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  • 03º Domingo do Tempo da Quaresma - Ano B [atualizado]

    03º Domingo do Tempo da Quaresma - Ano B [atualizado]

    3 de Março, 2024

    ANO B

    3.º DOMINGO DA QUARESMA

    Tema do 3.º Domingo da Quaresma

    No 3.º Domingo da Quaresma, a Palavra de Deus desenha-nos o mapa do caminho que conduz à Vida nova, à salvação. Recomenda-nos que, ao longo de todo o percurso, não percamos Jesus de vista: é Ele o guia que nos ajuda a interpretar o mapa e que nos leva ao encontro do Pai.

    Na primeira leitura, Deus oferece-nos um conjunto de indicações (“mandamentos”) que devem balizar o nosso itinerário de todos os dias. Com a sua iniciativa, Deus não quer limitar a nossa liberdade, mas sim ajudar-nos a chegar à Vida verdadeira.

    Na segunda leitura, o apóstolo Paulo sugere-nos uma conversão à “loucura de Deus”. Convida-nos a olhar para a cruz e a descobrir, na entrega do Crucificado, que só o amor dado até ao extremo gera Vida e salvação. Na cruz revela-se a paradoxal “sabedoria de Deus”, que Paulo nos convida a abraçar.

    No Evangelho, Jesus apresenta-Se como “o Templo Novo” onde Deus reside e onde marca encontro com os homens para lhes oferecer a sua Vida e a sua salvação. Quem quiser encontrar Deus deve aproximar-se de Jesus, tornar-se seu discípulo, abraçar o seu projeto, seguir os seus passos, viver animado pelo seu Espírito.

     

    LEITURA I – Êxodo 20,1-17

    Naqueles dias, Deus pronunciou todas estas palavras:
    «Eu sou o senhor teu Deus,
    que te tirei da terra do Egipto, dessa casa da escravidão.
    Não terás outros deuses perante Mim.
    Não farás para ti qualquer imagem esculpida,
    nem figura do que já existe lá no alto dos céus
    ou cá em baixo na terra ou nas águas debaixo da terra.
    Não adorarás outros deuses nem lhes prestarás culto.
    Eu, o senhor teu Deus, sou um Deus cioso:
    castigo a ofensa dos pais nos filhos
    até à terceira e quarta geração daqueles que Me ofendem;
    mas uso de misericórdia até à milésima geração
    para com aqueles que Me amam
    e guardam os meus mandamentos.
    Não invocarás em vão o nome do Senhor teu Deus,
    porque o Senhor não deixa sem castigo
    aquele que invoca o seu nome em vão.
    Lembrar-te-ás do dia de sábado, para o santificares.
    Durante seis dias trabalharás
    e levarás a cabo todas as tuas tarefas.
    Mas o sétimo dia é o sábado do Senhor teu Deus.
    Não farás nenhum trabalho,
    nem tu, nem o teu filho, nem a tua filha,
    nem o teu servo nem a tua serva,
    nem os teus animais domésticos,
    nem o estrangeiro que vive na tua cidade.
    Porque em seis dias
    o Senhor fez o céu, a terra, o mar e tudo o que eles contêm;
    mas no sétimo dia descansou.
    Por isso, o Senhor abençoou e consagrou o dia de sábado.
    Honra pai e mãe,
    a fim de prolongares os teus dias
    na terra que o Senhor teu Deus te vai dar.
    Não matarás.
    Não cometerás adultério.
    Não furtarás.
    Não levantarás falso testemunho contra o teu próximo.
    Não cobiçarás a casa do teu próximo;
    não desejarás a mulher do teu próximo,
    nem o seu servo nem a sua serva, o seu boi ou o seu jumento,
    nem coisa alguma que lhe pertença».

     

    CONTEXTO

    O texto que hoje nos é proposto como primeira leitura faz parte de um conjunto de tradições sobre uma Aliança entre Deus e os hebreus libertados da escravidão do Egito (cf. Ex 19-40). De acordo com o livro do Êxodo, essa Aliança teria sido celebrada num monte, algures no deserto do Sinai, o mesmo monte onde Javé se tinha revelado a Moisés.

    No texto bíblico não há indicações geográficas suficientes para conseguirmos identificar o “monte da Aliança”. Em si, o nome “Sinai” designa uma enorme península de forma triangular, com mais ou menos 420 quilómetros de extensão norte/sul, estendendo-se entre o Mediterrâneo e o Mar Vermelho. A norte, junto do Mediterrâneo, o Sinai apresenta uma faixa arenosa de cerca de 25 quilómetros de largura; mas à medida que se desce para sul, o território torna-se mais acidentado, com montanhas que chegam a atingir 2400 metros de altura. A península inteira é um deserto árido; não há, praticamente, vegetação (excepto em alguns pequenos oásis) e as comunicações são difíceis. Nesta enorme extensão de areia e rochas, é difícil situar o “monte da Aliança”. Contudo, uma tradição cristã tardia (séc. IV) identifica o “monte” com o Jebel Musa (o “monte de Moisés”), um monte com 2244 metros de altitude, situado a sul da península sinaítica. Embora a identificação do “monte da Aliança” com este lugar levante problemas, o Jebel Musa é, ainda hoje, um lugar de peregrinação para judeus e cristãos.

    A Aliança entre Javé e Israel, celebrada no Sinai, vai ser apresentada pelos catequistas de Israel através de uma estrutura literária que é muito semelhante aos formulários jurídicos conhecidos no mundo antigo para apresentar os acordos políticos entre duas partes, nomeadamente entre um “senhor” e o seu “vassalo”. Nesses formulários, depois de recordar ao “vassalo” a sua ação, a sua generosidade, os seus benefícios, o “senhor” apresentava as “cláusulas da Aliança” – isto é, a lista das obrigações que o “vassalo” assumia para com o seu “senhor” (obrigações que o “vassalo” devia cumprir fielmente).

    De entre as “cláusulas da Aliança” do Sinai, sobressai um bloco especial, onde são apresentadas as dez obrigações fundamentais que Israel vai assumir diante do seu Deus: os “dez mandamentos” ou as “dez palavras”. É esse texto que a primeira leitura deste domingo nos apresenta. Aí está, verdadeiramente, o coração da Aliança; aí se define o caminho que Israel deve percorrer para ser o Povo de Deus.

    A lista dos “dez mandamentos” é uma lista irregular, com mandamentos enunciados com brevidade e secura, sem nenhuma justificação (“não matarás”; não roubarás”) e outros mais desenvolvidos, contendo um comentário explicativo (cf. Ex 20,4.17), uma motivação (cf. Ex 20,7) ou uma promessa (cf. Ex 20,12). Por vezes Deus fala em primeira pessoa (cf. Ex 20,2.5-6); noutras, fala-se de Deus em terceira pessoa (cf. Ex 20,7.11.12). Dois mandamentos são formulados positivamente (cf. Ex 20,8: “lembra-te”; Ex 20,12: “honra”); todos os outros são formulados negativamente (“não matarás”; “não roubarás”). Estas irregularidades significam que o “decálogo” sofreu, através dos séculos, por motivos pastorais e catequéticos, retoques, acrescentos, comentários, modificações.

    É bastante provável que Moisés tenha uma certa relação com estas leis que estão no centro da Aliança entre Deus e o seu Povo; mas o texto, na sua forma atual, não vem de Moisés. É, certamente, um texto muito trabalhado, que sofreu muitas elaborações ao longo dos séculos. Ainda que esta lista de preceitos possa lembrar algumas listas de proibições encontradas na Babilónia e no Egipto, ocupa um lugar à parte no conjunto dos formulários legais dos povos do Crescente Fértil: é um núcleo legal sóbrio e equilibrado, despojado de tudo aquilo que nos outros povos é magia, superstição ou “tabu”.

     

    MENSAGEM

    O “decálogo” abarca os dois vetores fundamentais da existência humana: a relação da pessoa com Deus e a relação que cada pessoa estabelece com o seu próximo.

    Os primeiros quatro mandamentos dizem respeito à relação que Israel deve estabelecer com Deus (vers. 3-11). Dois, sobretudo, são de uma grande originalidade (o mandamento que obriga Israel a não ter outro Deus; e o mandamento que proíbe construir imagens de Deus), pois não encontram paralelo em nenhuma das religiões antigas que conhecemos.

    A questão essencial que sobressai, nestes quatro mandamentos, é esta: Javé deve ser a referência fundamental da vida do Povo, o centro à volta do qual se constrói toda a existência de Israel. Nada nem ninguém deve ocupar, no coração do Povo, o lugar que só a Deus pertence. É preciso que Israel reconheça que só em Javé está a vida e a salvação (vers. 3: “não terás nenhum deus além de mim”); é necessário que Israel reconheça a absoluta transcendência de Javé – que não pode ser reproduzida em qualquer criatura feita pelo homem – e não se prostre perante obras criadas pela mão do homem (vers. 4: “não farás para ti qualquer imagem esculpida… não hás de prostrar-te diante delas, nem prestar-lhes culto”); é preciso que Israel reconheça que não deve manipular Deus e usá-l’O em apoio de projetos e interesses puramente humanos (vers. 7: “não hás-de invocar o nome do Senhor teu Deus em apoio do que não tem fundamento”); é preciso que Israel reconheça que só o Senhor é o dono do tempo e que reserve espaço para o encontro e o louvor do Senhor (vers. 8: “hás de lembrar-te do dia de sábado, a fim de o santificares”).

    Os outros seis mandamentos dizem respeito às relações comunitárias (vers. 12-17). Procuram inculcar o respeito absoluto pelo próximo – a sua vida, os seus direitos na comunidade, os seus bens. São “a magna carta da liberdade, da justiça, do respeito pela pessoa e pela sua dignidade”. Recomendam que cada membro da comunidade reconheça a sua dependência dos outros e aceite a sua vinculação a uma família e a uma cultura (vers. 12: “honra teu pai e tua mãe”); pedem que cada membro do Povo de Deus respeite a vida do irmão (vers. 13: “não matarás”); recomendam que seja defendida a família e respeitadas as relações familiares (vers. 14: “não cometerás adultério”); exigem que se respeite absolutamente quer os bens, quer a própria liberdade dos outros membros da comunidade (vers. 15: “não tomarás para ti” – o que pode referir-se a pessoas ou a coisas. Pode traduzir-se por “não roubarás”, mas também por “não privarás de liberdade o teu irmão, não o reduzirás à escravidão”); pedem o respeito pelo bom nome e pela fama do irmão, nomeadamente dando sempre um testemunho verdadeiro diante do tribunal e garantindo a fiabilidade de uma justiça que é a base da correta ordem social (vers. 16: “não levantarás falso testemunho contra o teu próximo”); exigem o respeito pelos “bens básicos” que asseguram ao irmão a sua subsistência e procuram evitar que o coração dos membros da comunidade do Povo de Deus seja dominado pela cobiça e pelos instintos egoístas (vers. 17: “não cobiçarás a casa do teu próximo, não desejarás a mulher dele, nem o criado ou a criada, o boi ou o jumento, nem coisa alguma que lhe pertença”).

    Porque é que Deus apresentou estas propostas a Israel e lhe recomendou este caminho? Qual o interesse de Deus em que Israel viva de acordo com as regras aqui apresentadas? O que é que Deus “tem a ganhar” com a fidelidade do Povo a estas normas?

    A resposta está na primeira afirmação do Decálogo: “Eu sou o Senhor, teu Deus, que te fiz sair da terra do Egipto, da casa da servidão” (vers. 2). Deus, contra todas as expetativas, amou Israel e elegeu-o como o seu Povo especial; por isso, ao vê-lo em grande sofrimento, libertou-o da opressão em que ele vivia no Egito. Mas o amor de Deus não se limitou a essa iniciativa libertadora, mas prolonga-se agora no tempo e na história: Deus quer continuar a ajudar o seu Povo a caminhar livre e feliz. Os “mandamentos” são, precisamente, um contributo de Deus nesse sentido. Pretendem ajudar Israel a não cultivar a escravidão do egoísmo, da autossuficiência, da injustiça, das paixões, da cobiça, da exploração, daquilo que destrói a coesão comunitária e gera opressão e morte; pretendem “dar pistas” para que a comunidade israelita seja uma comunidade fraterna, solidária, livre, onde os direitos e a dignidade de todos são respeitados; pretendem ajudar o Povo de Deus a viver como Povo “consagrado” ao Senhor, dando testemunho da santidade de Deus no mundo e na história.

    Israel responderá ao amor de Deus, assim manifestado, vivendo no respeito pelas indicações e mandamentos de Javé.

     

    INTERPELAÇÕES

    • Os mandamentos do Decálogo que se referem à relação do homem com Deus sublinham a centralidade que Deus deve assumir no coração e na vida dos seus filhos. No entanto, nem sempre Deus tem lugar determinante na vida dos homens e mulheres do nosso tempo… Para muitos dos nossos contemporâneos, Deus é uma realidade que os deixa indiferentes. Não aquece nem arrefece; não conta para nada. O que os move é o dinheiro, o poder, os afetos humanos, a realização profissional, o reconhecimento social, os projetos pessoais, as ideologias, os valores da moda, as coisas materiais que tornam a vida mais cómoda e mais fácil. Esta opção, no entanto, mais cedo ou mais tarde, vai trazer vazio, insatisfação, frustração e desencanto. Não podemos sufocar indefinidamente essa sede de infinito que está viva no mais profundo do nosso ser. Por outro lado, quando optamos por prescindir de Deus e escolher caminhos de autossuficiência, acabamos facilmente por privilegiar soluções egoístas, que geram sofrimento e infelicidade para nós e para aqueles que caminham ao nosso lado… Neste tempo de Quaresma, interroguemo-nos: que lugar ocupa Deus na nossa vida? Há na nossa vida “deuses” que ocuparam o lugar de Deus e que condicionam as nossas tomadas de posição e as nossas opções?
    • Os mandamentos do Decálogo que se referem à forma de tratarmos os nossos irmãos convidam-nos a banir das nossas relações qualquer tipo de violência, de egoísmo, de agressividade, de cobiça, de intolerância, de escravidão, de indiferença. Dizem-nos que tudo aquilo que atenta contra a vida, a dignidade e os direitos daqueles que caminham ao nosso lado subverte o projeto de Deus para o mundo e para os homens. Contudo, todos os dias vemos multiplicarem-se no nosso mundo as situações de injustiça, de violência e de maldade que mergulham milhões de homens e mulheres numa noite sem saída e sem esperança. O que podemos fazer para que os valores de Deus prevaleçam sobre a maldade dos homens? O que é que, nos nossos gestos, nas nossas atitudes, nos nossos valores, é gerador de injustiça, de sofrimento, de exploração, de escravidão, de morte, para nós e para todos aqueles que nos rodeiam?
    • Há quem considere os “mandamentos” propostas de uma moral obsoleta e antiquada, fórmulas inventadas pela religião e destinadas a impor aos crentes comportamentos religiosamente corretos, ou até mesmo diretrizes para limitar a nossa liberdade e autonomia… No entanto, para aqueles que têm Deus como referência, os “mandamentos” são indicações de Deus para sermos mais felizes e para construirmos um mundo mais humano, mais fraterno, mais solidário. Não são uma prisão, mas uma porta para a verdadeira liberdade. Como é que eu vejo e acolho essas indicações de Deus? Levo-as a sério e aceito que elas definam as fronteiras do meu caminho?

     

    SALMO RESPONSORIAL – Salmo 18 (19)

    Refrão: Senhor, Vós tendes palavras de vida eterna.

     

    A lei do Senhor é perfeita,
    ela reconforta a alma;
    as ordens do Senhor são firmes,
    dão sabedoria aos simples.

    Os preceitos do Senhor são retos
    e alegram o coração
    os mandamentos do Senhor são claros
    e iluminam os olhos.

    O temor do senhor é puro
    e permanece para sempre;
    os juízos do Senhor são verdadeiros,
    todos eles são retos.

    São mais preciosos que o ouro,
    o ouro mais fino;
    são mais doces que o mel,
    o puro mel dos favos.

     

    LEITURA II – 1 Coríntios 1,22-25

    Irmãos:
    Os judeus pedem milagres
    e os gregos procuram a sabedoria.
    Quanto a nós, pregamos Cristo crucificado,
    escândalo para os judeus e loucura para os gentios;
    mas para aqueles que são chamados,
    tanto judeus como gregos,
    Cristo é poder e sabedoria de Deus.
    Pois o que é loucura de Deus
    é mais sábio do que os homens
    e o que é fraqueza de Deus
    é mais forte do que os homens.

     

    CONTEXTO

    No decurso da sua segunda viagem missionária, Paulo chegou a Corinto, depois de atravessar boa parte da Grécia, e ficou por lá cerca de 18 meses (anos 50-52). Como resultado da pregação de Paulo, nasceu a comunidade cristã de Corinto. De uma forma geral, a comunidade era viva, fervorosa e empenhada; no entanto, não era imune aos valores da cultura ambiente, que nem sempre coincidiam com os valores de evangelho de Jesus.

    Em Corinto, cidade cosmopolita e com pretensões culturais, estavam representadas todas as escolas filosóficas da Grécia antiga. Cada uma delas contava com os seus mestres e os seus fiéis adeptos. As rivalidades entre mestres e escolas traduziam-se, frequentemente, em conflitos e divisões que, extravasando para as ruas da cidade, punham em causa a coesão e a paz social. Ora, os cristãos de Corinto transplantaram para a vida da comunidade cristã esses modelos. Viam determinadas figuras proeminentes do cristianismo como mestres de uma doutrina e aderiam a essas figuras, esperando encontrar nelas uma proposta filosófica credível, que os conduzisse à plenitude da sabedoria e da realização humana. É de crer que os adeptos desses vários mestres se confrontassem na comunidade, procurando demonstrar a excelência e a superior sabedoria da sua figura de referência. Paulo soube isto no decurso da sua terceira viagem missionária, quando estava em Éfeso (por volta do ano 56). Tomou então a decisão de escrever aos coríntios avisando-os de que isto era bastante grave, pois punha em causa a unidade da fé. A reflexão de Paulo sobre esta questão aparece em 1 Co 1,10-4,21.

    Na sua reflexão, Paulo vai demonstrar aos coríntios que entre os cristãos não há senão um mestre, que é Jesus Cristo; e a experiência cristã não é a busca de uma filosofia coerente, brilhante, elegante, que conduza à sabedoria, entendida à maneira dos gregos. Quem procura na mensagem cristã um sistema lógico, coerente, inquestionável à luz da lógica humana, é porque não percebeu nada do Evangelho e do dinamismo da salvação. O texto da segunda leitura deste terceiro domingo da Quaresma deve ser enquadrado neste cenário.

     

    MENSAGEM

    Paulo não foi enviado aos coríntios a propor uma sabedoria humana, exposta com o brilho das belas palavras ou com a coerência de um sistema filosófico bem elaborado. Paulo recebeu a missão de anunciar Cristo crucificado.

    Ora, esse anúncio é algo inaudito. Humanamente falando, não tem nada de belo e sedutor. A cruz era o instrumento de suplício para os últimos da sociedade, para os cidadãos sem direitos e sem dignidade. Causava horror e significava infâmia. Mas Paulo vê na cruz onde Cristo foi morto a manifestação, humanamente desconcertante, mas absoluta e categórica, da força salvadora de Deus.

    Tudo isto parece, efetivamente, um contrassenso. A notícia de um Messias crucificado é “escândalo para os judeus e loucura para os gentios” (vers. 23). Os judeus esperavam que Deus manifestasse o seu poder salvador através de intervenções espetaculares, de gestos poderosos que deixassem toda a gente desconcertada; mas Deus apresentou-Se como um derrotado, como um condenado a uma morte aviltante. Os gregos, por sua vez, estariam disponíveis para aceitar um Deus que se impusesse pela sabedoria, pela sedução das belas palavras, pelo brilho de um sistema de pensamento que oferecesse resposta definitivas sobre o sentido da vida. Mas Deus falou-lhes com a linguagem ilógica e desconcertante da cruz.

    Paulo afirma, no entanto, que a “sabedoria do mundo” é vã, vazia, ineficaz e incapaz de oferecer ao homem a sua realização plena; e, em contrapartida, garante que a “sabedoria de Deus” é fonte de salvação e de Vida verdadeira. Na cruz manifestou-se a força de um Deus que salva pelo amor. O homem que olha para a cruz de Jesus percebe a lição do amor até ao extremo e dispõe-se a seguir o caminho de Jesus, encontra a verdadeira sabedoria, a sabedoria proposta por Deus.

     

    INTERPELAÇÕES

    • Andamos há dois mil anos a olhar para a cruz e a meditar naquilo a que Paulo chamou “a loucura de Deus”. No entanto, ainda não interiorizamos plenamente a lógica de Deus. Ainda achamos que a nossa plena realização passa pela acumulação de bens materiais, pelos triunfos humanos, pelas conquistas da ciência ou da técnica, pela força das ideologias, pelas palavras sedutoras dos nossos líderes, pelos aplausos daqueles que viajam connosco… Usamos a cruz como enfeite ou como distintivo de um grupo religioso, mas esquecemo-nos do crucificado e de tudo aquilo que Ele nos disse ao entregar a vida até à morte, por amor. Talvez esta Quaresma seja uma oportunidade para nos aproximarmos de Jesus, para irmos com Ele, para aprendermos com Ele que só o amor salva; talvez este caminho de Quaresma que estamos a percorrer nos ajude a libertar do orgulho, da vaidade, da autossuficiência, dos valores estéreis, para acolhermos a sabedoria de Deus e para fazermos da nossa vida um dom de amor a Deus e aos nossos irmãos, particularmente aos mais frágeis e esquecidos… Estamos conscientes que é na sabedoria de Deus, expressa no amor e na entrega do Crucificado, que está a nossa realização plena, a nossa salvação?
    • Segundo Paulo, a força e a sabedoria de Deus manifestam-se na fragilidade, na pequenez, na pobreza, na humildade, na vida entregue por amor… Sendo assim, não nos parecem ridículas, descabidas e pretensiosas as nossas poses de importância, de autoridade, de protagonismo, de êxito humano, que tantas vezes magoam e humilham os irmãos e irmãs com quem nos cruzamos?
    • Paulo, enquanto testemunha de Jesus, recusa-se a “dourar a pílula” e a suavizar as exigências do Evangelho. Ele prega “Cristo crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os gentios”. Nós, discípulos de Jesus, que temos a responsabilidade de anunciar o Evangelho, fazemo-lo com verdade e radicalidade, renunciando à tentação de suavizar a Palavra, de a tornar menos radical e interpelativa? Às vezes o invólucro “brilhante” com que envolvemos a Palavra pode torná-la mais atrativa, mas também menos questionante e, portanto, menos transformadora.

     

    ACLAMAÇÃO ANTES DO EVANGELHO – Jo 3,16

    (escolher um dos 7 refrães)

    1. Louvor e glória a Vós, Jesus Cristo, Senhor.
    2. Glória a Vós, Jesus Cristo, Sabedoria do Pai.
    3. Glória a Vós, Jesus Cristo, Palavra do Pai.
    4. Glória a Vós, Senhor, Filho do Deus vivo.
    5. Louvor a Vós, Jesus Cristo, Rei da eterna glória.
    6. Grandes e admiráveis são as vossas obras, Senhor.
    7. A salvação, a glória e o poder a Jesus Cristo, Nosso Senhor.

     

    Deus amou tanto o mundo que lhe deu o seu Filho Unigénito;
    quem acredita n’Ele tem a vida eterna.

     

    EVANGELHO – João 2, 13-25

    Estava próxima a Páscoa dos judeus
    e Jesus subiu a Jerusalém.
    Encontrou no templo
    os vendedores de bois, de ovelhas e de pombas
    e os cambistas sentados às bancas.
    Fez então um chicote de cordas
    e expulsou-os a todos do templo, com as ovelhas e os bois;
    deitou por terra o dinheiro dos cambistas
    e derrubou-lhes as mesas;
    e disse aos que vendiam pombas:
    «Tirai tudo isto daqui;
    não façais da casa de meu Pai casa de comércio».
    Os discípulos recordaram-se do que estava escrito:
    «Devora-me o zelo pela tua casa».
    Então os judeus tomaram a palavra e perguntaram-Lhe:
    «Que sinal nos dás de que podes proceder deste modo?»
    Jesus respondeu-lhes:
    «Destruí este templo e em três dias o levantarei».
    Disseram os judeus:
    «Foram precisos quarenta e seis anos para se construir este templo
    e Tu vais levantá-lo em três dias?»
    Jesus, porém, falava do templo do seu corpo.
    Por isso, quando Ele ressuscitou dos mortos,
    os discípulos lembraram-se do que tinha dito
    e acreditaram na Escritura e nas palavras que Jesus dissera.
    Enquanto Jesus permaneceu em Jerusalém pela festa da Páscoa,
    muitos, ao verem os milagres que fazia,
    acreditaram no seu nome.
    Mas Jesus não se fiava deles, porque os conhecia a todos
    e não precisava de que Lhe dessem informações sobre ninguém:
    Ele bem sabia o que há no homem.

     

    CONTEXTO

    O evangelho deste terceiro domingo da Quaresma integra a secção introdutória do Evangelho de João (cf. Jo 1,19-3,36). É nessa secção que João nos apresenta Jesus e as grandes linhas programáticas do seu ministério.

    O episódio decorre no Templo de Jerusalém. Trata-se do majestoso Templo construído pelo rei Herodes para “comprar” a benevolência dos judeus. A construção do Templo herodiano iniciou-se em 19 a.C. e ficou essencialmente pronta no ano 9 d.C. (embora os trabalhos só tivessem sido concluídos em 63 d.C.). No ano 27 d.C., efetivamente, o Templo estava a ser construído há 46 anos e ainda não estava terminado, conforme a observação que os dirigentes judeus fizeram a Jesus (cf. Jo 2,20).

    João situa o episódio nos dias que antecedem a festa da Páscoa. Era a época em que as grandes multidões se concentravam em Jerusalém para celebrar a festa principal do calendário religioso judaico. Jerusalém, que normalmente teria à volta de 55.000 habitantes, chegava a albergar cerca de 125.000 peregrinos nesta altura. No Templo sacrificavam-se cerca de 18.000 cordeiros, destinados à celebração pascal.

    Neste ambiente, o comércio relacionado com o Templo sofria um enorme incremento. Três semanas antes da Páscoa, começava a emissão de licenças para a instalação dos postos comerciais à volta do Templo. O dinheiro arrecadado com a emissão dessas licenças revertia para o sumo-sacerdote. Havia tendas de venda que pertenciam, diretamente, à família do sumo-sacerdote. Vendiam-se os animais para os sacrifícios e vários outros produtos destinados à liturgia do Templo. Havia também as tendas dos cambistas que trocavam as moedas romanas correntes por moedas judaicas (os tributos dos fiéis para o Templo eram pagos em moeda judaica, pois não era permitido que moedas com a efígie de imperadores pagãos conspurcassem o tesouro do Templo). Este comércio constituía uma mais-valia para a cidade e sustentava a nobreza sacerdotal, o clero e os empregados do Templo.

    Vai ser neste contexto que Jesus vai realizar o seu gesto profético.

     

    MENSAGEM

    Os profetas de Israel tinham, em diversas situações, criticado o culto sacrificial que Israel oferecia a Deus, considerando-o como um conjunto de ritos estéreis, vazios e sem significado, uma vez que não eram expressão verdadeira de amor a Javé; tinham, inclusive, denunciado a relação do culto com a injustiça e a exploração dos pobres (cf. Am 4,4-5; 5,21-25; Os 5,6-7; 8,13; Is 1,11-17; Jr 7,21-26). As considerações proféticas tinham, de alguma forma, consolidado a ideia de que a chegada dos tempos messiânicos implicaria a purificação e a moralização do culto prestado a Javé no Templo. O profeta Zacarias liga explicitamente o “dia do Senhor” (o dia em que Deus vai intervir na história e construir um mundo novo, através do Messias) com a purificação do culto e a eliminação dos comerciantes que estão “no Templo do Senhor do universo” – Zac 14,21).

    O gesto que o Evangelho deste domingo nos relata deve entender-se neste enquadramento. Quando Jesus pega no chicote de cordas, expulsa do Templo os vendedores de ovelhas, de bois e de pombas, deita por terra os trocos dos banqueiros e derruba as mesas dos cambistas (vers. 14-16), está a revelar-Se como “o messias” e a anunciar que chegaram os novos tempos, os tempos messiânicos.

    No entanto, Jesus vai bem mais longe do que os profetas veterotestamentários. Ao expulsar do Templo também as ovelhas e os bois que serviam para os ritos sacrificiais que Israel oferecia a Javé (João é o único dos evangelistas a referir este pormenor), Jesus mostra que não propõe apenas uma reforma, mas a abolição do próprio culto. O culto prestado a Deus no Templo de Jerusalém era, antes de mais, algo sem sentido: ao transformar a casa de Deus num mercado, os líderes judaicos tinham suprimido a presença de Deus… Mas, além disso, o culto celebrado no Templo era algo de nefasto: em nome de Deus esse culto criava exploração, miséria, injustiça e, por isso, em lugar de potenciar a relação do homem com Deus, afastava o homem de Deus. Jesus, o Filho, com a autoridade que Lhe vem do Pai, diz um claro “basta” a uma mentira com a qual Deus não pode continuar a pactuar: “não façais da casa de meu Pai casa de comércio” (vers. 16).

    Os líderes judaicos ficam indignados. Quais são as credenciais de Jesus para assumir uma atitude tão radical e grave? Com que legitimidade é que Ele se arroga o direito de abolir o culto oficial prestado a Javé?

    A resposta de Jesus é, à primeira vista, estranha: “destruí este Templo e Eu o reconstruirei em três dias” (vers. 19). Recorrendo à figura literária do “mal-entendido” (propõe-se uma afirmação; os interlocutores entendem-na de forma errada; aparece, então, a explicação final, que dá o significado exato do que se quer afirmar), João deixa claro que Jesus não Se referia ao Templo de pedra onde Israel celebrava os seus ritos litúrgicos (vers. 20), mas a um outro “Templo” que é o próprio Jesus (“Jesus, porém, falava do Templo do seu corpo” – vers. 21). O que é que isto significa? Jesus desafia os líderes que O questionaram a suprimir o Templo que é Ele próprio, mas deixa claro que, três dias depois, esse Templo estará outra vez erigido no meio dos homens. Jesus alude, evidentemente, à sua ressurreição. A prova de que Jesus tem autoridade para “proceder deste modo” é que os líderes não conseguirão suprimi-l’O. A ressurreição garante que Jesus vem de Deus e que a sua atuação tem o selo de garantia de Deus.

    No entanto, o mais notável, aqui, é que Jesus Se apresenta como o “novo Templo”. O Templo representava, no universo religioso judaico, a residência de Deus, o lugar onde Deus Se revelava e onde Se tornava presente no meio do seu Povo. Jesus é, agora, o lugar onde Deus reside, onde Se encontra com os homens e onde Se manifesta ao mundo. É através de Jesus que o Pai oferece aos homens o seu amor e a sua vida. Aquilo que a antiga Lei já não conseguia fazer – estabelecer relação entre Deus e os homens – é Jesus que, a partir de agora, o faz.

     

    INTERPELAÇÕES

    • Como é que podemos encontrar Deus e chegar até Ele? Como podemos perceber as propostas de Deus e descobrir os seus caminhos? O Evangelho deste domingo responde: é olhando para Jesus. Nas palavras e nos gestos de Jesus, Deus revela-Se aos homens e manifesta-lhes o seu amor, faz-Se companheiro de caminhada dos homens e aponta-lhes caminhos de salvação. Neste tempo de Quaresma – tempo de conversão, de renovação, de caminhada em direção ao Homem Novo – somos convidados a olhar para Jesus, a aproximar-nos dele, a ir atrás dele, a descobrir nas suas indicações, no seu anúncio, no seu “Evangelho” essa proposta de vida nova que Deus nos quer apresentar. É isso que acontece connosco?
    • Jesus é, agora, o Novo Templo onde Deus reside e onde os homens podem encontrar Deus e a sua proposta de salvação. E os cristãos, membros do Corpo de Cristo, são pedras vivas desse Templo. Esta realidade supõe, para os discípulos de Jesus, uma grande responsabilidade… Os homens do nosso tempo têm de ver no rosto dos cristãos o rosto bondoso e terno de Deus; têm de experimentar, nos gestos de partilha, de solidariedade, de serviço, de perdão dos cristãos, a vida nova de Deus; têm de encontrar, na preocupação dos cristãos com a justiça e com a paz, o anúncio desse mundo novo que Deus quer oferecer a todos os homens. Talvez o facto de Deus parecer tão ausente da vida, das preocupações e dos valores dos homens do nosso tempo tenha a ver com a tibieza do nosso testemunho. O nosso testemunho pessoal é um sinal de Deus para os irmãos que caminham ao nosso lado? A vida das nossas comunidades dá testemunho da Vida de Deus? A Igreja – comunidade dos discípulos de Jesus – é essa “casa de Deus” de portas sempre abertas onde qualquer pessoa, sem distinção de raça, de estatuto social, de estado civil, de opção sexual, pode encontrar a proposta de libertação e de salvação que Deus oferece a todos?
    • Qual é o verdadeiro culto que Deus espera? Evidentemente, não são os ritos solenes e pomposos, mas vazios, estéreis e balofos. O culto que Deus aprecia é uma vida vivida na escuta das suas propostas e traduzida em gestos concretos de doação, de entrega, de serviço simples e humilde aos irmãos. Quando somos capazes de sair do nosso comodismo e da nossa autossuficiência para ir ao encontro do pobre, do marginalizado, do estrangeiro, do doente, estamos a dar a resposta “litúrgica” adequada ao amor e à generosidade de Deus para connosco.
    • Ao gesto profético de Jesus, os líderes judaicos respondem com incompreensão e arrogância. Consideram-se os donos da verdade e os únicos intérpretes autênticos da vontade divina. Instalados nas suas certezas e preconceitos, nem sequer admitem que a denúncia que Jesus faz esteja correta. A sua autossuficiência impede-os de ver para além dos seus projetos pessoais e de descobrir os projetos de Deus. Trata-se de uma atitude que, mais uma vez, nos questiona… Estamos conscientes de que, quando nos barricamos atrás de certezas absolutas e de atitudes intransigentes, podemos estar a fechar o nosso coração aos desafios e à novidade de Deus?
    • Como aqueles vendedores e cambistas que transformaram o Templo de Deus numa casa de comércio, também nós podemos, quase sem nos darmos conta, estar a converter toda a nossa vida num negócio, onde tudo é pesado em favor do nosso interesse e do nosso ganho. Até a nossa relação com Deus pode tornar-se uma troca comercial, em que cumprimos os ritos para termos Deus a nosso favor, “pagamos missas” ou “promessas” para obter algum benefício, evitamos o pecado para que Deus não tenha razões para nos condenar… O gesto profético de Jesus no Templo de Jerusalém denuncia o sem sentido de uma vida vivida em registo de ganância e de lucro egoísta; lembra-nos que Deus é amor, amor que não se compra nem vende e que é puro dom; lembra-nos a importância dos gestos gratuitos de amor, da partilha solidária, da fraternidade desinteressada, do dom sem recompensa; lembra-nos que devemos dar testemunho, com a nossa vida, de um Deus que ama os seus filhos – todos – com um amor sem limites e “a fundo perdido”. Estou consciente de tudo isto?

     

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 3.º DOMINGO DA QUARESMA
    (adaptadas, em parte, de “Signes d’aujourd’hui”)

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.

    Ao longo dos dias da semana anterior ao 3º Domingo da Quaresma, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. PALAVRA DE VIDA.

    Jesus vem mudar a maneira de encontrar Deus seu Pai. Até aqui bastava ir ao templo, doravante é preciso escutar a mensagem de amor do seu Enviado e beneficiar dos seus gestos de salvação, sinais da bondade de Jesus para com os homens. Mesmo que se procure destruir o verdadeiro templo de Deus entre os homens, o seu próprio Filho, Ele levantar-se-á. E quando tiver desaparecido aos olhos dos homens, é a sua Igreja que será o novo templo, porque Deus vem morar no meio dos homens. Se os seus discípulos se recordam das palavras e dos gestos de Jesus, é para fazer memória da fidelidade de Deus. É com os olhos da fé que reconheceram, nos sinais realizados por Jesus, a ação de Deus. E se hoje podemos fazer memória da morte e da ressurreição de Cristo, tal acontece graças a todos estes testemunhas que acreditaram e contaram o que tinham visto e ouvido.

    3. À ECUTA DA PALAVRA.

    Imensa vocação de todo o batizado… É no Templo de Jerusalém que Jesus tinha estabelecido a sua morada. É certo que os Judeus sabiam que não se pode encerrar Deus dentro de quatro muros. Mas era somente no Templo que era preciso oferecer os sacrifícios, o culto de adoração e de ação de graças. É preciso também dizer que os escribas e os doutores da Lei tinham bem fechado o acesso a Deus. Eis que com Jesus surge algo de inaudito: Deus salta o muro! E a cólera de Jesus é a manifestação disso. Doravante, Deus deixa-Se aproximar num homem que não é um especialista do Templo, um homem que encontra as prostitutas, os publicanos, que come com eles, sem nunca pedir a ninguém para ir primeiro purificar-se no Templo. Doravante, dirá São Paulo, “em Jesus temos livre acesso ao Pai”. Quando vamos comungar, é este homem, Jesus ressuscitado, que vem encher-nos com a sua Presença. E, de repente, tornamo-nos a Presença de Deus junto dos nossos irmãos e das nossas irmãs. Imensa vocação de todo o batizado! Estamos verdadeiramente conscientes disso?

    4. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE…

    Reler e meditar os dez Mandamentos… Esta semana, somos convidados a retomar muitas vezes esta oração do Salmo 18, a cantar este louvor da lei do Senhor, que é um apoio para a nossa vida, que nos ajuda ao discernimento, que nos dá a sabedoria e vai guiar-nos na boa direção se nos deixarmos conduzir pelo Espírito do Senhor… Convite à disponibilidade, à confiança. De seguida, convite a reler e meditar estes “dez mandamentos” que pensamos conhecer: embora sendo da “antiga Aliança”, têm algo a dizer-nos e a revelar-nos de Deus, que só quer a nossa felicidade.

     

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA

    Grupo Dinamizador:
    José Ornelas, Joaquim Garrido, Manuel Barbosa, Ricardo Freire, António Monteiro
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
    www.dehonianos.org

  • 04º Domingo do tempo da Quaresma - Ano B [atualizado]

    04º Domingo do tempo da Quaresma - Ano B [atualizado]

    10 de Março, 2024

    ANO B

    4.º DOMINGO DA QUARESMA

    Tema do 4.º Domingo da Quaresma

    A liturgia do 4.º Domingo da Quaresma coloca-nos diante do projeto salvador de Deus para o mundo e para os homens: é uma iniciativa de Deus que, independentemente dos nossos méritos, nos oferece a Vida eterna. Cada um de nós tem de decidir como acolhe essa oferta e que resposta lhe dá. A nossa resposta deve ser levada na alegria, marca essencial do Evangelho e deste Domingo da Quaresma, chamado o “Domingo da Alegria”.

    A primeira leitura avisa que, quando o homem prescinde de Deus e escolhe caminhos de egoísmo e de autossuficiência, está a construir um futuro de dor e de morte. Mas garante, por outro lado, que Deus nunca desiste dos seus filhos: Ele dá-lhes sempre a possibilidade de reconstruir a vida, de começar de novo.

    A segunda leitura diz-nos que, apesar da nossa condição de fragilidade e de pecado, Deus nos ofereceu, em Cristo, a Vida e a salvação. Não o fez em resultado dos nossos merecimentos; foi uma oferta totalmente gratuita, que resulta do amor que nos tem.

    No Evangelho, João apresenta, em palavras do próprio Jesus, o projeto de salvação de Deus: por puro amor, Deus enviou ao nosso encontro o seu Filho Unigénito, que veio oferecer-nos a salvação. Quem “acreditar” em Jesus e aprender com Ele a lição do amor até ao extremo, nascerá para uma Vida nova, para a Vida plena e definitiva.

     

    LEITURA I – 2 Crónicas 36,14-16.19-23

    Naqueles dias,
    todos os príncipes dos sacerdotes e o povo
    multiplicaram as suas infidelidades,
    imitando os costumes abomináveis das nações pagãs,
    e profanaram o templo
    que o Senhor tinha consagrado para Si em Jerusalém.
    O Senhor, Deus de seus pais,
    desde o princípio e sem cessar, enviou-lhes mensageiros,
    pois queria poupar o povo e a sua própria morada.
    Mas eles escarneciam dos mensageiros de Deus,
    desprezavam as suas palavras e riam-se dos profetas,
    a tal ponto que deixou de haver remédio,
    perante a indignação do Senhor contra o seu povo.
    Os caldeus incendiaram o templo de Deus,
    demoliram as muralhas de Jerusalém.
    Lançaram fogo aos seus palácios
    e destruíram todos os objetos preciosos.
    O rei dos caldeus deportou para Babilónia
    todos os que tinham escapado ao fio da espada;
    e foram escravos deles e de seus filhos,
    até que se estabeleceu o reino dos persas.
    Assim se cumpriu o que o Senhor anunciara pela boca de Jeremias:
    «Enquanto o país não descontou os seus sábados,
    esteve num sábado contínuo,
    durante todo o tempo da sua desolação,
    até que se completaram setenta anos».
    No primeiro ano do reinado de Ciro, rei da Pérsia,
    para se cumprir a palavra do Senhor,
    pronunciada pela boca de Jeremias,
    o Senhor inspirou Ciro, rei da Pérsia,
    que mandou publicar, em todo o seu reino,
    de viva voz e por escrito,
    a seguinte proclamação:
    «Assim fala Ciro, rei da Pérsia:
    O Senhor, Deus do Céu, deu-me todos os reinos da terra
    e Ele próprio me confiou o encargo
    de Lhe construir um templo em Jerusalém, na terra de Judá.
    Quem de entre vós fizer parte do seu povo ponha-se a caminho
    e que Deus esteja com ele».

     

    CONTEXTO

    O Livro das Crónicas (dividido em duas partes) é uma obra de um autor anónimo, que se propõe contar a história de Israel, desde a criação do mundo, até à época do Exílio. O livro faz parte de um bloco com alguma unidade (em conjunto com os livros de Esdras e de Neemias) que se costuma designar como “Obra do Cronista”.

    O autor privilegia, na sua obra, a história do reino do Sul (Judá), dando um especial destaque ao rei David e seus descendentes. Também dá algum relevo à tribo de Levi, pelo facto de esta tribo estar ligada às questões de âmbito litúrgico. Em contrapartida, ignora deliberadamente a história do reino do Norte (Israel).

    Os estudiosos não estão de acordo no que diz respeito à datação da obra do Cronista. No entanto, muitos falam de um processo de redação em várias etapas: por volta de 515 a.C. teria aparecido uma primeira edição da obra, com a finalidade de legitimar o culto no “segundo Templo” (isto é, no Templo reconstruído pelos judeus regressados do Exílio na Babilónia); entre 400 e 375 a.C., teria aparecido uma segunda edição, destinada a sublinhar a autoridade de Esdras como legislador e intérprete da Tora; entre 350 e 300 a.C., teria aparecido uma terceira edição, destinada a animar e a fortalecer e a consolidar a comunidade judaica frente à hostilidade dos vizinhos, particularmente dos samaritanos. O objetivo fundamental do autor parece ser o de propor a fidelidade a Deus e à Aliança. Essa fidelidade deve manifestar-se, segundo o Cronista, no cumprimento da Lei e no ritual do culto do Templo de Jerusalém.

    O texto que nos é proposto como primeira leitura neste quarto domingo da Quaresma aparece na parte final do segundo volume do Livro das Crónicas. Neste texto, o Cronista refere dois factos históricos separados por quase 50 anos: a queda de Jerusalém nas mãos de Nabucodonosor (586 a.C.) e a autorização dada pelo rei persa Ciro para o regresso dos exilados a Jerusalém, após a queda da Babilónia (538 a.C.). Pelo meio, o Povo de Deus conheceu a dramática experiência do Exílio na Babilónia.

    Contudo, o autor está muito mais interessado em dar-nos uma interpretação teológica dos factos do que em oferecer-nos uma descrição pormenorizada dos acontecimentos históricos. Não é um historiador ou um analista político a falar, mas sim um crente preocupado em ler a história à luz da fé e em tirar daí as conclusões que se impõem.

     

    MENSAGEM

    A destruição de Jerusalém, o incêndio do Templo e a deportação do Povo de Deus para a Babilónia são vistas pelo Cronista como o resultado lógico dos pecados da nação. “Os chefes de Judá, os sacerdotes e o Povo multiplicaram as suas infidelidades” (vers. 14); ignoraram os avisos enviados por Deus por intermédio dos profetas e desdenharam os seus apelos… Então, a ira do Senhor abateu-se sem remédio sobre o seu Povo (vers. 15-16).

    A propósito, o Cronista cita uma profecia de Jeremias que fala de um castigo de Deus que se iria abater sobre a terra desolada de Judá e que duraria setenta anos (cf. Jr 25,11-14). O Cronista vê nos setenta anos do Exílio (na realidade, o Exílio não durou tanto tempo: setenta anos é um número simbólico, correspondente ao espaço de uma geração) um grande jubileu forçado por Deus, um tempo de compensação por todos os “anos sabáticos” que o Povo não respeitou e nos quais não cumpriu as suas obrigações para com Javé. A Lei de Deus previa que, de sete em sete anos, a terra fosse deixada um ano a descansar e que, depois de sete vezes sete anos (quarenta e nove anos), no quinquagésimo, se celebrasse um “ano jubilar”, isto é, um tempo acrescido de descanso para a terra e os seus habitantes (cf. Lv 25,8-13). Contudo, a ganância e o egoísmo fizeram com que o Povo nunca respeitasse essa lei e não deixasse a terra descansar. Mas Deus quis compensá-la e, ao enviar o Povo para o Exílio, fez com que a “terra de Deus”, martirizada pela injustiça e pelo pecado, ficasse a descansar durante setenta anos, até ser renovada e voltar a ser outra vez a “casa” do Povo de Deus (vers. 21).

    Por detrás desta leitura da história, está um dos dogmas fundamentais da fé de Israel: o dogma da retribuição. Para os teólogos de Israel, Deus retribui ao homem conforme as ações que ele pratica. Se o Povo vive na fidelidade à Aliança e aos mandamentos, Deus oferece-lhe vida e felicidade; se o Povo é infiel aos compromissos assumidos, recebe em paga morte e desgraça.

    Esta imagem de Deus que o Cronista apresenta surpreende-nos e choca-nos. Esse Deus “contabilista” que assenta os débitos e os créditos da pessoa para lhe pagar em conformidade, está longe do Deus da bondade e da misericórdia cujo rosto Jesus veio revelar-nos. Contudo, por detrás dessa ideia desfocada de Deus está uma intuição que tem algo de verdadeiro: as opções erradas que fazemos, mais tarde ou mais cedo resultam em sofrimento e infelicidade para nós e para os que caminham connosco.

    Apesar de tudo, o Cronista está consciente de que o castigo não é a última palavra de Deus. Os últimos versículos (vers. 22-23, que são uma versão resumida de Esd 1,1-4) apontam no sentido da esperança e de um recomeço. Por detrás da referência à libertação operada por Ciro e ao édito que autoriza os habitantes de Judá a regressar à sua terra, está a ideia de um Deus que não abandona o seu Povo e que continua a dar-lhe, em cada momento da história, a possibilidade de recomeçar.

     

    INTERPELAÇÕES

    • Embora usando elementos teológicos e formas de expressão típicas da sua época, o Cronista recorda-nos algo que é indesmentível: quando a pessoa prescinde de Deus e escolhe caminhos de egoísmo e de autossuficiência, está a construir um futuro sem horizontes e sem esperança. Na verdade, a nossa experiência de todos os dias mostra como a indiferença da pessoa face a Deus e às suas propostas gera violência, opressão, exploração, exclusão, solidão, sofrimento. Então, a culpa de muitos dos males que nos afligem não é de Deus, mas sim das opções erradas que fazemos. Estamos conscientes disto? Estamos disponíveis, neste tempo de Quaresma, para fazer um caminho de “conversão” que nos leve de regresso a Deus, dispostos a escutá-l’O e a acolher as indicações que Ele nunca desiste de nos dar?
    • A perspetiva de que a libertação do cativeiro é comandada por Deus e de que Deus oferece ao seu Povo a oportunidade de um novo começo aponta no sentido da esperança. Deus nunca desiste dos seus filhos. Ele abomina o pecado que destrói o nosso mundo e as nossas vidas, mas continua a amar-nos, apesar das nossas opções erradas. Dá-nos a possibilidade, continuamente renovada, de recomeçar, de refazer tudo, de reconstruir as nossas vidas. A certeza do amor de Deus deve iluminar cada instante da nossa vida nesta terra; e deve também ser um incentivo a abraçarmos uma vida nova: mais livre, mais fraterna, mais solidária, mais humana. Confiamos no amor de Deus? Estamos dispostos a aceitar, neste caminho que estamos a percorrer em direção à Páscoa, as oportunidades de renovação que esse amor nos oferece?

     

    SALMO RESPONSORIAL – Salmo 136 (137)

    Refrão:  Se eu me não lembrar de ti, Jerusalém,
    fique presa a minha língua.

    Sobre os rios de Babilónia nos sentámos a chorar,
    com saudades de Sião.
    Nos salgueiros das suas margens,
    dependurámos nossas harpas.

    Aqueles que nos levaram cativos
    queriam ouvir os nossos cânticos
    e os nossos opressores uma canção de alegria:
    «Cantai-nos um cântico de Sião».

    Como poderíamos nós cantar um cântico do Senhor
    em terra estrangeira?
    Se eu me esquecer de ti, Jerusalém,
    esquecida fique a minha mão direita.

    Apegue-se-me a língua ao paladar,
    se não me lembrar de ti,
    se não fizer de Jerusalém
    a maior das minhas alegrias.

     

    LEITURA II – Efésios 2, 4-10

    Irmãos:
    Deus, que é rico em misericórdia,
    pela grande caridade com que nos amou,
    a nós, que estávamos mortos por causa dos nossos pecados,
    restituiu-nos à vida em Cristo
    – é pela graça que fostes salvos –
    e com Ele nos ressuscitou
    e nos fez sentar nos Céus com Cristo Jesus,
    para mostrar aos séculos futuros
    a abundante riqueza da sua graça
    e da sua bondade para connosco, em Cristo Jesus.
    De facto, é pela graça que fostes salvos, por meio da fé.
    A salvação não vem de vós: é dom de Deus.
    Não se deve às obras: ninguém se pode gloriar.
    Na verdade, nós somos obra sua, criados em Cristo Jesus,
    em vista das boas obras que Deus de antemão preparou,
    como caminho que devemos seguir.

     

    CONTEXTO

    A cidade de Éfeso estava situada na costa ocidental da Ásia Menor. Era uma cidade grande e próspera, capital da Província Romana da Ásia. O seu porto de mar ligava o interior da Ásia Menor com todas as cidades do Mediterrâneo.

    Quando Paulo chegou a Éfeso (cf. At 19,1), durante a sua terceira viagem missionária, encontrou alguns cristãos escassamente preparados. Paulo procurou instruí-los e dar-lhes uma adequada formação cristã. De acordo com o Livro dos Atos dos Apóstolos, Paulo permaneceu na cidade durante um longo período (mais de dois anos, segundo At 19,10), ensinando na sinagoga e, depois, na “escola de Tirano” (At 19,9). Assim, reuniu à sua volta um número considerável de pessoas convertidas ao “Caminho” (At 19,9.23). Ainda de acordo com o autor dos Atos, foi aos anciãos da Igreja de Éfeso que Paulo confiou, em Mileto (cf. At 20,17-38), o seu testamento espiritual, apostólico e pastoral, antes de ir a Jerusalém, onde acabaria por ser preso. Tudo isto faz supor uma relação muito estreita entre Paulo e a comunidade cristã de Éfeso.

    Curiosamente, a carta aos Efésios é bastante impessoal e não reflete essa relação. Alguns dos comentadores dos textos paulinos duvidam, por isso, que esta carta venha de Paulo. Outros, porém, acreditam que o texto que chegou até nós com o nome de “Carta aos Efésios” é um dos exemplares de uma “carta circular” enviada a várias igrejas da Ásia Menor, inclusive à comunidade cristã de Éfeso.

    Em qualquer caso, a Carta aos Efésios apresenta-se como uma carta escrita por Paulo, numa altura em que o apóstolo está na prisão (em Roma?). O seu portador teria sido um tal Tíquico. Estamos por volta dos anos 58/60. Trata-se de um texto com uma grande riqueza temática, de uma reflexão amadurecida e completa onde o autor apresenta uma espécie de síntese da teologia paulina.

    O texto que a liturgia deste quarto domingo da Quaresma nos propõe como segunda leitura integra a parte dogmática da carta (cf. Ef 1,3-3,21). Propõe uma reflexão sobre o papel de Cristo na salvação do homem. O autor começa por constatar a situação de pecado em que o homem vive e da qual, por si só, não pode sair (cf. Ef 2,1-3). O homem estará, portanto, condenado à escravidão do pecado e à morte?

     

    MENSAGEM

    Deus é rico em misericórdia e ama os seus filhos e filhas com um amor imenso. Por isso, à nossa situação pecadora, Deus responde com a sua graça (vers. 4). O amor salvador e libertador de Deus não é um amor condicional, que só se derrama sobre os homens se e quando eles se convertem; mas é um amor incondicional, que atinge os seres humanos mesmo quando eles continuam a percorrer caminhos de pecado e de morte (vers. 5).

    Aos homens, orgulhosos e autossuficientes, instalados no egoísmo e no pecado, Deus ofereceu, por meio de Cristo, uma nova vida. Tornados membros de Cristo, eles ressuscitaram com Cristo e sentaram-se com Ele nos céus (vers. 6). Repare-se neste pormenor: o autor da Carta aos Efésios não se refere à ressurreição do homem e à sua glorificação como uma coisa futura, mas como uma coisa passada (usa o tempo grego do aoristo, que tem significado de passado). No entanto, essa ação passada afeta o presente e tem implicações no presente: unido a Cristo, o cristão já ressuscitou e já foi glorificado; ele continua a viver na terra, sujeito à finitude e às limitações da vida presente mas é já, aqui e agora, um cidadão do céu. Na verdade, Deus já introduziu na débil e frágil natureza humana os dinamismos da vida eterna. A vida do cristão está, consequentemente, marcada pela dupla condição da fragilidade e da eternidade. Apesar dos seus limites e da sua debilidade, o cristão tem de testemunhar e anunciar essa vida nova que Deus já lhe ofereceu nesta terra.

    Em toda esta exposição há um elemento incontornável e ao qual o autor da Carta aos Efésios dá uma grande importância: a gratuidade da ação salvadora de Deus. A salvação não é uma conquista nossa, nem resulta das nossas obras ou dos nossos méritos, mas é puro dom de Deus, fruto do seu amor incondicional. Portanto, não há aqui lugar para qualquer sentimento de orgulho ou para qualquer atitude de autoglorificação. A salvação é uma oferta gratuita que Deus faz aos seus filhos e filhas, mesmo que eles a não mereçam (vers. 9).

    Da oferta de salvação que Deus nos faz, deve nascer uma nova humanidade, que pratica boas obras. As boas obras não são a condição para se receber a salvação, mas o resultado da ação dessa graça que Deus, no seu amor e na sua bondade, derrama gratuitamente sobre nós (vers. 10).

     

    INTERPELAÇÕES

    • A vida do ser humano sobre a terra está marcada pela debilidade, pela finitude, pelas limitações inerentes à nossa condição humana. A doença, o sofrimento, o egoísmo, o pecado são realidades que acompanham a nossa existência, que nos mantêm prisioneiros e que nos roubam a esperança. Parece que, por nós próprios, nunca conseguiremos superar os nossos limites e alcançar essa realidade de vida plena, de felicidade total com que permanentemente sonhamos. Por isso, certos filósofos contemporâneos referem-se à futilidade da existência, à náusea que acompanha a vida da pessoa, à inutilidade da busca da felicidade, ao fracasso que é a vida condenada à morte… Este quadro seria desesperante se não existisse o amor de Deus. É precisamente isso que o autor da Carta aos Efésios nos recorda: Deus ama-nos com um amor total, incondicional, desmedido; e é esse amor que nos levanta da nossa condição, que nos faz vencer os nossos limites, que nos oferece esse mundo novo de vida plena e de felicidade sem fim a que aspiramos. Não somos pobres criaturas derrotadas, condenadas ao fracasso, limitadas por um horizonte sem sentido, mas somos filhos amados a quem Deus oferece a vida plena, a salvação. Nós, crentes, que conhecemos e confiamos no amor de Deus, somos capazes de oferecer aos nossos irmãos – cansados, desiludidos e magoados pelas feridas da vida – um testemunho de esperança?
    • Segundo o autor da Carta aos Efésios, Deus introduziu na nossa realidade humana dinamismos de superação e de vida nova que apontam para o Homem Novo, livre das limitações, da debilidade e da fragilidade. Aqueles homens e mulheres que acolheram o dom de Deus são chamados a dar testemunho de um mundo novo, livre do sofrimento, da injustiça, do egoísmo, do pecado. Por isso, os crentes têm de anunciar e de construir um mundo mais justo, mais fraterno, mais humano. Eles são testemunhas, nesta terra, de uma realidade nova de felicidade sem fim e de vida eterna. Nós, discípulos de Jesus, procuramos ser arautos desse mundo novo?
    • A vida nova de Deus manifesta-se nas nossas palavras, nos nossos gestos de partilha e de serviço, nas nossas atitudes de tolerância e de perdão, na nossa solidariedade com os irmãos esquecidos e abandonados, nos nossos esforços para construir pontes de entendimento e de diálogo… Convém, no entanto, não esquecer este facto essencial: é Deus que, através de nós, age no mundo e na vida dos homens. O mérito das coisas boas que fazemos não é nosso, mas sim de Deus. Temos consciência de que somos apenas os instrumentos frágeis através dos quais Deus manifesta ao mundo e aos homens a sua misericórdia e o seu amor?

     

    ACLAMAÇÃO ANTES DO EVANGELHO – João 3,16

    (escolher um dos 7 refrães)

    1. Louvor e glória a Vós, Jesus Cristo, Senhor.
    2. Glória a Vós, Jesus Cristo, Sabedoria do Pai.
    3. Glória a Vós, Jesus Cristo, Palavra do Pai.
    4. Glória a Vós, Senhor, Filho do Deus vivo.
    5. Louvor a Vós, Jesus Cristo, Rei da eterna glória.
    6. Grandes e admiráveis são as vossas obras, Senhor.
    7. A salvação, a glória e o poder a Jesus Cristo, Nosso Senhor.

    Deus amou tanto o mundo que lhe deu o seu Filho Unigénito:
    quem acredita n’Ele tem a vida eterna.

     

    EVANGELHO: João 3, 14-21

    Naquele tempo,
    disse Jesus a Nicodemos:
    «Assim como Moisés elevou a serpente no deserto,
    também o Filho do homem será elevado,
    para que todo aquele que acredita
    tenha n’Ele a vida eterna.
    Deus amou tanto o mundo que entregou o seu Filho Unigénito,
    para que todo o homem que acredita n’Ele
    não pereça, mas tenha a vida eterna.
    Porque Deus não enviou o Filho ao mundo
    para condenar o mundo,
    mas para que o mundo seja salvo por Ele.
    Quem acredita n’Ele não é condenado,
    mas quem não acredita já está condenado,
    porque não acreditou no nome do Filho Unigénito de Deus.
    E a causa da condenação é esta:
    a luz veio ao mundo
    e os homens amaram mais as trevas do que a luz,
    porque eram más as suas obras.
    Todo aquele que pratica más ações
    odeia a luz e não se aproxima dela,
    para que as suas obras não sejam denunciadas.
    Mas quem pratica a verdade aproxima-se da luz,
    para que as suas obras sejam manifestas,
    pois são feitas em Deus.

     

    CONTEXTO

    Jesus tinha ido a Jerusalém para a celebração da Páscoa (cf. Jo 2,13). Foi lá que se encontrou e conversou com um fariseu chamado Nicodemos, que era “uma autoridade entre os judeus” (Jo 3,1).

    Dizer que Nicodemos era fariseu é dizer que ele era um homem da Lei. Os fariseus distinguiam-se pela sua adesão e fidelidade à Lei de Moisés. Os membros deste partido tinham grande influência entre o povo pela sua fama de observância e de prática religiosa. Mas João diz-nos também que Nicodemos era uma autoridade entre os judeus. Isso significa, provavelmente, que era membro do Sinédrio, um representante do judaísmo oficial. O encontro de Nicodemos com Jesus dá-se “de noite”. A indicação pode significar que ele não queria ser visto com Jesus para não prejudicar a sua posição, ou pode ter a ver com o hábito que os fariseus tinham de estudar a Lei à noite. Também pode significar que, nessa altura, Nicodemos ainda está às escuras, pois ainda não foi iluminado pela luz de Jesus. É bem possível que Nicodemos fizesse parte de um grupo, dentro do judaísmo erudito, que se interessava por Jesus e que queria compreendê-lo. Nicodemos aparecerá, mais tarde, a defender Jesus, perante os chefes dos fariseus (cf. Jo 7,50-52). Também estará presente na altura em que Jesus foi descido da cruz e colocado no túmulo (cf. Jo 19,39).

    A conversa daquela noite entre Jesus e Nicodemos apresenta três momentos significativos. No primeiro (cf. Jo 3,1-3), Nicodemos reconhece a autoridade de Jesus, graças às obras poderosas que Ele faz; mas Jesus acrescenta que isso não é suficiente, pois o essencial é reconhecê-l’O como o enviado do Pai, como aquele que veio do alto para revelar Deus. No segundo (cf. Jo 3,4-8), Jesus explica a Nicodemos que, para entender a proposta que Ele traz, é preciso “nascer de Deus”; e explica-lhe que esse novo nascimento é o nascimento “da água e do Espírito”. No terceiro (cf. Jo 3,9-21), Jesus descreve a Nicodemos o projeto de salvação de Deus: é uma iniciativa do Pai, tornada presente no mundo e na vida dos homens através do Filho e que se concretizará pela cruz/exaltação de Jesus. O extrato da conversa que escutamos neste quarto domingo da Quaresma pertence a esta terceira parte. É um texto carregado de densidade teológica.

     

    MENSAGEM

    A missão de Jesus consiste em mostrar aos homens o amor de Deus e em ensinar os homens a viver no amor. Ora será na cruz que Ele mostrará, de forma superlativa, tudo isso. Por isso, Jesus diz a Nicodemos que o Messias tem de “ser levantado ao alto”, como “Moisés levantou a serpente” no deserto. A referência evoca o episódio da caminhada pelo deserto quando os hebreus, mordidos pelas serpentes, olhavam uma serpente de bronze levantada num estandarte por Moisés e se curavam (cf. Nm 21,8-9). Essa serpente de bronze, levantada ao alto, oferecia a vida, a salvação. Do mesmo modo, Jesus tem de ser levantado na cruz para ser fonte de vida e de salvação para aqueles que o contemplarem. É na cruz que Jesus manifesta o seu amor até ao extremo e que indica aos homens o caminho que eles devem percorrer para alcançar a salvação, a Vida definitiva (vers. 14). Nicodemos pensava que a Lei dava Vida; no entanto, a Vida plena brota do amor de Deus, expresso naquela cruz onde Jesus se oferece por amor até à última gota de sangue. Quem acredita naquele Homem levantado na cruz, quem adere a Ele e à sua proposta de Vida, quem aprende com Ele a fazer da própria vida dom total a Deus e aos irmãos, esse terá Vida eterna (vers. 15). Poderá, então, integrar a comunidade do Reino.

    Depois destas considerações de caráter geral, o autor do Quarto Evangelho vai entrar em afirmações mais detalhadas sobre o plano de salvação de Deus oferecido aos homens em Jesus.

    Jesus, o “Filho único” de Deus enviado pelo Pai ao encontro dos homens para lhes trazer a vida definitiva, é o grande dom do amor de Deus à humanidade. A expressão “Filho único” evoca, provavelmente, o “sacrifício de Isaac” (cf. Gn 22,16): Deus comporta-Se como Abraão, que foi capaz de desprender-se do próprio filho por amor (no caso de Abraão, amor a Deus; no caso de Deus, amor aos homens). Jesus, o “Filho único” de Deus, veio ao mundo para cumprir os planos do Pai em favor dos homens. Para isso, encarnou na nossa história humana, correu o risco de assumir a nossa fragilidade, partilhou a nossa humanidade; e, como consequência de uma vida gasta a lutar contra as forças das trevas e da morte que escravizam os homens, foi preso, torturado e morto numa cruz. A cruz é o último ato de uma vida vivida no amor, na doação, na entrega. A cruz é, portanto, a expressão suprema do amor de Deus pelos homens. Ela dá-nos a dimensão do incomensurável amor de Deus pela humanidade (vers. 16).

    Qual é o objetivo de Deus ao enviar o seu Filho único ao encontro dos homens? É libertá-los do egoísmo, da escravidão, da alienação, da morte, e dar-lhes a Vida eterna.

    Ao enviar ao mundo o seu “Filho único”, Deus não tinha uma intenção negativa, mas uma intenção positiva. O Messias não veio com uma missão judicial, nem veio excluir ninguém da salvação. Pelo contrário, Ele veio oferecer aos homens – a todos os homens – a Vida definitiva, ensinando-os a amar sem medida e dando-lhes o Espírito que os transforma em Homens Novos (vers. 17). Reparemos neste facto notável: Deus não enviou o seu Filho único ao encontro de homens perfeitos e santos; mas enviou o seu Filho único ao encontro de homens pecadores, egoístas, autossuficientes, a fim de lhes apresentar uma nova proposta de Vida… E foi o amor de Jesus – bem como o Espírito que Jesus deixou – que transformou esses homens egoístas, orgulhosos, autossuficientes e os inseriu num dinamismo de vida nova e plena.

    Diante da oferta de salvação que Deus faz, a pessoa tem de fazer a sua escolha. Quando aceita a proposta de Jesus e adere a Ele, escolhe a vida definitiva; mas quando prefere continuar escrava de esquemas de egoísmo e de autossuficiência, rejeita a proposta de Deus e autoexclui-se da salvação. A salvação ou a condenação não são, nesta perspetiva, um prémio ou um castigo que Deus dá à pessoa pelo seu bom ou mau comportamento; mas são o resultado da escolha livre da pessoa, face à oferta incondicional de salvação que Deus lhe faz. Em qualquer caso, a oferta de salvação, por parte de Deus, nunca foi retirada; continua aberta e à espera da resposta da pessoa. A responsabilidade pela Vida definitiva ou pela morte eterna não recai, assim, sobre Deus, mas sobre a pessoa (vers. 18). De acordo com a perspetiva de João, também não existe um julgamento futuro, no final dos tempos, no qual Deus pesa na sua balança os pecados dos homens, para ver se os há de salvar ou condenar: o juízo realiza-se aqui e agora e depende da atitude que a pessoa assume diante da proposta de Jesus.

    Na parte final do nosso texto (vers. 19-21), João repete o tema da opção pela Vida (Jesus, “a Luz”) ou pela morte (“as trevas”). Ele constata que, por vezes, os homens rejeitam a proposta de Deus e preferem a escravidão e as trevas. Essa opção constitui uma sentença e são os homens que a pronunciam. Os que assim procedem rejeitam a Vida. Mas há outros homens que conseguem ver a beleza do amor: esses escolhem a luz e passam a viver no amor. São animados pelo Espírito de Jesus. São sinais de Deus no mundo. As suas obras refletem o amor e traduzem-se em gestos de serviço simples e humilde, de cuidado, de entrega, de doação. Esses são os que “nasceram de novo, os que nasceram do alto (da contemplação do Homem levantado na cruz), os que nasceram da água e do Espírito.

     

    INTERPELAÇÕES

    • João é o evangelista abismado na contemplação do amor de um Deus que não hesitou em enviar ao mundo o seu Filho, o seu único Filho, para apresentar aos homens uma proposta de felicidade plena, de vida definitiva. O Evangelho deste domingo convida-nos a contemplar, com João, esta incrível história de amor e a espantar-nos com o peso que nós – seres limitados e finitos, pequenos grãos de pó na imensidão das galáxias – adquirimos nos esquemas, nos projetos e no coração de Deus. Temos consciência desse amor, estamos gratos por esse amor, aceitamos que esse amor nos indique o caminho que devemos percorrer e a forma como devemos viver?
    • O amor de Deus traduz-se na oferta ao homem de Vida plena e definitiva. É uma oferta gratuita, incondicional, absoluta, válida para sempre e que não discrimina ninguém. Aos homens – dotados de liberdade e de capacidade de opção – compete decidir se aceitam ou se rejeitam o dom de Deus. Às vezes, os homens acusam Deus pelas guerras, pelas injustiças, pelas arbitrariedades que trazem sofrimento e morte que pintam as paredes do mundo com a cor do desespero… O texto, contudo, é claro: Deus ama a pessoa e oferece-lhe a vida. O sofrimento e a morte não vêm de Deus, mas são o resultado das escolhas erradas feitas pelo ser humano que se obstina na autossuficiência e que prescinde dos dons de Deus. Temos consciência de que alguns dos males do nosso mundo poderão resultar do nosso egoísmo, do nosso orgulho, do nosso comodismo, dos nossos preconceitos, da nossa recusa em ouvir Deus e em seguir caminhos que Ele nos aponta? O que é que precisamos de mudar, nas nossas vidas, para sermos sinais e arautos do amor de Deus?
    • O evangelista João define claramente o caminho que todo o homem deve seguir para chegar à vida eterna: trata-se de “acreditar” em Jesus. “Acreditar” em Jesus não é uma mera adesão intelectual ou teórica a certas verdades da fé; mas é escutar Jesus, acolher a sua mensagem e os seus valores, segui-l’O no caminho do amor e da entrega ao Pai e aos irmãos. “Acreditar” significa olhar para aquele homem levantado na cruz e aprender com Ele o amor até ao extremo, o amor que ultrapassa todo o egoísmo e é dom total. Jesus é para nós essa referência fundamental, que procuramos seguir a cada instante e que nos aponta o caminho? Estamos dispostos a confiar incondicionalmente n’Ele, mesmo quando as suas indicações parecem estar contra a cultura ambiente, os ditames da moda, as doutrinas vigentes, ou as regras do socialmente correto?
    • Alguns cristãos vivem obcecados e assustados com esse momento final em que Deus vai julgar a pessoa, depois de pesar na balança as suas ações boas e as suas ações más… João garante-nos que Deus não é um contabilista, a somar os débitos e os créditos da pessoa para lhes pagar em conformidade… O cristão não vive no medo, pois ele sabe que Deus é esse Pai cheio de amor que oferece a todos os seus filhos a vida eterna. Não é Deus que nos condena; somos nós que escolhemos entre a vida eterna que Deus nos oferece ou a eterna infelicidade. Vivemos no medo de Deus, ou temos consciência de que somos nós que, com liberdade, fazemos as nossas opções? E, quando optamos, sabemos o que estamos a construir e para onde caminhamos?

     

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 4.º DOMINGO DA QUARESMA
    (adaptadas, em parte, de “Signes d’aujourd’hui”)

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.

    Ao longo dos dias da semana anterior ao 4.º Domingo da Quaresma, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. PALAVRA DE VIDA.

    Depois da saída do Egipto, o povo de Deus sabe que Deus é um Deus libertador. Toda a história do povo eleito é a história de uma aliança entre um libertador e um povo libertado. E Jesus vem ao mundo não para o julgar mas para o salvar. Deus toma então, sempre, a iniciativa do encontro, mas a pessoa tem que fazer a sua parte… Outrora, para conhecer o país onde corria leite e mel, foi preciso que os hebreus deixassem o Egipto, terra da escravidão, e atravessassem o Mar Vermelho, depois o deserto, lugar de provação. Para serem salvos da mordedura da serpente venenosa, foi preciso que erguessem os olhos para a serpente de bronze. Jesus será também elevado, e os homens são convidados a erguer os olhos para O olhar, O escutar, seguir o seu exemplo, acolher a sua paz e a sua vida.

    3. À ESCUTA DA PALAVRA.

    O grande amor de Deus por nós… Estranha palavra de Jesus que se refere a uma também estranha história de serpente de bronze erguida por Moisés no deserto! As serpentes mordiam os Hebreus na sua travessia do deserto. Então, Deus diz a Moisés para fazer uma serpente de bronze. Olhando-a, os Hebreus eram salvos da morte. Um remédio de certo modo homeopático! Mas diz-nos Jesus que «a minha morte vai tornar-se o remédio que vos salvará da vossa morte». Como? Porque o Pai depositou em Jesus a plenitude do seu amor: «Deus amou de tal modo o mundo que lhe deu o seu único Filho». Então, quando Jesus entra na morte que os homens esvaziaram de qualquer traço de amor – a morte na cruz –, Ele entranha em si esta plenitude de amor. Ele preenche o vazio da morte com este amor infinito. Não há mais vazio, a morte explode na Ressurreição. Apenas Deus, porque é Amor, era capaz de cumprir esta admirável alquimia, muito mais extraordinária que a serpente de bronze no deserto: fazer da morte mais atroz o lugar onde se manifestaria o poder do seu amor. Isso continua verdadeiro hoje. Ele é sempre capaz de pôr no mais profundo de todas as mortes, mesmo as mais atrozes, a presença do seu amor. Não o vemos ainda, tal como os discípulos só viram ao princípio um cadáver na cruz. Mas, graças a este imenso amor de Deus por nós, todas as nossas mortes rebentarão na vida eterna.

    4. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE…

    Somos dignos da missão, da confiança que Jesus põe em nós? Isso não é assim tão difícil, na realidade. Basta, muitas vezes, a atenção a pequenas coisas. Comportar-se à maneira de Jesus junto de cada um destes pequenos que são os seus irmãos: por uma palavra de acolhimento, um serviço prestado, um pouco de entreajuda, um gesto de partilha, um momento de escuta… Empreender também, ao nível de responsabilidade que é a nossa, atitudes para mudar o que pode ser mudado, para que haja menos injustiça e exclusão. Preparar a Páscoa com os mais esquecidos…

     

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA

    Grupo Dinamizador:
    José Ornelas, Joaquim Garrido, Manuel Barbosa, Ricardo Freire, António Monteiro
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
    www.dehonianos.org

  • 05º Domingo do tempo da Quaresma - Ano B [atualizado]

    05º Domingo do tempo da Quaresma - Ano B [atualizado]

    17 de Março, 2024

    ANO B

    5.º DOMINGO DA QUARESMA

    Tema do 5.º Domingo da Quaresma

     

    Na liturgia do 5.º Domingo da Quaresma ecoa, com insistência, a preocupação de Deus em nos mostrar o caminho que conduz à Vida nova. Foi para isso que Deus nos enviou o seu Filho Jesus. Cumprindo a vontade do Pai, Jesus desenhou-nos e ofereceu-nos o mapa desse caminho.

    Na primeira leitura, o profeta Jeremias anuncia que Deus se dispõe fazer connosco uma “nova Aliança”. Ele vai gravar as suas propostas nos nossos corações, a fim de que os nossos sentimentos, decisões e ações traduzam a vida e os valores de Deus. Acolhendo o dom de Deus, iremos ao encontro da Vida nova e plena que Ele nos quer dar.

    A segunda leitura apresenta-nos Jesus Cristo, o sumo-sacerdote da nova Aliança, que Se solidariza com os homens e lhes aponta o caminho da salvação. Esse caminho é o mesmo que Jesus seguiu: é o caminho do diálogo com Deus, da entrega confiada nas mãos de Deus, da aceitação plena do projeto do Pai.

    O Evangelho convida-nos a olhar para Jesus, a conhecer as suas propostas, a aprender com Ele, a identificarmo-nos com Ele, a segui-l’O no caminho do amor e da entrega da vida. O caminho da cruz parece, aos olhos do mundo, um caminho de fracasso e de morte; mas é desse caminho de amor e de doação que brota a Vida verdadeira.

     

    LEITURA I – Jeremias 31, 31-34

    Dias virão, diz o Senhor,
    em que estabelecerei com a casa de Israel e com a casa de Judá
    uma aliança nova.
    Não será como a aliança que firmei com os seus pais,
    no dia em que os tomei pela mão
    para os tirar da terra do Egipto,
    aliança que eles violaram,
    embora Eu exercesse o meu domínio sobre eles, diz o Senhor.
    Esta é a aliança que estabelecerei com a casa de Israel,
    naqueles dias, diz o senhor:
    Hei-de imprimir a minha lei no íntimo da sua alma
    e gravá-la-ei no seu coração.
    Eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo.
    Não terão já de se instruir uns aos outros,
    nem de dizer cada um a seu irmão:
    «Aprendei a conhecer o Senhor».
    Todos eles Me conhecerão,
    desde o maior ao mais pequeno, diz o Senhor.
    Porque vou perdoar os seus pecados
    e não mais recordarei as suas faltas.

     

    CONTEXTO

    Jeremias exerceu a sua missão profética desde 627/626 a.C. até depois da destruição de Jerusalém pelos Babilónios (586 a.C.). O cenário da atividade do profeta é, em geral, o reino de Judá e, sobretudo, a cidade de Jerusalém.

    A primeira fase da pregação de Jeremias abrange parte do reinado de Josias. Este rei leva a cabo, a partir de 632 a.C., uma reforma religiosa destinada a banir do país os cultos aos deuses estrangeiros. Jeremias empenha-se nesta reforma. A sua mensagem, neste período, traduz-se num constante apelo à conversão, à fidelidade a Javé e à Aliança.

    No entanto, em 609 a.C., Josias é morto, em combate contra os egípcios. Joaquim sucede-lhe no trono. A segunda fase da atividade profética de Jeremias abrange o tempo de reinado de Joaquim (609-597 a.C.). É um tempo de desgraça e de pecado para Judá. Nesta fase, o profeta aparece a criticar as injustiças sociais e a infidelidade religiosa (a aliança política que Joaquim faz, por esta altura, com os egípcios significa que Judá confia mais num exército estrangeiro do que em Javé). Convencido de que Judá ultrapassou todas as marcas, Jeremias anuncia a iminência de uma invasão babilónica que irá castigar os pecados do Povo. As previsões funestas de Jeremias concretizam-se: em 597 a.C., Nabucodonosor invade Judá e deporta para a Babilónia uma parte da população de Jerusalém.

    No trono de Judá fica, então, Sedecias (597-586 a.C.). A terceira fase da missão profética de Jeremias desenrola-se, precisamente, durante este reinado. Após alguns anos de calma submissão à Babilónia, Sedecias volta a experimentar a velha política das alianças com o Egipto. Jeremias não está de acordo que se confie em exércitos estrangeiros mais do que em Deus; mas nem o rei nem os notáveis prestam atenção à opinião do profeta.

    Em 587 a.C., Nabucodonosor põe cerco a Jerusalém; no entanto, um exército egípcio vem em socorro de Judá e os babilónios retiram-se. Nesse momento de euforia nacional, Jeremias anuncia o recomeço do cerco e a destruição de Jerusalém (cf. Jr 32,2-5). Acusado de traição, o profeta é encarcerado (cf. Jr 37,11-16) e corre, inclusive, perigo de vida (cf. Jr 38,11-13). Enquanto Jeremias continua a pregar a rendição, Nabucodonosor apossa-se, de facto, de Jerusalém, destrói a cidade e deporta a sua população para a Babilónia (586 a.C.).

    É impossível dizer com segurança em qual destes períodos de atividade do profeta encaixa o texto que a primeira leitura deste domingo nos apresenta. Para alguns, tratar-se de um oráculo da primeira fase da atividade profética de Jeremias (reinado de Josias), dirigido aos israelitas do Reino do Norte. Seria uma mensagem de esperança, destinada a animar esse povo que há cerca de cem anos tinha perdido a independência e estava sob o domínio assírio. Para outros, contudo, este texto será da época de Sedecias, algures entre a primeira e a segunda deportação do Povo para a Babilónia (597-586 a.C.). É a época em que Jeremias descobre perspetivas teológicas novas e começa a refletir sobre um tempo novo que Deus irá oferecer ao seu Povo: após a catástrofe, será possível recomeçar tudo, pois Deus tem em mente fazer uma nova Aliança com Judá.

     

    MENSAGEM

    Deus está disposto a firmar uma nova Aliança com o seu Povo. Essa Aliança será, contudo, diferente da Aliança do Sinai.

    A Aliança do Sinai foi uma Aliança externa, gravada em tábuas de pedra e que o Povo nunca interiorizou devidamente. Apresentava leis que o Povo devia cumprir; mas essas leis eram sempre leis externas, que não atingiram o coração do Povo nem mudaram substancialmente a sua maneira de ser. Por isso, o Povo de Deus continuou a trilhar caminhos de infidelidade a Deus, de injustiça, de autossuficiência, de pecado. O Povo de Deus aderiu à Aliança do Sinai, mas mais com a boca do que com o coração. Ora, sem uma adesão efetiva, uma adesão do coração, era impossível manter a fidelidade aos mandamentos e exigências dessa Aliança.

    Constatada a falência da antiga Aliança, Deus vai seguir outro caminho e propor uma nova Aliança que se fundamente noutras bases… Em concreto, Deus vai intervir no sentido de gravar as suas leis e preceitos no coração, no íntimo de cada membro do Povo. Na antropologia semita, o coração é, além da sede dos sentimentos, a sede dos pensamentos, dos projetos, das decisões e das ações da pessoa; é o centro do ser, onde a pessoa dialoga consigo mesma, toma as suas decisões, assume as suas responsabilidades. Portanto, a iniciativa de Deus irá possibilitar que as exigências da Aliança sejam interiorizadas por cada membro do Povo de Deus e que estejam presentes nessa sede onde nascem os pensamentos, onde se definem os valores, onde se decidem as ações. Com um “coração” assim transformado, isto é, que pensa, que decide e que age segundo os esquemas e a lógica de Deus, cada crente poderá viver na fidelidade à Aliança, na obediência aos mandamentos, no respeito pelas leis, no amor a Javé. Então, Javé será, efetivamente, o Deus de Israel; Israel será, verdadeiramente, o Povo que vive de acordo com as propostas de Deus e que testemunha Deus no meio do mundo.

    Com esse novo tipo de relação, Javé não será mais um “desconhecido” para o seu Povo. Entre Deus e Israel será possível o estabelecimento de uma relação pessoal de proximidade, de intimidade, de familiaridade. A comunhão com Javé não será uma lição dificilmente aprendida, mas algo de inato e natural, que brota de um coração em permanente diálogo com Deus.

    Na última frase do nosso texto, Deus anuncia o perdão para as faltas do seu Povo: um perdão total e sem reservas é o primeiro resultado desta nova relação que se vai estabelecer entre Deus e o seu Povo. Também nisto se manifesta o “amor eterno” de Deus.

     

    INTERPELAÇÕES

    • Detenhamo-nos na palavra “Aliança”. Ela serviu aos teólogos de Israel para expressar o compromisso de Deus com o seu Povo, a sua decisão de descer ao encontro do seu Povo, de o acompanhar em cada passo da história e de lhe oferecer a Vida e a salvação. Esse Deus que faz “Aliança” com os homens é o Deus da comunhão e da relação, que olha para nós com amor, que nos convida a fazer parte da sua família e que nunca desiste de nós. É verdade: não andamos à deriva e sem rumo por caminhos sombrios, não somos criaturas sem valor perdidas num universo cujos contornos nos escapam, não somos seres “descartáveis” que podem ser deixados para trás e triturados pela história; somos criaturas que Deus conhece pessoalmente, por quem Deus se interessa infinitamente, que Deus acompanha e cuida com ternura de pai e de mãe. Que impacto tem esta “boa notícia” na nossa vida?
    • O profeta Jeremias revela que Deus, fiel ao seu amor e à sua decisão de nos levar ao encontro da Vida plena, se dispõe a gravar as suas propostas diretamente nos nossos corações. Ali, na raiz do nosso ser, as indicações de Deus tocarão os nossos sentimentos, as nossas decisões e as nossas ações, fazendo com que a nossa vida seja um reflexo da vida e dos valores de Deus. Conduzidos pelo Espírito de Deus age em nós, seremos dotados da capacidade de escolher o Bem, a Verdade, a Justiça, o Amor. Esta iniciativa de Deus refletirá, uma vez mais, o apreço que Ele tem por nós. Da nossa parte, estamos disponíveis para acolher o dom de Deus, para abraçar os seus desafios, para nos deixarmos transformar pelo seu Espírito? Estamos dispostos, neste tempo de Quaresma, a dar mais tempo ao encontro com Deus, ao diálogo com Deus, à escuta de Deus, ao acolhimento das suas propostas?
    • Essa Nova Aliança que Jeremias anunciou começa a concretizar-se em Jesus. Com a sua vida, com os seus gestos, com as suas palavras, com o seu amor, Ele veio inscrever nos nossos corações as propostas de Deus; e deixou-nos o seu Espírito, aquele “alento de Vida” que nos transforma, que nos renova e que nos capacita para viver segundo Deus. Somos verdadeiramente discípulos que seguem Jesus, que se deixam tocar pela sua Palavra e que aceitam o seu convite para integrar a comunidade da Nova Aliança?

     

    SALMO RESPONSORIAL – Salmo 50 (51)

    Refrão: Dai-me, Senhor, um coração puro.

    Compadecei-Vos de mim, ó Deus, pela vossa bondade,
    pela vossa grande misericórdia, apagai os meus pecados.
    Lavai-me de toda a iniquidade
    e purificai-me de todas as faltas.

    Criai em mim, ó Deus, um coração puro
    e fazei nascer dentro de mim um espírito firme.
    Não queirais repelir-me da vossa presença
    e não retireis de mim o vosso espírito de santidade.

    Dai-me de novo a alegria da vossa salvação
    e sustentai-me com espírito generoso.
    Ensinarei aos pecadores os vossos caminhos
    e os transviados hão-de voltar para Vós.

     

    LEITURA II – Hebreus 5, 7-9

    Nos dias da sua vida mortal,
    Cristo dirigiu preces e súplicas,
    com grandes clamores e lágrimas,
    Àquele que O podia livrar da morte
    e foi atendido por causa da sua piedade.
    Apesar de ser Filho,
    aprendeu a obediência no sofrimento
    e, tendo atingido a sua plenitude,
    tornou-Se para todos os que Lhe obedecem
    causa de salvação eterna.

     

    CONTEXTO

    A Carta aos Hebreus é um escrito (alguns preferem dizer “um sermão”) de autor anónimo e cujos destinatários, em concreto, desconhecemos (o título “aos hebreus” provém das múltiplas referências ao Antigo Testamento e ao ritual dos “sacrifícios” que a obra apresenta). É possível que se dirija a uma comunidade cristã constituída maioritariamente por cristãos vindos do judaísmo; mas nem isso é totalmente seguro, uma vez que o Antigo Testamento era um património comum, assumido por todos os cristãos, quer os vindos do judaísmo, quer os vindos do paganismo. Trata-se, em qualquer caso, de cristãos em situação difícil, expostos a perseguições e que vivem num ambiente hostil à fé… São, também, cristãos que facilmente se deixam vencer pelo desalento, que perderam o fervor inicial e que cedem às seduções de doutrinas não muito coerentes com a fé recebida dos apóstolos… O objetivo do autor é estimular a vivência do compromisso cristão e levar os crentes a crescer na fé. Para isso, ele expõe o mistério de Cristo (apresentado, sobretudo, como “o sacerdote” da Nova Aliança) e recorda a fé tradicional da Igreja.

    O texto que nos é hoje proposto como segunda leitura deste quinto domingo da Quaresma é parte de uma longa reflexão (cf. Heb 3,1-9,28) sobre o sacerdócio de Cristo. Em concreto, a perícope de Heb 5,1-10 desenvolve o tema do sacerdócio de Cristo por comparação com o sumo-sacerdote do Antigo Testamento, apresentando uma série de aspetos semelhantes e opostos. Começa por apontar três aspetos que definem a missão do sumo-sacerdote: o sumo-sacerdote é um homem que, pela sua fragilidade, é capaz de entender as fragilidades (pecado) dos seus irmãos (vers. 2); o sumo-sacerdote tem como missão oferecer sacrifícios a Deus, a fim de refazer a comunhão entre Deus e o homem (vers. 3); o sumo-sacerdote desempenha esta missão por escolha de Deus, tal como aconteceu com o sacerdote Aarão (vers. 4).

    Ora, estes três elementos também estão bem patentes no sumo-sacerdócio de Cristo.

     

    MENSAGEM

    Cristo, apesar de Filho de Deus, foi um homem que viveu entre os homens e que experimentou a fragilidade e a debilidade dos homens. Como os outros homens, seus irmãos, Ele sofreu, chorou, sentiu angústia e medo diante da morte (o autor alude, provavelmente, à oração de Jesus no Monte das Oliveiras, pouco antes de ser preso – cf. Mc 14,36). Nele não houve pecado; mas, identificando-se com os homens, Ele compreendeu as fraquezas e identificou a debilidade dos seus irmãos. A partir dessa compreensão, dispôs-se a atuar no sentido de lhes dar remédio.

    Por outro lado, Jesus, o Filho de Deus feito homem, viveu toda a sua vida em permanente diálogo com o Pai. Procurou sempre, através de uma oração intensa, discernir e acolher a vontade do Pai. Mesmo nos momentos mais difíceis da sua existência terrena, escutou o Pai, manteve a sua adesão incondicional ao Pai, manifestou a sua total disponibilidade para cumprir o projeto de salvação que o Pai queria, através d’Ele, oferecer aos homens. Percebendo, pela oração, o projeto do Pai, Jesus, através da oração, disse “sim” ao Pai. Dizendo “sim”, Jesus fez da sua vida uma oferenda ao Pai, um “sacrifício” ao Pai. Esse “sacrifício” reparou a rutura que o pecado tinha provocado e restaurou a comunhão entre Deus e os homens.

    Com a sua obediência, Jesus ensinou os homens a viver em comunhão total com Deus, a cumprir os projetos de Deus e a amar os irmãos até ao dom total da vida; com a sua obediência, Ele eliminou o egoísmo e o pecado que afastavam os homens de Deus. Sendo, pela sua comunhão total com o Pai e com os homens, o modelo de Homem Novo, Ele tornou-se, para todos aqueles que escutam a sua proposta e que O seguem, “fonte de salvação eterna” (vers. 9).

    Jesus Cristo, o sumo-sacerdote da Nova Aliança, fez bem mais do que os sumos-sacerdotes da linha levítica (Aarão e os seus descendentes). Ao entregar ao Pai o sacrifício da sua própria vida, Ele ofereceu o sacrifício perfeito, o sacrifício capaz de eliminar o pecado; ao mostrar aos homens o caminho da obediência ao projeto do Pai, Jesus apontou-lhes o caminho que conduz à Vida eterna e verdadeira.

     

    INTERPELAÇÕES

    • Jesus desceu até nós, “vestiu” a nossa humanidade, conheceu as nossas fragilidades, partilhou as nossas dores, medos e incertezas, experimentou as dificuldades do caminho que temos de fazer todos os dias. Tornou-se, verdadeiramente, nosso irmão. Pôde, assim, compreender as fraquezas dos homens e propor-lhes uma forma de as superar. Com a sua própria vida, com a sua entrega completa nas mãos do Pai, com o seu testemunho de uma vida dada por amor até ao extremo, Ele mostrou-nos como derrotar tudo aquilo que nos impede de aceder à Vida plena, à Vida verdadeira. Dispomo-nos a seguir Jesus nesse caminho, sem hesitações nem desculpas, confiando completamente n’Ele?
    • A oração, o diálogo com o Pai, é uma dimensão sempre presente na vida de Jesus. Os Evangelhos contam que, após jornadas intensas de anúncio do Reino, Ele retirava-se para lugares isolados para falar com o Pai. Era nesse diálogo que Ele discernia a vontade de Deus e encontrava a força para concretizar os planos do Pai. Foi também no diálogo sempre renovado com o Pai que Ele aprendeu a fazer de toda a sua vida um dom, uma entrega ao Pai e aos homens. Na nossa vida, temos espaço para dialogar com o Pai, para perceber os seus projetos para nós e para o mundo, para escutar os desafios que Deus nos faz? A nossa vida cumpre-se na indiferença para com Deus e para com os seus projetos, ou numa procura sincera e empenhada da vontade de Deus?

     

    ACLAMAÇÃO ANTES DO EVANGELHO – João 12,26

    (escolher um dos 7 refrães)

    1. Louvor e glória a Vós, Jesus Cristo, Senhor.
    2. Glória a Vós, Jesus Cristo, Sabedoria do Pai.
    3. Glória a Vós, Jesus Cristo, Palavra do Pai.
    4. Glória a Vós, Senhor, Filho do Deus vivo.
    5. Louvor a Vós, Jesus Cristo, Rei da eterna glória.
    6. Grandes e admiráveis são as vossas obras, Senhor.
    7. A salvação, a glória e o poder a Jesus Cristo, Nosso Senhor.

    Se alguém Me quiser servir, que Me siga, diz o Senhor,
    e onde Eu estiver, ali estará também o meu povo.

     

    EVANGELHO – João 12, 20-33

    Naquele tempo,
    alguns gregos que tinha vindo a Jerusalém
    para adorar nos dias da festa,
    foram ter com Filipe, de Betsaida da Galileia,
    e fizeram-lhe este pedido:
    «Senhor, nós queríamos ver Jesus».
    Filipe foi dizê-lo a André;
    e então André e Filipe foram dizê-lo a Jesus.
    Jesus respondeu-lhes:
    «Chegou a hora em que o Filho do homem vai ser glorificado.
    Em verdade, em verdade vos digo:
    Se o grão de trigo, lançado à terra, não morrer, fica só;
    mas se morrer, dará muito fruto.
    Quem ama a sua vida, perdê-la-á,
    e quem despreza a sua vida neste mundo
    conservá-la-á para a vida eterna.
    Se alguém Me quiser servir, que Me siga,
    e onde Eu estiver, ali estará também o meu servo.
    E se alguém Me servir, meu Pai o honrará.
    Agora a minha alma está perturbada.
    E que hei de dizer? Pai, salva-Me desta hora?
    Mas por causa disto é que Eu cheguei a esta hora.
    Pai, glorifica o teu nome».
    Veio então uma voz do céu que dizia:
    «Já O glorifiquei e tornarei a glorificá-l’O».
    A multidão que estava presente e ouvira
    dizia ter sido um trovão.
    Outros afirmavam: «Foi um Anjo que Lhe falou».
    Disse Jesus:
    «Não foi por minha causa que esta voz se fez ouvir;
    foi por vossa causa.
    Chegou a hora em que este mundo vai ser julgado.
    Chegou a hora em que vai ser expulso o príncipe deste mundo.
    E quando Eu for elevado da terra,
    atrairei todos a Mim».
    Falava deste modo,
    para indicar de que morte ia morrer.

     

    CONTEXTO

    O evangelho que a liturgia do 5.º Domingo da Quaresma nos propõe situa-nos em Jerusalém, talvez no próprio dia da entrada solene de Jesus na cidade santa (cf. Jo 12,12-19). As multidões “que tinham chegado para a Festa” haviam aclamado Jesus como o rei/messias, encenando um rito de entronização e aclamando-o como aquele “que vem em nome do Senhor, o rei de Israel” (Jo 12,12-13). No entanto, no horizonte próximo paira a sombra da cruz: aproxima-se a “hora” há muito anunciada e esperada (cf. Jo 2,4; 7,30; 8,20), a “hora” do dom da vida até ao extremo, a “hora” da passagem deste mundo para o Pai, a “hora” da glorificação de Jesus.

    O evangelista João coloca em cena “alguns gregos” que “tinham subido a Jerusalém para adorar” e que queriam ver Jesus. “Gregos” significa, provavelmente, “não judeus”. Podem ser prosélitos (estrangeiros convertidos ao judaísmo) ou simples simpatizantes do judaísmo. Esses “gregos” dirigem-se a Filipe. Filipe, por sua vez, vai apresentar a questão a André. Os dois tinham nomes gregos e os dois eram naturais de Betsaida (que significa “casa da pesca”), uma povoação situada na tetrarquia de Herodes Filipe, já fora do território judeu propriamente dito, a nordeste do Mar da Galileia. Filipe e André decidem levar a Jesus a pretensão dos “gregos”.

     

    MENSAGEM

    Os “gregos” vieram a Jerusalém “adorar” a Deus no Templo; mas quiseram “ver” Jesus. Este “ver” deve ser entendido como “conhecer”, encontrar-se com Jesus, tomar contacto com a salvação que Ele veio oferecer (“ver Jesus” – vers. 21). Com isto, o autor do Quarto Evangelho sugere que o Templo e o culto antigo já não são mais os lugares onde a pessoa encontra Deus e a salvação; agora, quem estiver interessado em encontrar a verdadeira libertação deve dirigir-se ao próprio Jesus. Por outro lado, a salvação/libertação que Jesus veio trazer tem um alcance universal e destina-se a todos os homens – mesmo àqueles que vivem fora das fronteiras físicas de Israel (“gregos”).

    Estes “gregos” não se dirigem diretamente a Jesus, mas a um discípulo chamado Filipe que, por sua vez, expõe o pedido a outro discípulo, André. Ambos eram naturais de Betsaida (“casa da pesca”: lembremos que Jesus confiou aos seus discípulos a missão de serem “pescadores de homens” – cf. Mc 1,17). Muito provavelmente temos aqui um aceno à responsabilidade missionária da comunidade de Jesus, encarregada da missão de levar Jesus a toda a terra, inclusive ao mundo grego. Os mesmos dois discípulos são, aliás, referidos no relato joânico da multiplicação dos pães (cf. Jo 6,5.7.8): são eles que levarão o “pão da vida” aos não judeus. O facto de Filipe falar primeiro com André e só depois os dois irem contar o que se passa a Jesus pretende talvez refletir a dificuldade com que as primeiras comunidades cristãs deram o passo para a evangelização dos pagãos. João sugere, com este pormenor, que a decisão de integrar os pagãos na comunidade de Jesus não é uma decisão individual, mas uma decisão que a comunidade tomou depois de haver consultado o Senhor.

    Entretanto, Filipe e André levam a Jesus a pretensão dos “gregos”. Esperava-se que Jesus mandasse chamar esses “gregos” que o queriam conhecer ou que, pelo menos, lhes marcasse um encontro… No entanto, não é isso que acontece. Jesus responde ao pedido dos “gregos” anunciando que chegou a sua “hora”, a “hora” da cruz, a “hora” da sua glorificação. Como é que esta declaração de Jesus responde à pretensão desses “gregos” que o querem “ver”?

    A morte de Jesus na cruz constitui uma excelente chave de leitura para entender a sua vida e o seu projeto. Desde o momento da sua incarnação, Jesus pôs a sua vida ao serviço do plano salvador do Pai. Recusou qualquer projeto pessoal de triunfo e de glória humana, para abraçar o plano de Deus para o mundo e para os homens. Andou por todo o lado – desde a Galileia até Jerusalém – a propor o Reino de Deus; sem se resguardar, enfrentou o sistema opressor que mantinha os homens escravos; denunciou, em nome de Deus, as leis e os comportamentos que eram geradores de sofrimento e morte. Como não podia deixar de ser, entrou em rota de colisão com aqueles que dominavam o mundo. Por isso, foi preso, foi condenado e foi morto na cruz. A sua morte foi a consequência lógica da sua entrega ao projeto do Pai, que pretendia mudar o mundo e libertar os homens.

    Quando se tornou evidente que a proposta de Jesus ia contra os interesses instalados, Jesus podia ter desistido ou, pelo menos, moderado a sua denúncia. Não o fez. A sua obediência a Deus e o seu amor aos homens seus irmãos levou-o a lutar até ao fim, até ao seu último alento. A cruz onde se consumou a “hora” de Jesus é a expressão suprema de uma vida dada por amor; naquela cruz, qualquer pessoa pode ver a lição do amor até ao extremo, do amor que se faz dom total. A cruz “diz” toda a vida de Jesus, a forma como Ele viveu toda a sua vida.

    O que é que resulta deste “dom” de Jesus? Resulta uma nova humanidade, uma humanidade que Jesus libertou da opressão, da injustiça, dos mecanismos que geram sofrimento e medo; uma humanidade que, com Jesus, aprendeu que a vida é para ser dada, sem limites, por amor. Não há dúvida que o dom da vida dá abundantes frutos de vida. Na cruz de Jesus manifesta-se, portanto, o projeto libertador de Deus para os homens. Toda a vida de Jesus foi como “o grão de trigo, lançado à terra”, que morre para dar fruto (vers. 24).

    Os “gregos” queriam conhecer Jesus. Jesus diz-lhes que olhem para a cruz: é na cruz que Ele se revela totalmente, que Ele mostra o sentido da sua vida, que Ele diz porque viveu e para que viveu. É naquele homem que ama até ao dom total de si próprio que se pode ver a proposta de Deus. É nele que se pode encontrar Deus e adorar Deus.

    É esse Jesus e esta proposta de vida que Filipe e André – e os outros discípulos – devem testemunhar diante do mundo. E todos aqueles que escutarem esse testemunho são convidados a tomar posição. Se quiserem servir Jesus, devem segui-l’O nesse caminho que Ele percorreu e pôr as suas vidas ao serviço de Deus e da libertação dos homens. Até ao dom total da vida, por amor (“se alguém Me quer servir, siga-Me” – vers. 26a). Quem aceitar esta proposta permanece unido a Jesus, entra na comunidade de Deus (vers. 26b). Poderá ser desprezado pelo “mundo”; mas será honrado por Deus e acolhido como seu filho (vers. 26c).

    O texto termina com a “voz do céu” que glorifica Jesus (vers. 28-32). É uma forma de mostrar que o caminho de Jesus tem o selo de garantia de Deus. A “voz do céu” assegura que a forma de viver a proposta por Jesus é verdadeira e que Deus garante a sua autenticidade. Confirma-se, desta forma, aos discípulos que oferecer a vida por amor não é um caminho de fracasso e de morte, mas um caminho de glorificação e de vida.

     

    INTERPELAÇÕES

    • A primeira leitura deste domingo dá conta da preocupação de Deus em oferecer aos homens uma nova Aliança, capaz de fazer nascer um Homem Novo. Como é que chegamos a essa realidade do Homem Novo, de coração transformado, isto é, com um coração que sente, que decide e que age segundo os esquemas e a lógica de Deus? O Evangelho responde: é olhando para Jesus, identificando-nos com Ele, aprendendo com Ele a pôr a nossa vida ao serviço do projeto de Deus, seguindo-O no caminho da cruz. Jesus é o modelo, a referência, o exemplo para quem quer aceitar o desafio de Deus e viver na comunidade da nova Aliança. Estamos verdadeiramente decididos a conhecer Jesus, a abraçar as suas propostas, a caminhar atrás d’Ele, como discípulos, no caminho do amor, do serviço, do dom da vida?
    • O caminho que Jesus nos aponta – o caminho da obediência a Deus, do amor até ao extremo, da entrega total da própria vida ao serviço de Deus e dos irmãos – parece, em pleno séc. XXI, um caminho pouco atraente, pouco lógico, pouco moderno, desligado da realidade do mundo, que nos coloca à margem dos valores e realizações que marcam a história do nosso tempo. Sentimo-nos com coragem para remar contra a maré e para dar testemunho – com as nossas palavras, com os nossos gestos, com a nossa vida – do caminho de Jesus? Somos capazes de afirmar, mesmo que nos ridicularizem, persigam e condenem, a nossa profunda convicção de que a proposta de Jesus faz sentido e pode fazer nascer um mundo mais humano, mais justo, mais fraterno, mais são, mais feliz?
    • Jesus rejeita absolutamente o caminho da autossuficiência, do fechamento em si próprio, do egoísmo estéril, dos valores efémeros. Ele sabe bem que, na lógica de Deus, esse caminho é um caminho que produz vidas vazias e sem sentido, sofrimento e frustração, desilusão e desânimo. Quem vive exclusivamente para si próprio, quem se preocupa apenas em defender os seus interesses e perspetivas, quem se apega excessivamente a uma realização pessoal cumprida em circuitos fechados, “compra” uma existência infecunda e que não vale a pena ser vivida. Perde a oportunidade de chegar ao Homem Novo, à realização plena, à vida verdadeira, à ressurreição, à salvação. Nesta “janela de conversão” que é o tempo quaresmal, que temos de mudar na nossa vida, nos nossos valores, nos nossos comportamentos, na nossa história, para estarmos plenamente alinhados com as propostas de Jesus?
    • Filipe e André, homens nascidos na “casa da pesca” e chamados por Jesus a serem “pescadores de homens”, servem de intermediários entre Jesus e os “gregos” que o querem conhecer. É através da comunidade dos discípulos que os homens “veem Jesus”, descobrem o seu projeto, encontram esse caminho de amor e de doação que conduz à vida nova do Homem Novo, à salvação. Isto recorda-nos a nossa responsabilidade de testemunhas de Jesus e da sua salvação no meio dos homens do nosso tempo… Aqueles irmãos que se cruzam connosco nos caminhos da vida descobrem no nosso testemunho o rosto de Jesus? Todos aqueles que vêm ao encontro de Jesus à procura da vida plena encontram na forma como nos doamos, como servimos e como amamos a proposta libertadora que, através de nós, Jesus quer passar a todos os homens? Somos realmente a ponte entre Jesus e aqueles que O querem “conhecer”?

     

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 5.º DOMINGO DA QUARESMA
    (adaptadas, em parte, de “Signes d’aujourd’hui”)

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.

    Ao longo dos dias da semana anterior ao 5.º Domingo da Quaresma, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. BILHETE DE EVANGELHO.

    Se o grão de trigo quer dar fruto, é preciso que ele passe pela terra onde vai apodrecer, mas o seu percurso não pára aí, o fruto brotará. Jesus quer dar a vida, Ele escolhe passar pela morte, dando então a maior prova de amor. Mas a sua missão não pára aí, a vida brotará: a sua própria vida é a ressurreição; e a vida da humanidade é a salvação. “Não era necessário que Cristo sofresse tudo isto para entrar na sua glória?”, dirá Ele aos discípulos no caminho de Emaús. Se queremos que os outros vivam, é preciso que passemos por um certo número de renúncias, de esquecimentos de nós próprios, e isto através do serviço, do acolhimento, do perdão. Mas a nossa relação com os outros não pára aí, a alegria brota nos rostos e no nosso próprio rosto. A morte é uma passagem obrigatória para aquele que ama e quer amar até ao fim.

    3. À ECUTA DA PALAVRA.

    “Queremos ver Jesus”… Em resposta ao pedido dos Gregos, Jesus anuncia a sua próxima “glorificação”, isto é, a sua morte. Estranha associação esta, da morte com a glória! Mas Jesus explica: “Se o grão de trigo, lançado à terra, não morrer, fica só; mas se morrer, dará muito fruto”. Sabemos que, na realidade, o grão enterrado na terra sofre uma profunda transformação. O seu invólucro exterior deve rebentar e acabar por desaparecer para que o germe, até então escondido, possa crescer e produzir novos grãos. Na morte de Jesus acontece a “explosão” da Ressurreição. Os discípulos reconhecem em Jesus a presença imediata de Deus. Então, Ele será glorificado. A “glória” é o “peso” no sentido de “densidade”, de um ser. A verdadeira glória, a verdadeira densidade do ser de Jesus, é que a sua humanidade é o lugar da incarnação do Filho eterno do Pai. Porque estamos ainda no tempo da germinação secreta, não vemos ainda esta glória do Senhor. Mas acolhendo o testemunho dos apóstolos que “comeram e beberam com Ele depois da sua ressurreição de entre os mortos”, podemos deixar-nos atrair por Jesus, acolher e ver “já” pela fé o seu mistério de glória, e testemunhar assim, no coração do mundo, que Ele, o Filho do homem, é verdadeiramente o Filho de Deus, vencedor da morte.

    4. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE…

    Redescobrir a “caridade”… A palavra “caridade”, por vezes, parece não ter muito sentido hoje, devido a deformações e incompreensões da própria palavra. A encíclica de Bento XVI “Deus é caridade” ajuda-nos a recuperar o seu sentido genuíno. É preciso redescobrir o verdadeiro sentido evangélico e amar os nossos irmãos: pela escuta, pelo serviço, pela partilha, pela atenção aos mais pobres! Ao longo desta semana, procuremos gestos concretos para praticar a caridade!

     

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA

    Grupo Dinamizador:
    José Ornelas, Joaquim Garrido, Manuel Barbosa, Ricardo Freire, António Monteiro
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
    www.dehonianos.org

  • Domingo de Ramos - Ano B [atualizado]

    Domingo de Ramos - Ano B [atualizado]

    24 de Março, 2024

    ANO B

    DOMINGO DE RAMOS NA PAIXÃO DO SENHOR

    Tema do Domingo de Ramos

    A liturgia deste último Domingo do tempo quaresmal, Domingo de Ramos, convida-nos a contemplar esse Deus que, por amor, desceu ao nosso encontro, partilhou a nossa humanidade, fez-Se servo dos homens, deixou-Se matar para que o egoísmo, a maldade e o pecado fossem vencidos. Por Jesus, Deus ofereceu-nos a possibilidade de uma Vida nova.

    A primeira leitura traz-nos a palavra e o drama de um profeta anónimo, chamado por Deus a testemunhar no meio das nações a Palavra da salvação. Apesar do sofrimento e da perseguição, o profeta confiou em Deus e concretizou, com teimosa fidelidade, os projetos de Deus. Os primeiros cristãos viram neste “servo de Deus” a figura de Jesus.

    A segunda leitura traz-nos um belo hino onde ecoa a catequese primitiva sobre Jesus. Fiel ao projeto do Pai, Ele desceu ao encontro dos homens, viveu a vida dos homens e sofreu uma morte atroz por amor aos homens. Mas a sua vida não foi malbaratada: Deus exaltou-O, mostrando que o caminho que Ele seguiu é o caminho que conduz à Vida. É esse mesmo caminho que somos desafiados a percorrer.

    O Evangelho relata-nos a paixão e morte de Jesus. É o momento culminante de uma vida gasta a concretizar o projeto salvador de Deus: libertar os homens de tudo aquilo que gera egoísmo, escravidão, sofrimento e morte. Na cruz onde Jesus ofereceu a sua vida até à última gota de sangue, revela-se o incomensurável amor de Deus por nós; na cruz, Jesus disse-nos que o amor até ao extremo gera Vida nova e eterna.

     

    LEITURA I – Isaías 50, 4-7

    O Senhor deu-me a graça de falar como um discípulo,
    para que eu saiba dizer uma palavra de alento
    aos que andam abatidos.
    Todas as manhãs Ele desperta os meus ouvidos,
    para eu escutar, como escutam os discípulos.
    O Senhor Deus abriu-me os ouvidos
    e eu não resisti nem recuei um passo.
    Apresentei as costas àqueles que me batiam
    e a face aos que me arrancavam a barba;
    não desviei o meu rosto dos que me insultavam e cuspiam.
    Mas o Senhor Deus veio em meu auxílio,
    e, por isso, não fiquei envergonhado;
    tornei o meu rosto duro como pedra,
    e sei que não ficarei desiludido.

     

    CONTEXTO

    No livro do Deutero-Isaías (Is 40-55), encontramos quatro poemas (cf. Is 42,1-9; 49,1-13; 50,4-11; 52,13-53,12) que se diferenciam um tanto da temática desenvolvida pelo profeta no resto do livro. Referem-se a uma figura enigmática, que o próprio Deus apresenta como “o meu Servo” (Is 42,1). O nome “servo de Javé” é, na Bíblia, um título honorífico. Refere-se, habitualmente, a alguém a quem Deus chama a colaborar no seu projeto salvador. De facto, o “servo de Javé” que nos é apresentado pelo Deutero-Isaías, foi eleito por Deus e recebeu de Deus uma missão (cf. Is 42,1a; 49,1.5). Essa missão tem a ver com a Palavra de Deus e tem carácter universal, pois deve concretizar-se no meio das nações (cf. Is 42,1b; 49,6); será vivida pelo “servo” na humildade, no sofrimento e na obediência incondicional ao projeto de Deus (cf. Is 42,2-3). Apesar de a missão terminar num aparente insucesso (cf. Is 53,2-3.7-9), a dor do profeta não foi em vão: ela tem um valor expiatório e redentor; do seu sofrimento resulta o perdão para o pecado do Povo (cf. Is 53,6.10). Deus aprecia o sacrifício do profeta e recompensá-lo-á, elevando-o à vista de todos, fazendo-o triunfar dos seus detratores e adversários (cf. Is 53,11-12).

    Quem é este profeta? É Jeremias, o paradigma do profeta que sofre por causa da Palavra? É o próprio Deutero-Isaías, chamado a dar testemunho da Palavra no ambiente hostil do Exílio? É um profeta desconhecido? É uma figura coletiva, que representa o Povo exilado, humilhado, esmagado, mas que continua a dar testemunho de Deus, no meio das outras nações? É uma figura representativa, que une a recordação de personagens históricas (patriarcas, Moisés, David, profetas) com figuras míticas, de forma a representar o Povo de Deus na sua totalidade? Não sabemos; no entanto, a figura apresentada nesses poemas vai receber uma outra iluminação à luz de Jesus Cristo, da sua vida, do seu destino.

    O texto que nos é proposto é parte do terceiro cântico do “servo de Javé”.

     

    MENSAGEM

    Quem toma a palavra é um personagem anónimo, que fala do seu chamamento por Deus para a missão. Não se designa a si próprio como “servo”; mas assemelha-se a esse “servo” de que se fala no primeiro cântico do servo de Javé (cf. Is 42,1-9). Também não se intitula “profeta”; porém, narra a sua vocação com os elementos típicos dos relatos proféticos de vocação.

    A missão que este profeta/servo recebe de Deus tem claramente a ver com o anúncio da Palavra. O profeta é o homem da Palavra, através de quem Deus fala; a proposta de redenção que Deus faz a todos aqueles que necessitam de salvação/libertação ecoa na palavra profética. O profeta é inteiramente modelado por Deus e não opõe resistência nem ao chamamento, nem à Palavra que Deus lhe confia; mas tem de estar, continuamente, numa atitude de escuta de Deus, para que possa depois apresentar – com fidelidade – essa Palavra de Deus para os homens. A missão que Deus confia ao profeta/servo consiste em dizer uma palavra de alento a todos os que estão cansados e abatidos, a todos os que são magoados e injustiçados, a todos os que perderam a esperança.

    A missão do profeta/servo não é fácil; concretiza-se no sofrimento e na dor. A palavra proclamada em nome de Deus é uma palavra que incomoda e provoca resistências que, para o profeta, se consubstanciam, quase sempre, em dor e perseguição. No entanto, o profeta/servo de Deus não resiste às agressões e condenações e torna o seu rosto “duro como pedra” face àqueles que o agridem e magoam. Não por insensibilidade, mas porque está decidido a suportar tudo a fim de levar até ao fim a missão que Deus lhe tinha confiado. O verdadeiro profeta não desiste nem se demite: a paixão pela Palavra sobrepõe-se ao sofrimento e faz com que ele ponha à frente de tudo a missão que Deus lhe confiou.

    O que é que leva o profeta/servo a resistir corajosamente face aos que o agridem e o querem silenciar? Precisamente a sua confiança no Senhor, que não abandona aqueles a quem chama. A certeza de que não está só, mas de que tem a força de Deus, torna o profeta/servo mais forte do que a dor, o sofrimento, a perseguição, o ódio dos inimigos. O profeta/servo tem uma absoluta confiança em Deus; e sabe que Deus nunca o desiludirá.

     

    INTERPELAÇÕES

    • Não sabemos, efetivamente, quem é este “servo de Javé”; no entanto, os primeiros cristãos vão utilizar este texto como grelha para interpretar o mistério de Jesus: Ele é a Palavra de Deus feita carne, que oferece a sua vida para trazer a salvação/libertação aos homens… A vida de Jesus realiza plenamente esse destino de dom e de entrega da vida em favor de todos; e a sua glorificação mostra que uma vida vivida deste jeito não termina no fracasso, mas na ressurreição que gera Vida nova. No entanto, talvez esta conceção da vida nos pareça estranha e incongruente face àquilo que vemos acontecer todos os dias à nossa volta… Como é que me situo face a isto? Acredito que uma vida gasta como a de Jesus ou a do profeta/servo da primeira leitura deste domingo é uma vida com sentido e que conduz à Vida nova?
    • O profeta/servo que, sem hesitar, põe a sua palavra e a sua vida ao serviço da libertação dos seus irmãos – mesmo que isso implique para si próprio sofrimento, perseguição e humilhação – deixa-nos um desafio que não podemos ignorar… Vivemos cercados por ilhas de miséria e de dor onde tantos e tantos irmãos nossos permanecem prisioneiros; passamos a cada passo por homens e mulheres abandonados, esquecidos, atirados para as margens da história, privados dos seus direitos e dignidade; assistimos diariamente à crucifixão de tanta gente que luta contra os sistemas de opressão e de morte… O que fazemos? Permanecemos indiferentes e viramos a cara para outro lado para não ver e para não sermos incomodados, ou levantamos a voz para denunciar o egoísmo, a violência, a injustiça, as mil formas de maldade que desfeiam o mundo e destroem a Vida?
    • Temos consciência de que a nossa missão profética passa por sermos Palavra viva de Deus que ecoa no mundo dos homens? Nas nossas palavras, nos nossos gestos, no nosso testemunho, a proposta libertadora de Deus alcança o mundo e o coração dos homens?
    • O profeta/servo da nossa leitura garante-nos que nunca desistirá da missão que lhe foi confiada porque confia em Deus: sabe que Deus estará sempre com ele e que nunca o desiludirá. Que fantástica expressão de confiança e de fé! Seremos capazes de dizer, com convicção, a mesma coisa? Acreditamos que Deus nunca nos desiludirá?

     

    SALMO RESPONSORIAL – Salmo 21 (22)

    Refrão: Meu Deus, meu Deus, porque me abandonastes?

    Todos os que me veem escarnecem de mim,
    estendem os meus lábios e meneiam a cabeça:
    «Confiou no Senhor, Ele que o livre,
    Ele que o salve, se é meu amigo».

    Matilhas de cães me rodearam,
    cercou-me um bando de malfeitores.
    Trespassaram as minhas mãos e os meus pés,
    posso contar todos os meus ossos.

    Repartiram entre si as minhas vestes
    e deitaram sortes sobre a minha túnica.
    Mas Vós, Senhor, não Vos afasteis de mim,
    sois a minha força, apressai-Vos a socorrer-me.

    Hei de falar do vosso nome aos meus irmãos,
    Hei de louvar-Vos no meio da assembleia.
    Vós, que temeis o Senhor, louvai-O,
    glorificai-O, vós todos os filhos de Jacob,
    reverenciai-O, vós todos os filhos de Israel.

     

    LEITURA II – Filipenses 2, 6-11

    Cristo Jesus, que era de condição divina,
    não Se valeu da sua igualdade com Deus,
    mas aniquilou-Se a Si próprio.
    Assumindo a condição de servo,
    tornou-Se semelhante aos homens.
    Aparecendo como homem, humilhou-Se ainda mais,
    obedecendo até à morte e morte de cruz.
    Por isso Deus O exaltou
    e Lhe deu um nome que está acima de todos os nomes,
    para que ao nome de Jesus todos se ajoelhem
    no céu, na terra e nos abismos,
    e toda a língua proclame que Jesus Cristo é o Senhor,
    para glória de Deus Pai.

     

    CONTEXTO

    A cidade de Filipos, situada na Macedónia oriental, era uma cidade próspera, com uma população constituída maioritariamente por veteranos romanos do exército. Organizada à maneira de Roma, estava fora da jurisdição dos governantes das províncias locais e dependia diretamente do imperador. Gozava dos mesmos privilégios das cidades de Itália e os seus habitantes tinham cidadania romana. Paulo chegou a Filipos pelo ano 49 ou 50, no decurso da sua segunda viagem missionária, acompanhado de Silvano, Timóteo e Lucas (cf. At 16,1-40). Da sua pregação nasceu a primeira comunidade cristã em solo europeu.

    A comunidade cristã de Filipos era uma comunidade entusiasta, generosa, comprometida, sempre atenta às necessidades de Paulo e do resto da Igreja (como no caso da coleta em favor da Igreja de Jerusalém – cf. 2 Cor 8,1-5). Paulo nutria pelos cristãos de Filipos um afeto especial; e os filipenses, por seu turno, tinham Paulo em grande apreço. Apesar de tudo, a comunidade cristã de Filipos não era perfeita: os altivos patrícios romanos de Filipos tinham alguma dificuldade em assumir certos valores como o desprendimento, a humildade e a simplicidade.

    Paulo escreve aos Filipenses numa altura em que estava na prisão (não sabemos se em Cesareia, em Roma, ou em Éfeso). Os filipenses tinham-lhe enviado, por um membro da comunidade chamado Epafrodito, uma certa quantia em dinheiro, a fim de que Paulo pudesse prover às suas necessidades. Na carta, Paulo agradece a preocupação dos filipenses com a sua pessoa (cf. Fl 4,10-20); exorta-os a manterem-se fiéis a Cristo e a incarnarem os valores que marcaram a vida de Cristo (“tende entre vós os mesmos sentimentos que estão em Cristo Jesus” – Fl 2,5).

    O texto que a liturgia do domingo de Ramos nos apresenta como segunda leitura é o texto mais notável da carta aos filipenses. Trata-se de um antigo hino, provavelmente pré-paulino, que era recitado nas celebrações litúrgicas cristãs (há quem fale, a propósito deste hino, na catequese primitiva de Simão Pedro, conservada na comunidade cristã de Antioquia da Síria). Lembra aos cristãos de Filipos o exemplo de Cristo, a sua humildade e despojamento.

     

    MENSAGEM

    Cristo Jesus – nomeado no princípio, no meio e no fim – constitui o motivo do hino. Os filipenses, enquanto discípulos de Cristo, são convidados a olhar para Ele e a conformarem as suas vidas com o Seu exemplo. Como é o exemplo de Cristo?

    O hino começa por aludir subtilmente ao contraste entre Adão e Cristo: Adão, o primeiro homem, reivindicou ser como Deus, assumiu diante de Deus uma atitude de arrogância e autossuficiência e virou as costas às indicações de Deus (cf. Gn 3,5.22); Cristo, o Homem Novo, assumiu uma atitude de humildade e obediência diante de Deus (vers. 6-7). A atitude de Adão trouxe sofrimento e morte; a atitude de Jesus trouxe exaltação e vida.

    A atitude de Cristo é caraterizada no hino como “aniquilação” ou “despojamento” (“kenosis” – vers. 7). Cristo era de condição divina; mas sem reivindicar, em razão do seu estatuto, quaisquer poderes ou privilégios, pôs-se totalmente ao serviço do projeto salvador do Pai. Aceitou, conforme o plano do Pai, vestir a fragilidade dos seres humanos e tornou-se homem: experimentou as dores e os limites dos homens, conviveu com os dramas dos homens e caminhou com os homens para lhes indicar o caminho que leva à salvação, fez-se servo dos homens, lavou-lhes os pés. Como se tudo isso não bastasse, desceu ainda mais: foi contestado, preso, condenado e sofreu uma morte infame na cruz, a morte reservada aos malditos e abandonados por Deus (vers. 8). Esta história de despojamento parece uma história de fracasso e de morte, uma história “pouco recomendável”. É assim que termina a história de quem obedece a Deus e põe a sua vida ao serviço do plano salvador de Deus?

    Não. Exatamente porque cumpriu plenamente o plano do Pai, Deus ressuscitou-O e exaltou-O. Fê-lo vencer a injustiça, o egoísmo e a violência que o tinham condenado a uma morte maldita. Apresentou-O como modelo para todos os homens. Mais: Deus fez dele o “Jesus” (o nome significa “Deus salva”) e o “Kyrios” (“Senhor” – nome que, no Antigo Testamento, substituía o nome impronunciável de Deus); e a humanidade inteira (“os céus, a terra e os infernos”) reconhece esse Cristo que se despojou de tudo para obedecer ao Pai como “o Senhor” que reina sobre toda a terra e que preside à história (vers. 9-11).

    Aos filipenses e aos crentes de todas as épocas e lugares Paulo diz: “libertai-vos do orgulho, da autossuficiência, da arrogância, do fechamento a Deus e às suas propostas; aprendei com Cristo a pôr a vossa vida ao serviço do plano de Deus; com humildade e simplicidade, tornai-vos servos de todos; amai sem medida, até ao dom total da vida. Deus garante-vos que esse caminho – o caminho que Cristo percorreu – não conduz ao aniquilamento, mas sim à glória, à Vida plena”.

     

    INTERPELAÇÕES

    • Não há mesmo volta a dar: a lógica de Deus funciona em sentido contrário à nossa lógica humana. Quanto mais nos despojamos da nossa superioridade, quanto mais renunciamos à capa da importância, quanto mais gastamos a nossa vida a fazer o bem, quanto mais nos fazemos “servos” dos nossos irmãos, quanto mais amamos sem esperar nada em troca, mais subimos na “escala” de Deus. Deus disse-nos isto, com todas as letras, através do seu Filho Jesus. De forma inequívoca, de forma irrefutável, com uma linguagem que só não entende quem não quer. Porque é que, depois de dois mil anos a olhar para a cruz de Jesus, isto ainda não é claro para nós? O que mais tem Deus de fazer para nos mostrar o caminho que conduz à Vida verdadeira?
    • Estamos a chegar ao fim deste caminho quaresmal. Este caminho foi efetivamente, para nós, um caminho de conversão, de mudança, de nascimento para uma vida nova? Ao longo deste caminho em direção à Páscoa transformamos a arrogância em humildade, a atitude de superioridade em respeito pelo outro, o orgulho em simplicidade, a soberba em delicadeza?
    • Este hino constitui uma excelente chave de leitura para interpretar, sentir e viver, na “Semana Maior” em que estamos a entrar, os acontecimentos centrais da nossa fé. Ao “som” deste belíssimo hino podemos compreender o caminho de Jesus, o significado das suas opções, o sentido da sua vida, da sua paixão, morte e ressurreição. Iremos procurar, nesta semana, acompanhar os passos de Jesus? E, ao revivermos o seu amor e a sua entrega, renovaremos a nossa adesão a Ele e ao caminho que Ele propõe?

     

    ACLAMAÇÃO ANTES DO EVANGELHO – Filip 2, 8-9

    (escolher um dos 7 refrães)

    1. Louvor e glória a Vós, Jesus Cristo, Senhor.
    2. Glória a Vós, Jesus Cristo, Sabedoria do Pai.
    3. Glória a Vós, Jesus Cristo, Palavra do Pai.
    4. Glória a Vós, Senhor, Filho do Deus vivo.
    5. Louvor a Vós, Jesus Cristo, Rei da eterna glória.
    6. Grandes e admiráveis são as vossas obras, Senhor.
    7. A salvação, a glória e o poder a Jesus Cristo, Nosso Senhor.

    Cristo obedeceu até à morte e morte de cruz.
    Por isso Deus O exaltou
    e Lhe deu um nome que está acima de todos os nomes.

     

    EVANGELHO – Marcos 14, 1 – 15,47

    N   Faltavam dois dias para a festa da Páscoa e dos Ázimos
    e os príncipes dos sacerdotes e os escribas
    procuravam maneira de se apoderarem de Jesus à traição
    para Lhe darem a morte.
    Mas diziam:

    R    «Durante a festa, não,
    para que não haja algum tumulto entre o povo».

    N   Jesus encontrava-Se em Betânia,
    em casa de Simão o Leproso,
    e, estando à mesa,
    veio uma mulher que trazia um vaso de alabastro
    com perfume de nardo puro de alto preço.
    Partiu o vaso de alabastro
    e derramou-o sobre a cabeça de Jesus.
    Alguns indignaram-se e diziam entre si:

    R    «Para que foi esse desperdício de perfume?
    Podia vender-se por mais de duzentos denários
    e dar o dinheiro aos pobres».

    N   E censuravam a mulher com aspereza.
    Mas Jesus disse:

    J     «Deixai-a. Porque estais a importuná-la?
    Ela fez uma boa ação para comigo.
    Na verdade, sempre tereis os pobres convosco
    e, quando quiserdes, podereis fazer-lhes bem;
    Mas a Mim, nem sempre Me tereis.
    Ela fez o que estava ao seu alcance:
    ungiu de antemão o meu corpo para a sepultura.
    Em verdade vos digo:
    Onde quer que se proclamar o Evangelho, pelo mundo inteiro,
    dir-se-á também em sua memória, o que ela fez».

    N   Então, Judas Iscariotes, um dos Doze,
    foi ter com os príncipes dos sacerdotes
    para lhes entregar Jesus.
    Quando o ouviram, alegraram-se
    e prometeram dar-lhe dinheiro.
    E ele procurava uma oportunidade para entregar Jesus.
    No primeiro dia dos Ázimos,
    em que se imolava o cordeiro pascal,
    os discípulos perguntaram a Jesus:

    R    «Onde queres que façamos os preparativos
    para comer a Páscoa?»

    N   Jesus enviou dois discípulos e disse-lhes:

    J     «Ide à cidade.
    Virá ao vosso encontro um homem com uma bilha de água.
    Segui-o e, onde ele entrar, dizei ao dono da casa:
    ‘O Mestre pergunta: Onde está a sala,
    em que hei de comer a Páscoa com os meus discípulos?’
    Ele vos mostrará uma grande sala no andar superior,
    alcatifada e pronta.
    Preparai-nos lá o que é preciso».

    N   Os discípulos partiram e foram à cidade.
    Encontraram tudo como Jesus lhes tinha dito
    e prepararam a Páscoa.
    Ao cair da tarde, chegou Jesus com os Doze.
    Enquanto estavam à mesa e comiam,
    Jesus disse:

    J     «Em verdade vos digo:
    Um de vós, que está comigo à mesa, há de entregar-Me».

    N   Eles começaram a entristecer-se e a dizer um após outro:

    R    «Serei eu?»

    N   Jesus respondeu-lhes:

    J     «É um dos Doze, que mete comigo a mão no prato.
    O Filho do homem vai partir,
    como está escrito a seu respeito,
    mas ai daquele por quem o Filho do homem vai ser traído!
    Teria sido melhor para esse homem não ter nascido».

    N   Enquanto comiam, Jesus tomou o pão,
    recitou a bênção e partiu-o,
    deu-o aos discípulos e disse:

    J     «Tomai: isto é o meu Corpo».

    N   Depois tomou um cálice, deu graças e entregou-lho.
    E todos beberam dele.
    Disse Jesus:

    J     «Este é o meu Sangue, o Sangue da nova aliança,
    derramado pela multidão dos homens.
    Em verdade vos digo:
    Não voltarei a beber do fruto da videira,
    até ao dia em que beberei do vinho novo no reino de Deus».

    N   Cantaram os salmos e saíram para o Monte das Oliveiras.
    Disse-lhes Jesus:

    J     «Todos vós Me abandonareis, como está escrito:
    ‘Ferirei o pastor e dispersar-se-ão as ovelhas’.
    Mas depois de ressuscitar,
    Irei à vossa frente para a Galileia».

    N   Disse-Lhe Pedro:

    R    «Embora todos te abandonem, eu não».

    N   Jesus respondeu-lhe:

    J     «Em verdade te digo:
    Hoje, esta mesma noite, antes do galo cantar duas vezes,
    três vezes Me negarás».

    N   Mas Pedro continuava a insistir:

    R    «Ainda que tenha de morrer contigo, não Te negarei».

    N   E todos afirmaram o mesmo.
    Entretanto, chegaram a uma propriedade chamada Getsémani
    e Jesus disse aos seus discípulos:

    J     «Ficai aqui, enquanto Eu vou orar».

    N   Tomou consigo Pedro, Tiago e João
    e começou a sentir pavor e angústia.
    Disse-lhes então:

    J     «A minha alma está numa tristeza de morte.
    Ficai aqui e vigiai».

    N   Adiantando-Se um pouco, caiu por terra
    e orou para que, se fosse possível,
    se afastasse d’Ele aquela hora.
    Jesus dizia:

    J     «Abba, Pai, tudo Te é possível:
    afasta de Mim este cálice.
    Contudo, não se faça o que Eu quero,
    mas o que Tu queres».

    N   Depois, foi ter com os discípulos, encontrando-os dormindo
    e disse a Pedro:

    J     «Simão, estás a dormir? Não pudeste vigiar uma hora?
    Vigiai e orai, para não entrardes em tentação.
    O espírito está pronto, mas a carne é fraca».

    N   Afastou-Se de novo e orou, dizendo as mesmas palavras.
    Voltou novamente e encontrou-os dormindo,
    porque tinham os olhos pesados
    e não sabiam que responder.
    Jesus voltou pela terceira vez e disse-lhes:

    J     «Dormi agora e descansai…
    Chegou a hora:
    o Filho do homem vai ser entregue às mãos dos pecadores.
    Levantai-vos. Vamos.
    Já se aproxima aquele que Me vai entregar».

    N   Ainda Jesus estava a falar,
    quando apareceu Judas, um dos Doze,
    e com ele uma grande multidão, com espadas e varapaus,
    enviada pelos príncipes dos sacerdotes,
    pelos escribas e os anciãos.
    O traidor tinha-lhes dado este sinal:
    «Aquele que eu beijar, é esse mesmo.
    Prendei-O e levai-O bem seguro».
    Logo que chegou, aproximou-se de Jesus e beijou-O, dizendo:

    R    «Mestre».

    N   Então deitaram-Lhe as mãos e prenderam-n’O.
    Um dos presentes puxou da espada
    e feriu o servo do sumo sacerdote, cortando-lhe a orelha.
    Jesus tomou a palavra e disse-lhes:

    J     «Vós saístes com espadas e varapaus para Me prender,
    como se fosse um salteador.
    Todos os dias Eu estava no meio de vós,
    a ensinar no templo,
    e não Me prendestes!
    Mas é para se cumprirem as Escrituras».

    N   Então os discípulos deixaram-n’O e fugiram todos.
    Seguiu-O um jovem, envolto apenas num lençol.
    Agarraram-no, mas ele, largando o lençol, fugiu nu.

    N   Levaram então Jesus à presença do sumo sacerdote,
    onde se reuniram todos os príncipes dos sacerdotes,
    os anciãos e os escribas.
    Pedro, que O seguira de longe,
    até ao interior do palácio do sumo sacerdote,
    estava sentado com os guardas, a aquecer-se ao lume.
    Entretanto, os príncipes dos sacerdotes e todo o Sinédrio
    procuravam um testemunho contra Jesus
    para Lhe dar a morte,
    mas não o encontravam.
    Muitos testemunhavam falsamente contra Ele,
    mas os seus depoimentos não eram concordes.
    Levantaram-se então alguns,
    para proferir contra Ele este falso testemunho:

    R    «Ouvimo-l’O dizer:
    ‘Destruirei este templo feito pelos homens
    e em três dias construirei outro
    que não será feito pelos homens’».

    N   Mas nem assim o depoimento deles era concorde.
    Então o sumo sacerdote levantou-se no meio de todos
    e perguntou a Jesus:

    R    «Não respondes nada ao que eles depõem contra Ti?»

    N   Mas Jesus continuava calado e nada respondeu.
    O sumo sacerdote voltou a interrogá-l’O:

    R    «És Tu o Messias, Filho do Deus Bendito?»

    N   Jesus respondeu:

    J     «Eu Sou. E vós vereis o Filho do homem
    sentado à direita do Todo-poderoso
    vir sobre as nuvens do céu».

    N   O sumo sacerdote rasgou as vestes e disse:

    R    «Que necessidade temos ainda de testemunhas?
    Ouvistes a blasfémia. Que vos parece?»

    N   Todos sentenciaram que Jesus era réu de morte.
    Depois, alguns começaram a cuspir-Lhe,
    a tapar-Lhe o rosto com um véu
    e a dar-Lhe punhadas, dizendo:

    R    «Adivinha».

    N   E os guardas davam-Lhe bofetadas.

    N   Pedro estava em baixo, no pátio,
    quando chegou uma das criadas do sumo sacerdote.
    Ao vê-lo a aquecer-se, olhou-o de frente e disse-lhe:

    R    «Tu também estavas com Jesus, o Nazareno».

    N   Mas ele negou:

    R    «Não sei nem entendo o que dizes».

    N   Depois saiu para o vestíbulo e o galo cantou.

    A    criada, vendo-o de novo, começou a dizer aos presentes:

    R    «Este é um deles».

    N   Mas ele negou segunda vez.
    Pouco depois, os presentes diziam também a Pedro:

    R    «Na verdade, tu és deles, pois também és galileu».

    N   Mas ele começou a dizer imprecações e a jurar:

    R    «Não conheço esse homem de quem falais».

    N   E logo o galo cantou pela segunda vez.
    Então Pedro lembrou-se do que Jesus lhe tinha dito:
    «Antes do galo cantar duas vezes,
    três vezes Me negarás».
    E desatou a chorar.

    N   Logo de manhã,
    os príncipes dos sacerdotes reuniram-se em conselho,
    com os anciãos e os escribas e todo o Sinédrio.
    Depois de terem manietado Jesus,
    foram entregá-l’O a Pilatos.
    Pilatos perguntou-Lhe:

    R    «Tu és o Rei dos judeus?»

    N   Jesus respondeu:

    J     «É como dizes».

    N   E os príncipes dos sacerdotes
    faziam muitas acusações contra Ele.
    Pilatos interrogou-O de novo:

    R    «Não respondes nada? Vê de quantas coisas Te acusam».

    N   Mas Jesus nada respondeu,
    de modo que Pilatos estava admirado.

    N   Pela festa da Páscoa,
    Pilatos costumava soltar-lhes um preso à sua escolha.
    Havia um, chamado Barrabás, preso com os insurretos,
    que numa revolta tinham cometido um assassínio.
    A multidão, subindo,
    começou a pedir o que era costume conceder-lhes.
    Pilatos respondeu:

    R    «Quereis que vos solte o Rei dos judeus?»

    N   Ele sabia que os príncipes dos sacerdotes
    O tinham entregado por inveja.
    Entretanto, os príncipes dos sacerdotes incitaram a multidão
    a pedir que lhes soltasse antes Barrabás.
    Pilatos, tomando de novo a palavra, perguntou-lhes:

    R    «Então, que hei de fazer d’Aquele
    que chamais o Rei dos judeus?»

    N   Eles gritaram de novo:

    R    «Crucifica-O!».

    N   Pilatos insistiu:

    R    «Que mal fez Ele?»

    N   Mas eles gritaram ainda mais:

    R    «Crucifica-O!».

    N   Então Pilatos, querendo contentar a multidão,
    soltou-lhes Barrabás
    e, depois de ter mandado açoitar Jesus,
    entregou-O para ser crucificado.
    Os soldados levaram-n’O para dentro do palácio,
    que era o pretório,
    e convocaram toda a coorte.
    Revestiram-n’O com um mando de púrpura
    e puseram-Lhe na cabeça uma coroa de espinhos
    que haviam tecido.
    Depois começaram a saudá-l’O:

    R    «Salvé, Rei dos judeus!»

    N   Batiam-lhe na cabeça com uma cana, cuspiam-Lhe
    e, dobrando os joelhos, prostravam-se diante d’Ele.
    Depois de O terem escarnecido,
    tiraram-Lhe o manto de púrpura
    e vestiram-Lhe as suas roupas.
    Em seguida levaram-n’O dali para O crucificarem.

    N   Requisitaram, para Lhe levar a cruz,
    um homem que passava, vindo do campo,
    Simão de Cirene, pai de Alexandre e Rufo.
    E levaram Jesus ao lugar do Gólgota,
    quer dizer, lugar do Calvário.
    Queriam dar-Lhe vinho misturado com mirra,
    mas Ele não o quis beber.
    Depois crucificaram-n’O.
    E repartiram entre si as suas vestes,
    tirando-as à sorte, para verem o que levaria cada um.
    Eram nove horas da manhã quando O crucificaram.
    O letreiro que indicava a causa da condenação tinha escrito:
    «Rei dos Judeus».
    Crucificaram com Ele dois salteadores,
    um à direita e outro à esquerda.
    Os que passavam insultavam-n’O
    e abanavam a cabeça, dizendo:

    R    «Tu que destruías o templo e o reedificavas em três dias,
    salva-Te a Ti mesmo e desce da cruz».

    N   Os príncipes dos sacerdotes e os escribas
    troçavam uns com os outros, dizendo:

    R    «Salvou os outros e não pode salvar-se a Si mesmo!
    Esse Messias, o Rei de Israel, desça agora da cruz,
    para nós vermos e acreditarmos».

    N   Até os que estavam crucificados com ele o injuriavam.
    Quando chegou o meio-dia,
    as trevas envolveram toda a terra até às três horas da tarde.
    E às três horas da tarde, Jesus clamou com voz forte:

    J     «Eloí, Eloí, lamá sabachtháni?»

    N   que quer dizer:
    «Meu Deus, meu Deus, porque Me abandonastes?»

    N   Alguns dos presentes, ouvindo isto, disseram:

    R    «Está a chamar por Elias».

    N   Alguém correu a embeber uma esponja em vinagre
    e, pondo-a na ponta duma cana, deu-Lhe a beber e disse:

    R    «Deixa ver se Elias vem tirá-l’O dali».

    N   Então Jesus, soltando um grande brado, expirou.

    N   O véu do templo rasgou-se em duas partes de alto a baixo.
    O centurião que estava em frente de Jesus,
    ao vê-l’O expirar daquela maneira, exclamou:

    R    «Na verdade, este homem era Filho de Deus».

    N   Estavam também ali umas mulheres a observar de longe,
    entre elas Maria Madalena,
    Maria, mãe de Tiago e de José, e Salomé,
    que acompanhavam e serviam Jesus,
    quando estava na Galileia,
    e muitas outras que tinham subido com ele a Jerusalém.
    Ao cair da tarde
    – visto ser a Preparação, isto é, a véspera do sábado –
    José de Arimateia, ilustre membro do Sinédrio,
    que também esperava o reino de Deus,
    foi corajosamente à presença de Pilatos
    e pediu-lhe o corpo de Jesus.
    Pilatos ficou admirado de Ele já estar morto
    e, mandando chamar o centurião,
    ordenou que o corpo fosse entregue e José.
    José comprou um lençol,
    desceu o corpo de Jesus e envolveu-O no lençol;
    depois depositou-O num sepulcro escavado na rocha
    e rolou uma pedra para a entrada do sepulcro.
    Entretanto, Maria Madalena e Maria, mãe de José,
    observavam onde Jesus tinha sido depositado.

     

    CONTEXTO

    Ao iniciarmos a Semana Santa, a Semana Maior, a liturgia convida-nos a escutar o impressionante relato da Paixão e Morte de Jesus. O relato, inegavelmente fundamentado em acontecimentos concretos, não é uma simples reportagem jornalística da condenação à morte de um inocente; mas é, sobretudo, uma catequese destinada a apresentar Jesus como o Filho de Deus que aceita cumprir o projeto do Pai, mesmo quando esse projeto passa por um destino de cruz. Marcos pretende que os crentes a quem a catequese se destina concluam, como o centurião romano que está junto da cruz e que vê como Jesus cumpriu o plano do Pai até à última gota de sangue: “na verdade, este homem era Filho de Deus” (Mc 15,39). Fica assim demonstrada a tese que Marcos, desde o início do Evangelho (cf. Mc 1,1), se propôs apresentar: Jesus, o Messias que anunciou o Reino de Deus e que os homens mataram na cruz, é o Filho de Deus.

    Betânia (onde Jesus foi ungido com perfume por uma mulher e de onde saiu para se dirigir a Jerusalém), o Cenáculo (o edifício com “uma grande sala no andar de cima, mobilada e pronta”, onde Jesus fez com os discípulos aquela inolvidável ceia de despedida), o Getsémani (o nome significa “lagar de azeite” e designava o jardim cheio de oliveiras para onde Jesus, após a última ceia, se retirou para rezar, e onde foi preso pelos guardas do Templo), o palácio do sumo-sacerdote Caifás (onde Jesus foi julgado, condenado pelo Sinédrio e ficou preso o resto da noite antes de ser levado diante das autoridades romanas), o pretório romano da Torre Antónia (onde estava a guarnição romana que vigiava o Templo, onde Jesus, na manhã de sexta-feira, foi torturado e coroado de espinhos e onde o governador Pilatos confirmou a sua condenação à morte), as ruas da cidade de Jerusalém (por onde Jesus passou, carregando com a trave transversal da cruz, segundo o ritual próprio das crucifixões), o Gólgota o (“lugar do crânio”, a pequena colina, fora da cidade onde Jesus, por volta das 9 horas de sexta-feira, foi crucificado), e o túmulo novo (situado num jardim ao lado do Gólgota, onde o corpo morto de Jesus foi depositado antes do pôr do sol de sexta-feira) são os cenários onde se desenrola a ação que o Evangelho deste dia nos apresenta.

    Em que data e em que contexto ocorreram os acontecimentos narrados no relato da paixão de Jesus? Todos os evangelistas concordam que Jesus celebrou uma ceia depois do pôr do sol de uma quinta-feira (quando, segundo o calendário religioso judaico já era sexta-feira) e que morreu na cruz por volta das três horas da tarde dessa sexta-feira. Para Marcos, Mateus e Lucas, contudo, essa sexta-feira era o dia da celebração da festa judaica da Páscoa. Assim, a última ceia de Jesus com os discípulos teria sido uma Ceia Pascal. João, no entanto, considera que a sexta-feira (dia em que Jesus morreu) não foi dia de Páscoa, mas sim o dia da preparação da Páscoa (o dia de Páscoa, nesse ano, começou na sexta-feira ao pôr do sol, quando Jesus já tinha morrido na cruz). Nesse caso, a última ceia de Jesus com os discípulos não teria sido uma Ceia Pascal, mas sim uma ceia de despedida. É difícil aceitar o calendário dos sinóticos, pois não parece provável que, em pleno dia de Páscoa, os judeus desenvolvessem o processo contra Jesus, o levassem pelas ruas de Jerusalém até ao Gólgota e o crucificassem. Sendo assim, Jesus teria sido crucificado na véspera da celebração da Páscoa judaica. Estaríamos, muito provavelmente, na primavera do ano 30. Jesus teria, então, 35-37 anos.

     

    MENSAGEM

    O relato da paixão e morte de Jesus é uma história de uma violência inaudita, perpetrada contra um homem que, na perspetiva daqueles que o conheceram bem e que o acompanharam desde a Galileia até Jerusalém, não fez nada para merecer a condenação decretada contra Ele. Como é que se chegou a este desfecho?

    A morte de Jesus tem de ser entendida no contexto daquilo que foi a sua vida. Desde cedo, Jesus apercebeu-Se de que o Pai O chamava a uma missão: anunciar um mundo novo, de justiça, de paz e de amor para todos os homens. Jesus chamava a esse mundo novo “o Reino de Deus”. Para concretizar este projeto, Jesus passou pelos caminhos da Palestina “fazendo o bem” e anunciando a proximidade do Reino de Deus. Ensinou que Deus era amor e que não excluía ninguém, nem mesmo os pecadores; ensinou que os leprosos, os paralíticos, os cegos não deviam ser marginalizados, pois não eram amaldiçoados por Deus; ensinou que eram os pobres e os excluídos os preferidos de Deus e aqueles que tinham um coração mais disponível para acolher o “Reino”; e avisou os “ricos” (os poderosos, os prepotentes, os instalados) de que o egoísmo, o orgulho, a autossuficiência e o fechamento só podiam conduzir à morte.

    O projeto libertador de Jesus entrou em choque – como era inevitável – com a atmosfera de egoísmo, de má vontade, de opressão que dominava o mundo. As autoridades políticas e religiosas judaicas sentiram-se incomodadas com a denúncia de Jesus: não estavam dispostas a renunciar a esses mecanismos que lhes asseguravam poder, influência, domínio, privilégios; não estavam dispostas a arriscar, a desinstalar-se e a aceitar a conversão proposta por Jesus. Por isso, decidiram calar Jesus: prenderam-n’O, julgaram-n’O, condenaram-n’O e pregaram-n’O numa cruz. A morte de Jesus é a consequência lógica do anúncio do “Reino”: resultou das tensões e resistências que a proposta do “Reino” provocou entre os que dominavam o mundo.

    Podemos também dizer que a morte de Jesus é o culminar da sua vida; é a afirmação última, porém mais radical e mais verdadeira (porque marcada com sangue), daquilo que Jesus pregou com palavras e com gestos: o amor, o dom total, o serviço simples e humilde. Foi por amor que Jesus lutou contra a injustiça, a prepotência, a opressão, a maldade nas suas mil e uma formas; foi por amor que Jesus Se deixou prender, condenar e matar; foi por amor que Jesus morreu na cruz. Quem olha para aquela cruz erguida numa colina fora das muralhas de Jerusalém e vê o testemunho que Jesus deixou, percebe como é que a vida deve ser vivida.

    Na cruz, vemos aparecer o Homem Novo, o protótipo do homem que ama radicalmente e que faz da sua vida um dom para todos. Assim, a cruz encerra e propõe o dinamismo de um mundo novo, de um mundo transformado pelo amor – o dinamismo do “Reino de Deus”. A cruz, instrumento vil de sofrimento e de morte, torna-se assim uma fonte de Vida e de esperança.

     

    No relato da Paixão na versão de Marcos, não difere substancialmente das versões de Mateus e de Lucas; no entanto, há algumas coordenadas que Marcos sublinha especialmente.

    1. Ao longo de todo o processo, Jesus manifesta uma grande serenidade, uma grande dignidade e uma total conformação com aquilo que se está a passar. Não se trata de passividade ou de inconsciência, mas de aceitação serena de um caminho que Ele sabe que passa pela cruz. Marcos sugere, desta forma, que Jesus está perfeitamente conformado com o projeto do Pai e que a sua vontade é cumprir fiel e integralmente o plano de Deus, sem objeções ou resistências de qualquer espécie. Esta “dignidade” de Jesus diante do processo que as autoridades religiosas e políticas lhe movem é atestada em várias cenas:

    - Mateus e Lucas põem Jesus a interpelar diretamente Judas, quando este o entrega no monte das Oliveiras (cf. Mt 26,50; Lc 22,48); mas na narração de Marcos, Jesus mantém-se silencioso e cheio de dignidade diante da traição do discípulo (cf. Mc 14,45-46), sem observações ou recriminações.

    - Mateus põe Jesus a desautorizar Pedro quando este fere um servo do sumo-sacerdote cortando-lhe uma orelha (cf. Mt 26,52) e, na narração de Lucas, Jesus pede aos discípulos que deixem atuar os seus sequestradores (cf. Lc 22,51); mas Marcos não apresenta, no mesmo episódio, qualquer reação de Jesus (cf. Mc 14,47). Marcos apenas acrescenta que a prisão de Jesus acontece para que se cumpram as Escrituras (cf. Mc 14,49).

    - No tribunal judaico, quando interrogado pelo sumo-sacerdote acerca das acusações que lhe eram feitas, Jesus manteve um silêncio solene e digno (cf. Mc 14,61a), recusando defender-Se das acusações dos seus detratores.

     

    2. Uma das teses fundamentais do Evangelho de Marcos é que Jesus é o Filho de Deus (cf. Mc 1,1). Esta ideia também está bem presente, bem sublinhada, bem desenvolvida, no relato da Paixão:

    - No jardim das Oliveiras, pouco antes de ser preso, Jesus dirige-Se a Deus (cf. Mc 14,36) e chama-Lhe “Abba” (“paizinho”, “papá”). Esta apalavra não era usada nas orações hebraicas como invocação de Deus; mas era usada na intimidade familiar e expressava a grande proximidade entre um filho e o seu pai. Para a psicologia judaica, teria sido um sinal de irreverência usar uma palavra tão familiar para se dirigir a Deus. O facto de Jesus usar esta palavra revela a comunhão que havia entre Ele e o Pai e revela uma relação marcada pela simplicidade, pela intimidade, pela total confiança.

    - Apesar do silêncio digno de Jesus durante o interrogatório no palácio do sumo-sacerdote, há um momento em que Jesus não hesita em esclarecer as coisas e em deixar clara a sua divindade. Quando o sumo-sacerdote Lhe perguntou diretamente se Ele era “o Messias, o Filho de Deus bendito” (Mc 14,61b), Jesus respondeu, sem subterfúgios: “Eu sou. E vereis o Filho do Homem sentado à direita do Todo-poderoso e vir sobre as nuvens do céu” (Mc 14,62). A expressão “eu sou” (“egô eimi”) leva-nos ao nome de Deus no Antigo Testamento (“eu sou aquele que sou” – Ex 3,14). É, na perspetiva do nosso evangelista, a afirmação inequívoca da dignidade divina de Jesus. A referência ao “sentar-se à direita do Todo-poderoso” e ao “vir sobre as nuvens” sublinha também a dignidade divina de Jesus, que um dia aparecerá no lugar de Deus, como juiz soberano da humanidade inteira. O sumo-sacerdote percebe perfeitamente o alcance da afirmação de Jesus (Ele está a arrogar-Se a condição de Filho de Deus e a prerrogativa divina de juiz universal); por isso, o sumo-sacerdote manifesta a sua indignação rasgando as vestes e condenando Jesus como blasfemo.

    - Marcos põe um centurião romano a dizer, junto da cruz de Jesus: “na verdade, este homem era Filho de Deus” (Mc 15,39). Mais do que uma afirmação histórica, esta frase deve ser vista como uma “profissão de fé” que Marcos convida todos os crentes a fazer. Depois de tudo o que foi testemunhado ao longo do Evangelho, em geral, e no relato da paixão, em particular, a conclusão é óbvia: Jesus é mesmo o Filho de Deus que veio ao encontro dos homens para lhes apresentar uma proposta de salvação.

     

    3. Apesar de Filho de Deus, o Jesus de Marcos é também homem e partilha da fragilidade da natureza humana:

    - No jardim das Oliveiras, pouco antes de ser preso, o Jesus de Marcos sentiu “pavor” e “angústia” (cf. Mc 14,33), como acontece com qualquer pessoa diante da morte violenta (Mateus é ligeiramente mais moderado e fala da “tristeza” e da “angústia” de Jesus – cf. Mt 26,37; e Lucas evita fazer qualquer referência a estes sentimentos que, sublinhando a dimensão humana de Jesus, podiam lançar dúvidas sobre a sua divindade).

    - No momento da morte, Jesus reza: “meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste” (Mc 15,34). A “oração” de Jesus é a “oração” de um homem que, como qualquer outro ser humano, experimenta a solidão, o abandono, o sentimento de impotência, a sensação de falhanço… e do fundo do seu drama, não compreende a ausência e a indiferença de Deus.

    Não há dúvida: o Jesus apresentado por Marcos é também o homem/Jesus que Se solidariza com os homens, que os acompanha nos seus sofrimentos, que experimenta os seus dramas, fragilidades e debilidades.

     

    4. Em todos os relatos da paixão, Jesus aparece a enfrentar sozinho (abandonado pelas multidões e pelos próprios discípulos) o seu destino de morte; mas Marcos sublinha especialmente a solidão de Jesus, nesses momentos dramáticos:

    - Lucas põe um anjo a confortar Jesus, no jardim das Oliveiras (cf. Lc 22,43); Marcos não faz qualquer referência a esse momento de “consolação.

    - Mateus conta que a mulher de Pilatos intercedeu por Jesus, pedindo ao marido que não se intrometesse “no caso desse justo” (cf. Mt 27,19); Marcos não refere nenhuma interferência deste tipo no processo de Jesus.

    - João refere, além de Pedro, a presença de um “outro discípulo conhecido do sumo-sacerdote” no palácio de Anás (Jo 18,15); Marcos, para além de Pedro (que negou Jesus três vezes), nunca refere a presença de qualquer outro dos discípulos.

    - Lucas fala na presença de mulheres, ao longo do caminho do calvário, que “batiam no peito e se lamentavam por Ele” (Lc 23,27-31); Marcos também não conhece ninguém que se lamentasse durante o caminho percorrido por Jesus em direção ao lugar da execução (só após a morte de Jesus, Marcos observa que algumas mulheres que O seguiam e serviam quando estava na Galileia estavam ali a “contemplar de longe” – Mc 15,40-41).

    Abandonado pelos discípulos, escarnecido pela multidão, condenado pelos líderes, torturado pelos soldados, Jesus percorre na solidão, no abandono, na indiferença de todos, o seu caminho de morte. O grito final de Jesus na cruz (“meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste” – Mc 15,34) pode ser o início do Salmo 22 (cf. Sal 22,2); mas é também expressão dramática dessa solidão que Jesus sente à sua volta.

     

    5. Só Marcos relata o episódio do jovem não identificado que seguia Jesus envolto apenas num lençol e que fugiu nu quando os guardas o tentaram agarrar (cf. Mc 14,51-52). Para alguns comentadores do Evangelho segundo Marcos, o jovem em causa poderia ser o próprio evangelista. Trata-se, no entanto, de uma simples conjetura. É mais provável que o episódio tenha sido introduzido por Marcos para representar plasticamente a atitude dos discípulos que, desiludidos e amedrontados diante do falhanço do projeto em que acreditaram, largaram tudo quando viram o seu líder ser preso e fugiram sem olhar para trás.

     

    INTERPELAÇÕES

    • Celebrar a paixão e a morte de Jesus é abismar-se na contemplação de um Deus a quem o amor tornou frágil… Por amor, Ele veio ao nosso encontro, assumiu os nossos limites e fragilidades, experimentou a fome, o sono, o cansaço, conheceu a mordedura das tentações, experimentou a angústia e o pavor diante da morte; e, estendido no chão, esmagado contra a terra, atraiçoado, abandonado, incompreendido, continuou a amar, até ao último suspiro, até à última gota de sangue. Esta é a mais espantosa história de amor que é possível contar; ela é a boa notícia que enche de alegria o coração dos crentes. É esse amor ilimitado e inacreditável que vemos quando olhamos para a cruz de Jesus? E o amor de Jesus, expresso na cruz, torna-se lição que nós acolhemos e que transformamos em gestos concretos de dom e de serviço aos que “viajam” connosco?
    • Contemplar a cruz onde se manifesta o amor e a entrega de Jesus significa assumir a mesma atitude que Ele assumiu e solidarizar-se com aqueles que são crucificados neste mundo: os que sofrem violência, os que são explorados, os que são excluídos, os que são privados de direitos e de dignidade. Olhar a cruz de Jesus significa denunciar tudo o que gera ódio, divisão, medo, em termos de estruturas, valores, práticas, ideologias; significa evitar que os homens continuem a crucificar outros homens; significa aprender com Jesus a entregar a vida por amor… Viver deste modo pode conduzir à morte; mas o cristão sabe que amar como Jesus é viver a partir de uma dinâmica que a morte não pode vencer: o amor gera vida nova e introduz na nossa carne os dinamismos da ressurreição. A contemplação da cruz de Jesus leva-nos ao compromisso com a transformação do mundo? A contemplação da cruz de Jesus faz com que nos sintamos solidários com todos os nossos irmãos que todos os dias são crucificados e injustiçados? A contemplação da cruz de Jesus dá-nos a coragem para lutarmos contra tudo aquilo que gera sofrimento e morte, mesmo que isso implique correr riscos, ser incompreendido e condenado?
    • Um dos elementos mais destacados no relato marciano da paixão é a forma como Jesus Se comporta ao longo de todo o processo que conduz à sua morte… Ele nunca Se descontrola, nunca recua, nunca resiste, mas mantém-Se sempre sereno e digno, enfrentando o seu destino de cruz. Tal não significa que Jesus seja um herói inconsciente a quem o sofrimento e a morte não assustam, ou que Ele Se coloque na pele de um fraco que desistiu de lutar e que aceita passivamente aquilo que os outros Lhe impõem… A atitude de Jesus é a atitude de quem sabe que o Pai Lhe confiou uma missão e está decidido a cumprir essa missão, custe o que custar. Temos a mesma disponibilidade de Jesus para escutar os desafios de Deus e a mesma determinação que Jesus tinha para concretizar esses desafios no mundo?
    • A “angústia” e o “pavor” de Jesus diante da morte tornam-n’O muito “humano”, muito próximo das nossas debilidades e fragilidades. Dessa forma, é mais fácil identificarmo-nos com Ele, confiar n’Ele, segui-l’O no seu caminho do amor e da entrega. A humanidade de Jesus mostra-nos, também, que o caminho da obediência ao Pai não é um caminho impossível, reservado a super-heróis ou a deuses, mas é um caminho de homens frágeis, chamados por Deus a percorrerem, com esforço, o caminho que conduz à vida definitiva. Quais são as fragilidades que sentimos e que são obstáculo no nosso seguimento de Jesus? Deixamos que as limitações – reais ou imaginárias – que sentimos sejam decisivas quando chega a hora de optarmos?
    • A solidão de Jesus diante do sofrimento e da morte anuncia já a solidão do discípulo que percorre o caminho da cruz. Quando o discípulo procura cumprir o projeto de Deus, recusa os valores do mundo, enfrenta as forças da opressão e da morte, recebe a indiferença e o desprezo do mundo e tem de percorrer o seu caminho na mais dramática solidão. O discípulo tem de saber, no entanto, que o caminho da cruz, apesar de difícil, doloroso e solitário, não é um caminho de fracasso e de morte, mas é um caminho de libertação e de vida plena. Estamos conscientes de que, quanto mais somos fiéis a Jesus e ao seu projeto, mais teremos de remar contra a corrente e de experimentar a solidão, o abandono e até a incompreensão dos que nos rodeiam? Estamos determinados, apesar disso, a seguir o caminho que Jesus nos aponta?
    • A figura do jovem que, no jardim das Oliveiras, deixou o lençol que o cobria nas mãos dos soldados e fugiu pode ser figura do discípulo que, amedrontado e desiludido, abandonou Jesus. Já alguma vez virámos as costas a Jesus e ao seu projeto, seduzidos por outras propostas?

     

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O DOMINGO DE RAMOS
    (adaptadas, em parte, de “Signes d’aujourd’hui”)

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.

    Ao longo dos dias da semana anterior ao Domingo de Ramos, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. BILHETE DE EVANGELHO.

    Quantas vezes a multidão estava perto de Jesus! Para O escutar, para beneficiar dos seus gestos, para cruzar o seu olhar, para aprender a rezar… A mesma multidão estende os mantos ou os ramos à passagem de Jesus e grita: “Hossana! Bendito o que vem em nome do Senhor! Bendito o Reino que vem! Hossana no mais alto dos céus!” Sabiam o que diziam, todos estes pobres que esperavam o Messias? Estavam prontos a reconhecer ainda como Rei aquele que teria como trono uma cruz e como coroa uma coroa de espinhos? O seu grito era uma aclamação, alguns dias mais tarde o seu grito será uma condenação: “Crucifica-O!” Chegou o tempo do silêncio que permite acolher o mistério, o mistério do Amor.

    3. À ECUTA DA PALAVRA.

    O grito na cruz… A multidão é versátil. Basta um orientador hábil para manipulá-la em qualquer sentido, o melhor e o pior. Houve o melhor, para Jesus, aquando da sua entrada em Jerusalém. Houve o pior, quando a multidão gritou: “Crucifica-O!” Pregado na cruz, Jesus gritará com uma voz forte: “Meu Deus, meu Deus, porque Me abandonaste?” É o início de um salmo, que termina com um cântico de esperança e de louvor. Então, diz-se, Jesus crucificado rezou todo este salmo. O seu grito não foi um grito de desespero. Foi o grito que os evangelistas retiveram e os assistentes (os Judeus, porque os soldados romanos não conheciam os salmos) compreenderam que Jesus chamava o profeta Elias em seu socorro. Eles não fizeram expressamente a ligação com o salmo. Em Jesus, é o Filho eterno do Pai que se fez homem, “em tudo semelhante aos seus irmãos, exceto no pecado”. Ele veio habitar o todo do humano. Era preciso que Jesus fosse até ao fim do caminho real dos homens: até à morte física, mas primeiro até à noite interior, onde não existe mais nada. Onde o silêncio de Deus parece ser a única resposta. Senão, os desesperos dos homens teriam escapado à presença de Deus. Eis porque, hoje, eu posso ir até Jesus com as minhas mais profundas obscuridades: Ele é capaz de vir com a sua presença, para que seja a vida, e não a morte, a vencer definitivamente!

    4. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE…

    Que esta semana seja “santa”… fixar alguns momentos precisos. É prudente, na vida trepidante que levamos, reservar na nossa agenda alguns encontros precisos que desejamos ter com o Senhor: em cada dia, viver com Ele um momento de oração, de meditação, de adoração; fixar as celebrações nas quais poderemos participar; prever serviços a prestar, as visitas, etc. Que a semana seja “santa” nos momentos quotidianos de encontro com Jesus Cristo!

     

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA

    Grupo Dinamizador:
    José Ornelas, Joaquim Garrido, Manuel Barbosa, Ricardo Freire, António Monteiro
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
    www.dehonianos.org

     

  • 01º Domingo da Páscoa - Ano B [atualizado]

    01º Domingo da Páscoa - Ano B [atualizado]

    31 de Março, 2024

    ANO B

    DOMINGO DE PÁSCOA

    Tema do Domingo de Páscoa

    A liturgia deste domingo celebra a ressurreição de Jesus. Proclama a vitória da Vida sobre a morte, do Amor sobre o ódio, do Bem sobre o mal, da Verdade sobre a mentira, da Luz sobre as trevas. Garante-nos que a morte não pode prender quem aceita fazer da própria vida um dom de amor. É do amor que nasce a Vida plena, a Vida em abundância, a Vida verdadeira e eterna.

    Na primeira leitura Pedro, em nome da comunidade, apresenta o exemplo de Cristo que “passou pelo mundo fazendo o bem” e que, por amor, fez da sua vida um dom total a Deus e aos homens. Por isso, Deus ressuscitou-O: o caminho que Jesus percorreu e propôs conduz à Vida. Os discípulos, testemunhas desta dinâmica, devem anunciar este “caminho” a todos os homens.

    O Evangelho convida-nos a olhar para o túmulo vazio de Jesus e a “acreditar”: o verdadeiro discípulo de Jesus, aquele que o conhece bem, que entende a sua proposta e está disposto a segui-l’O sabe que a forma como Ele viveu e amou não podia terminar no túmulo, no fracasso, no nada. Por isso, está sempre preparado para acolher a Boa notícia da ressurreição.

    A segunda leitura ensina que os cristãos, unidos a Cristo ressuscitado pelo batismo, morreram para o pecado e nasceram para a Vida nova. Ao longo da sua caminhada pelo mundo, devem dar testemunho dessa Vida nova nos seus gestos, no seu amor, no seu serviço a Deus e aos homens.

     

    LEITURA I – Atos dos Apóstolos 10,34.37-43

    Naqueles dias,
    Pedro tomou a palavra e disse:
    «Vós sabeis o que aconteceu em toda a Judeia,
    a começar pela Galileia,
    depois do batismo que João pregou:
    Deus ungiu com a força do Espírito Santo a Jesus de Nazaré,
    que passou fazendo o bem
    e curando a todos os que eram oprimidos pelo Demónio,
    porque Deus estava com Ele.
    Nós somos testemunhas de tudo o que Ele fez
    no país dos judeus e em Jerusalém;
    e eles mataram-n’O, suspendendo-O na cruz.
    Deus ressuscitou-O ao terceiro dia
    e permitiu-Lhe manifestar-Se, não a todo o povo,
    mas às testemunhas de antemão designadas por Deus,
    a nós que comemos e bebemos com Ele,
    depois de ter ressuscitado dos mortos.
    Jesus mandou-nos pregar ao povo
    e testemunhar que Ele foi constituído por Deus
    juiz dos vivos e dos mortos.
    É d’Ele que todos os profetas dão o seguinte testemunho:
    quem acredita n’Ele
    recebe pelo seu nome a remissão dos pecados.

     

    CONTEXTO

    Todos os anos a liturgia propõe-nos, ao longo dos domingos do tempo pascal, a leitura dos Atos dos Apóstolos. Obra de Lucas (que também foi o autor do 3.º Evangelho), os Atos é o livro “pascal” por excelência: conta-nos como os discípulos, depois de terem feito a experiência de encontro com o Ressuscitado e animados pelo Espírito que lhes foi enviado, abriram as portas da casa onde se encontravam escondidos e tornaram-se testemunhas de Jesus e do seu projeto. Deram assim cumprimento ao mandato que Jesus lhes tinha deixado quando se despediu deles e partiu ao encontro do Pai (cf. At 1,8).

    O “tempo” dos Atos é o “tempo” da Igreja (a comunidade que nasceu de Jesus e que continua a viver de Jesus) e o “tempo” do Espírito. Nesta nova fase da história da salvação, compete aos discípulos, animados e conduzidos pelo mesmo Espírito que ungiu Jesus e o acompanhava na sua missão, levarem ao mundo a salvação de Deus. Os discípulos são nesta nova fase, como Jesus o tinha sido enquanto andou pelas aldeias e vilas da Galileia, o rosto visível do Deus salvador e libertador. O seu testemunho deve percorrer um “caminho” que vai de Jerusalém – no Antigo Testamento, o lugar onde devia manifestar-se definitivamente a salvação de Deus – até “aos confins da terra”. É esse, precisamente, o “percurso” que o livro dos Atos nos apresenta.

    A execução de Estevão (um dos diáconos da Igreja de Jerusalém) e a perseguição que se abateu, logo depois, sobre os cristãos de Jerusalém fez com que diversos membros da comunidade saíssem da cidade e buscassem refúgio nas regiões vizinhas (cf. At 8,1). Assim, o Evangelho de Jesus chegou à Samaria, a Damasco e a Antioquia da Síria. Mais tarde, sobretudo por ação de Paulo, a Boa Nova de Jesus foi anunciada na Ásia Menor e na Grécia. Os Atos terminam com Paulo a chegar a Roma: o anúncio da salvação de Deus tinha alcançado o coração do mundo gentio; era uma proposta de salvação para todos os homens e mulheres que a quisessem acolher.

    Um dos episódios importantes desta saga missionária aconteceu em Cesareia Marítima (cf. At 10,24-48), a cidade da costa mediterrânica que era a sede do poder romano na Palestina. Os protagonistas desse episódio foram o apóstolo Pedro e um centurião romano chamado Cornélio. Pedro, convocado pelo Espírito (cf. At 10,19-20) e respondendo a um pedido de Cornélio (cf. At 10,22), foi a Cesareia, entrou em casa do centurião, expôs-lhe o essencial da fé cristã e batizou-o, bem como a toda a sua família (cf. At 10,23b-48). Cornélio foi o primeiro pagão a ser acolhido na Igreja de Jesus. É a primeira vez que um dos membros proeminentes da comunidade cristã (Pedro) admite que o Evangelho de Jesus é uma Boa Notícia destinada a todos os homens e mulheres, de todas as raças e culturas.

    O texto que, neste dia de Páscoa, nos é proposto como primeira leitura, é parte da “instrução” de Pedro a Cornélio e sua família. Trata-se de uma composição de Lucas onde aparecem os elementos fundamentais do kerigma cristão sobre Jesus.

     

    MENSAGEM

    Num breve resumo, Pedro “apresenta” Jesus a Cornélio e aos seus familiares. É um “primeiro anúncio”, que elenca as coordenadas fundamentais da vida e do caminho de Jesus.

    Pedro começa por testemunhar que Jesus foi “ungido” por Deus e recebeu o Espírito Santo quando foi batizado no rio Jordão (vers. 38a); na sequência dessa unção, Jesus assumiu a missão que Deus lhe confiou e, animado pela força do Espírito, andou de lugar em lugar “fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos pelo Mal, porque Deus estava com Ele” (vers. 38b). As forças do Mal, contudo, sentiram que Jesus as desafiava e decidiram calá-l’O: “mataram-n’O, suspendendo-O de um madeiro” (vers. 39b); mas Deus não aceitou que o seu “ungido” terminasse assim o seu caminho no meio dos homens e “ressuscitou-O ao terceiro dia” (vers. 40). Deus, ao ressuscitar Jesus, deu-Lhe razão e garantiu a veracidade do seu caminho e da sua proposta. Finalmente, Pedro tira as conclusões acerca da dimensão salvífica de tudo isto: a vida de Jesus, as opções de Jesus, as palavras de Jesus, os gestos de Jesus são fonte de Vida para todos aqueles que O conhecem e que decidem caminhar com Ele (vers. 43b: “quem acredita n’Ele, recebe, pelo seu nome, a remissão dos pecados”). Pedro conclui a sua reflexão atestando a veracidade de tudo o que acabou de proclamar sobre Jesus: “nós somos testemunhas de que tudo isto aconteceu”, de que foi assim que Jesus viveu e de que Deus O ressuscitou e O fez vencer todos aqueles que O quiseram calar e encerrar num túmulo (vers. 39a.41.42). Pedro e os outros discípulos garantem ao mundo que a história de Jesus não é uma fábula inventada, mas sim uma história de vida que eles conheceram, acompanharam e comprovaram.

    Estamos em dia de Páscoa, a celebrar a ressurreição de Jesus e a tentar perceber todo o alcance desse acontecimento. Repare-se como a ressurreição de Jesus não é apresentada, neste anúncio de Pedro, como um facto isolado, mas como o culminar de uma vida vivida na obediência ao Pai e na doação aos homens. Depois de Jesus ter passado pelo mundo “fazendo o bem e libertando todos os que eram oprimidos”, depois de Ele ter morrido na cruz como consequência desse “caminho”, Deus ressuscitou-O. A vida nova e plena que a ressurreição significa parece ser o ponto de chegada de uma existência posta ao serviço do projeto salvador e libertador de Deus. Por outro lado, esta vida vivida na entrega e no dom é uma proposta transformadora que, uma vez acolhida, liberta da escravidão do egoísmo e do pecado (vers. 43).

    Qual o papel dos discípulos no meio de tudo isto? Eles aderiram a Jesus e acolheram a sua proposta libertadora. Estão, portanto, a ressuscitar com Jesus. Compete-lhes serem testemunhas, diante dos homens e mulheres da terra inteira, de Jesus e da Vida nova que d’Ele receberam. É precisamente esse testemunho que Pedro dá diante de Cornélio e sua família.

     

    INTERPELAÇÕES

    • A ressurreição de Jesus é a consequência de uma vida gasta a “fazer o bem e a libertar os oprimidos”. Isso significa que, sempre que alguém – na linha de Jesus – se esforça por vencer o egoísmo, a mentira, a injustiça e por fazer triunfar o amor, está a ressuscitar; significa que, sempre que alguém – na linha de Jesus – se dá aos outros e manifesta, em gestos concretos, a sua entrega aos irmãos, está a construir vida nova e plena. Estamos a ressuscitar, porque caminhamos pelo mundo fazendo o bem e libertando os oprimidos, ou a nossa vida é um repisar os velhos esquemas do egoísmo, do orgulho, do comodismo?
    • A ressurreição de Jesus significa também que o medo, a morte, o sofrimento e a injustiça deixam de ter poder sobre a pessoa que ama, que se dá, que partilha a vida. Ela tem assegurada a Vida plena – essa Vida que os poderes do mundo não podem destruir, atingir ou restringir. Ela pode, assim, enfrentar o mundo com a serenidade que lhe vem da fé. Estamos conscientes disto, ou deixamo-nos dominar pelo medo, sempre que temos de agir para combater aquilo que rouba a vida e a dignidade, a nós e a cada um dos nossos irmãos?
    • Aos discípulos pede-se que sejam as testemunhas da ressurreição. Nós não vimos o sepulcro vazio; mas fazemos, todos os dias, a experiência do Senhor ressuscitado, que está vivo e caminha ao nosso lado nos caminhos da história. A nossa missão é testemunhar essa realidade; no entanto, o nosso testemunho será oco e vazio se não for comprovado pelo amor e pela doação, as marcas da vida nova de Jesus. O nosso testemunho da ressurreição é coerente e credível e traduz-se em gestos concretos de amor, de partilha, de serviço?

     

    SALMO RESPONSORIAL – Salmo 117 (118)

    Refrão 1: Este é o dia que o Senhor fez:
    exultemos e cantemos de alegria.

     

    Refrão 2: Aleluia.

    Dai graças ao Senhor, porque Ele é bom,
    porque é eterna a sua misericórdia.
    Diga a casa de Israel:
    é eterna a sua misericórdia.

    A mão do Senhor fez prodígios,
    a mão do Senhor foi magnífica.
    Não morrerei, mas hei de viver
    para anunciar as obras do Senhor.

    A pedra que os construtores rejeitaram
    tornou-se pedra angular.
    Tudo isto veio do Senhor:
    é admirável aos nossos olhos.

     

    LEITURA II – Colossenses 3,1-4

    Irmãos:
    Se ressuscitastes com Cristo,
    aspirai às coisas do alto,
    onde está Cristo, sentado à direita de Deus.
    Afeiçoai-vos às coisas do alto e não às da terra.
    Porque vós morrestes
    e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus.
    Quando Cristo, que é a vossa vida, Se manifestar,
    também vós vos haveis de manifestar com Ele na glória.

     

    CONTEXTO

    Colossos era uma cidade da antiga Frígia (Ásia Menor), situada a cerca de cento e oitenta quilómetros de Éfeso, a dezasseis de Laodiceia e a vinte de Hierápolis. Pertencia à Província romana da Ásia. Em tempos recuados tinha sido cidade rica e populosa; mas no tempo de Paulo tinha perdido o seu esplendor e importância.

    Não foi Paulo que evangelizou Colossos. Durante a longa estadia de Paulo em Éfeso, no decurso da sua terceira viagem, Epafras, discípulo de Paulo e colossense de origem (cf. Col 4,12), fundou a comunidade (cf. Col 1,7), ao mesmo tempo que as de Hierápolis e Laodiceia (cf. Col 4,13). A maior parte dos membros da comunidade cristã de Colossos tinham vindo do paganismo; mas havia também um bom grupo de judeo-cristãos.

    Quando escreveu a Carta aos Colossenses, Paulo estava na prisão (em Roma?). Epafras visitou-o e falou-lhe da “crise” por que estava a passar a Igreja de Colossos. Alguns doutores locais ensinavam doutrinas estranhas, que misturavam elementos cristãos, judaicos e pagãos: especulações acerca dos anjos (cf. Col 2,18), práticas ascéticas, rituais legalistas, prescrições sobre os alimentos e a observância de determinadas festas (cf. Col 2,16.21). Tudo isso deveria (na opinião desses “mestres”) completar a fé em Cristo, comunicar aos crentes um conhecimento superior de Deus e dos mistérios cristãos e possibilitar uma vida religiosa mais autêntica. Contra este sincretismo religioso, Paulo afirma a absoluta suficiência de Cristo: Ele é a imagem do Deus invisível, o primogénito de toda a criatura, o mediador da Criação, aquele que Deus enviou para reconciliar todas as coisas, a cabeça do Corpo que é a Igreja, o Senhor de todos os poderes e dominações (cf. Cl 1,15-20).

    O texto que a liturgia deste domingo de Páscoa nos propõe como segunda leitura é a introdução à reflexão moral da carta (cf. Col 3,1-4,6). Depois de apresentar a centralidade de Cristo no projeto salvador de Deus (cf. Col 1,13-2,23), Paulo recorda aos cristãos de Colossos que é preciso viver de forma coerente e verdadeira o compromisso assumido com Cristo.

     

    MENSAGEM

    Para Paulo, o ponto de partida e a base da vida cristã é a união a Cristo Ressuscitado. Essa união concretiza-se através do batismo. Quando somos batizados e nos unimos a Cristo, morremos para o pecado e ressuscitamos com Cristo para uma Vida nova, uma Vida plena e verdadeira. Essa Vida nova terá a sua plena concretização no mundo de Deus, quando ultrapassarmos as fronteiras da vida terrena e entrarmos na glória de Deus.

    Enquanto não acedemos à glória de Deus, continuamos o nosso caminho na terra; e essa Vida nova que recebemos a partir da nossa união com Cristo ressuscitado tem de manifestar-se já, aqui e agora, nos nossos gestos, nas nossas opções, nas nossas aspirações. Através de um processo de conversão que nunca está terminado, temos de nos ir despojando do nosso egoísmo, da nossa autossuficiência, da nossa arrogância, da nossa maldade (Paulo chama a isso “despir-se do homem velho) para passarmos a viver num dinamismo de amor, de serviço simples e humilde, de bondade, de misericórdia de mansidão, de dom da vida (Paulo chama a isso “revestir-se do Homem Novo”). Cristo ressuscitado, que venceu o pecado e a morte, será sempre a nossa referência e o nosso modelo de vida. Caminhamos na terra, mas de olhos postos no céu (“afeiçoai-vos às coisas do alto e não às da terra”).

    Desta opção por Cristo e desta união com Cristo ressuscitado resultam exigências práticas que Paulo vai enumerar, de forma bem concreta, nos versículos seguintes (cf. Col 3,5-4,1).

     

    INTERPELAÇÕES

    • O Batismo introduz-nos numa dinâmica de comunhão com Cristo ressuscitado. A partir do Batismo, Cristo passa a ser o centro e a referência fundamental à volta da qual se constrói toda a vida do crente. Qual o lugar que Cristo ocupa na nossa vida? Temos consciência de que o nosso Batismo significou um compromisso com Cristo e uma identificação com Cristo?
    • A identificação com Cristo implica o assumir uma dinâmica de Vida nova, despojada do pecado e feita doação a Deus e aos irmãos. O cristão torna-se então, verdadeiramente, alguém que “aspira às coisas do alto” – quer dizer, alguém que, embora vivendo nesta terra e desfrutando das realidades deste mundo, tem como referência última os valores de Deus. Não se pede ao crente que seja um alienado, alguém que viva a olhar para o céu e que se demita do compromisso com o mundo e com os irmãos; mas pede-se-lhe que não faça dos valores do mundo a sua prioridade, a sua referência última. A nossa vida tem sido uma caminhada coerente com essa dinâmica de Vida nova que começou no dia em que fomos batizados? Esforçamo-nos, realmente, por nos despojarmos do “homem velho” e por nos revestirmos do “Homem Novo”, do homem que se identifica com Cristo e que vive no amor, no serviço, na doação aos irmãos?
    • Paulo, a partir do exemplo de Cristo, garante-nos que esse caminho de despojamento do “homem velho” não é um caminho de derrota e de fracasso; mas é um caminho de glória, no qual se manifesta a realidade da Vida eterna, da Vida verdadeira. Neste dia de Páscoa, diante do túmulo vazio e da certeza de que Jesus triunfou da morte e do pecado, reconhecemos a verdade do testemunho de Paulo?
    • Quando, de alguma forma, estou envolvido na preparação ou na celebração do sacramento do Batismo, tenho consciência – e procuro passar essa mensagem – de que o sacramento não é um ato tradicional ou social (que, por acaso, até proporciona fotografias bonitas), mas um compromisso sério e exigente com Cristo?

     

    SEQUÊNCIA PASCAL

    À Vítima pascal
    ofereçam os cristãos
    sacrifícios de louvor.

    O Cordeiro resgatou as ovelhas:
    Cristo, o Inocente,
    reconciliou com o Pai os pecadores.

    A morte e a vida
    travaram um admirável combate:
    Depois de morto,
    vive e reina o Autor da vida.

    Diz-nos, Maria:
    Que viste no caminho?

    Vi o sepulcro de Cristo vivo
    e a glória do Ressuscitado.
    Vi as testemunhas dos Anjos,
    vi o sudário e a mortalha.

    Ressuscitou Cristo, minha esperança:
    precederá os seus discípulos na Galileia.

    Sabemos e acreditamos:
    Cristo ressuscitou dos mortos:
    Ó Rei vitorioso,
    tende piedade de nós.

     

    ALELUIA – 1 Coríntios 5,7b-8a

    Aleluia. Aleluia.

    Cristo, nosso Cordeiro pascal, foi imolado:
    celebremos a festa do Senhor.

     

    EVANGELHO – João 20,1-9

    No primeiro dia da semana,
    Maria Madalena foi de manhãzinha, ainda escuro, ao sepulcro
    e viu a pedra retirada do sepulcro.
    Correu então e foi ter com Simão Pedro
    e com o discípulo predileto de Jesus
    e disse-lhes:
    «Levaram o Senhor do sepulcro
    e não sabemos onde O puseram».
    Pedro partiu com o outro discípulo
    e foram ambos ao sepulcro.
    Corriam os dois juntos,
    mas o outro discípulo antecipou-se,
    correndo mais depressa do que Pedro,
    e chegou primeiro ao sepulcro.
    Debruçando-se, viu as ligaduras no chão, mas não entrou.
    Entretanto, chegou também Simão Pedro, que o seguira.
    Entrou no sepulcro
    e viu as ligaduras no chão
    e o sudário que tinha estado sobre a cabeça de Jesus,
    não com as ligaduras, mas enrolado à parte.
    Entrou também o outro discípulo
    que chegara primeiro ao sepulcro:
    viu e acreditou.
    Na verdade, ainda não tinham entendido a Escritura,
    segundo a qual Jesus devia ressuscitar dos mortos.

     

    CONTEXTO

    O Quarto Evangelho (cf. Jo 4,1-19,42) apresenta duas partes. Na primeira, João descreve a atividade criadora e vivificadora do Messias, no sentido de dar vida e de criar um Homem Novo – um homem livre da escravidão do egoísmo, do pecado e da morte (para João, o último passo dessa atividade destinada a fazer surgir o Homem Novo foi, precisamente, a morte na cruz: aí, Jesus apresentou a última e definitiva lição – a lição do amor total, que não guarda nada para si, mas faz da vida um dom radical ao Pai e aos irmãos). Na segunda parte do Evangelho (cf. Jo 20,1-31), João apresenta o resultado da ação de Jesus e mostra essa comunidade de Homens Novos, recriados e vivificados por Jesus, que com Ele aprenderam a amar com radicalidade e a quem Jesus abriu as portas da Vida definitiva. Trata-se dessa comunidade de homens e mulheres que se converteram e aderiram a Jesus e que, em cada dia – mesmo diante do sepulcro vazio – são convidados a manifestar a sua fé no Filho de Deus que “ergueu a sua tenda no meio dos homens” para lhes dar Vida em abundância.

    Jesus tinha sido crucificado na manhã de sexta-feira (por volta das nove horas) e tinha morrido na cruz por volta das três horas da tarde desse mesmo dia. No final da tarde, o seu corpo morto tinha sido descido da cruz e depositado, à pressa, num “túmulo novo”, situado num horto, perto do lugar da crucificação (cf. Jo 19,41). Como era habitual, na tradição judaica, uma pedra redonda tinha sido rolada para tapar a entrada do sepulcro. Os rituais fúnebres não tinham sido observados em pormenor, uma vez que nesse dia, ao pôr do sol, começava o sábado e também a celebração da Páscoa judaica (cf. Jo 19,42). Aqueles que lidaram com o sepultamento de Jesus queriam voltar a casa, rapidamente, porque queriam “comer a Páscoa”, nessa noite, em família. Precisavam de se afastar do corpo morto de Jesus para não ficarem “impuros” e serem ritualmente impedidos de celebrar a Páscoa.

    Passado o dia festivo da Páscoa, no “yom rishon”, o primeiro dia da semana, Maria Madalena – uma das mulheres que tinha seguido Jesus desde a Galileia até Jerusalém e que tinha estado junto da cruz de Jesus até à sua morte – dirigiu-se ao túmulo. Presumivelmente levava perfumes para ungir o corpo morto de Jesus (cf. Mc 16,1). Perguntava-se como iria conseguir afastar a enorme pedra que tinha sido rolada, na sexta-feira, para tapar a entrada do sepulcro de Jesus.

     

    MENSAGEM

    O relato joânico começa com uma indicação aparentemente cronológica, mas que deve ser entendida, sobretudo, em chave teológica: “no primeiro dia da semana”. Significa que aqui começa um novo ciclo – o da nova criação, o da libertação definitiva. Este é o “primeiro dia” de um novo tempo e de uma nova realidade – o tempo do Homem Novo, do Homem que nasceu a partir da ação criadora e vivificadora de Jesus.

    Nesse primeiro dia da semana, “de manhã cedo”, Maria Madalena dirige-se ao túmulo de Jesus. Maria Madalena representa, no Quarto Evangelho, a nova comunidade nascida da ação criadora e vivificadora do Messias. No entanto, para Maria Madalena “ainda estava escuro”: a comunidade nascida de Jesus estava convencida, nessa hora, de que a morte tinha triunfado e que Jesus estava prisioneiro do sepulcro. Era, portanto, uma comunidade perdida, desorientada, insegura, com medo, sem esperança.

    A primeira coisa que Maria Madalena vê, quando se aproxima, é que a pedra que fechava o sepulcro havia sido retirada. Essa pedra, colocada depois de o corpo morto de Jesus ter sido depositado no túmulo, assinalava a morte definitiva de Jesus. Estabelecia a separação entre o mundo dos vivos e o mundo dos mortos. Porque é que essa pedra foi retirada? Além disso, o túmulo está vazio. O que é que isso significa? Maria constata estes dados; mas não consegue perceber onde é que eles conduzem. Está desorientada e perplexa. Ainda está na escuridão. Não põe, nesse primeiro momento, a hipótese de a morte de Jesus não ser definitiva. Conclui apenas que alguém tinha retirado daquele túmulo o corpo morto de Jesus. A conclusão de Maria, a sua dificuldade em interpretar os sinais revela, provavelmente, a perplexidade e a confusão dos discípulos, nas primeiras horas da manhã de Páscoa, diante do túmulo vazio de Jesus. Só mais tarde, num desenvolvimento que a liturgia deste dia não conservou, Maria Madalena fará a experiência do encontro com Jesus ressuscitado e tornar-se-á testemunha da ressurreição (cf. Jo 20,11-18).

    Na sequência, João entende apresentar uma catequese sobre a dupla atitude dos discípulos diante do mistério da morte e da ressurreição de Jesus. Essa dupla atitude é expressa no comportamento dos dois discípulos que, na manhã da Páscoa, alertados por Maria Madalena para o facto de o corpo de Jesus ter desaparecido, correram ao túmulo: Simão Pedro e um “outro discípulo” não identificado (mas que parece ser esse “discípulo amado”, apresentado no Quarto Evangelho como o modelo ideal do discípulo).

    O “discípulo amado” é uma figura de proa no Evangelho segundo João. Na última ceia, foi ele que recebeu a confidência de Jesus sobre a traição de Judas (cf. Jo 13,23-26); na paixão, foi ele que conseguiu estar perto de Jesus no átrio do sumo sacerdote, enquanto Pedro O trai (cf. Jo 18,15-18.25-27); foi ele que esteve junto de Jesus, numa altura em que os outros discípulos estavam escondidos, cheios de medo (cf. Jo 19,25-27); foi ele que reconheceu Jesus ressuscitado naquele vulto que apareceu junto da praia no lago de Tiberíades, após uma noite inglória de pesca (cf. Jo 21,7). É um discípulo muito próximo de Jesus, com uma ligação e uma empatia especiais com Jesus. Nas cenas em que apareceu lado a lado com Pedro, o “discípulo amado” levou vantagem. Aqui, isso irá acontecer outra vez: ele correu mais e chegou ao túmulo primeiro que Pedro. Correu mais, porque amava mais; chegou primeiro, porque sempre esteve mais próximo de Jesus. No entanto, diz o texto, “não entrou”. Só avançou depois de Pedro ter entrada no sepulcro: ao ceder o passo a Pedro, mostra deferência e amor, que é o que se esperaria de alguém que tem uma forte ligação a Jesus. Este discípulo “viu e acreditou” (vers. 8). Viu os sinais, soube interpretá-los e o seu amor a Jesus levou-o a perceber que o Mestre tinha vencido a morte. Em contrapartida, não se diz o mesmo sobre Pedro.

    O que é que estas duas figuras de discípulo representam?

    Em geral, Pedro representa, nos Evangelhos, o discípulo obstinado, para quem a morte significa fracasso e que se recusa a aceitar que a Vida nova passe pela humilhação da cruz (Jo 13,6-8.36-38; 18,16.17.18.25-27; cf. Mc 8,32-33; Mt 16,22-23). Ele é, em várias situações, o discípulo que tem dificuldade em entender os valores que Jesus propõe, que raciocina de acordo com a lógica do mundo e que não entende que a Vida eterna e verdadeira possa brotar da cruz. Na sua perspetiva, Jesus fracassou, pois insistiu – contra toda a lógica – em servir e em dar a vida. Para ele, a doação e a entrega não podem conduzir à vitória, mas sim à derrota; portanto, Jesus morreu e o caso está encerrado. A eventual ressurreição de Jesus é, para alguém que vê as coisas dessa forma, uma hipótese absurda e sem sentido.

    Ao contrário, o “outro discípulo” – o “discípulo amado” – é aquele que está sempre próximo de Jesus, que se identifica com Jesus, que adere incondicionalmente aos valores de Jesus, que ama Jesus. Nessa comunhão e intimidade com Jesus, ele aprendeu e interiorizou a lógica de Jesus e percebeu que a doação e a entrega são um caminho de Vida. Para ele, faz todo o sentido que Jesus tenha ressuscitado, pois a vitória sobre a morte é o resultado lógico do dom da vida, do amor até ao extremo.

    Esse “outro discípulo” é, portanto, a imagem do discípulo ideal, que está em sintonia total com Jesus, que percebe e aceita os valores de Jesus, que está disposto a embarcar com Jesus na lógica do amor e do dom da vida, que corre ao encontro de Jesus com um total empenho, que compreende os sinais da ressurreição e que descobre – porque o amor leva à descoberta – que Jesus está vivo. Ele é o paradigma do Homem Novo, do homem recriado por Jesus.

     

    INTERPELAÇÕES

    • A ressurreição de Jesus é a resposta de Deus aos que pretenderam, de forma injusta e criminosa, calar Jesus e banir da história o seu projeto do Reino de Deus. Deus não permitiu que o mal vencesse; Deus não permitiu que a violência, a injustiça, a maldade e a morte tivessem a última palavra; Deus não aceitou que o mundo ficasse refém daqueles que queriam continuar a viver na escuridão. Ao ressuscitar Jesus, Deus deu-Lhe razão; afirmou, alto e bom som, que o caminho proposto por Jesus – o do amor que se dá até às últimas consequências, o do serviço simples e humilde aos irmãos, o do perdão sem limites – é o caminho que leva à Vida. Neste dia de Páscoa, diante do túmulo de Jesus vazio, tenho alguma dúvida em abraçar tudo aquilo que Jesus me disse, com as suas palavras e com os seus gestos, sobre a forma de chegar à Vida definitiva, à Vida eterna?
    • A vitória de Jesus sobre o egoísmo, a violência, a maldade e a morte muda a nossa perspetiva sobre a forma de encarar tudo aquilo que, de forma objetiva, faz sofrer os homens e mulheres que caminham ao nosso lado. Ficar do lado dos que são magoados e crucificados, combater a injustiça e a opressão nas suas mil e uma formas, gastar a vida a servir os mais frágeis e abandonados, recusar um mundo que se constrói sobre violência e prepotência, lutar até ao dom da própria vida para vencer tudo o que gera morte não é algo absurdo. É, segundo Deus, o caminho que fará com que a nossa vida valha a pena e tenha pleno sentido. Talvez essa opção nos deixe cheios de feridas e cicatrizes; mas serão feridas e cicatrizes que Deus curará. Estamos dispostos a dar a vida para que outros tenham Vida? Estamos dispostos a correr riscos para levar a libertação ao mundo e aos nossos irmãos? Cremos firmemente, com toda a nossa alma e com todas as nossas forças, que uma vida gasta a servir não é uma vida fracassada, mas é uma vida que termina em ressurreição?
    • Pedro parece ter sentido dificuldade, diante do túmulo vazio, em “acreditar” que Jesus estivesse vivo e que aquele caminho de cruz tivesse conduzido à Vida. Na verdade, em muitos passos do caminho que percorreu com Jesus, Pedro manifestou dificuldade em sintonizar com Jesus e com a sua lógica. Ele estava habituado a funcionar de acordo com outros valores e padrões, numa lógica muito “do mundo”. Os interesses de Pedro nem sempre coincidiam com a visão de Jesus. Parece estranho, para alguém que andava com Jesus? Teoricamente, sim. Na prática, talvez reconheçamos, nas hesitações e recusas de Pedro, as nossas indecisões, a nossa dificuldade em arriscar, a nossa dificuldade em abandonarmos os critérios “do mundo” para abraçarmos a lógica de Deus. Será assim? O que podemos fazer para sermos menos “Pedro” e mais discípulos que vão, sem hesitar, atrás de Jesus?
    • A fotografia que o evangelista João nos apresenta do “discípulo predileto” é a fotografia de um discípulo que vive em comunhão com Jesus, que se identifica com Jesus e com os seus valores, que interiorizou e absorveu a lógica da entrega incondicional, do dom da vida, do amor total. Por isso, não tem qualquer problema em aceitar que o caminho seguido por Jesus conduz à ressurreição, à Vida nova. Ele “acredita” em Jesus. Revemo-nos nesta figura? Vemo-la como uma proposta com a qual gostaríamos de nos identificar? O que podemos fazer para sermos verdadeiramente “discípulo predileto”?
    • A ressurreição de Jesus é a vitória da Vida sobre a morte, da verdade sobre a mentira, da esperança sobre o desespero, da justiça sobre a injustiça, da alegria sobre a tristeza, da luz sobre as trevas. Abre-nos perspetivas completamente novas e garante-nos o triunfo de Deus sobre as forças que querem destruir o mundo e os homens. Nós, que acreditamos e celebramos a ressurreição de Jesus, somos testemunhas da vitória da Vida junto dos nossos irmãos paralisados pelo medo e pelo pessimismo? A mensagem que levamos ao mundo é uma mensagem de alegria e de esperança que tem as cores da manhã de Páscoa?

     

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O DOMINGO DE PÁSCOA
    (adaptadas, em parte, de “Signes d’aujourd’hui”)

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.

    Ao longo dos dias da semana anterior ao Domingo de Páscoa, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus… Aproveitar, sobretudo, a Semana Santa para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. BILHETE DE EVANGELHO.

    Demos a morte àquele que, com um olhar, dava dignidade aos feridos da vida, então Maria Madalena reconhece-O quando Ele a chama pelo seu nome. Demos a morte àquele que tinha falado do amor como de um dom, então Tomé reconhece-O nas suas feridas, provas do dom da sua vida. Demos a morte àquele que tinha declarado “felizes os construtores de paz”, então os discípulos reconhecem-n’O na sua saudação: “A paz esteja convosco!” Demos a morte àquele que tinha partilhado o pão, então dois dos seus discípulos reconhecem-n’O no gesto da fração do pão a caminho de Emaús. A morte não teve a última palavra. Doravante, quem terá a última palavra é a Vida, o Amor, a Paz, a Fé. Tal é na nossa esperança.

    3. À ECUTA DA PALAVRA.

    “Ele viu e acreditou”. O discípulo que Jesus amava viu aquilo que Simão Pedro via: um túmulo vazio, com as ligaduras e o sudário… Mas João crê. Porquê esta diferença na atitude dos dois discípulos? O amor de Pedro por Jesus era grande. Mas com a tríplice negação, o seu amor tinha necessidade de ser confirmado, purificado, perdoado. João, ele, o único entre os apóstolos, ficou até ao fim. Deixou-se invadir por um amor sem falhas. Na última Ceia, tinha sentido bater mais perto o coração do Senhor. Diante do túmulo vazio, ele sabe que se trata de algo de infinitamente mais misterioso, mais decisivo. Muitos homens não tiveram fé no testemunho dos apóstolos. É este amor que nos faz ver para lá das aparências e que queimava o coração de João. “Para vós, pergunta-nos sempre Jesus, quem sou Eu?”

    4. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE…

    Falar verdade… Uma maneira simples de testemunhar a nossa fé na ressurreição de Cristo no “primeiro dia da semana” seria, para nós cristãos, não falar mais de fim da semana! Porque, evidentemente, o domingo não é o fim da semana, mas o seu começo. O domingo é o primeiro dia, o dia do Senhor. Então, podemos habituar-nos a falar em “início de semana” em vez de “fim de semana”.

     

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS

    PROPOSTA PARA ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA
    Grupo Dinamizador:

    José Ornelas, Joaquim Garrido, Manuel Barbosa, Ricardo Freire, António Monteiro
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
    www.dehonianos.org

     

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