioquia. Permanecera 18 meses em Corinto, onde teve algum sucesso, entre os judeus e entre os pagãos. O Senhor afirmou ter lá «um povo numeroso» (v. 9). Mas Paulo não tinha feitio para se demorar muito tempo no mesmo lugar.

    Evangelho: Jo 16, 20-23a

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 20Em verdade, em verdade vos digo: haveis de chorar e lamentar-vos, ao passo que o mundo há-de gozar. Vós haveis de estar tristes, mas a vossa tristeza há-de converter-se em alegria! 21A mulher, quando está para dar à luz, sente tristeza, porque chegou a sua hora; mas, quando deu à luz o menino, já não se lembra da sua aflição, com a alegria de ter vindo um homem ao mundo. 22Também vós vos sentis agora tristes, mas Eu hei-de ver-vos de novo! Então, o vosso coração há-de alegrar-se e ninguém vos poderá tirar a vossa alegria. 23Nesse dia, já não me perguntareis nada. Em verdade, em verdade vos digo: se pedirdes alguma coisa ao Pai em meu nome, Ele vo-la dará.

    A alegria dos discípulos vem da liberdade que o afastamento do mundo lhes dá (cf. Jo 8, 32). O encontro «espiritual» com Cristo ressuscitado produz a liberdade e a alegria nos crentes. E nada nem ninguém lhas podem tirar. Essa liberdade e essa alegria, que vem da reconciliação do homem com Deus, realizada por Cristo, e expressa sobretudo na oração comunitária, vêem-se ilustradas nos capítulos 20-21 de João. Tal como acontece à mulher, que deu à luz, está feliz porque terminaram os seus sofrimentos, e deu ao mundo uma nova criatura, também o cristão está contente porque a sua alegria, fundada na dor, desabrochou na nova vida que é a páscoa do Senhor. A morte infame de Jesus transformou-se em alegria retumbante, alegria que ninguém pode tirar aos discípulos, porque se fundamenta na fé n´Aquele que vive glorioso à direita de Deus. A partir da ressurreição, a comunidade cristã, iluminada pelo Espírito, terá uma visão nova da vida e das coisas, e o mesmo Espírito lhe fará compreender tudo quanto precisar.

    Meditatio

    Paulo experimenta a presença de Jesus. Experimenta-a na forma inaugurada com o Pentecostes. Experimenta-a em si mesmo, pela força que sente no anúncio do Evangelho, mesmo quando as circunstâncias são difícieis. Sente-a nas comunidades que estão vivas e crescem: «Nada temas, continua a falar e não te cales, porque Eu estou contigo e ninguém porá as mãos em ti para te fazer mal, pois tenho um povo numeroso nesta cidade» (v. 10). O sofrimento do missionário é condição necessária e lugar privilegiado da alegria eclesial. Paulo será mestre e protagonista dessa alegria:
    «Estou cheio de consolação e transbordo de alegria no meio de todas as nossas tribulações» (2 Cor 7, 4). A seu exemplo, os convertidos acolhem «a Palavra em plena tribulação, com a alegria do Espírito Santo» (1 Ts 1, 6). Os ministros da Palavra são tidos «por tristes, nós que estamos sempre alegres;por pobres, nós que enriquecemos a muitos; por nada tendo e, no entanto, tudo possuindo» (2 Cor 6, 10).
    Jesus, ao subir ao Céu, não se afastou dos discípulos, mas inaugurou uma forma de presença mais profunda no meio deles. A Ascensão libertou-O dos limites da condição terrena e possibilitou-Lhe um contacto pessoal e íntimo com cada um de nós, possibilitou-Lhe estar connosco, com todos, todos os dias: «Eu estou contigo».
    «Hei-de ver-vos de novo! Então, o vosso coração há-de alegrar-se e ninguém vos poderá tirar a vossa alegria» (v. 22). É a alegria da intimidade com o Senhor, da vida com o Senhor: amar com Ele, actuar com Ele, estar sempre com Ele. «Com Jesus e como Ele», sintetizam as nossas Constituições (n. 21).
    Sabemos da importância que o Pe. Dehon dava à vida de união com Cristo, presente em nós. A «união permanente com Jesus» (Diário, 2 Janeiro de 1867) foi o seu caminho de santidade. «Deixemos viver em nós Nosso Senhor. Ele continua a viver na terra em cada um dos seus membros» (Diário, 25 de Abril de 1867). Esta união íntima com Cristo, como vara unida à cepa, era a sua vida e a força do seu apostolado.

    Oratio

    Obrigado, Senhor, pela tua presença, de tantos modos, no meio de nós. Posso encontrar-te na Palavra, na Eucaristia, na comunidade fraterna, na hierarquia da Igreja, no necessitado, e também na tua presença cósmica, que agora enche o universo. Posso viver na alegria da liberdade porque estou repleto da tua presença. Posso dar testemunho corajoso de Ti, porque o teu Espírito é a minha força.
    Perdoa-me, porque nem sempre vivo e actuo consciente desta realidade. Perdoa-me porque não Te dou suficientes graças por ela. Perdoa-me porque não me empenho suficientemente na missão, temendo o fracasso.
    Dá-me um coração atento às necessidades dos meus irmãos, especialmente à necessidade de Ti. Ajuda-me a levar a todos a tua alegria e a tua paz, para que esses dons da tua Ressurreição também possam crescer em mim. Amen.

    Contemplatio

    «Chorareis e gemereis». - «O vosso coração encheu-se de tristeza», diz Nosso Senhor aos seus apóstolos. Anunciou-lhes, de facto, acontecimentos bem tristes: a sua partida para o céu, a sua morte próxima, a traição de Judas, a negação de Pedro. Estão tristes e acabrunhados. Consola-os e anuncia-lhes que voltará.
    Temos também as nossas tristezas: A ausência de Nosso Senhor que por vezes deixa a nossa alma na obscuridade e na aridez, - os nossos pecados passados, que se representam à nossa memória. - O perigo contínuo de pecar e a nossa fraqueza, que nos é conhecida, - os escândalos que reinam no mundo, - as mágoas e provações desta vida.
    Suportemos estas provas com coragem. Os filhos de Deus guardam a serenidade nas suas mágoas. Oferecem-nas a Deus, unem-nas aos sofrimentos do Coração de Jesus, e tornam-se-lhes leves. Oferecem-nas para a reparação, pela expiação dos seus pecados e dos do mundo. Se são fervorosos, vão até ao ponto de se alegrarem levando a cruz com Jesus.
    «A vossa tristeza mudar-se-á em alegria». - Esta promessa devia ter cumprimento próximo para os apóstolos. Três dias, e eles veriam Jesus ressuscitado. Poderiam apalpar as feridas das suas mãos e do seu coração. Vê-lo-iam muitas vezes durante quarenta dias. Depois um outro consolador viria enchê-los de uma alegria sobrenatural, de uma alegria que ultrapassa todas as deste mundo, é o Espírito Santo, o grande dom do Coração de Jesus. E alguns anos mais tarde seria o triunfo do martírio e a entrada triunfal no céu.
    Para nós também, a alegria sucederá à tristeza. A tristeza das nossas almas culpadas apaga-se, quando nós quisermos, pelo arrependimento e pela penitência. A tristeza da aridez e da provação passa bastante rapidamente; Jesus não estava longe e volta.
    Há uma santa tristeza, a que vem de um coração penitente; esta é acompanhada por uma real doçura que nos faz conhecer que Deus é o seu autor.
    O mesmo se passa com aquela que tem por causa os pecados do mundo. Esta tristeza é agradável a Deus o qual no-la inspira.
    A tristeza que vem do sofrimento, da doença ou dos acidentes da vida é de ordem natural, mas pode ser santificada pela virtude da paciência e do sacrifício.
    A tristeza do mundo, pelo contrário, não tem remédio, e a sua alegria não é sã. O mundo alegra-se com os prazeres maus e a sua alegria termina na amargura.
    Senhor, mudai a minha tristeza em alegria pelo dom do arrependimento, do sacrifício, do espírito de imolação e de reparação. (Leão Dehon, OSP 4, p. 466s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «A vossa tristeza há-de converter-se em alegria!» (Jo 16, 20).

  • 6ª Semana - Sábado - Páscoa

    6ª Semana - Sábado - Páscoa

    11 de Maio, 2024

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 18, 23-28

    23Depois de ter passado algum tempo em Antioquia, Paulo voltou a partir e percorreu sucessivamente a Galácia e a Frígia, fortalecendo todos os discípulos. 24Entretanto, chegara a Éfeso um judeu chamado Apolo, natural de Alexandria, homem eloquente e muito versado nas Escrituras. 25Fora instruído na «Via» do Senhor e, com o espírito cheio de fervor, pregava e ensinava com precisão o que dizia respeito a Jesus, embora só conhecesse o baptismo de João. 26Começou a falar desassombradamente na sinagoga. Priscila e Áquila, que o tinham ouvido, tomaram- no consigo e expuseram-lhe, com mais precisão, a «Via» do Senhor. 27Como ele queria partir para a Acaia, os irmãos encorajaram-no e escreveram aos discípulos, para que o recebessem amigavelmente. Quando lá chegou, pela graça de Deus, prestou grande auxílio aos fiéis; 28pois refutava energicamente os judeus, em público, demonstrando pelas Escrituras que Jesus era o Messias.

    Paulo prossegue a sua viagem missionária pela Galácia e pela Frigia. Os seus companheiros, Priscila e Áquila, ficam em Éfeso, onde conhecem Apolo, notável pregador, teólogo e missionário que, todavia, não tinha uma boa formação cristã. A sua pregação sobre Jesus era incompleta. E é o casal amigo de Paulo que lhe expõe «com mais precisão, a «Via» do Senhor» (v. 26). É interessante esta intervenção de dois leigos, em relação a um teólogo missionário com a envergadura de Apolo. Toda a Igreja participa na obra da evangelização, cada um com os seus limites, mas sempre com o apoio e as achegas dos irmãos. Apolo, uma vez «actualizado» vai dar um contributo notável para o enraizamento da fé na Grécia.

    Evangelho: Jo 16, 23b-28

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 23Nesse dia, já não me perguntareis nada. Em verdade, em verdade vos digo: se pedirdes alguma coisa ao Pai em meu nome, Ele vo-la dará. 24Até agora não pedistes nada em meu nome; pedi e recebereis. Assim, a vossa alegria será completa.» 25«Até aqui falei-vos por meio de comparações. Está a chegar a hora em que já não vos falarei por comparações, mas claramente vos darei a conhecer o que se refere ao Pai. 26Nesse dia, apresentareis em meu nome os vossos pedidos ao Pai, e não vos digo que rogarei por vós ao Pai, 27pois é o próprio Pai que vos ama, porque vós já me tendes amor e já credes que Eu saí de Deus. 28Saí do Pai e vim ao mundo; agora deixo o mundo e vou para o Pai.»

    Os discípulos não estavam acostumados a rezar em nome de Jesus (v. 24). A vinda do Espírito Santo inaugura um tempo novo no qual poderão dirigir-se ao Pai em nome de Jesus, porque o seu Senhor, em força da sua passagem para o Pai, se tornou verdadeiro mediador entre Deus e os homens.
    Depois, Jesus lança um olhar ao passado, para dizer que se serviu de palavras e imagens, que encerravam um significado profundo, que nem sempre os discípulos podiam compreender. Mas, de futuro, depois da páscoa, as suas palavras serão compreendidas e atingirão o íntimo dos corações, graças à intervenção do Espírito Santo.
    A oração será o «lugar» onde os discípulos conhecerão a relação profunda que existe entre Jesus e o Pai, e de Jesus e do Pai com eles. O perfeito entendimento no amor e na fé com Jesus, fará com que a oração dos discípulos seja feita de modo conveniente e, por isso, aceite pelo Pai.

    Meditatio

    «Pedi e recebereis... a vossa alegria será completa». Estas palavras de Jesus mostram-nos o seu amor por nós. Ele está disposto a dar-nos tudo o que desejamos. Só temos que apresentar os nossos pedidos ao Pai, em seu nome. E garante-nos que Pai nos ama, porque nós amamos a Ele, Jesus, e acreditamos que Ele saiu de Deus (cf. v. 27).
    «Saí do Pai e vim ao mundo; agora deixo o mundo e vou para o Pai», afirma Jesus (v. 28).
    Jesus volta para o Pai, levando-nos com Ele. Assim, a nossa oração de súplica é uma entrada no amor recíproco do Pai e do Filho. O que pedimos ao Pai é-nos concedido em nome do Filho. E nós devemos pedir em nome do Filho, porque Ele está junto do Pai, vivo a interceder por nós. O Pai escuta-nos, mas também o Filho nos escuta: «O que me pedirdes, Eu o farei». Estamos envolvidos no amor do Pai e do Filho. É essa a nossa alegria.
    Esta página de João provoca-me: porque alcanço tão pouco? Porque sou tão pouco eficaz? Porque é que a minha alegria é tão raramente plena? Mais: como é que o mistério da união do Filho com o Pai me atrai tão pouco? Como é que sinto tão pouco o poder de Deus na minha acção? Não estarão os meus olhos demasiadamente voltados para a realidade deste mundo e pouco voltados para o mistério de Deus, para o amor do Pai para com o Filho e do Filho para com os discípulos? O olhar para o mundo é certamente necessário; mas não me ajudará a salvá-lo, se não o olhar com os olhos e com o coração do Pai que deu o Filho para salvar o mundo e quer envolver-nos nessa aventura decisiva. O olhar de Deus levar-me-á a ver as necessidades muitas vezes escondidas das pessoas e a encontrar, para elas, não só remédio humano, mas também remédio divino, a alegria completa de lhes apresentar o amor que tudo redime.
    A oração perene tem a sua fonte na oração de intimidade, que é a experiência pessoal do amor de Deus: sentir-se amados e possuídos por Ele. É a oração contemplativa. E se o meu problema central fosse um défice de contemplação? A amorosa contemplação das relações intra-trinitárias, e a contemplação do mistério de Cristo, particularmente do seu Lado aberto e do seu Coração trespassado, é para nós um chamamento à confiança, ao abandono, à oblação. Ao mesmo tempo, é uma poderosa fonte de força para o nosso apostolado. Contemplando o amor oblativo de Deus, sentimo-nos estimulados a vivê-lo, não só na relação com Deus, mas também na relação com os nossos irmãos.

    Oratio

    Ó Jesus: Tu ensinas-me a pedir em teu nome, a fazer minha a tua causa, a ver o mundo com os teus olhos, e dar-me como Tu te deste ao Pai pelos homens. Como estou longe de tudo isso! É por essa razão que tantas vezes me sinto desiludido na minha oração, e desanimo no meu apostolado e no serviço aos meus irmãos.
    Olha, Jesus, com piedade, as minhas veleidades em Te servir. Vem ao encontro das minhas ilusórias esperanças de gratificação. Ampara-me, purifica-me.

    Dá-me um coração semelhante ao teu. Dá-me o impulso desinteressado do teu amor. Ajuda-me a amar Contigo e como Tu. Amen.

    Contemplatio

    O encorajamento à oração é um dos primeiros ensinamentos do Sermão da montanha.
    Nosso Senhor rezava muito. Juntava o exemplo às suas exortações. Retirava-se para a solidão para rezar. Passava lá muitas vezes a noite. Passou quarenta dias no deserto a rezar.
    Rezava por nós; rezava também para nos dar o exemplo da oração. Muitas vezes recomendava-a aos seus discípulos. Dizia-lhes como é preciso rezar sempre e sem cessar.
    A fim de lhes mostrar como a perseverança na oração é eficaz para obter o que se pede, propunha-lhes a parábola do juiz e da viúva.
    A pobre viúva viera várias vezes pedir justiça, mas em vão. No fim, o juiz diz para consigo mesmo: «Se bem que eu não queira saber nem de Deus nem dos homens, porque esta viúva me importuna, vou fazer-lhe justiça, com receio que no fim ela não venha fazer-me alguma afronta».
    Pensais, acrescentava o Salvador, que Deus não fará justiça aos seus eleitos que clamam para Ele de dia e de noite?
    Propunha-lhes também este outro exemplo do amigo o qual pela sua importunidade pede ao seu amigo que lhe empreste os pães de que tem necessidade (Lc 11).
    Encorajava a sua confiança dizendo-lhe: «Pedi e recebereis» (Leão Dehon, OSP 3, p. 69).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Pedi e recebereis... a vossa alegria será completa». (Jo 16, 24).

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