Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus – Ano C
1 de Janeiro, 2022
ANO C
SOLENIDADE DE SANTA MARIA, MÃE DE DEUS
Dia Mundial da Paz
Tema da Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus
Neste dia, a liturgia coloca-nos diante de evocações diversas, ainda que todas importantes.
Celebra-se, em primeiro lugar, a Solenidade da Mãe de Deus: somos convidados a olhar a figura de Maria, aquela que, com o seu sim ao projecto de Deus, nos ofereceu a figura de Jesus, o nosso libertador. Celebra-se, em segundo lugar, o Dia Mundial da Paz: em 1968, o Papa Paulo VI quis que, neste dia, os cristãos rezassem pela paz. Celebra-se, finalmente, o primeiro dia do ano civil: é o início de uma caminhada percorrida de mãos dadas com esse Deus que nunca nos deixa, mas que em cada dia nos cumula da sua bênção e nos oferece a vida em plenitude. As leituras de hoje exploram, portanto, diversas coordenadas. Elas têm a ver com esta multiplicidade de evocações.
Na primeira leitura, sublinha-se a dimensão da presença contínua de Deus na nossa caminhada, como bênção que nos proporciona a vida em plenitude.
Na segunda leitura, a liturgia evoca outra vez o amor de Deus, que enviou o seu “Filho” ao nosso encontro, a fim de nos libertar da escravidão da Lei e nos tornar seus “filhos”. É nessa situação privilegiada de “filhos” livres e amados que podemos dirigir-nos a Deus e chamar-Lhe “papá”.
O Evangelho mostra como a chegada do projecto libertador de Deus (que veio ao nosso encontro em Jesus) provoca alegria e contentamento por parte daqueles que não têm outra possibilidade de acesso à salvação: os pobres e os débeis. Convida-nos, também, a louvar a Deus pelo seu cuidado e amor e a testemunhar a libertação de Deus aos homens.
Maria, a mulher que proporcionou o nosso encontro com Jesus, é o modelo do crente que é sensível ao projecto de Deus, que sabe ler os seus sinais na história, que aceita acolher a proposta de Deus no coração e que colabora com Deus na concretização do projecto divino de salvação para o mundo.
LEITURA I – Num 6,22-27
Leitura do Livro dos Números
O Senhor disse a Moisés:
«Fala a Aarão e aos seus filhos e diz-lhes:
Assim abençoareis os filhos de Israel, dizendo:
‘O Senhor te abençoe e te proteja.
O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face
e te seja favorável.
O Senhor volte para ti os seus olhos
e te conceda a paz’.
Assim invocarão o meu nome sobre os filhos de Israel
e Eu os abençoarei».
AMBIENTE
O texto da leitura que nos é proposta é retirado da primeira parte do Livro dos Números. No contexto das últimas instruções de Jahwéh a Moisés antes de os filhos de Israel deixarem o Sinai, apresenta-se uma “bênção” que os “filhos de Aarão” (sacerdotes) deviam pronunciar sobre a comunidade do Povo de Deus. Provavelmente, trata-se de uma fórmula litúrgica utilizada no Templo de Jerusalém para abençoar a comunidade, no final das funções litúrgicas e que aqui é apresentada como um dom de Deus no Sinai.
A “bênção” (“beraka”) é concebida como uma comunicação de vida, real e eficaz, que atinge o “abençoado” e que lhe traz vigor, força, êxito, felicidade. É um dom que, uma vez pronunciado, não pode ser retirado nem anulado. Aqui, essa comunicação de vida, fruto da generosidade de Deus, derrama-se sobre os membros da comunidade por intermédio dos sacerdotes – no Antigo Testamento, os intermediários entre o mundo de Jahwéh e a comunidade israelita.
MENSAGEM
Esta “bênção” apresenta-se numa tríplice fórmula, sempre em crescendo de versículo para versículo (no texto hebraico, a primeira fórmula tem três palavras; a segunda, cinco; a terceira, sete). Em cada uma das fórmulas, é pronunciado o nome de Jahwéh… Ora, pronunciar três vezes o nome do Deus da aliança é dar uma nova actualidade à aliança, às suas promessas e às suas exigências; é lembrar aos israelitas que é do Deus da aliança que recebem a vida, nas suas múltiplas manifestações e que tudo é um dom de Deus.
A cada uma das invocações correspondem dois pedidos de bênção: que Jahwéh te abençoe (isto é, que te comunique a sua vida) e te proteja; que Jahwéh faça brilhar sobre ti a sua face (hebraísmo que se pode traduzir como “que te mostre um rosto sorridente”) e te conceda a sua graça; que Jahwéh dirija para ti o seu olhar (hebraísmo que significa “olhar-te com benevolência”, “acolher-te”) e te conceda a paz (“shalom”, no sentido de plenitude da felicidade).
Este texto lembra ao israelita que tudo é dom do amor de Jahwéh e que o Deus da aliança está ao lado do seu Povo em cada dia do ano, oferecendo-lhe a vida plena e a felicidade em abundância.
ACTUALIZAÇÃO
Na reflexão, ter em conta os seguintes elementos:
¨ A primeira linha de reflexão pode ir para a constatação da generosidade do nosso Deus, que não nos abandona nunca, mas continua a criar-nos continuamente, derramando sobre nós a plenitude da vida e da felicidade.
¨ É de Deus que tudo recebemos: vida, força e aquelas mil e uma pequeninas coisas que enchem a nossa vida e que nos dão instantes plenos. Tendo consciência dessa presença contínua de Deus ao nosso lado, somos gratos por isso? No nosso diálogo com Ele, sentimos a necessidade de O louvar e de Lhe agradecer por tudo o que Ele coloca na nossa existência? Agradecemos todos os seus dons no ano que acaba de terminar?
¨ É preciso ter consciência de que a “bênção” de Deus não cai do céu como uma chuva mágica que nos molha, quer queiramos, quer não (magia e Deus não combinam); mas a vida de Deus, derramada sobre nós continuamente, tem de ser acolhida no coração com amor e gratidão e, depois, transformada em gestos concretos de amor e de paz. É com o nosso “sim” que a vida de Deus nos atinge.
SALMO RESPONSORIAL – Salmo 66 (67)
Refrão: Deus Se compadeça de nós
e nos dê a sua bênção.
Deus Se compadeça de nós e nos dê a sua bênção,
resplandeça sobre nós a luz do seu rosto.
Na terra se conhecerão os seus caminhos
e entre os povos a sua salvação.
Alegrem-se e exultem as nações,
porque julgais os povos com justiça
e governais as nações sobre a terra.
Os povos Vos louvem, ó Deus,
todos os povos Vos louvem.
Deus nos dê a sua bênção
e chegue o seu temor aos confins da terra.
LEITURA II – Gal 4,4-7
Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Gálatas
Irmãos:
Quando ch
egou a plenitude dos tempos,
Deus enviou o seu Filho,
nascido de uma mulher e sujeito à Lei,
para resgatar os que estavam sujeitos à Lei
e nos tornar seus filhos adoptivos.
E porque sois filhos,
Deus enviou aos nossos corações
o Espírito de seu Filho, que clama:
«Abbá! Pai!».
Assim, já não és escravo, mas filho.
E, se és filho, também és herdeiro, por graça de Deus.
AMBIENTE
O contexto em que Paulo escreve a Carta aos Gálatas é o de uma profunda crise de identidade das Igrejas da Galácia. À região gálata (centro da Ásia Menor) tinham chegado pregadores que acusavam Paulo de não pregar o verdadeiro Evangelho e que exigiam aos Gálatas a observância fiel da Lei de Moisés, nomeadamente o rito da circuncisão. Estes “pregadores”, oriundos das comunidades judeo-cristãs da Palestina, são conhecidos na história do cristianismo primitivo como “judaizantes”.
Paulo percebe o mal que estes “pregadores” estão a fazer. Eles pretendem transformar o cristianismo numa religião de ritos, num cumprimento de regras externas, numa escravatura a rituais que não tinham nada a ver com a proposta libertadora de Cristo. De forma dura, ele convida os Gálatas a fazer a sua escolha: ou pela escravidão da Lei, ou pela liberdade que Cristo veio trazer.
No texto que nos é proposto, Paulo recorda aos Gálatas a incarnação de Cristo e o objectivo da sua vinda ao mundo: fazer de nós “filhos de Deus” livres.
MENSAGEM
Os versículos apresentados como segunda leitura constituem um dos pontos altos da Carta aos Gálatas. Neles, Paulo pretende recordar aos habitantes da Galácia algo fundamental: Cristo veio a este mundo para os libertar, definitivamente, do jugo da Lei… Assim, já não são escravos, mas “filhos” que partilham a vida de Deus.
A palavra-chave é a palavra “filho”, aplicada tanto a Cristo como aos cristãos. Cristo, o “Filho”, veio ao mundo com uma missão concreta: libertar os homens do jugo da Lei, identificá-los consigo. Ora, é em consequência da acção libertadora de Deus em Jesus que os homens deixam de ser escravos para se tornarem “filhos”.
Assim, têm o direito de chamar a Deus “abba” (papá”). Paulo utiliza esta palavra aqui, bem como na Carta aos Romanos, apesar de os judeus nunca designarem Deus desta forma. A insistência de Paulo nesta palavra deve ter a ver com o Jesus histórico: Jesus adoptou esta palavra para expressar a sua confiança filial em Deus e a sua entrega total à sua causa.
Gal 4,4 é o único lugar em que Paulo faz referência à mãe de Jesus. No entanto, Paulo não parece estar interessado em falar de Nossa Senhora, mas antes em sublinhar a solidariedade de Cristo com todo o género humano.
ACTUALIZAÇÃO
Na reflexão deste texto, podem tocar-se os seguintes pontos:
¨ A experiência cristã é, fundamentalmente, uma experiência de encontro com um Deus que é “abba” – isto é, que é um “papá” muito próximo, com quem nos identificamos, a quem amamos e em quem confiamos plenamente. É esta proximidade libertadora e confiante que temos com o nosso Deus?
¨ A nossa experiência cristã leva-nos a sentirmo-nos “filhos” amados, ou ao cumprimento de regras e de obrigações? Na Igreja, não se põe, às vezes, ênfase em cumprir determinados ritos externos, esquecendo o essencial – a experiência de “filhos” livres de Deus?
¨ A importante constatação de que somos “filhos” de Deus leva-nos a uma descoberta fundamental: estamos unidos a todos os outros homens – filhos de Deus como nós – por laços fraternos. É a mesma vida de Deus que circula em todos nós… O que é que esta constatação implica, em termos concretos? O que é que isto significa, no que diz respeito à relação que nos deve ligar com os outros? Faz algum sentido marginalizar alguém por causa da sua raça ou do seu estatuto social?
ALELUIA – Hebr 1,1-2
Aleluia. Aleluia.
Muitas vezes e de muitos modos
falou Deus antigamente aos nossos pais pelos Profetas.
Nestes dias, que são os últimos,
Deus falou-nos por seu Filho.
EVANGELHO – Lc 2, 16-21
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
Naquele tempo,
os pastores dirigiram-se apressadamente para Belém
e encontraram Maria, José
e o Menino deitado na manjedoura.
Quando O viram,
começaram a contar o que lhes tinham anunciado
sobre aquele Menino.
E todos os que ouviam
admiravam-se do que os pastores diziam.
Maria conservava todos estes acontecimentos,
meditando-os em seu coração.
Os pastores regressaram,
glorificando e louvando a Deus
por tudo o que tinham ouvido e visto,
como lhes tinha sido anunciado.
Quando se completaram os oito dias
para o Menino ser circuncidado,
deram-Lhe o nome de Jesus,
indicado pelo Anjo,
antes de ter sido concebido no seio materno.
AMBIENTE
O texto do Evangelho de hoje é a continuação daquele que foi lido na noite de Natal: após o anúncio do “anjo do Senhor” (noite de Natal), os pastores dirigem-se a Belém e encontram o menino. Mais uma vez, Lucas não está interessado em fazer a reportagem do nascimento de Jesus e das “visitas” que, então, o menino de Belém recebeu, mas antes em apresentar Jesus como o libertador, que veio ao mundo com uma mensagem de salvação para todos os homens – e, especialmente, para os pobres e marginalizados, aqui representados pela classe dos pastores.
MENSAGEM
Os pastores – classe marginalizada de “pecadores”, afastados da salvação de Deus – são os primeiros a quem se revela a boa notícia do nascimento de Jesus. Todo o texto gira à volta da apresentação de Jesus como o Messias libertador, o autêntico libertador dos débeis e dos pobres.
Em primeiro lugar, repare-se como os pastores se dirigem “apressadamente” ao encontro do menino. A palavra “apressadamente” sublinha a ânsia com que os pobres e débeis esperam a acção de Deus em seu favor. Aqueles que vivem numa situação intolerável de sofrimento e de opressão reconhecem que, com Jesus, chegou o momento da libertação e apressam-se a ir ao seu encontro.
Em segundo lugar, repare-se na forma como os pastores reagem ao encontro com Jesus: glorificam e louvam a Deus por tudo o que tinham visto e ouvido: é a alegria pela libertação que se converte em acção de graças ao Deus libertador. Também se tornam porta-vozes desse anúncio libertador, provocando a admiração de quantos tomavam contacto com o seu testemunho.
Finalmente, atentemos na atitude de Maria: ela “conservava todas estas palavras, meditando-as no seu coração”. É a atitude de quem é capaz de abismar-se com as acções do Deus
libertador, com o amor que Ele manifesta nos seus gestos em favor dos homens. “Observar”, “conservar” e “meditar” significa ter a sensibilidade para entender os sinais de Deus e ter a sabedoria da fé para saber lê-los à luz do plano de Deus. É precisamente isso que faziam os profetas.
A atitude meditativa de Maria, que interioriza e aprofunda os acontecimentos, complementa a atitude “missionária” dos pastores, que proclamam a acção salvadora de Deus manifestada no nascimento de Jesus. Estas duas atitudes dão-nos um bom retrato daquilo que deve ser a existência crente.
ACTUALIZAÇÃO
Na reflexão, considerar os seguintes dados:
¨ Mais uma vez fica claro, neste texto, o projecto que Deus tem para a humanidade, em Jesus: apresentar-nos uma proposta libertadora, que nos leve a superar a nossa fragilidade e debilidade e a encontrar a vida plena. Temos consciência de que a verdadeira libertação está na proposta que Deus nos apresentou em Jesus e não nas ideologias, ou no poder do dinheiro, ou no brilho da nossa posição social? Quando anunciamos Jesus aos nossos irmãos, é esta a proposta que nós apresentamos – sobretudo aos mais pobres e marginalizados?
¨ Diante da boa nova da libertação, reagimos – como os pastores – com o louvor e a acção de graças? Sabemos ser gratos ao nosso Deus pelo seu empenho em nos libertar da nossa debilidade e escravidão?
¨ Os pastores, depois de terem tomado contacto com o projecto libertador de Deus, fizeram-se testemunhas desse projecto. Sentimos, também, o imperativo do “testemunho” dessa libertação que experimentamos?
¨ Maria “conservava todas estas palavras e meditava-as no seu coração”. Quer dizer: ela era capaz de perceber os sinais do Deus libertador no acontecer da vida. Temos, como ela, a sensibilidade de estar atentos à vida e de perceber a presença – discreta, mas significativa, actuante e transformadora – de Deus, nos acontecimentos banais do nosso dia a dia?
UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
PROPOSTA PARA
ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
Grupo Dinamizador:
P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
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