Liturgia

Events in Julho 2023

  • 13º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    13º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    2 de Julho, 2023

    ANO A
    13º Domingo do Tempo Comum

    Tema do 13º Domingo do Tempo Comum

    Nas leituras deste 13º Domingo do Tempo Comum, cruzam-se vários temas. No geral, os três textos que nos são propostos apresentam uma reflexão sobre alguns aspectos do discipulado. Fundamentalmente, diz-se quem é o discípulo (é todo aquele que, pelo baptismo, se identifica com Jesus, faz de Jesus a sua referência e O segue) e define-se a missão do discípulo (tornar presente na história e no tempo o projecto de salvação que Deus tem para os homens).
    O Evangelho é uma catequese sobre o discipulado, com vários passos. Num primeiro passo, define o caminho do discípulo: o discípulo tem de ser capaz de fazer de Jesus a sua opção fundamental e seguir o seu mestre no caminho do amor e da entrega da vida. Num segundo passo, sugere que toda a comunidade é chamada a dar testemunho da Boa Nova de Jesus. No terceiro passo, promete uma recompensa àqueles que acolherem, com generosidade e amor, os missionários do "Reino".
    Na primeira leitura mostra-se como todos podem colaborar na realização do projecto salvador de Deus. De uma forma directa (Eliseu) ou de uma forma indirecta (a mulher sunamita), todos têm um papel a desempenhar para que Deus se torne presente no mundo e interpele os homens.
    A segunda leitura recorda que o cristão é alguém que, pelo Baptismo, se identificou com Jesus. A partir daí, o cristão deve seguir Jesus no caminho do amor e do dom da vida e renunciar definitivamente ao pecado.

    LEITURA I - 2 Re 4,8-11.14-16a

    Leitura do Segundo Livro dos Reis

    Certo dia, o profeta Eliseu passou por Sunam.
    Vivia lá uma distinta senhora,
    que o convidou com insistência a comer em sua casa.
    A partir de então, sempre que por ali passava,
    era em sua casa que ia tomar a refeição.
    A senhora disse ao marido:
    "Estou convencida de que este homem,
    que passa frequentemente pela nossa casa,
    é um santo homem de Deus.
    Mandemos-lhe fazer no terraço um pequeno quarto
    com paredes de tijolo,
    com uma cama, uma mesa, uma cadeira e uma lâmpada.
    Quando ele vier a nossa casa, poderá lá ficar".
    Um dia, chegou Eliseu
    e recolheu-se ao quarto para descansar.
    Depois perguntou ao seu servo Giezi:
    "Que podemos fazer por esta senhora?"
    Giezi respondeu:
    "Na verdade, ela não tem filhos
    e o seu marido é de idade avançada".
    "Chama-a" - disse Eliseu.
    O servo foi chamá-la e ela apareceu à porta.
    Disse-lhe o profeta:
    "No próximo ano, por esta época,
    terás um filho nos braços".

    AMBIENTE

    Após a morte de Salomão (932 a.C.), o Povo de Deus dividiu-se em dois reinos: Israel, a norte, e Judá, a sul. Os dois reinos viveram, a partir daqui, histórias separadas e, quase sempre, antagónicas.
    O nosso texto situa-nos no reino de Israel, em meados do séc. IX a.C., durante o reinado de Jorão (853-842 a.C.). As relações económicas, políticas e culturais que Israel insiste em estabelecer com outros países da zona tornam-no vulnerável às influências religiosas estrangeiras e favorecem a entrada no país de cultos diversos. É, portanto, uma época de sincretismo e de confusão religiosa.
    Eliseu é um profeta, discípulo de Elias (cf. 1 Re 19,16b.19-21) que, continuando a obra do mestre, luta contra o sincretismo religioso e procura trazer de novo os israelitas aos caminhos da fidelidade à aliança. Faz parte, segundo parece, de uma comunidade de "filhos de profetas" ("benê nebi'im" - cf. 2 Re 2,3; 4,1), isto é, de seguidores incondicionais de Jahwéh, que vivem na absoluta fidelidade aos mandamentos de Deus e não se deixam contaminar pelos valores religiosos estrangeiros. Estes "filhos de profetas" vivem pobremente (cf. 2 Re 4,1-7) e são regularmente consultados pelo Povo, que neles busca apoio face aos abusos dos poderosos.
    Eliseu é chamado, com muita frequência (29 vezes), o "homem de Deus" ('ish Elohim). O título designa um homem que é intérprete da Palavra de Jahwéh junto dos outros homens; mas a Palavra que o "homem de Deus" transmite é, sobretudo, uma Palavra poderosa, que opera maravilhas e que tem a capacidade de transformar a realidade. Os "milagres" atribuídos a Eliseu (o grande "milagreiro" do Antigo Testamento") são a expressão viva da força de Deus, que através do profeta intervém na história e salva os pobres.
    Este episódio situa-nos em Sunam, uma pequena cidade situada no sul da Galileia, não longe de Meggido, à entrada da planície de Yezre'el, em casa de uma mulher rica e sem filhos. A história da sunamita tem duas partes distintas: a descrição da hospitalidade que a mulher oferece ao profeta e que é recompensada por este com o anúncio do nascimento de um filho (cf. 2 Re 4,8-17) e a repentina doença e morte desse filho, que exigirá uma nova intervenção do profeta no sentido de devolver a vida ao menino (cf. 2 Re 8,18-37). A nossa leitura apresenta-nos apenas a primeira parte.

    MENSAGEM

    O episódio que a leitura nos relata descreve, portanto, a generosa hospitalidade que Eliseu encontra em casa desta mulher sunamita. A mulher não se limita a oferecer a Eliseu uma refeição, sempre que este passava por Sunam, nas suas idas e vindas ao monte Carmelo; mas manda construir, expressamente para o profeta, um quarto no terraço da sua casa e mobila-o adequadamente.
    O gesto da mulher não é apenas o levar até às últimas consequências o sagrado "sacramento da hospitalidade", tão importante para os povos do Crescente Fértil... Mas é ainda mais: é o reconhecimento de que Eliseu é um "homem de Deus", através de quem Deus age no mundo. Ajudando Eliseu, a mulher mostra a sua adesão a Jahwéh e manifesta a sua disponibilidade para colaborar com Deus no projecto de salvação que Deus tem para o mundo e para os homens.
    Em resposta à generosidade da mulher, Eliseu anuncia-lhe o nascimento de um filho. A promessa tem um valor especial, dada a quase impossibilidade de ter filhos que pesa sobre o casal, devido à avançada idade do marido.
    A história procura ensinar que colaborar com Deus na realização do plano de salvação/libertação que ele tem para os homens é uma fonte de vida e de bênção. Deus não deixa de recompensar todos aqueles que com ele colaboram.

    ACTUALIZAÇÃO

    Considerar, na reflexão, os seguintes desenvolvimentos:

    • Antes de mais, o texto sugere que o projecto de salvação que Deus tem para os homens e para o mundo envolve toda a gente e é uma responsabilidade que a todos compromete. Uns são chamados a estar mais na "linha da frente" e a desenvolver uma acção mais exclusiva e mais exposta; outros são chamados a desenvolver uma acção menos exclusiva e mais discreta, mas nem por isso menos importante. Mas uns e outros t&ecir
    c;m de sentir a responsabilidade de colaborar com Deus. Estou consciente disso? Empenho-me verdadeiramente em descobrir o papel que Deus me confia no seu projecto e em cumpri-lo com generosidade?

    • Numa altura em que a Europa se tornou uma espécie de condomínio fechado, do qual é excluída essa imensa multidão de pobres sem futuro e sem esperança, que mendigam a possibilidade de construir um futuro sem miséria, este episódio convida-nos a reflectir sobre o sentido da hospitalidade e do acolhimento. É evidente para todos que não temos os recursos suficientes para acolher, de forma indiscriminada, todos aqueles que batem à nossa porta; mas a política que o nosso mundo segue em relação aos imigrantes não esconderá também uma boa dose de egoísmo e de falta de vontade de partilhar? Como nos situamos face a isto?

    • A nossa leitura deixa também claro que o dar não nos despoja, nem nos faz perder seja o que for. O dar é sempre uma fonte de vida e de bênção. A dádiva não deve, no entanto, ser interesseira, mas desinteressada e gratuita.

    • Há pessoas que são chamadas por Deus a deixar a terra, a família, os pontos de referência culturais e sociais, a fim de dedicar a sua vida ao anúncio da Palavra. Não são super-homens ou super-mulheres, mas são homens e mulheres como quaisquer outros, com as mesmas necessidades de afecto, de apoio, de solidariedade, de compreensão. É nossa responsabilidade ajudá-los, não apenas com meios materiais, mas também com compreensão, com solidariedade, com amor.

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 89 (89)

    Refrão 1: Cantarei eternamente as misericórdias do Senhor.

    Refrão 2: Eu canto para sempre a bondade do Senhor.

    Cantarei eternamente as misericórdias do Senhor
    e para sempre proclamarei a sua fidelidade.
    Vós dissestes: "A bondade está estabelecida para sempre",
    no céu permanece firme a vossa fidelidade.

    Feliz do povo que sabe aclamar-Vos
    e caminha, Senhor, à luz do vosso rosto.
    Todos os dias aclama o vosso nome
    e se gloria com a vossa justiça.

    Vós sois a sua força,
    com o vosso favor se exalta a nossa valentia.
    Do Senhor é o nosso escudo
    e do Santo de Israel o nosso rei.

    LEITURA II - Rom 6,3-4. 8-11

    Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Romanos

    Irmãos:
    Todos nós que fomos baptizados em Jesus Cristo
    fomos baptizados na sua morte.
    Fomos sepultados com Ele na sua morte,
    para que, assim como Cristo ressuscitou dos mortos,
    para glória do Pai,
    também nós vivamos uma vida nova.
    Se morremos com Cristo,
    acreditamos que também com Ele viveremos,
    sabendo que, uma vez ressuscitado dos mortos,
    Cristo já não pode morrer;
    a morte já não tem domínio sobre Ele.
    Porque na morte que sofreu,
    Cristo morreu para o pecado de uma vez para sempre;
    mas a sua vida, é uma vida para Deus.
    Assim, vós também, considerai-vos mortos para o pecado
    e vivos para Deus, em Cristo Jesus.

    AMBIENTE

    Continuamos a explorar essa carta aos romanos, na qual Paulo propõe a todos os crentes - judeus e não judeus - o essencial da mensagem cristã... Fundamentalmente, Paulo está interessado em sugerir aos crentes (divididos pela discussão acerca do caminho mais correcto para "conquistar" a salvação) que a salvação é sempre um dom de Deus e não uma conquista do homem. Apesar do pecado dos homens (cf. Rom 1,18-3,20), Deus a todos justifica e salva de forma gratuita e incondicional (cf. Rom 3,1-5,11). Essa salvação é oferecida aos homens através de Jesus Cristo.
    O texto que nos é proposto faz parte desse bloco em que Paulo descreve como é que a vida de Deus se comunica aos homens através de Jesus Cristo (cf. Rom 5,12-8,39). De acordo com a perspectiva de Paulo, Cristo - ao contrário de Adão, o homem do orgulho e da auto-suficiência - escolheu viver na obediência a Deus e aos seus planos; e foi a obediência de Cristo - isto é, o seu cumprimento incondicional da vontade do Pai - que fez chegar a todos os homens a graça da salvação (cf. Rom 5,12-20).
    Isso significará, então, que pecar ou não pecar é indiferente, pois a obediência de Cristo a todos salva, de forma incondicional? O cristão pode pecar tranquilamente (cf. Rom 6,1-2), porque a graça da salvação oferecida por Cristo irá sempre derramar-se sobre o pecador?

    MENSAGEM

    Ao ser baptizado (isto é, ao aderir a Cristo e ao aceitar a oferta de salvação que Cristo faz), o cristão renuncia ao egoísmo e ao pecado, a fim de viver numa dinâmica de vida nova. O pecado passa a ser algo absolutamente incoerente e absurdo pois, pelo baptismo, o cristão enxertou-se em Cristo, isto é, passou a receber de Cristo a vida que o anima e alimenta.
    Como é que foi a vida que Cristo viveu? A vida de Cristo foi marcada pelo egoísmo, pelo orgulho, pela auto-suficiência? Não. A vida de Cristo foi vivida no amor, na partilha, no dom total de si a Deus e aos homens. Cristo "matou" o pecado, ao viver uma vida segundo Deus. A cruz, sobretudo como expressão última de uma vida totalmente liberta do egoísmo e feita dom radical, é o "golpe final" no pecado (que é egoísmo, que é auto-suficiência, que é fechamento em si próprio). A ressurreição mostra essa vida nova que brota de um "não" decidido ao egoísmo e ao pecado.
    Ora os cristãos, pelo Baptismo, são "enxertados" em Cristo. Quer dizer: entram a fazer parte do Corpo de Cristo e passam a receber de Cristo a vida que os alimenta. Se neles circula a mesma vida de Cristo, o pecado já não tem aí lugar: só tem aí lugar essa vida de dom, de amor, de entrega, de serviço que conduz à ressurreição, à vida definitiva. Ser baptizado é "sepultar o pecado" e ressuscitar para uma dinâmica de vida nova, de onde o pecado está - tem de estar - ausente.

    ACTUALIZAÇÃO

    Para a reflexão, considerar os seguintes elementos:

    • Nesta leitura sugere-se, antes de mais, que o cristão é aquele que se identifica com Cristo. Enxertado em Cristo pelo Baptismo, o cristão faz de Cristo a sua referência e segue-O incondicionalmente, renunciando ao pecado e escolhendo o amor e o dom da vida. Ora, todos os discípulos estão conscientes que ser cristão passa por aqui; mas, dia a dia, são desafiados por outras referências, por outros valores, por outros modelos de vida... Qual é o modelo e a referência fundamental à volta da qual a minha vida se ordena e se constrói?

    • Em termos concretos, o que é que implica a nossa adesão a Cristo? Paulo responde: significa morrer para o pecado e viver para Deus. O que é que significa "pecar"? Significa fechar-se no próprio egoísmo e recusar Deus e os outros. "Pecar" é recusar a comunhão com Deus e ignorar conscientemente as suas proposta
    s; é recusar fazer da vida um dom, um serviço, uma partilha de amor com os irmãos... Os homens do nosso tempo acham que falar de "pecado" não faz sentido e que o discurso sobre o pecado é um discurso antiquado, repressivo, alienante. No entanto, o "pecado" existe: é o egoísmo que gera injustiça e exploração; é o orgulho que gera conflito e divisão; é a vingança que gera violência e morte. O que se pede ao discípulo de Jesus é que renuncie a esta realidade e oriente a sua vida de acordo com outros critérios - os critérios e os valores de Jesus.

    ALELUIA - 1 Pedro 2,9

    Aleluia. Aleluia.

    Vós sois geração eleita, sacerdócio real, nação santa,
    para anunciar os louvores de Deus,
    que vos chamou das trevas à sua luz admirável.

    EVANGELHO - Mt 10,37-42

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus apóstolos:
    "Quem ama o pai ou a mãe mais do que a Mim,
    não é digno de Mim;
    e quem ama o filho ou a filha mais do que a Mim,
    não é digno de Mim.
    Quem não toma a sua cruz para Me seguir,
    não é digno de Mim.
    Quem encontrar a sua vida há-de perdê-la;
    e quem perder a sua vida por minha causa, há-de encontrá-la.
    Quem vos recebe, a Mim recebe;
    e quem Me recebe, recebe Aquele que Me enviou.
    Quem recebe um profeta por ele ser profeta,
    receberá a recompensa de profeta;
    e quem recebe um justo por ele ser justo,
    receberá a recompensa de justo.
    E se alguém der de beber,
    nem que seja um copo de água fresca,
    a um destes pequeninos, por ele ser meu discípulo,
    em verdade vos digo: não perderá a sua recompensa".

    AMBIENTE

    O Evangelho deste domingo apresenta-nos a parte final de um discurso atribuído a Jesus e que teria sido pronunciado pouco antes do envio dos discípulos em missão (é chamado, por isso, o "discurso da missão"). Mais do que um discurso histórico, que Jesus pronunciou de uma única vez e num único lugar, é uma catequese que Mateus compôs a partir de diversos materiais (o autor combina aqui relatos de envio, "ditos" de Jesus acerca dos "doze" e várias outras "sentenças" que, originalmente, tinham um outro contexto).
    Qual o objectivo de Mateus, ao compor este texto e ao pô-lo na boca de Jesus?
    Estamos na década de 80. Mateus escreve para uma comunidade onde a tradição missionária estava bem enraizada (a comunidade cristã de Antioquia da Síria?). No entanto, as condições políticas do final do séc. I (reinado de Domiciano e hostilidade crescente do império em relação ao cristianismo) trazem a comunidade confusa e desorientada. Vale a pena "remar contra a maré"? Não é um risco imprudente continuar a anunciar Jesus? Vale a pena arriscar tudo por causa do Evangelho, quando as condições são tão desfavoráveis?
    Mateus compõe então uma espécie de "manual do missionário cristão", destinado a revitalizar a opção missionária da sua comunidade. Nele sugere que a missão dos discípulos é anunciar Jesus e continuar a percorrer o caminho de Jesus - mesmo que esse caminho leve ao dom total da vida. Apresenta, nesse sentido, um conjunto de valores e atitudes que devem orientar a acção dos missionários cristãos.

    MENSAGEM

    O nosso texto pode dividir-se em duas partes. Na primeira parte (vers. 37-39), Mateus apresenta um conjunto de exigências radicais para quem quer seguir Jesus; na segunda parte (vers. 40-42), Mateus sugere que toda a comunidade deve anunciar Jesus e põe na boca de Jesus o anúncio de uma recompensa, destinada àqueles que acolherem os mensageiros do Evangelho.
    O seguimento de Jesus não é um caminho fácil e consensual, ladeado por aplausos e encorajamentos. Mas é um caminho radical, que obriga, muitas vezes, a rupturas e a opções exigentes. Quando se trata de escolher entre Jesus e outros valores, qual deve ser a opção do cristão?
    Mateus não admite "meias-tintas": a primeira lealdade deve ser sempre com Jesus. Se a alternativa for escolher entre Jesus e a própria família (vers. 37), a escolha do discípulo deve recair sempre em Jesus (recorde-se que, então, a família era a estrutura social que dava sentido à vida dos indivíduos; a ruptura com a família era uma medida extrema, que supunha um desenraizamento social quase completo). O discípulo tem necessariamente que cortar relações com a própria família para seguir Jesus? Não. No entanto, não pode deixar que a família ou os afectos o impeçam de responder, com coerência e radicalidade, ao desafio do "Reino".
    Se a alternativa for escolher entre Jesus e as próprias seguranças (vers. 38), a escolha do discípulo deve ser tomar a cruz e seguir Jesus (o fazer da vida um dom total a Deus e aos homens, significa o rompimento com todos os esquemas que, na perspectiva dos homens, dão comodidade, bem estar, realização, felicidade, êxito).
    De resto, escolher Jesus e segui-l'O até à cruz não é um caminho de fracasso e de morte, mas é um caminho de vida. Na verdade, quando o homem está muito preocupado em proteger os seus esquemas de seguranças humanas e se fecha no seu egoísmo e na sua auto-suficiência, acaba por perder a vida verdadeira; mas, quando o homem aceita viver na obediência aos projectos de Deus e fazer da sua vida um dom de amor aos irmãos, encontra a vida definitiva (vers. 39).
    Na segunda parte do nosso texto, Mateus refere-se à recompensa destinada àqueles que acolhem os mensageiros da Boa Nova de Jesus.
    Mateus refere-se a quatro grupos de pessoas, que integram a comunidade cristã e que têm a responsabilidade do testemunho: os apóstolos (vers. 40), os profetas (vers. 41a), os justos (vers. 41b) e os pequenos (vers. 42). Todos eles têm por missão anunciar a Boa Nova de Jesus. Os apóstolos - os que acompanharam sempre Jesus - são as testemunhas primordiais de Jesus, pois diz-se deles que quem os recebe, recebe Jesus. Os profetas são aqueles pregadores itinerantes que, em nome de Deus, interpelam a comunidade e que a ajudam a ser coerente com os valores do Evangelho. Os justos são provavelmente os cristãos procedentes do judaísmo, que procuram viver, no seio da comunidade cristã, em coerência com a Lei de Moisés. Os pequenos são os discípulos que ainda não integram de forma plena a comunidade, pois estão em processo de amadurecimento da sua opção (podiam ser os catecúmenos que estão a descobrir a fé, à espera do compromisso pleno com Cristo e com a Boa Nova). De qualquer forma, todos estes grupos que formam a comunidade cristã, têm por missão anunciar o Evangelho de Jesus.
    A questão é fundamentalmente esta: a tarefa de anunciar o Evangelho pertence a todos os membros da comunidade cristã; e esses "missionários&rd
    quo; que testemunham a Boa Nova e que entregam a vida ao serviço do "Reino" devem ser acolhidos com entusiasmo, com generosidade e amor.

    ACTUALIZAÇÃO

    Na reflexão, considerar os seguintes elementos:

    • Jesus não é um demagogo que faz promessas fáceis e cuja preocupação é juntar adeptos ou atrair multidões a qualquer preço. Ele veio ao nosso encontro com uma proposta de salvação e de vida plena; no entanto, essa proposta implica uma adesão séria, exigente, radical, sem "paninhos quentes" ou "meias tintas". O caminho que Jesus propõe não é um caminho de "massas", mas um caminho de "discípulos": implica uma adesão incondicional ao "Reino", à sua dinâmica, à sua lógica; e isso não é para todos, mas apenas para os discípulos que fazem, séria e conscientemente, essa opção. Como é que eu me situo face a isto? O projecto de Jesus é, para mim, uma opção radical, que eu abracei com convicção, a tempo inteiro e a "fundo perdido", ou é um projecto em que eu "vou estando", sem grande esforço ou compromisso, por inércia, por comodismo, por tradição?

    • Dentro do quadro de exigências que Jesus apresenta aos discípulos, sobressai a exigência de preferir Jesus à própria família. Isso não significa, evidentemente, que devamos rejeitar os laços que nos unem àqueles que amamos... No entanto, significa que os laços afectivos, por mais sagrados que sejam, não devem afastar-nos dos valores do "Reino"? As pessoas têm mais importância, para mim, do que o "Reino"? Já me aconteceu renunciar aos valores de Jesus por causa de alguém?

    • Outra exigência que Jesus faz aos discípulos é a renúncia à própria vida e o tomar a cruz do amor, do serviço, do dom da vida. O que é mais importante para mim: os meus interesses, os meus valores egoístas, ou o serviço dos irmãos e o dom da vida?

    • A forma exigente como Jesus põe a questão da adesão ao "Reino" e à sua dinâmica, faz-nos pensar na nossa pastoral - vocacionada para ser uma pastoral de "massas" - e na tentação que sentem os agentes da pastoral no sentido de facilitar as coisas, de não ser exigentes... Às vezes, interessa mais que as estatísticas da paróquia apresentem um grande número de baptizados, de casamentos, de crismas, de comunhões, do que propor, com exigência, a radicalidade do Evangelho e dos valores de Jesus... O caminho cristão é um caminho de facilidade, onde cabe tudo, ou é um caminho verdadeiramente exigente, onde só cabem aqueles que aceitam a radicalidade de Jesus? A nossa pastoral deve facilitar tudo, ou ir pelo caminho da exigência?

    • Às vezes, as pessoas procuram os ritos cristãos por tradição, por influências do meio social ou familiar, porque "a cerimónia religiosa fica bonita nas fotografias...". Sem recusarmos nada devemos, contudo, fazê-las perceber que a opção pelo baptismo ou pelo casamento religioso é uma opção séria e exigente, que só faz sentido no quadro de um compromisso com o "Reino" e com a proposta de Jesus.

    • Integrar a comunidade cristã é assumir o imperativo do testemunho. Sinto verdadeiramente que isso é algo que me diz respeito - seja qual for o lugar que eu ocupo na organização da comunidade?

    • Como é que, na minha comunidade, são vistos aqueles que se dão, de forma mais plena e mais total, ao anúncio do Evangelho: são reconhecidos e apoiados, ou são injustamente criticados e vítimas de maledicência, de invejas e de ciúmes?

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 13º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    1. A liturgia meditada ao longo da semana.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 13º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa...

    2. «Quem perder a sua vida por minha causa, há-de encontrá-la...»
    Antes do rito penitencial, pode-se convidar a assembleia a uns momentos de silêncio. Todos são convidados a olhar para a cruz e a contemplar aquele que perdeu a sua vida para no-la dar.

    3. Aspersão depois do rito penitencial.
    Em ligação com a segunda leitura, pode-se fazer a aspersão com água benzida, em recordação do baptismo.

    4. Oração na lectio divina.
    Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.

    No final da primeira leitura:
    Deus de nossos Pais, bendito sejas pela hospitalidade oferecida aos teus profetas e pela atenção que por eles concedes aos teus fiéis.
    Nós Te confiamos todas as nossas preocupações de pais e de educadores, diante das dificuldades que surgem na transmissão da vida e diante das ameaças que pesam sobre o crescimento das crianças.

    No final da segunda leitura:
    Nós Te damos graças pela ressurreição de Jesus e pelo mistério do baptismo. Pai, nós Te bendizemos pelo teu apelo: convidas-nos a viver para Ti, na relação filial que Jesus nos manifesta.
    Nós Te pedimos: livra-nos de todas as formas de morte. Que o teu Espírito renove em nós a vida sem limites que nos deste no nosso baptismo.

    No final do Evangelho:
    Pai, nós Te damos graças pela tua presença em todo o homem: pela vinda do teu Filho tornaste-Te homem e é a Ti que servimos quando ajudamos e amamos os outros. Faz-nos reconhecer neles.
    Nós Te pedimos: aumenta em nós o espírito de acolhimento e de atenção aos outros, desperta em nós o discernimento necessário no amor aos outros.

    5. Oração Eucarística.
    Pode-se escolher a Oração Eucarística para as Assembleias com Crianças I, que une com simplicidade os temas das leituras.

    6. Palavra para o caminho.
    Escolher. Não é uma reprimenda que Jesus dá aos seus Apóstolos. É antes um convite a amá-l'O, a Ele, mais que a todos os que nos são queridos. Mas esse amor não é complacência. Escolher caminhar o mais perto possível de Cristo, é tomar com Ele o caminho da Cruz, "jogando" a nossa vida sob o registo da fé e do amor. Uma decisão em contradição directa com o espírito do mundo...

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • 14º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    14º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    9 de Julho, 2023

    Ano A
    14º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    Tema do 14º Domingo do Tempo Comum

    A liturgia deste domingo ensina-nos onde encontrar Deus. Garante-nos que Deus não Se revela na arrogância, no orgulho, na prepotência, mas sim na simplicidade, na humildade, na pobreza, na pequenez.
    A primeira leitura apresenta-nos um enviado de Deus que vem ao encontro dos homens na pobreza, na humildade, na simplicidade; e é dessa forma que elimina os instrumentos de guerra e de morte e instaura a paz definitiva.
    No Evangelho, Jesus louva o Pai porque a proposta de salvação que Deus faz aos homens (e que foi rejeitada pelos "sábios e inteligentes") encontrou acolhimento no coração dos "pequeninos". Os "grandes", instalados no seu orgulho e auto-suficiência, não têm tempo nem disponibilidade para os desafios de Deus; mas os "pequenos", na sua pobreza e simplicidade, estão sempre disponíveis para acolher a novidade libertadora de Deus.
    Na segunda leitura, Paulo convida os crentes - comprometidos com Jesus desde o dia do Baptismo - a viverem "segundo o Espírito" e não "segundo a carne". A vida "segundo a carne" é a vida daqueles que se instalam no egoísmo, orgulho e auto-suficiência; a vida "segundo o Espírito" é a vida daqueles que aceitam acolher as propostas de Deus.

    LEITURA I - Zac 9,9-10

    Leitura da Profecia de Zacarias

    Eis o que diz o Senhor:
    "Exulta de alegria, filha de Sião,
    solta brados de júbilo, filha de Jerusalém.
    Eis o teu Rei, justo e salvador, que vem ao teu encontro,
    humildemente montado num jumentinho, filho duma jumenta.
    Destruirá os carros de combate de Efraim
    e os cavalos de guerra de Jerusalém;
    e será quebrado o arco de guerra.
    Anunciará a paz às nações:
    o seu domínio irá de um mar ao outro mar
    e do Rio até aos confins da terra.

    AMBIENTE

    O Livro de Zacarias é um livro profético com catorze capítulos. Actualmente, os estudiosos da Bíblia são unânimes em reconhecer que entre os oito primeiros capítulos e os restantes há uma diferença tão grande em contextos, estilo, vocabulário e temática, que devemos falar de dois livros em um e de dois autores diversos. Dado que não conhecemos o nome do autor do segundo livro (capítulos 9-14), convencionou-se chamar-lhe o "Deutero-Zacarias". É ao "Deutero-Zacarias" que pertence este texto que hoje nos é proposto.
    Em que época foram escritos esses textos atribuídos ao Deutero-Zacarias? As opiniões são divergentes; no entanto, a maioria dos comentadores coloca estes oráculos no final do séc. IV ou princípios do séc. III a.C.. O ambiente é claramente pós-exílico. O contexto parece revelar a época posterior às vitórias de Alexandre da Macedónia, quando o Povo de Deus estava integrado no império helénico.
    O livro do "segundo Zacarias" está marcado por um forte acento messiânico. Refere-se, com frequência, à figura do Messias, apresentado como rei, como pastor e como servo do Senhor. Na primeira parte (cf. Zac 9,1-11,7), o profeta anuncia a intervenção definitiva de Deus em favor do seu Povo, na figura do Messias; na segunda parte (cf. Zac 12,1-14,21), os oráculos descrevem a salvação e a glória futura de Jerusalém.

    MENSAGEM

    O Deutero-Zacarias descreve, neste oráculo, o regresso do rei vitorioso a Jerusalém. A cidade é convidada a alegrar-se e regozijar-se pois o seu rei, "justo e salvador", chegou.
    A entrada triunfal desse rei justo e vitorioso é, no entanto, humilde e pacífica: ele não cavalgará um cavalo de guerra (símbolo do militarismo), mas um "jumentinho, filho de uma jumenta". A atitude deste "rei" contrasta claramente com as exibições de força, de poder, de agressividade dos grandes do mundo...
    No entanto, paradoxalmente, este "rei" humilde e pacífico terá a força para destruir a guerra (ele aniquilará os instrumentos de morte - os carros de combate, os cavalos de guerra, os arcos de guerra) e para proclamar a paz universal. O seu "reino" irá "de um mar ao outro mar" e do "rio" (Eufrates) "até aos confins da terra" (isto é, abarcará a totalidade do mundo antigo).

    ACTUALIZAÇÃO

    Na reflexão, considerar os seguintes pontos:

    • Em primeiro lugar, o Deutero-Zacarias deixa clara a preocupação de Deus com a salvação do seu Povo. Na fase em que o profeta leva a cabo a sua missão, o Povo de Deus conhece uma relativa tranquilidade; mas é um Povo subjugado, manipulado, impedido de escolher livremente o seu destino e de construir o seu futuro. É nesse contexto que o profeta anuncia a chegada de um rei "justo e salvador", que vem ao encontro do Povo para o libertar e para lhe oferecer a paz ("shalom" - no sentido de harmonia, bem estar, felicidade plena). Ora, Deus não perdeu qualidades, nem mudou a sua essência. O Deus que assim actuou ontem é o Deus que assim actua hoje e que assim actuará sempre. Ao longo da nossa caminhada de todos os dias, fazemos frequentemente a experiência do desencanto, da frustração, da privação de liberdade. Sentimo-nos, tantas vezes, perdidos, sem esperança, incapazes de tomar nas mãos o nosso futuro e de dar um sentido à nossa vida... Nessas circunstâncias, somos convidados a redescobrir esse Deus que vem ao nosso encontro, que restaura a nossa esperança e nos oferece a paz.

    • Uma certa visão "americanizada" do mundo e da vida defende a necessidade de armar exércitos formidáveis, de gastar uma considerável fatia do orçamento das nações em instrumentos de morte cada vez mais sofisticados, para impor, pela força e pelo medo, a paz e a segurança do mundo. O Deutero-Zacarias diz-nos que a lógica de Deus é outra: Ele chega desarmado, pacífico, humilde, sem arrogância e é, dessa forma, que Ele salva e liberta os homens. Para mim, qual faz mais sentido: a lógica desarmada de Deus ou a lógica musculada dos senhores do mundo?

    • A história da salvação mostrou, muitas vezes, que é através dos pequenos, dos humildes, dos pobres, dos insignificantes que Deus actua no mundo e o transforma. Deus está mais na viúva que lança no tesouro do Templo umas pobres moedas do que no capitalista que preenche um cheque chorudo para pagar os vitrais da nova igreja da paróquia; Deus está mais no gesto simples do pacifista que oferece uma flor a um soldado do que na violência daqueles que lutam de armas na mão contra os "maus"; Deus está mais no olhar límpido de uma criança do que na palavra poderosa de um pregador inflamado que "sabe tudo" sobre Deus... Já aprendi a descobrir esse Deus que se manifesta na humildade, na pobreza, na simplicidade?

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 144 (145)

    Refrão 1: Louvarei para sempre o vosso nome,
    Senhor, meu Deus e meu Rei.

    Refrão 2: Aleluia.

    Quero exaltar-Vos, meu Deus e meu Rei,
    e bendizer o vosso nome para sempre.
    Quero bendizer-Vos, dia após dia,
    e louvar o vosso nome para sempre.

    O Senhor é clemente e compassivo,
    paciente e cheio de bondade.
    O Senhor é bom para com todos
    e a sua misericórdia se estende a todas as criaturas.

    Graças Vos dêem, Senhor, todas as criaturas
    e bendigam-Vos os vossos fiéis.
    Proclamem a glória do vosso reino
    e anunciem os vossos feitos gloriosos.

    O Senhor é fiel à sua palavra
    e perfeito em todas as suas obras.
    O Senhor ampara os que vacilam
    e levanta todos os oprimidos.

    LEITURA II - Rom 8,9.11-13

    Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Romanos

    Irmãos:
    Vós não estais sob o domínio da carne, mas do Espírito,
    se é que o Espírito de Deus habita em vós.
    Mas se alguém não tem o Espírito de Cristo, não Lhe pertence.
    Se o Espírito d'Aquele que ressuscitou Jesus de entre os mortos
    habita em vós,
    Ele, que ressuscitou Cristo Jesus de entre os mortos,
    também dará vida aos vossos corpos mortais,
    pelo seu Espírito que habita em vós.
    Assim, irmãos, não somos devedores à carne,
    para vivermos segundo a carne.
    Se viverdes segundo a carne, morrereis;
    mas, se pelo Espírito fizerdes morrer as obras da carne,
    vivereis.

    AMBIENTE

    Continuamos a ler a Carta aos Romanos. Ela apresenta-nos um Paulo amadurecido que, depois de vários anos de incansável trabalho missionário, expõe, de forma serena, a sua reflexão sobre a salvação (numa altura em que a questão da salvação era uma questão teológica "quente": os judeo-cristãos acreditavam que, para chegar à salvação, era preciso continuar a cumprir a Lei de Moisés; e os judeo-pagãos não manifestavam nenhuma vontade de se submeter aos ritos da Lei judaica).
    Na perspectiva de Paulo, a salvação é um dom não merecido (porque todos vivem mergulhados no pecado - cf. Rom 1,18-3,20), que Deus oferece por pura bondade aos homens, a todos os homens (cf. Rom 3,1-5,11). Essa salvação chega-nos através de Jesus Cristo (cf. Rom 5,12-8,39); e actua em nós pelo Espírito (cf. Rom 8,1-39).
    O texto que hoje nos é proposto faz parte de um capítulo em que Paulo reflecte sobre a vida no Espírito. O pensamento teológico de Paulo atinge aqui um dos seus pontos culminantes: todos os grandes temas paulinos (o projecto salvador de Deus em favor dos homens; a acção libertadora de Cristo, através da sua vida de doação, da sua morte e da sua ressurreição; a nova vida que faz dos crentes Homens Novos e os torna filhos de Deus) se cruzam aqui.
    O Espírito aparece como o elemento fundamental que dá unidade a toda esta reflexão. Ele está presente por detrás desse projecto salvador que Deus tem em favor do homem e do qual Paulo não se cansa de dar testemunho.

    MENSAGEM

    Jesus, o Deus/Homem, gastou a vida a cumprir o projecto do Pai de dar vida ao homem. A sua acção acabou por chocar com os interesses dos senhores do mundo, e Ele foi morto na cruz.
    No entanto, essa morte na cruz não foi o "fim da linha": o Espírito de Deus, sempre presente em Jesus, ressuscitou-O (pois, no projecto de Deus, o oferecer a vida para concretizar o plano do Pai não pode gerar morte, mas vida plena e definitiva).
    Ora, Jesus ofereceu aos seus discípulos o mesmo Espírito. Os discípulos têm de estar conscientes de que, se viverem como Jesus e se fizerem da vida um dom a Deus e aos irmãos, receberão essa mesma vida nova e definitiva que o Espírito deu a Jesus.
    Sobretudo, Paulo convida os cristãos a tirarem as conclusões práticas desta realidade: se viverem "segundo a carne", morrerão (isto é, não encontrarão a vida definitiva); mas se viverem segundo o Espírito, ressuscitarão para a vida nova.
    Temos aqui uma das mais interessantes e sugestivas antíteses paulinas: a "carne" e o "Espírito". Viver "segundo a carne" é, na perspectiva de Paulo, viver em oposição a Deus - ou seja, viver fechado a Deus, numa vida de egoísmo, de autismo, de auto-suficiência que leva o homem a prescindir dos mandamentos, das propostas e dos valores de Deus; "viver segundo o Espírito" é, na perspectiva de Paulo, viver em relação com Deus, escutando as suas propostas e sugestões, na obediência aos projectos de Deus e na doação da própria vida aos homens.
    Os cristãos são, portanto, veementemente exortados por Paulo a fazerem a sua escolha. Sobretudo, Paulo está interessado em demonstrar aos crentes que só o seguimento de Cristo garante ao homem a vida definitiva.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão poderá ter em conta as seguintes questões:

    • À luz dos critérios que hoje presidem à construção do mundo, a vida de Jesus foi um rotundo fracasso. Ele nunca desempenhou qualquer cargo público nem teve jamais conta num banco qualquer; mas viveu na simplicidade, na humildade, no serviço, sem ter para si próprio uma pedra onde reclinar a cabeça. Ele nunca foi apoiado pelos "cabeças pensantes" da sua terra; apenas foi escutado pela gente humilde, marginalizada, condenada a uma situação de escravidão, de pobreza, de debilidade. Ele nunca se proclamou chefe de um movimento popular; apenas ensinou, àqueles que O seguiam, que Deus os ama e que quer fazer deles seus filhos. Ele nunca se sentou num trono, a dar ordens e a distribuir benesses; mas foi abandonado por todos, condenado a uma morte infame e pregado numa cruz. No entanto, Ele venceu a morte e recebeu de Deus a vida plena e definitiva. Paulo diz aos crentes a quem escreve: não vos preocupeis com aqueles valores a que o mundo chama êxito, realização, felicidade; mas tende a coragem de gastar a vida do mesmo jeito de Jesus, a fim de encontrardes a vossa realização plena, a vida definitiva.

    • Paulo ensina que a vida "segundo a carne" gera morte; e que a vida "segundo o Espírito" gera vida. O que é viver "segundo a carne"? Olhando para o mundo e para a vida da Igreja, quais são os sintomas que eu noto da vida "segundo a carne"? O que é viver "segundo o Espírito"? Olhando para o mundo e para a vida da Igreja, quais são os sintomas que eu noto da vida "segundo o Espírito"?

    • O cristão tem de viver "segundo o Espírito". É desse jeito que eu vivo? Estou aberto à acção renovadora e libertadora do Espírito que recebi no dia do meu Baptismo?

    ALELUIA - cf. Mt 11,25

    Aleluia. Aleluia.

    Bendito sejais, ó Pai, Senhor do céu e da terra,
    porque revelastes aos pequeninos os mistério
    s do reino.

    EVANGELHO - Mt 11,25-30

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

    Naquele tempo, Jesus exclamou:
    "Eu Te bendigo, ó Pai, Senhor do céu e da terra,
    porque escondeste estas verdades aos sábios e inteligentes
    e as revelaste aos pequeninos.
    Tudo me foi dado por meu Pai.
    Sim, Pai, Eu Te bendigo,
    porque assim foi do teu agrado.
    Ninguém conhece o Filho senão o Pai
    e ninguém conhece o Pai senão o Filho
    e aquele a quem o Filho o quiser revelar.
    Vinde a Mim,
    todos os que andais cansados e oprimidos,
    e Eu vos aliviarei.
    Tomai sobre vós o meu jugo
    e aprendei de Mim,
    que sou manso e humilde de coração,
    e encontrareis descanso para as vossas almas.
    Porque o meu jugo é suave e a minha carga é leve".

    AMBIENTE

    Após o "discurso da missão" e o envio dos discípulos ao mundo para continuarem a obra libertadora de Jesus (cf. Mt 9,36-11,1), Mateus coloca no seu esquema de Evangelho uma secção sobre as reacções e as atitudes que as várias pessoas e grupos tomam frente a Jesus e à sua proposta de "Reino" (cf. Mt 11,2-12,50). O nosso texto integra esta secção.
    Nos versículos anteriores ao texto que nos é hoje proposto (cf. Mt 11,20-24), Jesus havia dirigido uma veemente crítica aos habitantes de algumas cidades situadas à volta do lago de Tiberíades (Corozaim, Betsaida, Cafarnaum), porque foram testemunhas da sua proposta de salvação e mantiveram-se indiferentes. Estavam demasiado cheios de si próprios, instalados nas suas certezas, calcificados nos seus preconceitos e não aceitavam questionar-se, a fim de abrir o coração à novidade de Deus.
    Agora, Jesus manifesta-Se convicto de que essa proposta rejeitada pelos habitantes das cidades do lago encontrará acolhimento entre os pobres e marginalizados, desiludidos com a religião "oficial" e que anseiam pela libertação que Deus tem para lhes oferecer.
    O nosso texto consta de três "sentenças" que, provavelmente, foram pronunciadas em ambientes diversos deste que Mateus nos apresenta. Dois desses "ditos" (cf. Mt 11,25-27) aparecem também em Lucas (cf. Lc 10,21-22) e devem provir de um documento que reuniu os "ditos" de Jesus e que tanto Mateus como Lucas utilizaram na composição dos seus evangelhos. O terceiro (cf. Mt 11,28-30) é exclusivo de Mateus e deve provir de uma fonte própria.

    MENSAGEM

    A primeira sentença (cf. Mt 11,25-26) é uma oração de louvor que Jesus dirige ao Pai, porque Ele escondeu "estas coisas" aos "sábios e inteligentes" e as revelou aos "pequeninos".
    Os "sábios e inteligentes" são certamente esses "fariseus" e "doutores da Lei", que absolutizavam a Lei, que se consideravam justos e dignos de salvação porque cumpriam escrupulosamente a Lei, que não estavam dispostos a deixar pôr em causa esse sistema religioso em que se tinham instalado e que - na sua perspectiva - lhes garantia automaticamente a salvação. Os "pequeninos" são os discípulos, os primeiros a responder positivamente à oferta do "Reino"; e são também esses pobres e marginalizados (os doentes, os publicanos, as mulheres de má vida, o "povo da terra") que Jesus encontrava todos os dias pelos caminhos da Galileia, considerados malditos pela Lei, mas que acolhiam, com alegria e entusiasmo, a proposta libertadora de Jesus.
    A segunda sentença (cf. Mt 11,27) relaciona-se com a anterior e explica o que é que foi escondido aos "sábios e inteligentes" e revelado aos "pequeninos". Trata-se, nem mais nem menos, do "conhecimento" (quer dizer, uma "experiência profunda e íntima") de Deus.
    Os "sábios e inteligentes" (fariseus e doutores da Lei) estavam convencidos de que o conhecimento da Lei lhes dava o conhecimento de Deus. A Lei era uma espécie de "linha directa" para Deus, através da qual eles ficavam a conhecer Deus, a sua vontade, os seus projectos para o mundo e para os homens; por isso, apresentavam-se como detentores da verdade, representantes legítimos de Deus, capazes de interpretar a vontade e os planos divinos.
    Jesus deixa claro que quem quiser fazer uma experiência profunda e íntima de Deus tem de aceitar Jesus e segui-l'O. Ele é "o Filho" e só Ele tem uma experiência profunda de intimidade e de comunhão com o Pai. Quem rejeitar Jesus não poderá "conhecer" Deus: quando muito, encontrará imagens distorcidas de Deus e aplicá-las-á depois para julgar o mundo e os homens. Mas quem aceitar Jesus e O seguir, aprenderá a viver em comunhão com Deus, na obediência total aos seus projectos e na aceitação incondicional dos seus planos.
    A terceira sentença (cf. Mt 11,28-30) é um convite a ir ao encontro de Jesus e a aceitar a sua proposta: "vinde a Mim"; "tomai sobre vós o meu jugo...".
    Entre os fariseus do tempo de Jesus, a imagem do "jugo" era aplicada à Lei de Deus (cf. Si 6,24-30; 51,26-27) - a suprema norma de vida. Para os fariseus, por exemplo, a Lei não era um "jugo" pesado, mas um "jugo" glorioso, que devia ser carregado com alegria.
    Na realidade, tratava-se de um "jugo" pesadíssimo. A impossibilidade de cumprir, no dia a dia, os 613 mandamentos da Lei escrita e oral, criava consciências pesadas e atormentadas. Os crentes, incapazes de estar em regra com a Lei, sentiam-se condenados e malditos, afastados de Deus e indignos da salvação. A Lei aprisionava em lugar de libertar e afastava os homens de Deus em lugar de os conduzir para a comunhão com Deus.
    Jesus veio libertar o homem da escravidão da Lei. A sua proposta de libertação plena dirige-se aos doentes (na perspectiva da teologia oficial, vítimas de um castigo de Deus), aos pecadores (os publicanos, as mulheres de má vida, todos aqueles que tinham publicamente comportamentos política, social ou religiosamente incorrectos), ao povo simples do país (que, pela dureza da vida que levava, não podia cumprir escrupulosamente todos os ritos da Lei), a todos aqueles que a Lei exclui e amaldiçoa. Jesus garante-lhes que Deus não os exclui nem amaldiçoa e convida-os a integrar o mundo novo do "Reino". É nessa nova dinâmica proposta por Jesus que eles encontrarão a alegria e a felicidade que a Lei recusa dar-lhes.
    A proposta do "Reino" será uma proposta reservada a uma classe determinada (os pobres, os débeis, os marginalizados) em detrimento de outra (os ricos, os poderosos, os da "situação")? Não. A proposta do "Reino" destina-se a todos os homens e mulheres, sem excepção... No entanto, são os pobres e débeis aqueles que já desesperaram do socorro humano, que têm o coração mais disponível para acolher a proposta de Jesus. Os outros (os ricos, os poderosos) estão demasiado cheios de si próprios, dos seus interesses, dos seus esquemas organizados, para aceitar arriscar na novid
    ade de Deus.
    Acolhendo a proposta de Jesus e seguindo-O, os pobres e oprimidos encontrarão o Pai, tornar-se-ão "filhos de Deus" e descobrirão a vida plena, a salvação definitiva, a felicidade total.

    ACTUALIZAÇÃO

    Na reflexão, considerar os seguintes desenvolvimentos:

    • Na verdade, os critérios de Deus são bem estranhos, vistos de cá de baixo, com as lentes do mundo... Nós, homens, admiramos e incensamos os sábios, os inteligentes, os intelectuais, os ricos, os poderosos, os bonitos e queremos que sejam eles ("os melhores") a dirigir o mundo, a fazer as leis que nos governam, a ditar a moda ou as ideias, a definir o que é correcto ou não é correcto. Mas Deus diz que as coisas essenciais são muito mais depressa percebidas pelo "pequeninos": são eles que estão sempre disponíveis para acolher Deus e os seus valores e para arriscar nos desafios do "Reino". Quantas vezes os pobres, os pequenos, os humildes são ridicularizados, tratados como incapazes, pelos nossos "iluminados" fazedores de opinião, que tudo sabem e que procuram impor ao mundo e aos outros as suas visões pessoais e os seus pseudo-valores... A Palavra de Deus ensina: a sabedoria e a inteligência não garantem a posse da verdade; o que garante a posse da verdade é ter um coração aberto a Deus e às suas propostas (e com frequência, com muita frequência, são os pobres, os humildes, os pequenos que "sintonizam" com Deus e que acolhem essa verdade que Ele quer oferecer aos homens para os levar à vida em plenitude).

    • Como é que chegamos a Deus? Como percebemos o seu "rosto"? Como fazemos uma experiência íntima e profunda de Deus? É através da filosofia? É através de um discurso racional coerente? É passando todo o tempo disponível na igreja a mudar as toalhas dos altares? O Evangelho responde: "conhecemos" Deus através de Jesus. Jesus é "o Filho" que "conhece" o Pai; só quem segue Jesus e procura viver como Ele (no cumprimento total dos planos de Deus) pode chegar à comunhão com o Pai. Há crentes que, por terem feito catequese, por irem à missa ao domingo e por fazerem parte do conselho pastoral da paróquia, acham que conhecem Deus (isto é, que têm com Ele uma relação estreita de intimidade e comunhão)... Atenção: só "conhece" Deus quem é simples e humilde e está disposto a seguir Jesus no caminho da entrega a Deus e da doação da vida aos homens. É no seguimento de Jesus - e só aí - que nos tornamos "filhos" de Deus.

    • Como nos situamos face a Deus e à proposta que Ele nos apresenta em Jesus? Ficamos fechados no nosso comodismo e instalação, no nosso orgulho e auto-suficiência, sem vontade de arriscar e de pôr em causa as nossas seguranças, ou estamos abertos e atentos à novidade de Deus, a fim de perceber as suas propostas e seguir os seus caminhos?

    • Cristo quis oferecer aos pobres, aos marginalizados, aos pequenos, a todos aqueles que a Lei escravizava e oprimia, a libertação e a esperança. Os pobres, os débeis, os marginalizados, aqueles que não encontram lugar à mesa do banquete onde se reúnem os ricos e poderosos, continuam a encontrar - no testemunho dos discípulos de Jesus - essa proposta de libertação e de esperança? A Igreja dá testemunho da proposta libertadora de Jesus para os pobres? Como é que os pequenos e humildes são acolhidos nas nossas comunidades? Como é que acolhemos aqueles que têm comportamentos social ou religiosamente incorrectos?

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 14º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 14º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. PREPARAR LEITORES.
    Seria bom que todo o baptizado pudesse ser chamado a proclamar na assembleia a Palavra para os seus irmãos. Um leitor não preparado arrisca-se a não ser ouvido nem compreendido. O texto pode ser lido, mas será que "fala" aos membros da assembleia? Faz-se o rito da leitura, mas será que acontece verdadeiramente "liturgia da Palavra"? Seria bom, sobretudo em tempo de férias, organizar antecipadamente o grupo de leitores, para que a Palavra seja bem preparada, proclamada, escutada... e vivida!

    3. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
    Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.

    No final da primeira leitura:
    Senhor, nós exultamos de alegria e Te damos graças, porque abres os nossos espíritos e os nossos corações ao louvor e à admiração. Pelos teus profetas, desde o princípio manifestas a tua bondade e a tua ternura paterna.
    Nós Te pedimos por todos os povos que esperam com angústia o fim das guerras: concede-lhes artífices da paz.

    No final da segunda leitura:
    Nós Te bendizemos, porque és Espírito de vida. O teu Filho Jesus venceu todas as formas de morte.
    Nós Te pedimos, Tu que habitas em nós: concede a vida aos nossos seres mortais, purifica-nos pelo teu Espírito das desordens do homem pecador. Arranca-nos do domínio das forças de morte, faz-nos viver sob o domínio do Espírito.

    No final do Evangelho:
    Pai, Senhor do céu e da terra, com o teu Filho Jesus proclamamos o teu louvor: para Te dares a conhecer a nós e nos revelar o insondável mistério do teu amor, vieste até nós enviando o teu Filho.
    Nós Te pedimos: porque nos chamas a conhecer-Te, purifica as nossas inteligências, dá-nos um coração de criança na tua presença.

    4. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Pode-se escolher a Oração Eucarística IV, que nos recorda a fidelidade de Deus à sua aliança.

    5. PALAVRA PARA O CAMINHO.
    Reviravolta de valores. Numa sociedade idolatra que só crê na força, no poder, na riqueza, nos sucessos de todo o tipo... Jesus revela-nos que Deus confia os seus segredos aos mais pequenos... aqueles que não aparecem nas primeiras páginas dos jornais... aqueles que não contam grande coisa... Uma vez mais, é a reviravolta dos valores e o convite a rectificar os nossos julgamentos e os nossos comportamentos.

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • 15º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    15º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    16 de Julho, 2023

    ANO A
    15º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    Tema do 15º Domingo do Tempo Comum

    A liturgia do 15º Domingo do Tempo Comum convida-nos a tomar consciência da importância da Palavra de Deus e da centralidade que ela deve assumir na vida dos crentes.
    A primeira leitura garante-nos que a Palavra de Deus é verdadeiramente fecunda e criadora de vida. Ela dá-nos esperança, indica-nos os caminhos que devemos percorrer e dá-nos o ânimo para intervirmos no mundo. É sempre eficaz e produz sempre efeito, embora não actue sempre de acordo com os nossos interesses e critérios.
    O Evangelho propõe-nos, em primeiro lugar, uma reflexão sobre a forma como acolhemos a Palavra e exorta-nos a ser uma "boa terra", disponível para escutar as propostas de Jesus, para as acolher e para deixar que elas dêem abundantes frutos na nossa vida de cada dia. Garante-nos também que o "Reino" proposto por Jesus será uma realidade imparável, onde se manifestará em todo o seu esplendor e fecundidade a vida de Deus.
    A segunda leitura apresenta uma temática (a solidariedade entre o homem e o resto da criação) que, à primeira vista, não está relacionada com o tema deste domingo - a Palavra de Deus. Podemos, no entanto, dizer que a Palavra de Deus é que fornece os critérios para que o homem possa viver "segundo o Espírito" e para que ele possa construir o "novo céu e a nova terra" com que sonhamos.

    LEITURA I - Is 55,10-11

    Leitura do Livro de Isaías

    Eis o que diz o Senhor:
    "Assim como a chuva e a neve que descem do céu
    não voltam para lá sem terem regado a terra,
    sem a terem fecundado e feito produzir,
    para que dê a semente ao semeador e o pão para comer,
    assim a palavra que sai da minha boca
    não volta sem ter produzido o seu efeito,
    sem ter cumprido a minha vontade,
    sem ter realizado a sua missão".

    AMBIENTE

    O Deutero-Isaías, autor deste texto, é um profeta que exerce a sua missão entre os exilados da Babilónia, procurando consolar e manter acesa a esperança no meio de um povo amargurado, desiludido e decepcionado. Os capítulos que recolhem a sua mensagem (Is 40-55) chamam-se, por isso, "Livro da Consolação".
    Na primeira parte desse livro (cf. Is 40-48), o profeta anuncia aos exilados a libertação do cativeiro e um "novo êxodo" do Povo de Deus rumo à Terra Prometida; na segunda parte (cf. Is 49-55), o profeta fala da reconstrução e da restauração de Jerusalém.
    Estes três versículos que a primeira leitura de hoje nos propõem aparecem no final do "Livro da Consolação". Depois de convidar o Povo (que ainda está na Babilónia) a buscar e invocar o Senhor (cf. Is 55,6-9), o profeta relembra a eficácia da Palavra de Deus que acabou de ser proclamada aos exilados (cf. Is 55,10-11).
    Estamos na fase final do Exílio (à volta de 550/540 a.C.). A comunidade exilada está farta de belas palavras e de promessas de libertação que tardam a concretizar-se... A impaciência, a dúvida, o cepticismo vão minando lentamente a resistência e a fé dos exilados... Será que as promessas de Deus se concretizarão? Deus não está a ser demasiado lento, em relação a algo que exige uma intervenção imediata? Deus ter-se-á esquecido da situação do seu Povo?

    MENSAGEM

    Não - diz o profeta - Deus não se esqueceu do seu Povo. A sua Palavra não deixará de se concretizar, pois Deus é eternamente fiel às suas promessas. A Palavra de Deus é eficaz, transformadora, geradora de vida. Ela nunca falha.
    Para expressar a ideia da eficácia da Palavra de Deus, o profeta utiliza o exemplo da chuva e da neve: assim como a chuva e a neve que descem do céu fecundam a terra e multiplicam a vida nos campos, assim a Palavra de Jahwéh não deixará de se concretizar e de criar vida plena para o Povo de Deus.
    A imagem é extremamente sugestiva. Devia lembrar aos judeus exilados na Babilónia as chuvas que caem no norte de Israel e as neves do monte Hermon. Essa água caída do céu alimenta o rio Jordão; e este, por sua vez, corre por toda a terra de Israel, deixando um rasto de vida e de fecundidade.
    A Palavra de Deus é como essa água bendita caída do céu que, inevitavelmente, gera essa vida que alimenta o Povo de Deus.

    ACTUALIZAÇÃO

    Na reflexão, considerar os seguintes elementos:

    • Quando escutamos a Palavra de Deus, sentimo-nos confiantes, optimistas, com o coração a transbordar de esperança; sentimos que o caminho que Deus nos indica é, efectivamente, um caminho de felicidade e de vida plena... "Que bom é estarmos aqui" - dizemos... Depois, voltamos à nossa vida do dia a dia e reencontramos a monotonia, os problemas, o desencanto; constatamos que os maus, os corruptos, os violentos, parecem triunfar sempre e nunca são castigados pelo seu egoísmo e prepotência, enquanto que os bons, os justos, os humildes, os pacíficos são continuamente vencidos, magoados, humilhados... Então perguntamos: podemos confiar nas promessas de Deus? Não estaremos a ser enganados? A Palavra de Deus que hoje nos é proposta responde a estas dúvidas. Ela garante-nos: a Palavra de Deus não falha; ela indica sempre caminhos de vida plena, de vida verdadeira, de liberdade, de felicidade, de paz sem fim.

    • A Palavra de Deus não poderá ser uma espécie de ópio do Povo, no sentido de que projecta em Deus as esperanças e os sonhos que nos competem a nós concretizar? Atenção: é preciso estarmos bem conscientes de que Deus não prescinde de nós para actuar na história humana... A sua Palavra dá-nos esperança, indica-nos os caminhos que devemos percorrer e dá-nos o ânimo para intervirmos no mundo. A Palavra de Deus não só não adormece a nossa vontade de agir, mas revela-nos os projectos de Deus para o mundo e para os homens e convida-nos ao compromisso com a transformação e a renovação do mundo.

    • Vivemos na era do relógio. "Tempo é dinheiro" - dizemos. Passamos a vida numa correria louca, contando os minutos, sem tempo para as pessoas, sem tempo para Deus, sem tempo para nós. Tornamo-nos impacientes e exigentes; achamos que ser eficiente é ter feito ontem aquilo que é pedido para hoje... E achamos que Deus também deve seguir os nossos ritmos. Queremos que Ele aja imediatamente, que nos resolva logo os problemas, que actue de imediato, ao sabor dos nossos desejos e projectos. É preciso, no entanto, aprender a respeitar o ritmo de Deus, o tempo de Deus. Não nos basta saber que a Palavra de Deus é sempre eficaz (embora não tenha os nossos prazos) e que não volta sem ter produzido o seu efeito, sem ter cumprido a vontade de Deus, sem ter realizado a sua missão?

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 64 (65)

    Refrão: A semente caiu em boa terra e de
    u muito fruto.

    Visitastes a terra e a regastes,
    enchendo-a de fertilidade.
    As fontes do céu transbordam em água
    e fazeis brotar o trigo.

    Assim preparais a terra;
    regais os seus sulcos e aplanais as leivas,
    Vós a inundais de chuva
    e abençoais as sementes.

    Coroastes o ano com os vossos benefícios,
    por onde passastes brotou a abundância.
    Vicejam as pastagens do deserto
    e os outeiros vestem-se de festa.

    Os prados cobrem-se de rebanhos
    e os vales enchem-se de trigo.
    Tudo canta e grita de alegria.

    LEITURA II - Rom 8,18-23

    Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Romanos

    Irmãos:
    Eu penso que os sofrimentos do tempo presente
    não têm comparação com a glória
    que se há-de manifestar em nós.
    Na verdade, as criaturas esperam ansiosamente
    a revelação dos filhos de Deus.
    Elas estão sujeitas à vã situação do mundo,
    não por sua vontade,
    mas por vontade d'Aquele que as submeteu,
    com a esperança de que as mesmas criaturas
    sejam também libertadas da corrupção que escraviza,
    para receberem a gloriosa liberdade dos filhos de Deus.
    Sabemos que toda a criatura geme ainda agora
    e sofre as dores da maternidade.
    E não só ela, mas também nós,
    que possuímos as primícias do Espírito,
    gememos interiormente,
    esperando a adopção filial e a libertação do nosso corpo.

    AMBIENTE

    Paulo continua a oferecer-nos a sua catequese sobre o caminho que é preciso seguir para se poder acolher a salvação que Deus oferece. A salvação é um dom de Deus, dom gratuito, que é fruto da bondade e do amor de Deus (cf. Rom 3,1-5,11). Essa salvação chega-nos através de Jesus Cristo (cf. Rom 5,12-8,39); e actua em nós pelo Espírito que Jesus derrama sobre aqueles que aderem ao seu projecto e entram na sua comunidade (cf. Rom 8,1-39).
    Nos versículos anteriores ao texto que hoje nos é proposto (cf. Rom 8,1-17), Paulo mostrou aos crentes o exemplo de Cristo e convidou os cristãos a seguirem o mesmo percurso. De forma especial, disse-lhes que seguir o exemplo de Cristo implica deixar a vida "segundo a carne" (isto é, a vida do egoísmo, do orgulho, da auto-suficiência) e aderir à vida "segundo o Espírito" (isto é, a vida de escuta de Deus, de obediência aos projectos de Deus, de doação aos homens).

    MENSAGEM

    Na perspectiva de Paulo, o homem não é o único interessado na opção por uma vida "segundo o Espírito": toda a criação está dependente das escolhas que o homem faz. O que é que isto significa?
    Como resultado do pecado do homem, a criação inteira ficou submetida ao império do egoísmo e da desordem (cf. Gn 3,17) e está condenada à finitude e à caducidade. Se o homem aderir a Cristo e passar a viver "segundo o Espírito", superará o destino de maldição e de morte em que o pecado o tinha lançado; então, também o resto da criação será libertado e nascerá o novo céu e a nova terra. É o tema da solidariedade entre o homem, os outros animais e a natureza, tão enraizado na Bíblia (cf. Gn 9,12-13; Col 1,20; 2 Pe 3,13; Ap 21,1-15).
    Portanto, toda a criação aguarda ansiosamente que o homem escolha a vida "segundo o Espírito". Até lá, vai nascendo - no meio da dificuldade e da dor - esse Homem Novo, bem como esse Novo Céu e Nova Terra com que todos sonhamos. Porquê na dificuldade e na dor? Porque a vida "segundo o Espírito" supõe a renúncia ao egoísmo, aos interesses mesquinhos, ao comodismo, ao orgulho e a opção por um caminho de entrega e de dom da própria vida a Deus e aos outros. Paulo utiliza até o exemplo das dores do parto, para iluminar a mensagem que pretende transmitir... O nascimento de uma criança dá-se sempre através da dor; no entanto, essa dor é o caminho obrigatório para o nascimento de uma nova vida.
    De resto, vale a pena viver "segundo o Espírito". Os "padecimentos", as renúncias, as dificuldades, não são nada, em comparação com a felicidade sem fim que espera os crentes no final do caminho.

    ACTUALIZAÇÃO

    Na reflexão, ter em conta os seguintes elementos:

    • Antes de mais, Paulo exorta os crentes a decidirem-se por uma vida "segundo o Espírito". Essa opção terá uma dimensão cósmica e afectará a relação do homem com os outros homens e com toda a criação. Uma vida conduzida de acordo com critérios de egoísmo, de orgulho, de auto-suficiência, de pecado, gera escravidão, injustiça, arbitrariedade, morte, sofrimento, que se reflectem na vida de todos os outros seres criados e criam desequilíbrios que desfeiam este mundo que Deus quis "bom"... Ao contrário, uma vida conduzida de acordo com os critérios de Deus gera respeito, amor, solidariedade, que se reflectem na vida dos outros seres criados e criam harmonia, equilíbrio, bem-estar, felicidade. Tenho consciência de que as minhas opções afectam os outros meus irmãos, bem como o mundo que me rodeia? Tenho consciência de que o mundo será melhor ou pior, de acordo com as opções que eu fizer?

    • No nosso tempo manifesta-se, cada vez mais, uma preocupação séria com a forma como usamos o mundo que Deus nos ofereceu. O homem de hoje já descobriu que a criação não é para ser explorada, violentada, usada de acordo com critérios de egoísmo e de exploração. Aquilo que nos deve mover, no entanto, não é a simples preocupação com o esgotamento dos recursos, ou com a destruição das condições de habitabilidade do nosso planeta; mas o que nos deve mover é a ideia da fraternidade que deve unir o homem e as outras coisas criadas por Deus. Só quando se instalar essa consciência de fraternidade, podemos libertar toda a criação do egoísmo e da exploração em que o homem a encerrou e fazer aparecer o "novo céu e a nova terra".

    • Muitas vezes sentimo-nos confusos com certas novidades que nos desconcertam e que parecem pôr em causa os velhos esquemas sobre os quais o mundo se tem edificado. Criticamos os mais jovens pela sua ousadia, pelos seus valores, pelas suas preocupações, pela sua visão do mundo... Não sabemos para onde vamos e parece que nada faz sentido... Sentimo-nos abalados e inseguros; lamentamo-nos porque tudo parece ir de mal a pior e não sabemos "onde isto vai parar". Não é possível que, em muitos casos, a nossa rigidez esconda o comodismo, a instalação, o aburguesamento de quem tem medo da novidade?

    • Aconteça o que acontecer, somos convidados a olhar para o futuro do mundo e da humanidade com os óculos da esperan
    ça. Não caminhamos para o holocausto, para a destruição, para o nada, mas para o "novo céu e a nova terra", que já estão em gérmen presentes na nossa história e que, cada dia, se manifestam um pouco mais.

    • Atenção: esse "novo céu e nova terra" não podem ser projectados para um futuro ideal, no céu... Eles estão já a construir-se na terra, na nossa história, sempre que os seguidores de Jesus aceitam o seu convite e se dispõem a viver "segundo o Espírito".

    ALELUIA

    Aleluia. Aleluia.

    A semente é a palavra de Deus e o semeador é Cristo.
    Quem O encontra viverá eternamente.

    EVANGELHO - Mt 13,1-23

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

    Naquele dia,
    Jesus saiu de casa e foi sentar-Se à beira-mar.
    Reuniu-se à sua volta tão grande multidão
    que teve de subir para um barco e sentar-Se,
    enquanto a multidão ficava na margem.
    Disse muitas coisas em parábolas, nestes termos:
    "Saiu o semeador a semear.
    Quando semeava,
    caíram algumas sementes ao longo do caminho:
    vieram as aves e comeram-nas.
    Outras caíram em sítios pedregosos,
    onde não havia muita terra,
    e logo nasceram porque a terra era pouco profunda;
    mas depois de nascer o sol, queimaram-se e secaram,
    por não terem raiz.
    Outras caíram entre espinhos
    e os espinhos cresceram e afogaram-nas.
    Outras caíram em boa terra e deram fruto:
    umas, cem; outras, sessenta; outras, trinta por um.
    Quem tem ouvidos, oiça".

    Os discípulos aproximaram-se de Jesus e disseram-Lhe:
    "Porque lhes falas em parábolas?"
    Jesus respondeu-lhes:
    "Porque a vós é dado conhecer os mistérios do reino dos Céus,
    mas a eles não.
    Pois àquele que tem dar-se-á e terá em abundância;
    mas àquele que não tem, até o pouco que tem lhe será tirado.
    É por isso que lhes falo em parábolas,
    porque vêem sem ver e ouvem sem ouvir nem entender.
    Neles se cumpre a profecia de Isaías que diz:
    'Ouvindo ouvireis, mas sem compreender;
    olhando olhareis, mas não vereis.
    Porque o coração deste povo tornou-se duro:
    endureceram os seus ouvidos e fecharam os seus olhos,
    para não acontecer
    que, vendo com os olhos e ouvindo com os ouvidos
    e compreendendo com o coração,
    se convertam e Eu os cure'.
    Quanto a vós, felizes os vossos olhos porque vêem
    e os vossos ouvidos porque ouvem!
    Em verdade vos digo: muitos profetas e justos
    desejaram ver o que vós vedes e não viram
    e ouvir o que vós ouvis e não ouviram.
    Vós, portanto, escutai o que significa a parábola do semeador:
    Quando um homem ouve a palavra do reino
    e não a compreende,
    vem o Maligno e arrebata o que foi semeado no seu coração.
    Este é o que recebeu a semente ao longo do caminho.
    Aquele que recebeu a semente em sítios pedregosos
    é o que ouve a palavra e a acolhe de momento,
    mas não tem raiz em si mesmo, porque é inconstante,
    e, ao chegar a tribulação ou a perseguição por causa da palavra,
    sucumbe logo.
    Aquele que recebeu a semente entre espinhos
    é o que ouve a palavra,
    mas os cuidados deste mundo e a sedução da riqueza
    sufocam a palavra, que assim não dá fruto.
    E aquele que recebeu a palavra em boa terra
    é o que ouve a palavra e a compreende.
    Esse dá fruto,
    produz ora cem, ora sessenta, ora trinta por um".

    AMBIENTE

    Hoje e nos próximos dois domingos, o Evangelho apresenta-nos parábolas de Jesus. A "parábola" é uma imagem ou comparação, através da qual se ilustra uma determinada mensagem ou ensinamento.
    A linguagem parabólica não foi inventada por Jesus. É uma linguagem habitual na literatura dos povos do Médio Oriente: o génio oriental gosta mais de falar e de instruir através de imagens, de comparações e de alegorias, do que através dos discursos lógicos, frios e racionais, típicos da civilização ocidental.
    A linguagem parabólica tem várias vantagens em relação a um discurso mais lógico e impositivo. Em primeiro lugar, porque a imagem ou comparação que caracteriza a linguagem parabólica é muito mais rica em força de comunicação e em poder de evocação, do que a simples exposição teórica: é mais profunda, mais carregada de sentido, mais evocadora e, por isso, mexe mais com os ouvintes. Em segundo lugar, porque é uma excelente arma de controvérsia: a linguagem figurada permite levar o interlocutor a admitir certos pontos que, de outro modo, nunca mereceriam a sua concordância. Em terceiro lugar, porque é um verdadeiro método pedagógico, que ensina as pessoas a reflectir, a medir os prós e os contras, a encontrar soluções para os dilemas que a vida põe: espicaça a curiosidade, incita à busca, convida a descobrir a verdade.
    No capítulo 13 do seu Evangelho, Mateus apresenta-nos sete parábolas, através das quais Jesus revela aos discípulos a realidade do "Reino": são as "parábolas do Reino".
    Dessas sete parábolas, três procedem da tradição sinóptica (o semeador, o grão de mostarda, o fermento); as outras quatro (o trigo e o joio, o tesouro escondido, a pérola preciosa, a rede) não se encontram nem em Marcos, nem em Lucas. Provavelmente, são originárias da antiga fonte dos "ditos" de Jesus, que Mateus usou abundantemente na composição do seu Evangelho.
    A preocupação do evangelista Mateus é sempre a vida da sua comunidade. Nestas sete parábolas e na interpretação que as acompanha, percebe-se a preocupação de um pastor que procura exortar, animar, ensinar e fortalecer a fé desses crentes a quem o Evangelho se destina.

    MENSAGEM

    A parábola que hoje nos é proposta - a do semeador e da semente - é uma das mais conhecidas e emblemáticas das parábolas de Jesus. No entanto, o texto do Evangelho de hoje vai um pouco mais além da parábola em si... Apresenta três partes: a parábola (vers. 1-9), um conjunto de "ditos" sobre a função das parábolas (vers. 10-17) e a explicação da parábola (vers. 18-23).
    Na primeira parte temos, pois, a parábola propriamente dita (vers. 1-9). O quadro apresentado supõe as técnicas agrícolas usadas na Palestina de então: primeiro, o agricultor lançava a semente à terra; depois, é que passava a arar o terreno. Assim compreende-se porque é que uma parte da semente pôde cair "à beira do caminho", outra em "sítios pedregosos onde não havia muita terra" e outra "entre os espinhos".
    Evidentemente, a
    s diferenças do terreno significam, nesta "comparação", as diferentes formas como é acolhida a semente. No entanto, nem sequer é isso que é mais significativo: o que aqui é verdadeiramente significativo é a quantidade espantosa de frutos que a semente lançada na "boa terra" produz... Tendo em conta que, na época, uma colheita de sete por um era considerada farta, os cem, sessenta e trinta por um deviam parecer aos ouvintes de Jesus algo de surpreendente, de exagerado, de milagroso...
    Mateus coloca esta parábola num contexto em que a proposta de Jesus parece condenada ao malogro. As cidades do lago (Corozaim, Betsaida, Cafarnaum) tinham rejeitado a sua pregação (cf. Mt 11,20-24); os fariseus atacavam-no por Ele não respeitar o sábado e queriam matá-l'O (cf. Mt 12,1-14); acusavam-n'O, além disso, de agir, não pelo poder de Deus, mas pelo poder de Belzebu, príncipe dos demónios (cf. Mt 12,22-29); não acreditavam nas suas palavras e exigiam d'Ele "sinais" (cf. Mt 12,38-45). O "Reino" anunciado sofria grande contestação e parecia, pois, encaminhar-se para um rotundo fracasso...
    É muito possível que esta parábola tenha sido apresentada por Jesus neste contexto de "crise". Àqueles que manifestavam desânimo e desconfiança em relação ao êxito do projecto do "Reino", Jesus fala de um resultado final grandioso. Com esta parábola, Jesus diz aos discípulos desiludidos: "coragem! Não desanimeis, pois apesar do aparente fracasso, o 'Reino' é uma realidade imparável; e o resultado final será algo de surpreendente, de maravilhoso, de inimaginável".
    Na segunda parte temos uma reflexão sobre a função das parábolas (vers. 10-17). O ponto de partida é uma questão posta pelos discípulos: porque é que Jesus fala em parábolas?
    Mateus vê nas parábolas a ocasião para que apareçam, com nitidez, o acolhimento e a recusa da mensagem proposta por Jesus. Que quer isto dizer?
    As parábolas apresentam a proposta do "Reino" numa linguagem sugestiva, rica, clara, concreta, questionante, interpeladora... Tornam tudo claro e evidente para os ouvintes; por isso, após escutar a mensagem apresentada nas parábolas, só não aceita a mensagem quem tiver o coração endurecido e não estiver mesmo interessado na proposta. As parábolas são, portanto, o factor decisivo: propõem clara e inequivocamente a realidade do "Reino". Quem acolher essa mensagem, receberá mais e "terá em abundância" (quer dizer, irá entrando, cada vez mais, na dinâmica do "Reino"); mas quem não a acolher (apesar da clareza e da acessibilidade da mensagem), está a rejeitar o "Reino" e a possibilidade de integrar a comunidade da salvação. Nos que rejeitam a proposta de Jesus, cumpre-se a profecia de Isaías: o profeta fala de um povo de coração endurecido, que quanto mais ouve a pregação profética, mais se irrita, agravando cada vez mais a sua culpa (cf. Is 6,9-10).
    Os discípulos são aqueles que escutam a proposta do "Reino" e estão dispostos a acolhê-la. Eles compreendem, portanto, as parábolas e aceitam a realidade que elas propõem. Eles são "felizes", porque abriram o coração às propostas de Jesus, escutaram as suas palavras, viram e entenderam os seus gestos e sinais; são "felizes" porque (ao contrário daqueles que endureceram o coração e fecharam os ouvidos à proposta de Jesus) já integram o "Reino".
    Na terceira parte, temos a explicação da parábola (vers. 18-23). Alguns indícios presentes no texto levam a pensar que esta explicação não fazia parte da parábola original, mas é uma adaptação posterior, que aplica a parábola à vida dos cristãos.
    A explicação desloca, de forma evidente, o "centro de interesse". Nessa explicação, a parábola deixa de ser uma apresentação da forma grandiosa como o "Reino" se vai manifestar, para passar a ser uma reflexão sobre as diversas atitudes com que a comunidade acolhe a Palavra de Jesus (na verdade, é essa a grande preocupação das comunidades cristãs).
    Na perspectiva dos catequistas que prepararam esta aplicação da parábola, o acolhimento do Evangelho não depende, nem da semente, nem de quem semeia; mas depende da qualidade da terra.
    Diante da Palavra de Jesus, há várias atitudes... Há aqueles que têm um coração duro como o chão de terra batida dos caminhos: a Palavra de Jesus não poderá penetrar nessa terra e dar fruto. Há aqueles que têm um coração inconstante, capaz de se entusiasmar instantaneamente, mas também de desanimar perante as primeiras dificuldades: a Palavra de Jesus não pode aí criar raízes. Há aqueles que têm um coração materialista, que dá sempre prioridade à riqueza e aos bens deste mundo: a Palavra de Jesus é aí facilmente sufocada por esses outros interesses dominantes. Há também aqueles que têm um coração disponível e bom, aberto aos desafios de Deus: a Palavra de Jesus é aí acolhida e dá muito fruto. Os verdadeiros discípulos (a "boa terra") identificam-se com aqueles que escutam as parábolas, as entendem e acolhem a proposta do "Reino".
    Temos aqui, portanto, uma exortação aos cristãos no sentido de acolherem a Palavra de Jesus, sem deixarem que as dificuldades, os acidentes da vida, os outros valores a afoguem e a tornem uma semente estéril, sem vida.

    ACTUALIZAÇÃO

    Reflectir nas seguintes questões:

    • No seu "estado actual", a parábola do semeador e da semente é, sobretudo, um convite a reflectir sobre a importância e o significado da Palavra de Jesus. É verdade que, nas nossas comunidades cristãs, a Palavra de Jesus é a referência fundamental, à volta do qual se constrói a vida da comunidade e dos crentes? Temos consciência de que é a Palavra anunciada, proclamada, meditada, partilhada, celebrada, que cria a comunidade e que a alimenta no dia a dia?

    • A semente que caiu em terrenos duros, de terra batida, faz-nos pensar em corações insensíveis, egoístas, orgulhosos, onde não há lugar para a Palavra de Jesus e para os valores do "Reino". É a realidade de tantos homens e mulheres que vêem no Evangelho um caminho para fracos e vencidos, e que preferem um caminho de independência e de auto-suficiência, à margem de Deus e das suas propostas. Este caminho de orgulho e de auto-suficiência alguma vez foi "o meu caminho"?

    • A semente que caiu em sítios pedregosos, que brota nessa pequena camada de terra que aí há, mas que morre rapidamente por falta de raízes profundas, faz-nos pensar em corações inconstantes, capazes de se entusiasmarem com o "Reino", mas incapazes de suportarem as contrariedades, as dificuldades, as perseguições. É a realidade de tantos homens e mulheres que vêem em Jesus uma verdadeira proposta de salvação e que a ela aderem, mas que rapidamente perdem a coragem e entram num jogo de cedências e de meias tintas quando são confrontados com a radicalidade do Evangelho. A Palavra de Deus é, para mim, uma realidade que eu levo a sério, ou algo que eu deixo cair quando me dá jeito?

    • A semente que caiu entre os espinhos e que foi sufocada por eles, faz-nos pensar em corações materialistas, comodistas, instalados, para quem a proposta do "Reino" não é a prioridade fundamental. É a realidade de tantos homens e mulheres que, sem rejeitarem a proposta de Jesus (muitas vezes são "muito religiosos" e têm "a sua fé") fazem do dinheiro, do poder, da fama, do êxito profissional ou social o verdadeiro Deus a que tudo sacrificam. As propostas de Jesus são a referência fundamental à volta da qual a minha vida se constrói, ou deixo que outros interesses e valores sufoquem os valores do Evangelho?

    • A semente que caiu em boa terra e que deu fruto abundante faz-nos pensar em corações sensíveis e bons, capazes de aderirem às propostas de Jesus e de embarcarem na aventura do "Reino". É a realidade de tantos homens e mulheres que encontraram na proposta de Jesus um caminho de libertação e de vida plena e que, como Jesus, aceitam fazer da sua vida uma entrega a Deus e um dom aos homens. Este é o quadro ideal do verdadeiro discípulo; e é esta a proposta que o Evangelho de hoje me faz.

    • A parábola, na sua forma original (vers. 1-9) refere-se à inevitável erupção do "Reino", à sua força e aos resultados maravilhosos que o "Reino" alcançará... Com frequência, olhamos o mundo que nos rodeia e ficamos desanimados com o materialismo, a futilidade, os falsos valores que marcam a vida de muitos homens e mulheres do nosso tempo. Perguntamo-nos se vale a pena anunciar a proposta libertadora de Jesus num mundo que vive obcecado com as riquezas, com os prazeres, com os valores materiais... O Evangelho de hoje responde: "coragem! Não desanimeis pois, apesar do aparente fracasso, o 'Reino' é uma realidade imparável; e o resultado final será algo de surpreendente, de maravilhoso, de inimaginável".

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 15º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 15º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. CONTINUIDADE COM O PRÓXIMO DOMINGO.
    Este domingo está marcado pela palavra do semeador. No próximo domingo escutaremos a parábola do joio. Estas duas parábolas que falam da vida da terra permitem criar uma unidade, um seguimento entre os dois domingos. Uma decoração simples na igreja pode ser um meio adequado para assinalar esta continuidade.

    3. PREPARAR UMA "PEQUENA ENTRADA".
    Em razão da primeira leitura e do Evangelho, pode-se fazer, no início da liturgia da Palavra (e também no próximo domingo), o que as Igrejas do Oriente chamam a "pequena entrada". Trazido por uma pessoa, acompanhada de várias pessoas com velas ou lamparinas, o leccionário (ou a Bíblia) parte do fundo da igreja e atravessa a assembleia antes de ser colocado no ambão. Durante este tempo, pode-se entoar um cântico de aclamação à Palavra.

    4. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
    Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.

    No final da primeira leitura:
    Deus que estás tão próximo de nós, nós Te damos graças pela tua Palavra. Assim como os pais comunicam com os seus filhos para os fazer crescer, também Tu ages para connosco para nos elevar para Ti.
    Nós Te pedimos: prepara os nossos corações e os nossos espíritos como uma boa terra para o acolhimento da tua Palavra, para que ela germine e dê fruto nas nossas vidas.

    No final da segunda leitura:
    Nós Te damos graças, ó Pai, porque és o Criador do imenso e admirável universo, que nos ofereces como um jardim para cultivar.
    Nós Te pedimos por toda a criação, mas sobretudo pela humanidade, guarda da nossa terra e do espaço. Ilumina-nos com o teu Espírito criador, para nos inspirar o respeito pela tua criação.

    No final do Evangelho:
    Nós Te agradecemos pelo semeador que nos enviaste, Jesus, teu Filho. Ele lançou generosamente o bom grão do teu amor e da tua vida em todos os terrenos, e Ele continua esta obra na tua Igreja.
    Nós Te pedimos pelas nossas comunidades: livra-nos de abafar o bom grão, mas que o teu Espírito o faça frutificar em nós e à nossa volta.

    5. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Pode-se escolher a Oração Eucarística III, com as suas belas epicleses, que põem em evidência a obra do Espírito.

    6. PALAVRA PARA O CAMINHO.
    Que género de terra somos nós? Que género de terra somos nós para esta Palavra semeada em nós com abundância? Se a possibilidade nos é oferecida, tomemos um momento ao longo da semana, directamente na natureza, para rezar esta página do Evangelho. E deixemo-la enraizar-se em nós para lhe permitir produzir fruto em abundância.

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • 16º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    16º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    23 de Julho, 2023

    Ano A
    16º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    Tema do 16º Domingo do Tempo Comum

    A liturgia do 16º Domingo do Tempo Comum convida-nos a descobrir o Deus paciente e cheio de misericórdia, a quem não interessa a marginalização do pecador, mas a sua integração na comunidade do "Reino"; e convida-nos, sobretudo, a interiorizar essa "lógica" de Deus, deixando que ela marque o olhar que lançamos sobre o mundo e sobre os homens.
    A primeira leitura fala-nos de um Deus que, apesar da sua força e omnipotência, é indulgente e misericordioso para com os homens - mesmo quando eles praticam o mal. Agindo dessa forma, Deus convida os seus filhos a serem "humanos", isto é, a terem um coração tão misericordioso e tão indulgente como o coração de Deus.
    O Evangelho garante a presença irreversível no mundo do "Reino de Deus". Esse "Reino" não é um clube exclusivo de "bons" e de "santos": nele todos os homens - bons e maus - encontram a possibilidade de crescer, de amadurecer as suas escolhas, de serem tocados pela graça, até ao momento final da opção definitiva.
    A segunda leitura sublinha, doutra forma, a bondade e a misericórdia de Deus. Afirma que o Espírito Santo - dom de Deus - vem em auxílio da nossa fragilidade, guiando-nos no caminho para a vida plena.

    LEITURA I - Sab 12,13.16-19

    Leitura do Livro da Sabedoria

    Não há Deus, além de Vós,
    que tenha cuidado de todas as coisas;
    a ninguém tendes de mostrar que não julgais injustamente.
    O vosso poder é o princípio da justiça
    e o vosso domínio soberano
    torna-Vos indulgente para com todos.
    Mostrais a vossa força
    aos que não acreditam na vossa omnipotência
    e confundis a audácia daqueles que a conhecem.
    Mas Vós, o Senhor da força, julgais com bondade
    e governais-nos com muita indulgência,
    porque sempre podeis usar da força quando quiserdes.
    Agindo deste modo, ensinastes ao vosso povo
    que o justo deve ser humano
    e aos vossos filhos destes a esperança feliz
    de que, após o pecado, dais lugar ao arrependimento.

    AMBIENTE

    O "Livro da Sabedoria" é o mais recente de todos os livros do Antigo Testamento (aparece durante a primeira metade do séc. I a.C.). O seu autor - um judeu de língua grega, provavelmente nascido e educado na Diáspora (Alexandria?) - exprimindo-se em termos e concepções do mundo helénico, faz o elogio da "sabedoria" israelita, traça o quadro da sorte que espera o justo e o ímpio no mais-além e descreve (com exemplos tirados da história do Êxodo) as sortes diversas que tiveram os pagãos (idólatras) e os hebreus (fiéis a Jahwéh). O seu objectivo é duplo: dirigindo-se aos seus compatriotas judeus (mergulhados no paganismo, na idolatria, na imoralidade), convida-os a redescobrirem a fé dos pais e os valores judaicos; dirigindo-se aos pagãos, convida-os a constatar o absurdo da idolatria e a aderir a Jahwéh, o verdadeiro e único Deus... Para uns e para outros, só Jahwéh garante a verdadeira "sabedoria" e a verdadeira felicidade.
    O texto que nos é proposto pertence à terceira parte do livro (cf. Sab 10,1-19,22). Nessa parte, recorrendo, sobretudo, à técnica do midrash, o autor faz a comparação entre os castigos que Deus lançou contra os "ímpios" (os pagãos) e a salvação reservada aos "justos" (o Povo de Deus).
    O autor começa por mostrar como a "sabedoria" de Deus se manifestou na história de Israel (cf. Sab 10,1-11,14). Em contraste, vai descrever como é que Deus tratou os egípcios (cf. Sab 11,15-20) e os idólatras cananeus (cf. Sab 12,3-19). O texto que nos é proposto faz parte desta última perícopa.
    Os cananeus eram, na perspectiva dos israelitas, uma raça maldita e perversa, que cometiam crimes especialmente hediondos: "praticavam obras detestáveis, ritos ímpios, e eram cruéis assassinos dos seus filhos" (Sab 12,4-5). Deus podia tê-los eliminado rapidamente (cf. Sab 12,9); no entanto, retardou o mais possível o castigo (cf. Sab 12,8), dando-lhes várias oportunidades de se arrependerem e de mudarem de vida (cf. Sab 12,10).

    MENSAGEM

    Nessas circunstâncias, Jahwéh deu provas de extrema moderação e manifestou a sua bondade, a sua misericórdia, a sua justiça. Deus não tinha que provar nada a ninguém, pois ninguém lhe podia pedir contas; se agiu dessa forma equilibrada e moderada, é porque é um Deus justo. A "justiça" não é, no Antigo Testamento, a estrita aplicação da lei; mas é, sobretudo, a fidelidade à própria essência. Ora, a essência de Deus é amor, bondade e misericórdia; por isso, ser justo equivale, para Deus, a revelar amor, benevolência e bondade na sua atitude para com os homens.
    O que é mais significativo aqui é que a "justiça de Deus" não se exerce sobre o Povo de Deus, mas sobre um povo "de má estirpe" e de "maldade congénita" (Sab 12,10): é a universalidade da salvação que assim é sugerida.
    Por outro lado, o autor vê neste comportamento "justo" de Deus uma lição para Israel. Que é que, desta forma, Deus ensina ao seu Povo?
    Ensina, em primeiro lugar, que Deus não quer a morte do pecador, mas sim que ele se converta e viva; por isso, "fecha os olhos" diante do pecado do homem, a fim de o convidar ao arrependimento.
    Ensina, em segundo lugar, que "o justo deve ser amigo dos homens" (Sab 12,19): se a lógica de Deus é uma lógica de perdão e de misericórdia, o Povo de Deus deve adoptar a mesma lógica e assumir atitudes de bondade, de amor, de misericórdia, de tolerância, nas suas relações comunitárias. Mais: a bondade e a compreensão não devem ser reservadas para aqueles que são bons, mas também para aqueles que fazem insistentemente o mal.

    ACTUALIZAÇÃO

    Para a reflexão e actualização da Palavra, podem tomar-se as seguintes indicações:

    • O nosso texto apresenta-nos um Deus tolerante e justo, em quem a bondade e a misericórdia se sobrepõem à vontade de castigar. Ele não quer a destruição do pecador, mas a sua conversão; Ele ama todos os homens que criou, mesmo aqueles que praticam acções erradas. Ora, todos nós conhecemos bem este quadro de Deus, pois ele aparece-nos a par e passo na Palavra revelada... Mas já o interiorizámos suficientemente?

    • Interiorizar esta "fotografia" de Deus significa "empapar-nos" da lógica do amor e da misericórdia e deixar que ela transpareça em gestos para com os nossos irmãos. Isso acontece realmente? Qual a nossa atitude para com aqueles que nos fizeram mal, ou cujos comportament
    os nos desafiam e incomodam? Faz sentido catalogar os homens em bons e maus e defendermos uma justiça implacável para com aqueles que praticam acções erradas?

    • Muitas vezes, percebemos certos males que nos incomodam como "castigos" de Deus pelo nosso mau proceder. No entanto, este texto deixa claro que Deus não está interessado em castigar os pecadores... Quando muito, procura fazer-nos perceber, com a pedagogia de um pai cheio de amor, o sem sentido de certas opções e o mal que nos fazem certos caminhos que escolhemos.

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 85 (86)

    Refrão: Senhor, sois um Deus clemente e compassivo.

    Vós, Senhor, sois bom e indulgente,
    cheio de misericórdia para com todos os que Vos invocam.
    Ouvi, Senhor, a minha oração,
    atendei a voz da minha súplica.

    Todos os povos que criastes virão adorar-vos, Senhor,
    e glorificar o vosso nome,
    porque Vós sois grande e operais maravilhas,
    Vós sois o único Deus.

    Senhor, sois um Deus bondoso e compassivo,
    paciente e cheio de misericórdia e fidelidade.
    Voltai para mim os vossos olhos
    e tende piedade de mim.

    LEITURA II - Rom 8,26-27

    Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Romanos

    Irmãos:
    O Espírito Santo vem em auxilio da nossa fraqueza,
    porque não sabemos que pedir nas nossas orações;
    mas o próprio Espírito intercede por nós
    com gemidos inefáveis.
    E Aquele que vê no íntimo dos corações
    conhece as aspirações do Espírito,
    sabe que Ele intercede pelos santos
    em conformidade com Deus.

    AMBIENTE

    Há já alguns domingos que Paulo nos vem propondo uma catequese sobre o caminho a seguir para poder acolher a salvação que Deus oferece. A salvação é um dom de Deus, dom gratuito que é fruto da bondade e do amor de Deus (cf. Rom 3,21-5,11). Essa salvação chega-nos através de Jesus Cristo (cf. Rom 5,12-8,39); e actua em nós pelo Espírito que Jesus derrama sobre aqueles que aderem ao seu projecto e entram na sua comunidade (cf. Rom 8,1-39) - a comunidade do Reino.
    No passado domingo, Paulo convidava os crentes a decidirem-se pela vida "segundo o Espírito". Dizia-nos que essa opção terá uma dimensão cósmica e que ajudará a vencer os desequilíbrios e desarmonias que destroem a criação de Deus. Trata-se, no entanto, segundo Paulo, de um caminho difícil, que exige padecimentos, renúncias, purificações, renovação da vida.
    Como é que o cristão pode fazer essa opção? Como é que ele percebe, claramente, qual é o caminho? Donde recebe ele a força para viver "segundo o Espírito"?

    MENSAGEM

    É Deus que nos dá a força de viver "segundo o Espírito". No entanto, devemos continuamente pedir a Deus, nosso Pai, essa graça.
    Na verdade, nem sempre sabemos o que devemos pedir, pois nem sempre conseguimos discernir entre a vida "segundo a carne" e a vida "segundo o Espírito". No entanto, o próprio Espírito Santo "vem em auxílio da nossa fraqueza" (vers. 26a). O que é que Ele faz? Como é que Paulo entende a intervenção do Espírito a este propósito?
    O texto não é explícito. Segundo uma interpretação, nós temos dificuldade em articular devidamente os nossos desejos e necessidades e é o Espírito que se encarrega de formulá-los em nosso lugar. Segundo outra interpretação, o Espírito junta a sua intercessão "inefável" aos nossos gemidos, fazendo com que a nossa oração chegue até Deus.
    Num e noutro caso, o Espírito faz de mediador eficaz no nosso diálogo com Deus. Ele é nosso "intérprete" e intercessor, elevando-nos ao Deus que conhece o coração. E esta oração (que o Espírito dirige em nosso lugar, ou que o Espírito "apoia") é sempre acolhida por Deus, pois está em conformidade com os planos e os projectos de Deus (vers. 27).

    ACTUALIZAÇÃO

    Na reflexão, considerar as seguintes linhas:

    • Antes de mais, há neste texto um convite implícito a tomarmos consciência do amor que Deus nos dedica e da sua preocupação com a nossa salvação, com a nossa realização plena. Não somos minúsculos grãos de areia abandonados ao sabor das tempestades cósmicas num universo sem fim; somos filhos amados de Deus, a quem Ele não desiste de indicar, todos os dias, os caminhos da felicidade e da vida definitiva. Nos momentos de crise, de derrota, de falência, é preciso conservar os olhos postos nesta certeza: Deus ama-nos; por isso, oferece-nos, de forma gratuita e incondicional, a salvação.

    • O Espírito de Deus, vivo e actuante na história do mundo e na vida de cada homem ou mulher é a "prova provada" do amor de Deus por nós. O Espírito oferece-nos cada dia a vida de Deus, leva-nos ao encontro de Deus, faz com que a nossa voz chegue ao coração de Deus. É preciso, no entanto, disponibilidade para o acolher e atenção aos sinais através dos quais Ele nos conduz ao encontro de Deus. Acolher o Espírito é sair do egoísmo, do orgulho, da auto-suficiência e procurar descobrir, com humildade e simplicidade, os caminhos de Deus, os desafios de Deus.

    • O ritmo da vida moderna é estonteante... As exigências profissionais, os problemas familiares, o inferno do trânsito, a necessidade de ganhar a vida atiram-nos de corrida em corrida, sempre ocupados, sempre cansados, sempre carregados de stress, prisioneiros de uma máquina que nos desumaniza e que não nos deixa centrar a nossa atenção no essencial, reequacionar os nossos valores e prioridades. É preciso, no entanto, encontrar tempo e espaço para reflectir, para redefinir o sentido da nossa existência, para perceber se estamos a conduzir a nossa vida "segundo a carne" ou "segundo o Espírito".

    • O verdadeiro crente é o que vive em comunhão com Deus. Não prescinde desses momentos de diálogo, de partilha, de escuta, de louvor a que chamamos oração. É nesse diálogo intenso, verdadeiro, diário que o crente, através do Espírito, intui a lógica de Deus, a sua verdade, o projecto que Ele tem para cada homem e para o mundo. Esforço-me por encontrar espaço para o diálogo com Deus e para fortalecer a minha intimidade com Ele?

    ALELUIA - cf. Mt 11,25

    Aleluia. Aleluia.

    Bendito sejais, ó Pai, Senhor do céu e da terra,
    porque revelastes aos pequeninos os mistérios do reino.

    EVANGELHO - Mt 13,24-43

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

    Naquele tempo,
    Jesus disse às multidões mais esta parábola:
    "O reino dos Céus pode comparar
    -se a um homem
    que semeou boa semente no seu campo.
    Enquanto todos dormiam, veio o inimigo,
    semeou joio no meio do trigo e foi-se embora.
    Quando o trigo cresceu e deu fruto,
    apareceu também o joio.
    Os servos do dono da casa foram dizer-lhe:
    'Senhor, não semeaste boa semente no teu campo?
    Donde vem então o joio?
    Ele respondeu-lhes: 'Foi um inimigo que fez isso'.
    Disseram-lhe os servos:
    'Queres que vamos arrancar o joio?'
    'Não! - disse ele –
    não suceda que, ao arrancardes o joio,
    arranqueis também o trigo.
    Deixai-os crescer ambos até à ceifa
    e, na altura da ceifa, direi aos ceifeiros:
    Apanhai primeiro o joio e atai-o em molhos para queimar;
    e ao trigo, recolhei-o no meu celeiro'".

    Jesus disse-lhes outra parábola:
    "O reino dos Céus pode comparar-se a um grão de mostarda
    que um homem tomou e semeou no seu campo.
    Sendo a menor de todas as sementes,
    depois de crescer, é a maior de todas as hortaliças
    e torna-se árvore, de modo que as aves do céu vêm abrigar-se nos seus ramos".
    Disse-lhes outra parábola:
    "O reino dos Céus pode comparar-se ao fermento
    que uma mulher toma e mistura em três medidas de farinha,
    até ficar tudo levedado".
    Tudo isto disse Jesus em parábolas,
    e sem parábolas nada lhes dizia,
    a fim de se cumprir o que fora anunciado pelo profeta,
    que disse: "Abrirei a minha boca em parábolas,
    proclamarei verdades ocultas desde a criação do mundo".

    Jesus deixou então as multidões e foi para casa.
    Os discípulos aproximaram-se d'Ele e disseram-Lhe:
    "Explica-nos a parábola do joio no campo".
    Jesus respondeu:
    "Aquele que semeia a boa semente é o Filho do homem
    e o campo é o mundo.
    A boa semente são os filhos do reino,
    o joio são os filhos do Maligno
    e o inimigo que o semeou é o Demónio.
    A ceifa é o fim do mundo
    e os ceifeiros são os Anjos.
    Como o joio é apanhado e queimado no fogo,
    assim será no fim do mundo:
    o Filho do homem enviará os seus Anjos,
    que tirarão do seu reino todos os escandalosos
    e todos os que praticam a iniquidade,
    e hão-de lançá-los na fornalha ardente;
    aí haverá choro e ranger de dentes.
    Então, os justos brilharão como o sol
    no reino do seu Pai.
    Quem tem ouvidos, oiça".

    AMBIENTE

    Continuamos em contacto com as "parábolas do Reino". O Evangelho deste domingo apresenta-nos mais um bloco de três imagens ou comparações ("parábolas") que pretendem revelar aos discípulos e às multidões que rodeiam Jesus, a realidade do "Reino".
    Já vimos, no passado domingo, porque é que Jesus pregava por "parábolas": porque a linguagem parabólica é uma linguagem rica, expressiva, questionante; porque a "parábola" é uma excelente arma de controvérsia, muito útil em contextos polémicos; porque a "parábola" faz as pessoas pensar e incita-as à procura da verdade. Por tudo isto, as "parábolas" são uma linguagem privilegiada para apresentar o Reino, para incitar as pessoas a descobrir o Reino e para as levar a aderir ao Reino.
    Das três parábolas que nos são hoje propostas, duas (o grão de mostarda e o fermento) procedem da tradição sinóptica; a outra (a parábola do trigo e do joio) só aparece em Mateus (além de aparecer também numa antiga colecção de "ditos" de Jesus, conhecida como "Evangelho de Tomé").
    Também desta vez percebe-se - tanto nas parábolas, como nas explicações que as acompanham - a preocupação "pastoral" de Mateus: ele não é um jornalista a transcrever o que Jesus disse; mas é um "pastor" que procura exortar, animar, ensinar e fortalecer a fé dessa comunidade cristã a que o Evangelho se dirige.

    MENSAGEM

    A primeira parábola que nos é proposta é a parábola do trigo e do joio (vers. 24-30). Trata-se de um quadro da vida quotidiana: há um "senhor" que semeia boa semente no seu campo, um "inimigo" que semeia o joio (nome de uma erva gramínea que nasce entre o trigo e o danifica) e "servos" dedicados, preocupados com o futuro da colheita. Tudo parece normal; o anormal é a reacção do "senhor" à "crise": dá ordens para que deixem crescer trigo e joio lado a lado e que só na altura da ceifa seja feita a selecção do bom e do mal, do que é para queimar e do que é para guardar nos celeiros.
    A parábola deve ser entendida no contexto do ministério de Jesus. Ele conviveu com os pecadores, com os marginais, com os que levavam vidas moralmente condenáveis. Sentou-se à mesa com gente desclassificada, deixou-se tocar por pecadoras públicas, convidou um publicano a integrar o seu grupo de discípulos... Com esse comportamento "escandaloso", Ele quis dizer a todos esses que a religião oficial excluía, que Deus os amava e que os convidava a fazer parte da sua família, a integrar a comunidade da salvação, a serem membros de pleno direito da comunidade do "Reino".
    Os fariseus consideravam inaceitável a atitude de Jesus. Para eles, quem não cumpria a Lei tinha de ser excluído do Povo santo de Deus e não tinha o direito de fazer parte do "campo" de Deus. A "lógica" dos fariseus condiz com a "lógica" de Deus?
    Nesta parábola, Jesus pretende dar-nos uma lição sobre a "lógica" de Deus. Sugere que a "lógica" de Deus não é uma "lógica" de destruição, de segregação, de exclusão, mas é uma "lógica" de amor, de misericórdia, de tolerância. O Deus de Jesus Cristo é um Deus paciente e misericordioso, lento para a ira e rico de misericórdia, que dá sempre ao homem todas as oportunidades para refazer a existência e para integrar plenamente a comunidade do "Reino". Ele tem um plano de salvação e de graça que oferece gratuitamente a todos os homens, bons e maus; depois, no tempo oportuno, ver-se-á quem são os maus e quem são os bons. De resto, não é muito fácil separar o bom e o mau, porque as duas realidades coexistem em todos os "campos", em todos os corações.
    O "senhor" da parábola é esse Deus paciente, que dá ao homem todas as oportunidades, que não quer a morte do pecador, mas que ele se converta e viva.
    Os "servos" com excesso de zelo são os crentes (que trabalham no campo do "senhor") rígidos e intolerantes, incapazes de olhar o mundo e o coração dos homens com a bondade, a serenidade e a paciência de Deus.
    O "campo" é o mundo e a história, onde coexistem
    o trigo (os sinais de esperança, de vida, de amor que tornam este mundo mais belo e mais feliz) e o joio (os sinais de morte, responsáveis pelo sofrimento, pela opressão, pela escravidão). É também o coração de cada homem e de cada mulher, capaz de opções de vida e capazes de opções de morte.
    Jesus garante: os métodos de Deus não passam pelo castigo imediato, pela intolerância face às opções dos homens, pela incompreensão dos erros dos seus filhos; os métodos de Deus passam por deixar os homens crescer em liberdade, integrando a comunidade dos filhos de Deus.
    Nos vers. 36-43, temos a aplicação que Mateus faz da parábola do trigo e do joio à vida da sua comunidade.
    Nesta "explicação", o eixo central da parábola original passa a ser outro. A problema já não é se na "lógica" de Deus o trigo e o joio podem crescer juntos, mas é a questão do "juízo" que espera bons e maus: Mateus insiste que, no "dia da colheita" (imagem que, nos profetas, se identifica com o dia do "juízo de Deus" sobre os homens e o mundo), os bons receberão a recompensa e os maus receberão o castigo.
    Estamos nos finais do séc. I (década de 80). Já passou o entusiasmo dos primeiros anos; a vida das comunidades cristãs é marcada pela monotonia, pela falta de entusiasmo e empenho, pela mediocridade, pelo laxismo. Os cristãos aburguesaram-se e nem sempre vivem de forma empenhada e comprometida a sua fé. Como despertar de novo nos crentes o entusiasmo inicial?
    Mateus vai usar os métodos dos pregadores do seu tempo... Recorrendo à linguagem e aos símbolos da apocalíptica, Mateus lembra aos cristãos da sua comunidade o juízo futuro de Deus. Os símbolos utilizados (o joio queimado no fogo, a fornalha ardente, o choro e o ranger de dentes) destinam-se a impressionar os crentes, a obrigá-los a inflectir os seus esquemas de vida e a voltar à fidelidade ao Evangelho. Portanto, não temos aqui uma descrição de como será o "fim do mundo"; o que temos aqui é um convite urgente e emocionado à conversão, ao aprofundamento do compromisso com Jesus e com o Evangelho.
    O Evangelho deste domingo propõe-nos ainda duas outras parábolas: a parábola do grão de mostarda (vers. 31-32) e a parábola do fermento (vers. 33). São duas parábolas muito semelhantes, quer quanto ao conteúdo, quer quanto à forma.
    Numa e noutra, o quadro é o mesmo: sublinha-se a desproporção entre o início e o resultado final. O grão de mostarda é uma semente muito pequena, que no entanto pode dar origem a um arbusto de razoáveis dimensões; o fermento apresenta um aspecto perfeitamente insignificante, mas tem a capacidade de fermentar uma grande quantidade de massa. Estas duas comparações servem para apresentar o dinamismo do "Reino". O "Reino" anunciado por Jesus compara-se ao grão de mostarda e ao fermento: parece algo insignificante, que tem inícios muito modestos e humildes, mas contém potencialidades para encher o mundo, para o transformar e renovar. Trata-se de um dinamismo de vida nova que começa como uma pequena semente lançada à terra numa província obscura e insignificante do império romano, mas que vai lançar as suas raízes, invadir história dos homens e potenciar o aparecimento de um mundo novo.
    Com estas parábolas, Jesus responde às objecções daqueles que não acreditavam que da mensagem de um carpinteiro de Nazaré, pudesse surgir uma proposta de vida, capaz de fermentar o mundo e a história. Ele garante-nos que o "Reino" é uma realidade irreversível, que veio para ficar e para transformar o mundo. Escutar estas parábolas é receber uma injecção de ânimo e de esperança, capaz de levar a um compromisso mais sério e mais exigente com o "Reino".

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pode fazer-se a partir dos seguintes dados:

    • O Evangelho deste domingo garante-nos, antes de mais, que o "Reino" é uma realidade irreversível, que está em processo de crescimento no mundo. É verdade que é difícil perceber essa semente a crescer ou esse fermento a levedar a massa, quando vemos multiplicarem-se as violências, as injustiças, as prepotências, as escravidões... É difícil acreditar que o "Reino" está em processo de construção, quando o materialismo, a futilidade, o comodismo, a procura da facilidade, o efémero sobressaem, de forma tão marcada, na vida de grande parte dos homens e das mulheres do nosso tempo... A Palavra de Deus convida-nos, contudo, a não perder a confiança e a esperança. Apesar das aparências, o dinamismo do "Reino" está presente, minando positivamente a história e a vida dos homens.

    • Na verdade, falar do "Reino" não significa falarmos de um "condomínio fechado", ao qual só tem acesso um grupo privilegiado constituído pelos "bons", pelos "puros", pelos perfeitos", e de onde está ausente o mal, o egoísmo e o pecado... Falar do "Reino" é falar de uma realidade em processo de construção, onde cada homem e cada mulher têm o direito de crescer ao seu ritmo, de fazer as suas escolhas, de acolher ou não o dom de Deus, até à opção final e definitiva. É falarmos de uma realidade onde o amor de Deus, vivo e actuante, vai introduzindo no coração do homem um dinamismo de conversão, de transformação, de renascimento, de vida nova.

    • Neste Evangelho temos também uma lição muito sugestiva sobre a atitude de Deus face ao mal e aos que fazem o mal. Na parábola do trigo e do joio, Jesus garante-nos que os esquemas de Deus não prevêem a destruição do pecador, a segregação dos maus, a exclusão dos culpados. O Deus de Jesus Cristo é um Deus de amor e de misericórdia, sem pressa para castigar, que dá ao homem "todo o tempo do mundo" para crescer, para descobrir o dom de Deus e para fazer as suas escolhas. Não percamos nunca de vista a "paciência" de Deus para com os pecadores: talvez evitemos ter de carregar sentimentos de culpa que oprimem e amarguram a nossa breve caminhada nesta terra.

    • A "paciência de Deus" com o joio convida-nos também a rejeitarmos as atitudes de rigidez, de intolerância, de incompreensão, de vingança, nas nossas relações com os nossos irmãos. O "senhor" da parábola não aceita a intolerância, a impaciência, o radicalismo dos "servos" que pretendem "cortar o mal pela raiz" e arrancar o mal (correndo o risco de serem injustos, de se enganarem e de meterem mal e bem no mesmo saco). Às vezes, somos demasiados ligeiros em julgar e condenar, como se as coisas fossem claras e tudo fosse, sem discussão, claro ou escuro... A Palavra de Deus convida-nos a moderar a nossa dureza, a nossa intolerância, a nossa intransigência e a contemplar os irmãos (com as suas falhas, defeitos, diferenças, comportamentos religiosa ou socialmente incorrectos) com os olhos benevolentes, compreensivos e pacientes de Deus.

    • Convém termos sempre presente o seguinte: não há o mal quimicamente puro de um lado e o bem quimicamente puro do outro... Mal e bem misturam-se no mundo, na vida e no coração de cada um de nós. Dividir as nações em boas (as que têm uma política que serve os nossos interesses) e más (as que têm uma política que lesa os nossos interesses), os grupos sociais em bons (os que defendem valores com os quais concordamos) e maus (os que defendem valores que não são os nossos), os indivíduos em bons (os amigos, aqueles que nos apoiam e que estão sempre de acordo connosco) e maus (aqueles que nos fazem frente, que nos dizem verdades que são difíceis de escutar, que não concordam connosco)... é uma atitude simplista, que nos leva frequentemente a assumir atitudes injustas, que geram exclusão, marginalização, sofrimento e morte. Mais uma vez: saibamos olhar para o mundo, para os grupos, para as pessoas sem preconceitos, com a mesma bondade, compreensão e tolerância que Deus manifesta face a cada homem e a cada mulher, independentemente das suas escolhas e do seu ritmo de caminhada.

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 16º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 16º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. DE UM DOMINGO A OUTRO.
    Se temos mantido a sugestão de unidade com o domingo precedente, é conveniente fazer uma alusão a isso no início da celebração. A decoração floral da igreja, embora simples, pode aproveitar símbolos presentes no Evangelho de hoje: espigas de trigo, grão, ervas daninhas... Tal simbolismo pode ajudar a dar sentido à Boa Nova de Jesus Cristo.

    3. UMA SEGUNDA LEITURA MUITO BREVE.
    É, sem dúvida, a mais breve das segundas leituras do leccionário que nos é proposta neste domingo: apenas algumas linhas. Por essa razão, é conveniente proclamá-la lentamente, com algumas pausas entre as frases. O silêncio ajudar-nos-á a acolher a voz do Espírito e a vontade de Deus...

    4. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
    Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.

    No final da primeira leitura:
    Pai, nós Te louvamos com as palavras que confiaste aos teus profetas e que lemos nas nossas assembleias: nós Te damos graças porque cuidas de cada um de nós, és paciente e sempre pronto a ajudar-nos.
    Nós Te pedimos: torna-nos atentos à tua presença, que o teu Espírito nos torne curiosos de Ti, receptivos e cheios de admiração por tudo aquilo que és.

    No final da segunda leitura:
    Ó Deus, que vês o fundo dos corações, nós Te bendizemos pelo teu Espírito, que é a tua presença em nós, o teu sopro de vida em nós.
    Nós Te recomendamos todas as nossas assembleias de oração, nas nossas igrejas e nas nossas casas: que o teu Espírito venha em socorro da nossa fraqueza e nos inspire as palavras para Te cantar, Te louvar e Te rezar.

    No final do Evangelho:
    Bendito sejas, ó Pai, pelo Reino dos céus, que manifestas no meio de nós e em nós. Ele é o bom grão que semeaste para renovar a nossa terra, ele é a semente que cresce e o fermente que age.
    Nós Te pedimos: que o teu Espírito nos torne pacientes. Diante do mal, mantém-nos confiantes na presença e na força do teu Reino.

    5. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Pode-se escolher uma das Orações Eucarísticas para Assembleias com Crianças, que recordam em termos simples a obra de Cristo.

    6. PALAVRA PARA O CAMINHO.
    Sem alternativa! O bom grão semeado no nosso campo era promessa de uma boa ceifa. Mas eis que o joio veio poluir a seara. Que tipo de compromissos aceitamos na nossa vida? Deus é paciente! Mas se temos ouvidos, é urgente escutar o seu apelo à conversão. É urgente escolher o nosso campo: o do Senhor ou o do Maligno. Não há alternativa!

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • 17º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    17º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    30 de Julho, 2023

    Ano A
    17º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    Tema do 17º Domingo do Tempo Comum

    A liturgia deste domingo convida-nos a reflectir nas nossas prioridades, nos valores sobre os quais fundamentamos a nossa existência. Sugere, especialmente, que o cristão deve construir a sua vida sobre os valores propostos por Jesus.
    A primeira leitura apresenta-nos o exemplo de Salomão, rei de Israel. Ele é o protótipo do homem "sábio", que consegue perceber e escolher o que é importante e que não se deixa seduzir e alienar por valores efémeros.
    No Evangelho, recorrendo à linguagem das parábolas, Jesus recomenda aos seus seguidores que façam do Reino de Deus a sua prioridade fundamental. Todos os outros valores e interesses devem passar para segundo plano, face a esse "tesouro" supremo que é o Reino.
    A segunda leitura convida-nos a seguir o caminho e a proposta de Jesus. Esse é o valor mais alto, que deve sobrepor-se a todos os outros valores e propostas.

    LEITURA I - 1 Reis 3,5.7-12

    Leitura do Primeiro Livro dos Reis

    Naqueles dias,
    O Senhor apareceu em sonhos a Salomão durante a noite e disse-lhe:
    "Pede o que quiseres".
    Salomão respondeu:
    "Senhor, meu Deus,
    Vós fizestes reinar o vosso servo em lugar do meu pai David
    e eu sou muito novo e não sei como proceder.
    Este vosso servo está no meio do povo escolhido,
    um povo imenso, inumerável,
    que não se pode contar nem calcular.
    Dai, portanto, ao vosso servo um coração inteligente,
    para saber distinguir o bem do mal;
    pois, quem poderia governar este vosso povo tão numeroso?"
    Agradou ao Senhor esta súplica de Salomão e disse-lhe:
    "Porque foi este o teu pedido,
    e já que não pediste longa vida, nem riqueza,
    nem a morte dos teus inimigos,
    mas sabedoria para praticar a justiça,
    vou satisfazer o teu desejo.
    Dou-te um coração sábio e esclarecido,
    como nunca houve antes de ti nem haverá depois de ti".

    AMBIENTE

    O grande rei David morreu por volta de 972 a.C., após um reinado longo e fecundo, ocupado a expandir as fronteiras do reino, a consolidar a união entre as tribos do norte e do sul e a conquistar a paz e a tranquilidade para o Povo de Deus. Sucedeu-lhe no trono o filho, Salomão.
    Salomão desenvolveu um trabalho meritório na estruturação do reino que o pai lhe legou. Organizou a divisão administrativa do território que herdou, dotou-o de grandes construções (das quais a mais emblemática é o Templo de Jerusalém), fortificou as cidades mais importantes, potenciou o intercâmbio cultural e comercial com os países da zona, incentivou e apoiou a cultura e as artes.
    Preocupado com a constituição de uma classe política preparada para as tarefas da governação, Salomão recrutou "sábios" estrangeiros (sobretudo egípcios) para a sua corte e rodeou-se de homens que se distinguiam pelo seu "saber", pela sua justiça e prudência. Esses "quadros", além de aconselharem o rei, tinham também a tarefa de preparar os futuros "funcionários" para desempenharem funções no aparelho governativo montado por Salomão.
    A corte de Salomão tornou-se, assim, um "viveiro" de "sabedoria". Os "sábios" de Salomão coligiram provérbios, redigiram "máximas" de carácter sapiencial, deram "instruções" (sobre as virtudes que deviam ser cultivadas para ter êxito e para ser feliz). Nesta fase, também redigiram-se crónicas sobre os reinados anteriores e publicaram-se textos sobre as tradições dos antepassados (provavelmente, é nesta época que a "escola jahwista" dá à luz algumas das tradições que irão ocupar um lugar fundamental no Pentateuco). Não admira, portanto, que Salomão tenha ficado na memória histórica de Israel como o protótipo do rei sábio, "cuja sabedoria excedia a todos os orientais e egípcios" (1 Re 4,30).
    Salomão é também, historicamente, o primeiro rei que "herda" o trono. Até agora, os seus predecessores não chegaram ao trono por herança, mas receberam-no das mãos de Deus (segundo a visão "religiosa" dos catequistas bíblicos). Os teólogos de Israel vão, pois, esforçar-se por sacralizar o poder de Salomão e demonstrar que, se Salomão chegou a governar o Povo de Deus, não foi apenas por um direito hereditário (sempre contestável), mas pela vontade de Deus.
    O texto que hoje nos é proposto supõe todo este enquadramento. O chamado "sonho de Gabaon" (cf. 1 Re 3,5) é uma ficção literária montada pelos teólogos deuteronomistas (esse grupo que reflecte a vida e a história na linha das grandes ideias teológicas apresentadas no Livro do Deuteronómio) com uma dupla finalidade: apresentar Salomão como o escolhido de Jahwéh e justificar a sua proverbial "sabedoria".

    MENSAGEM

    No Antigo Testamento, o "sonho" aparece, com alguma frequência, como uma forma privilegiada de Deus comunicar com os homens e de lhes indicar os seus caminhos. No nosso texto, aparece-nos também um sonho: os catequistas deuteronomistas vão utilizar este recurso literário para apresentar Salomão como "o escolhido" de Deus, a quem Jahwéh comunica os seus projectos e a quem confia a condução do seu Povo.
    O "sonho" de Salomão está estruturado na forma de um diálogo entre Deus e Salomão. Há, em primeiro lugar, uma interpelação de Deus ("que posso Eu dar-te?"); e há, depois, uma resposta de Salomão: consciente da grandeza da sua tarefa e das suas próprias limitações, o jovem rei pede a Deus que lhe dê um coração "sábio" para governar com justiça. A prece do rei é atendida e Deus concede a Salomão uma "sabedoria" inigualável (na continuação - que, todavia, o nosso texto de hoje já não apresenta - Deus acrescenta ainda outros três dons: a riqueza, a glória e a longa vida - cf. 1 Re 3,13-14).
    Em termos religiosos, qual a mensagem que os autores deuteronomistas pretendem deixar com esta "ficção"?
    Antes de mais, o nosso texto deixa claro que, em Israel, o rei é o "instrumento de Deus", o intermediário entre Deus e o seu Povo. É através da pessoa do rei que Deus governa, que intervém na vida do seu Povo e o conduz pela história.
    Depois, o texto mostra que Salomão não concebeu o seu papel como um privilégio pessoal que podia ser usado em benefício próprio, mas sim como um ministério que lhe foi confiado por Deus. Salomão tinha consciência de que a autoridade é um serviço que deve ser exercido com "sabedoria" e que o objectivo final desse serviço é a realização do bem comum.
    Finalmente (e é talvez o aspecto mais significativo para o tema da liturgia deste domingo), os autores deuteronomistas sublinham a "qualidade" da resposta de Salomão: ele não pede riqueza nem glória, mas pede as aptidões necessárias e a capacidade para cumprir bem a missão que Deus lhe confiou. Salomão aparece aqui como o modelo do homem que sabe escolher as coisas importantes e que não se deixa distrair por valores efémeros.
    Dizer que a súplica de Salomão "agradou ao Senhor" (vers. 10) é propor aos israelitas que optem pelos valores eternos, duradouros e essenciais.

    ACTUALIZAÇÃO

    Considerar as seguintes questões:

    • Algumas pessoas e grupos com um peso significativo na opinião pública procuram vender a ideia de que a realização plena do indivíduo está num conjunto de valores que decidem quem pertence à elite dos vencedores, dos que estão na moda, dos que têm êxito... Em muitos casos, esses valores propostos são realidades efémeras, materiais, secundárias, relativas. Quase sempre, por detrás da proposição de certos valores, estão interesses particulares e egoístas, a tentativa de vender determinada ideologia ou a preocupação em tornar o mercado dependente dos produtos comerciais de determinada marca... O "sábio", contudo, é aquele que está consciente destes mecanismos, que sabe ver com olhar crítico os valores que a moda propõe, que sabe discernir o verdadeiro do falso, que distingue o que apenas tem um brilho doirado daquilo que, na essência, é um tesouro que importa conservar. O "sábio" é aquele que consegue perceber o que efectivamente o realiza e lhe permite levar a cabo, dentro da comunidade, a missão que lhe foi confiada. Como é que eu me situo face a isto? O que me seduz e que eu abraço é o imediato, o brilhante, o sedutor, ainda que efémero, ou é o que é exigente e radical mas que me permite conquistar uma felicidade duradoura e concretizar o meu papel no mundo, na empresa, na família ou na minha comunidade cristã?

    • A figura de Salomão interpela também todos aqueles que detêm responsabilidades na comunidade (seja em termos civis, seja em termos religiosos). Convida-os a uma verdadeira atitude de serviço: o seu objectivo não deve nunca ser a realização dos próprios esquemas pessoais, mas sim o benefício de toda a comunidade, a concretização do bem comum.

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 118 (119)

    Refrão: Quanto amo, Senhor, a vossa lei!

    Senhor, eu disse: A minha herança
    é cumprir as vossas palavras.
    Para mim vale mais a lei da vossa boca
    do que milhões em ouro e prata.

    Console-me a vossa bondade,
    segundo a promessa feita ao vosso servo.
    Desçam sobre mim as vossas misericórdias e viverei,
    porque a vossa lei faz as minhas delícias.

    Por isso, eu amo os vossos mandamentos,
    mais que o ouro, o ouro mais fino.
    Por isso, eu sigo todos os vossos preceitos
    e detesto todo o caminho da mentira.

    São admiráveis as vossas ordens,
    por isso, a minha alma as observa.
    A manifestação das vossas palavras ilumina
    e dá inteligência aos simples.

    LEITURA II - Rom 8,28-30

    Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Romanos

    Irmãos:
    Nós sabemos que Deus concorre em tudo
    para o bem daqueles que O amam,
    dos que são chamados, segundo o seu desígnio.
    Porque os que Ele de antemão conheceu,
    também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho,
    a fim de que Ele seja o Primogénito de muitos irmãos.
    E àqueles que predestinou, também os chamou;
    àqueles que chamou, também os justificou;
    e àqueles que justificou, também os glorificou.

    AMBIENTE

    O texto que nos é proposto como segunda leitura continua a reflexão de Paulo sobre o projecto de salvação que Deus tem para oferecer aos homens.
    Já vimos nos domingos anteriores que, na perspectiva de Paulo, todo o homem que chega a este mundo mergulha num contexto de pecado que o marca e condiciona (cf. Rom 1,18-3,20); no entanto, Deus, na sua bondade, oferece gratuitamente ao homem pecador a sua graça e dá-lhe a possibilidade de chegar à salvação (cf. Rom 3,21-4,25); e é em Jesus Cristo que esse dom de Deus se comunica ao homem (cf. Rom 5,1-7,25). É o Espírito Santo que permite ao homem acolher esse dom e viver na fidelidade à graça que Deus oferece (cf. Rom 8,1-39).
    Depois de assegurar aos cristãos de Roma (e, através deles, aos cristãos de todas as épocas e lugares) que o Espírito "vem em auxílio da nossa fraqueza" e "intercede por nós" (cf. Rom 8,26-27), Paulo relembra - no texto que nos é proposto como segunda leitura - que Deus tem um projecto de amor que se traduz no oferecimento da salvação ao homem.

    MENSAGEM

    Esse projecto não é um acontecimento casual, mas algo que, desde sempre, está previsto nos planos de Deus.
    Aos que aderem a esse projecto, Deus chama-os a identificarem-se com o seu filho Jesus, liberta-os do egoísmo e do pecado e fá-los, com Jesus, chegar à vida nova e plena (justificação).
    Neste contexto, Paulo fala "daqueles" que Deus "conheceu" de antemão, que "predestinou" para viverem à imagem de Jesus, que "chamou", que "justificou" e que "glorificou". No entanto, estes versículos não devem ser entendidos no sentido de que a salvação que Deus oferece se destine apenas a um grupo de predestinados, que Deus escolheu de entre os homens de acordo com critérios que nos escapam... A teologia paulina é clara a este respeito: o projecto salvador de Deus está aberto a todos aqueles que querem acolhê-l'O. O que Paulo sublinha aqui é que se trata de um dom gratuito de Deus e que esse dom está previsto desde toda a eternidade.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pode partir dos seguintes dados:

    • Em todas as cartas de Paulo transparece o espanto que o apóstolo sente diante do amor de Deus pelo homem. Este tema está, contudo, especialmente presente na Carta aos Romanos. O nosso texto convida-nos a dar conta - outra vez - desse facto extraordinário que é o amor de Deus (amor que o homem não merece, mas que Deus, com ternura, insiste em oferecer, de forma gratuita e incondicional), traduzido num projecto de salvação preparado desde sempre, e que leva Deus a enviar ao mundo o seu próprio Filho para conduzir todos os homens e mulheres a uma nova condição. Numa época marcada por uma certa indiferença face a Deus, este texto convida-nos a tomar consciência de que Deus nos ama, vem continuamente ao nosso encontro, aponta-nos o caminho da vida plena e verdadeira, desafia-nos à identificação com Jesus, convida-nos a integrar a sua família. Nós, os crentes, somos convidados a conduzir a nossa vid
    a à luz desta realidade; e somos convocados a testemunhar, com palavras, com acções, com a vida, no meio dos irmãos que dia a dia percorrem connosco o caminho da vida, o amor e o projecto de salvação que Deus tem.

    • Diante da oferta de Deus, somos livres de fazer as nossas opções - opções que Deus respeita de forma absoluta. No entanto, a vida plena está no acolhimento desse "valor mais alto" que é o seguimento de Jesus e a identificação com Ele. É esse o "valor mais alto", o "tesouro" pelo qual eu optei de forma decidida no dia do meu baptismo? Tenho sido, na caminhada da vida, coerente com essa escolha?

    ALELUIA - cf. Mt 11,25

    Aleluia. Aleluia.

    Bendito sejais, ó Pai, Senhor do céu e da terra,
    porque revelastes aos pequeninos os mistérios do reino.

    EVANGELHO - Mt 13,44-52

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

    Naquele tempo,
    disse Jesus às multidões:
    "O reino dos Céus é semelhante
    a um tesouro escondido num campo.
    O homem que o encontrou tornou a escondê-lo
    e ficou tão contente que foi vender tudo quanto possuía
    e comprou aquele campo.
    O reino dos Céus é semelhante
    a um negociante que procura pérolas preciosas.
    Ao encontrar uma de grande valor,
    foi vender tudo quanto possuía e comprou essa pérola.
    O reino dos Céus é semelhante
    a uma rede que, lançada ao mar,
    apanha toda a espécie de peixes.
    Logo que se enche, puxam-na para a praia
    e, sentando-se, escolhem os bons para os cestos
    e o que não presta deitam-no fora.
    Assim será no fim do mundo:
    os Anjos sairão a separar os maus do meio dos justos
    e a lançá-los na fornalha ardente.
    Aí haverá choro e ranger de dentes.
    Entendestes tudo isto?"
    Eles responderam-Lhe: "Entendemos".
    Disse-lhes então Jesus:
    "Por isso, todo o escriba instruído sobre o reino dos Céus
    é semelhante a um pai de família
    que tira do seu tesouro coisas novas e coisas velhas".

    AMBIENTE

    Concluímos, neste domingo, a leitura do capítulo dedicado às "parábolas do Reino" (cf. Mt 13). Nele, recorrendo a imagens e comparações simples, sugestivas e questionantes ("parábolas"), Jesus apresenta esse mundo novo de liberdade e de vida nova que Ele veio propor aos homens e ao qual Ele chamava Reino de Deus.
    Concretamente, o nosso texto apresenta-nos três parábolas que são exclusivas de Mateus (nenhuma delas aparece nos outros três evangelhos considerados canónicos. No entanto, as três aparecem num texto não canónico - o Evangelho de Tomé - embora aí apresentem notáveis variantes em relação à versão mateana): a parábola do tesouro, a parábola da pérola e a parábola da rede e dos peixes.
    Para enquadrarmos melhor a mensagem aqui proposta por Mateus, devemos ter em conta a realidade da comunidade a quem o Evangelho se destina... Estamos no final do primeiro século (anos oitenta). Passaram-se mais de trinta anos após a morte de Jesus. O entusiasmo inicial deu lugar à monotonia, à falta de empenho, a uma vivência "morna", pouco exigente e pouco comprometida. No horizonte próximo das comunidades cristãs perfilam-se tempos difíceis de perseguição e de hostilidade e os cristãos parecem pouco preparados para enfrentar as dificuldades. Mateus sente que é preciso renovar o compromisso cristão e chamar a atenção dos crentes para o Reino, para as suas exigências e para os seus valores. As parábolas do Reino que hoje nos são propostas devem ser lidas neste contexto.

    MENSAGEM

    O texto do Evangelho deste domingo pode ser dividido em três partes. Em cada uma delas, há aspectos e questões que convém pôr em relevo e ter em conta.
    Na primeira parte, temos duas parábolas - a parábola do tesouro escondido no campo e a parábola da pérola preciosa (vers. 44-46). Ambas desenvolvem o mesmo tema e apresentam ensinamentos semelhantes.
    A questão principal abordada nesta primeira parte é a da descoberta do valor e da importância do Reino. Quer a parábola do tesouro escondido, quer a parábola da pérola preciosa, sugerem que o Reino proposto por Jesus (esse mundo de paz, de amor, de fraternidade, de serviço, de reconciliação que Jesus veio anunciar e oferecer) é um "tesouro" precioso, que os seguidores de Jesus devem abraçar, antes de qualquer outro valor ou proposta. Os cristãos são, antes de mais, aqueles que encontraram algo de único, de fundamental, de decisivo: o Reino. Ora, quando alguém encontra um "tesouro" como esse, deve elegê-lo como a riqueza mais preciosa, o fim último da própria existência, o valor fundamental pelo qual se renuncia a tudo o resto e pelo qual se está disposto a pagar qualquer preço. Provavelmente, Mateus está a sugerir a esses cristãos a quem o seu Evangelho se destina (adormecidos numa fé morna, inconsequente, pouco exigente) que é preciso redescobrir e optar decisivamente por esse valor mais alto, que deve dar sentido às suas vidas - o Reino. O cristão é confrontado, a par e passo, com muitos valores e opções; mas deve aperceber-se de que o Reino é o valor mais importante.
    Na segunda parte, Mateus apresenta o Reino na imagem de uma rede que, lançada ao mar, apanha diversos tipos de peixes (vers. 47-50). Na versão apresentada por Mateus, a parábola apresenta um ensinamento semelhante ao da parábola do trigo e do joio (sobre a qual meditamos no passado domingo): o Reino não é um condomínio fechado, onde só há gente escolhida e santa, mas é uma realidade onde o mal e o bem crescem simultaneamente. Deus não tem pressa de condenar e destruir. Ele não quer a morte do pecador; por isso, dá ao homem o tempo necessário e suficiente para amadurecer as suas opções e para fazer as suas escolhas (no Evangelho de Tomé, a versão é diferente: conta a história de um pescador "sábio" que pesca vários peixes, mas fica só com o maior e lança os outros ao mar. Aí, portanto, a parábola da rede e dos peixes apresenta uma mensagem que vai na linha das parábolas do tesouro descoberto no campo e da pérola preciosa. Alguns autores pensam que a versão apresentada no Evangelho de Tomé constitui a versão primitiva da parábola da rede e dos peixes).
    A referência que Mateus faz (mais uma vez) ao juízo final é uma forma de exortar os irmãos da sua comunidade no sentido de escolherem decididamente o Reino e porem em prática as propostas de Jesus.
    Na terceira parte do Evangelho que nos é proposto, Mateus apresenta um breve diálogo entre Jesus e os discípulos (vers. 51-52).
    Neste diálogo temos uma espécie de conclusão de todo o capítulo. Mateus sugere que o verdadeiro discípulo de Jesus é aquele que &
    ldquo;compreende". Ora, "compreender", na teologia mateana, significa "prestar atenção" e comprometer-se com o ensinamento proposto. Os cristãos são, pois, convidados a descobrir a realidade do Reino, a entender as suas exigências, a comprometerem-se com os seus valores. A referência ao "escriba" que "tira do seu tesouro coisas novas e velhas" pode referir-se aos judeus, conhecedores profundos do Antigo Testamento (o "velho"), convidados agora a reflectirem essas velhas promessas à luz das propostas de Jesus (o "novo"). É nessa dialéctica sempre exigente e questionante que o verdadeiro discípulo encontra o caminho para o Reino; e, depois de encontrar esse caminho, deve comprometer-se com ele de forma decisiva, exigente, empenhada.

    ACTUALIZAÇÃO

    Ter em conta, na reflexão, os seguintes elementos:

    • A primeira e mais importante questão abordada neste texto é a das nossas prioridades. Para Mateus, não há qualquer dúvida: ser cristão é ter como prioridade, como objectivo mais importante, como valor fundamental, o Reino. O cristão vive no meio do mundo e é todos os dias desafiado pelos esquemas e valores do mundo; mas não pode deixar que a procura dos bens seja o objectivo número um da sua vida, pois o Reino é partilha. O cristão está permanentemente mergulhado num ambiente em que a força e o poder aparecem como o grande ideal; mas ele não pode deixar que o poder seja o seu objectivo fundamental, porque o Reino é serviço. O cristão é todos os dias convencido de que o êxito profissional, a fama a qualquer preço são condições essenciais para triunfar e para deixar a sua marca na história; mas ele não pode deixar-se seduzir por esses esquemas, pois a realidade do Reino vive-se na humildade e na simplicidade. O cristão faz a sua caminhada num mundo que exalta o orgulho, a auto-suficiência, a independência; mas ele já aprendeu, com Jesus, que o Reino é perdão, tolerância, encontro, fraternidade... O que é que comanda a minha vida? Quais são os valores pelos quais eu sou capaz de deixar tudo? Que significado têm as propostas de Jesus na minha escala de valores?

    • A decisão pelo Reino, uma vez tomada, não admite meias tintas, tibiezas, hesitações, jogos duplos. Escolher o Reino não é agradar a Deus e ao diabo, pactuar com realidades que mutuamente se excluem; mas é optar radicalmente por Deus e pelos valores do Evangelho. A minha opção pelo Reino é uma opção radical, sincera, que não pactua com desvios, com compromissos a "meio gás", com hipocrisias e incoerências?

    • Porque é que os cristãos apresentam, tantas vezes, um ar amargurado, sofredor, desolado? Quando a tristeza nos tolda a vista e nos impede de sorrir, quando apresentamos semblantes carrancudos e preocupados, quando deixamos transparecer em gestos e em palavras a agitação e o desassossego, quando olhamos para o mundo com os óculos do pessimismo e do desespero, quando só nos deixamos impressionar pelo mal que acontece à nossa volta, já teremos descoberto esse valor fundamental - o Reino - que é paz, esperança, serenidade, alegria, harmonia?

    • Mais uma vez o Evangelho convida-nos a admirar (e a absorver) os métodos de Deus, que não tem pressa nenhuma em condenar e destruir, mas dá tempo ao homem - todo o tempo do mundo - para amadurecer as suas opções e fazer as suas opções. Sabemos respeitar, com esta tolerância e liberdade, o ritmo de crescimento e de amadurecimento dos irmãos que nos rodeiam?

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 17º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 17º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. FAVORECER O TEMPO DE SILÊNCIO.
    Durante o período estival, procure-se favorecer os tempos de silêncio no início das orações, antes das leituras, depois da homilia, depois da comunhão, para permitir a cada um de se preparar para o acolhimento de Cristo, Palavra e Eucaristia. Procurar o Reino é, antes de mais, fazer silêncio para nos deixarmos tocar pela graça.

    3. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
    Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.

    No final da primeira leitura:
    Deus, nosso Pai, nós Te bendizemos pelo teu servidor, o rei Salomão, nos dias da sua fidelidade para contigo. Estiveste atento à sua oração e escutaste-o.
    Com o rei Salomão, nós Te pedimos pelos dirigentes das nações e das Igrejas: dá-lhes um coração atento, para que conduzam os povos e as comunidades segundo o teu Espírito e saibam discernir o bem do mal.

    No final da segunda leitura:
    Nós Te damos graças pelo desígnio do teu amor e pelo teu filho Jesus, que estabeleceste no meio de nós como primogénito de uma multidão de irmãos.
    Nós Te pedimos: Tu que imprimes em nós a imagem do teu Filho, faz que o teu Espírito nos transforme à sua semelhança.

    No final do Evangelho:
    Nós Te bendizemos pelo Reino dos céus que estabeleceste no coração do nosso mundo como um tesouro escondido e como um laço que nos conduz a Ti.
    Nós Te pedimos: dá aos teus fiéis a coragem de procurar em toda a parte o tesouro da tua presença escondida, para aí encontrar a riqueza do teu amor.

    4. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Pode-se escolher a Oração Eucarística III que, na sua intercessão, faz eco dos temas da segunda leitura.

    5. PALAVRA PARA O CAMINHO.
    "Pede o que quiseres..." Se a mesma questão nos fosse posta hoje, qual seria a nossa resposta? Por que tesouro estamos dispostos a sacrificar tudo? "Um coração que escute e saiba discernir o essencial do acessório!" A oração de Salomão poderia inspirar a nossa oração ao longo da semana...

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

plugins premium WordPress