Liturgia

Week of Mai 12th

  • Nossa Senhora de Fátima

    Nossa Senhora de Fátima


    13 de Maio, 2024

    A 13 de Maio de 1917, Nossa Senhora apareceu aos Três Pastorinhos, Lúcia, Francisco e Jacinta. Nos meses seguintes, até Outubro inclusive, a Virgem Maria voltaria a manifestar-se nos dias 13, exceto em Agosto, quando se manifestou no dia 19, nos Valinhos. Nesses encontros, Nossa Senhora recordou, em linguagem muito simples, acessível aos pastorinhos, as verdades fundamentais do Evangelho. A sua mensagem pode resumir-se nos termos de "oração e penitência", oração e conversão. As aparições foram reconhecidas pela Igreja como dignas de fé. Paulo VI, João Paulo II e Bento XVI foram peregrinos de Fátima.
    Lectio

    Primeira leitura: Apocalipse 21, 1-5a

    Eu, João, vi, então, um novo céu e uma nova terra, pois o primeiro céu e a primeira terra tinham desaparecido e o mar já não existia. 2E vi descer do céu, de junto de Deus, a cidade santa, a nova Jerusalém, já preparada, qual noiva adornada para o seu esposo. 3E ouvi uma voz potente que vinha do trono e dizia:«Esta é a morada de Deus entre os homens. Ele habitará com eles; eles serão o seu povo e o próprio Deus estará com eles e será o seu Deus. 4Ele enxugará todas as lágrimas dos seus olhos; e não haverá mais morte, nem luto, nem pranto, nem dor. Porque as primeiras coisas passaram.» 5O que estava sentado no trono afirmou: «Eu renovo todas as coisas.»

    A grande utopia da ressurreição do homem e do mundo chegará a ser realidade. A cidade nova não tem nada da antiga: nem da Jerusalém israelita, nem sequer da Igreja cristã. É algo de novo que integra aquilo que o antigo tinha de melhor numa espécie de continuidade descontínua. João admira-se de não haver templo na cidade nova. Para o cristianismo, todo o universo é templo: Deus pode revelar-se onde quiser.
    A liturgia aplica este texto a Maria. Deus revelou-se nela. Ela foi a verdadeira Arca de Deus no meio do seu povo. Glorificada no Céu, não esquece aqueles que lhe foram confiados como filhos. Daí, as suas numerosas intervenções ao longo da história, como as de Fátima, em 1917. Ela faz tudo para que, em cada um dos seus filhos, se realize o que já se realizou n´Ela.

    Evangelho: João 19, 25-27

    Naquele tempo, estavam junto à cruz de Jesus estavam, de pé, sua mãe e a irmã da sua mãe, Maria, a mulher de Clopas, e Maria Madalena. 26Então, Jesus, ao ver ali ao pé a sua mãe e o discípulo que Ele amava, disse à mãe: «Mulher, eis o teu filho!» 27Depois, disse ao discípulo: «Eis a tua mãe!» E, desde aquela hora, o discípulo acolheu-a como sua.

    A mãe de Jesus aparece no princípio e no fim da vida pública de Jesus, ou seja, nas bodas de caná (Jo 2, 1ss.) e junto à cruz do Senhor (Jo 19, 1ss.). Nas bodas de Caná, Jesus dirige-lhe palavras que devem entender-se no sentido de separação: Jesus diz-lhe que não intervenha na fase da sua vida pública, que estava a iniciar. A partir desse momento, Maria como que desaparece de cena. Mas, agora que chegou a hora de Jesus, Maria reaparece, pois é também a sua hora. Em ambas as situações Jesus se lhe dirige chamando-a "mulher" e não mãe, como seria normal. O Senhor parece querer apresentá-la como a mulher estreitamente unida a Ele na realização da obra da redenção, a mulher de que se fala no Génesis (Gn 3, 15) e no Apocalipse (Ap 12). As palavras que Jesus dirige a Maria: "Eis o teu filho!" têm um sentido mais profundo do que o imediatamente literal. A Igreja encarregou-se de aprofundá-lo. O afeto e a relação maternal - a maternidade espiritual de Maria - concentrar-se-ão naqueles por quem o seu Filho está a dar a vida. João personifica todos os seguidores de Jesus. Segundo a teologia paulina, os crentes são "irmãos" de Cristo, participantes da sua filiação.

    Meditatio
    "Por ocasião das cerimónias religiosas que têm lugar nestes dias em Fátima, Portugal, em honra da Virgem Mãe de Deus, onde acorrem numerosas multidões de fiéis para venerarem o seu coração maternal e compassivo, desejamos mais uma vez chamar a atenção de todos os filhos da Igreja para o inseparável vínculo que existe entre a maternidade espiritual de Maria e os deveres que têm para com Ela os homens resgatados. Julgamos ser de grande utilidade para as almas dos fiéis considerar duas verdades muito importantes para a renovação da vida cristã. A primeira verdade é esta: Maria é Mãe da Igreja, não só por ser Mãe de Jesus Cristo e sua íntima colaboradora na nova economia da graça, quando o Filho de Deus n'Ela assumiu a natureza humana para libertar o homem do pecado mediante os mistérios da sua carne, mas também porque brilha à comunidade dos eleitos como admirável modelo de virtude. Depois de ter participado no sacrifício redentor de seu Filho, e de maneira tão íntima que mereceu ser por Ele proclamada Mãe não somente do discípulo João, mas - seja consentido afirmá-lo - do género humano, por este de algum modo representado, Ela continua agora no Céu a desempenhar a sua função materna de cooperadora no nascimento e desenvolvimento da vida divina em cada alma dos homens remidos. Mas de que modo coopera Maria no crescimento da vida da graça nos membros do Corpo Místico? Antes de tudo, pela sua oração incessante, inspirada por uma ardentíssima caridade. A Virgem Santa, de facto, gozando embora da contemplação da Santíssima Trindade, não esquece os seus filhos que caminham, como Ela outrora, na peregrinação da fé; pelo contrário, contemplando-os em Deus e conhecendo bem as suas necessidades, em comunhão com Jesus Cristo que está sempre vivo para interceder por nós, deles se constitui Advogada, Auxiliadora, Amparo e Medianeira. No entanto, a cooperação da Mãe da Igreja no desenvolvimento da vida divina nas almas não consiste apenas na sua intercessão junto do Filho. Ela exerce sobre os homens remidos outra influência importantíssima, a do exemplo, segundo a conhecida máxima: as palavras movem, o exemplo arrasta. Realmente, tal como os ensinamentos dos pais adquirem maior eficácia quando são acompanhados pelo exemplo duma vida conforme as normas da prudência humana e cristã, assim também a suavidade e o encanto das excelsas virtudes da Imaculada Mãe de Deus atraem irresistivelmente as almas para a imitação do divino modelo, Jesus Cristo, de que Ela foi a mais perfeita imagem. Mas nem a graça do divino Redentor nem a poderosa intercessão de sua e nossa Mãe espiritual poderiam conduzir-nos ao porto da salvação, se a tudo isso não correspondesse a nossa perseverante vontade de honrar Jesus Cristo e a Virgem Mãe de Deus com a fiel imitação das suas sublimes virtudes. É, pois, dever de todos os cristãos imitar religiosamente os exemplos de bondade que lhes deixou a Mãe do Céu. É esta a segunda verdade sobre a qual nos agrada chamar a vossa atenção. É em Maria que os cristãos podem admirar o exemplo que lhes mostra como realizar, com humildade e magnanimidade, a missão que Deus confiou a cada um neste mundo, em ordem à sua eterna salvação e à do próximo. Uma mensagem de suma utilidade parece chegar hoje aos fiéis da parte d'Aquela que é a Imaculada, a toda santa, a cooperadora do Filho na restauração da vida sobrenatural das almas. A santa contemplação de Maria incita-os, de facto, à oração confiante, à prática da penitência, ao santo temor de Deus, e recorda-lhes com frequência aquelas palavras com que Jesus Cristo anunciava estar perto o reino dos Céus: Arrependei-vos e acreditai no Evangelho, bem como a sua severa advertência: Se não vos arrependerdes, perecereis todos de maneira semelhante. Comemorando-se este ano o vigésimo quinto aniversário da solene consagração da Igreja a Maria Mãe de Deus e ao seu Coração Imaculado, feita pelo Nosso Predecessor Pio XII no dia 31 de Outubro de 1942, por ocasião da Radiomensagem à Nação Portuguesa - consagração que Nós mesmo renovámos no dia 21 de Novembro de 1964 - exortamos todos os filhos da Igreja a renovar pessoalmente a sua própria consagração ao Coração Imaculado da Mãe da Igreja e a viver este nobilíssimo ato de culto com uma vida cada vez mais conforme à vontade divina, em espírito de serviço filial e devota imitação da sua celeste Rainha. (Paulo VI, 13 de Maio de 1967).

    Oratio

    Pai Santo, nós vos louvamos e bendizemos, ao celebrarmos a festa da Virgem Santa Maria. Recebendo o vosso Verbo em seu Coração Imaculado, ela mereceu concebê-lo em seu seio virginal e, dando à luz o Criador do universo, preparou o nascimento da Igreja. Junto à cruz, aceitou o testamento da caridade divina e recebeu todos os homens como seus filhos, pela morte de Cristo gerados para a vida eterna. Enquanto esperava, com os Apóstolos, a vinda do Espírito Santo, associando-se às preces dos discípulos, tornou-se modelo admirável da Igreja em oração. Elevada à glória do Céu, assiste com amor materno a Igreja ainda peregrina sobre a terra, protegendo misericordiosamente os seus passos a caminho da pátria celeste, enquanto espera a vinda gloriosa do Senhor. Nós vos louvamos e bendizemos, Senhor! Ámen. (cf. Prefácio da Missa).

    Contemplatio

    Ó Coração sagrado do meu Jesus, eu vos adoro e vos dou graças infinitas por terdes dirigido para a minha salvação o martírio que suportastes à vista dos sofrimentos do santíssimo Coração de Maria ao pé da cruz, porque ma destes como soberana e como mãe. Tal é o vosso amor por mim que lhe pedistes para me tomar como seu filho em vosso lugar, para me amar, para ter compaixão das minhas misérias, para me assistir, para me proteger, para me guardar e para me governar como seu filho. Talvez, ó meu Salvador, não encontrastes maior consolação para a vossa divina Mãe do que dar-lhe filhos perversos e pecadores, a fim de que ela empregue o seu poder e a imensa caridade do seu Coração em conseguir a sua conversão e salvação. Sede bendito e louvado para sempre, ó Coração sagrado do meu Redentor, por terdes querido que nenhum dos vossos sofrimentos, e os de vossa santa Mãe, fosse perdido por mim, mas que todos servissem para curar as minhas feridas e enriquecer-me com verdadeiros bens. (Leão Dehon, OSP 4, p. 262s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Esta é a morada de Deus entre os homens." (Ap 21, 3).

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    Nossa Senhora de Fátima  (13 Maio)

    VII Semana - Segunda-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    VII Semana - Segunda-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    13 de Maio, 2024

    Tempo Comum - Anos Pares
    VII Semana - Segunda-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Tiago 3, 13-18

    Caríssimos: 13Existe alguém entre vós que seja sábio e entendido? Mostre, então, pelo seu bom procedimento, que as suas obras estão repassadas da mansidão própria da sabedoria. 14Mas, se tendes no vosso coração uma inveja amarga e um espírito dado a contendas, não vos vanglorieis nem falseeis a verdade. 15Essa não é a sabedoria que vem do alto, mas é a terrena, a da natureza corrompida, a diabólica. 16Pois, onde há inveja e espírito faccioso também há perturbação e todo o género de obras más. 17Mas a sabedoria que vem do alto é, em primeiro lugar, pura; depois, é pacífica, indulgente, dócil, cheia de misericórdia e de bons frutos, imparcial, sem hipocrisia; 18e é com a paz que uma colheita de justiça é semeada pelos obreiros da paz.

    Depois de ter aconselhado os mestres a dominarem a língua, Tiago pergunta: «Existe alguém entre vós que seja sábio e entendido?» (v. 13). Depois, detém-se a apresentar a verdadeira e a falsa sabedoria, realçando-lhes os contrastes. Os neo-convertidos eram tentados a sentar-se na cátedra e a apresentar soluções para todas as questões e problemas, pois julgavam possuir um profundo conhecimento de Deus e do mundo. Tiago pede-lhes moderação. Já Paulo tivera que haver-se com os que possuíam uma «sabedoria» meramente intelectual (cf. 1 Cor 1). A sabedoria intelectual, ou terrena, leva à discórdia; a sabedoria que vem do alto leva à comunhão.
    A sabedoria que vem do alto inspira a comunhão que, por sua vez dá bom testemunho e permite viver na mansidão e na paz. A sabedoria terrena, pelo contrário, inspira a discórdia e faz crescer sentimentos de inveja, de contendas, que alimentam a soberba.
    O fruto da verdadeira sabedoria é a justiça e a paz (v. 18), tal como a desordem e toda a espécie de obras más provêm da falsa sabedoria (v. 16).

    Evangelho: Marcos 9, 14-29

    Naquele tempo, tendo Jesus descido do monte, 14ia ter com os seus discípulos, quando viu em torno deles uma grande multidão e uns doutores da Lei a discutirem com eles. 15Assim que viu Jesus, toda a multidão ficou surpreendida e acorreu a saudá-lo. 16Ele perguntou: «Que estais a discutir uns com os outros?» 17Alguém de entre a multidão disse-lhe: «Mestre, trouxe-te o meu filho que tem um espírito mudo. 18Quando se apodera dele, atira-o ao chão, e ele põe-se a espumar, a ranger os dentes e fica rígido. Pedi aos teus discípulos que o expulsassem, mas eles não conseguiram.» 19Disse Jesus: «Ó geração incrédula, até quando estarei convosco? Até quando vos hei-de suportar? Trazei-mo cá.» 20E levaram-lho.Ao ver Jesus, logo o espírito sacudiu violentamente o jovem, e este, caindo por terra, começou a estrebuchar, deitando espuma pela boca.
    21Jesus perguntou ao pai: «Há quanto tempo lhe sucede isto?» Respondeu: «Desde a infância; 22e muitas vezes o tem lançado ao fogo e à água, para o matar. Mas, se podes alguma coisa, socorre-nos, tem compaixão de nós.» 23«Se podes...! Tudo é possível a quem crê», disse-lhe Jesus. 24Imediatamente o pai do jovem disse em altos brados: «Eu creio! Ajuda a minha pouca fé!» 25Vendo, Jesus, que acorria muita gente, ameaçou o espírito maligno, dizendo: «Espírito mudo e surdo, ordeno-te: sai do jovem e não voltes a entrar nele.» 26Dando um grande grito e sacudindo-o violentamente, saiu. O jovem ficou como morto, a ponto de a maioria dizer que tinha morrido. 27Mas, tomando-o pela mão, Jesus levantou-o, e ele pôs-se de pé. 28Quando Jesus entrou em casa, os discípulos perguntaram-lhe em particular: «Porque é que nós não pudemos expulsá-lo?» 29Respondeu: «Esta casta de espíritos só pode ser expulsa à força de oração.»

    Jesus não permitiu que os discípulos acampassem no Tabor. Mas nem Ele lá ficou muito tempo. Ao chegar junto dos discípulos, viu-os rodeados por uma multidão, que não esperava a sua vinda. Surpreendida, suspendeu a discussão com os discípulos, e acorreu a saudá-lo. É então que o pai de um jovem endemoninhado Lhe fala do estado de saúde do filho, acrescentando que os discípulos não tinham conseguido curá-lo.
    O carácter iracundo de Jesus, várias vezes realçado no segundo evangelho, vem ao de cima: «Ó geração incrédula, até quando estarei convosco? Até quando vos hei-de suportar? Trazei-mo cá» (v. 19). Jesus verifica que a sua pregação e os milagres realizados não tinham conseguido consolidar a fé dos discípulos, nem da multidão. Daí a sua indignação. Todavia não abandona aqueles que sofrem.
    O pai do jovem também tinha uma fé inconsistente. Mas, pelo menos, reconhecia-o com humildade: «se podes alguma coisa, socorre-nos, tem compaixão de nós» (v. 22). Era já um princípio de fé, que Jesus intuiu. Partindo dessa fé inicial, e escutando a sua oração - «Eu creio! Ajuda a minha pouca fé!» - Jesus concede-lhe uma fé mais robusta. Depois, realiza o milagre pedido, libertando o jovem do espírito mudo e deixando um breve intervalo de tempo para que se revelem a grandeza e o poder do amor. A multidão pensa que o jovem estava morto mas, pelo contrário, estava livre e podia iniciar uma nova vida.
    Quando os discípulos interrogam Jesus sobre a sua incapacidade em curar o jovem, o divino Mestre acena, mais uma vez, à necessidade da oração.

    Meditatio

    Tiago leva-nos a meditar na relação sabedoria e fé: uma e outra se entrelaçam, formando como que um tecido compacto que cobre e aquece o homem, fazendo-o caminhar para o bem e para o amor. De facto, o homem sábio e crente tem, com os outros, um relacionamento fundado no acolhimento e na escuta. Por isso, é manso, pacífico, prestável, misericordioso, imparcial e verdadeiro na relação com os seus semelhantes. Na relação com Deus, reconhece-se que precisa d´Ele e que necessita de encontrar a Jesus, no seu caminho, Está consciente de que, por si mesmo, não é capaz de fazer o bem e de caminhar no amor.
    A fé faz crescer a sabedoria e a sabedoria aumenta a fé. O verdadeiro sábio e crente não cairá numa justiça meramente terrena. A humildade é a fé escondida, e a confiança daquele que tudo espera, e por isso tudo cobre na caridade. De mesmo modo, a oração é o pão quotidiano que fermenta a massa da existência e faz erguer os olhos para Aquele que é o Senhor da vida, de Quem precisamos para expulsar o mal que nos atormenta.
    O evangelho apresenta-nos esse Senhor em acção. Marcos narra com pormenor mais um milagre de Jesus que, provavelmente, servia para uma catequese baptismal. Duas vezes o jovem é comparado a um morto: &
    laquo;O jovem ficou como morto, a ponto de a maioria dizer que tinha morrido» (v. 26); «Jesus levantou-o, e ele pôs-se de pé» (v. 27). No v. 27, temos dois verbos, - levantar-se, erguer-se -, que o Novo Testamento usa para falar de ressurreição. Morte e vida: imagem do Baptismo, por meio do qual «fomos, pois, sepultados com Ele (Cristo) na morte, para que, tal como Cristo foi ressuscitado de entre os mortos pela glória do Pai, também nós caminhemos numa vida nova» (Rm 6, 4). É, pois, necessário que o «homem velho» morra, que seja destruída inveja amarga, o espírito de contendas, a sabedoria carnal, diabólica, para que chegue ao pleno desenvolvimento em nós a novidade de vida que é dom de Cristo.
    Este dom, brotou do Lado aberto do Senhor: «Do Coração de Cristo, aberto na cruz, nasce o homem de coração novo, animado pelo Espírito e unido aos seus irmãos na comunidade de amor, que é a Igreja» (cf. Leão Dehon, Études sur le Sacré-Coeur, I, p. 114). O sangue e a água, que jorram do Lado de Cristo aberto pela lança simbolizam o dom do Espírito, que será derramado, e da Eucaristia, sacramento do amor, de que somos convidados a alimentar-nos para crescer na caridade. Mas o sangue derramado é também um sinal de morte, e convida-nos a morrer ao homem velho (Cf. Rm 6, 6; Ef 4, 22), tal como a água é um sinal de vida que nos impele a viver do «homem novo, criado segundo Deus na justiça e na santidade verdadeira» (Ef 4, 22); é sinal do baptismo: «Fomos baptizados em Cristo Jesus... na Sua morte» (Rm 6, 3; Cf. Col 2, 2); «O amor de Deus foi derramado nos vossos corações por meio do Espírito Santo que nos foi dado» (Rm 5, 5).

    Oratio

    Senhor Jesus, faz morrer em mim toda a desordem, para que reine na minha mente e no meu coração a sabedoria que vem do alto, uma sabedoria pura, pacífica, mansa, prestável, cheia de misericórdia e de bons frutos.
    Se for preciso, renova em mim os teus prodígios, para que a minha fé se torne sólida. Tu disseste: «tudo é possível a quem crê». E eu respondo com humildade e confiança: «Eu creio! Ajuda a minha pouca fé!». Ajuda-me a não abandonar-te e a descobrir a tua presença na vida de cada dia. Dá-me a graça de olhar para Ti quando penso fazer boas acções, especialmente em favor do próximo, para que não perca qualquer dom do que infundiste em mim. Amen.

    Contemplatio

    Os discípulos exorcizam em vão o doente. Os escribas triunfam; procuram desacreditar os discípulos e o Mestre. Repetem os seus ultrajes do costume: «Estas pessoas, dizem, expulsam os demónios pela virtude de Belzebu, quando Belzebu quer». Os discípulos defendem-se, Jesus intervém: «De que disputais?», diz. Não respondem. As lamentações dolorosas e a ardente súplica do pobre pai interrompem o silêncio. Está de joelhos, chorando e com o coração partido: «Mestre, diz, conjuro-vos, lançai um olhar sobre o meu filho, o meu filho único. Se podeis alguma coisa, ajudai-me, tende piedade de nós, curai-o; os vossos discípulos não puderam». E Jesus diz à parte aos seus discípulos: «Este demónio não se pode expulsar senão pelo jejum, pela penitência e pela oração». É a grande lição deste milagre.
    Depois o Salvador interessa-se pelo pobre doente e pelo seu pai: «Desde quando sofre?» - «Desde a sua infância, diz o pai, é terrivelmente atormentado. Esperava que os vossos discípulos o salvassem!» - «Raça incrédula!», exclamou Jesus. Os apóstolos tinham tido pouca fé; o pai do doente e todo o seu acompanhamento também. «Se tu podes crer, diz o Salvador a este homem, tudo é possível a quem crê». - «Senhor, eu creio, ajuda a minha incredulidade». Mesmo assim Jesus sente-se tocado: «Trazei-me aqui o vosso filho», diz. A raiva do espírito maligno duplica contra a sua vítima, logo que viu Jesus, seu Senhor todo-poderoso. O ar retine com os seus gritos. O menino, atirando-se ao chão, escuma e rebola-se sobre a terra.
    Que espectáculo! O demónio triunfa momentaneamente, porque os apóstolos não tinham sido bastante fiéis ao espírito de reparação e de penitência, ensinado todos os dias pelo seu Mestre. Eis também o segredo do poder que o demónio ainda guarda sobre a nossa alma, sobre as nossas casas, sobre a nossa sociedade: a falta de espírito de reparação e de penitência (Leão Dehon, OSP3, p. 193s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Eu creio! Ajuda a minha pouca fé!» (Mc 9, 24).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • S. Matias

    S. Matias


    14 de Maio, 2024

    S. Matias não pertencia ao grupo dos Doze escolhidos por Jesus para seus companheiros e mensageiros (Mc 3, 14). Mas provavelmente era um dos setenta e dois discípulos que Jesus enviou em missão (Lc 10, 1ss.). De qualquer modo, como firma S. Pedro, estava entre aqueles que, após o batismo de Jesus por João Batista, não tinham deixado de acompanhar os Apóstolos e haviam sido testemunhas da Ressurreição (At 1, 22-23). Quando após a Ascensão se tornou necessário escolher um substituto para Judas, Matias foi agregado ao Colégio Apostólico. O seu nome encontra-se no segundo elenco do Cânon Romano.

    Lectio

    Primeira leitura: Atos dos Apóstolos 1, 15-17, 20-26

    Por aqueles dias, Pedro levantou-se no meio dos irmãos - encontravam-se reunidas cerca de cento e vinte pessoas - e disse: 16«Irmãos, era necessário que se cumprisse o que o Espírito Santo anunciou na Escritura pela boca de David a respeito de Judas, que foi o guia dos que prenderam Jesus. 20Está realmente escrito no Livro dos Salmos:'Fique deserta a sua habitação e não haja quem nela resida'. E ainda: 'Receba outro o seu encargo.'21Portanto, de entre os homens que nos acompanharam durante todo o tempo em que o Senhor Jesus viveu no meio de nós, 22a partir do baptismo de João até ao dia em que nos foi arrebatado para o Alto, é indispensável que um deles se torne, connosco, testemunha da sua ressurreição.»23Designaram dois: José, de apelido Barsabas, chamado Justo, e Matias. 24Fizeram, então, a seguinte oração: «Senhor, Tu que conheces o coração de todos, indica-nos qual destes dois escolheste  25para ocupar, no ministério apostólico, o lugar abandonado por Judas, que foi para o lugar que merecia.» 26Depois, tiraram à sorte, e a sorte caiu em Matias, que foi incluído entre os onze Apóstolos.

    Pedro, ao iniciar o seu ministério, preocupa-se em recompor o número dos apóstolos, - Doze -, explicando à comunidade as motivações de tal preocupação. Para entrar no Colégio Apostólico, o candidato deve ter partilhado as experiências do ministério público de Jesus. Exige-o o testemunho eficaz da Ressurreição do Senhor. Para o cristão, a fé enxerta-se na história e a história abre-se a Deus que visita e salva. A oração dos Apóstolos (vv. 24-25) sugere claramente que a escolha não é obra deles, mas é confiada à vontade e à intervenção do Senhor.

    Segunda leitura: João 15, 9-17

    Naquele tempo, Jesus disse aos seus discípulos: Assim como o Pai me tem amor, assim Eu vos amo a vós. Permanecei no meu amor. 10Se guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor, assim como Eu, que tenho guardado os mandamentos do meu Pai, também permaneço no seu amor. 11Manifestei-vos estas coisas, para que esteja em vós a minha alegria, e a vossa alegria seja completa. 12É este o meu mandamento: que vos ameis uns aos outros como Eu vos amei. 13Ninguém tem mais amor do que quem dá a vida pelos seus amigos. 14Vós sois meus amigos, se fizerdes o que Eu vos mando. 15Já não vos chamo servos, visto que um servo não está ao corrente do que faz o seu senhor; mas a vós chamei-vos amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi ao meu Pai. 16Não fostes vós que me escolhes-tes; fui Eu que vos escolhi a vós e vos destinei a ir e a dar fruto, e fruto que permaneça; e assim, tudo o que pedirdes ao Pai em meu nome Ele vo-lo concederá. 17É isto o que vos mando: que vos ameis uns aos outros.

    O apóstolo partilha a missão de Jesus, que o escolhe e envia. Mas, ainda antes disso, Jesus e os seus discípulos partilham o mesmo amor que Deus, o Pai, lhes deu. O primeiro dever do apóstolo é permanecer no amor, no amor de Jesus para com ele, e no amor de Jesus para com o Pai. É viver na comunhão simultaneamente horizontal e vertical, isto é, com os irmãos na fé e com Deus, meta última do nosso amor. O discípulo de Jesus, porque se sente amado e partilha com Jesus o amor do Pai, sabe que tem um mandamento a observar, o mandamento do amor. Este mandamento não inibe a nossa liberdade, mas exalta-a. O verdadeiro discípulo de Jesus tem plena consciência de ser seu amigo, e sente-se chamado a viver essa amizade "até ao fim", até ao dom de si mesmo.

    Meditatio

    S. Matias foi escolhido para ser amigo de Jesus e seu apóstolo. Como aos Onze, que restavam do Colégio Apostólico, Jesus diz: "És meu amigo, se fizeres o que Eu te mando." (cf. v. 14). Os temas do mandamento e o do amor repetem-se, hoje, no evangelho: "Permanecei no meu amor. Se guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor." (vv. 9-10); "É este o meu mandamento: que vos ameis uns aos outros como Eu vos amei." (v. 12). Esta insistência no mandamento, a propósito do amor, pode causar-nos estranheza. O amor, pensamos, só pode ser livre, uma vez que é algo de espontâneo e se desenvolve por leis próprias. Não são precisos mandamentos para o observar. Mas o cristão sabe que o verdadeiro amor não é pura espontaneidade, mas dom de Deus, derramado nos nossos corações. Para Jesus o verdadeiro amor leva a cumprir a vontade do outro: "Eu tenho guardado os mandamentos do meu Pai, e permaneço no seu amor" cf. (v. 10). Para amar o Pai, Jesus vive em permanente adesão à sua vontade. O Pai, e Jesus, querem que também nós amemos. Trata-se de uma espécie de círculo, que não é vicioso, mas de progresso no amor. A verdadeira adesão à vontade de Deus realiza-se no amor e, para que o nosso amor progrida, é preciso que seja adesão à vontade divina. Esta é a lei fundamental da vida espiritual: para amar, procuramos a vontade de Jesus, a vontade do Pai; procurando e cumprindo esta vontade, progredimos no amor.
    A oblação de amor, a que somos chamados, como dehonianos, concretiza-se na obediência amorosa à vontade de Deus. Lemos nas Constituições: "Jesus submeteu-Se amorosamente à vontade do Pai: disponibilidade particularmente manifesta na sua atenção e abertura às necessidades e aspirações dos homens. "O meu alimento é fazer a vontade d'Aquele que Me enviou e realizar a sua obra" (Jo 4,34). Queremos, a seu exemplo, pela profissão da obediência, fazer o sacrifício de nós mesmos a Deus e unir-nos, de uma maneira mais firme, à sua vontade de salvação". (Cst 53).

    Oratio

    Senhor Jesus, quero ser teu amigo. Não olhes para os meus méritos, mas para a misericórdia do teu coração. Perdoa o meu pecado e olha-me com predileção. Sei que precisas de colaboradores livres e alegres. Quero ser um deles. Tenho muito que aprender de ti e tu tens muito para me ensinar e entregar. Eis-me aqui! Quero ser teu amigo, um dos teus prediletos, um daqueles a quem confias quanto tens no coração e, como tu, fazer em tudo a vontade do Pai. Ámen.

    Contemplatio

    É preciso, diz S. Pedro, substituir o traidor e escolher um outro apóstolo. Procuremos, portanto, um discípulo fiel, um discípulo que tenha estado todo o tempo connosco, desde o começo da vida pública do Salvador até à sua morte. E escolheram dois, os mais fiéis, os mais zelosos discípulos do Salvador, José Barsabas, chamado o Justo, e Matias. Este não tinha o sobrenome de Justo, mas tinha a sua reputação. Ambos tinham seguido assiduamente o Salvador; não o tinham deixado; tinha escutado e posto em prática os seus ensinamentos. Eram os mais dedicados, os mais assíduos, os mais fiéis depois dos doze. Tinham visto tudo, ouvido tudo, meditado tudo... Podiam receber a imposição das mãos, o sacerdócio, o carácter episcopal e a missão apostólica. Mas, qual dos dois vão escolher? ... S. Pedro tem a piedosa inspiração de confiar a escolha a Deus reportando-se à sorte. E a sorte caiu em Matias. É, portanto, ele o fiel por excelência, o discípulo perfeito, que melhor ensinará a doutrina de Cristo e que melhor reproduzirá as virtudes do seu divino Coração. Se quero ter os favores divinos, eis o caminho: seguir fielmente Jesus, meditar em todos os seus mistérios, do começo até ao fim, deixar-me compenetrar dos sentimentos do seu Coração sagrado e reproduzir as suas virtudes. (Leão Dehon, OSP 3, p. 213).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Permanecei no meu amor" (Jo 15, 9).

    (14 maio)

    VII Semana - Terça-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    VII Semana - Terça-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    14 de Maio, 2024

    Tempo Comum - Anos Pares
    VII Semana - Terça-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Tiago 4, 1-10

    1De onde vêm as guerras e as lutas que há entre vós? Não vêm precisamente das vossas paixões que se servem dos vossos membros para fazer a guerra? 2Cobiçais, e nada tendes? Então, matais! Roeis-vos de inveja, e nada podeis conseguir? Então, lutais e guerreais-vos! Não tendes, porque não pedis. 3Pedis e não recebeis, porque pedis mal, para satisfazer os vossos prazeres. 4Almas adúlteras! Não sabeis que a amizade com o mundo é inimizade com Deus? Portanto, quem quiser ser amigo deste mundo torna-se inimigo de Deus! 5Ou pensais que a Escritura diz em vão: O Espírito que habita em nós ama-nos com ciúme? 6No entanto, a graça que Ele dá é mais abundante, pelo que diz:Deus opõe-se aos soberbos,mas dá a sua graça aos humildes.
    7Submetei-vos, portanto, a Deus; resisti ao diabo, e ele fugirá de vós. 8Aproximai-vos de Deus e Ele aproximar-se-á de vós. Lavai as mãos, pecadores, e purificai os vossos corações, ó gente de alma dividida. 9Reconhecei a vossa miséria, lamentai-vos e chorai; que o vosso riso se converta em pranto e a vossa alegria em tristeza. 10Humilhai-vos na presença do Senhor, e Ele vos exaltará.

    Se a verdadeira sabedoria, aquela que vem do alto, é pacificadora e condescendente, de onde vêm as lutas que dividem a comunidade? Vêm da sabedoria terrena. É ela que suscita na comunidade contendas, cobiças, invejas, lutas. Tiago, depois de ter tratado dos aspectos negativos que levam à divisão, penetra mais profundamente no coração daqueles que se armam em mestres da comunidade. A sua falta de correcção leva a guerras e litígios suscitados pelas paixões humanas que matam moralmente os outros. Como se pode alcançar o que se deseja, quando se pede movidos pela cobiça e pela inveja? O apóstolo chama a essas pessoas «almas adúlteras» (v. 4), porque amam as coisas mundanas e odeiam as coisas de Deus. Ora, «Deus... dá a sua graça aos humildes» (v. 8), ama os humildes, que Lhe são fiéis. Tiago parte desta afirmação para apelar à conversão dos seus ouvintes. É preciso acabar com toda a cobiça e inveja, pois cada um vale diante dos outros ou que vale diante de Deus. E só Ele exalta aqueles que Lhe obedecem.

    Evangelho: Marcos 9, 30-37

    Naquele tempo, 30Jesus e os discípulos, partindo dali, atravessaram a Galileia, e Ele não queria que ninguém o soubesse, 31porque ia instruindo os seus discípulos e dizia-lhes: «O Filho do Homem vai ser entregue nas mãos dos homens que o hão-de matar; mas, três dias depois de ser morto, ressuscitará.» 32Mas eles não entendiam esta linguagem e tinham receio de o interrogar.
    33Chegaram a Cafarnaúm e, quando estavam em casa, Jesus perguntou: «Que discutíeis pelo caminho?» 34Ficaram em silêncio porque, no caminho, tinham discutido uns com os outros sobre qual deles era o maior. 35Sentando-se, chamou os Doze e disse-lhes: «Se alguém quiser ser o primeiro, há-de ser o último de todos e o servo de todos.» 36E, tomando um menino, colocou-o no meio deles, abraçou-o e disse-lhes: 37«Quem receber um destes meninos em meu nome é a mim que recebe; e quem me receber, não me recebe a mim mas àquele que me enviou.»

    O segundo anúncio da paixão é mais seco do que o primeiro (8, 31). Não se diz quem serão os autores da morte de Jesus. Os discípulos nem se atrevem a fazer perguntas. Talvez porque conhecem as reacções de Jesus, e a sua própria cegueira. Além disso, andavam ocupados com outros pensamentos. Sabiam que Jesus queria fundar uma comunidade e que os elementos fundadores eram eles. Preocupava-os a organização da comunidade. Até aí, não havia falta. Mas também discutiam sobre quem deles seria o primeiro nessa comunidade. Jesus admite que tem que haver um «primeiro», mas não à maneira da sociedade civil. Por isso, faz-lhes saber que será primeiro aquele que se dispuser a servir com humildade. «Servir», em sentido bíblico, é servir a Deus e, portanto, também ao próximo. Este «serviço» liberta do egoísmo, vício dominante do homem. Quem quiser ser o primeiro «há-de ser o último de todos e o servo de todos» (v. 35). Há aqui uma lição de humildade e de entrega de si na dor e no sofrimento, mas, sobretudo, no amor oblativo e desinteressado. Aquele que sabe ser o último e o servo, reconhece que tudo quanto possui lhe foi dado por Deus. Por isso, coloca-se em atitude de acolhimento: «quem me receber, não me recebe a mim mas àquele que me enviou» (v. 37). É comparável a uma criança que recebe tudo e a todos com simplicidade, humildade e pobreza, e se abandona confiadamente nos braços dos pais, ou de quem dela cuida.

    Meditatio

    A tentação de correr aos primeiros lugares é muito antiga nas nossas comunidades cristãs, e mesmo nas comunidades de consagrados e consagradas. Por vezes, essa tentação apresenta-se de modo subtil e sob forma de bem: o interesse da comunidade, o bom êxito da sua missão, o Reino de Deus. Pode acontecer que, no começo, nem nos demos conta do engano em que o nosso egoísmo nos está a induzir. Mas, a tentação, pouco a pouco, vai sugerindo coisas cada vez mais afastadas da verdade de Cristo, que, sendo de condição divina, tomou a condição humana, fazendo-se homem, e homem pobre de bens e de poder. Como refere Paulo, tomou a condição de servo (cf. Fl 2, 5), e, como narra João, prestou serviços de servo (cf. Jo 13, 1ss). Por amor, e para servir, ocupou o último lugar, que ninguém era tentado a tirar-Lhe.
    O serviço à comunidade, não pode ser um pretexto para alguém se afirmar, se impor, dar nas vistas, mas há-de ser prestado com os sentimentos de Jesus. João, ao narrar o lava-pés, revela-nos os sentimentos com que Jesus prestou esse serviço aos seus discípulos. Prestou-o por amor e com humildade: «Tendo amado os seus... começou a lavar-lhes os pés») (Jo 13, 1ss). Vivemos numa sociedade onde há muitos «serviços» organizados em favor dos cidadãos. O serviço evangélico distingue-se de qualquer outro pela motivação (o amor) e pelo modo como é prestado (com humildade). Não bastam o profissionalismo, nem o sentido de solidariedade humana, ainda que sejam importantes. O amor e a humildade tornam o serviço evangélico, imitação de Cristo.
    O evangelho mostra-nos os discípulos, que seguem Jesus, mas não O compreendem, nem compreendem o sentido da sua vida. Jesus é, na verdade, o servo de Deus e dos homens. Eles falam de poder, de domínio. Quando o Mestre fala de dificuldades graves, e mesmo de morte, ainda compreendem menos. Permanecem nos seus pensamentos, que os afastam de Senhor. Por isso, Jesus lhes diz claramente: «Se alguém quiser ser o primeiro, há-de ser o último de todos e o servo de todos» (v. 34).
    Jesus est&aa
    cute; consciente da provação que O espera, e avança decidido e sereno. Procura inculcar nos discípulos o verdadeiro espírito de serviço, motivado pelo amor e praticado com humildade. As suas palavras «Fazei isto em memória de Mim» (Lc 22, 19; 1 Cor 11, 24-25) pronunciadas na instituição da Eucaristia são também um convite a todo o discípulo de Jesus, para que sirva como Ele serviu, para que se torne "pão partido" e "sangue derramado" por todos. Na eucaristia, como no lava-pés, Jesus oferece-se-nos um exemplo claro de como se deve servir os irmãos: depõe as "vestes" (Jo 13, 4) e, como um servo, lava os pés aos discípulos. Pedro tenta impedir o Senhor de fazer tal serviço (Cf. Jo 13, 6). Mas Jesus diz-lhe: «O que eu faço, tu não podes entendê-lo agora, mas hás-de sabê-lo depois» (Jo 13, 7).
    O Lava-pés preanuncia a morte de Jesus, o dom de toda a sua vida pelos homens: uma verdadeira "diaconia" ou serviço da vida, uma vida que se torna "pão partido pelo mundo". Tal como foi a vida do Mestre, assim deve ser a vida de discípulos. Depois da descida do Espírito Santo, Pedro compreende a lição e escreve na sua primeira carta: «Cada um de vós viva segundo a graça (carisma) que recebeu, pondo-a ao serviço (diaconia) dos outros» (1 Pe 4, 10). Os carismas são para o serviço (Cf. 1 Cor 12, 7; Ef 4, 12). Daqui se compreende o espírito de serviço, que deve caracterizar todo o discípulo do Senhor, que não age por sede de lucro ou por orgulho, mas unicamente animado pela oblação de amor: «Jesus... tendo amado os Seus, que estavam no mundo, amou-os até ao fim» (Jo 13, 1). O verdadeiro serviço, é imitação de Jesus que amou «não só com palavras e com língua, mas com obras e em verdade» (1 Jo 3, 18; Cst n. 18).

    Oratio

    Ó Jesus, na provação, Te tornaste sacerdote misericordioso. Ajuda-me a acolher as minhas próprias provações como momentos de educação salutar, e como motivos de alegria, porque me unem a Ti. Ajuda-me a acolher e a entender as palavras de Pedro: «exultais de alegria, se bem que, por algum tempo, tenhais de andar aflitos por diversas provações» (1 Pe 1, 6), bem como as de Paulo: «Estou cheio de consolação e transbordo de alegria no meio de todas as nossas tribulações» (2 Cor 7, 4). Que jamais me desoriente nas dificuldades e que, fixando o olhar em Ti, encontre, para elas, uma saída inspirada no teu amor por mim e no meu amor por Ti. Amen.

    Contemplatio

    Os apóstolos tinham acabado de ter uma discussão entre eles relativamente às honras que esperavam no novo reino, que julgavam dever ser temporal. Nosso Senhor repreende-os: Deixai, diz-lhes, estas vãs pretensões aos grandes do mundo. Esses gostam dos títulos de honra. Entre vós, que o primeiro se torne o servidor dos outros.
    Depois o bom Mestre quis apoiar este ensinamento com uma lição concreta: Quem é maior, diz-lhes, aquele que é servido, ou o que serve? É o que é servido. Ora bem! Vede, eu faço-me vosso servidor. E tomou uma bacia, como um escravo, e deitou-lhe água, e lavou-lhes os pés. Que lição de humildade!
    «Vós chamais-me Mestre e Senhor, diz-lhes, e dizeis bem, porque o sou. Então, se vos lavei os pés, se me humilhei até desempenhar a vosso respeito o ofício de um escravo, Eu que sou vosso Senhor e vosso Mestre, também vós deveis então lavar os pés uns aos outros, isto é, deveis prestar-vos os serviços mais humildes...».
    Não queria com isto excluir a hierarquia, porque acrescentava: «Como meu Pai me preparou um trono, também vos preparei o vosso; e tu Pedro, rezei para que a tua fé não desfaleça e tu hás-de confirmar os teus irmãos» (Lc 22,32).
    «Sereis apóstolos, deveis mesmo assim ser humildes, porque Eu, que sou vosso Mestre, faço acto de humildade. O apóstolo não é maior do que aquele que o enviou» (Jo 13,16).
    Quais são as minhas disposições de humildade? Sou verdadeiramente o servidor dos meus irmãos pela minha caridade e pelo meu zelo? (Leão Dehon, OSP 3, p. 266s.)

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Se alguém quiser ser o primeiro, faça-se servo de todos.»(cf. Mc 9, 35).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • VII Semana - Quarta-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    VII Semana - Quarta-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    15 de Maio, 2024

    Tempo Comum - Anos Pares
    VII Semana - Quarta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Tiago 4, 13-17

    Caríssimos: 13agora, escutai-me, vós dizeis: «Hoje ou amanhã iremos a tal cidade, passaremos ali um ano, faremos negócios e ganharemos bom dinheiro.» 14Vós, que nem sequer sabeis o que será a vossa vida no dia de amanhã! O que é, afinal, a vossa vida? Sois fumo que aparece por um instante e logo a seguir se desfaz! 15Em vez disso, deveis dizer: «Se o Senhor quiser, viveremos e faremos isto ou aquilo.» 16Pelo contrário, gloriais-vos das vossas prosápias: toda a vaidade deste género é má. 17Quem sabe praticar o bem e não o faz comete pecado.

    Estas palavras de Tiago dirigem-se aos ricos da comunidade, homens habituados a viajar e a fazer negócios que lhes trazem elevados lucros. Ávidos de dinheiro e de poder, julgam controlar o futuro. A sua presunção torna-os semelhantes ao fumo: tão depressa sobem como descem e se desfazem, porque são pessoas inconsistentes.
    O apóstolo sublinha a importância de voltar os olhos e os pensamentos para o Senhor. Só assim poderemos tomar decisões sábias, mesmo no que se refere ao nosso dia a dia. «Se Deus quiser», diz o nosso povo cristão, quando se refere ao futuro. Parece que os cristãos, aos quais se dirigia Tiago, não usavam esse modo de falar e, programando o futuro, como se tudo dependesse unicamente deles, apenas projectavam o que convinha aos seus interesses. Para eles, enriquecer era uma vaidade, um modo de se afirmarem sobre os outros, uma tentativa de obter direitos e privilégios. O seu pecado consistia em que, conhecendo o bem, faziam o mal.

    Evangelho: Marcos 9, 38-40

    Naquele tempo, 38João disse a Jesus: «Mestre, vimos alguém expulsar demónios em teu nome, alguém que não nos segue, e quisemos impedi-lo porque não nos segue.» 39Jesus disse-lhes: «Não o impeçais, porque não há ninguém que faça um milagre em meu nome e vá logo dizer mal de mim. 40Quem não é contra nós é por nós.

    Ao terminarmos a leitura do capítulo 9 de Marcos, podemos fazer um pequeno resumo de alguns temas: a fé dos discípulos é frágil, não é suficiente para expulsar demónios; os próprios discípulos têm a mania das grandezas, orgulhando-se diante daqueles que não pertencem ao grupo dos discípulos. Parece-lhes que só eles têm capacidade para realizar acções correspondentes aos ensinamentos de Jesus. Mas o Mestre mostra que a sua missão e os seus ensinamentos não podem ser encerrados atrás de portas ou muros. O Espírito Santo sopra onde quer. Fazer prodígios «em nome» de Jesus, é actuar com liberdade, acolhendo o amor, e em total dependência de Deus, que não exclui ninguém. Os discípulos não podem pretender um monopólio absoluto sobre Jesus. A Igreja deve estar aberta àqueles que não lhe pertencem expressamente, mas demonstram simpatia e benevolência em relação a ela. As exortações finais apresentam exactamente alguns princípios para a boa convivência comunitária.

    Meditatio

    É rico, não quem acumula muitos bens, mas quem é feliz, e quem sabe estar atento aos outros e às suas necessidades. Mas também é preciso estar atentos aos sentimentos com que damos algo aos irmãos carenciados, às motivações com que o fazemos. Quando a nossa generosidade é movida pela caridade de Cristo, sentimo-nos impelidos a novas iniciativas e a acções que nunca antes pensámos poder fazer. E pode acontecer que também nos admiremos de ver outros capazes de gestos de amor ainda maiores que os nossos.
    É então que nasce o verdadeiro sentido de comunidade, de encontro entre pessoas que, reunidas no amor oblativo, têm como dinamismo vital o Espírito Santo, que assim realiza a sua missão: «onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, Eu estou no meio deles» (Mt 18, 29).
    O mesmo Espírito pode actuar por meio de pessoas que não pertencem à comunidade, ao nosso grupo. Jesus ensina-nos a sabedoria espiritual e a abertura do coração para enfrentarmos esses casos. João e os seus companheiros pensaram proibir a outros de fazerem o bem em nome do Senhor: «vimos alguém expulsar demónios em teu nome, alguém que não nos segue, e quisemos impedi-lo porque não nos segue» (v. 38). Também nós, cristãos do século XXI, podemos cair na tentação de não admitir que outros, que não são católicos como nós, façam o bem. Mas a Igreja assumiu, no Concílio Vaticano II, o ensinamento de Cristo, incitando-nos a alegrar-nos com todo o bem feito no mundo, ainda que não seja feito por nós (cf. GS). Não possuímos o monopólio do bem.
    Não é fácil admitir que, pessoas que não estão de acordo connosco, possam fazer o bem. Mas Deus quer que o reconheçamos e nos alegremos com isso, porque «não há ninguém que faça um milagre em meu nome e vá logo dizer mal de mim», disse Jesus (Mt 9, 39). Uma boa acção leva a outra boa acção. Por isso, não a critiquemos, ainda que não estejamos de acordo com quem a faz.
    Há que aprender a descobrir «os sinais da sua presença» (Cst. 28) também em homens que não são "dos nossos". Pode até acontecer que os que nos parecem mais afastados sejam os mais próximos do Senhor. Assim aconteceu na vida de Jesus: Nicodemos e os judeus de Jerusalém são entusiastas dos sinais que Jesus realiza. Acreditam n´Ele e reconhecem-n´O como enviado de Deus. Mas não chegam à fé perfeita. E Jesus não Se fia neles, porque sabe o que há no coração do homem (cf. Jo 2, 23-25; 3, 1-10). Pelo contrário, chegam à fé os desprezados, os cismáticos samaritanos: «Este é, na verdade, o salvador do mundo» (Jo 4, 42) e mais ainda o pagão funcionário real, que acredita à palavra de Jesus: «Vai, o teu filho está salvo. Aquele homem acreditou na palavra de Jesus e pôs-se a caminho» (Jo 4, 50). O seu filho estava verdadeiramente curado: «Acreditou ele e toda a sua família» (Jo 4, 53).

    Oratio

    Senhor, abre o meu coração para que possa receber toda a tua alegria e comunicá-la ao mundo. Perdoa-me a presunção com que, por vezes, realizo obras em teu nome. Tenho a boca, as mãos, o coração e a mente cheios de Ti, mas os meus sentimentos levam-me a procurar interesses e resultados egoístas. Não permitas que os tente justificar, porque, só Tu os podes justificar pela tua morte na cruz. Que a minha única riqueza seja ver a pobreza dos outros, para ir em sua ajuda. E que a minha pobreza seja colmatada pela riqueza que os outros têm para me dar. Amen.

    Contemplatio

    Vigiemos para contentar Nosso Senhor, para alegrar o seu Coração, para nos lembrarmos d' Ele que é nosso amigo, para o servirmos fiel e delicadamente. Vigiemos para salvar
    mos a nossa alma, à qual Nosso Senhor tanto quer. Vigiemos, se amamos Nosso Senhor, para conservarmos a sua presença na nossa alma e a nossa união com o seu divino Coração! A sua graça, a sua amizade, não são o mais precioso dos tesouros?
    Não é estranho que os homens sejam tão zelosos e tão vigilantes pelos seus interesses temporais, para satisfazerem a sua avareza ou a sua ambição, e que o sejam tão pouco para adquirirem e para conservarem o mais precioso dos tesouros, a graça, a amizade de Nosso Senhor, a sua presença na sua alma.
    Vigiai porque estais envolvidos de perigos: perigos do lado do demónio, perigos do lado das criaturas, perigos do lado das vossas paixões. Escutai S. Pedro, que tinha conhecido as graves consequências da falta de vigilância. «Meus irmãos, dizia, sede sóbrios e estai vigilantes, porque o vosso inimigo, o demónio, ronda como um leão para vos devorar. Resisti-lhe permanecendo firmes na fé (e na caridade)» (Pd 5) (Leão Dehon, OSP4, p. 496).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Quem sabe praticar o bem e não o faz comete pecado» (Tg 4, 17).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • VII Semana - Quinta-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    VII Semana - Quinta-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    16 de Maio, 2024

    Tempo Comum - Anos Pares
    VII Semana - Quinta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Tiago 5, 1-6

    1Agora vós, ó ricos, chorai em altos gritos por causa das desgraças que virão sobre vós. 2As vossas riquezas estão podres e as vossas vestes comidas pela traça. 3O vosso ouro e a vossa prata enferrujaram-se e a sua ferrugem servirá de testemunho contra vós e devorará a vossa carne como o fogo. Entesourastes, afinal, para os vossos últimos dias! 4Olhai que o salário que não pagastes aos trabalhadores que ceifaram os vossos campos está a clamar; e os clamores dos ceifeiros chegaram aos ouvidos do Senhor do universo! 5Tendes vivido na terra, entregues ao luxo e aos prazeres, cevando assim os vossos apetites... para o dia da matança! 6Condenastes e destes a morte ao inocente, e Deus não vai opor-se.

    Tiago dirige agora uma invectiva contra os ricos. É a mais forte e veemente que encontramos na Bíblia (cf. Is 5, 8-10; Jer 5, 26-30; Am 8, 4-8; Miq 2, 89). É um solene aviso, ao estilo dos profetas, à sociedade em que vive, onde os ricos são cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres.
    O apóstolo, primeiro descreve a sorte dos ricos; depois fala da sua culpa. Para isso, retoma, com tons mais duros, o que já antes dissera (cf. Tg 2, 6s.) sobre a relação pobres e ricos. Fá-lo com verbos fortemente expressivos. Os ricos hão-de chorar compulsivamente, e com brados semelhantes ao ulular das feras porque as suas riquezas estão podres, as suas vestes comidas pela traça e o seu ouro e a sua prata enferrujados. As suas garantias de vida estão destruídas e, pior ainda, pesa sobre eles o juízo de Deus (v. 3b). O salário que não pagaram aos trabalhadores clama contra eles aos ouvidos do Senhor (v. 5). A vida frívola tornou-os semelhantes aos animais que engordam para a matança.
    O pobre, pelo contrário, é amado por Deus, que não afasta dele o olhar e que está sempre atento aos seus clamores.

    Evangelho: Marcos 9, 41-50

    Naquele tempo, 41disse Jesus aos seus discípulos: «quem for que vos der a beber um copo de água por serdes de Cristo, em verdade vos digo que não perderá a sua recompensa.»
    42«E se alguém escandalizar um destes pequeninos que crêem em mim, melhor seria para ele atarem-lhe ao pescoço uma dessas mós que são giradas pelos jumentos, e lançarem-no ao mar. 43Se a tua mão é para ti ocasião de queda, corta-a; mais vale entrares mutilado na vida, do que, com as duas mãos, ires para a Geena, para o fogo que não se apaga, 44onde o verme não morre e o fogo não se apaga. 45Se o teu pé é para ti ocasião de queda, corta-o; mais vale entrares coxo na vida, do que, com os dois pés, seres lançado à Geena, 46onde o verme não morre e o fogo não se apaga. 47E se um dos teus olhos é para ti ocasião de queda, arranca-o; mais vale entrares com um só no Reino de Deus, do que, com os dois olhos, seres lançado à Geena, 48onde o verme não morre e o fogo não se apaga. 49Todos serão salgados com fogo. 50O sal é coisa boa; mas, se o sal ficar insosso, com que haveis de o temperar? Tende sal em vós mesmos e vivei em paz uns com os outros.»

    Jesus continua a sua caminhada para Jerusalém e chega a Cafarnaúm. Marcos insere aqui uma colecção de ensinamentos sobre o discipulado, aparentemente desligados entre si. Mas neles encontramos algumas palavras-chave que os ligam uns aos outros: a expressão «em nome» de Cristo, ou «por serdes de Cristo» (v. 41), já fora anunciada no v. 37; o termo «escândalo» (v. 42) antecipa a secção seguinte (vv. 43-48); a sentença conclusiva do «sal» (v. 50) apela para o versículo anterior.
    No texto que escutamos, Jesus começa a tratar do acolhimento, apontando alguns gestos simples, feitos em seu nome, porque é Ele que dá significado às acções humanas, e lhes confere valor de eternidade (v. 41). Depois, fala do escândalo: quem põe obstáculos àqueles que ainda são frágeis na fé, merece uma pena severa. Nos vv. 43-47, Marcos adopta a linguagem paradoxal para indicar a radicalidade e a dureza do juízo: é melhor sacrificar os órgãos vitais do que aderir ao pecado e cair na condenação eterna.
    As imagens do sal e do fogo servem para retomar o tema do sacrifício de si mesmo em vista da preservação ou da purificação do pecado. A sabedoria de Cristo deve dar sabor a todas as nossas acções; o fogo do amor deve arder sempre para pôr a nossa vida ao serviço da comunhão. É preciso dispor-se a perder... para tudo ganhar: «quem quiser salvar a sua vida, há-de perdê-la; mas, quem perder a sua vida por causa de mim e do Evangelho, há-de salvá-la» (Mc 8, 35).

    Meditatio

    Apoiados na Palavra recebida, os Profetas interpelam-nos e fazem-nos erguer dos sofás do nosso egoísmo. Deus suscita-os em todas as épocas para erguerem a chama da esperança na escuridão circundante, denunciar as injustiças, e ajudar os pobres e erguer o seu grito para os céus.
    Também nós, cristãos e consagrados, precisamos de ser incomodados e acordados para olharmos a realidade, não com os nossos olhos, mas com os olhos de Deus.
    Os desafios que, no nosso tempo, nos são postos pela globalização estão à vista de todos. Também o apóstolo Tiago via, no seu tempo, o desequilíbrio entre ricos e pobres, e se dava conta do pecado de uns e da grandeza dos outros. Observando a realidade, em perspectiva divina, vemos o que é invisível à simples lógica humana.
    Também cada um de nós é chamado a ser profeta no nosso tempo. Há que devorar a Palavra, há que deixar-se queimar por ela, para que os nossos gestos, mesmo os mais simples, sejam realizados em nome de Deus, e deixem a sua marca. Possuídos pela Palavra, seremos verdadeiros Profetas, e não poremos obstáculos à verdade.
    No evangelho, Jesus exige que resistamos às tentações e renunciemos decididamente às ocasiões de pecado. A sua linguagem, como geralmente acontece, é fortemente expressiva: «Se a tua mão é para ti ocasião de queda, corta-a... Se o teu pé é para ti ocasião de queda, corta-o... se um dos teus olhos é para ti ocasião de queda, arranca-o...» (cf. vv 43-47). É precisa coragem heróica para corresponder a este mandato do Senhor!
    A palavra de Cristo faz-nos tomar consciência da nossa falta de coerência quando é preciso renunciar a pequenas coisas para progredirmos espiritualmente. A palavra de Cristo é semelhante ao bisturi de um cirurgião. O cirurgião usa o bisturi para salvar a vida, para curar o doente. A palavra de Deus, por vezes é mais cortante que um bisturi, quando actua em nós, para nos salvar a vida, para nos curar. E «mais vale entrares mutilado na vida, do que, com as duas mãos, ires para a Geena... mais vale entrares coxo na vida, do que, com os dois pés, seres lançado à Geena...mais vale entrares
    com um só olho no Reino de Deus, do que, com os dois olhos, seres lançado à Geena...» (cf. vv. 45.48). A intenção de Jesus é positiva: quer dar-nos a vida em plenitude. Cada um de nós, inspirado por esta linguagem metafórica de Jesus, deve discernir o que deve efectivamente cortar para entrar na Vida. Para um, será uma certa relação ambígua, para outro será um determinado espectáculo ou leitura, para outro ainda, um certo modo de fazer carreira na política, de aumentar o volume de negócios e de rendimentos... A carta de Tiago pode ajudar ao discernimento.
    «O Padre Dehon espera que os seus religiosos sejam profetas do amor». A nossa "vida religiosa" deve ser «um testemunho profético» (Cst 39). Ser "profetas" é, para nós, um "carisma" em vista da missão salvífica do Povo de Deus (cf. Cst 27).
    O "profeta", em sentido bíblico, é aquele que é chamado por Deus a falar "em nome de Deus" diante dos homens e a "falar em alta voz". Geralmente o profeta do Antigo Testamento é alguém que tem uma profunda experiência pessoal de Deus. Por isso, não só anuncia em alta voz a palavra de Deus, mas testemunha com a sua vida a vontade de Deus e como deve ser a vida do homem segundo Deus.
    Para nós, Oblatos-Sacerdotes do Coração de Jesus, o confronto deve acontecer especificamente com a "oblação reparadora de Cristo ao Pai pelos homens" (Cst 6). Sabendo como é exigente o carisma da oblação, é espontâneo o confronto com o Coração trespassado de Cristo e com todas as realidades expressas pelo mistério da transfixão do Seu Lado (Cst 21); é espontâneo o apelo para as profundas exigências da reparação (Cst 23) e da imolação (Cst 24), para as exigências da Eucaristia (Cst nn. 80-84) que devem tornar a nossa vida, tal como a do Pe. Dehon, "uma missa permanente" (Cst 5), "para Glória e Alegria de Deus" (Cst 25).

    Oratio

    Senhor, queremos, hoje, pedir-te a abundância do teu Espírito, porque estamos confusos, e já não sabemos distinguir o bem do mal. O pecado acumulou-se em nós, e tornou-se a nossa riqueza, o tesouro guardado nos cofres cerrados dos nossos corações. Que o teu Espírito, Senhor, volte a arder em nós e nos reconduza ao essencial, ao que verdadeiramente tem valor. Que Ele nos dê um olhar límpido, capaz de ver a criação e as criaturas; que nos dê braços abertos capazes de acolher os irmãos e partilhar com eles o que somos e temos; que nos dê pés seguros capazes de percorrer os caminhos da esperança. Então, seremos teus profetas, arautos da vida nova, que tem a marca e a sabedoria da tua cruz. Amen.

    Contemplatio

    Nosso Senhor, na sua bondade, quis acautelar-nos e premunir-nos contra a danação... Ora exprime simplesmente a danação, ora chama a nossa atenção para a pena do fogo e para a eternidade do castigo.
    Percorramos estes textos... Nosso Senhor ensina-nos primeiro que podemos perder a nossa alma, se quisermos satisfazer as nossas inclinações naturais e as nossas paixões. A condição da salvação é vencer a natureza, imitar o Salvador e levar a cruz atrás d' Ele (Mt 16).
    E se perdermos a nossa alma, quais serão então as consequências? Nosso Senhor di-no-lo em diversos momentos... «Povos do Oriente e do Ocidente hão-de converter-se, diz-nos, e entrarão no reino de Deus, enquanto que os filhos de Israel serão lançados nas trevas exteriores, onde reinam os choros e os rangeres de dentes» (Mt 7) ... Os condenados são submetidos ao suplício do fogo. O tormento deste suplício guarda em si algum mistério, mas Nosso Senhor chama-o sempre o suplício do fogo... Várias vezes, deu ao inferno, ou lugar dos condenados, o nome de Gehenna... Ora aqui está uma boa figura do inferno, um vale sinistro onde o fogo queima sempre. Ora Nosso Senhor tanto o chama simplesmente Gehenna, ou a Gehenna do fogo.
    «Mais vale, diz, arrancar o membro que causa escândalo, do que ver-se lançado inteiro na Gehenna» (Mt 5). - Noutra vez, diz: na Gehenna do fogo (Mt 18; Mc 9, 44).
    «Escribas e fariseus hipócritas, dizia ainda, fechais aos homens que vos escutam o reino dos céus; fazeis deles filhos da Gehenna... Como é que haveis vós mesmos de escapar ao juízo que condena à Gehenna?».
    Numa outra vez tinha dito: «Do mesmo modo que o cultivador queima as ervas más depois da colheita, assim o Filho do homem há-de enviar os seus anjos para atirar os escandalosos para o braseiro: para a fornalha ardente» (Mt 3, 42) (Leão Dehon, OSP 4, p. 510s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    Quem perder a sua vida por causa de mim e do Evangelho, há-de salvá-la» (Mc
    8, 35).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • VII Semana - Sexta-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    VII Semana - Sexta-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    17 de Maio, 2024

    Tempo Comum - Anos Pares
    VII Semana - Sexta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Tiago 5, 9-12

    Irmãos: 9Não vos queixeis uns dos outros, irmãos, para não serdes julgados.Olhai que o Juiz já está à porta.
    10Irmãos, tomai como modelos de sacrifício e de paciência os profetas, que falaram em nome do Senhor. 11Vede como nós proclamamos bem-aventurados aqueles que sofreram com paciência; ouvistes falar da paciência de Job e vistes o resultado que o Senhor lhe concedeu; porque o Senhor é cheio de misericórdia e compassivo. 12Mas, sobretudo, meus irmãos, não jureis, nem pelo Céu, nem pela Terra, nem façais qualquer outro juramento. Que o vosso «sim» seja sim e que o vosso "não" seja não, para não incorrerdes em condenação.

    Tiago volta-se finalmente para toda a comunidade exortando-os a viver o tempo presente de modo positivo e confiante. No meio das injustiças e atropelos, devem erguer os olhos para o Senhor que há-de melhorar a sua situação, quando vier como juiz. O apóstolo recorda dois exemplos do Antigo Testamento: os profetas e Job. Deus não os desiludiu, nem nos desiludirá a nós, porque «é cheio de misericórdia e compassivo» (v. 11). Há pois que permanecer fiéis à Palavra que devemos anunciar, e perseverar na fé. Finalmente, para que a esperança da parusia seja um tempo de serenidade e de edificação mútua, Tiago convida, não só a evitar a murmuração, mas também os juramentos (cf Mt 5, 33-37). A nossa palavra há-de ser garantida, não invocando o nome de Deus, mas vivendo com seriedade, autenticidade e transparência.

    Evangelho: Marcos 10, 1-12

    Naquele tempo, 1Jesus saindo dali, foi para a região da Judeia, para além do Jordão. As multidões agruparam-se outra vez à volta dele, e outra vez as ensinava, como era seu costume. 2Aproximaram-se uns fariseus e perguntaram-lhe, para o experimentar, se era lícito ao marido divorciar-se da mulher. 3Ele respondeu-lhes: «Que vos ordenou Moisés?» 4Disseram: «Moisés mandou escrever um documento de repúdio e divorciar-se dela.» 5Jesus retorquiu: «Devido à dureza do vosso coração é que ele vos deixou esse preceito. 6Mas, desde o princípio da criação, Deus fê-los homem e mulher. 7Por isso, o homem deixará seu pai e sua mãe para se unir à sua mulher, 8e serão os dois um só. Portanto, já não são dois, mas um só. 9Pois bem, o que Deus uniu não o separe o homem.» 10De regresso a casa, de novo os discípulos o interrogaram acerca disto. 11Jesus disse: «Quem se divorciar da sua mulher e casar com outra, comete adultério contra a primeira. 12E se a mulher se divorciar do seu marido e casar com outro, comete adultério.»

    A comunidade messiânica deve ultrapassar a moral exclusivamente legalista, característica dos fariseus. Eles, com a pergunta sobre o divórcio, querem «experimentá-lo», pô-lo em apuros. O divórcio hebraico era regulado por Dt 24, 1-4, cujo propósito inicial era tutelar a mulher e garantir-lhe uma certa liberdade. Mas as escolas rabínicas discutiam os motivos de divórcio. As mais liberais achavam que bastava a mulher deixar queimar a comida, ou o marido encontrar outra mais bonita, para haver divórcio. Outras achavam que só o adultério justificava o divórcio. De qualquer modo, o divórcio era concedido pela legislação em vigor com muita facilidade, o que naturalmente acabava por prejudicar a mulher.
    Como é seu costume, Jesus responde à questão com outra questão, obrigando os seus interlocutores a aprofundar o sentido da sua objecção. No juízo moral, há que distinguir o que é regra humana, por muito aceitável que ela seja, e a perspectiva de Deus. As prescrições mosaicas sobre o divórcio reflectem a mediocridade humana e não o projecto primordial de Deus sobre a união do homem e da mulher. A moral farisaica fundamentava-se na não confessada inferioridade da mulher, que era considerada propriedade do homem. Para Jesus, à luz do Génesis, a união do homem e da mulher é a meta de uma plenitude humana. Não é o homem que toma posse da mulher, nem o contrário, mas, ao casarem, ambos se enriquecem mutuamente. A união matrimonial procede de Deus e é um verdadeiro «sacrilégio» contrapor-lhe um projecto de separação e divergência.
    O homem e a mulher levam em si a imagem de Deus-Amor e, ainda que na diferença, são chamados a ser uma só coisa no matrimónio (v. 8). A ninguém é permitido quebrar essa união (v. 9).

    Meditatio

    O apóstolo Tiago convida-nos a viver com transparência, sem duplicidade nem ambiguidade, de tal modo que as nossas acções sejam credíveis por si mesmas. E lembra-nos que há um passado de que podemos tirar lições úteis para o presente, e que o futuro não é uma realidade nebulosa, longínqua, mas algo que já se constrói hoje e que, de algum modo, já se pode saborear.
    A história humana desenrola-se entre dois grandes momentos: o da criação e o da vinda gloriosa de Cristo. No princípio e no fim dos tempos, encontramos o sentido profundo da nossa vida: Deus, que nos chama e nos quer em comunhão com Ele. O tempo presente, por influência das sugestões mediáticas dominantes, pode parecer-nos o hoje absoluto, e fazer-nos cair na tentação de cortar com o passado, como se não fosse nosso, e de não nos projectarmos para um futuro possível, fechando-nos em nós mesmos. Mas a Palavra de Deus diz-nos que o momento em que vivemos é tempo de paciência, é tempo de espera activa e confiante do Senhor que vem. A nossa vida é também tempo para darmos corpo e história à «imagem e semelhança» divinas impressas em nós no acto criador, pelo qual cada um realiza o projecto originário de comunhão na diferença e na harmonia do amor.
    No tempo, somos chamados a palpitar da própria vida de Deus Trino e Uno. O homem e a mulher, unidos pelo sacramento do matrimónio, são «sacramento», sinal e actuação dessa vida, dentro dos limites da linguagem humana. Por isso é que o matrimónio é indissolúvel, e só por causa da dureza do coração humano é que Moisés permitiu que se passe o documento de repúdio. Os próprios discípulos acharem excessivamente dura a posição de Jesus em relação ao divórcio: «Se é essa a situação do homem perante a mulher, não é conveniente casar-se!» (Mt 19, 10). Mas é d´Ele que vem a força para amar com paciência e misericórdia. «Bem-aventurados aqueles que sofreram com paciência» (Tg 5, 11). E esta bem-aventurança destina-se, não só aos que são fiéis ao matrimónio, mas a todas as relações interpessoais.
    Parece-nos lógico que os outros tenham paci&ec
    irc;ncia connosco. Mas temos alguma dificuldade em aceitar ter paciência com os outros: «Não vos lamenteis uns dos outros», exorta-nos o Apóstolo (Tg 5, 9). Deus não se lamenta de nós, «porque é rico em misericórdia e compaixão» (cf. Ef 2, 4).
    A paciência, a misericórdia, a tolerância são necessárias em todo o tipo de relações interpessoais, particularmente no matrimónio, mas também na vida comunitária. Os nossos irmãos de comunidade, particularmente os idosos, os doentes, os feridos pelas agruras da vida, precisam de muita compreensão, amor e paciência. A paciência é um fruto do Espírito: é aceitação, compreensão, misericórdia, perdão. Realize-se em nós e nestes nossos irmãos feridos a profecia de Ezequiel: "Dar-vos-ei um coração novo, infundirei em vós um espírito novo; retirarei o vosso coração de pedra e dar-vos-ei um coração de carne" (36.26). A caridade deve ser uma esperança activa daquilo que os outros podem vir a ser com a ajuda do nosso apoio fraterno (Cst 34).

    Oratio

    Bendito és Tu, Senhor, que me lembras que hás-de vir julgar os vivos e os mortos. Ouvindo-te, sou levado a mudar a minha relação com a vida e com os outros. Não existo por acaso, nem avanço na vida sem rumo: Tu és a minha meta, a meta dos meus irmãos. Só Tu dás sentido e dás sabor às relações comigo mesmo e com os outros.
    Fortalece a minha vontade sempre frágil, para que conheça o teu projecto original para cada homem e para cada mulher, esse projecto de amor e de alegria que a tua Palavra me revela e que, em Jesus, assumiu carne humana. Que eu saiba dar o justo valor ao que é humano, e colher no meu tempo fugaz fragmentos duradouros, reflexos de eternidade. Amen.

    Contemplatio

    Nosso Senhor não veio destruir a lei; explicou, desenvolveu a lei moral com mais clareza, mais extensão; deu-lhe o sentido verdadeiro; purificou-a das falsas interpretações farisaicas; acrescentou-lhe o que faltava, e elevou-a a um ideal de perfeição que nunca tivera até então, e que deve conservar até ao fim dos séculos.
    Deus tinha-nos dado a lei sumariamente no Sinai: resumia-se em dois preceitos: amarás o teu Deus de todo o coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e amarás o teu próximo como a ti mesmo.
    Era necessária a delicadeza do Coração de Jesus para bem compreender toda a plenitude do mandamento divino e todo o seu alcance, e para o explicar sem mistura de vistas terrestres.
    Só Ele tinha poder para acrescentar ao preceito a força do exemplo no cumprimento perfeito de toda a lei, de maneira a poder dizer: dei-vos o exemplo, para que façais como me vistes fazer.
    Nosso Senhor restabeleceu-a em vários pontos.
    O decálogo diz: «Não matarás». Os fariseus tomavam isto à letra e desculpavam as outras violências. Nosso Senhor recorda-nos que o preceito interdita toda a cólera, toda a injúria, mesmo todo o sentimento interior de hostilidade contra o próximo. Recomenda o suporte mútuo e a pronta reconciliação depois da ofensa.
    O decálogo proíbe o adultério. Ao contrário dos Fariseus, Nosso Senhor diz-nos que este preceito interdita até os mínimos desejos, olhares e pensamentos maus, até ao ponto que mais valeria perder um olho ou uma mão, se forem para nós ocasião de escândalo.
    A lei de Moisés autoriza o divórcio em certos casos. Nosso Senhor diz-nos que isso era uma tolerância divina por causa da fraqueza do povo judeu, mas que devia cessar na lei nova, e restabeleceu a indissolubilidade do matrimónio (Leão Dehon, OSP3, p. 27s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Bem-aventurados aqueles que sofreram com paciência» (Tg 5, 11).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • VII Semana - Sábado - Tempo Comum - Anos Pares

    VII Semana - Sábado - Tempo Comum - Anos Pares


    18 de Maio, 2024

    Tempo Comum - Anos Pares
    VII Semana - Sábado

    Lectio

    Primeira leitura: Tiago 5, 13-20

    Caríssimos: 13Está alguém, entre vós, aflito? Recorra à oração. Está alguém contente? Cante salmos. 14Algum de vós está doente? Chame os presbíteros da Igreja e que estes orem sobre ele, ungindo-o com óleo em nome do Senhor. 15A oração da fé salvará o doente e o Senhor o aliviará; e, se tiver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados. 16Confessai, pois, os pecados uns aos outros e orai uns pelos outros para serdes curados. A oração fervorosa do justo tem muito poder. 17Elias, que era um homem da mesma condição que nós, rezou com fervor para que não chovesse, e durante três anos e seis meses não choveu sobre a terra. 18Depois voltou a rezar, e o céu deu chuva, e a terra produziu o seu fruto. 19Meus irmãos, se algum de vós se extravia da verdade e alguém o converte, 20saiba que aquele que converte um pecador do seu erro salvará da morte a sua alma e obterá o perdão de muitos pecados.

    Tiago termina com um pensamento final, que não se apresenta como conclusivo. Se não se deve invocar o nome de Deus em vão (cf. Tg 5, 9-12), Deus deve estar sempre presente na vida dos cristãos, que O hão invocar na oração. Toda a nossa existência, nas mais diversas situações, tristes ou alegres, pode e deve ser acompanhada pela oração. Tiago aponta concretamente a situação de doença (v. 14). O fiel doente deve dirigir-se a Deus e aos irmãos para receber a força necessária a essa situação. O chefes da comunidade, chamados a intervir com orações e gestos precisos pela autoridade que lhes vem do Senhor, revelam uma praxe usada na primitiva igreja. A Tradição fundamenta nessa praxe o sacramento da unção dos enfermos. A intervenção de Deus, invocado na oração comum, toca o homem na sua totalidade, corpo e espírito, «ergue-o» da doença, mas também do pecado (v. 15). Tiago usa o verbo com que é indicada a ressurreição do Senhor, para sublinhar que o Senhor torna participante da sua própria vida aqueles que a Ele se confiam.

    Evangelho: Marcos 10, 13-16

    Naquele tempo, 13apresentaram a Jesus uns pequeninos para que Ele os tocasse; mas os discípulos repreenderam os que os haviam trazido. 14Vendo isto, Jesus indignou-se e disse-lhes: «Deixai vir a mim os pequeninos e não os afasteis, porque o Reino de Deus pertence aos que são como eles. 15Em verdade vos digo: quem não receber o Reino de Deus como um pequenino, não entrará nele.» 16Depois, tomou-os nos braços e abençoou-os, impondo-lhes as mãos.

    A renúncia ao orgulho é outra característica da comunidade messiânica. O episódio da apresentação de alguns meninos a Jesus é significativo e claro a este respeito. Os discípulos pretendiam afastar as crianças, não porque incomodavam Jesus, mas porque, como as mulheres, representavam pouco ou mesmo nada. Segundo a mentalidade comum, de que os discípulos naturalmente também partilhavam, o Reino não era para crianças, mas para adultos, capazes de opções conscientes, de obras correspondentes e de adquirir méritos. Para Jesus, era tudo ao contrário: o Reino é um dom de Deus, que é preciso receber com disponibilidade. As crianças são as pessoas mais disponíveis para acolher dons, porque são pequenos e pobres, sem seguranças a defender ou privilégios a reclamar. Assim devem ser os discípulos de Cristo (v. 15), porque o Reino não é uma conquista pessoal, mas dom gratuito de Deus a esperar e a acolher com simplicidade e confiança. Ao abraçar as crianças, Jesus elimina toda a distância entre Ele e as crianças, e torna-se modelo daquela vida a que se chama «infância espiritual». De facto, dirige-se ao Pai com a palavra «abba», submete-se à sua vontade, abandona-se nas suas mãos.

    Meditatio

    A primeira leitura faz-nos lembrar o episódio da cura do paralítico que apresentaram a Jesus: Antes de lhe dar a saúde física, Jesus perdoa-lhe os pecados: «Filho, os teus pecados estão perdoados» (Mc 2, 5). De facto, Tiago escreve: «Algum de vós está doente? Chame os presbíteros da Igreja e que estes orem sobre ele, ungindo-o com óleo em nome do Senhor. A oração da fé salvará o doente e o Senhor o aliviará; e, se tiver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados» (vv. 14-15). Esta ligação doença-oração, perdão-cura, é significativa para nós: a doença, lida de modo cristão, é tempo de purificação. Não porque seja necessariamente causada por pecados! Quando os discípulos perguntaram a Jesus, no caso da cura do cego de nascença, se fora ele os pais a pecar, respondeu: «Nem pecou ele, nem os seus pais, mas isto aconteceu para nele se manifestarem as obras de Deus» (Jo 9, 3). Mas não há dúvida de que a doença seja tempo de dolorosa purificação do egoísmo, e de real solidariedade com quem sofre.
    O abraço de Jesus às crianças (v. 16) é simbolo do reino de Deus: é Cristo quem nos torna filhos do Pai e irmãos entre nós. Aquele abraço mostra-nos tudo quanto o nosso coração precisa e deseja. O reino de Deus é uma realidade já presente no meio de nós. Há que acolhê-lo na fé, como crianças, sem a presunção de o construirmos nós próprios. O Reino está aqui. Mas, onde estão as crianças? Onde estão os pequeninos dispostos a deixar-se amar?
    Talvez nos tenhamos tornado adultos autosuficientes! Talvez tenhamos construído um «reino» à nossa medida!
    Deixemos que a Palavra ecoe dentro de nós: «o Reino de Deus pertence aos que são como eles» (v. 14); «o Reino de Deus está próximo: arrependei-vos e acreditai no Evangelho» (Mc 1, 15); «quem não nascer do Alto não pode ver o Reino de Deus» (Jo 3, 3).
    A Palavra revela os nossos sentimentos mais secretos, desmascara o nosso orgulho, os nossos cálculos egoístas. Mas não nos deixa desorientados. Cristo dá-se a nós, adultos renascidos, para nos fazer sentir a sua presença, que é vida verdadeira, nos nos acolhe e anima, que nos cura o coração. Cristo presente no meio de nós, aponta-nos o caminho e abre os seus braços para nos acolher, juntamente com tantos irmãos, pecadores como nós, mas que se abandonam confiadamente ao seu amplexo.
    O princípio de toda a conversão é o humilde reconhecimento de que somos pequenos, de que somos pecadores: «Os meus olhares pousam sobre os humildes, e sobre os de coração contrito», diz o Senhor em Isaías (66, 2). Com muita sinceridade, no meio dos irmãos, devemos fazer nossa a atitude de Paulo, quando afirma: «Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores dos quais eu sou o primeiro» (1 Tm 1, 15).
    Dos muitos convites &agrave
    ; conversão, que ecoam no NT, prestamos, hoje, particular atenção ao nos traz o evangelho escutado: «Em verdade vos digo: quem não receber o Reino de Deus como um pequenino, não entrará nele» (v. 15; cf. Mt 18, 2-3). Ao pensar nesta conversão, realizada em cada um de nós, Jesus exultou no Espírito Santo dizendo: «Eu Te dou graças, ó Pai... porque escondeste estas coisas (os mistérios do Reino) aos sábios e aos inteligentes e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque tudo isso foi do Teu agrado» (Lc 10, 21; TOB). Como é grande a misericórdia, a ternura do Coração de Jesus!

    Oratio

    Senhor, pelo baptismo libertaste-me do pecado, deste-me o teu Espírito e entregaste-me nos braços da tua Igreja. Como é grande o teu amor, a tua misericórdia para comigo! Ajuda-me a conservar e a fazer crescer os teus dons.
    Que em cada momento, em cada situação, possa dirigir-me a Ti, para saborear a tua presença. Tu és o meu refúgio, também na doença. Que eu saiba aceitá-la com fé e amor, para ser purificado do meu egoísmo.
    . Guarda-me nos teus braços e saborearei a tua paz. Se acontecer esquecer-te, e tentar apoiar-me só nas minhas seguranças, ajuda-me a renascer, reconhecendo-me carecido da tua misericórdia, da comunhão contigo e com os meus irmãos. Amen.

    Contemplatio

    O Salvador (diz): Não exijo como um mestre sombrio que estejam sempre diante de mim numa atitude que cheire a incómodo e a coacção. Preciso de simplicidade, candura. Porque é que uma piedade mal entendida impede demasiadas vezes estas doces efusões comigo? As almas simples não conhecem as torturas desta coacção, vêm directamente ter comigo. Falam-me sem arte, como sentem e como pensam. Comprazo-me nesta simplicidade. Concedo a estas almas graças que recuso aos soberbos: humilibus dat gratiam (Tiago 4).
    Quantos sábios na doutrina da verdade são ignorantes na arte de conversar comigo! Imaginam que para virem ter comigo, para serem admitidos na intimidade do meu Coração, é necessário todo um aparato de artifícios engenhosos.
    Aproximam-se de mim como sitiariam um lugar terrível, à força de táctica, e durante esse tempo os simples vêm direitos ao meu Coração. Se fordes fiéis a este abandono cheio de simplicidade, mesmo quando não sentirdes a minha presença, eu estarei em vós. «Amo aqueles que me amam» (Prov. 8). «Se alguém me ama, meu Pai amá-lo-á, e nós viremos a ele e faremos nele a nossa morada» (Jo 14,25).
    Quero alegrar o coração dos meus amigos, é na sua afeição que o meu coração encontra a sua felicidade e se mesmo não lhes faço sentir a minha presença, estou com eles e eles fazem a minha alegria quando me amam.
    Muitos fazem de mim uma ideia muito inexacta, agem como faziam os meus apóstolos quando lhes repreendi por afastarem de mim as crianças. As crianças ouviam falar da minha bondade e do acolhimento benevolente que fazia a todos, queriam ver-me. Acorriam com a simplicidade da sua idade para verem Jesus, para lhe falarem, para receberem a sua bênção. Os meus apóstolos, que não me conheciam então como me conheceram depois, julgavam fazer bem afastando estes pobres pequenos, consideravam-nos como importunos. Dei-lhes então docemente uma lição que compreenderam. Atraí a mim estas crianças, abracei-as com bondade, abençoei-as e disse aos meus apóstolos quanto amava estas crianças. Acrescentei que o reino dos céus pertence-lhes e àqueles que a elas se assemelham. São semelhantes a elas os que vêm a mim na simplicidade do seu coração, para me dizerem que me amam, para receberem de mim um sinal de afecto, para me darem o seu coração (Leão Dehon, OSP3, p. 45).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Quem não receber o Reino de Deus como um pequenino, não entrará nele» (Mc 10, 15).

    | Fernando Fonseca, scj |

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