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  • 9.º Domingo do Tempo Comum - Ano B

    9.º Domingo do Tempo Comum - Ano B


    2 de Junho, 2024

    9.º Domingo do Tempo Comum - Ano B

    Tema do 9.º Domingo Comum

    A liturgia do 9.º Domingo do Tempo Comum convida-nos a refletir sobre a celebração do Dia do Senhor, sábado para os judeus, domingo para os cristãos, fazendo memória da ação criadora e redentora de Deus para com o seu Povo.
    A primeira leitura recorda-nos o preceito do terceiro mandamento, de guardar o sábado para o santificar, sugerindo que seja um dia que exprime a unidade do Povo que celebra a ação libertadora de Deus, sem qualquer tipo de desigualdades.
    O Evangelho, retomando a mesma temática, mostra que, quando se faz uma interpretação demasiado rigorista dos preceitos da Lei, ela deixa de cumprir a sua missão de estar ao serviço do homem de cada tempo. Jesus convida-nos, por isso, a posicionar-nos ao serviço dos necessitados, tendo em conta que o Dia do Senhor foi feito para o homem, não para fazer do homem um escravo. É um convite a vivermos não do preceito, mas da Lei que assumimos no nosso coração.
    A segunda leitura apresenta-nos o exemplo de ardor apostólico de São Paulo, para quem ser evangelizador equivale a ser prolongamento da vida de Cristo que deve ser visível naqueles que a anunciam. Apesar das fragilidades humanas, a mensagem evangélica não fica comprometida, porque é um tesouro precioso, sinal de que a obra evangelizadora é obra do poder de Deus.

    LEITURA I - Deut 5,12-15
    Leitura do Livro do Deuteronómio
    Eis o que diz o Senhor:
    «Guarda o dia de sábado, para o santificares,
    como te mandou o Senhor, teu Deus.
    Trabalharás durante seis dias
    e neles farás todas as tuas obras.
    O sétimo, porém, é o sábado do Senhor, teu Deus.
    Não farás nele qualquer trabalho,
    nem tu, nem o teu filho, nem a tua filha,
    nem o teu escravo, nem a tua escrava,
    nem o teu boi, nem o teu jumento,
    nem nenhum dos teus animais,
    nem o estrangeiro que mora contigo.
    Assim, o teu escravo e a tua escrava
    poderão descansar como tu.
    Recorda-te que foste escravo na terra do Egipto
    e que o Senhor, teu Deus, te fez sair de lá
    com mão forte e braço estendido.
    Por isso, o Senhor, teu Deus,
    te mandou guardar o dia de sábado».

    AMBIENTE
    O livro do Deuteronómio, mesmo que de redação posterior ao tempo da narração (que seria o tempo do caminho deserto, sob a guia de Moisés) e com notórias influências de textos extra-bíblicos de culturas vizinhas do Povo de Israel (nomeadamente dos tratados de vassalagem neo-assírios), é importante para as reformas de Ezequias (725-697 a.C.; cf. 2Rs 18,4.22) e sobretudo de Josias (640-609 a.C.; cf. 2Rs 23,4-20), uma vez que as centra no evento fundador de Israel como Povo, com a celebração da Aliança no Sinai-Horeb. Os elementos fundamentais que dão corpo às reformas são: o monoteísmo (um só Deus), a centralidade do curso num só lugar (Jerusalém), a Aliança de Deus-YHWH com o povo, que faz do Povo propriedade de Deus-YHWH e, portanto, a unidade do povo, demostrando a insensatez da constituição de dois reinos no período pós-salomónico e afirmando o ideal de regressar à unidade política das 12 tribos de Israel.
    O livro do Deuteronómio é tradicionalmente dividido em três grandes secções, que corresponderiam a três grandes discursos de Moisés; o nosso texto situa-se no início do segundo discurso (cf. Dt 4,44 - 26,19), depois de uma breve introdução histórica que o situa no contexto da teofania do Sinai-Horeb (Dt 4,44 - 5,5) e é parte da versão deuteronómica do decálogo (Dt 5,6-21). Quanto à sua forma literária, sendo parte do decálogo (dez mandamentos), é um texto de carácter legislativo, sem perder, porém, a sua componente didática como se vê pelo início do discurso de Moisés.

    MENSAGEM
    Não é difícil perceber qual a temática que está em foco no texto de Dt 5,12-15: trata-se do mandamento referente ao sábado, como se percebe até pela repetição desta palavra por três vezes. Praticamente é a enunciação do mandamento, uma explicação didática de como se deve praticar esse mandamento e uma fundamentação teológica para essa mesma prática.
    Quanto à enunciação do mandamento, há que notar que, a par do mandamento de honrar pai e mãe (cf. Dt 5,16), este é o único que não exprime uma proibição, mas uma ordem positiva: «Guarda o dia de sábado, para o santificares» (v. 12). Este enunciado positivo desdobra-se depois em duas explicações, uma positiva (v.13-14a) e outra em chave de proibição (v.14b): a positiva basicamente estabelece que o trabalho seja limitado aos primeiros seis dias da semana, de modo a reservar o sábado para o Senhor-YHWH, mostrando que o «sábado» é um dia que lhe pertence; já a explicação em chave de proibição centra-se na celebração do sábado que exclui qualquer possibilidade de trabalho. Esta explicação negativa, porém, transporta consigo um ideal de justiça para a sociedade que se baseia na solidariedade, uma vez que é uma espécie de crítica direta a um sistema social baseado numa lógica de mercado, uma vez que todos, também os escravos e os estrangeiros, são chamados a guardar o dia de sábado, com igualdade de direitos em relação às classes médias-altas que teriam a possibilidade de guardar o sábado exatamente socorrendo-se dos serviços de escravos e estrangeiros. A terceira parte do texto, o fundamento teológico, é típico do Deuteronómio, uma vez que, ao contrário do decálogo do livro do Êxodo que fundamenta o sábado com o repouso de Deus na obra da criação (cf. Ex 20,8-11), o Deuteronómio relaciona a obrigação do sábado com o evento de libertação do Egito (Dt 5,15); de facto, este último livro do Pentateuco insiste fortemente sobre a importância da memória da escravatura de Israel no Egito e sobre a libertação que lhe pôs termo (cf. Dt 4,23; 7,19; 11,2; 26,8).
    Uma releitura do texto do decálogo na versão do Deuteronómio (5,6-21) permite notar que o mandamento referente ao sábado é central a vários títulos no contexto do mesmo decálogo e, portanto, de importância cabal para a identidade hebraica: numa divisão tripartida do decálogo deuteronómico (vv. 6-11; vv. 12-15; vv. 16-21), o sábado ocupa a posição central; além disso, no contexto do decálogo menciona-se o evento libertador do Egito por duas vezes, a primeira no título que encabeça todo o decálogo (Dt 5,6) e no mandamento do sábado (Dt 5,15). Centrado assim na experiência libertadora do Êxodo, que é constitutiva para Israel, este mandamento funciona como um símbolo dos deveres para com o Senhor-YHWH, Deus libertador (Dt 5,6.15) e para com o próximo, que também fez a experiência da libertação (Dt 5,14.21).

    ATUALIZAÇÃO
    • Uma compreensão anárquica da realidade poderia relativizar os preceitos do Decálogo do Deuteronómio e, mais concretamente, de «guardar o dia de sábado para o santificar». Há que ter em conta que a Lei é sobretudo instrução paternal de Deus, uma oferta para o seu Povo, para regular as relações em sociedade. O texto da primeira leitura convida-nos a regressar aos fundamentos da celebração do Dia do Senhor, tomando a sério o valor do verbo «santificar».
    • Destacámos para o sábado e podemos fazê-lo para o domingo cristão as duas fundamentações teológicas expressas no livro do Êxodo e do Deuteronómio, respetivamente, fazendo memória do repouso do Senhor, depois da obra da criação, e da sua obra de libertação da escravidão do Egito. É importante voltar aos fundamentos da celebração do Dia do Senhor, vivendo-o como memorial da libertação do Pecado na Páscoa de Cristo que atualiza a obra libertadora de Deus da escravidão do Egito.
    • Notámos que a celebração do Dia do Senhor - sábado para os judeus e domingo para os cristãos - tem uma grande dimensão social, sendo dia de descanso para todos, garantindo esse direito sobretudo aos pobres que se veem assim protegidos pela Lei divina. Como ensina o Catecismo da Igreja Católica: «O agir de Deus é o modelo do agir humano. Se Deus "descansou" no sétimo dia, o homem deve também "descansar" e deixar que os outros, sobretudo os pobres, "tomem fôlego". O sábado faz cessar os trabalhos quotidianos e concede uma folga. É um dia de protesto contra as servidões do trabalho e o culto do dinheiro» (n. 2172).
    • O texto do Deuteronómio socorre-se de uma tradição antiga, que está na origem de Israel como Povo, para redefinir a própria identidade em tempo de crise, concretamente no tempo do exílio e pós-exílio. A celebração do Dia do Senhor pode ser um bom recurso para recuperar a identidade cristã. De facto, se no passado irmãos nossos deram a vida para defender o domingo («Não podemos passar sem o domingo», diziam diante do cônsul que os condenaria à morte, como quem diz, «sem nos reunirmos em assembleia ao domingo para celebrar a Eucaristia não podemos viver»). Como ensinou Bento XVI, a experiência dos mártires de Abitene pode ser paradigmática para nós cristãos do séc. XXI: «Precisamos do pão da vida para enfrentar as fadigas e o cansaço da viagem. O Domingo, Dia do Senhor, é a ocasião propícia para haurir a força d'Ele, que é o Senhor da vida. Por conseguinte, o preceito festivo não é um dever imposto pelo exterior, um peso sobre os nossos ombros. Ao contrário, participar na Celebração dominical, alimentar-se do Pão eucarístico e experimentar a comunhão dos irmãos e irmãs em Cristo é uma necessidade para o cristão, é uma alegria, e assim pode encontrar a energia necessária para o caminho que devemos percorrer todas as semanas. Um caminho, aliás, não arbitrário: a via que Deus nos indica na sua Palavra vai na direção inscrita na própria essência do homem, a Palavra de Deus e a razão caminham juntas. Seguir a Palavra de Deus e caminhar com Cristo significa para o homem realizar-se a si mesmo; perdê-la equivale a perder-se a si próprio.»

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 80 (81)
    Refrão 1: Exultai em Deus, que é o nosso auxílio.
    Refrão 2: Aclamai a Deus, nossa força.

    Aclamai a Deus, nossa força,
    aplaudi ao Deus de Jacob.
    Fazei ressoar a trombeta na lua nova
    e na lua cheia, dia da nossa festa.
    É uma obrigação para Israel,
    é um preceito do Deus de Jacob,
    lei que Ele impôs a José,
    quando saiu da terra do Egipto.
    Ouço uma língua desconhecida:
    «Aliviei os teus ombros do fardo
    e soltei as tuas mãos dos cestos;
    gritaste na angústia e Eu te libertei.
    Não terás contigo um deus alheio,
    nem adorarás divindades estranhas.
    Eu, o Senhor, sou o teu Deus,
    que te fiz sair da terra do Egipto».

    LEITURA II - 2Cor 4,6-11
    Leitura da Segunda Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios
    Irmãos:
    Deus, que disse: «Das trevas brilhará a luz»
    fez brilhar a luz em nossos corações,
    para que se conheça em todo o seu esplendor
    a glória de Deus, que se reflete no rosto de Cristo.
    Nós trazemos em vasos de barro o tesouro do nosso ministério,
    para que se reconheça que um poder tão sublime
    vem de Deus e não de nós.
    Em tudo somos oprimidos, mas não esmagados;
    andamos perplexos, mas não desesperados;
    perseguidos, mas não abandonados;
    abatidos, mas não aniquilados.
    Levamos sempre e em toda a parte no nosso corpo
    os sofrimentos da morte de Jesus,
    a fim de que se manifeste também no nosso corpo
    a vida de Jesus.
    Porque, estando ainda vivos,
    somos constantemente entregues à morte por causa de Jesus,
    para que se manifeste também na nossa carne mortal
    a vida de Jesus.

    AMBIENTE
    A relação de Paulo com as comunidades cristãs por ele fundadas ou pelo menos solidificadas é semelhante à de um pai que se ocupa da educação dos filhos: ao verificar comportamentos pouco condizentes com a fé cristã, Paulo intervém indicando o caminho a seguir. Esta atitude não será certamente estranha a quem conhece a Primeira Carta aos Coríntios, em que o apóstolo das gentes individua vários comportamentos reprováveis e mostra o caminho a seguir, oferecendo também, normalmente, um fundamento teológico. A Segunda Carta de São Paulo aos Coríntios insere-se nestas relações paternas de Paulo com aquela comunidade, que se fazem através de visitas presenciais e de correspondência epistolar. Uma vez que o seu ministério apostólico é posto em causa, muito provavelmente pelo grupo dos "Homens Espirituais" a que se refere a Primeira Carta aos Coríntios (cf. 2,6-16; 4,8-10) e nem sequer os seus cristãos vêm em sua defesa, Paulo faz a sua apologia, uma espécie de defesa do seu ministério apostólico, mostrando que nele se verificam os critérios que permitem identificar um verdadeiro apóstolo.
    É neste contexto que se insere este texto proposto pela liturgia, que se esforça por demonstrar que o ministério apostólico de Paulo é condizente com o mistério de Cristo e, sobretudo, não o ofusca com pretensões de protagonismo, uma vez que é o conteúdo da mensagem transmitida por Paulo que assume o verdadeiro papel de protagonista na sua missão apostólica.

    MENSAGEM
    No centro do nosso texto, temos uma descrição autobiográfica de situações limite (vv. 8-9) vividas pelo apóstolo Paulo e possivelmente pelos seus companheiros que, porém, não põem termo à sua vida, mas que demonstram bem como a vida humana do apóstolo é frágil, não imortal. Estes factos autobiográficos, conjugados com a imagem simbólica dos «vasos de barro» - a fragilidade e a limitação humana - que transportam o «tesouro do ministério» apostólico, ou seja, o Evangelho, enquanto conteúdo da mensagem que o apóstolo anuncia (v. 7). Há, portanto, uma desproporção de valor entre os «vasos de barro» e o «tesouro» que eles transportam e isso será visível no contraste que se estabelece entre as situações de fragilidade descritas nos vv. 8-9 e a mensagem que essas situações podem transmitir (v. 10), isto é, que a vida e a morte de Cristo estão presentes nas várias situações existenciais, mesmo nas tribulações do apóstolo. Este é um ponto assente na teologia e na vivência de fé de Paulo, como se pode verificar ao comparar 2Cor 4,8-10 com Gl 2,19-20 («Estou crucificado com Cristo. Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim»); e ainda na Carta aos Gálatas, o apóstolo quisera demonstrar que o Evangelho por ele pregado não tinha origem na vontade humana, mas é fruto da revelação divina (cf. Gl 1,11-12: «O Evangelho por mim anunciado, não o conheci à maneira humana; pois eu não o recebi nem aprendi de homem algum, mas por uma revelação de Jesus Cristo»).
    Não podemos esquecer que este texto se situa num ambiente apologético, de defesa do apóstolo diante de quem denigre o seu ministério. De facto, a grande mensagem do nosso texto está nas frases de abertura e de conclusão que servem de moldura a esta descrição autobiográfica de Paulo: ele não se anuncia a si mesmo (v. 5), mas anuncia «a glória de Deus, que se reflete no rosto de Cristo» (v. 6), e que Deus, autor da luz na criação do mundo, fez brilhar como luz no seu coração, talvez numa alusão, também autobiográfica, ao episódio da estrada de Damasco, do encontro com Cristo, quando «uma grande luz o envolveu» (At 9,4). O objetivo de Paulo é demonstrar que Cristo está vivo no seu ministério apostólico, mesmo a partir da fragilidade que se manifesta na forma como é perseguido e entregue à morte em nome de Cristo (v. 11).

    ATUALIZAÇÃO
    • São Paulo é um modelo de servidor do Evangelho para todos os que, na Igreja, se posicionam ao serviço humilde do Povo de Deus. Dele aprendemos que a grande característica do apostolado, mais que as ações pastorais inovadoras ou não, é a relação com Cristo, a ponto de trazer na própria vida as marcas dessa união, seja nas tribulações que se sofre por causa de Cristo e do Evangelho, seja porque se incarna na própria vida aquilo que se ensina.
    • Para se exercer um serviço na Igreja, mais concretamente ao serviço do anúncio e da evangelização, sem excluir nenhum dos outros serviços e ministérios, é necessário pôr de parte todo e qualquer desejo de ser protagonista, para dar protagonismo ao Evangelho, verdadeiro «tesouro» que transportamos «em vasos de barro», frágeis, da nossa fragilidade humana. Mesmo quando o Senhor fortalece a nossa fragilidade, é importante que seja claro para nós, como era para Paulo, que o verdadeiro tesouro é o Evangelho que não depende de nós, mas de Deus que no-lo deu a conhecer na pessoa de Jesus Cristo.
    • A vida do evangelizador deve conformar-se cada vez mais à vida de Cristo a ponto de se tornar um espelho de Cristo, um livro aberto do Evangelho, onde se pode ler os sinais da vida oferecida de Jesus. Só uma grande intimidade com Jesus Cristo, como a que teve Paulo, poderá dar-nos a possibilidade de sermos pessoas identificadas com o Evangelho que anunciamos.

    ALELUIA - cf. Jo 17,17b.a
    Aleluia. Aleluia.
    A vossa palavra, Senhor, é a verdade;
    santificai-nos na verdade.

    EVANGELHO - Mc 2,23–3,6
    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
    Passava Jesus através das searas, num dia de sábado,
    e os discípulos, enquanto caminhavam,
    começaram a apanhar espigas.
    Disseram-Lhe então os fariseus:
    «Vê como eles fazem ao sábado o que não é permitido».
    Respondeu-lhes Jesus:
    «Nunca lestes o que fez David,
    quando ele e os seus companheiros
    tiveram necessidade e sentiram fome?
    Entrou na casa de Deus,
    no tempo do sumo sacerdote Abiatar,
    e comeu dos pães da proposição,
    que só os sacerdotes podiam comer,
    e os deu também aos companheiros».
    E acrescentou:
    «O sábado foi feito para o homem
    e não o homem para o sábado.
    Por isso, o Filho do homem é também Senhor do sábado».
    Jesus entrou de novo na sinagoga,
    onde estava um homem com uma das mãos atrofiada.
    Os fariseus observavam Jesus,
    para verem se Ele ia curá-lo ao sábado
    e poderem assim acusá-l'O.
    Jesus disse ao homem que tinha a mão atrofiada:
    «Levanta-te e vem aqui para o meio».
    Depois perguntou-lhes:
    «Será permitido ao sábado fazer bem ou fazer mal,
    salvar a vida ou tirá-la?».
    Mas eles ficaram calados.
    Então, olhando-os com indignação
    e entristecido com a dureza dos seus corações,
    disse ao homem:
    «Estende a mão».
    Ele estendeu-a e a mão ficou curada.
    Os fariseus, porém, logo que saíram dali,
    reuniram-se com os herodianos
    para deliberarem como haviam de acabar com Ele.

    AMBIENTE
    O texto evangélico deste domingo conclui a primeira secção do Evangelho de Marcos, que descreve a fase inicial do ministério de Jesus (cf. 1,14-3,6), e é a última das controvérsias de Jesus com os seus opositores acerca de algumas práticas rituais judaicas, no caso sobre o sábado judaico. É de notar que estes dois textos que formam Mc 1,23 - 3,6 são os únicos dois textos de Marcos em que Jesus se contrapõe ao sábado; no resto do Evangelho, tanto Jesus como quem está com Ele observam as práticas judaicas a respeito do mandamento de guardar o sábado. Recapitulando, Jesus tinha-se já confrontado com os escribas a respeito do perdão dos pecados ao paralítico (cf. 2,1-13), do estar à mesa com os publicamos e pecadores (cf. 2,14-17); depois, com os discípulos de João Batista e os fariseus sobre as práticas do jejum, não observado pelos discípulos de Jesus (cf. 2,18-22); confronta-se agora com os fariseus sobre o respeito pelo dia de sábado em dois episódios (2,23-28; 3,1-6), sendo que, neste último episódio, pela primeira vez os seus opositores se reuniam com os herodianos para encontrar maneira de condenar Jesus à morte (3,6), funcionando esta decisão como conclusão de todos os confrontos.
    Será bom ter em conta o objetivo desta primeira secção do Evangelho de Marcos; o evangelista pretende mostrar a novidade trazida pelo movimento de Jesus, bem diferente do ambiente judaico e rabínico, mostrando o amor de Deus pelos que estavam marginalizados (os publicamos e pecadores), uma mensagem que toma corpo no perdão dos pecados (na cura do paralítico) e a total rejeição de leituras rigoristas da Lei de Moisés, demonstrando que o formalismo pode aniquilar a experiência de fé, que deve estar sempre orientada para o bem do outro. Como se verá o critério que Jesus deixa para interpretar o sábado judaico, mas também outros preceitos é o amor ao outro.

    MENSAGEM
    O nosso texto é composto por dois episódios que colocam Jesus em confronto com a instituição do sábado judaico: os discípulos a colher espigas para comer e um homem com uma mão atrofiada que nos coloca, com Jesus e os seus interlocutores, diante do dilema de curar ou não esse homem; ambos os episódios em dia de sábado. No que ao primeiro episódio diz respeito, o problema de colher espigas talvez seja o problema de se entender como colheita.
    De qualquer forma, Marcos convida-nos a centrar-nos nas palavras de Jesus que ajudam a interpretar a sua liberdade diante da instituição do sábado judaico: «O sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado. Por isso, o Filho do homem é também Senhor do sábado» (Mc 2,27-28); «Será permitido ao sábado fazer bem ou fazer mal, salvar a vida ou tirá-la?» (Mc 3,4). Estas palavras de Jesus dão a interpretação dos episódios, bem como da forma como Jesus se posiciona diante da instituição de sábado em geral.
    Já na controvérsia de Mc 2,1-12 sobre o perdão dos pecados, a questão era do «poder» ou «autoridade» para o fazer. Da mesma forma, agora apenas nas palavras de Jesus, a relação de Jesus com o sábado exprime-se em chave de poder e autoridade, uma vez que Ele, «o Filho do homem, é também Senhor do sábado» (Mc 2,28).
    A segunda linha de argumentação é a da total precedência das necessidades humanas, mesmo em relação ao sagrado: isto vale para a fome dos discípulos diante do sábado que é sagrado, como valeu para a fome de David e dos seus homens diante dos pães sagrados da proposição (pelo menos na forma como Mc 2,25-26 nos conta o episódio com algumas nuances em relação a 1Sm 21,1-7) e valerá também para a cura do homem com a mão atrofiada diante da instituição de sábado. Diante do poder de Jesus e das necessidades humanas, as coisas sagradas não têm um valor próprio (nem o pão do santuário, no caso de David, nem o sábado, no caso dos discípulos de Jesus ou do homem com a mão atrofiada), mas existem para o bem da humanidade (os pães da proposição para alimentar David e os seus homens, o sábado para o homem e para Jesus); na interpretação de Jesus, é fundamental que o que é sagrado esteja ao serviço do homem. A par deste critério, se partirmos da formulação da pergunta retórica de Mc 3,4, na perspetiva de Jesus não há um agir neutro e ainda menos decisivas são as instituições: a lei é a da atenção ao outro, a quem sou chamado a fazer bem, salvando-lhe a vida, ou então posiciono-me diante dele para lhe fazer mal, causando-lhe a morte. Em ambos os momentos, Jesus escolheu fazer o bem e colocar-se ao serviço das necessidades humanas, satisfazendo-as, mesmo se isso lhe acarreta a decisão do conluio das autoridades políticas e religiosas contra Ele, para o condenarem à morte.
    É importante ter em conta que Jesus não retira qualquer importância ao sábado, enquanto dia consagrado a Deus, mas redireciona-o de modo a voltar à intuição inicial da Lei de Moisés, uma vez que «o sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado» (2,27). Não está em causa uma interpretação libertina ou relativista do sábado, mas fazer dele o dia da relação com Deus que vem em auxílio de quem está em necessidade. Uma boa interpretação lê todos estes aforismos de Jesus em relação entre eles, de modo que o sábado esteja sempre ao serviço do homem, para fazer bem e salvar a vida; se, de facto, Jesus é o senhor do sábado, é para o recolocar ao serviço do homem e da salvação da vida.

    ATUALIZAÇÃO
    • Jesus ensina-nos a posicionar-nos com verdadeira liberdade diante da Lei de Moisés, ou melhor, diante da Lei de Deus, que nos chegou por Moisés, sem perder nunca de vista o seu objetivo de regular a nossa vida em sociedade e em Igreja, protegendo os mais frágeis e evitando toda e qualquer opressão por parte de quem exerce o poder. Interpretações rigoristas da Lei - como são as dos fariseus no nosso texto - cegam e não deixam ver as necessidades humanas que, na perspetiva de Jesus, são o verdadeiro critério para manter uma atitude livre diante da Lei.
    • O nosso texto não coloca em causa a celebração do culto no dia de sábado, mas reposiciona-a de modo a que possa coabitar com o serviço dos necessitados, na pessoa dos discípulos com fome e de uma pessoa com uma mão atrofiada. A celebração do Dia do Senhor, ao domingo, pode ser cada vez mais expressão desta dupla faceta do sábado reinterpretado com Jesus que, em dia de sábado entra na sinagoga, lugar onde se realiza o culto, mas não pactua com a necessidade de quem sofre, indo em seu auxílio, dando conforto e, no caso, mesmo a cura. Se o cristão prolonga na existência a vida de Cristo, é importante que no dia maior, a Ele consagrado, não se perca de vista aqueles que foram os seus prediletos.
    • A regra hermenêutica que Jesus dá para saber o que se pode fazer ou não ao domingo pode ser transposta para outros campos da nossa vida: é importante saber que queremos estar ao serviço do bem e da salvação da vida humana, em linha com o desejo de Deus, tal como se manifesta na vida e mensagem de Jesus; a par disso, sabemos que as instituições, sejam elas religiosas ou civis, devem estar ao serviço da vida humana, para que possam realizar a missão para a qual nasceram.

    A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 10º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho, P. Ricardo Freire
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • SS. Carlos Lwanga e Companheiros, Mártires

    SS. Carlos Lwanga e Companheiros, Mártires


    3 de Junho, 2024

    Carlos Luanga e os seus vinte e um companheiros, ugandeses, foram martirizados entre 1885 e 1886, por ordem do rei Mwanga. Tendo abraçado a fé, graças à pregação dos Padres Brancos, opuseram-se ao rei, esclavagista e pederasta. Uns foram decapitados e outros queimados vivos. Foram canonizados por Paulo VI, em 1964.

    Lectio

    Primeira leitura: 2 Macabeus 7, 1-2.9-14

    Naqueles dias, foram presos sete irmãos com a mãe, aos quais o rei, por meio de golpes de azorrague e de nervos de boi, quis obrigar a comer carnes de porco, proibidas pela lei. 2Um deles, tomou a palavra e falou assim: «Que pretendes perguntar e saber de nós? Estamos prontos a antes morrer do que violar as leis dos nossos pais.» 3O rei, irritado, ordenou que aquecessem ao fogo sertãs e caldeirões. 4Logo que ficaram em brasa, ordenou que cortassem a língua ao que primeiro falara, lhe arrancassem a pele da cabeça e lhe cortassem também as extremidades das mãos e dos pés, na presença dos irmãos e da mãe. 5Mutilado de todos os seus membros, o rei mandou aproximá-lo do fogo e, vivo ainda, assá-lo na sertã. Enquanto o cheiro da panela se espalhava ao longe, os outros, com a mãe, animavam-se a morrer corajosamente, dizendo: 6«Deus, o Senhor, nos vê e, na verdade, Ele terá compaixão de nós, como diz claramente Moisés no seu cântico de admoestação: Ele terá piedade dos seus servidores.» 7Morto, deste modo, o primeiro, conduziram o segundo ao suplício. Arrancaram-lhe a pele da cabeça com os cabelos e perguntaram-lhe: «Comes carne de porco, ou preferes que o teu corpo seja torturado, membro por membro?» 9Prestes a dar o último suspiro, disse: «Ó malvado, tu arrebatas-nos a vida presente, mas o rei do universo há-de ressuscitar-nos para a vida eterna, se morrermos fiéis às suas leis.» 10Depois deste, torturaram o terceiro, o qual, mal lhe pediram a língua, deitou-a logo de fora e estendeu as mãos corajosamente. 11E disse, cheio de confiança: «Do Céu recebi estes membros, mas agora menosprezo-os por amor das leis de Deus, mas espero recebê-los dele, de novo, um dia.» 12O próprio rei e os que o rodeavam ficaram admirados com o heroísmo deste jovem, que nenhum caso fazia dos sofrimentos.13Morto também este, aplicaram os mesmos suplícios ao quarto, 14o qual, prestes a expirar, disse: «É uma felicidade perecer à mão dos homens, com a esperança de que Deus nos ressuscitará; mas a tua ressurreição não será para a vida.»

    Perante a perseguição de Antíoco IV, que pretendia impor a cultura e a religião gregas em todo o reino, também em Jerusalém, o autor do 2 Macabeus apresenta o testemunho heroico dos seus irmãos perseguidos. Os Macabeus lutam para evitar a normalização política e religiosa, que vai contra a identidade e a liberdade do povo de Deus. Hoje escutamos a impressionante narrativa do martírio dos sete irmãos e da sua mãe. Os Mártires de Uganda, em nome da fé cristã, e dos seus princípios morais, resistiram ao tirano Mwanga, pagando o seu atrevimento com a própria vida.

    Evangelho: Mateus 5, 1-12ª

    Naquele tempo, ao ver a multidão, Jesus subiu a um monte. Depois de se ter sentado, os discípulos aproximaram-se dele. 2Então tomou a palavra e começou a ensiná-los, dizendo:3«Felizes os pobres em espírito, porque deles é o Reino do Céu. 4Felizes os que choram, porque serão consolados. 5Felizes os mansos, porque possuirão a terra.  6Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados. 7Felizes os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. 8Felizes os puros de coração, porque verão a Deus. 9Felizes os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus.  10Felizes os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o Reino do Céu. 11Felizes sereis, quando vos insultarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o género de calúnias contra vós, por minha causa.12Exultai e alegrai-vos, porque grande será a vossa recompensa no Céu.

    Mateus apresenta a Jesus como o novo Moisés, que promulga a nova lei. O reino de Deus está presente e atuante no mundo. A situação do homem, tornado filho de Deus, é nova. Há que viver de acordo com ela, há que construir uma sociedade nova. Há que viver "segundo o espírito" e não "segundo a carne" (cf. Gl 5, 10ss.). O novo estilo de vida, pessoal e coletivo, - ser construtores de paz, misericordiosos, amigos da justiça, puros de coração, pobres em espírito, vai contra os princípios e hábitos do mundo. Por isso, há que contar com o sofrimento e a perseguição, tal como aconteceu com Cristo. Mas Cristo diz-lhes: "Exultai e alegrai-vos, porque grande será a vossa recompensa no Céu. (v. 12).

    Meditatio

    Ao canonizar os mártires, que hoje celebramos, Paulo VI pronunciou estas palavras: "Estes Mártires Africanos acrescentam ao álbum dos vencedores, chamado Martirológio, uma página ao mesmo trágica e grandiosa, verdadeiramente digna de figurar ao lado das célebres narrações da África antiga, as quais, neste tempo em que vivemos, julgávamos, por causa da nossa pouca fé, que nunca mais viriam a ter semelhante continuação... Estes Mártires Africanos dão, sem dúvida, início a uma nova era... Com efeito, a África, orvalhada com o sangue destes mártires, que são os primeiros desta nova era, (e queira Deus que sejam os últimos - tão grande e precioso é o seu holocausto), a África renasce livre e resgatada".
    Nos Mártires de Uganda realizou-se a palavra de Jesus: "Se o grão de trigo, lançado à terra, não morrer, fica ele só; mas, se morrer, dá muito fruto." (Jo 12, 24). As novas comunidades cristã, no coração da África, nascem marcadas pelo seu martírio. O seu sangue é semente de novas comunidades, que floresceram e continuarão a florescer em África, comunidades jovens, dinâmicas e evangelizadoras.
    Os Mártires de Uganda são para nós um ícone vivo. São um desafio a construir, com clareza de identidade, a sociedade contemporânea e, como escreveu João Paulo II, a "não deixar faltar a este mundo o clarão da divina beleza que ilumine o caminho da existência humana".
    Como batizados, participamos no sacerdócio de Cristo, mas, com Ele e como Ele, somos também "vítimas" do seu e nosso sacerdócio: "Saiamos, então, ao seu encontro fora do acampamento, suportando a sua humilhação... ofereçamos continuamente a Deus um sacrifício de louvor, isto é, o fruto dos lábios que confessam o seu nome." (Heb 13, 13.15). Os Mártires participam na oblação que Jesus Cristo faz de Si mesmo, para glória e alegria de Deus, e para redenção da humanidade. Com efeito, comenta Cipriani, "O sacrifício de Cristo não pode permanecer isolado, não partilhável; o Seu martírio é um apelo ao nosso martírio". S. Paulo, ao escrever aos Romanos, diz-lhes: "Exorto-vos, irmãos, pela misericórdia de Deus, a que ofereçais os vossos corpos (isto é, vós mesmos) como sacrifício, vivo, santo e agradável a Deus; é este o vosso culto espiritual" (Rom 12, 1).

    Oratio

    Senhor nosso Deus, que fazeis do sangue dos mártires semente de cristãos, concedei que a seara da vossa Igreja, regada com o sangue de São Carlos Lwanga e seus companheiros, produza sempre abundante colheita para o vosso reino. Ámen. (Coleta da Missa).

    Contemplatio

    As ladainhas cantam a glória do nome de Jesus, o seu valor, a sua fecundidade... É um nome glorioso pelas suas origens celestes: Jesus, filho do Deus vivo; Jesus, esplendor do Pai; Jesus pureza da luz eterna; Jesus, rei de glória; Jesus, sol de justiça, tende piedade de nós. É um nome glorioso sobre a terra, pela sua beleza sobrenatural e pela sua grande missão: Jesus, filho da Virgem Maria; Jesus amável; Jesus admirável; Jesus, Deus forte; Jesus, Pai do século que há-de vir; Jesus, anjo do grande conselho; Jesus muito poderoso tende piedade de nós. É um nome glorioso pelas suas virtudes: Jesus, muito paciente; Jesus muito obediente; Jesus manso e humilde de coração; Jesus que amais a castidade; Jesus, que nos amastes; Jesus, Deus de paz; Jesus, autor da vida; Jesus, modelo de toda a virtude; Jesus zelador das almas, tende piedade de nós. É um nome glorioso pelos seus títulos mais amáveis: Jesus, nosso Deus; Jesus, nosso refúgio; Jesus, pai dos pobres; Jesus, tesouro dos fiéis; Jesus, bom Pastor; Jesus, verdadeira luz; Jesus, sabedoria eterna; Jesus, bondade infinita; Jesus, nosso caminho e nossa vida; tende piedade de nós. É um nome glorioso pela sua preeminência sobre todas as glórias: Jesus, alegria dos anjos; Jesus, rei dos patriarcas; Jesus, senhor dos apóstolos; Jesus, doutor dos evangelistas; Jesus, mártir e força dos mártires; Jesus, confessor e luz dos confessores; Jesus, virgem e pureza das virgens; Jesus, santo e coroa de todos os santos, tende piedade de nós. Verdadeiramente este nome está acima de todos os nomes. (Leão Dehon, OSP 3, p.59s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Felizes sereis quando vos perseguirem por minha causa." (cf. Mt 5, 12).
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    SS. Carlos Lwanga e Companheiros, Mártires (03 Junho)

  • 10º Domingo do Tempo Comum - Ano B

    10º Domingo do Tempo Comum - Ano B


    9 de Junho, 2024

    Ano B - 10.º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    Tema do 10.º Domingo do Tempo Comum

    O tema deste 10.º Domingo do Tempo Comum gravita à volta da identidade de Jesus e da comunhão que Ele deseja estabelecer com aqueles que se colocam na disposição de o seguir: fica claro que Jesus não tem qualquer aliança com o Demónio e com o poder do mal e que se quer definir pela sua relação de obediência com Deus Pai, à qual convida todos aqueles que se querem sentir parte da sua família.
    No Evangelho, Jesus demonstra que, na sua atividade de libertação do poder do mal, não pode estar a pactuar com o Demónio, mas vem para libertar os homens e as mulheres de todos os tempos. Também nisso está a fazer a vontade de Deus e convida todos a fazer comunidade centrada na sua pessoa e decidida a construir um mundo que se baseie neste desejo de fazer a vontade de Deus.
    A primeira leitura traz-nos o diálogo de Deus com as figuras poéticas do primeiro homem e da primeira mulher, depois da queda. Este texto procura chamar-nos ao sentido da existência, deixando claro que todos somos chamados a não pactuar com o mal e a estar de sobreaviso diante das tentações do Maligno.
    Na segunda leitura, São Paulo mostra como as tribulações que sofre não abrandam o seu ardor missionário, que se caracteriza pela grande confiança em Deus e na vida eterna que há de conceder; duas grandes atitudes qualificam o ministério de Paulo: a esperança de estar unido com Jesus na ressurreição tal como o está na tribulação terrena e o desejo íntimo de estar em comunhão com os cristãos a quem anuncia o Evangelho de Jesus Cristo.

    LEITURA I - Gn 3,9-15

    Leitura do Livro do Génesis

    Depois de Adão ter comido da árvore,
    o Senhor Deus chamou-o e disse-lhe:
    «Onde estás?»
    Ele respondeu:
    «Ouvi o rumor dos vossos passos no jardim
    e, como estava nu, tive medo e escondi-me».
    Disse Deus:
    «Quem te deu a conhecer que estavas nu?
    Terias tu comido dessa árvore, da qual te proibira comer?»
    Adão respondeu:
    «A mulher que me destes por companheira
    deu-me do fruto da árvore e eu comi».
    O Senhor Deus perguntou à mulher:
    «Que fizeste?»
    E a mulher respondeu:
    «A serpente enganou-me e eu comi».
    Disse então o Senhor Deus à serpente:
    «Por teres feito semelhante coisa,
    maldita sejas entre todos os animais domésticos
    e todos os animais selvagens.
    Hás de rastejar e comer do pó da terra
    todos os dias da tua vida.
    Estabelecerei inimizade entre ti e a mulher,
    entre a tua descendência e a descendência dela.
    Ela há de atingir-te na cabeça
    e tu a atingirás no calcanhar».

    AMBIENTE

    Como indica a palavra Génesis (quer dizer «origem»), que intitula o primeiro livro da Sagrada Escritura, este é o livro das origens, não apenas porque narra as origens da criação e do mundo (cf. Gn 1,1: «No princípio, Deus criou...»), mas porque vem de encontro às perguntas existenciais de todos os homens e mulheres: «Quem sou eu? Donde venho? Para onde vou?». Assim, mesmo na divisão clássica em duas partes, o primeiro livro da Bíblia responde à pergunta sobre as origens: primeiro, as origens da criação e do ser humano (cf. Gn 1,1–11,26); depois, as origens de Israel, com os chamados ciclos dos patriarcas (cf. Gn 11,27–50,26).
    Sobretudo no que diz respeito à primeira parte, não se deve procurar uma história factual (cada vez mais, as traduções da Bíblia traduzem «'adam» como «homem», em vez de «Adão», mostrando como, naquele primeiro homem, está presente o drama de cada ser humano); deve ler-se aí uma história poético-simbólica, em que a poesia e o símbolo abraçam a realidade, mas ultrapassam-na. O autor sagrado condensa, com certeza, várias tradições que foram sendo transmitidas oralmente e que respondem à pergunta sobre as origens da criação, do ser humano na sua diferenciação e complementaridade homem-mulher, do mal, das várias línguas, etc.
    Esta primeira leitura faz parte do segundo relato da criação (cf. Gn 2,4b–3,24), o único a narrar a transgressão, não como um facto histórico, mas como um modo de perceber as origens do mal - que, como veremos, não se encontra em Deus nem no ser humano, mas é externa - e da luta intrínseca dos homens e mulheres contra o autor do mal. Leva-nos até ao relato do encontro de Deus com o homem e a mulher, depois de estes terem comido do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal (cf. Gn 3,1-7), transgredindo a ordem que lhes tinha sido expressamente dada de não comer de duas árvores, da árvore do conhecimento do bem e do mal e da árvore da vida (cf. Gn 2,16-17).

    MENSAGEM

    Para compreender a mensagem do nosso texto, é necessário ter presente o seu contexto, que descrevemos no ambiente. O facto de o homem e a mulher terem comido do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, contrariando uma ordem do Senhor Deus em Gn 2,16-17, quebra a harmonia existente entre o ser humano e Deus, e mesmo com a criação. Mesmo assim, isto não quebra a relação de Deus com o homem e a mulher, uma vez que todo o texto se desenrola num diálogo, feito de perguntas de Deus e de respostas do homem e da mulher.
    A primeira pergunta do Senhor Deus é fundamental: «Onde estás?» (v. 9). Esta questão não se limita a indagar sobre o lugar onde se situa o homem; assume, por isso, uma dimensão claramente existencial. Através da desobediência, homem e mulher tinham perdido a sua colocação espacial original, perdendo-se na inconsistência de pretender ser como Deus (cf. Gn 2,5.22). Ao interrogá-los, o Senhor Deus conhece bem a dimensão da transgressão como o denota a terceira pergunta (v. 11: «Terias tu comido dessa árvore, da qual te proibira comer?»). As perguntas do Senhor Deus servem muito mais ao homem e à mulher que são interrogados, para se encontrarem consigo mesmos depois de se terem perdido e para refazerem o caminho que os levou a transgredir a ordem estabelecida pelo Senhor Deus. As respostas do homem e da mulher (vv. 12-13) refletem a tendência humana de se desculpabilizar, desresponsabilizar e autojustificar, de encontrar a culpa fora de si; por outro lado, e numa leitura teológica, pode ser a forma encontrada pelo autor sagrado para mostrar que o mal não tem origem em Deus, que criou tudo bem e bom, nem no ser humano, ou seja, que o mal tem origem fora do ser humano; o homem e a mulher fizeram mal, mas foram a isso levados pela serpente que é, de facto, a única a receber a condenação mais dura (vv. 14-15), se tivermos em conta que Gn 2,16-19 é uma explicação da situação atual e real da mulher e do homem.
    Ficamo-nos, por último, na sentença divina em relação à serpente. É verdade que esta sentença dura contra a serpente pode espelhar a situação atual deste animal, considerado maldito: os humanos em luta contra as serpentes; a declaração de impureza da serpente, o que a faz ser rejeitada nas prescrições alimentares de Israel (cf. Lv 11,41-44; 20,25). No entanto, já no judaísmo tardio, a serpente começa a ser lida como um símbolo do diabo, que será derrotado pelo Rei-Messias (esta interpretação ganhará força no Novo Testamento, concretamente na releitura de Rm 16,20 ou de Ap 12,9; 20,2). Numa releitura cristã, portanto, esta sentença divina em relação à serpente apresenta-se como profecia da luta de Jesus Cristo, descendente da mulher, contra o mal e contra o seu autor, descendente da antiga serpente simbólica deste relato.

    ATUALIZAÇÃO

    • O estilo do texto da primeira leitura, de diálogo entre Deus e os personagens deste relato, ajuda a colocar-se na narrativa, escutando as perguntas de Deus ao homem: «Onde estás?» (v. 9), «Terias tu comido dessa árvore, da qual te proibira comer?» (v. 11), e à mulher: «Que fizeste?» (v. 13). Uma vez que todas estas questões têm um sentido existencial, poderá ser bom voltar às origens, poder localizar-nos no espaço de Deus, responder pelas nossas ações e verificar se as nossas respostas diferem das dos personagens deste relato.

    • Diz-se que é comum a tendência para desculpabilizar, desresponsabilizar e autojustificar-se; também neste relato se vê um contínuo passar da culpa para os outros personagens. Retomando as questões anteriores, poderá ser hora de assumir as nossas responsabilidades diante de Deus, sabendo que, como dirá o Salmo 129 (130), «no Senhor está a misericórdia e a abundante redenção». A autojustificação não é caminho; o caminho passa pela justificação trazida por Cristo na sua morte de cruz, para nos reconciliar com o Pai.

    • A origem última de toda a complicação remonta ao facto de se ter dado ouvidos à serpente: «A serpente enganou-me e eu comi» (v. 13). Se vemos na serpente uma imagem do diabo e do poder do mal, é importante estar de sobreaviso diante da tentação do maligno. Como várias vezes tem ensinado o Papa Francisco: «Não se dialoga com o demónio». Ainda o Papa Francisco: «A vida cristã é uma luta permanente. Requer-se força e coragem para resistir às tentações do demónio e anunciar o Evangelho. [...] Não pensemos que é um mito, uma representação, um símbolo, uma figura ou uma ideia. Este engano leva-nos a diminuir a vigilância, a descuidar-nos e a ficar mais expostos. O demónio não precisa de nos possuir. Envenena-nos com o ódio, a tristeza, a inveja, os vícios. E assim, enquanto abrandamos a vigilância, ele aproveita para destruir a nossa vida, as nossas famílias e as nossas comunidades, porque, "como um leão a rugir, anda a rondar-vos, procurando a quem devorar" (1Pd 5,8)» (Gaudete et Exsultate 158.161).

    SALMO RESPONSORIAL - Sl 129 (130)

    Refrão: No Senhor está a misericórdia e abundante redenção.

    Ou: No Senhor está a misericórdia,
    no Senhor está a plenitude da redenção.

    Do profundo abismo chamo por Vós, Senhor,
    Senhor, escutai a minha voz.
    Estejam os vossos ouvidos atentos
    à voz da minha súplica.

    Se tiverdes em conta os nossos pecados,
    Senhor, quem poderá salvar-se?
    Mas em Vós está o perdão
    para Vos servirmos com reverência.

    Eu confio no Senhor,
    a minha alma confia na sua palavra.
    A minha alma espera pelo Senhor
    mais do que as sentinelas pela aurora.

    Porque no Senhor está a misericórdia
    e com Ele abundante redenção.
    Ele há de libertar Israel
    de todas as suas faltas.

    LEITURA II - 2Cor 4,13–5,1

    Leitura da Segunda Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios

    Irmãos:
    Diz a Escritura: «Acreditei, por isso falei».
    Com este mesmo espírito de fé,
    também nós acreditamos, e por isso falamos,
    sabendo que Aquele que ressuscitou o Senhor Jesus
    também nos há de ressuscitar com Jesus
    e nos levará convosco para junto d'Ele.
    Tudo isto é por vossa causa,
    para que uma graça mais abundante
    multiplique as ações de graças de um maior número de cristãos
    para glória de Deus.
    Por isso, não desanimamos.
    Ainda que em nós o homem exterior se vá arruinando,
    o homem interior vai-se renovando de dia para dia.
    Porque a ligeira aflição dum momento
    prepara-nos, para além de toda e qualquer medida,
    um peso eterno de glória.
    Não olhamos para as coisas visíveis,
    olhamos para as invisíveis:
    as coisas visíveis são passageiras,
    ao passo que as invisíveis são eternas.
    Bem sabemos que,
    se esta tenda, que é a nossa morada terrestre, for desfeita,
    recebemos nos Céus uma habitação eterna,
    que é obra de Deus
    e não é feita pela mão dos homens.

    AMBIENTE

    A Segunda Carta aos Coríntios é, em grande parte, uma apologia do Apóstolo Paulo em favor do seu ministério apostólico, diante de quem não o reconhece. Numa primeira apologia, em 2Cor 2,14–4,6, Paulo tinha-se baseado muito na autoridade do Antigo Testamento, para provar a verdade da sua atividade apostólica, tão gloriosa a ponto de ofuscar o ministério de Moisés. O nosso texto situa-se na segunda apologia de Paulo (2Cor 4,7–5,10), desta feita baseada não tanto sobre os textos sagrados do Antigo Testamento, mas sobre uma antropologia em perspetiva escatológica, que será bem visível no nosso texto. Esta segunda apologia responde a algumas questões que os seus adversários poderiam colocar-se; uma delas é perceber como é que o ministério apostólico, por ele defendido na primeira apologia, pode ser tão provado e atribulado (cf. 2Cor 4,8-9.17). A resposta apologética de Paulo pautar-se-á por uma estratégia muito particular de ler toda a situação presente, claramente marcada pelas tribulações, à luz do futuro, do mundo que há de vir, das coisas últimas (escatologia). Nesta releitura, Paulo acentuará a comunhão: a comunhão que o une a Jesus Ressuscitado e a comunhão com os crentes, incluídos muito provavelmente também os destinatários desta Carta.

    MENSAGEM

    Este trecho da Segunda Carta aos Coríntios, sendo parte da apologia de Paulo, mostra a disposição com que Paulo encara o seu ministério que fica marcado, basicamente, por duas grandes atitudes: a fé-confiança que lhe dá força apesar das tribulações; a comunhão a dois níveis, ou seja, com Cristo e com os destinatários da sua pregação apostólica, entre os quais os destinatários desta carta.
    A referência de Paulo à atitude de fé (v. 13: «o mesmo espírito de fé») baseia-se na citação da tradução grega do Sl 115: «Acreditei, por isso falei». Isto permite que Paulo faça depender o conteúdo da sua pregação não das suas ideias, mas do conteúdo da fé na ressurreição de Jesus Cristo; além disso, trata-se da fé como atitude de confiança de quem sabe que não está só, mas está unido à morte de Cristo e de quem espera a Ele estar unido também na ressurreição (cf. v. 14). Esta apologia é de conteúdo mais antropológico e, por isso, Paulo dá nota de como se deixa mover pela fé, ao estabelecer um contraste muito nítido entre a realidade presente, que para ele é aparente, e a realidade definitiva que é a vida do mundo que há de vir: a progressiva ruína do «homem exterior» em contraste com a progressiva renovação do «homem interior» (4,16); «a ligeira aflição dum momento» em contraste com «um peso eterno de glória» que se está a preparar (4,17); «as coisas visíveis» e «passageiras» em contraste com «as invisíveis» que são «eternas» (4,18); «esta tenda, que é a nossa morada terrestre», passível de ser destruída, a contrastar com «uma habitação eterna, que é obra de Deus» (5,1). É tudo isto a motivar a ação apostólica de Paulo, acentuando claramente que a tribulação do momento presente não é a palavra definitiva. Nas cartas de Paulo encontramos várias vezes este desprezo em relação à realidade presente e a total confiança e esperança na eternidade em comunhão com Deus (cf. Rm 8,31-39; Fl 3,7-14).
    A segunda atitude que enunciámos é de comunhão, a dois níveis: do espírito de união com Cristo e da comunhão com os cristãos a quem dirige a sua pregação. Antes, Paulo já tinha deixado claro que as suas tribulações no desempenho do ministério apostólico eram sinal de estar visivelmente unido à morte de Jesus (cf. 2Cor 4,8-12); manifesta agora a esperança de se unir a ele também na glória da ressurreição (v. 14: «sabendo que Aquele que ressuscitou o Senhor Jesus também nos há de ressuscitar com Jesus e nos levará convosco para junto d'Ele»). A união existencial a Jesus é, portanto, essencial na vida do apóstolo. No entanto, essa comunhão visível com Jesus abre-se à comunhão com os que creem em Cristo: de facto, Paulo espera estar unido a Jesus com os destinatários da carta (v. 14: «convosco»); se Paulo sofre tribulações, fá-lo em favor dos cristãos, para suscitar «as ações de graças de um maior número de cristãos para glória de Deus» (v. 15).

    ATUALIZAÇÃO

    • A atitude de Paulo diante das tribulações serve de modelo para os cristãos de todos os tempos, como atitude a conservar diante das provas e tribulações, quer derivem do exercício dos diversos ministérios na comunidade eclesial, quer se refiram a tantas outras situações que derivam do próprio "ser cristãos" no mundo contemporâneo. É antes de mais uma atitude de fé e de confiança que tem a eternidade como fim bem visível. A ressurreição de Cristo abriu caminho, para mostrar que a vida humana não se confina à vida terrena, mas é chamada à vida de comunhão com Jesus ressuscitado, sentado à direita do Pai. A fé na vida eterna deve continuar a iluminar o momento presente dos cristãos.

    • A comunhão eclesial é certamente uma das marcas distintivas do que significa ser cristãos. Jesus chama a essa comunhão o mandamento novo do amor e reza para que a comunhão eclesial se mantenha e seja imagem da sua comunhão com o Pai. Paulo dá mostras de a viver, porque espera continuar unido aos cristãos, a quem se dirige, também na vida eterna. Além disso, todo o seu ministério apostólico se destina a gerar novos cristãos. Paulo é exemplo do desempenho do ministério como serviço à Igreja, não para a sua glória pessoal, não para se servir, mas verdadeiramente para servir.

    ALELUIA - Jo 12,31b-32

    Aleluia. Aleluia.

    Chegou a hora em que vai ser expulso
    o príncipe deste mundo, diz o Senhor;
    e quando Eu for levantado da terra,
    atrairei todos a Mim.

    EVANGELHO - Mc 3,20-35

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos

    Naquele tempo,
    Jesus chegou a casa com os seus discípulos.
    E de novo acorreu tanta gente,
    de modo que nem sequer podiam comer.
    Ao saberem disto, os parentes de Jesus
    puseram-se a caminho para O deter,
    pois diziam: «está fora de Si».
    Os escribas que tinham descido de Jerusalém diziam:
    «Está possesso de Belzebu,
    e ainda:
    «É pelo chefe dos demónios que Ele expulsa os demónios».
    Mas Jesus chamou-os e começou a falar-lhes em parábolas:
    «Como pode Satanás expulsar Satanás?»
    Se um reino estiver dividido contra si mesmo,
    tal reino não pode aguentar-se.
    E se uma casa estiver dividida contra si mesma,
    essa casa não pode aguentar-se.
    Portanto, se Satanás se levanta contra si mesmo e se divide,
    não pode subsistir: está perdido.
    Ninguém pode entrar em casa de um homem forte
    e roubar-lhe os bens, sem primeiro o amarrar:
    só então poderá saquear a casa.
    Em verdade vos digo:
    Tudo será perdoado aos filhos dos homens:
    os pecados e blasfémias que tiverem proferido;
    mas quem blasfemar contra o Espírito Santo
    nunca terá perdão: será réu de pecado eterno».
    Referia-Se aos que diziam:
    «Está possesso dum espírito impuro».
    Entretanto, chegaram sua Mãe e seus irmãos,
    que, ficando fora, mandaram-n'O chamar.
    A multidão estava sentada em volta d'Ele,
    quando Lhe disseram:
    «Tua Mãe e teus irmãos estão lá fora à tua procura».
    Mas Jesus respondeu-lhes:
    «Quem é minha Mãe e meus irmãos?»
    E, olhando para aqueles que estavam à sua volta, disse:
    «Eis minha Mãe e meus irmãos.
    Quem fizer a vontade de Deus
    esse é meu irmão, minha irmã e minha Mãe».

    AMBIENTE

    Em Mc 3,6, tinha terminado a secção das várias controvérsias de Jesus com diversas instituições do mundo judaico. Não quer dizer que tenha terminado o confronto com essas instituições; o nosso texto será uma boa prova desse confronto. Dentro da grande secção de Mc 3,7–8,26, o texto de Mc 3,7–6,6 em que se encontra o nosso texto será dominado pelo contraste entre a rejeição e a aceitação de Jesus como mestre e agente de ações miraculosas: por um lado, o grupo dos doze apóstolos (cf. 3,13-19) e todos os que aceitam e fazem a vontade do Pai (3,33-35); por outro, a dificuldade da família de Jesus (cf. 3,21), dos escribas (cf. 3,22) e dos habitantes de Nazaré (cf. 6,1-6) em aceitar o ministério de Jesus.

    MENSAGEM

    Através da técnica literária da "narrativa em sanduiche", o Evangelho de Marcos encara a difícil temática da identidade e origem de Jesus. Apesar de ser apenas uma técnica literária, vale a pena explicar o que significa a "narrativa em sanduiche", para perceber o conteúdo da mensagem deste texto de Mc 3,20-35. O início e o fim do texto (v. 21) apresentam-nos a atitude da família de Jesus, de ir ao seu encontro por ter ouvido dizer que Ele «está fora de si»; a família volta à cena apenas no v. 31, com a sucessiva conclusão de Jesus a revelar quem é a sua família. Pelo meio (dentro da "sanduiche"), encontramos uma controvérsia com os escribas (vv. 22-30) sobre a origem do poder de Jesus para expulsar os demónios: se, por um lado, os escribas tentam fazer passar a ideia de uma familiaridade de Jesus com o príncipe dos demónios, Belzebu (v. 22), Jesus demonstrará, por meio da parábola do reino dividido (vv. 23-25), que não pode pertencer ao reino de Belzebu-Satanás, que não pode ter com ele qualquer familiaridade, porque um reino dividido não pode levar a melhor contra o inimigo (vv. 26-27).
    A verdadeira questão deste texto é sobre a identidade de Jesus, a vários níveis, que passamos a explicitar. Antes de mais, a controvérsia com os escribas termina com uma afirmação solene dos vv. 28-29, contextualizada pelo v. 30. Diante de quem diz que Ele «está possesso de um espírito impuro» (v. 30), Jesus declara que todos «os pecados e blasfémias» serão perdoados (v. 28), mas «quem blasfemar contra o Espírito» não obterá perdão (v. 29); dá assim a entender que a blasfémia contra o Espírito Santo seria negar a verdadeira identidade divina de Jesus, ficando associada aos demónios. Isto está em linha com a pregação apostólica, por exemplo de Paulo, em 1Cor 12,3: «Pela ação do Espírito Santo, ninguém pode dizer: "Jesus é anátema"; ninguém pode dizer: "Jesus é Senhor", a não ser pela ação do Espírito Santo».
    Além disso, o texto termina com a afirmação de Jesus a mostrar quem é a sua família, refundando os laços familiares. Jesus não está irmanado por laços de sangue, mas pela atitude diante da «vontade de Deus»: «Eis minha Mãe e meus irmãos. Quem fizer a vontade de Deus esse é meu irmão, minha irmã e minha Mãe» (v. 35). A atitude fundamental de Jesus é a obediência à vontade de Deus, seu Pai; é isso que define a sua identidade. Para fazer parte da família de Jesus, é essencial ter a mesma atitude que Ele tem diante da vontade de Deus.
    A mensagem do nosso texto revela, portanto, a identidade de Jesus a dois níveis: por um lado, Jesus define-se pela total ligação a Deus e à sua vontade, a ponto de considerar sua família quem estiver nessa mesma atitude; por outro lado, define-se ainda pela total separação e diferenciação do Demónio-Satanás. Aliás a sua missão é, nos termos da parábola (cf. v. 27), entrar em casa do «homem forte» que é o demónio, «amarrá-lo», impedindo-o de continuar a sua ação, e «roubar-lhe os bens», ou seja, retirar do seu poder todos os que eram sua propriedade.

    ATUALIZAÇÃO

    • O tema principal do texto do Evangelho deste domingo - sobre a identidade de Jesus - mostra que desde os inícios do cristianismo os cristãos sentiram necessidade de responder à pergunta: "Quem é Jesus?". Ainda hoje, na ação pastoral da Igreja, sobretudo nas catequeses, é importante que todos os cristãos conheçam a identidade de Jesus, até mesmo para poderem estabelecer com ele uma relação personalizada.

    • Fazer parte da família de Jesus é a vocação fundamental dos cristãos de todos os tempos. Por isso, são chamados a formar comunidade, que está centrada na pessoa de Jesus e que tem como única missão fazer a vontade de Deus em todas as circunstâncias da vida. É a isso que chama o Evangelho quando Jesus apresenta a sua verdadeira família: é quem faz a vontade de Deus e toma lugar ao redor de Jesus.

    • O método para estabelecer uma relação de familiaridade com Jesus passa necessariamente por seguir o seu exemplo: é Ele o primeiro a fazer a vontade de Deus, mesmo quando isso acarreta incompreensão e rejeição do seu ministério. O cristão continua no mundo a missão de Jesus e tem como único horizonte fazer a vontade de Deus; esta é uma das petições do Pai Nosso, a oração que Jesus ensina a rezar: «Faça-se a tua vontade, assim na terra como no céu».

    • Quando o cristão se decide a seguir Jesus, isso implica necessariamente que renuncie ao mal e ao demónio. Tal como Jesus estabelece uma clara separação entre o seu serviço e o poder de Satanás, desde o primeiro momento da vida cristã, os cristãos são chamados a renunciar a Satanás e a fazer a sua profissão de fé em Deus. Na vida ordinária, isso implica que se tenha claro que algumas práticas de bruxaria, feitiçaria e cartomancia não são práticas próprias de um cristão, mas aprisionam; Jesus vem libertar-nos desse aprisionamento de Satanás e é necessário deixar-se libertar.

    A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.

    Ao longo dos dias da semana anterior ao 10.º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Ricardo Freire, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • Santo Anjo da Guarda de Portugal

    Santo Anjo da Guarda de Portugal


    10 de Junho, 2024

    A devoção ao Anjo da Guarda é muito antiga em Portugal. Tomou, porém, incremento especial com as Aparições do Anjo, em Fátima, aos Pastorinhos. Pio XII aprovou a comemoração do Anjo de Portugal no Calendário Litúrgico de Portugal.

    Mensageiros de Deus, em momentos decisivos da História da Salvação, os Anjos estão encarregados da guarda dos homens (Mt 18, 10; At 12, 13) e da proteção da Igreja (Ap 12, 1-9). A fé cristã crê também possuir cada nação em particular um Anjo encarregado de velar por ela.

    Lectio

    Primeira leitura: Daniel, 10, 2a, 5-6.12-14b

    Naqueles dias, levantando os olhos, vi um homem vestido de linho. Tinha sobre os rins uma cinta de ouro de Ufaz. 6O corpo era como que de crisólito; a face brilhava como o relâmpago, os olhos como fachos ardentes, os braços e os pés tinham o aspecto do bronze polido e a sua voz ressoava como o rumor de uma multidão. 12Disse-me: «Não tenhas medo, Daniel, porque, desde o primeiro dia em que te aplicaste a compreender e te humilhaste diante do teu Deus, a tua oração foi atendida e é por causa de ti que eu aqui venho. 13O príncipe do reino da Pérsia resistiu-me durante vinte e um dias; mas Miguel, um dos primeiros príncipes, veio em meu socorro. Deixei-o a bater-se com os reis da Pérsia, 14e aqui estou para te fazer compreender o que deve acontecer ao teu povo nos últimos dias."

    Nos capítulos 7 a 12 de Daniel, encontramos uma série de apocalipses ou revelações relacionados entre si, apesar de serem unidades independentes e autónomas. Abundam os elementos simbólicos: o grande mar, os quatro ventos, os quatro animais, o pequeno chifre, o ancião e o filho do homem, para além de outros pormenores de números e colorido. Para compreender todos estes símbolos, teríamos de nos colocar no mundo do autor e na sua mentalidade, simultaneamente judaica, profética e apocalítica. Estão em jogo a história e a mitologia, a tradição e o futuro messiânico. A finalidade é conseguir suscitar a convicção de que no fim dos tempos, que está próximo, o reino de Deus será entregue ao povo dos santos de Deus, o resto profético. O anjo de Deus defende esse povo. De modo semelhante, todos os povos e nações têm um Anjo encarregado por Deus de os proteger e defender em todos os perigos, de modo que a vida temporal se oriente para a eterna e todos os povos possam vir a formar o único Povo de Deus.

    Evangelho: Lucas 2, 8-14

    Na mesma região encontravam-se uns pastores que pernoitavam nos campos, guardando os seus rebanhos durante a noite. 9Um anjo do Senhor apareceu-lhes, e a glória do Senhor refulgiu em volta deles; e tiveram muito medo. 10O anjo disse-lhes: «Não temais, pois anuncio-vos uma grande alegria, que o será para todo o povo: 11Hoje, na cidade de David, nasceu-vos um Salvador, que é o Messias Senhor. 12Isto vos servirá de sinal: encontrareis um menino envolto em panos e deitado numa manjedoura.» 13De repente, juntou-se ao anjo uma multidão do exército celeste, louvando a Deus e dizendo: 14«Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens do seu agrado.»

    Lucas leva-nos a Belém, cidade das promessas de Israel, para falar do nascimento de Jesus. Mas a verdade mais profunda do nascimento de Jesus é anunciada pelo anjo da força e da presença de Deus no meio dos homens, que quebra o silêncio da noite e proclama: "Nasceu-vos o Salvador" (2, 11). É a verdade da Boa Nova de um mundo novo, dirigida aos pastores, que vivem afastados e não têm lugar nas cidades dos homens, que não se ocupam das coisas da lei judaica (do cerimonial) e, por conseguinte, são impuros. A eles, e a todos os humildes da terra, é dirigida a mensagem da verdade salvadora: "Hoje, na cidade de David, nasceu-vos um Salvador, que é o Messias Senhor" (v. 11).

    Meditatio

    "A existência dos seres espirituais, não-corporais, a que a Sagrada Escritura habitualmente chama anjos, é uma verdade de fé. P testemunho da Escritura é tão claro como a unanimidade da Tradição" (Catecismo da Igreja Católica).
    Deus nunca deixa só o homem desorientado e desanimado. Do mesmo modo, protege os povos e nações, particularmente nos momentos de maiores dificuldades. Há uma criação visível que, pelo menos em parte, vemos com os olhos do corpo. Mas há também uma criação invisível que só podemos perceber através dos sentidos espirituais, através da fé, da oração, da iluminação interior que nos vem do Espírito Santo.
    Quem são, portanto, os anjos? São, em primeiro lugar, um sinal luminoso da Providência, da paterna bondade de Deus, que jamais deixa faltar aos filhos aquilo de que precisam. Intermediários entre a terra e o céu, os anjos são criaturas invisíveis postas à nossa disposição, e à disposição dos povos e nações, para nos guiar no caminho de regresso a casa do Pai. Vêm do Céu para nos reconduzir ao Céu. Fazem-nos, desde já, saborear algo das realidades celestes.
    O cuidado e a guarda dos nossos anjos podem, por vezes, experimentar-se de modo muito concreto e sensível, desde que saibamos reconhecê-los. Trata-se de encontros "casuais", que todavia se tornam fundamentais e determinantes na vida de uma pessoa ou de uma ajuda imprevista e inesperada em situações de perigo. Pode ser também uma intuição repentina que nos permite dar-nos conta de um erro, de um esquecimento. Como não sentir-nos guiados, protegidos e amavelmente socorridos? Os anjos protegem-nos de perigos de que nos damos conta, sobretudo, do perigo de nos tornarmos autossuficientes, surdos a Deus e desobedientes à sua palavra. Além disso, sugerem-nos pensamentos retos e humildes, bons sentimentos. Desde o seu começo até à morte, a vida humana é acompanha pela assistência e intercessão dos anjos: "Cada fiel tem a seu lado um anjo protetor e pastor para o guiar na vida" (S. Basílio Magno). De igual modo, "toda a vida da Igreja beneficia da ajuda misteriosa e poderosa dos anjos" (At 5, 18-20; 8, 26-29; 10, 3-8; 12, 6-11; 27, 23-25). Porque não pensar que acontece com os povos e nações o que acontece com cada homem e com a Igreja? Peçamos ao Anjo de Portugal que nos livre de todas as adversidades, nos defenda nas adversidades, dirija os nossos passos, como nação, no caminho da salvação e da paz.

    Oratio

    Senhor, Pai Santo, proclamamos a vossa imensa glória, que resplandece nos Anjos e nos Arcanjos, e, honrando estes mensageiros celestes, exaltamos a vossa infinita bondade, porque a veneração que eles merecem é sinal da vossa incomparável grandeza sobre as criaturas. Hoje, com a multidão dos Anjos, que celebram a vossa divina majestade, queremos adorar-vos e bendizer-vos. Ámen. (cf. Prefácio dos Anjos)

    Contemplatio

    Os Anjos louvam a Deus e servem-n'O. "Eles são milhares de milhares, diz Daniel, à volta do trono de Deus, ocupados em servi-l'O" (Dan 7, 10). "Anjos do céu, diz o salmo, bendizei o Senhor, vós que executais as suas ordens" (Sl 102). Deus envia-os junto das criaturas. O seu nome significa "mensageiros". "São os enviados de Deus, diz S. Paulo, vêm ajudar os homens a realizarem a sua salvação" (Heb 1, 14). Há os anjos das nações e os anjos de cada um de nós. Deus dizia ao seu povo por Moisés: "Enviarei o meu anjo diante de vós. Conduzir-vos-á, guardar-vos-á e dirigir-vos-á para a terra que vos prometi" (Ex 23). Deus acrescentava: "Honrai-o, escutai a sua voz quando vos fala por Moisés. Se lhe obedecerdes, sereis abençoados e triunfareis sobre os vossos inimigos. Se o desprezardes, sereis castigados" (Ibid.). "Deus ordenou aos seus anjos,para que te guardem em todos os teus caminhos. Eles hão-de elevar-te na palma das mãos, para que não tropeces em nenhuma pedra." (Sl 90). Trata-se aqui dos anjos de cada um de nós. (Leão Dehon, OSP 4, p. 316).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Bendito seja o Senhor,
    que nos protege por meio do seu Anjo" (Judite 13, 20).

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    Santo Anjo da Guarda de Portugal  (10 Junho)

  • S. Barnabé, Apóstolo

    S. Barnabé, Apóstolo


    11 de Junho, 2024

    José, cognominado Barnabé, isto é, filho da consolação, é chamado apóstolo embora não tenha pertencido ao grupo dos Doze. Era membro da comunidade judaica de Chipre, em Jerusalém. Não conheceu pessoalmente Jesus, mas converteu-se logo nos primeiros anos do Cristianismo, e teve um papel importante na expansão da Igreja. Daí ser chamado apóstolo. Foi ele que apresentou Paulo à comunidade de Jerusalém, garantindo-lhe a sua recente conversão. Conduziu Paulo a Antioquia, apresentando-o também lá à comunidade dos fiéis. Acompanhou o Apóstolo na sua primeira viagem missionária, cerca do ano 60. Depois, separou-se de Paulo, regressando a Chipre onde terá sido martirizado no ano 60.

    Lectio

    Primeira leitura: Atos 11, 21b-26; 13, 1-3.

    Naqueles dias, foi grande o número dos que abraçaram a fé e se converteram ao Senhor. 22A notícia chegou aos ouvidos da igreja de Jerusalém, e mandaram Barnabé a Antioquia. 23Assim que ele chegou e viu a graça concedida por Deus, regozijou-se com isso e exortou-os a todos a que se conservassem unidos ao Senhor, de coração firme; 24ele era um homem bom, cheio do Espírito Santo e de fé. Assim, uma grande multidão aderiu ao Senhor. 25Então, Barnabé foi a Tarso procurar Saulo. 26Encontrou-o e levou-o para Antioquia. Durante um ano inteiro, mantiveram-se juntos nesta igreja e ensinaram muita gente. Foi em Antioquia que, pela primeira vez, os discípulos começaram a ser tratados pelo nome de «cristãos.» 1Havia na igreja, estabelecida em Antioquia, profetas e doutores: Barnabé, Simeão, chamado 'Níger', Lúcio de Cirene, Manaen, companheiro de infância do tetrarca Herodes, e Saulo. 2Estando eles a celebrar o culto em honra do Senhor e a jejuar, disse-lhes o Espírito Santo: «Separai Barnabé e Saulo para o trabalho a que Eu os chamei.» 3Então, depois de terem jejuado e orado, impuseram-lhes as mãos e deixaram-nos partir.

    O nosso texto mostra-nos o papel de Barnabé como elo de união entre a igreja mãe de Jerusalém e a comunidade de Antioquia. Assim, colaborou na evangelização e na edificação da Igreja.
    A sua relação com Paulo também foi importante. Apresentou-o às comunidades de Jerusalém e de Antioquia garantindo a conversão à fé cristã daquele que todos conheciam e temiam como terrível perseguidor. Fê-lo seu companheiro de missão, apesar de Paulo acabar por ultrapassá-lo no intento de inculturar a fé. Ambos foram missionários empreendedores e geniais a quem devem as comunidades de todos os tempos.

    Evangelho: Mateus 10, 7-13

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus Apóstolos: Ide e proclamai que o Reino do Céu está perto. 8Curai os enfermos, ressuscitai os mortos, purificai os leprosos, expulsai os demónios. Recebestes de graça, dai de graça. 9Não possuais ouro, nem prata, nem cobre, em vossos cintos; 10nem alforge para o caminho, nem duas túnicas, nem sandálias, nem cajado; pois o trabalhador merece o seu sustento. 11Em qualquer cidade ou aldeia onde entrardes, procurai saber se há nela alguém que seja digno, e permanecei em sua casa até partirdes. 12Ao entrardes numa casa, saudai-a. 13Se essa casa for digna, a vossa paz desça sobre ela; se não for digna, volte para vós.

    Jesus percorre cidades e aldeias a anunciar o evangelho do Reino e a curar doentes, e verifica que as multidões andam desorientadas e abandonadas como ovelhas sem pastor. Então, chama Doze dos seus discípulos para estarem com Ele e partilharem a sua missão. Dá-lhes poder sobre os espíritos imundos e para curar os doentes. Segundo Mateus esta missão dirige-se exclusivamente às ovelhas perdidas da casa de Israel: como Jesus, também os seus apóstolos - por agora - devem concentrar os seus esforços num horizonte bem delimitado, enquanto esperam maiores aberturas, depois da Páscoa do Senhor. Os missionários devem proclamar o que Jesus disse e fez, e nada mais; devem exercer o seu ministério em absoluta gratuidade.

    Meditatio

    O discurso missionário de Jesus revela-nos a magnanimidade do seu coração. A pobreza de meios, na pregação do Evangelho, não é um limite mas abertura na confiança e na generosidade. A pobreza faz-nos livres e capazes de dar a todos, por causa do Reino de Deus, gratuitamente o que recebemos: "Recebestes de graça, dai de graça." (v. 8).
    S. Barnabé realizou esta página do Evangelho na sua vida. O livro dos Atos informa-nos que ele, possuindo um campo, o vendeu, entregando aos Apóstolos, o produto da venda. Fez o que o jovem rico não teve coragem de fazer (Mt 19, 21; Mc 10, 21). A confiança em Deus, com que faz este gesto, é acompanhada pela confiança nos outros. Ao chegar a Antioquia, em vez de se preocupar com aqueles "pagãos" recém-convertidos ao Evangelho, Barnabé reage com total confiança: "Assim que ele chegou e viu a graça concedida por Deus, regozijou-se com isso" (v. 23). Não é um apagador de entusiasmos, preocupado com a observância de minúcias. É "um homem de Deus, cheio de Espírito Santo e de fé" (At 2, 24), que "exorta a todos a que se conservem unidos ao Senhor" (cf. v. 23). O mais importante é aderir a Cristo. Deste modo, "uma grande multidão aderiu ao Senhor" (v. 24).
    Outro aspeto que nos revela a amplitude do seu coração é o seguinte: ao dar-se conta da fecundidade daquele campo de apostolado, não o reservou só para si, mas "foi a Tarso procurar Saulo" (At 10, 25). Quando Paulo se tornou mais importante do que ele no apostolado entre os pagãos, pode dizer-se de Barnabé o que dizem os Atos, quando da sua chegada a Antioquia: "regozijou-se com isso" (v. 23).
    Barnabé está completamente à disposição de Cristo. Por isso, o Espírito Santo pode reservá-lo para uma missão mais universal: a evangelização das nações.
    Em Barnabé, vemos resplandecer a confiança e generosidade, baseadas na pobreza do coração. Dizem as nossas Constituições: "A partilha dos bens no amor fraterno permite-nos verificar que, na Igreja e com a Igreja, somos sinal no meio dos nossos irmãos. Esta pobreza segundo o Evangelho convida-nos a libertar-nos da sede de posse e de prazer que sufoca o coração do homem. Estimula-nos a viver na confiança e na gratuidade do amor" (n. 46).

    Oratio

    Senhor, que belo modelo a imitar. S. Barnabé é um discípulo muito amável, bom, piedoso e caridoso para com o próximo. Possui, além disso, as virtudes mais austeras, pois se despojou dos seus bens, e desafiou todas as contradições. A seu exemplo, quero sacudir a minha tibieza, e viver a gratuidade que carateriza os verdadeiros missionários. Educai o meu coração, e fazei-o aproximar do ritmo do vosso Coração. Dai-me um coração manso e humilde como o vosso. Ámen.

    Contemplatio

    S. Barnabé não era do número dos doze apóstolos, mas foi-lhe acrescentado e trabalhou muito com S. Paulo. Levita e cipriota, estudava as santas Letras em Jerusalém sob a direção do Rabino Gamaliel, quando foi testemunha da cura do paralítico na piscina. Uniu-se então imediatamente aos discípulos de Nosso Senhor. Era um homem jovem, amável e bom. Era bom, dizem os Atos, e cheio de fé e ricamente dotado com os dons do Espírito Santo. Os apóstolos chamaram-no Barnabé, o que quer dizer «o Filho da consolação». Depois do Pentecostes, estava em Damasco quando aconteceu o milagre da conversão de S. Paulo. Fez-se o anjo da guarda de S. Paulo, conduziu-o a Jerusalém e apresentou-o aos apóstolos. Trabalharam juntos vários anos, e receberam a missão de pregar a fé aos gentios. Ganharam quase toda a cidade de Antioquia. Barnabé era de uma família abastada. Tinha uma bela propriedade na ilha de Chipre. Vendeu-a e apresentou o valor aos apóstolos. Dava assim o grande exemplo do desapego e da vida religiosa. Havia em Antioquia um grupo de padres, de profetas e de doutores. O Espírito Santo revelou-lhes positivamente a missão de Paulo e de Barnabé para a conversão dos gentios. Enviaram, portanto, estes dois apóstolos para os países do ocidente. Barnabé e Paulo passaram na ilha de Chipre onde fizeram maravilhas e ganharam para a fé o próprio procônsul, Sérgio Paulo. De lá foram para a Ásia Menor e pregaram na Pisídia, em Perga, em Antioquia, em Icónio, em Listra. Foi uma alternativa de sucessos e de perseguições. (L. Dehon, OSP 2, pp. 311-312).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Recebestes de graça, dai de graça". (Mt 10, 8).

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    S. Barnabé, Apóstolo (11 Junho)

  • S. António de Lisboa, Presbítero e Doutor da Igreja

    S. António de Lisboa, Presbítero e Doutor da Igreja


    13 de Junho, 2024

    S. António nasceu em Lisboa, em 1195. No batismo, recebeu o nome de Fernando. Em 1210 entrou para os Cónegos Regulares de S. Agostinho, no mosteiro de S. Vicente de Fora, em Lisboa. Dois anos depois, desejando uma vida mais recolhida, transferiu-se para o Mosteiro de S. Cruz, em Coimbra. Ordenado sacerdote, em 1220, ao ver os restos mortais dos primeiros mártires franciscanos, mortos em Marrocos, sentiu um novo apelo vocacional e mudou-se para a Ordem dos Frades Menores, tomando o nome de António. Em 1221 participou no "Capítulo das Esteiras", junto à Porciúncula, e viu Francisco de Assis. Depois de alguns anos no escondimento e na oração, começou a pregar com grande sucesso e frutos. Converteu hereges em Itália e em França. Morreu aos 33 anos de idade, perto de Pádua, onde foi sepultado. No dia do Pentecostes de 1232, um ano depois da sua morte, foi canonizado pelo Papa Gregório IX.

    Lectio

    Primeira leitura: Sir 39, 8-14 (gr. 6-11)

    Aquele que medita na lei do Altíssimo, for a vontade do Soberano Senhor, ele será repleto do espírito de inteligência; então, ele derramará, como chuva, as palavras da sabedoria; e louvará o Senhor, na sua oração. 7Possuirá a rectidão do julgamento e da ciência e ele meditará nos mistérios de Deus. 8Ensinará ele próprio a doutrina que aprendeu e porá a sua glória na Lei da Aliança do Senhor. 9Muitos louvarão a sua sabedoria, que jamais ficará no esquecimento. A sua recordação não desaparecerá e o seu nome viverá de geração em geração. 10As nações proclamarão a sua sabedoria, a assembleia publicará o seu louvor.

    Segundo o Ben Sirá, o sábio adquire a sabedoria não apenas pelo estudo, pela tradição e pela experiência pessoal, mas sobretudo pelas súplicas e pela oração. Se o Altíssimo o quiser, o sábio ver-se-á gratuita e copiosamente cheio do dom da inteligência, de maneira que ele mesmo se possa converter em fonte de sabedoria para os outros. Isto levá-lo-á a dar graças a Deus. Graças à sabedoria recebida de Deus, o sábio saberá conduzir-se retamente e poderá aprofundar, na oração, os mistérios divinos. Ver-se-á capacitado para instruir os outros e a sua glória será a aliança do Senhor. Como recompensa do seu ministério, o sábio receberá o elogio dos seus contemporâneos, e das gerações sucessivas, incluindo os pagãos: nunca esquecerão a sua inteligência e a sua fama transmitir-se-á de geração em geração.

    Evangelho: Mateus 5, 13-19
    Naquele tempo, disse Jesusaos seus discípulos: "Vós sois o sal da terra. Ora, se o sal se corromper, com que se há-de salgar? Não serve para mais nada, senão para ser lançado fora e ser pisado pelos homens. 14Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade situada sobre um monte; 15nem se acende a candeia para a colocar debaixo do alqueire, mas sim em cima do candelabro, e assim alumia a todos os que estão em casa. 16Assim brilhe a vossa luz diante dos homens, de modo que, vendo as vossas boas obras, glorifiquem o vosso Pai, que está no Céu.» 17«Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas. Não vim revogá-los, mas levá-los à perfeição. 18Porque em verdade vos digo: Até que passem o céu e a terra, não passará um só jota ou um só ápice da Lei, sem que tudo se cumpra. 19Portanto, se alguém violar um destes preceitos mais pequenos, e ensinar assim aos homens, será o menor no Reino do Céu. Mas aquele que os praticar e ensinar, esse será grande no Reino do Céu.

    Dois provérbios, em forma de parábolas definem, no nosso texto, a missão dos discípulos de Cristo: sal e luz. Temperamos os alimentos com o sal: os discípulos hão de ser, no mundo, como o sal que dá sabor, que preserva da corrução. No mundo judaico, a metáfora do sal significava também a sabedoria. Os discípulos possuem a sabedoria do Evangelho. Se, quimicamente falando, o sal não pode perder o sabor, à força de se usado, pode deixar de salgar. Se a Palavra de Deus perdeu a sua força no antigo Israel, tem de conservá-la no novo Israel, a Igreja.
    A metáfora da luz também se refere à Palavra. Jesus, que é a luz, tem a Palavra (Jo 8, 12.31s.; 14, 9-10). O mesmo se pode dizer dos discípulos de Cristo: são a luz do mundo (Fl 2, 15); são a cidade edificada sobre o monte (v. 14); têm a luz, a palavra de Deus (Mc4, 21; Lc 8, 16; 11, 33).

    Meditatio

    Ao fazer memória dos mártires e dos outros santos, a Igreja proclama o mistério pascal realizado naqueles homens e mulheres que sofreram com Cristo e com Ele foram glorificados, propondo aos fiéis os seus exemplos, que a todos atraem ao Pai por Cristo, e implora, pelos seus méritos, os benefícios de Deus (cf CIC, 1173).
    S. António de Lisboa, que hoje celebramos, foi dotado de extraordinária preparação intelectual e de grandes capacidades de comunicação. Com a sua sabedoria evangélica provocou admiração, confundiu os hereges, converteu os pecadores. Com as suas virtudes e milagres, fascinou o povo. Pregador itinerante, S. António incarnou o Evangelho de Cristo, levando de cidade em cidade a sua paz, no estilo de uma vida obediente à vontade de Deus, disponível para os incómodos e canseiras da missão, e compassivo para todas as realidades humanas provados pelo sofrimento em qualquer das suas muitas formas. Atribuía tudo ao poder da oração. O testemunho de vida de S. António reflete a envolvente beleza de quem vive permanentemente em íntima comunhão com Deus, unicamente impelido pelo desejo de cumprir a sua vontade e de manifestar o seu imenso amor por todas as criaturas. S. António, humilde e pobre, e, por isso mesmo, digno filho do Pobrezinho de Assis, deixa transparecer os grandes prodígios de Deus: os milagres físicos e espirituais que o Altíssimo realiza naqueles que confiam n´Ele, apoiados numa fé quotidiana, autêntica e inabalável.
    A luz e a criatividade da Palavra escutada, meditada e rezada, produzem em S. António os frutos de uma caridade incansável, paciente, sem preconceitos e tenaz diante das dificuldades. O que mais anseia é anunciar a ternura de Deus, a sua bondade e a infinita misericórdia com que nos revela o seu coração de Pai. S. António alerta-nos para o essencial, para a amizade com Deus, fonte de todo o bem, da paz e da alegria, que nada nem ninguém nos pode jamais tirar. Meditando na sua vida, descobrimos as maravilhas da fidelidade de Deus, que segue com amor o caminho de quem procura o seu rosto, tornando-o participante dos seus dons e colaborador do seu projeto de vida sobre a humanidade.

    Oratio

    Grande santo, éreis pelo vosso ardente amor a Nosso Senhor um santo do Sagrado Coração, ajudai-nos a fazer reinar o Coração de Jesus nos nossos corações e na sociedade. (Leão Dehon, OSP 3, p. 649).

    Contemplatio

    Santo António foi um apóstolo do Coração de Jesus. A Providência não quis que chegasse a Marrocos, foi lançado sobre as costas da Sicília. Vai aquecer ainda o seu coração junto do de S. Francisco de Assis. O seu talento revela-se, fazem-no professor, depois missionário. Ganha almas inumeráveis ao amor de Nosso Senhor. Foi, no séc. XIII, diz o P. Marie-Antoine, o doutor e o escritor do Coração de Jesus. Conduz sempre os seus ouvintes ao pensamento do amor, como objetivo final da vida cristã, e é no Coração do Salvador que mostra a fonte e o trono deste amor. Diz: «Sim, a ferida do lado de Jesus é um sol que ilumina todo o homem. Pela abertura do Sagrado Coração foi aberta a porta do paraíso donde nos vem toda a luz. É lá que está o asilo assegurado da arca da paz e da salvação. O Salvador abriu o seu lado e o seu Coração à pomba, isto é, à alma religiosa, a fim de que pudesse encontrar um lugar de refúgio. Sede como a pomba que estabelece o seu ninho no mais profundo da pedra. Se Jesus Cristo é a pedra, a cavidade da pedra é a chaga do lado de Jesus, que leva ao seu Coração. Havia na antiga lei dois altares, o altar de bronze ou dos holocaustos, que estava fora do santuário, e o altar de ouro do santuário mesmo. O altar de bronze da lei nova é o corpo sangrento de Cristo imolado em presença do povo; o altar de ouro é o seu Coração ardente de amor, e lá está o incenso que sobe para o céu». Os seus sucessos eram maravilhosos. Se queremos ganhar almas para Nosso Senhor, é preciso primeiro excitar-nos ao seu amor. O fervor do nosso coração comunicar-se-á facilmente àqueles que estiverem em relação connosco. (Leão Dehon, OSP 3, p. 649s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Vós sois o sal da terra. Vós sois a luz do mundo" (Mt 5, 13-14).

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    S. António de Lisboa, Presbítero e Doutor da Igreja (13 Junho)

  • 11º Domingo do Tempo Comum - Ano B

    11º Domingo do Tempo Comum - Ano B


    16 de Junho, 2024

    11º Domingo do Tempo Comum - Ano B

    Tema do 11º Domingo do Tempo Comum

    A liturgia do 11º Domingo do Tempo Comum convida-nos a olhar para a vida e para o mundo com confiança e esperança. Deus, fiel ao seu plano de salvação, continua, hoje como sempre, a conduzir a história humana para uma meta de vida plena e de felicidade sem fim.
    Na primeira leitura, o profeta Ezequiel assegura ao Povo de Deus, exilado na Babilónia, que Deus não esqueceu a Aliança, nem as promessas que fez no passado. Apesar das vicissitudes, dos desastres e das crises que as voltas da história comportam, Israel deve continuar a confiar nesse Deus que é fiel e que não desistirá nunca de oferecer ao seu Povo um futuro de tranquilidade, de justiça e de paz sem fim.
    O Evangelho apresenta uma catequese sobre o Reino de Deus - essa realidade nova que Jesus veio anunciar e propor. Trata-se de um projecto que, avaliado à luz da lógica humana, pode parecer condenado ao fracasso; mas ele encerra em si o dinamismo de Deus e acabará por chegar a todo o mundo e a todos os corações. Sem alarde, sem pressa, sem publicidade, a semente lançada por Jesus fará com que esta realidade velha que conhecemos vá, aos poucos, dando lugar ao novo céu e à nova terra que Deus quer oferecer a todos.
    A segunda leitura recorda-nos que a vida nesta terra, marcada pela finitude e pela transitoriedade, deve ser vivida como uma peregrinação ao encontro de Deus, da vida definitiva. O cristão deve estar consciente de que o Reino de Deus (de que fala o Evangelho de hoje), embora já presente na nossa actual caminhada pela história, só atingirá a sua plena maturação no final dos tempos, quando todos os homens e mulheres se sentarem à mesa de Deus e receberem de Deus a vida que não acaba. É para aí que devemos tender, é essa a visão que deve animar a nossa caminhada.

    LEITURA I - Ez 17, 22-24

    Leitura da profecia de Ezequiel

    Eis o que diz o Senhor Deus:
    «Do cimo do cedro frondoso, dos seus ramos mais altos,
    Eu próprio arrancarei um ramo novo
    e vou plantá-lo num monte muito alto.
    Na excelsa montanha de Israel o plantarei
    e ele lançará ramos e dará frutos
    e tornar-se-á um cedro majestoso.
    Nele farão ninho todas as aves,
    toda a espécie de pássaros habitará à sombra dos seus ramos.
    E todas as árvores do campo hão-de saber
    que Eu sou o Senhor;
    humilho a árvore elevada e elevo a árvore modesta,
    faço secar a árvore verde e reverdeço a árvore seca.
    Eu, o Senhor, digo e faço».

    AMBIENTE

    No ano de 609 a. C., o faraó Necao derrotou o rei Josias e colocou no trono de Judá Joaquim, que durante algum tempo foi vassalo do Egipto. Contudo, em 605 a.C., Nabucodonosor derrotou as tropas assírias e egípcias em Carquemish, prosseguiu a sua campanha em direcção ao Egipto e assumiu o controlo da Síria e da Palestina. Joaquim ficou a pagar tributo aos babilónios. Quando, em 601, Nabucodonosor não conseguiu conquistar o Egipto, Joaquim julgou chegada a hora de se libertar do domínio babilónico. Contudo, Nabucodonosor reagiu sitiando Jerusalém, em 598 a. C., e Joaquim morreu durante o cerco, ou foi deportado para a Babilónia. Sucedeu-lhe Jeconias que, ao fim de três meses de resistência, se rendeu aos babilónios (597 a.C.).
    Nabucodonosor instalou, então, no trono de Judá um tal Sedecias. Durante algum tempo, Judá manteve-se tranquilo, pagando pontualmente os tributos devidos aos babilónios; mas, ao fim de algum tempo, aproveitando a conjuntura política favorável, Sedecias aliou-se com os egípcios e deixou de pagar o tributo. Nabucodonosor enviou imediatamente um exército que cercou Jerusalém. Apesar do socorro de um exército egípcio, Jerusalém teve de se render aos babilónios. Sedecias, aproveitando as sombras da noite, tentou fugir da cidade; mas foi feito prisioneiro, viu os seus filhos serem assassinados e ele próprio foi levado prisioneiro para a Babilónia, onde acabou os seus dias.
    Ezequiel, o "profeta da esperança", exerceu o seu ministério na Babilónia no meio dos exilados judeus. O profeta fez parte de uma primeira "leva" de exilados que, em 597 a.C., chegou à Babilónia, após a derrota de Jeconias.
    A primeira fase do ministério de Ezequiel decorreu entre 593 a.C. (data do seu chamamento à vocação profética) e 586 a.C. (data em que Jerusalém foi conquistada uma segunda vez pelos exércitos de Nabucodonosor e um novo grupo de exilados foi encaminhado para a Babilónia). Nesta fase, o profeta preocupou-se em destruir as falsas esperanças dos exilados (convencidos de que o exílio terminaria em breve e que iam poder regressar rapidamente à sua terra) e em denunciar a multiplicação das infidelidades a Jahwéh por parte desses membros do Povo judeu que escaparam ao primeiro exílio e que ficaram em Jerusalém.
    É precisamente neste contexto que Ezequiel propõe "um enigma", "uma parábola", que nos é apresentada ao longo do capítulo 17 do seu livro. Fala de uma "águia" (provavelmente o rei Nabucodonosor), que "veio do Líbano comer a ponta do cedro. Apanhou o ramo mais elevado" (provavelmente o rei Jeconias) e levou-o para o país dos comerciantes (isto é, a Babilónia). Em seu lugar, plantou outra árvore (provavelmente Sedecias). Esta árvore, uma "videira", não irá, contudo, prosperar, apesar das tentativas de aliança com o Egipto. Mais, será levado prisioneiro para a Babilónia e lá morrerá (Ez 17,10).
    A mensagem deste "enigma" é óbvia: os exilados não devem alimentar ilusões ao ver as jogadas políticas de Sedecias, aliado com os egípcios. A política de Sedecias, em Jerusalém, não significará a liberdade dos exilados, mas, pelo contrário, conduzirá a uma nova catástrofe.
    Estará então tudo terminado? Já não há esperança? Deus abandonou definitivamente o seu Povo e esqueceu as suas promessas de salvação?
    É precisamente aqui que se encaixa o oráculo de salvação que a primeira leitura deste domingo nos apresenta: não, apesar das dramáticas circunstâncias do tempo presente, Deus não abandonou o seu Povo, mas irá construir com ele uma história nova, de salvação e de graça.

    MENSAGEM

    Deus não esqueceu a promessa feita, por intermédio do profeta Natan (cf. 2 Sm 7), e na qual assegurou a David a continuidade do seu trono. É verdade que a dinastia de David (o "ramo mais elevado" do "cedro" - Ez 17,3-4) foi arrancada; mas Deus não abandonou o seu Povo: Ele próprio vai tomar um "ramo novo", plantá-lo na montanha de Israel, fazê-lo dar frutos e torná-lo uma árvore resistente e de grande porte (Ez 17,22-23) - ou seja, irá restabelecer a dinastia davídica em Jerusalém, assegurando ao seu Povo um futuro pleno de vida, de felicidade e de paz sem fim.
    O texto sublinha, antes de mais, a presença omnipotente de Deus na história da humanidade. Ele preside à história humana, tem um projecto de salvação e conduz sempre a caminhada dos homens de acordo com o seu plano. O poder orgulhoso dos impérios humanos nada pode contra esse Deus que é o Senhor da história e que, com paciência e amor, vai concretizando o seu projecto.
    Além disso, Ezequiel assegura aos exilados a "fidelidade" de Deus às suas promessas. Deus não falha, não esquece os seus compromissos, não abandona esse Povo com quem se comprometeu. Mesmo afogado na angústia e no sofrimento, mesmo mergulhado num horizonte de desespero, Israel tem de aprender a confiar nesse Deus que é sempre fiel às suas promessas e aos compromissos que assumiu com o seu Povo no âmbito da Aliança. Tudo pode cair, tudo pode falhar; só Deus não falha.
    O nosso texto contém ainda uma indicação sobre a forma de actuar de Deus, sobre a "estranha" lógica de Deus: Ele toma aquilo que é pequeno aos olhos dos homens ("um ramo novo" - Ez 17,22) e, através dele, vence o orgulho e a prepotência, confunde os poderosos e exalta os humildes. Deus prefere os pequenos, os débeis, os pobres (aqueles que na sua humildade e simplicidade estão sempre disponíveis para acolher os desafios e os dons de Deus); e é através deles que concretiza os seus projectos de salvação e de graça.
    Estes poucos versículos contêm um imenso capital de esperança, que deve alimentar e animar, hoje como ontem, a caminhada do Povo de Deus pela história.

    ACTUALIZAÇÃO

    ¨ Essencialmente, o texto de Ezequiel que a liturgia deste domingo nos propõe garante que Deus conduz sempre a história humana de acordo com o seu projecto de salvação e mantém-se fiel às promessas feitas ao seu Povo. Esta "lição" não pode ser esquecida e essa certeza deve levar-nos a encarar os dramas e desafios do tempo actual com confiança e esperança. Não estamos abandonados à nossa sorte; Deus não desistiu desta humanidade que Ele ama e continua a querer salvar. É verdade que a hora actual que a humanidade atravessa está marcada por sombras e graves inquietações; mas também é verdade que Deus continua a acompanhar cada passo que damos e a apontar-nos caminhos de vida. A última palavra - uma palavra que não pode deixar de ser de salvação e de graça - será sempre de Deus. Ancorados nessa certeza, temos de vencer o medo e o pessimismo que, por vezes, nos paralisam e dar aos homens nossos irmãos um testemunho de esperança, de serena confiança.

    ¨ A referência - mil vezes repetida ao longo da Bíblia - à tal "estranha lógica" de Deus, que se serve do que é débil e frágil para concretizar os seus projectos de salvação, convida-nos a mudar os nossos critérios de avaliação e a nossa atitude face ao mundo e face aos que nos rodeiam. Por um lado, ensina-nos a valorizar aquilo e aquelas pessoas que o mundo, por vezes, marginaliza ou despreza; ensina-nos, por outro lado, que as grandes realizações de Deus não estão dependentes das grandes capacidades dos homens, mas antes da vontade amorosa de Deus; ensina-nos ainda que o fundamental, para sermos agentes de Deus, não é possuir brilhantes qualidades humanas, mas uma atitude de disponibilidade humilde que nos leve a acolher os apelos e desafios de Deus.

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 91 (92)

    Refrão: É bom louvar-Vos, Senhor.

    É bom louvar o Senhor
    e cantar salmos ao vosso nome, ó Altíssimo,
    proclamar pela manhã a vossa bondade
    e durante a noite a vossa fidelidade.

    O justo florescerá como a palmeira,
    crescerá como o cedro do Líbano;
    plantado na casa do Senhor,
    florescerá nos átrios do nosso Deus.

    Mesmo na velhice dará o seu fruto,
    cheio de seiva e de vigor,
    para proclamar que o Senhor é justo:
    n'Ele, que é o meu refúgio, não há iniquidade.
    LEITURA II - 2 Cor 5, 6-10

    Leitura da Segunda Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios

    Irmãos:
    Nós estamos sempre cheios de confiança,
    sabendo que, enquanto habitarmos neste corpo,
    vivemos como exilados, longe do Senhor,
    pois caminhamos à luz da fé e não da visão clara.
    E com esta confiança, preferíamos exilar-nos do corpo,
    para irmos habitar junto do Senhor.
    Por isso nos empenhamos em ser-Lhe agradáveis,
    quer continuemos a habitar no corpo,
    quer tenhamos de sair dele.
    Todos nós devemos comparecer perante o tribunal de Cristo,
    para que receba cada qual o que tiver merecido,
    enquanto esteve no corpo,
    quer o bem, quer o mal.

    AMBIENTE

    Por volta de 56/57, chegam a Corinto missionários itinerantes que se apresentam como apóstolos e criticam Paulo, lançando a confusão na comunidade. Provavelmente, trata-se desses "judaizantes" que queriam impor aos pagãos convertidos as práticas da Lei de Moisés (embora também possam ser cristãos que condenam a severidade de Paulo e que apoiam o laxismo da vida dos coríntios). De qualquer forma, Paulo é informado de que a validade do seu ministério está a ser desafiada e dirige-se a toda a pressa para Corinto, disposto a enfrentar o problema. O confronto é violento e Paulo é gravemente injuriado por um membro da comunidade (cf. 2 Cor 2,5-11; 7,11). Na sequência, Paulo abandona Corinto e parte para Éfeso. Passado algum tempo, Paulo envia Tito a Corinto, a fim de tentar a reconciliação. Quando Tito regressa, traz notícias animadoras: o diferendo foi ultrapassado e os coríntios estão, outra vez, em comunhão com Paulo. É nessa altura que Paulo, aliviado e com o coração em paz, escreve esta Carta aos Coríntios, fazendo uma tranquila apologia do seu apostolado.
    O texto que nos é proposto está incluído na primeira parte da Carta (2 Cor 1,3-7,16), onde Paulo reflecte e escreve sobre a grandeza e as dificuldades, os riscos e as compensações do ministério apostólico.
    Na perícopa que vai de 4,16 a 5,10, Paulo defende a ideia de que, apesar de tudo, vale a pena acolher os desafios de Deus: no final do caminho percorrido nesta terra, espera-nos uma vida nova, uma vida plena e eterna. Para pintar o contraste entre a vida nesta terra e a vida futura, Paulo utiliza (cf. 2 Cor 5,1-4) a imagem da tenda que se monta e desmonta (que representa a vida transitória e corruptível desta terra) e da casa solidamente construída (que representa a vida plena e eterna).

    MENSAGEM

    A vida terrena, passageira e mortal é, para Paulo, um exílio "longe do Senhor" (vers. 6). Esse tempo de exílio neste mundo caracteriza-se por um conhecimento de Deus parcial: é o tempo da fé. Paulo - como todos os verdadeiros crentes - anseia pelo tempo "da visão" - isto é, pelo tempo do encontro face a face com Deus. Então, a vida caduca e transitória dará lugar a uma vida gloriosa e indestrutível.
    Uma leitura simplista destes versículos poderia transmitir a ideia de que Paulo negligencia a vida terrena; contudo, essa ideia não é exacta... Para Paulo, a perspectiva dessa outra vida nova, plena e eterna, não significa um alhear-se das responsabilidades que temos, como crentes, enquanto caminhamos neste mundo finito e transitório. Aos crentes compete, enquanto "habitam este corpo" mortal, viver de acordo com as exigências de Deus, caminhar à luz da fé, assumir as suas responsabilidades enquanto discípulos comprometidos com Cristo e com o seu Reino. A perspectiva dessa vida plena que nos espera para além desta terra deve estar permanentemente no horizonte do crente que caminha pela história, fundamentar e iluminar o seu compromisso e a sua fidelidade a Jesus Cristo e ao Evangelho.
    De resto, a preocupação de Paulo não é apresentar uma doutrina escatológica perfeitamente definida; mas é, sobretudo, lembrar aos cristãos a sua condição de peregrinos, que "não têm morada permanente" nesta terra: o destino final de cada homem ou mulher é o encontro com o Senhor, a vida plena e definitiva.

    ACTUALIZAÇÃO

    ¨ A cultura actual é uma cultura do provisório, que dá prioridade ao que é efémero sobre as realidades perenes com a marca da eternidade: propõe que se viva ao sabor do imediato e do momento, e subalterniza as opções definitivas e os valores duradouros. É também uma cultura do bem-estar material: ao seduzir os homens com o brilho dos bens perecíveis, ao potenciar o reinado do "ter" sobre o "ser", escraviza o homem e relativiza a sua busca de eternidade. É ainda uma cultura da facilidade, que ensina a evitar tudo o que exige esforço, sofrimento e luta: produz pessoas incapazes de lutar por objectivos exigentes e por realizar projectos que exijam esforço, fidelidade, compromisso, sacrifício. Neste contexto, a palavra de Paulo aos cristãos de Corinto soa a desafio profético: é necessário que tenhamos sempre diante dos olhos a nossa condição de "peregrinos" nesta terra e que aprendamos a dar valor àquilo que tem a marca da eternidade. É nos valores duradouros - e não nos valores efémeros e passageiros - que encontramos a vida plena. O fim último da nossa existência não está nesta terra; o nosso horizonte e as nossas apostas devem apontar sempre para o mais além, para a vida plena e definitiva.

    ¨ Contudo, o facto de vivermos a olhar para o mais além não pode levar-nos a ignorar as realidades terrenas e os compromissos com a construção da cidade dos homens. O Reino de Deus - que atingirá a sua plena maturação quando tivermos ultrapassado o transitório e o efémero da vida presente - começa a ser construído nesta terra e exige o nosso compromisso pleno com a construção de um mundo mais justo, mais fraterno, mais verdadeiro. Não há comunhão com Cristo se nos demitimos das nossas responsabilidades em testemunhar os gestos e os valores de Cristo.

    ALELUIA

    Aleluia. Aleluia.

    A semente é a palavra de Deus e o semeador é Cristo:
    quem O encontrar permanecerá para sempre.
    EVANGELHO - Mc 4, 26-34

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos

    Naquele tempo,
    disse Jesus à multidão:
    «O reino de Deus é como um homem
    que lançou a semente à terra.
    Dorme e levanta-se, noite e dia,
    enquanto a semente germina e cresce, sem ele saber como.
    A terra produz por si, primeiro a planta, depois a espiga,
    por fim o trigo maduro na espiga.
    E quando o trigo o permite, logo mete a foice,
    porque já chegou o tempo da colheita».
    Jesus dizia ainda:
    «A que havemos de comparar o reino de Deus?
    Em que parábola o havemos de apresentar?
    É como um grão de mostarda, que, ao ser semeado na terra,
    é a menor de todas as sementes que há sobre a terra;
    mas, depois de semeado, começa a crescer,
    e torna-se a maior de todas as plantas da horta,
    estendendo de tal forma os seus ramos
    que as aves do céu podem abrigar-se à sua sombra».
    Jesus pregava-lhes a palavra de Deus
    com muitas parábolas como estas,
    conforme eram capazes de entender.
    E não lhes falava senão em parábolas;
    mas, em particular, tudo explicava aos seus discípulos.

    AMBIENTE

    Na primeira parte do Evangelho segundo Marcos (cf. Mc 1,14-8,30), Jesus é apresentado como o Messias que proclama o Reino de Deus. Marcos procura aí demonstrar como Jesus, com palavras e gestos, anuncia um mundo novo (o "Reino de Deus"), livre do egoísmo, da opressão, da injustiça e de tudo o que escraviza os homens e os impede de ter acesso à vida verdadeira.
    Estamos na Galileia, nos primeiros tempos do anúncio do Reino. Uma grande multidão segue Jesus, a fim de escutar os seus ensinamentos (cf. Mc 3,7.20.32; 4,1). Para fazer chegar a todos a sua proposta, Jesus precisará de utilizar uma linguagem acessível, viva, questionadora, concreta, desafiadora, evocadora, pedagógica, que pudesse semear no coração dos ouvintes a consciência dessa nova e revolucionária realidade que Ele queria propor. É neste contexto que nos aparecem as "parábolas".
    As "parábolas" são uma linguagem habitual na literatura dos povos do Médio Oriente: o génio oriental gosta mais de falar e instruir através de imagens, de comparações, de alegorias, do que através de um discurso mais lógico, mais frio, mais racional. De resto, a linguagem parabólica tem várias vantagens em relação a um discurso mais racional e expositivo. Que vantagens?
    Em primeiro lugar, é uma excelente arma de controvérsia. A linguagem figurada permite levar o interlocutor a admitir certos pontos que, de outro modo, nunca mereceriam a sua concordância. A parábola é, pois, um bom instrumento de diálogo, sobretudo em contextos polémicos (como era, quase sempre, o contexto em que Jesus pregava).
    Em segundo lugar, a imagem ou comparação que caracteriza a linguagem parabólica é muito mais rica em força de comunicação e em poder de evocação, do que a simples exposição teórica. Talvez seja uma linguagem mais vaga e imprecisa, do ponto de vista racional; mas é mais profunda, mais carregada de sentido, mais evocadora e, por isso, "mexe" mais com os ouvintes.
    Em terceiro lugar, porque a linguagem parabólica - muito mais do que outro tipo de linguagem - espicaça a curiosidade e incita à busca. Na sua simplicidade, torna-se um verdadeiro método pedagógico, que leva as pessoas a pensar por si, a medir os prós e os contras, a tirar conclusões, a interiorizar soluções e a integrá-las na própria vida. É uma linguagem que, mais do que injectar nas pessoas soluções feitas, as leva a reflectir e a tirar daí as devidas consequências. Trata-se, pois, de linguagem altamente subversiva: ensina o povo a pensar, a ser crítico, a descobrir onde está a verdade. Ora, isso é altamente incómodo para os defensores do mundo velho e da ordem estabelecida.
    Uma linguagem tão sugestiva não podia ser ignorada por Jesus no seu anúncio do "Reino de Deus". É neste contexto que devemos entender as duas parábolas que o Evangelho deste domingo nos apresenta.

    MENSAGEM

    A primeira parábola (vers. 26-29) é a do grão que germina e cresce por si só. A parábola refere a intervenção do agricultor apenas no acto de semear e no acto de ceifar. Cala, de propósito, qualquer menção às demais acções do agricultor: arar a terra, regar a semente, tirar as ervas que a impedem de crescer... Ao narrador interessa apenas que, entre a sementeira e a colheita, a semente vá crescendo e amadurecendo, sem que o homem intervenha para impedir ou acelerar o processo. A questão essencial não é o que o agricultor faz, mas o dinamismo vital da semente. O resultado final não depende dos esforços e da habilidade do homem, mas sim do dinamismo da semente que foi lançada à terra. Desta forma, o narrador ensina que o Reino de Deus (a semente) é uma iniciativa divina: é Deus quem actua no silêncio da noite, no tumulto do dia ou na turbulência da história para que o Reino aconteça; e nenhum obstáculo poderá frustrar o seu plano. Provavelmente, a parábola é dirigida contra todas as posturas que pretendiam forçar a vinda do Reino - a dos zelotas que queriam instaurar o Reino através da violência das armas, a dos fariseus que pretendiam forçar o aparecimento do Reino com a obediência a uma disciplina legal, a dos apocalípticos que faziam cálculos precisos sobre a data da irrupção do Reino. Não adianta forçar o tempo ou os resultados: é Deus que dirige a marcha da história e que fará com que o Reino aconteça, de acordo com o seu tempo e o seu projecto. Desta forma, a parábola convida à serenidade e à confiança nesse Deus que não dorme nem se demite e que não deixará de realizar, a seu tempo e de acordo com a sua lógica, o seu plano para os homens e para o mundo.
    A segunda parábola (vers. 30-32) é a do grão de mostarda. O narrador pretende, fundamentalmente, pôr em relevo o contraste entre a pequenez da semente (a semente da mostarda negra tem um diâmetro aproximado de 1,6 milímetros e era a semente mais pequena, no entendimento popular palestino; a tradição judaica celebrava com provérbios a sua pequenez) e a grandeza da árvore (nas margens do lago da Galileia alcançava uma altura de 2 a 4 metros). A comparação serve para dizer que a semente do Reino lançada pelo anúncio de Jesus pode parecer uma realidade pequena e insignificante, mas está destinada a atingir todos os cantos do mundo, encarnando em cada pessoa, em cada povo, em cada sociedade, em cada cultura. O Reino de Deus, ainda que tenha inícios modestos ou que se apresente com sinais de debilidade e pequenez aos olhos do mundo, tem uma força irresistível, pois encerra em si o dinamismo de Deus. Além disso, a parábola retoma um tema que já havíamos encontrado na primeira leitura: Deus serve-Se de algo que é pequeno e insignificante aos olhos do mundo para concretizar os seus projectos de salvação e de graça em favor dos homens.
    A parábola é um convite à esperança, à confiança e à paciência. Nos factos aparentemente irrelevantes, na simplicidade e normalidade de cada dia, na insignificância dos meios, esconde-se o dinamismo de Deus que actua na história e que oferece aos homens caminhos de salvação e de vida plena.

    ACTUALIZAÇÃO

    ¨ Antes de mais, o Evangelho deste domingo garante-nos que Deus tem em marcha um projecto destinado a oferecer aos homens a vida e a salvação. Pode parecer que a nossa história caminha entregue ao acaso ou aos caprichos dos líderes; pode parecer que a história humana entrou em derrapagem e que, no final do caminho, nos espera o abismo; mas é Deus que conduz a história, que lhe imprime o seu dinamismo, que está presente em todos os passos do nosso caminho. Deus caminha connosco e, garantidamente, leva-nos pela mão ao encontro de um final feliz. Num tempo histórico como o nosso, marcado por "sombras", por crises e por graves inquietações, este é um dos testemunhos mais importantes que podemos, como crentes, oferecer aos nossos irmãos escravizados pelo desespero e pelo medo.

    ¨ O projecto de salvação que Deus tem para a humanidade revela-se no anúncio do Reino, feito por Jesus de Nazaré. Nas suas palavras, nos seus gestos, Jesus propôs um caminho novo, uma nova realidade; lançou a semente da transformação dos corações, das mentes e das vontades, de forma a que a vida dos homens e das sociedades se construa de acordo com os esquemas de Deus. Essa semente não foi lançada em vão: está entre nós e cresce por acção de Deus. Resta-nos acolher essa semente e deixar que Deus realize a sua acção. Resta-nos também, como discípulos de Jesus, continuar a lançar essa semente do Reino, a fim de que ela encontre lugar no coração de cada homem e de cada mulher.

    ¨ Os que, continuando a missão de Jesus, anunciam a Palavra (que lançam a semente) não devem preocupar-se com a forma como ela cresce e se desenvolve. Devem, apenas, confiar na eficácia da Palavra anunciada, conformar-se com o tempo e o ritmo de Deus, confiar na acção de Deus e no dinamismo intrínseco da Palavra semeada. Isso equivale a respeitar o crescimento de cada pessoa, o seu processo de maturação, a sua busca de caminhos de vida e de plenitude. Não nos compete exigir que os outros caminhem ao nosso ritmo, que pensem como nós, que passem pelas mesmas experiências e exigências que para nós são válidas. Há que respeitar a consciência e o ritmo de caminhada de cada homem ou mulher - como Deus sempre faz.

    ¨ A referência à pequenez da semente (segunda parábola) convida-nos - como já o havia feito a primeira leitura deste domingo - a rever os nossos critérios de actuação e a nossa forma de olhar o mundo e os nossos irmãos. Por vezes, é naquilo que é pequeno, débil e aparentemente insignificante que Deus Se revela. Deus está nos pequenos, nos humildes, nos pobres, nos que renunciaram a esquemas de triunfalismo e de ostentação; e é deles que Deus Se serve para transformar o mundo. Atitudes de arrogância, de ambição desmedida, de poder a qualquer custo, não são sinais do Reino. Sempre que nos deixamos levar por tentações de grandeza, de orgulho, de prepotência, de vaidade, estamos a frustrar o projecto de Deus, a impedir que o Reino de Deus se torne realidade no mundo e nas nossas vidas.

    A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 11º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.pt

  • 12º Domingo do Tempo Comum - Ano B

    12º Domingo do Tempo Comum - Ano B


    23 de Junho, 2024

    12º Domingo do Tempo Comum - Ano B

    Tema do 12º Domingo do Tempo Comum

    Deus preocupa-se com os dramas dos homens? Onde está Ele nos momentos de sofrimento e de dificuldade que enfrentamos ao longo da nossa vida? A liturgia do 12º Domingo do Tempo Comum diz-nos que, ao longo da sua caminhada pela terra, o homem não está perdido, sozinho, abandonado à sua sorte; mas Deus caminha ao seu lado, cuidando dele com amor de pai e oferecendo-lhe a cada passo a vida e a salvação.
    A primeira leitura fala-nos de um Deus majestoso e omnipotente, que domina a natureza e que tem um plano perfeito e estável para o mundo. O homem, na sua pequenez e finitude, nem sempre consegue entender a lógica dos planos de Deus; resta-lhe, no entanto, entregar-se nas mãos de Deus com humildade e com total confiança.
    No Evangelho, Marcos propõe-nos uma catequese sobre a caminhada dos discípulos em missão no mundo... Marcos garante-nos que os discípulos nunca estão sozinhos a enfrentar as tempestades que todos os dias se levantam no mar da vida... Os discípulos nada têm a temer, porque Cristo vai com eles, ajudando-os a vencer a oposição das forças que se opõe à vida e à salvação dos homens.
    A segunda leitura garante-nos que o nosso Deus não é um Deus indiferente, que deixa os homens abandonados à sua sorte. A vinda de Jesus ao mundo para nos libertar do egoísmo que escraviza e para nos propor a liberdade do amor mostra que o nosso Deus é um Deus interveniente, que nos ama e que quer ensinar-nos o caminho da vida.

    LEITURA I - Job 38,1.8-11

    Leitura do Livro de Job

    O Senhor respondeu a Job do meio da tempestade, dizendo:
    «Quem encerrou o mar entre dois batentes,
    quando ele irrompeu do seio do abismo,
    quando Eu o revesti de neblina
    e o envolvi com uma nuvem sombria,
    quando lhe fixei limites e lhe tranquei portas e ferrolhos?
    E disse-lhe:
    'Chegarás até aqui e não irás mais além,
    aqui se quebrará a altivez das tuas vagas'».

    AMBIENTE

    O Livro de Job é um clássico da literatura universal, não só pela sua extraordinária beleza literária, mas também pelas questões que aborda e que tocam o âmago da existência humana. A história serve de pretexto para reflectir sobre certos temas fundamentais sobre as quais o homem sempre se interroga, como são a questão do sofrimento do justo inocente, a situação do homem diante de Deus e a atitude de Deus face ao homem.
    Apresenta-nos a história de um homem bom e justo (Job), repentinamente atingido por um vendaval de desgraças que lhe rouba a riqueza, a família e a própria saúde. No corpo central do livro (cf. Job 3,1-37,24), Job interroga-se acerca da origem do sofrimento que o atingiu e do papel de Deus no seu drama pessoal. Alguns dos amigos de Job procuram responder às suas questões, apresentando as explicações dadas pela teologia oficial: o sofrimento é sempre o resultado do pecado do homem; assim, se Job está a sofrer, é porque pecou... Com a veemência que vem de uma consciência em paz, Job recusa conclusões tão simplistas e demonstra a falência da doutrina oficial para explicar o seu drama pessoal. Com um apurado sentido crítico, Job vai desmontando os dogmas fundamentais da fé de Israel e recusando esse Deus "contabilista" que Se limita a registar as acções boas e más do homem para lhe pagar em conformidade. Deus não pode ser isso; e o caso concreto de Job prova-o.
    Rejeitada a explicação tradicional para o drama do sofrimento, Job dirige-se directamente àquele que lhe pode fornecer as respostas: o próprio Deus. No seu discurso, muito crítico, cruzam-se a animosidade, a violência, as queixas, o inconformismo, a dúvida, a revolta, com a esperança, a fé e a confiança em Deus. Quando, finalmente, Deus enfrenta Job, recorda-lhe o seu lugar de criatura, limitada e finita; mostra-lhe como só Ele conhece as leis que regem o universo e a vida, mostra-lhe a sua preocupação e o seu amor com cada ser criado; convida-o a não se pôr em bicos de pés, a ocupar o seu lugar de criatura e a não pôr em causa os desígnios de Deus para o mundo, já que esses desígnios ultrapassam infinitamente a capacidade de compreensão e de entendimento de qualquer criatura. Deus tem uma lógica, um plano, um projecto que ultrapassa infinitamente aquilo que cada homem (também Job) poderá entender.
    A história termina com Job a perceber o seu lugar, a reconhecer a transcendência de Deus e a incompreensibilidade dos seus projectos, a entregar-se nas mãos de Deus com humildade e confiança.
    O texto que nos é proposto faz parte do discurso com que Deus responde a Job (cf. Job 38,1-40,2). Nesse discurso, Deus coloca a Job uma série de questões sobre a terra, o mar, os grandes mistérios da natureza e da vida; a finalidade não é obter respostas de Job, mas levá-lo a perceber os seus limites, a sua ignorância, a sua incapacidade para entender o mistério insondável de Deus e os projectos que Deus tem para o mundo e para os homens.

    MENSAGEM

    O nosso texto começa por apresentar Jahwéh a responder a Job "do meio da tempestade" (vers. 1). É o quadro habitual das teofanias (cf. Ex 19,16); serve para emoldurar a manifestação aos homens do Deus todo-poderoso, o soberano de toda a terra.
    Portanto, Jahwéh manifesta-se a Job; o objectivo dessa manifestação é responder às questões de Job e fazer Job perceber a insensatez das suas críticas. Depois de se apresentar como o grande arquitecto que construiu a terra (cf. Job 38,4-7), Jahwéh refere-se ao seu papel no sentido de controlar o mar. Foi Ele quem "encerrou o mar entre dois batentes" (vers. 8) e que lhe "fixou os limites" (vers. 10).
    As antigas lendas mesopotâmicas sobre a criação apresentavam as "águas salgadas" (representadas pela deusa Tiamat) como um monstro criador do caos e da desordem; na sua luta para organizar o cosmos, Marduk, o deus mesopotâmico da ordem lutou contra o mar, venceu-o e pôs-lhe limites.
    O Povo bíblico foi, naturalmente, influenciado pelos mitos de criação mesopotâmicos; por isso, viu no mar uma realidade assustadora, indomável, orgulhosa, desordenada, onde residiam os poderes caóticos que o homem não conseguia controlar... No entanto, os catequistas de Israel sempre asseguraram que a Palavra criadora de Jahwéh impôs às águas tumultuosas do mar, de uma vez para sempre, os seus limites ("Deus disse: 'reúnam-se as águas que estão debaixo dos céus num único lugar, a fim de aparecer a terra seca'. E assim aconteceu" - Gn 1,9). Jahwéh não precisou de lutar furiosamente contra o mar, como Marduk, o deus dos mitos mesopotâmicos; mas limitou-Se a organizar o mundo impondo às águas, com o seu poder, um limite que elas não poderão nunca atravessar sem ordem divina. O mar, controlado e encerrado dentro dos seus limites naturais, é um testemunho do poder supremo de Deus; mostra o domínio perfeito de Deus sobre toda a criação.
    Ao recordar a Job a sua acção criadora sobre o mar, Jahwéh apresenta-Se, antes de mais, intocável na sua transcendência e majestade; e mostra, depois, que tem para a criação um plano estável, amadurecido, consolidado, irrevogável... Quem é Job para pôr em causa os desígnios desse Deus criador que, com a sua Palavra, controlou o mar? Job é convidado a aceitar que um Deus de quem depende toda a criação, que até submete o mar, que cuida da criação com cuidados de pai, sabe o que está a fazer e tem uma solução para os problemas e dramas do homem... O homem, na sua situação de criatura finita e limitada, é que nem sempre consegue ver e perceber o alcance e o sentido último dos projectos de Deus.
    Em conclusão: só Deus tem todas as respostas; ao homem resta reconhecer os seus limites de criatura e entregar-se nas mãos desse Deus omnipotente e majestoso, que tem um projecto para o mundo. Ao homem finito e limitado resta confiar em Deus e ver n'Ele a sua esperança e a sua salvação.

    ACTUALIZAÇÃO

    ¨ Convivemos diariamente com realidades positivas e negativas, com "luzes" e "sombras". Normalmente, as "sombras" marcam-nos muito e constituem uma fonte de preocupação e de inquietação... O terrorismo e a violência trazem-nos sofrimento e insegurança; as novas doenças geram medo e inquietação; as catástrofes naturais fazem-nos sentir impotentes e indefesos; as injustiças e arbitrariedades provocam revolta e descontentamento; o desmoronamento de velhas estruturas políticas e sociais provocam anarquia e caos; o fabrico e o comércio de armas de destruição em massa trazem-nos ansiosos e preocupados... Confusos e desorientados, viramo-nos para Deus... Por vezes, criticamos a sua indiferença face aos dramas do mundo; outras vezes, sentimos a tentação de Lhe mostrar, de forma clara e lógica, como é que Ele devia actuar para que o mundo fosse melhor... A leitura do Livro de Job que hoje nos é proposta convida-nos, antes de mais, a não nos pormos em bicos de pés e a não exigirmos a Deus que actue segundo as nossas lógicas humanas.

    ¨ Na verdade, o Deus que criou tudo o que existe, que estabeleceu as leis cósmicas, que conhece os segredos de cada uma das suas criaturas, que cuida de cada ser com cuidados de pai, que mil vezes manifestou na história o seu amor e a sua bondade, não pode ignorar os problemas do homem, ou deixar que a humanidade chegue a um beco sem saída. O nosso Deus está presente na história humana e sabe para onde caminhamos. Ele tem um projecto coerente, maduro, estável, irrevogável para o mundo e para os homens... Por vezes, o sentido desse projecto pode escapar-nos; mas Deus sabe para onde caminhamos e conduz-nos, através das armadilhas da história, ao encontro da realização plena, da vida definitiva.

    ¨ Mergulhados no mistério insondável desse Deus omnipotente, por vezes desconcertante e incompreensível, resta ao crente entregar-se nas suas mãos com humildade e confiar n'Ele. O verdadeiro crente é aquele que reconhece a pequenez e finitude que são as marcas da humanidade, que reconhece que os projectos de Deus não podem entender-se à luz da nossa pobre lógica humana e que se atira, confiante, para os braços de Deus; o verdadeiro crente é aquele que, mesmo sem entender totalmente os projectos de Deus, aprende a entregar-se a Ele, a obedecer-Lhe incondicionalmente, a vê-l'O como a razão última da sua vida e da sua esperança.

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 106 (107)

    Refrão 1: Dai graças ao Senhor,
    porque é eterna a sua misericórdia.

    Refrão 2: Cantai ao Senhor, porque é eterno o seu amor.

    Os que se fizeram ao mar em seus navios,
    a fim de labutar na imensidão das águas,
    esses viram os prodígios do Senhor
    e as suas maravilhas no alto mar.

    À sua palavra, soprou um vento de tempestade,
    que fez encapelar as ondas:
    subiam até aos céus, desciam até ao abismo,
    lutavam entre a vida e a morte.

    Na sua angústia invocaram o Senhor
    e Ele salvou-os da aflição.
    Transformou o temporal em brisa suave
    e as ondas do mar amainaram.

    Alegraram-se ao vê-las acalmadas,
    e Ele conduziu-os ao porto desejado.
    Graças ao Senhor pela sua misericórdia,
    pelos seus prodígios em favor dos homens.

    LEITURA II - 2 Cor 5,14-17

    Leitura da Segunda Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios

    Irmãos:
    O amor de Cristo nos impele,
    ao pensarmos que um só morreu por todos
    e que todos, portanto, morreram.
    Cristo morreu por todos,
    para que os vivos deixem de viver para si próprios,
    mas vivam para Aquele que morreu e ressuscitou por eles.
    Assim, daqui em diante,
    já não conhecemos ninguém segundo a carne.
    Ainda que tenhamos conhecido a Cristo segundo a carne,
    agora já não O conhecemos assim.
    Se alguém está em Cristo, é uma nova criatura.
    As coisas antigas passaram: tudo foi renovado.

    AMBIENTE

    A Primeira Carta aos Coríntios (que criticava alguns membros da comunidade por atitudes pouco condizentes com os valores cristãos) provocou uma reacção extremada e uma campanha organizada no sentido de desacreditar Paulo. Essa campanha parece ter sido instigada por missionários itinerantes procedentes das comunidades cristãs da Palestina, que se consideravam representantes dos Doze e que minimizavam o trabalho apostólico de Paulo (afirmavam, inclusive, que Paulo era inferior aos outros apóstolos, por não ter convivido com Jesus enquanto Ele andou pela Palestina com os seus discípulos). Paulo, informado de tudo, dirigiu-se apressadamente para Corinto e teve um violento confronto com os seus detractores. Depois, retirou-se para Éfeso. Tito, amigo de Paulo, fino negociador e hábil diplomata, partiu para Corinto, a fim de tentar a reconciliação.
    Paulo, entretanto, partiu para Tróade. Foi aí que reencontrou Tito, regressado de Corinto. As notícias trazidas por Tito eram animadoras: o diferendo fora ultrapassado e os coríntios estavam, outra vez, em comunhão com Paulo.
    Reconfortado, Paulo escreveu uma tranquila apologia do seu apostolado, à qual juntou um apelo em favor de uma colecta para os pobres da Igreja de Jerusalém. Esse texto é a nossa Segunda Carta de Paulo aos Coríntios. Estamos nos anos 56/57.
    O texto que nos é proposto integra a primeira parte da Carta, onde Paulo analisa as suas relações com a comunidade de Corinto e explica os princípios que sempre nortearam a sua acção pastoral (cf. 2 Cor 1,3-7,16).

    MENSAGEM

    O que é que realmente "move" Paulo? Qual a razão do seu ministério? Porque é que Paulo - que até nem conheceu o Jesus histórico, como os Doze - insiste em anunciá-lo? Paulo não estará a extravasar as suas funções?
    Paulo fez a experiência do amor de Cristo e deixou-se absorver por esse amor. A sua acção apostólica tem apenas como objectivo levar o amor de Cristo ao conhecimento de todos os homens. Cristo morreu por todos, a fim de que os homens, aprendendo a lição do amor que se dá até às últimas consequências, deixassem a vida velha, marcada por esquemas de egoísmo e de pecado. Contemplando o Cristo que oferece a sua vida ao Pai e aos irmãos, os homens não viverão, nunca mais, fechados em si mesmos; mas viverão, como Cristo, com o coração aberto a Deus e aos outros homens (vers. 14-15). É esta "boa nova" que absorve Paulo completamente e que ele quer passar a todos os seus irmãos.
    Com franqueza, Paulo admite que, no passado, entendeu Cristo "à maneira humana" e não percebeu que a sua doação até à morte era expressão de um amor ilimitado; mas, depois de se ter encontrado com Cristo ressuscitado na estrada de Damasco, Paulo passou a ver as coisas de forma diferente (vers. 16).
    Paulo quer anunciar - por mandato de Cristo - que a adesão a Cristo faz desaparecer o homem velho do egoísmo e do pecado e faz surgir uma nova criatura (vers. 17). A palavra grega aqui utilizada por Paulo ("ktisis") pode significar "criação", "criatura" ou "humanidade"... O cristão, que aderiu a Cristo, é uma nova criatura, o membro de uma nova humanidade. Identificado com Cristo, ele corre ao encontro do Homem Novo, da vida plena e verdadeira, da salvação definitiva.
    É isto que "faz correr" Paulo... Ele experimentou o amor de Cristo e tornou-se uma nova criatura. Agora, ele sente que Deus o manda testemunhar essa experiência diante de todos os homens.

    ACTUALIZAÇÃO

    ¨ Antes de mais, o texto dá conta da preocupação de Deus com a vida e a felicidade dos homens. A vinda de Jesus ao mundo, a sua luta contra o egoísmo e o pecado, o seu amor incondicional, a sua morte na cruz, pretendeu libertar os homens dos velhos esquemas de escravidão e de fechamento que impediam os homens de ter acesso à vida plena e verdadeira. Contemplar o amor de Deus, tornado presença efectiva na vida dos homens em Jesus, assegura-nos que Deus Se preocupa connosco e que está sempre atento à nossa realização e à nossa felicidade. O nosso Deus não é um Deus indiferente, que deixa os homens abandonados à sua sorte; mas é um Deus interveniente, que nos ama e que, a cada instante, está presente ao nosso lado, a indicar-nos os caminhos da vida.

    ¨ O objectivo de Deus é fazer aparecer o Homem Novo e a Nova Humanidade. Aos homens, é pedido que aceitem a proposta de Deus, que aceitem renunciar à vida velha do egoísmo e da escravidão e que aceitem nascer, livres e transformados, para o amor que nos torna livres. Como é que acolhemos esta proposta de Deus? Ela conta alguma coisa para nós?

    ¨ Paulo, depois de ter encontrado Jesus, de ter aderido à sua proposta e de ter feito a experiência da liberdade e da vida nova, tornou-se testemunha, diante dos homens, do projecto salvador e libertador de Deus para os homens. Cada homem e cada mulher que se encontra com Jesus e que faz a mesma experiência de Paulo, tem de tornar-se arauto das propostas de Deus e de anunciar aos seus irmãos, com gestos concretos, essa oferta de vida nova e verdadeira que Deus nos faz.

    ALELUIA - Lc 7,16

    Aleluia. Aleluia.

    Apareceu entre nós um grande profeta:
    Deus visitou o seu povo.
    EVANGELHO - Mc 4,35-41

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos

    Naquele dia, ao cair da tarde,
    Jesus disse aos seus discípulos:
    «Passemos à outra margem do lago».
    Eles deixaram a multidão
    e levaram Jesus consigo na barca em que estava sentado.
    Iam com Ele outras embarcações.
    Levantou-se então uma grande tormenta
    e as ondas eram tão altas que enchiam a barca de água.
    Jesus, à popa, dormia com a cabeça numa almofada.
    Eles acordaram-n'O e disseram:
    «Mestre, não Te importas que pereçamos?»
    Jesus levantou-Se,
    falou ao vento imperiosamente e disse ao mar:
    «Cala-te e está quieto».
    O vento cessou e fez-se grande bonança.
    Depois disse aos discípulos:
    «Porque estais tão assustados? Ainda não tendes fé?»
    Eles ficaram cheios de temor e diziam uns para os outros:
    «Quem é este homem,
    que até o vento e o mar Lhe obedecem?»

    AMBIENTE

    Na primeira parte do Evangelho segundo Marcos (cf. Mc 1,14-8,30), Jesus é apresentado como o Messias que proclama o Reino de Deus. Marcos procura aí demonstrar como Jesus, com palavras e com gestos, anuncia um mundo novo (o "reino de Deus"), livre do egoísmo, da opressão, da injustiça e de tudo o que escraviza os homens e os impede de ter acesso à vida verdadeira. O texto que hoje nos é proposto deve ser visto neste ambiente.
    O nosso texto começa com a indicação de que Jesus decidiu passar "à outra margem". A "outra margem" (do lago de Tiberíades, evidentemente) é o território pagão da Decápole. A Decápole ("dez cidades") era o nome dado ao território situado na Palestina oriental, estendendo-se desde Damasco, ao norte, até Filadélfia, ao sul. O nome servia para designar uma liga de dez cidades, que se formou depois da conquista da Palestina pelos romanos, no ano 63 a.C.. As "dez cidades" que formavam esta liga eram helenísticas e não estavam sujeitas às leis judaicas. As cidades que integravam a Decápole (bem como os territórios circundantes a cada uma dessas cidades) estavam sob a administração do legado romano da Síria. Eram território pagão, considerado pelos judeus completamente à margem dos caminhos da salvação.
    O episódio que Marcos nos narra, neste domingo, passa-se durante a travessia do Lago de Tiberíades. O Lago de Tiberíades, designado frequentemente por "Mar da Galileia", é um lago de água doce, alimentado sobretudo pelas águas do rio Jordão, com 12 quilómetros de largura e 21 quilómetros de comprimento. As tempestades que se levantavam neste "mar" podiam aparecer subitamente e ser especialmente violentas.
    Para entendermos melhor o que está em causa no episódio que hoje Marcos nos propõe, convém ter presente o que dissemos na primeira leitura a propósito do que o "mar" significava para a mentalidade judaica: era uma realidade assustadora, indomável, orgulhosa, desordenada, onde residiam os poderes caóticos que o homem não conseguia controlar e onde estavam os poderes maléficos que queriam destruir os homens... Só Deus, com o seu poder e majestade, podia pôr limites ao mar, dar-lhe ordens e libertar os homens dessas forças descontroladas do caos que o mar encerrava.
    Mais do que uma crónica fiel de uma viagem de Jesus com os discípulos através do Lago de Tiberíades, a narração que Marcos nos apresenta deve ser vista como uma página de catequese. Usando elementos com uma forte carga simbólica (o mar, o barco, a tempestade, a noite, o sono de Jesus), Marcos apresenta-nos uma reflexão sobre a comunidade dos discípulos em marcha pela história. Marcos escreve numa época em que a Igreja de Jesus enfrenta sérias "tempestades" (perseguição de Nero, problemas internos causados pela diferença de perspectivas entre judeo-cristãos e pagano-cristãos, dificuldades sentidas pelas comunidades em encontrar o caminho para o futuro...); e pretende dar sugestões aos crentes acerca do caminho a percorrer.

    MENSAGEM

    Reparemos, em primeiro lugar, no "ambiente" em que Marcos nos situa: no mar, ao anoitecer (vers. 35). Situar o barco com Jesus e os discípulos "no mar", é colocá-los num ambiente hostil, adverso, perigoso, caótico, rodeados pelas forças que lutam contra Deus e contra a felicidade do homem. Por outro lado, a "noite" é o tempo das trevas, da falta de luz; aparece como elemento ligado com o medo, com o desânimo, com a falta de perspectivas. O "mar" e a "noite" definem uma realidade de dificuldade, de hostilidade, de incompreensão.
    No "barco" vão Jesus e os discípulos (vers. 36). O "barco" é, na catequese cristã, o símbolo da comunidade de Jesus que navega pela história. Jesus está no "barco", mas são os discípulos que se encarregam da navegação, pois é a eles que é confiada a tarefa de conduzir a comunidade pelo mar da vida.
    O "barco" dirige-se "para a outra margem" (vers. 35b), ao encontro das terras dos pagãos. Com este dado Marcos alude, muito provavelmente, à missão da comunidade cristã, convidada por Jesus a ir ao encontro de todos os homens para lhes levar Jesus e a sua proposta libertadora.
    Durante a travessia, Jesus "dorme" (vers. 38). O "sono" de Jesus durante a viagem refere-se, possivelmente, à sua aparente ausência ao longo da "viagem" que a comunidade cristã faz pela história. Com frequência os discípulos, ocupados em dirigir o "barco", têm a sensação de que estão sós, abandonados à sua sorte e que Jesus não está com eles a enfrentar as vicissitudes da viagem. Na verdade, Jesus está com eles no "barco"; Ele prometeu ficar com eles "até ao fim do mundo".
    A "tempestade" (vers. 37) significa as dificuldades que o mundo opõe à missão dos discípulos. É provável que Marcos estivesse a pensar numa "tempestade" concreta, talvez a perseguição de Nero aos cristãos de Roma, durante a qual foram mortos Pedro e Paulo, bem como muitos outros cristãos (anos 64-68. O Evangelho segundo Marcos deve ter aparecido nessa altura); mas a "tempestade" refere-se também a todos os momentos de crise, de perseguição, de hostilidade que os discípulos terão de enfrentar ao longo do seu caminho histórico, até ao fim dos tempos.
    Jesus, despertado pelos discípulos, acalma a fúria do mar e do vento, com a sua Palavra imperiosa e dominadora (vers. 39). Já dissemos atrás que, na teologia judaica, só Deus era capaz de dominar o mar e as forças hostis que se albergavam no mar. Jesus aparece assim, como o Deus que acompanha a difícil caminhada dos discípulos pelo mundo e que cuida deles no meio das dificuldades e da hostilidade do mundo.
    Depois de aclamar o mar e o vento, Jesus dirige-Se aos discípulos e repreende-os pela sua falta de fé (vers. 40: "porque estais tão assustados? Ainda não tendes fé?"). Os discípulos, depois da caminhada feita com Jesus, já deviam saber que Ele nunca está ausente, nem alheado da vida da sua comunidade. Eles não podem esquecer que, em todas as circunstâncias, Jesus vai com eles no mesmo "barco" e que, por isso, nada têm a temer. A comunidade de Jesus tem de estar consciente de que Jesus está sempre presente e que, portanto, as tempestades da história não poderão impedi-los de concretizar no mundo a missão que lhes foi confiada.
    O nosso texto termina com o "temor" dos discípulos e a pergunta que eles fazem uns aos outros: "Quem é este, a quem até o vento e o mar obedecem?" (vers. 41). O "temor" define o estado de espírito do homem diante da divindade. No universo bíblico, este "temor" não apresenta carácter de pânico ou de medo servil, mas encerra um misterioso poder de atracção que se traduz em obediência, entrega, confiança, entusiasmo. Tal atitude positiva deriva da experiência que o crente israelita tem de Deus: Jahwéh é um Deus presente, que guia o seu Povo com uma solicitude paternal e maternal. Por isso, o crente, se por um lado tem consciência da omnipotência de Deus, por outro lado sabe que pode confiar incondicionalmente n'Ele e entregar-se nas suas mãos. A resposta à questão já está, portanto, dada: o "temor" dos discípulos significa que eles reconhecem que Jesus é o Deus presente no meio dos homens, e a quem os homens são convidados a aderir, a confiar, a obedecer com total entrega.
    A catequese que Marcos nos propõe é, portanto, sobre a caminhada dos discípulos, em missão no mundo... Marcos garante-nos que Cristo está sempre com os discípulos, mesmo quando parece ausente. Os discípulos nada têm a temer, porque Cristo vai com eles, ajudando-os a vencer as forças que se opõem à vida e à salvação dos homens.

    ACTUALIZAÇÃO

    ¨ A imagem de um barco cheio de discípulos convidados por Jesus a passar "à outra margem do lago" e a dar testemunho dessa vida nova que Deus quer oferecer aos homens é uma boa definição de Igreja. Antes de mais, o nosso texto convida-nos a tomar consciência de que a comunidade que nasce de Jesus é uma comunidade missionária, cuja tarefa é ir ao encontro dos homens prisioneiros do egoísmo e do pecado para lhes apresentar a Boa Nova da libertação. Os discípulos de Jesus não podem ficar comodamente instalados nos seus espaços seguros e protegidos, defendidos dos perigos do mundo e alheados dos problemas e necessidades dos homens; mas a Igreja tem de ser uma comunidade empenhada na transformação do mundo, que se preocupa em levar aos homens - a todos os homens, sobretudo aos pobres e marginalizados - com palavras e com gestos a proposta libertadora do Reino.

    ¨ O caminho percorrido pela comunidade de Jesus em missão no mundo é, muitas vezes, um caminho marcado por duras tempestades. Quando a comunidade procura ser fiel à sua vocação e levar a libertação aos homens, confronta-se frequentemente com as forças da injustiça, da opressão e do pecado que não estão interessadas em que o anúncio libertador de Jesus ecoe no mundo (às vezes, essas forças de injustiça e de opressão disfarçam-se com as atraentes roupagens da "moda", do "politicamente correcto" ou do "socialmente aceitável")... Por isso, a comunidade de Jesus conhece, ao longo da sua caminhada, a oposição, a incompreensão, a perseguição, as calúnias e até a morte... No entanto, os discípulos devem estar conscientes de que esse cenário é inevitável e resulta da sua fidelidade ao caminho de Jesus.

    ¨ Muitas vezes, ao longo da caminhada, os discípulos sentem uma tremenda solidão e, confrontados com a oposição e a incompreensão do mundo, experimentam a sua fragilidade e impotência. Parece que Jesus os abandonou; e o silêncio de Jesus desconcerta-os e angustia-os. O Evangelho deste domingo garante-nos que Jesus nunca abandona o barco dos discípulos. Ele está sempre lá, embarcado com eles na mesma aventura, dando-lhes segurança e paz. Nos momentos de crise, de desânimo, de medo, os discípulos têm de ser capazes de descobrir a presença - às vezes silenciosa, mas sempre amiga e reconfortante - de Jesus ao seu lado, no mesmo barco.

    ¨ "Ainda não tendes fé?" - pergunta Jesus aos discípulos... Se os discípulos tivessem fé, não teriam medo e não sentiriam a necessidade de "acordar" Jesus. Estariam conscientes da presença de Jesus ao seu lado em todos os momentos e não estariam à espera de uma intervenção mais ou menos mágica de Jesus para os livrar das dificuldades. O verdadeiro discípulo é aquele que aderiu a Jesus, que vive em permanente comunhão e intimidade com Jesus, que está em permanente escuta de Jesus, que caminha com Jesus, que a cada instante descobre a presença reconfortante de Jesus ao seu lado. Ele conta sempre com Jesus e não se lembra de Jesus apenas nos momentos de dificuldade e de crise...

    ¨ A intervenção de Jesus provoca o "temor" dos discípulos. Dissemos atrás que o "temor" significa, neste contexto, que os discípulos reconhecem que Jesus é o Deus presente no meio dos homens e a quem os homens são convidados a aderir, a confiar, a obedecer com total entrega. Esta "catequese" convida-nos a assumir, diante desse Jesus que nos acompanha sempre, uma atitude semelhante (de "temor") e a aderir incondicionalmente às suas propostas, a confiar n'Ele, a segui-l'O nesse caminho do amor e do dom da vida que Ele nos veio propor.

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 12º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 12º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. BILHETE DE EVANGELHO.
    Seria para repousar? Seria para propor aos seus Apóstolos uma forma de retiro? O facto é que Jesus convida os seus discípulos a passar para a outra margem. A travessia do lago não é de repouso, levanta-se uma tempestade violenta e os Apóstolos estão aterrorizados. Sabem que não estão sozinhos no barco. Eles, os especialistas do lago, admiram-se com o sono de Jesus. Estão perdidos, então despertam Jesus, Ele que veio salvar os que estavam perdidos. Ele vai manifestar, então, que tem autoridade sobre todas as forças da morte, dá uma ordem: "Silêncio! Cala-te!" E fez-se uma grande calmaria. Os Apóstolos, naquele dia, não passaram apenas para a outra margem... Passaram do medo à confiança, graças ao "Passador" que tinha embarcado com eles. Nunca esqueçamos de fazer subir Cristo para o nosso barco, para passarmos com Ele...

    3. À ESCUTA DA PALAVRA.
    Jesus no barco da nossa vida. "Ao cair da tarde..." Toda a cena da tempestade acalmada desenrola-se durante a noite. É o momento em que todas as forças do mal podem agir com toda a impunidade. O barco está "no mar", o lugar onde residem as forças demoníacas. Enfim, a palavra de Jesus ao vento e ao mar - "acalma-te!" - significa também "exorcizar". Dito de outro modo, Marcos quer fazer-nos compreender que, para além da brusca tempestade, os discípulos - e todos os homens - são confrontados a um combate bem mais profundo e dramático: o combate contra o mal, não somente o mal "natural", mas sobretudo o mal que habita e trabalha no coração dos homens. Os apóstolos, ultrapassados pela violência da tempestade, simbolizam os homens ultrapassados pelo poder do mal, que parece vencer, ainda e sempre. Para vencer o mal, é preciso recorrer a um poder maior. Felizmente que Jesus está lá! Ele dispõe do poder divino! Sim, mas Ele dorme tão profundamente que as enormes vagas não o fazem despertar. O seu sono torna-se, pois, a imagem da sua morte. Tudo parece perdido: "Mestre, estamos perdidos!" Jesus acaba por "despertar". Ora, a palavra é a mesma que Marcos empregará para dizer a Ressurreição de Jesus: "Ele despertou de entre os mortos". Podemos, pois, compreender o sentido mais profundo deste milagre da tempestade acalmada. Jesus veio ao coração da nossa história, desceu até ao fundo do mistério do mal que se desencadeia, ainda e sempre, foi até entrar no sono da morte violenta, que os homens esvaziaram de toda a traça de amor, onde parece que não se ouve mais nada, onde o próprio Deus parece dormir, indiferente aos males dos homens: "Mestre, isto não Te diz nada?" Mas Deus, em Jesus, respeitando infinitamente a nossa liberdade, só podia fazer uma coisa: juntar-se às nossas vidas, esconder-se nas nossas tempestades e nas nossas mortes, para aí colocar a sua presença, mais forte que todas as trevas. Só após a vitória aparente da morte é que Ele manifestará o poder da sua Ressurreição. O que Ele nos pede hoje é de crer, de Lhe dar a nossa confiança: "Porque ter medo?" Com Ele na nossa vida, as forças do mal não terão a última palavra.

    4. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE...
    As palavras da nossa fé. No domingo, é importante professar a nossa fé com o Credo da Igreja, para marcar a nossa pertença ao Povo de Deus que nos transmitiu estas palavras. Mas, nesta semana, se pudermos viver uma partilha à volta da questão "quem é Jesus para nós?", poderemos tentar compor uma profissão de fé que retome o essencial desta partilha.

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • S. João Baptista

    S. João Baptista

    24 de Junho, 2024

    João Batista, além da Virgem Maria, é o único santo de quem a Liturgia celebra o nascimento para a terra. João, como "Precursor" de Jesus teve, de fato, um papel único na História da Salvação. Filho de Zacarias e de Isabel, a sua vida não desabrochou por iniciativa humana, mas por dom de Deus a dois pais de idade avançada e, por isso, já sem possibilidade de gerar filhos. Situado na charneira entre o Antigo e o Novo Testamento, como Precursor, João é considerado profeta de um e outro Testamento. O paralelismo estabelecido por Lucas entre a infância de Jesus e de João Batista levou a Liturgia a celebrar o nascimento de ambos: o de Jesus no solstício de Inverno e o de João no solstício de Verão.

    Lectio

    Primeira leitura: Isaías 49, 1-6

    Povos de Além-Mar, escutai-me: povos de longe, prestai atenção. Quando ainda estava no ventre materno, o Senhor chamou-me, quando ainda estava no seio da minha mãe, pronunciou o meu nome.2Fez da minha palavra uma espada afiada, escondeu-me na concha da sua mão. Fez da minha mensagem uma seta penetrante, guardou-me na sua aljava.3Disse-me: «Israel, tu és o meu servo, em ti serei glorificado. 4Eu dizia a mim mesmo: "Em vão me cansei, em vento e em nada gastei as minhas forças." Porém, o meu direito está nas mãos do Senhor, e no meu Deus a minha recompensa. 5E agora o Senhor declara-me que me formou desde o ventre materno, para ser o seu servo, para lhe reconduzir Jacob, e para lhe congregar Israel. Assim me honrou o Senhor. O meu Deus tornou-se a minha força. 6Disse-me: «Não basta que sejas meu servo, só para restaurares as tribos de Jacob, e reunires os sobreviventes de Israel. Vou fazer de ti luz das nações, para que a minha salvação chegue até aos confins da terra.

    Como o Servo de Javé, João Baptista foi chamado a uma especial missão, desde que foi concebido o seio de sua mãe. Como Ele, recebeu um nome, um chamamento e uma revelação. Como Ele, teve que enfrentar a dureza e o sofrimento no desempenho da missão. Por isso, o nosso texto, retirado dos "Cânticos do Servo de Javé" adequa-se a João Baptista. O verdadeiro profeta realiza a missão, confiando unicamente n´Aquele que o escolheu, chamou e enviou. E só d´Ele espera recompensa.

    Segunda leitura: Atos 13, 22-26

    Naqueles dias, Paulo falou deste modo: Deus concedeu aos filhos de Israel David como rei, e a seu respeito deu este testemunho: 'Encontrei David, filho de Jessé, homem segundo o meu coração, que fará todas as minhas vontades.' 23Da sua descendência, segundo a sua promessa, Deus proporcionou a Israel um Salvador, que é Jesus. 24João preparou a sua vinda, anunciando um baptismo de penitência a todo o povo de Israel. 25Quase a terminar a sua carreira, João dizia: 'Eu não sou quem julgais; mas vem, depois de mim, alguém cujas sandálias não sou digno de desatar.' 26Irmãos, filhos da estirpe de Abraão, e os que de entre vós são tementes a Deus, a nós é que foi dirigida a palavra de salvação.

    O discurso de Paulo em Antioquia, com explícita referência a João Batista, mostra a importância que o profeta tinha na primitiva comunidade cristã. Paulo refere-se também a David. David e João foram dois profetas que, de modo diferente, e em tempos distintos, prepararam a vinda do Messias: David recebeu a promessa do Messias; João preparou a vinda do mesmo, pregando um batismo de penitência.
    Impressiona, nesta página, a clareza com que João identifica Jesus, e se define a si mesmo. É este o primeiro dever do verdadeiro profeta.

    Evangelho: Lucas 1, 57-66.80

    Naquele tempo, chegou o dia em que Isabel devia dar à luz e teve um filho. 58Os seus vizinhos e parentes, sabendo que o Senhor manifestara nela a sua misericórdia, rejubilaram com ela.59Ao oitavo dia, foram circuncidar o menino e queriam dar-lhe o nome do pai, Zacarias. 60Mas, tomando a palavra, a mãe disse: «Não; há-de chamar-se João.» 61Disseram-lhe: «Não há ninguém na tua família que tenha esse nome.» 62Então, por sinais, perguntaram ao pai como queria que ele se chamasse. 63Pedindo uma placa, o pai escreveu: «O seu nome é João.»E todos se admiraram. 64Imediatamente a sua boca abriu-se, a língua desprendeu-se-lhe e começou a falar, bendizendo a Deus. 65O temor apoderou-se de todos os seus vizinhos, e por toda a montanha da Judeia se divulgaram aqueles factos. 66Quantos os ouviam retinham-nos na memória e diziam para si próprios: «Quem virá a ser este menino?» Na verdade, a mão do Senhor estava com ele.80Entretanto, o menino crescia, o seu espírito robustecia-se, e vivia em lugares desertos, até ao dia da sua apresentação a Israel.

    O paralelismo estabelecido por Lucas, ao narrar a infância do Batista e a de Jesus é rico sob os pontos de vista literário e teológico. O nascimento de João preanuncia o de Jesus. João, ainda no ventre materno, anuncia um outro Menino. O nome de João é prelúdio do de Jesus. O extraordinário evento da maternidade de Isabel prepara outro, o da maternidade de Maria. A missão de João faz-nos pregustar a de Jesus. Trata-se de uma única missão, em dois tempos; dois tempos de uma única história que se desenrola em ritmos alternos mas sincronizados. Não devemos contrapor a missão do Batista e a de Jesus.

    Meditatio

    A festa do nascimento de João Batista leva-nos a pensar no amor preveniente de Deus e na importância das suas preparações para o acolhermos devidamente e com fruto. Deus prepara o nascimento de João: um anjo anuncia a Zacarias que a sua mulher, idosa e estéril, vai ter um filho, cujo nascimento alegrará a muitos; inesperadamente, o nome da criança não é Zacarias, mas João, cujo significado é: "Deus faz graça"; João é enviado a preparar os caminhos do Senhor, o "ano de graça" do Senhor, a vinda de Jesus. Como o agricultor prepara o terreno antes de lhe lançar a semente, assim Deus prepara os tempos e os corações para receberem os seus dons. É por isso que havemos de viver vigilantes, de estar atentos à ação de Deus em nós e nos outros, para a sabermos discernir no meio dos acontecimentos humanos e nas mais variadas situações da nossa vida. João ajuda-nos a estarmos atentos a Jesus e ao que Ele quer fazer em nós e no nosso mundo. João acreditou e indicou Jesus aos que o seguiam: "depois de mim, virá alguém maior do que eu... Eis o Cordeiro de Deus!"
    Por todas estas razões, a festa de hoje é um dia de alegria para a Igreja. E, todavia, João foi um profeta austero, que pregou a penitência com uma linguagem pouco amável: "Raça de víboras, quem vos ensinou a fugir da cólera que está para vir? Produzi, pois, frutos dignos de conversão e não vos iludais a vós mesmos, dizendo: 'Temos por pai a Abraão!'" (Mt 3, 7-8). O profeta exortava a uma penitência que se torna alegria, alegria da purificação, alegria da vinda do Senhor.
    A missão de João Batista é, de certo modo, a missão de todo o crente: preparar a vinda do Senhor, o que é mais do que simplesmente anunciar. É preciso por ao serviço de Jesus não só as nossas palavras, mas também a nossa vida toda.

    Oratio

    S. João Batista, glorioso Precursor de Jesus, verdadeiro amigo do Esposo, ensinai-me o espírito de penitência e o amor da pureza para alcançar uma união, cada vez maior, com Jesus, o Salvador, e com Maria, sua Mãe. Ensinai-me a viver essa união em todos os momentos da minha vida, incluindo o meu apostolado em que procuro preparar, como vós, os caminhos do Senhor. Que a minha ternura por Jesus se torne, cada vez mais, semelhante à vossa. Ámen.

    Contemplatio

    João ainda não nascera quando Jesus e Maria vão visitá-lo à Judeia. Estremece no seio de sua mãe. É abençoado e santificado pela presença de Jesus e pela visita de Maria. É um amigo para Jesus, di-lo ele mesmo: «O amigo do esposo, diz, alegra-se quando escuta a voz do seu amigo, é por isso que hoje estou alegre» (Jo 3, 29). Quando Jesus menino volta do Egipto, visita o seu pequeno amigo passando pela Judeia. Cada ano, nos dias de Páscoa, estão juntos em Jerusalém. Reencontram-se no Jordão. S. João conhece a missão do seu amigo e parente, proclama a sua missão: «Eis, diz, o Cordeiro de Deus, eis aquele que tira os pecados do mundo». Pregam um ao outro, mas S. João envia os seus discípulos a Cristo. Recebe as suas graças de Jesus e conduz as almas a Jesus. Tal deve ser a nossa união com Jesus e Maria. Maria dar-nos-á Jesus. Sede amigos para Jesus pela vossa assiduidade, pelo vosso afeto, pela vossa confiança. Conduzamos-lhe as almas, não procuremos em nada reter a sua afeição por nós, admiremos nisto o desapego de S. João. Ide a Jesus, diz a todos, nada sou senão uma voz que prega no deserto, não sou digno de desatar os seus sapatos. (Leão Dehon, OSP 3, p. 689).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Profeta do Altíssimo,
    irás à sua frente a preparar os seus caminhos" (Lc 1, 76).

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    S. João Baptista (24 Junho)

  • S. Pedro e S. Paulo, Apóstolos

    S. Pedro e S. Paulo, Apóstolos


    29 de Junho, 2024

    Desde o século III que a Liturgia une na mesma celebração as duas colunas da Igreja, Pedro e Paulo. Mestres inseparáveis de fé e de inspiração cristã pela sua autoridade, simbolizam todo o Colégio Apostólico. Pedro era natural de Betsaida, onde exercia a profissão de pescador. Jesus chamou-o e confiou-lhe a missão de guiar e confirmar os irmãos na fé. É uma das primeiras testemunhas de Jesus ressuscitado e, como arauto do Evangelho, toma consciência da necessidade de abrir a Igreja aos gentios (At 10-11). Paulo de Tarso, perseguidor acérrimo da Igreja, converte-se no caminho de Damasco. A partir daí, a sua vivacidade e brilhantismo são postos ao serviço do Evangelho. Fortemente apaixonado por Cristo, percorre o Mediterrâneo para anunciar o Evangelho da salvação, especialmente aos pagãos. Depois de terem sofrido toda a espécie de perseguições, ambos são martirizados em Roma. Regando com o seu sangue o mesmo terreno, "plantaram" a Igreja de Deus.

    Lectio

    Primeira leitura: Atos, 12, 1-11

    Naqueles dias, o rei Herodes maltratou alguns membros da Igreja. 2Mandou matar à espada Tiago, irmão de João, 3e, vendo que tal procedimento agradara aos judeus, mandou também prender Pedro. Decorriam os dias dos Ázimos. 4Depois de o mandar prender, meteu-o na prisão, entregando-o à guarda de quatro piquetes, de quatro soldados cada um, na intenção de o fazer comparecer perante o povo, a seguir à Páscoa. 5Enquanto Pedro estava encerrado na prisão, a Igreja orava a Deus, instantemente, por ele. 6Na noite anterior ao dia em que Herodes contava fazê-lo comparecer, Pedro estava a dormir entre dois soldados, bem preso por duas correntes, e diante da porta estavam sentinelas de guarda à prisão. 7De repente, apareceu o Anjo do Senhor e a masmorra foi inundada de luz. O anjo despertou Pedro, tocando-lhe no lado e disse-lhe: «Ergue-te depressa!» E as correntes caíram-lhe das mãos. 8O anjo prosseguiu: «Põe o cinto e calça as sandálias.» Pedro assim fez. Depois, disse-lhe: «Cobre-te com a capa e segue-me.» 9Pedro saiu e seguiu-o. Não se dava conta da realidade da intervenção do anjo, pois julgava que era uma visão. 10Depois de atravessarem o primeiro e o segundo posto da guarda, chegaram à porta de ferro que dá para a cidade, a qual se abriu por si mesma. Saíram, avançando por uma rua, e logo o anjo se retirou de junto dele. 11Pedro, voltando a si, exclamou: «Agora sei que o Senhor enviou o seu anjo e me arrancou das mãos de Herodes e de tudo o que o povo judeu esperava.»

    Pelos anos 41-44 da nossa era, reinava na Judeia Herodes Agripa, que moveu uma perseguição contra a Igreja. Foi por essa ocasião que Pedro foi preso, durante a páscoa hebraica, e teria a mesma sorte de Jesus, se Deus não tivesse intervindo com um milagre (vv. 1-4) : um anjo libertou Pedro da morte certa. Tal fato deixou os cristãos espantados e admirados com a benevolência de Deus. No evento foi importante a oração da Igreja, compenetrada da importância única da missão de Pedro. Mais tarde, também S. Paulo recuperará, de modo idêntico, a sua liberdade (At 16, 25-34).

    Segunda leitura: 2 Timóteo 4, 6

    Caríssimo, eu já estou pronto para oferecer-me como sacrifício; avizinha-se o tempo da minha libertação. 7Combati o bom combate, terminei a corrida, permaneci fiel. 8A partir de agora, já me aguarda a merecida coroa, que me entregará, naquele dia, o Senhor, justo juiz, e não somente a mim, mas a todos os que anseiam pela sua vinda. 17O Senhor, porém, esteve comigo e deu-me forças, a fim de que, por meu intermédio, o anúncio fosse plenamente proclamado e todos os gentios o escutassem. Assim fui arrebatado da boca do leão. 18O Senhor me livrará de todo o mal e me levará a salvo para o seu Reino celeste. A Ele, a glória, pelos séculos dos séculos. Ámen!

    Este texto apresenta-nos o que podemos chamar o testamento de Paulo. O Apóstolo pressente próxima a sua morte e dá-nos a conhecer o seu estado de espírito: sente-se só e abandonado pelos irmãos, mas não vítima, porque a sua consciência está tranquila e o Senhor está com ele. Guardou a fé e cumpriu a sua vocação missionária com fidelidade. Compara-se à libação derramada sobre as vítimas nos sacrifícios antigos. Quer morrer como viveu, isto é, como verdadeiro lutador, uma vez que se entregou a Deus e aos irmãos. A vitória é certa! As suas palavras são já um cântico de vitória, porque está próximo o seu encontro com Cristo Ressuscitado.

    Evangelho: Mateus 16, 13-19

    Naquele tempo, Jesus ao chegar à região de Cesareia de Filipe, Jesus fez a seguinte pergunta aos seus discípulos: «Quem dizem os homens que é o Filho do Homem?»  14Eles responderam: «Uns dizem que é João Baptista; outros, que é Elias; e outros, que é Jeremias ou algum dos profetas.» 15Perguntou-lhes de novo: «E vós, quem dizeis que Eu sou?»16Tomando a palavra, Simão Pedro respondeu: «Tu és o Messias, o Filho de Deus vivo.»17Jesus disse-lhe em resposta: «És feliz, Simão, filho de Jonas, porque não foi a carne nem o sangue que to revelou, mas o meu Pai que está no Céu. 18Também Eu te digo: Tu és Pedro, e sobre esta Pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do Abismo nada poderão contra ela.19Dar-te-ei as chaves do Reino do Céu; tudo o que ligares na terra ficará ligado no Céu e tudo o que desligares na terra será desligado no Céu.»

    O nosso texto evangélico de hoje consta de duas partes: a resposta de Pedro acerca da messianidade de Jesus, Filho de Deus (vv. 13-16) e a promessa do primado que Jesus confere a Pedro (vv. 17-19). O povo reconhecia Jesus como um profeta. Mas os Doze têm uma opinião muito própria, que é expressa por Pedro: Jesus é o Messias, o Filho de Deus (cf. v. 16). Essa opinião, mais do que baseada na experiência que tinham de Jesus, era fruto da ação do Espírito neles: "não foi a carne nem o sangue que to revelou, mas o meu Pai que está no Céu." (v. 17). Por causa desta confissão, Pedro será a rocha sobre a qual Cristo edificará a sua Igreja. A Pedro e aos seus sucessores é confiada a missão de serem o fundamento visível da realidade invisível que é Cristo Ressuscitado. O poder de ligar e desligar, expresso na metáfora das chaves, indica a autoridade sobre a Igreja.

    Meditatio

    Celebrar os Apóstolos Pedro e Paulo é um testemunho de fé na Igreja "una, santa, católica, apostólica". Pedro é, efetivamente, a pedra que se apoia diretamente sobre a pedra angular que é Cristo. Pedro, e Paulo são os últimos elos de uma corrente que nos liga a Jesus. Celebrando Pedro e Paulo celebramos os "fundadores" da nossa fé, os genearcas do povo cristão. Ambos foram martirizados em Roma, na perseguição de Nero, por volta do ano 64 d. C.
    O Novo Testamento permite-nos reconstruir, o itinerário da vida dos dois apóstolos e dar-nos conta da gratuidade da escolha divina. Pedro era um pescador da Galileia. Passava os dias no lago de Tiberíade, com o seu pai Jonas e com o seu irmão André. O seu trabalho consistia em lançar as redes, esperar, retirá-las e, depois, à tarde, remendá-las, sentado na margem.
    Foi aí que, uma tarde, quando lançava as redes para uma última pescaria, ouviu, com o seu irmão, o chamamento de Jesus que passava: "Segui-me; farei de vós pescadores de homens" (Mc 1, 17). Começou, assim, a sua extraordinária aventura; seguiu o Mestre da Galileia para a Judeia; daí, depois da morte de Jesus, percorreu a Palestina, até se mudar para Antioquia e, daí, chegou finalmente a Roma.
    Em Roma animou a fé dos crentes, esteve preso, e foi morto no Vaticano, onde ficou para sempre, não só com o seu túmulo, mas também com o seu mandato: ficou naqueles que lhe sucederam naquela que os cristãos chamaram sempre "a cátedra de Pedro", até ao papa que hoje governa a Igreja. Nele, Pedro continua a ser "a rocha", sobre a qual Cristo continua a edificar a sua Igreja, o sinal da unidade para "aqueles que invocam o nome do Senhor". Não muito longe de Pedro, repousa Paulo que, de perseguidor, se tornou o Apóstolo dos Gentios, o missionário ardoroso do Evangelho. O seu martírio revelou a substância da sua fé. A evangelização das duas colunas da Igreja apoia-se, não sobre uma mensagem intelectual, mas sobre uma praxis profunda, sofrida e testemunhada com a palavra de Jesus.
    O lugar de Pedro e dos seus sucessores não é um cargo honorífico ou uma recompensa de méritos. É um serviço, o serviço de apascentar as ovelhas do Senhor: "Apascenta as minhas ovelhas", disse Jesus (Jo 21, 15ss). Com o dever de dar testemunho d´Ele, Jesus confiou a Pedro a sua própria missão de Servo e Pastor. Testemunha de Cristo, pastor e servo dos crentes são prerrogativas que, de Cristo passaram a Pedro e, de Pedro, aos seus sucessores, os bispos de Roma
    Rezemos pelo Santo Padre, sucessor de Pedro, para que Ele, que o confiou uma tal missão, o ilumine e o torne, cada vez mais, capaz de confirmar na fé os seus irmãos. Escreve o P. Dehon: "Para mim, o Papa é como Cristo na terra. Devo honrá-lo, amá-lo, obedecer-lhe... Os amigos do Coração de Jesus são amigos de Pedro." (Leão Dehon, OSP 3, p. 705).

    Oratio

    Senhor, vós nos concedeis a alegria de celebrar hoje a festa dos santos apóstolos Pedro e Paulo: Pedro, que foi o primeiro a confessar a fé em Cristo, e Paulo, que a ilustrou com a sua doutrina; Pedro, que estabeleceu a Igreja nascente entre os filhos de Israel, e Paulo que anunciou o Evangelho a todos os povos; ambos trabalharam, cada um segundo a sua graça, para formar a única família de Cristo; agora, associados na mesma coroa de glória, recebem do povo fiel a mesma veneração. Por isso, vos damos graças e proclamamos a vossa glória. Ámen. (cf. Prefácio da Missa).

    Contemplatio

    Pedro é o continuador de Cristo, o substituto, o vigário de Cristo. É de certo modo o Cristo velado, como na Eucaristia. O seu ensino é o de Cristo. É o instrumento do Coração de Jesus... Nosso Senhor prometeu antecipadamente a Pedro a sua primazia, que é a continuação do poder de Cristo: «Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as potências do inferno não prevalecerão contra ela» (Mt 16, 18). «Dar-te-ei as chaves do reino dos céus: tudo o que ligares será ligado e tudo o que desligares será desligado» (Mt 16, 19). «Quando fores convertido, confirmarás os teus irmãos» (Lc 22, 32). Quando chegou o dia, Nosso Senhor realizou a sua promessa. Transmitiu a Pedro a sua autoridade de pastor: «Pedro, porque me amas muito, porque me amas mais do que os outros, apascenta os meus cordeiros, apascenta as minhas ovelhas». Pedro, pastor supremo da Igreja, é depositário e administrador de todos os dons do Coração de Jesus. Preside à administração dos sacramentos... Abre e fecha o tesouro do Coração de Jesus. Que respeito, que obediência devo a Pedro e aos seus sucessores! (Leão Dehon, OSP 3, p. 704s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "O Senhor, porém, esteve comigo e deu-me forças" (2 Tm 4, 17).

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    S. Pedro e S. Paulo, Apóstolos (29 Junho)

  • 13º Domingo do Tempo Comum - Ano B

    13º Domingo do Tempo Comum - Ano B


    30 de Junho, 2024

    13º Domingo do Tempo Comum - Ano B

    Nota inicial:
    Por não ser possível preparar atempadamente os habituais comentários para este domingo (há três anos havia coincidido com a Solenidade de S. Pedro e S. Paulo), colocamos apenas alguns comentários e interpelações, adaptados da revista "Signes d'aujourd'hui".

    Tema do 13º Domingo do Tempo Comum

    Deus ama a vida! Ele quer apenas a vida! "Deus criou o homem para ser incorruptível" (primeira leitura). Pelo seu Filho, salva-nos da morte: eis porque Lhe damos graças em cada Eucaristia. Na sua vida terrena, Jesus sempre defendeu a vida. O Evangelho de hoje relata-nos dois episódios que assinalam a defesa da vida: Ele cura, Ele levanta. Ele torna livres todas as pessoas, dá-lhes toda a dignidade e capacidade para viver plenamente. Sabemos dizer-Lhe que Ele é a nossa alegria de viver?
    Estamos em tempo de verão, início de férias... É uma ocasião propícia para celebrar a festa da vida! O 13º domingo celebra a vida mais forte que a morte, celebra Deus apaixonado pela vida. Convém, pois, que na celebração deste dia a vida expluda em todas as suas formas: na beleza das flores, nos gestos e atitudes, na proclamação da Palavra, nos cânticos e aclamações, na luz. No cântico do salmo e na profissão de fé, será bom recordar que é o Deus da vida que nós confessamos, as suas maravilhas que nós proclamamos. Durante toda a missa, rezando, mantenhamos a convicção expressa pelo Livro da Sabedoria: "Deus não Se alegra com a perdição dos vivos".

    LEITURA I - Sab 1, 13-15; 2,23-24

    Leitura do Livro da Sabedoria

    Não foi Deus quem fez a morte,
    nem Ele Se alegra com a perdição dos vivos.
    Pela criação deu o ser a todas as coisas,
    e o que nasce no mundo destina-se ao bem.
    Em nada existe o veneno que mata,
    nem o poder da morte reina sobre a terra,
    porque a justiça é imortal.
    Deus criou o homem para ser incorruptível
    e fê-lo à imagem da sua própria natureza.
    Foi pela inveja do demónio que a morte entrou no mundo,
    e experimentam-na aqueles que lhe pertencem.

    Breve comentário

    O Livro da Sabedoria foi composto um pouco antes da vinda de Jesus. A sua doutrina é mais serena que a dos livros mais antigos, em particular quando apresenta o rosto de Deus.
    Este anúncio deve ser proclamado com força, porque vem contradizer ideias ainda muito espalhadas, segundo as quais agradaria a Deus fazer morrer o homem. A morte vem de outro, pois "não foi Deus quem fez a morte". Pelo contrário, Ele cria a vida e dá-la à humanidade, modelada à sua imagem. Ele restaura a vida, quando esta está em perigo de se apagar. Dá a vida quando está perdida, como testemunha o Evangelho deste domingo.
    "Vivificaste-me", diz o salmista. No seguimento da primeira leitura, o salmo exprime a experiência de um Deus que quer a vida dos seus fiéis. Em Jesus ressuscitado, e para todos os que n'Ele acreditam, a oração do salmo encontra toda a sua verdade.

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 29 (30)

    Refrão: Eu Vos louvarei, Senhor, porque me salvastes.

    Eu Vos glorifico, Senhor, porque me salvastes
    e não deixastes que de mim se regozijassem os inimigos.
    Tirastes a minha alma da mansão dos mortos,
    vivificastes-me para não descer ao túmulo.

    Cantai salmos ao Senhor, vós os seus fiéis,
    e dai graças ao seu nome santo.
    A sua ira dura apenas um momento
    e a sua benevolência a vida inteira.
    Ao cair da noite vêm as lágrimas
    e ao amanhecer volta a alegria.

    Ouvi, Senhor, e tende compaixão de mim,
    Senhor, sede Vós o meu auxílio.
    Vós convertestes em júbilo o meu pranto:
    Senhor meu Deus, eu Vos louvarei eternamente.

    LEITURA II - 2 Cor 8, 7.9.13-15

    Leitura da Segunda Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios

    Irmãos:
    Já que sobressaís em tudo
    – na fé, na eloquência, na ciência,
    em toda a espécie de atenções
    e na caridade que vos ensinámos –
    deveis também sobressair nesta obra de generosidade.
    Conheceis a generosidade de Nosso Senhor Jesus Cristo:
    Ele, que era rico, fez-Se pobre por vossa causa,
    para vos enriquecer pela sua pobreza.
    Não se trata de vos sobrecarregar para aliviar os outros,
    mas sim de procurar a igualdade.
    Nas circunstâncias presentes,
    aliviai com a vossa abundância a sua indigência
    para que um dia
    eles aliviem a vossa indigência com a sua abundância.
    E assim haverá igualdade, como está escrito:
    «A quem tinha colhido muito não sobrou
    e a quem tinha colhido pouco não faltou».

    Breve comentário

    As primeiras comunidades cristãs praticaram a entreajuda e a partilha, não apenas entre os seus membros, mas também entre comunidades. O apóstolo Paulo solicitou-as nesse sentido.
    O apóstolo Paulo tinha organizado um peditório junto das comunidades que tinha fundado na Ásia Menor, na Macedónia e na Grécia, em favor dos irmãos de Jerusalém que estavam em dificuldades. Esta iniciativa correspondia às orientações da jovem Igreja, segundo Act 4,32-35. Paulo justifica esta acção de partilha pela generosidade de Cristo: esta é modelo para os cristãos e eles próprios já beneficiaram dela.

    ALELUIA - cf. 2 Tim 1, 10

    Aleluia. Aleluia.

    Jesus Cristo, nosso Salvador, destruiu a morte
    e fez brilhar a vida por meio do Evangelho.

    EVANGELHO - Mc 5, 21-43

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos

    Naquele tempo,
    depois de Jesus ter atravessado de barco
    para a outra margem do lago,
    reuniu-se grande multidão à sua volta,
    e Ele deteve-Se à beira-mar.
    Chegou então um dos chefes da sinagoga, chamado Jairo.
    Ao ver Jesus, caiu a seus pés
    e suplicou-Lhe com insistência:
    «A minha filha está a morrer.
    Vem impor-lhe as mãos,
    para que se salve e viva».
    Jesus foi com ele,
    seguido por grande multidão,
    que O apertava de todos os lados.
    Ora, certa mulher
    que tinha um fluxo de sangue havia doze anos,
    que sofrera muito nas mãos de vários médicos
    e gastara todos os seus bens,
    sem ter obtido qualquer resultado,
    antes piorava cada vez mais,
    tendo ouvido falar de Jesus,
    veio por entre a multidão
    e tocou-Lhe por detrás no manto,
    dizendo consigo:
    «Se eu, ao menos, tocar nas suas vestes, ficarei curada».
    No mesmo instante estancou o fluxo de sangue
    e sentiu no seu corpo que estava curada da doença.
    Jesus notou logo que saíra uma força de Si mesmo.
    Voltou-Se para a multidão e perguntou:
    «Quem tocou nas minhas vestes?»
    Os discípulos responderam-Lhe:
    «Vês a multidão que Te aperta
    e perguntas: 'Quem M
    e tocou?'»
    Mas Jesus olhou em volta,
    para ver quem O tinha tocado.
    A mulher, assustada e a tremer,
    por saber o que lhe tinha acontecido,
    veio prostrar-se diante de Jesus e disse-Lhe a verdade.
    Jesus respondeu-lhe:
    «Minha filha, a tua fé te salvou».
    Ainda Ele falava,
    quando vieram dizer da casa do chefe da sinagoga:
    «A tua filha morreu.
    Porque estás ainda a importunar o Mestre?»
    Mas Jesus, ouvindo estas palavras,
    disse ao chefe da sinagoga:
    «Não temas; basta que tenhas fé».
    E não deixou que ninguém O acompanhasse,
    a não ser Pedro, Tiago e João, irmão de Tiago.
    Quando chegaram a casa do chefe da sinagoga,
    Jesus encontrou grande alvoroço,
    com gente que chorava e gritava.
    Ao entrar, perguntou-lhes:
    «Porquê todo este alarido e tantas lamentações?
    A menina não morreu; está a dormir».
    Riram-se d'Ele.
    Jesus, depois de os ter mandado sair a todos,
    levando consigo apenas o pai da menina
    e os que vinham com Ele,
    entrou no local onde jazia a menina,
    pegou-lhe na mão e disse:
    «Talitha Kum»,
    que significa: «Menina, Eu te ordeno: levanta-te».
    Ela ergueu-se imediatamente e começou a andar,
    pois já tinha doze anos.
    Ficaram todos muito maravilhados.
    Jesus recomendou-lhes insistentemente
    que ninguém soubesse do caso
    e mandou dar de comer à menina.

    Breves comentários

    1. O Reino de Deus é a vida. Jesus percorre o país para o anunciar e o estabelecer. Ele fala e age. A sua fama espalha-se, porque uma força brota d'Ele, é a força da ressurreição, o Espírito de vida.
    "Sê curada". O imperativo de Jesus tem algo de afectuoso para com esta mulher, restaurada na sua dignidade, restabelecida na sociedade que excluía o seu mal. Este "sê curada" aparece também como uma constatação: é a sua fé que a salvou, e Jesus alegra-Se por isso. A cura é consequência da fé, que é sempre fonte de vida e de felicidade.
    "Levanta-te". Este segundo imperativo do Evangelho deste dia é dinâmico e traduz perfeitamente este louco desejo de Deus em ver o homem vivo, o seu amor incondicional pela vida. "Adormecida", no "sono da morte"... um estado do qual Deus nos quer fazer sair, um estado do qual Jesus nos salva. "Eu te ordeno: levanta-te". A palavra evoca a ressurreição, o novo surgir da vida, o amor divino que nos coloca de pé. Jesus pede ao pai da jovem apenas uma coisa: "basta que tenhas fé". E quanto a nós, cremos verdadeiramente?

    2. As duas beneficiárias das acções de Jesus neste Evangelho têm isto em comum: a primeira estava doente desde os 12 anos e a jovem filha morreu aos 12 anos, a idade em que se devia tornar mulher. No povo de Israel, o percurso destas duas mulheres era sinal de um fracasso. Uma estava atingida, como Sara, a mulher de Abraão, na sua fecundidade: ela perdia o seu sangue, princípio de vida na mentalidade semítica. A outra perdia a vida, precisamente na idade em que se preparava para a transmitir (era tradição casar-se muito cedo). Cristo cura as duas mulheres e permite-lhes assim assumir a sua vocação maternal.
    Estas duas mulheres representam a Igreja, na sua vocação maternal de dar e de alimentar a vida em Cristo. As alusões aos santos mistérios da Igreja orientam a compreensão do relato: Jairo pede a Jesus para impor as mãos, para salvar e dar a vida à sua filha. Ora, toda a preparação para o Baptismo está sinalizada pela imposição das mãos. Jesus levanta a jovem, tomando-a pela mão, como o diácono fazia sair da água o baptizado, tomando-o pela mão, para que fosse desperto para a vida em Deus. Jesus pede, de seguida, que se dê de comer a esta jovem ressuscitada da morte: é uma alusão à Eucaristia que se segue ao Baptismo.

    3. Bilhete de Evangelho: a transformação pela fé. Um chefe de sinagoga cai de joelhos e suplica a Jesus para curar a sua filha... Uma mulher atingida por hemorragias não diz nada, mas contenta-se em tocar as vestes de Jesus, sem dúvida porque se considera impura. Isto basta Àquele que veio para levantar, curar, salvar a humanidade ferida. As reacções dos que acompanham Jesus são diversas. Riem-se d'Ele. Só a fé solicita um sinal de Jesus, a fé de Jairo, a fé da mulher, a fé de Pedro, Tiago e João... E esta fé faz Jesus agir e transforma os beneficiários: a mulher é curada, a jovem levanta-se, as testemunhas ficam abaladas. Decididamente, Jesus não é um taumaturgo: é reconhecido por aqueles que acreditam, recomenda insistentemente que ninguém saiba, com receio, sem dúvida, que se valorize os seus sinais sem os ver com os olhos da fé.

    4. Na escuta da Palavra... Eis Jesus mergulhado no barulho e nos apertos da multidão. Para mais, circula o rumor: Jesus vai fazer um milagre, curar a jovem filha de Jairo! A multidão esmaga Jesus. E eis que uma mulher quer aproximar-se de Jesus, a todo o custo, para tocar ao menos as suas vestes. Ela quer ser também beneficiária do poder do homem de Deus, ser, enfim, curada da sua doença que dura há doze anos. Ela chega por detrás, toca as suas vestes. Conhecemos o diálogo que se segue... O mesmo acontece com Jairo que se aproxima... No meio da multidão, Jesus está atento a estas pessoas concretas, manifesta uma disponibilidade extraordinária, está extremamente atento à sua presença. No meio da multidão, Jesus está atento a cada um. Ninguém fica anónimo aos olhos de Jesus. Está habitado pelo amor de Deus para com os seus filhos. No Coração do Pai, Jesus é capaz de uma atenção extrema a cada angústia do ser humano. Não interessa quem possa vir junto d'Ele, não interessa qual é a situação: ele será sempre acolhido, Jesus dará sempre a sua atenção como se cada um estivesse sozinho no mundo com Ele. Isto continua a ser verdadeiro, agora que Jesus está na plenitude da glória do seu Pai. Se eu também começasse a fazer silêncio em mim para melhor escutar Jesus, através da sua Palavra, se eu tivesse tempo para a oração interior, para aprofundar o meu silêncio interior... certamente ficaria mais disponível, mais atento aos outros. Senhor Jesus, dá-me a graça do silêncio interior que escuta e que ama.

    5. Breve meditação: Jesus, Fonte de Vida.
    Jesus passou à outra margem,
    uma grande multidão reuniu-se à sua volta.
    Chega um chefe de sinagoga...
    Para Ti, Senhor, a multidão não é uma massa anónima
    a quem se dirige uma mensagem impessoal...
    Para Ti, Senhor, trata-se de pessoas concretas, com rostos particulares.
    Chamas cada um pelo seu nome.
    Tu sabes escutar, estar atento, permanecer disponível.
    Vens dizer a todos e a cada um:
    Eu vim para que todos os homens tenham vida... em abundância.
    As multidões reúnem-se à tua volta porque, talvez inconscientemente,
    encontraram em Ti a verdadeira fonte de vida.
    É o caso de Jairo: Vem impor-lhe as mãos para que ela viva!
    É o caso da mulher: Se chegar a tocar-Lhe, serei salva!
    Tu vais ajudá-los a crescer na fé...
    A mulher, humanamente incurável:
    ousou violar a lei que a proibia de tocar alguém.
    Ela quer ser curada a todo o custo.
    Ao tocar as tuas vestes, é a fonte da vida que ela atinge.
    Desde então, está curada.
    Mas Tu não és um mágico que faz prodígios sem o saber.
    Viras-Te para ela: queres fazê-la progredir na sua fé.
    Ela, que esperava uma cura corporal,
    encontra em Ti a Salvação, a Vida em plenitude.
    Jairo acaba de saber da morte da sua filha.
    Tu apoia-lo na sua caminhada: Não temas, crê somente!
    Segue-lo até à sua casa...
    Aproximas-Te do seu filho inerte, toma-la pela mão:
    Levanta-te!
    É a palavra da ressurreição... e a fonte de vida corre de novo nela:
    a jovem começou a andar.
    Ele disse-lhes para lhe darem de comer.
    Manténs os pés bem assentes na terra, Senhor!
    Os pais, abalados, não pensavam que a sua filha tinha fome!
    É a nós que Tu Te diriges também
    convidando-nos para a tua Eucaristia:
    Tomai, todos, e comei: isto é o meu corpo entregue por vós!
    Quem me come viverá!

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 13º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    1. A LITURGIA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 13º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE...
    Viva a vida! A palavra de ordem deste domingo é uma espécie de grito do coração: Deus ama a vida, viva a vida! Aí estamos de acordo... É certo que não há vida sem morte e esta faz sofrer quando acontece perto de nós. Mas hoje somos convidados a nos alegrarmos na vida e a acreditar que Deus nos destina à verdadeira Vida! A estação do ano presta-se a isso: alegria do sol e das férias, encontro com a natureza, reencontros familiares... Não faltarão ocasiões para admirar a vida... Não nos esqueçamos de dar graças... No início destas férias, as crianças podem fazer um pequeno caderno, com uma capa bonita e um título do género: "Festa para Deus" ou "Obrigado, Senhor". Ao longo dos passeios de verão, podem colar fotos, postais, flores secas... Podem desenhar o que vão vendo como sinais de vida. Os adultos pensarão noutros sinais de vida que podem dar ao longo do verão: visita a uma pessoa que vive sozinha, envio de um postal, um telefonema... Ou ajudar as pessoas isoladas a sair, acompanhá-las num dia de excursão, ajudar algumas crianças de famílias desfavorecidas a passar um dia de férias, etc. Será uma maneira de lhes oferecer um pouco de vida... E nunca esquecer que a oração, particularmente o Pai Nosso, deve ser a expressão constante para dar graças a Deus Pai e Criador, para Lhe expressarmos o obrigado pela vida, a felicidade de viver e de O louvar!

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

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