Liturgia

Week of Mar 17th

  • 05º Domingo do tempo da Quaresma - Ano B [atualizado]

    05º Domingo do tempo da Quaresma - Ano B [atualizado]

    17 de Março, 2024

    ANO B

    5.º DOMINGO DA QUARESMA

    Tema do 5.º Domingo da Quaresma

     

    Na liturgia do 5.º Domingo da Quaresma ecoa, com insistência, a preocupação de Deus em nos mostrar o caminho que conduz à Vida nova. Foi para isso que Deus nos enviou o seu Filho Jesus. Cumprindo a vontade do Pai, Jesus desenhou-nos e ofereceu-nos o mapa desse caminho.

    Na primeira leitura, o profeta Jeremias anuncia que Deus se dispõe fazer connosco uma “nova Aliança”. Ele vai gravar as suas propostas nos nossos corações, a fim de que os nossos sentimentos, decisões e ações traduzam a vida e os valores de Deus. Acolhendo o dom de Deus, iremos ao encontro da Vida nova e plena que Ele nos quer dar.

    A segunda leitura apresenta-nos Jesus Cristo, o sumo-sacerdote da nova Aliança, que Se solidariza com os homens e lhes aponta o caminho da salvação. Esse caminho é o mesmo que Jesus seguiu: é o caminho do diálogo com Deus, da entrega confiada nas mãos de Deus, da aceitação plena do projeto do Pai.

    O Evangelho convida-nos a olhar para Jesus, a conhecer as suas propostas, a aprender com Ele, a identificarmo-nos com Ele, a segui-l’O no caminho do amor e da entrega da vida. O caminho da cruz parece, aos olhos do mundo, um caminho de fracasso e de morte; mas é desse caminho de amor e de doação que brota a Vida verdadeira.

     

    LEITURA I – Jeremias 31, 31-34

    Dias virão, diz o Senhor,
    em que estabelecerei com a casa de Israel e com a casa de Judá
    uma aliança nova.
    Não será como a aliança que firmei com os seus pais,
    no dia em que os tomei pela mão
    para os tirar da terra do Egipto,
    aliança que eles violaram,
    embora Eu exercesse o meu domínio sobre eles, diz o Senhor.
    Esta é a aliança que estabelecerei com a casa de Israel,
    naqueles dias, diz o senhor:
    Hei-de imprimir a minha lei no íntimo da sua alma
    e gravá-la-ei no seu coração.
    Eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo.
    Não terão já de se instruir uns aos outros,
    nem de dizer cada um a seu irmão:
    «Aprendei a conhecer o Senhor».
    Todos eles Me conhecerão,
    desde o maior ao mais pequeno, diz o Senhor.
    Porque vou perdoar os seus pecados
    e não mais recordarei as suas faltas.

     

    CONTEXTO

    Jeremias exerceu a sua missão profética desde 627/626 a.C. até depois da destruição de Jerusalém pelos Babilónios (586 a.C.). O cenário da atividade do profeta é, em geral, o reino de Judá e, sobretudo, a cidade de Jerusalém.

    A primeira fase da pregação de Jeremias abrange parte do reinado de Josias. Este rei leva a cabo, a partir de 632 a.C., uma reforma religiosa destinada a banir do país os cultos aos deuses estrangeiros. Jeremias empenha-se nesta reforma. A sua mensagem, neste período, traduz-se num constante apelo à conversão, à fidelidade a Javé e à Aliança.

    No entanto, em 609 a.C., Josias é morto, em combate contra os egípcios. Joaquim sucede-lhe no trono. A segunda fase da atividade profética de Jeremias abrange o tempo de reinado de Joaquim (609-597 a.C.). É um tempo de desgraça e de pecado para Judá. Nesta fase, o profeta aparece a criticar as injustiças sociais e a infidelidade religiosa (a aliança política que Joaquim faz, por esta altura, com os egípcios significa que Judá confia mais num exército estrangeiro do que em Javé). Convencido de que Judá ultrapassou todas as marcas, Jeremias anuncia a iminência de uma invasão babilónica que irá castigar os pecados do Povo. As previsões funestas de Jeremias concretizam-se: em 597 a.C., Nabucodonosor invade Judá e deporta para a Babilónia uma parte da população de Jerusalém.

    No trono de Judá fica, então, Sedecias (597-586 a.C.). A terceira fase da missão profética de Jeremias desenrola-se, precisamente, durante este reinado. Após alguns anos de calma submissão à Babilónia, Sedecias volta a experimentar a velha política das alianças com o Egipto. Jeremias não está de acordo que se confie em exércitos estrangeiros mais do que em Deus; mas nem o rei nem os notáveis prestam atenção à opinião do profeta.

    Em 587 a.C., Nabucodonosor põe cerco a Jerusalém; no entanto, um exército egípcio vem em socorro de Judá e os babilónios retiram-se. Nesse momento de euforia nacional, Jeremias anuncia o recomeço do cerco e a destruição de Jerusalém (cf. Jr 32,2-5). Acusado de traição, o profeta é encarcerado (cf. Jr 37,11-16) e corre, inclusive, perigo de vida (cf. Jr 38,11-13). Enquanto Jeremias continua a pregar a rendição, Nabucodonosor apossa-se, de facto, de Jerusalém, destrói a cidade e deporta a sua população para a Babilónia (586 a.C.).

    É impossível dizer com segurança em qual destes períodos de atividade do profeta encaixa o texto que a primeira leitura deste domingo nos apresenta. Para alguns, tratar-se de um oráculo da primeira fase da atividade profética de Jeremias (reinado de Josias), dirigido aos israelitas do Reino do Norte. Seria uma mensagem de esperança, destinada a animar esse povo que há cerca de cem anos tinha perdido a independência e estava sob o domínio assírio. Para outros, contudo, este texto será da época de Sedecias, algures entre a primeira e a segunda deportação do Povo para a Babilónia (597-586 a.C.). É a época em que Jeremias descobre perspetivas teológicas novas e começa a refletir sobre um tempo novo que Deus irá oferecer ao seu Povo: após a catástrofe, será possível recomeçar tudo, pois Deus tem em mente fazer uma nova Aliança com Judá.

     

    MENSAGEM

    Deus está disposto a firmar uma nova Aliança com o seu Povo. Essa Aliança será, contudo, diferente da Aliança do Sinai.

    A Aliança do Sinai foi uma Aliança externa, gravada em tábuas de pedra e que o Povo nunca interiorizou devidamente. Apresentava leis que o Povo devia cumprir; mas essas leis eram sempre leis externas, que não atingiram o coração do Povo nem mudaram substancialmente a sua maneira de ser. Por isso, o Povo de Deus continuou a trilhar caminhos de infidelidade a Deus, de injustiça, de autossuficiência, de pecado. O Povo de Deus aderiu à Aliança do Sinai, mas mais com a boca do que com o coração. Ora, sem uma adesão efetiva, uma adesão do coração, era impossível manter a fidelidade aos mandamentos e exigências dessa Aliança.

    Constatada a falência da antiga Aliança, Deus vai seguir outro caminho e propor uma nova Aliança que se fundamente noutras bases… Em concreto, Deus vai intervir no sentido de gravar as suas leis e preceitos no coração, no íntimo de cada membro do Povo. Na antropologia semita, o coração é, além da sede dos sentimentos, a sede dos pensamentos, dos projetos, das decisões e das ações da pessoa; é o centro do ser, onde a pessoa dialoga consigo mesma, toma as suas decisões, assume as suas responsabilidades. Portanto, a iniciativa de Deus irá possibilitar que as exigências da Aliança sejam interiorizadas por cada membro do Povo de Deus e que estejam presentes nessa sede onde nascem os pensamentos, onde se definem os valores, onde se decidem as ações. Com um “coração” assim transformado, isto é, que pensa, que decide e que age segundo os esquemas e a lógica de Deus, cada crente poderá viver na fidelidade à Aliança, na obediência aos mandamentos, no respeito pelas leis, no amor a Javé. Então, Javé será, efetivamente, o Deus de Israel; Israel será, verdadeiramente, o Povo que vive de acordo com as propostas de Deus e que testemunha Deus no meio do mundo.

    Com esse novo tipo de relação, Javé não será mais um “desconhecido” para o seu Povo. Entre Deus e Israel será possível o estabelecimento de uma relação pessoal de proximidade, de intimidade, de familiaridade. A comunhão com Javé não será uma lição dificilmente aprendida, mas algo de inato e natural, que brota de um coração em permanente diálogo com Deus.

    Na última frase do nosso texto, Deus anuncia o perdão para as faltas do seu Povo: um perdão total e sem reservas é o primeiro resultado desta nova relação que se vai estabelecer entre Deus e o seu Povo. Também nisto se manifesta o “amor eterno” de Deus.

     

    INTERPELAÇÕES

    • Detenhamo-nos na palavra “Aliança”. Ela serviu aos teólogos de Israel para expressar o compromisso de Deus com o seu Povo, a sua decisão de descer ao encontro do seu Povo, de o acompanhar em cada passo da história e de lhe oferecer a Vida e a salvação. Esse Deus que faz “Aliança” com os homens é o Deus da comunhão e da relação, que olha para nós com amor, que nos convida a fazer parte da sua família e que nunca desiste de nós. É verdade: não andamos à deriva e sem rumo por caminhos sombrios, não somos criaturas sem valor perdidas num universo cujos contornos nos escapam, não somos seres “descartáveis” que podem ser deixados para trás e triturados pela história; somos criaturas que Deus conhece pessoalmente, por quem Deus se interessa infinitamente, que Deus acompanha e cuida com ternura de pai e de mãe. Que impacto tem esta “boa notícia” na nossa vida?
    • O profeta Jeremias revela que Deus, fiel ao seu amor e à sua decisão de nos levar ao encontro da Vida plena, se dispõe a gravar as suas propostas diretamente nos nossos corações. Ali, na raiz do nosso ser, as indicações de Deus tocarão os nossos sentimentos, as nossas decisões e as nossas ações, fazendo com que a nossa vida seja um reflexo da vida e dos valores de Deus. Conduzidos pelo Espírito de Deus age em nós, seremos dotados da capacidade de escolher o Bem, a Verdade, a Justiça, o Amor. Esta iniciativa de Deus refletirá, uma vez mais, o apreço que Ele tem por nós. Da nossa parte, estamos disponíveis para acolher o dom de Deus, para abraçar os seus desafios, para nos deixarmos transformar pelo seu Espírito? Estamos dispostos, neste tempo de Quaresma, a dar mais tempo ao encontro com Deus, ao diálogo com Deus, à escuta de Deus, ao acolhimento das suas propostas?
    • Essa Nova Aliança que Jeremias anunciou começa a concretizar-se em Jesus. Com a sua vida, com os seus gestos, com as suas palavras, com o seu amor, Ele veio inscrever nos nossos corações as propostas de Deus; e deixou-nos o seu Espírito, aquele “alento de Vida” que nos transforma, que nos renova e que nos capacita para viver segundo Deus. Somos verdadeiramente discípulos que seguem Jesus, que se deixam tocar pela sua Palavra e que aceitam o seu convite para integrar a comunidade da Nova Aliança?

     

    SALMO RESPONSORIAL – Salmo 50 (51)

    Refrão: Dai-me, Senhor, um coração puro.

    Compadecei-Vos de mim, ó Deus, pela vossa bondade,
    pela vossa grande misericórdia, apagai os meus pecados.
    Lavai-me de toda a iniquidade
    e purificai-me de todas as faltas.

    Criai em mim, ó Deus, um coração puro
    e fazei nascer dentro de mim um espírito firme.
    Não queirais repelir-me da vossa presença
    e não retireis de mim o vosso espírito de santidade.

    Dai-me de novo a alegria da vossa salvação
    e sustentai-me com espírito generoso.
    Ensinarei aos pecadores os vossos caminhos
    e os transviados hão-de voltar para Vós.

     

    LEITURA II – Hebreus 5, 7-9

    Nos dias da sua vida mortal,
    Cristo dirigiu preces e súplicas,
    com grandes clamores e lágrimas,
    Àquele que O podia livrar da morte
    e foi atendido por causa da sua piedade.
    Apesar de ser Filho,
    aprendeu a obediência no sofrimento
    e, tendo atingido a sua plenitude,
    tornou-Se para todos os que Lhe obedecem
    causa de salvação eterna.

     

    CONTEXTO

    A Carta aos Hebreus é um escrito (alguns preferem dizer “um sermão”) de autor anónimo e cujos destinatários, em concreto, desconhecemos (o título “aos hebreus” provém das múltiplas referências ao Antigo Testamento e ao ritual dos “sacrifícios” que a obra apresenta). É possível que se dirija a uma comunidade cristã constituída maioritariamente por cristãos vindos do judaísmo; mas nem isso é totalmente seguro, uma vez que o Antigo Testamento era um património comum, assumido por todos os cristãos, quer os vindos do judaísmo, quer os vindos do paganismo. Trata-se, em qualquer caso, de cristãos em situação difícil, expostos a perseguições e que vivem num ambiente hostil à fé… São, também, cristãos que facilmente se deixam vencer pelo desalento, que perderam o fervor inicial e que cedem às seduções de doutrinas não muito coerentes com a fé recebida dos apóstolos… O objetivo do autor é estimular a vivência do compromisso cristão e levar os crentes a crescer na fé. Para isso, ele expõe o mistério de Cristo (apresentado, sobretudo, como “o sacerdote” da Nova Aliança) e recorda a fé tradicional da Igreja.

    O texto que nos é hoje proposto como segunda leitura deste quinto domingo da Quaresma é parte de uma longa reflexão (cf. Heb 3,1-9,28) sobre o sacerdócio de Cristo. Em concreto, a perícope de Heb 5,1-10 desenvolve o tema do sacerdócio de Cristo por comparação com o sumo-sacerdote do Antigo Testamento, apresentando uma série de aspetos semelhantes e opostos. Começa por apontar três aspetos que definem a missão do sumo-sacerdote: o sumo-sacerdote é um homem que, pela sua fragilidade, é capaz de entender as fragilidades (pecado) dos seus irmãos (vers. 2); o sumo-sacerdote tem como missão oferecer sacrifícios a Deus, a fim de refazer a comunhão entre Deus e o homem (vers. 3); o sumo-sacerdote desempenha esta missão por escolha de Deus, tal como aconteceu com o sacerdote Aarão (vers. 4).

    Ora, estes três elementos também estão bem patentes no sumo-sacerdócio de Cristo.

     

    MENSAGEM

    Cristo, apesar de Filho de Deus, foi um homem que viveu entre os homens e que experimentou a fragilidade e a debilidade dos homens. Como os outros homens, seus irmãos, Ele sofreu, chorou, sentiu angústia e medo diante da morte (o autor alude, provavelmente, à oração de Jesus no Monte das Oliveiras, pouco antes de ser preso – cf. Mc 14,36). Nele não houve pecado; mas, identificando-se com os homens, Ele compreendeu as fraquezas e identificou a debilidade dos seus irmãos. A partir dessa compreensão, dispôs-se a atuar no sentido de lhes dar remédio.

    Por outro lado, Jesus, o Filho de Deus feito homem, viveu toda a sua vida em permanente diálogo com o Pai. Procurou sempre, através de uma oração intensa, discernir e acolher a vontade do Pai. Mesmo nos momentos mais difíceis da sua existência terrena, escutou o Pai, manteve a sua adesão incondicional ao Pai, manifestou a sua total disponibilidade para cumprir o projeto de salvação que o Pai queria, através d’Ele, oferecer aos homens. Percebendo, pela oração, o projeto do Pai, Jesus, através da oração, disse “sim” ao Pai. Dizendo “sim”, Jesus fez da sua vida uma oferenda ao Pai, um “sacrifício” ao Pai. Esse “sacrifício” reparou a rutura que o pecado tinha provocado e restaurou a comunhão entre Deus e os homens.

    Com a sua obediência, Jesus ensinou os homens a viver em comunhão total com Deus, a cumprir os projetos de Deus e a amar os irmãos até ao dom total da vida; com a sua obediência, Ele eliminou o egoísmo e o pecado que afastavam os homens de Deus. Sendo, pela sua comunhão total com o Pai e com os homens, o modelo de Homem Novo, Ele tornou-se, para todos aqueles que escutam a sua proposta e que O seguem, “fonte de salvação eterna” (vers. 9).

    Jesus Cristo, o sumo-sacerdote da Nova Aliança, fez bem mais do que os sumos-sacerdotes da linha levítica (Aarão e os seus descendentes). Ao entregar ao Pai o sacrifício da sua própria vida, Ele ofereceu o sacrifício perfeito, o sacrifício capaz de eliminar o pecado; ao mostrar aos homens o caminho da obediência ao projeto do Pai, Jesus apontou-lhes o caminho que conduz à Vida eterna e verdadeira.

     

    INTERPELAÇÕES

    • Jesus desceu até nós, “vestiu” a nossa humanidade, conheceu as nossas fragilidades, partilhou as nossas dores, medos e incertezas, experimentou as dificuldades do caminho que temos de fazer todos os dias. Tornou-se, verdadeiramente, nosso irmão. Pôde, assim, compreender as fraquezas dos homens e propor-lhes uma forma de as superar. Com a sua própria vida, com a sua entrega completa nas mãos do Pai, com o seu testemunho de uma vida dada por amor até ao extremo, Ele mostrou-nos como derrotar tudo aquilo que nos impede de aceder à Vida plena, à Vida verdadeira. Dispomo-nos a seguir Jesus nesse caminho, sem hesitações nem desculpas, confiando completamente n’Ele?
    • A oração, o diálogo com o Pai, é uma dimensão sempre presente na vida de Jesus. Os Evangelhos contam que, após jornadas intensas de anúncio do Reino, Ele retirava-se para lugares isolados para falar com o Pai. Era nesse diálogo que Ele discernia a vontade de Deus e encontrava a força para concretizar os planos do Pai. Foi também no diálogo sempre renovado com o Pai que Ele aprendeu a fazer de toda a sua vida um dom, uma entrega ao Pai e aos homens. Na nossa vida, temos espaço para dialogar com o Pai, para perceber os seus projetos para nós e para o mundo, para escutar os desafios que Deus nos faz? A nossa vida cumpre-se na indiferença para com Deus e para com os seus projetos, ou numa procura sincera e empenhada da vontade de Deus?

     

    ACLAMAÇÃO ANTES DO EVANGELHO – João 12,26

    (escolher um dos 7 refrães)

    1. Louvor e glória a Vós, Jesus Cristo, Senhor.
    2. Glória a Vós, Jesus Cristo, Sabedoria do Pai.
    3. Glória a Vós, Jesus Cristo, Palavra do Pai.
    4. Glória a Vós, Senhor, Filho do Deus vivo.
    5. Louvor a Vós, Jesus Cristo, Rei da eterna glória.
    6. Grandes e admiráveis são as vossas obras, Senhor.
    7. A salvação, a glória e o poder a Jesus Cristo, Nosso Senhor.

    Se alguém Me quiser servir, que Me siga, diz o Senhor,
    e onde Eu estiver, ali estará também o meu povo.

     

    EVANGELHO – João 12, 20-33

    Naquele tempo,
    alguns gregos que tinha vindo a Jerusalém
    para adorar nos dias da festa,
    foram ter com Filipe, de Betsaida da Galileia,
    e fizeram-lhe este pedido:
    «Senhor, nós queríamos ver Jesus».
    Filipe foi dizê-lo a André;
    e então André e Filipe foram dizê-lo a Jesus.
    Jesus respondeu-lhes:
    «Chegou a hora em que o Filho do homem vai ser glorificado.
    Em verdade, em verdade vos digo:
    Se o grão de trigo, lançado à terra, não morrer, fica só;
    mas se morrer, dará muito fruto.
    Quem ama a sua vida, perdê-la-á,
    e quem despreza a sua vida neste mundo
    conservá-la-á para a vida eterna.
    Se alguém Me quiser servir, que Me siga,
    e onde Eu estiver, ali estará também o meu servo.
    E se alguém Me servir, meu Pai o honrará.
    Agora a minha alma está perturbada.
    E que hei de dizer? Pai, salva-Me desta hora?
    Mas por causa disto é que Eu cheguei a esta hora.
    Pai, glorifica o teu nome».
    Veio então uma voz do céu que dizia:
    «Já O glorifiquei e tornarei a glorificá-l’O».
    A multidão que estava presente e ouvira
    dizia ter sido um trovão.
    Outros afirmavam: «Foi um Anjo que Lhe falou».
    Disse Jesus:
    «Não foi por minha causa que esta voz se fez ouvir;
    foi por vossa causa.
    Chegou a hora em que este mundo vai ser julgado.
    Chegou a hora em que vai ser expulso o príncipe deste mundo.
    E quando Eu for elevado da terra,
    atrairei todos a Mim».
    Falava deste modo,
    para indicar de que morte ia morrer.

     

    CONTEXTO

    O evangelho que a liturgia do 5.º Domingo da Quaresma nos propõe situa-nos em Jerusalém, talvez no próprio dia da entrada solene de Jesus na cidade santa (cf. Jo 12,12-19). As multidões “que tinham chegado para a Festa” haviam aclamado Jesus como o rei/messias, encenando um rito de entronização e aclamando-o como aquele “que vem em nome do Senhor, o rei de Israel” (Jo 12,12-13). No entanto, no horizonte próximo paira a sombra da cruz: aproxima-se a “hora” há muito anunciada e esperada (cf. Jo 2,4; 7,30; 8,20), a “hora” do dom da vida até ao extremo, a “hora” da passagem deste mundo para o Pai, a “hora” da glorificação de Jesus.

    O evangelista João coloca em cena “alguns gregos” que “tinham subido a Jerusalém para adorar” e que queriam ver Jesus. “Gregos” significa, provavelmente, “não judeus”. Podem ser prosélitos (estrangeiros convertidos ao judaísmo) ou simples simpatizantes do judaísmo. Esses “gregos” dirigem-se a Filipe. Filipe, por sua vez, vai apresentar a questão a André. Os dois tinham nomes gregos e os dois eram naturais de Betsaida (que significa “casa da pesca”), uma povoação situada na tetrarquia de Herodes Filipe, já fora do território judeu propriamente dito, a nordeste do Mar da Galileia. Filipe e André decidem levar a Jesus a pretensão dos “gregos”.

     

    MENSAGEM

    Os “gregos” vieram a Jerusalém “adorar” a Deus no Templo; mas quiseram “ver” Jesus. Este “ver” deve ser entendido como “conhecer”, encontrar-se com Jesus, tomar contacto com a salvação que Ele veio oferecer (“ver Jesus” – vers. 21). Com isto, o autor do Quarto Evangelho sugere que o Templo e o culto antigo já não são mais os lugares onde a pessoa encontra Deus e a salvação; agora, quem estiver interessado em encontrar a verdadeira libertação deve dirigir-se ao próprio Jesus. Por outro lado, a salvação/libertação que Jesus veio trazer tem um alcance universal e destina-se a todos os homens – mesmo àqueles que vivem fora das fronteiras físicas de Israel (“gregos”).

    Estes “gregos” não se dirigem diretamente a Jesus, mas a um discípulo chamado Filipe que, por sua vez, expõe o pedido a outro discípulo, André. Ambos eram naturais de Betsaida (“casa da pesca”: lembremos que Jesus confiou aos seus discípulos a missão de serem “pescadores de homens” – cf. Mc 1,17). Muito provavelmente temos aqui um aceno à responsabilidade missionária da comunidade de Jesus, encarregada da missão de levar Jesus a toda a terra, inclusive ao mundo grego. Os mesmos dois discípulos são, aliás, referidos no relato joânico da multiplicação dos pães (cf. Jo 6,5.7.8): são eles que levarão o “pão da vida” aos não judeus. O facto de Filipe falar primeiro com André e só depois os dois irem contar o que se passa a Jesus pretende talvez refletir a dificuldade com que as primeiras comunidades cristãs deram o passo para a evangelização dos pagãos. João sugere, com este pormenor, que a decisão de integrar os pagãos na comunidade de Jesus não é uma decisão individual, mas uma decisão que a comunidade tomou depois de haver consultado o Senhor.

    Entretanto, Filipe e André levam a Jesus a pretensão dos “gregos”. Esperava-se que Jesus mandasse chamar esses “gregos” que o queriam conhecer ou que, pelo menos, lhes marcasse um encontro… No entanto, não é isso que acontece. Jesus responde ao pedido dos “gregos” anunciando que chegou a sua “hora”, a “hora” da cruz, a “hora” da sua glorificação. Como é que esta declaração de Jesus responde à pretensão desses “gregos” que o querem “ver”?

    A morte de Jesus na cruz constitui uma excelente chave de leitura para entender a sua vida e o seu projeto. Desde o momento da sua incarnação, Jesus pôs a sua vida ao serviço do plano salvador do Pai. Recusou qualquer projeto pessoal de triunfo e de glória humana, para abraçar o plano de Deus para o mundo e para os homens. Andou por todo o lado – desde a Galileia até Jerusalém – a propor o Reino de Deus; sem se resguardar, enfrentou o sistema opressor que mantinha os homens escravos; denunciou, em nome de Deus, as leis e os comportamentos que eram geradores de sofrimento e morte. Como não podia deixar de ser, entrou em rota de colisão com aqueles que dominavam o mundo. Por isso, foi preso, foi condenado e foi morto na cruz. A sua morte foi a consequência lógica da sua entrega ao projeto do Pai, que pretendia mudar o mundo e libertar os homens.

    Quando se tornou evidente que a proposta de Jesus ia contra os interesses instalados, Jesus podia ter desistido ou, pelo menos, moderado a sua denúncia. Não o fez. A sua obediência a Deus e o seu amor aos homens seus irmãos levou-o a lutar até ao fim, até ao seu último alento. A cruz onde se consumou a “hora” de Jesus é a expressão suprema de uma vida dada por amor; naquela cruz, qualquer pessoa pode ver a lição do amor até ao extremo, do amor que se faz dom total. A cruz “diz” toda a vida de Jesus, a forma como Ele viveu toda a sua vida.

    O que é que resulta deste “dom” de Jesus? Resulta uma nova humanidade, uma humanidade que Jesus libertou da opressão, da injustiça, dos mecanismos que geram sofrimento e medo; uma humanidade que, com Jesus, aprendeu que a vida é para ser dada, sem limites, por amor. Não há dúvida que o dom da vida dá abundantes frutos de vida. Na cruz de Jesus manifesta-se, portanto, o projeto libertador de Deus para os homens. Toda a vida de Jesus foi como “o grão de trigo, lançado à terra”, que morre para dar fruto (vers. 24).

    Os “gregos” queriam conhecer Jesus. Jesus diz-lhes que olhem para a cruz: é na cruz que Ele se revela totalmente, que Ele mostra o sentido da sua vida, que Ele diz porque viveu e para que viveu. É naquele homem que ama até ao dom total de si próprio que se pode ver a proposta de Deus. É nele que se pode encontrar Deus e adorar Deus.

    É esse Jesus e esta proposta de vida que Filipe e André – e os outros discípulos – devem testemunhar diante do mundo. E todos aqueles que escutarem esse testemunho são convidados a tomar posição. Se quiserem servir Jesus, devem segui-l’O nesse caminho que Ele percorreu e pôr as suas vidas ao serviço de Deus e da libertação dos homens. Até ao dom total da vida, por amor (“se alguém Me quer servir, siga-Me” – vers. 26a). Quem aceitar esta proposta permanece unido a Jesus, entra na comunidade de Deus (vers. 26b). Poderá ser desprezado pelo “mundo”; mas será honrado por Deus e acolhido como seu filho (vers. 26c).

    O texto termina com a “voz do céu” que glorifica Jesus (vers. 28-32). É uma forma de mostrar que o caminho de Jesus tem o selo de garantia de Deus. A “voz do céu” assegura que a forma de viver a proposta por Jesus é verdadeira e que Deus garante a sua autenticidade. Confirma-se, desta forma, aos discípulos que oferecer a vida por amor não é um caminho de fracasso e de morte, mas um caminho de glorificação e de vida.

     

    INTERPELAÇÕES

    • A primeira leitura deste domingo dá conta da preocupação de Deus em oferecer aos homens uma nova Aliança, capaz de fazer nascer um Homem Novo. Como é que chegamos a essa realidade do Homem Novo, de coração transformado, isto é, com um coração que sente, que decide e que age segundo os esquemas e a lógica de Deus? O Evangelho responde: é olhando para Jesus, identificando-nos com Ele, aprendendo com Ele a pôr a nossa vida ao serviço do projeto de Deus, seguindo-O no caminho da cruz. Jesus é o modelo, a referência, o exemplo para quem quer aceitar o desafio de Deus e viver na comunidade da nova Aliança. Estamos verdadeiramente decididos a conhecer Jesus, a abraçar as suas propostas, a caminhar atrás d’Ele, como discípulos, no caminho do amor, do serviço, do dom da vida?
    • O caminho que Jesus nos aponta – o caminho da obediência a Deus, do amor até ao extremo, da entrega total da própria vida ao serviço de Deus e dos irmãos – parece, em pleno séc. XXI, um caminho pouco atraente, pouco lógico, pouco moderno, desligado da realidade do mundo, que nos coloca à margem dos valores e realizações que marcam a história do nosso tempo. Sentimo-nos com coragem para remar contra a maré e para dar testemunho – com as nossas palavras, com os nossos gestos, com a nossa vida – do caminho de Jesus? Somos capazes de afirmar, mesmo que nos ridicularizem, persigam e condenem, a nossa profunda convicção de que a proposta de Jesus faz sentido e pode fazer nascer um mundo mais humano, mais justo, mais fraterno, mais são, mais feliz?
    • Jesus rejeita absolutamente o caminho da autossuficiência, do fechamento em si próprio, do egoísmo estéril, dos valores efémeros. Ele sabe bem que, na lógica de Deus, esse caminho é um caminho que produz vidas vazias e sem sentido, sofrimento e frustração, desilusão e desânimo. Quem vive exclusivamente para si próprio, quem se preocupa apenas em defender os seus interesses e perspetivas, quem se apega excessivamente a uma realização pessoal cumprida em circuitos fechados, “compra” uma existência infecunda e que não vale a pena ser vivida. Perde a oportunidade de chegar ao Homem Novo, à realização plena, à vida verdadeira, à ressurreição, à salvação. Nesta “janela de conversão” que é o tempo quaresmal, que temos de mudar na nossa vida, nos nossos valores, nos nossos comportamentos, na nossa história, para estarmos plenamente alinhados com as propostas de Jesus?
    • Filipe e André, homens nascidos na “casa da pesca” e chamados por Jesus a serem “pescadores de homens”, servem de intermediários entre Jesus e os “gregos” que o querem conhecer. É através da comunidade dos discípulos que os homens “veem Jesus”, descobrem o seu projeto, encontram esse caminho de amor e de doação que conduz à vida nova do Homem Novo, à salvação. Isto recorda-nos a nossa responsabilidade de testemunhas de Jesus e da sua salvação no meio dos homens do nosso tempo… Aqueles irmãos que se cruzam connosco nos caminhos da vida descobrem no nosso testemunho o rosto de Jesus? Todos aqueles que vêm ao encontro de Jesus à procura da vida plena encontram na forma como nos doamos, como servimos e como amamos a proposta libertadora que, através de nós, Jesus quer passar a todos os homens? Somos realmente a ponte entre Jesus e aqueles que O querem “conhecer”?

     

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 5.º DOMINGO DA QUARESMA
    (adaptadas, em parte, de “Signes d’aujourd’hui”)

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.

    Ao longo dos dias da semana anterior ao 5.º Domingo da Quaresma, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. BILHETE DE EVANGELHO.

    Se o grão de trigo quer dar fruto, é preciso que ele passe pela terra onde vai apodrecer, mas o seu percurso não pára aí, o fruto brotará. Jesus quer dar a vida, Ele escolhe passar pela morte, dando então a maior prova de amor. Mas a sua missão não pára aí, a vida brotará: a sua própria vida é a ressurreição; e a vida da humanidade é a salvação. “Não era necessário que Cristo sofresse tudo isto para entrar na sua glória?”, dirá Ele aos discípulos no caminho de Emaús. Se queremos que os outros vivam, é preciso que passemos por um certo número de renúncias, de esquecimentos de nós próprios, e isto através do serviço, do acolhimento, do perdão. Mas a nossa relação com os outros não pára aí, a alegria brota nos rostos e no nosso próprio rosto. A morte é uma passagem obrigatória para aquele que ama e quer amar até ao fim.

    3. À ECUTA DA PALAVRA.

    “Queremos ver Jesus”… Em resposta ao pedido dos Gregos, Jesus anuncia a sua próxima “glorificação”, isto é, a sua morte. Estranha associação esta, da morte com a glória! Mas Jesus explica: “Se o grão de trigo, lançado à terra, não morrer, fica só; mas se morrer, dará muito fruto”. Sabemos que, na realidade, o grão enterrado na terra sofre uma profunda transformação. O seu invólucro exterior deve rebentar e acabar por desaparecer para que o germe, até então escondido, possa crescer e produzir novos grãos. Na morte de Jesus acontece a “explosão” da Ressurreição. Os discípulos reconhecem em Jesus a presença imediata de Deus. Então, Ele será glorificado. A “glória” é o “peso” no sentido de “densidade”, de um ser. A verdadeira glória, a verdadeira densidade do ser de Jesus, é que a sua humanidade é o lugar da incarnação do Filho eterno do Pai. Porque estamos ainda no tempo da germinação secreta, não vemos ainda esta glória do Senhor. Mas acolhendo o testemunho dos apóstolos que “comeram e beberam com Ele depois da sua ressurreição de entre os mortos”, podemos deixar-nos atrair por Jesus, acolher e ver “já” pela fé o seu mistério de glória, e testemunhar assim, no coração do mundo, que Ele, o Filho do homem, é verdadeiramente o Filho de Deus, vencedor da morte.

    4. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE…

    Redescobrir a “caridade”… A palavra “caridade”, por vezes, parece não ter muito sentido hoje, devido a deformações e incompreensões da própria palavra. A encíclica de Bento XVI “Deus é caridade” ajuda-nos a recuperar o seu sentido genuíno. É preciso redescobrir o verdadeiro sentido evangélico e amar os nossos irmãos: pela escuta, pelo serviço, pela partilha, pela atenção aos mais pobres! Ao longo desta semana, procuremos gestos concretos para praticar a caridade!

     

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA

    Grupo Dinamizador:
    José Ornelas, Joaquim Garrido, Manuel Barbosa, Ricardo Freire, António Monteiro
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
    www.dehonianos.org

  • Segunda-feira - 5ª Semana da Quaresma

    Segunda-feira - 5ª Semana da Quaresma

    18 de Março, 2024

    Lectio

    Primeira leitura: Daniel 13, 41c-62

    Naqueles dias, a assembleia condenou Susana à morte. Então Susana disse em altos brados: «Deus eterno, que sabeis o que é secreto e conheceis todas as coisas antes que aconteçam, Vós sabeis que eles proferiram contra mim um falso testemunho. E eu vou morrer, sem ter feito nada do que eles maliciosamente disseram contra mim». O Senhor ouviu a oração de Susana. Quando a levavam para ser executada, Deus despertou o espírito santo dum rapazinho chamado Daniel, que gritou com voz forte: «Eu sou inocente da morte desta mulher». Todo o povo se voltou para ele e perguntou: «Que palavras são essas que acabas de dizer?» Daniel, de pé no meio deles, respondeu: «Sois tão insensatos, ó filhos de Israel, que, sem julgamento nem conhecimento claro dos factos, condenais uma filha de Israel? Voltai ao tribunal, porque estes dois homens levantaram contra ela um falso testemunho». O povo regressou a toda a pressa e os anciãos disseram a Daniel: «Vem sentar-te no meio de nós e expõe-nos o teu pensamento, pois Deus concedeu-te a dignidade dos anciãos». Daniel disse-lhes: «Separai-os um do outro e eu os julgarei». Quando os separaram, Daniel chamou o primeiro e disse-lhe: «Envelheceste na prática do mal, mas agora aparecem os pecados que outrora cometeste, quando lavravas sentenças injustas, condenando os inocentes e absolvendo os culpados, apesar de o Senhor dizer: ‘Não dareis a morte ao inocente e ao justo’. Pois bem. Se viste esta mulher, debaixo de que árvore descobriste os dois juntos?». Ele respondeu: «Debaixo de um lentisco». Replicou Daniel: «A tua mentira cairá sobre a tua cabeça, pois o Anjo de Deus já recebeu a sentença, para te rachar ao meio». Depois de o terem afastado, Daniel ordenou que trouxessem o outro e disse-lhe: «Raça de Canaã e não de Judá, a beleza seduziu-te e o desejo perverteu-te o coração. Era assim que procedíeis com as filhas de Israel e elas por medo entregavam-se a vós. Pois bem, diz-me então: Debaixo de que árvore os surpreendeste juntos?» Ele respondeu: «Debaixo de um carvalho». Replicou Daniel: «A tua mentira cairá sobre a tua cabeça, pois o Anjo de Deus está à tua espera com a espada na mão para te cortar ao meio. Assim acabará convosco». Toda a assembleia clamou em alta voz, bendizendo a Deus, que salva aqueles que esperam n’Ele. Levantaram-se então contra os dois velhos, porque Daniel os tinha convencido de falso testemunho, pela sua própria boca. Para cumprirem a Lei de Moisés, aplicaram-lhes a mesma pena que tão impiamente tinham preparado para o seu próximo e executaram-nos; e foi salva naquele dia uma vida inocente.

     

    O episódio da jovem e bela Susana, assediada por dois anciãos de Israel, no tempo do exílio em Babilónia, é uma história edificante colocada em apêndice ao livro de Daniel. Encontramos aí o próprio profeta, como vidente muito jovem, que faz ver a todos a inocência de Susana - cujo nome em hebraico significa "lírio" - desmascarando a corrupção dos dois anciãos (vv. 42-59). Neles são também acusados os chefes saduceus do século I a. c., aparentemente irrepreensíveis, mas, na realidade, guias cegos que desviam o povo do bom caminho.

    Para se manter fiel a Deus e ao marido, Susana enfrenta o perigo da lapidação, quer ceda ao adultério, quer resista às torpes propostas dos anciãos e seja caluniada (v. 22). Susana prefere morrer inocente a consentir no mal (v. 23). Tendo posta a sua confiança nas mãos de Deus (v. 43), pôde verificar que Ele escuta a voz dos seus fiéis (v. 44) e vem em seu auxílio com prontidão e força (vv. 45-62).

    Evangelho: João 8, 1-11

    Naquele tempo, Jesus foi para o Monte das Oliveiras. Mas de manhã cedo, apareceu outra vez no templo e todo o povo se aproximou d’Ele. Então sentou-Se e começou a ensinar. Os escribas e os fariseus apresentaram a Jesus uma mulher surpreendida em adultério, colocaram-na no meio dos presentes e disseram a Jesus: «Mestre, esta mulher foi surpreendida em flagrante adultério. Na Lei, Moisés mandou-nos apedrejar tais mulheres. Tu que dizes?». Falavam assim para Lhe armarem uma cilada e terem pretexto para O acusar. Mas Jesus inclinou-Se e começou a escrever com o dedo no chão. Como persistiam em interrogá-l’O, Ele ergueu-Se e disse-lhes: «Quem de entre vós estiver sem pecado atire a primeira pedra». Inclinou-Se novamente e continuou a escrever no chão. Eles, porém, quando ouviram tais palavras, foram saindo um após outro, a começar pelos mais velhos, e ficou só Jesus e a mulher, que estava no meio. Jesus ergueu-Se e disse-lhe: «Mulher, onde estão eles? Ninguém te condenou?». Ela respondeu: «Ninguém, Senhor». Jesus acrescentou: «Também Eu não te condeno. Vai e não tornes a pecar».

     

    Os exegetas pensam que este texto é de origem sinóptica, provavelmente lucana, tendo aparecido no capítulo 8 de João como um meteorito errático onde, todavia, não destoa, tornando-se um exemplo concreto do tema de todo o capítulo:

    Cristo-Luz (cf. v. 12) que inevitavelmente faz um juízo (v. 15), não segundo as aparências, mas segundo a verdade mais profunda do coração de cada um.

    O enredo é muito simples: de madrugada (v. 2), depois de ter passado toda a noite em oração no Monte das Oliveiras, Jesus é abordado pelos escribas e fariseus que lhe apresentam uma mulher apanhada em adultério para que a julgue. Faziam isto para armar uma cilada a Jesus (v. 6), obrigando-o dissimuladamente a pronunciar-se contra a lei de Moisés, que em tal caso prevê a lapidação, ou contra o direito romano, que desde 30 d. c., retirou ao sinédrio o jus gladii, reservando para si o poder de pronunciar condenações à morte.

    Todo o texto converge para a pergunta: «Mulher, onde estão eles? Ninguém te condenou?» ... «Também Eu não te condeno. Vai e de agora em diante não tornes a pecar». No deserto criado pelo pecado, irrompe a novidade: um rio de misericórdia, que purifica e cura tudo à sua volta (Ap 21, 5), tornando nova toda a criatura.

    Meditatio

    O episódio edificante de Susana revela-nos que o recto juízo de Deus descobre e condena, mais tarde ou mais cedo, a injustiça humana. A Palavra de Deus é como uma lâmpada que se acende numa sala escura: os seus raios alargam-se instantaneamente até aos cantos mais afastados e esquecidos. Assim sucedeu quando Jesus, Luz do mundo, se tornou presente no meio de nós. Não se pode resistir-lhe: quem não acolhe a Palavra de Deus, a Luz de Cristo, é por elas julgado. Elas revelam o que estava oculto e fazem brilhar a justiça. A Palavra de Deus perscruta o mais íntimo dos corações, revela as intenções mais secretas, desmarcara as tramas da mentira. Então, revela-se claramente quem confia unicamente em Deus, e apenas teme não corresponder à grandeza do seu amor misericordioso. E também se revela quem, tendo a mente e o coração mesquinhos, vai procurar furtivas satisfações, como se a felicidade fosse incompatível com a fidelidade à verdade e ao Evangelho.

    É a própria vida que, momento a momento, realiza este discernimento. Feliz quem se deixa penetrar pela Palavra de Deus como por um raio de luz, que separa no seu coração o ouro das escórias. À luz da verdade poderá saborear a liberdade do abandono filial nas mãos paternas de Deus, e nada nem ninguém poderá meter-lhe medo ou induzi-lo em engano.

    O evangelho apresenta-nos um caso em que a lei pode escravizar. Os fariseus, mais do que cumprir a lei, queriam ficar bem com a sociedade e, por isso, iam sacrificar o futuro de uma pessoa humana. Jesus tem uma atitude totalmente diferente. Coloca-se do lado da pecadora, carrega sobre Si o castigo, a pena e o sofrimento pelo pecado. Por isso pode ser indulgente e oferecer o perdão de Deus. Não se trata, pois, de uma indulgência fácil. Perdoa à adúltera e recomenda-lhe que não volte a pecar, porque, na sua paixão, expia o pecado e dá força aos pecadores arrependidos para caminharem no amor do Pai.

    O texto que escutamos, mostra-nos também a mansidão com que Jesus se aproxima da sua paixão. Ela é um acto de misericórdia que agrada mais a Deus do que todos os sacrifícios rituais oferecidos no templo de Jerusalém. A narrativa da adúltera (Jo 8) dá-nos a medida da profundidade da misericórdia divina, se tal se pode dizer de uma misericórdia infinita. Deus amou-nos até ao fim, enviando o seu Filho para tomar sobre Si os nossos pecados, nos perdoar e nos dar uma vida nova cheia de caridade, de alegria e de paz.

    Oratio

    Senhor Jesus, enche-nos do teu Espírito Santo, para que não condenemos com dureza quem pratica o mal, nem sejamos facilmente indulgentes com eles. Sabemos que, também nós, somos pecadores. Por isso, não queremos distinguir-nos deles, mas solidarizar-nos com eles, para carregarmos o pecado do mundo, como Tu fizeste. Ajuda-nos também a não sermos facilmente indulgentes connosco ou com os outros pecadores, desculpando-nos e desculpando os outros com as circunstâncias do mundo actual, para não corrermos o risco de baixar os braços na luta contra o mal. Não foi essa a tua atitude perante a mulher adúltera. Não diminuíste a gravidade do seu pecado, mas assumiste-o e reparaste-o com a tua gloriosa morte e ressurreição. Que todos, e cada um de nós, saibamos assumir o próprio pecado e o pecado do mundo, oferecendo-nos, e oferecendo a nossa vida, como oblação reparadora ao Pai pelos homens. Amen.

    Contemplatio

    Diz ainda aos Fariseus: «Euntes autem discite quid est: misericordiam volo et non sacrificium». Ide, consultai os profetas, homens de coração duro, e sabei o que Oseias disse em meu nome: prefiro a misericórdia ao sacrifício, isto é, a oferta de um coração misericordioso é mais agradável a meu Pai e a mim do que todos os sacrifícios da antiga lei: «Non enim veni vocare justos sed peccetores». Vim principalmente para salvar os pecadores, e em segundo lugar, para chamar os justos, mas não vim para os falsos justos que desprezam e repelam os pecadores.

    Que censuras faz à samaritana? Ela era bem culpável, tinha tido vários maridos, e aquele que ela tinha então não era o seu. No entanto, não tem por ela senão palavras de doçura: «Si scires donum Dei. Se tu conhecesses o dom de Deus!» E que dom é este, senão a água da graça e da misericórdia que jorrava para a vida eterna?

    Os judeus levam-lhe a mulher adúltera; aqui, está envolvido por homens que têm um coração de juiz, e que querem mesmo obter d'Ele uma sentença de juiz contra esta pecadora. Que faz o Coração de Jesus? Não somente não a acolhe como juiz; mas volta-se de tal modo a favor dela que já ninguém ousa julgá-Ia. E então que é que Ele diz?: «Nemo te condemnavit? - Nemo, Domine. - Nec ego condemnabo: Ninguém te condenou, eu também não te condenarei». E hoje ainda, há um tribunal na terra? Sim, mas este é um tribunal onde só se pronunciam sentenças de absolvição, o tribunal do sacramento da penitência.

    Ele cumula com os seus favores Madalena gemendo aos seus pés, e assegura por um só acto de contrição o paraíso ao bom ladrão. (Leão Dehon, OSP 2, p. 273).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra: «Vai,' não tornes a pecar» (cf. Jo 8, 11).

  • S. José, Esposo da Virgem S. Maria

    S. José, Esposo da Virgem S. Maria


    19 de Março, 2024

    O culto litúrgico a S. José celebra-se, pelo menos, desde o século IV, quando Santa Helena lhe dedicou uma igreja. No Oriente, celebrava-se, a partir do século IX, uma festa em sua honra. No Ocidente o culto é mais tardio. No século XII, é celebrado entre os Beneditinos. No século XII, é celebrado entre os Carmelitas, que o propagam na Europa. No século XV, João Gerson e S. Bernardino de Sena são os seus fervorosos propagandistas. Santa Teresa de Jesus era uma devota fervorosa de S. José e muito promoveu o seu culto.

    S. José, descendente de David, era provavelmente de Belém. Por motivos familiares ou de trabalho, transferiu-se para Nazaré e tornou-se esposo de Maria. O anjo de Deus comunicou-lhe o mistério da incarnação do Messias no seio de Maria, e José, homem justo, aceitou-o apesar da dura crise por que passou. Indo a Belém para o recenseamento, lá nasceu o Menino Jesus. Pouco depois, teve de fugir com ele para o Egipto, donde regressou a Nazaré. Quando Jesus tinha doze anos, vemos José e Maria em Jerusalém, onde perdem o filho e acabam por o reencontrar entre os doutores do templo. A partir deste episódio, os evangelhos nada mais dizem sobre José. É possível que tenha morrido antes de Jesus iniciar a sua vida pública.

    S. José é padroeiro da Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus, Dehonianos.

    Lectio

    Primeira leitura: 2 Samuel 7, 4-5a.12-14a.16

    Naqueles dias, a palavra do Senhor foi dirigida ao profeta Natã, dizendo-lhe: 5«Vai dizer ao meu servo David: Diz o Senhor: 12Quando chegar o fim dos teus dias e repousares com teus pais, manterei depois de ti a descendência que nascerá de ti e consolidarei o seu reino. 13Ele construirá um templo ao meu nome, e Eu firmarei para sempre o seu trono régio. 14Eu serei para ele um pai e ele será para mim um filho. 16A tua casa e o teu reino permanecerão para sempre diante de mim, e o teu trono estará firme para sempre".»

    A profecia de Natã acena a Salomão, filho de David e construtor do templo. Mas as palavras: "manterei depois de ti a descendência que nascerá de ti e consolidarei o seu reino" (v. 12), indicam uma longa descendência no trono de Judá. Esta descendência teve um fim histórico, recebendo força profética na alusão velada ao Messias, descendente de David. Ele reinará para sempre. Mas o seu reino não será deste mundo. Será um reino espiritual para salvação da humanidade. A tradição cristã sempre aplicou este texto a Jesus, Messias descendente de David, e indiretamente também a José, o último elo da genealogia davídica.
    Segunda leitura: Romanos 4, 13.16-18.22

    Irmãos: Não foi em virtude da Lei, mas da justiça obtida pela fé que a Abraão, ou à sua descendência, foi feita a promessa de que havia de receber o mundo em herança. 16Por isso, é da fé que depende a herança. Só assim é que esta é gratuita, de tal modo que a promessa se mantém válida para todos os descendentes: não apenas para aqueles que o são em virtude da Lei, mas também para os que o são em virtude da fé de Abraão, pai de todos nós, 17conforme o que está escrito: Fiz de ti o pai de muitos povos. Pai diante daquele em quem acreditou, o Deus que dá vida aos mortos e chama à existência o que não existe. 18Foi com uma esperança, para além do que se podia esperar, que ele acreditou e assim se tornou pai de muitos povos, conforme o que tinha sido dito: Assim será a tua descendência. 22Esta foi exactamente a razão pela qual isso lhe foi atribuído à conta de justiça.

    Paulo evoca a figura de Abraão, pai dos crentes, que reconheceu a sua indigência e se apoiou, isto é, "acreditou" em Deus recebendo o "juízo de salvação", a "justificação". A sua indigência foi superada e pôde realizar a sua "tarefa existencial", a sua "obra", que naquelas circunstâncias consistia na sua paternidade para com Isaac. A liturgia aplica a S. José o elogio de Paulo a Abraão. A fé do esposo de Maria, submetida a duras provas, manteve-se firme, fazendo dele "homem justo", e pai adoptivo de Jesus. A sua resposta de fé manteve-se durante toda a sua vida. Por isso, colaborou com disponibilidade e generosidade no projeto de salvação a que Deus o associou. Se Abraão é "tipo" do cristão, José também o é. Abraão sabia-se condenado à morte, pois não teria descendência. Mas acreditou e recebeu uma grande descendência da mão de Deus. José aceitou ser "pai" de Quem não era seu filho, mas Filho de Deus e de Maria, e colaborou na geração da humanidade nova, nascida da morte e da ressurreição de Cristo.
    Evangelho: Lucas 2, 41-51a

    Os pais de Jesus iam todos os anos a Jerusalém, pela festa da Páscoa. 42Quando Ele chegou aos doze anos, subiram até lá, segundo o costume da festa. 43Terminados esses dias, regressaram a casa e o menino ficou em Jerusalém, sem que os pais o soubessem. 44Pensando que Ele se encontrava na caravana, fizeram um dia de viagem e começaram a procurá-lo entre os parentes e conhecidos. 45Não o tendo encontrado, voltaram a Jerusalém, à sua procura. 46Três dias depois, encontraram-no no templo, sentado entre os doutores, a ouvi-los e a fazer-lhes perguntas. 47Todos quantos o ouviam, estavam estupefactos com a sua inteligência e as suas respostas. 48Ao vê-lo, ficaram assombrados e sua mãe disse-lhe: «Filho, porque nos fizeste isto? Olha que teu pai e eu andávamos aflitos à tua procura!» 49Ele respondeu-lhes: «Porque me procuráveis? Não sabíeis que devia estar em casa de meu Pai?» 50Mas eles não compreenderam as palavras que lhes disse. 51Depois desceu com eles, voltou para Nazaré.

    A lei judaica mandava que os primogénitos, sendo sagrados, deviam ser entregues a Deus ou sacrificados. Como o sacrifício humano era proibido, a lei obrigava a fazer uma espécie de troca, de maneira que em vez do menino, era oferecido um animal puro (cordeiros, pombas) (cf. Ex 13 e Lv 12). Lucas parece ter presente que Jesus, primogénito de Maria, era primogénito de Deus. Por isso, com a substituição do sacrifício - oferecem-s duas pombas - é evidenciado o fato de Jesus ser "apresentado ao Senhor", isto é, solenemente oferecido ao Pai. O sentido deste oferecimento só se compreende à luz da cena do calvário, onde Jesus já não pode ser substituído e morrerá como autêntico primogénito, que se entrega ao Pai pela salvação dos homens.

    Como pai adoptivo, José preocupa-se por tudo uanto diz respeito a Jesus. Embora não lhe seja dado penetrar completamente no mistério das relações de Jesus com o Pai, e também não compreendendo tudo quanto Jesus faz e diz, deixa-se no entanto, conduzir por Deus, com uma fé dócil e silenciosa. A sua máxima, à semelhança da de Jesus e da de Maria, poderia ser: "Ecce servus tuus", eis o teu servo.

    Meditatio

    A Igreja convida-nos, hoje, a voltar-nos para S. José, a alegrar-nos e a bendizermos a Deus pelas graças com que o cumulou. S. José é o "homem justo" (Mt 1, 19). A sua justiça vem-lhe do acolhimento do dom da fé, da retidão interior e do respeito para com Deus e para com os homens, para com a lei e para com os acontecimentos. É o que nos sugere a segunda leitura. Não foi fácil para José aceitar uma paternidade que não era dele e, depois, a responsabilidade de ser o mestre e guia d´Aquele que, um dia, havia de ser o pastor de Israel. Respeito, obediência e humildade estão na base da "justiça" de José. Foi esta atitude interior, no desempenho da sua missão única, que guindaram José ao cume da santidade cristã, junto de Maria, a sua esposa.

    As atitudes de José são características dos grandes homens, de que nos fala a Bíblia, escolhidos e chamados por Deus para missões importantes. Embora se considerassem pequenos, fracos e indignos, aceitavam e realizavam a missão, confiando n´Aquele que lhes dizia: "Eu estarei contigo".

    José não procurou os seus interesses e satisfações, mas colocou-se inteiramente aos serviços dos que amava. O seu amor pela esposa, Maria, visava unicamente servir a vocação a ela que fora chamada. Deste modo, o casal chegou a uma união espiritual admirável, donde brotava uma enorme e puríssima alegria. Era a perfeição do amor. O amor de José por Jesus apenas visava servir a vocação de Jesus, a missão de Jesus. Para José, o filho não era uma espécie de propriedade a quem impunha uma autoridade e afeto tirânico, como, por vezes, acontece com alguns pais. José sabia que Jesus não era dele, e nada mais desejava do que prepará-lo, conforme as suas capacidades, para a missão de Salvador, como lhe fora dito pelo Anjo.

    Por intercessão do nosso santo, peçamos a Deus a fé, a confiança, a docilidade, a generosidade e a pureza do amor para nós mesmos e para quantos têm responsabilidades na Igreja, para que as maravilhas de Deus se realizem também nos nossos dias.

    Oratio

    Ó S. José, eu admiro e louvo a vossa perfeição e a vossa santidade. Que exemplos e que méritos! A vossa intercessão no céu é sempre escutada. O Coração de Jesus não pode ficar insensível à vossa oração. Pedi hoje a minha conversão, a minha santificação. Pedi o perdão de todas as minhas faltas e a graça de corresponder ao que Nosso Senhor espera de mim. Fiat! Fiat! (Leão Dehon, OSP 3, p. 309).

    Contemplatio

    José, o justo, o santo, entra simplesmente nos desígnios do céu sobre ele e torna-se esposo de Maria por um casamento virginal; esposo de uma Virgem, de uma Rainha, esposo da Mãe de Deus e da Esposa do Espírito Santo! Mas o seu coração é digno dela. Na sua alma reúnem-se a fé viva dos patriarcas, as nobres aspirações dos profetas, as esperanças das gerações passadas. O seu coração é o mais puro, o mais amável, o mais celeste de todos, depois do Coração de Jesus e do Coração imaculado de Maria. José é o esposo da Virgem Maria, com que respeito a envolve! Que delicadeza, que discrição nas suas relações com ela! Aprendeu de cor a sua sublime missão de castidade e de amor. E quando foi advertido pelo anjo a respeito dos grandes desígnios de Deus sobre o filho de Maria, associou-se de coração à missão de vítima do seu filho adotivo e aceitou sem reserva todos os sofrimentos que daí resultariam para ele. Esposo de Maria! Que conjunto de graças este título supõe. José esteve unido mais do que ninguém neste mundo à Mãe de Deus. Tiveram todos as mesmas vistas, todos as mesmas orações e os mesmos sofrimentos. Os méritos de S. José aproximam-se dos de Maria. Que grandeza e que dignidade! José é o pai nutritivo de Jesus, pai legal e pai putativo. Tem tudo o que pode pertencer à paternidade sem ferir a virgindade. Tem todos os direitos e toda a autoridade de um pai. É o chefe da Sagrada Família. (Pe. Dehon, OSP 3, p. 308).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Ecce servus tuus! Eis o teu servo!"

     

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    S. José, Esposo da Virgem S. Maria (19 Março)

    Terça-feira - 5ª Semana da Quaresma

    Terça-feira - 5ª Semana da Quaresma

    19 de Março, 2024

    Lectio

    Primeira leitura: Números 21, 4-9

    Naqueles dias, os filhos de Israel partiram do monte Hor; pelo caminho do Mar dos Juncos para contornar a terra de Edom, mas cansaram-se na caminhada. 50 povo falou contra Deus e contra Moisés: «Porque nos fizestes sair do Egipto? Foi para morrer no deserto, onde não há pão nem água, estando enjoados com este pão levíssimo?» 6Mas o Senhor enviou contra o povo serpentes ardentes, que mordiam o povo, e por isso morreu muita gente de Israel. 70 povo foi ter com Moisés e disse-lhe: «Pecámos ao protestarmos contra o Senhor e contra ti. Intercede junto do Senhor para que afaste de nós as serpentes.» E Moisés intercedeu pelo povo. 80 Senhor disse a Moisés: «Faz para ti uma serpente abrasadora e coloca-a num poste. Sucederá que todo aquele que tiver sido mordido, se olhar para ela, ficará vivo.» 9Moisés fez, pois, uma serpente de bronze e fixou-a sobre um poste. Quando alguém era mordido por uma serpente e olhava para a serpente de bronze, vivia.

    o povo de Israel continuou a contestar Moisés e a murmurar contra a providência de Deus. O castigo não se fez esperar, porque apareceram as serpentes ardentes, que mordiam as pessoas e as faziam morrer. Mas o castigo em breve se transforma em misericórdia. A serpente de bronze erguida sobre um poste, torna-se um sinal de salvação para quem a olha com fé. As serpentes eram veneradas pelos povos pagãos vizinhos. Este episódio, fora do seu contexto, poderia ser visto como idolatria. Mas a tradição javista liga o culto das serpentes, depois destruído por Ezequias (cf. 2 Re 18, 4) à sábia pedagogia de Deus. Com a mediação de Moisés, ofereceu ao seu povo a possibilidade de evitar ceder aos cultos das nações pagãs por onde passava.

    A serpente de bronze torna-se um sinal que encontra continuidade e realização no Evangelho (cf. Jo 3, 14). A serpente, no deserto, foi sinal da misericórdia de Deus que dá remédio ao castigo. No Evangelho, Cristo elevado na cruz, mostra o castigo e a misericórdia juntos: é o castigo de Deus pelo nosso pecado e, ao mesmo tempo, a maior manifestação do poder divino que cura do pecado.

    Evangelho: João 8, 21-30

    Naquele tempo, disse Jesus aos fariseus: 21 «Eu vou-me embora: vós haveis de procurar-me, mas morrereis no vosso pecado. Vós não podereis ir para onde Eu vou» 22 Então, os judeus comentavam: «Será que Ele se vai suicidar, dado que está a dizer: 'Vós não podeis ir para onde Eu vou'?» 23 Mas Ele acrescentou: «Vós sois cá de baixo; Eu sou lá de cima! Vós sois deste mundo; Eu não sou deste mundo.24Já vos disse que morrereis nos vossos pecados. De facto, se não crerdes que Eu sou o que sou, morrereis nos vossos pecados.»25perguntaram-Ihe, então: «Quem és Tu, afinal?» Disse-lhes Jesus: «Absolutamente aquilo que já vos estou a dizer! 26Tenho muitas coisas que dizer e que julgar a vosso respeito; mas do que falo ao mundo é do que ouvi àquele que me enviou, e que é verdadeiro.» 27E1es não perceberam que lhes falava do Pai. 28 Disse-lhes, pois, Jesus: «Quando tiverdes erguido ao alto o Filho do Homem, então ficareis a saber que Eu sou o que sou e que nada faço por mim mesmo, mas falo destas coisas tal como o Pai me ensinou. 29E aquele que me enviou está comigo. Ele não me deixou só, porque faço sempre aquilo que lhe agrada.» 30Quando expunha estas coisas, muitos creram nele.

    Em mais uma discussão, junto ao templo, Jesus oferece aos os chefes dos Judeus nova oportunidade para serem iluminados sobre o mistério do Filho do homem (cf. Dn 7, 13) e para acolherem a revelação da sua divindade. Duas vezes repete o «Eu SOLP>, nos vv. 24.28. Mas, mais uma vez recusam a oportunidade, compreendendo mal as afirmações sobre a sua iminente partida (vv. 21-24), sobre a sua identidade (vv. 25- 29) de enviado de Deus e de definitivo revelador (cf. Jo 5, 30; 6, 38). Entendem mal Jesus e as suas palavras, porque eles são eles são «cá de beba», enquanto Jesus é « lá de amei», Separa-os um abismo, que só a fé pode preencher. Jesus convida à fé, que eleva o olhar do homem para o alto. Mas os chefes do Judeus, mais uma vez, «não perceberem». Jesus é sinal de contradição. Sê-lo-á maximamente quando for erguido na cruz. Aí, ao realizar o projecto de salvação, revelará os pensamentos secretos dos corações e manifestará definitivamente a sua identidade de Filho, que diz e cumpre a vontade do Pai. Enquanto se aprofunda o abismo entre Jesus e os seus adversários, o evangelista termina com uma nota de esperança (cf. v. 30).

    Meditatio

    No evangelho, Jesus alude à salvação por meio da cruz, de que o episódio da serpente de bronze colocada sobre um poste (Nm 21, 4-9), é um símbolo. A serpente de bronze foi erguida sobre um poste; Jesus deve ser erguido na cruz. A expressão que vem no evangelho de S. João, referente ao erguer de Cristo na cruz, significa algo como a sua exaltação, a sua glorificação. Deus, querendo glorificar o seu Filho, deixou que fosse «erguido» na cruz. Uma tal glória pode parecer estranha a um olhar simplesmente humano. Mas o olhar da fé permite-nos entrever a enorme honra que foi, para Jesus, aceitar o sacrifício por amor ao Pai, tal como foi para o Pai um enorme gesto de amor pedir a Jesus o sacrifício total de Si mesmo. Com esse sacrifício, Jesus fez novas todas as coisas, mudou o coração do homem.

    A graça que brota da cruz de Cristo, torna-nos capazes de percorrer o caminho da justiça. E verdade que, por nós mesmos, não podemos ir para onde Ele está, porque não somos autores da nossa salvação. Mas, se erguermos os nossos olhos, obscurecidos pelo pecado, para Aquele que, como diz S. Paulo, foi tornado pecado por nós, nesse cruzar de olhares - porque também Ele nos olha do alto da cruz - havemos de descobrir, não só que estamos no caminho certo, mas que a nossa felicidade eterna já começou.

    Ao adorarmos a cruz, na Sexta-feira Santa, poderemos recordar algumas expressões das leituras de hoje: «Quando alguém olhava para a serpente de bronze, vivis» (Nm 21, 9); «Então ficareis a saber que Eu SOU» (Jo 8, 28). Contemplada demorada mente, a cruz revela-nos quem é Jesus: é o caminho, a verdade, a vida.

    Cristo é a vida. É "Aquele que vive' (Apoc 1, 18; n. 11). A vida é a primeira realidade que S. João realça no Verbo eterno de Deus: "N 'Ele estava a vida ... " (Jo 1, 4) e só porque é" vida", o Verbo é "luz dos homens' (Jo 1, 5), que nos permite ver a verdade. A verdade sobre Deus, mas também a verdade sobre Cristo, a verdade sobre nós mesmos e sobre o projecto de Deus acerca de nós. Em Cristo, "primogénito' (Col 1, 15), isto é, primeiro projectado, "primícias' dos "santos' e dos "ressuscitados' (Cf. Jo 1, 17; 1 Cor 15, 20; Col 1, 18) nós todos fomos, por Deus, "projectados, pensados, queridos, escolhidos e repletos de todas as bênçãos, já antes da fundação do mundo (Ef 1, 3-6)".

    A descoberta da verdade de Cristo, e do projecto de Deus, em Cristo, leva-nos ao discipulado: "O seu Caminho é o nosso caminho", afirma o n. 12 das Constituições. E nós percorremos Cristo-Caminho, com a nossa vida religiosa dehoniana, tendo fixo o olhar no "Lado aberto do Crucificado" e no "Coração de Cristo" (Cst. 20).

    Oratio

    Senhor Jesus, ensina-me e ajuda-me a contemplar o teu grande amor pelo Pai, e o grande amor do Pai por Ti, para que o meu coração se dilate de alegria e de generosidade. O amor do Pai por Ti manifestou-se na plena confiança com que Te entregou ao sacrifício que havia de salvar o mundo, fazendo novas todas as coisas, e mudando o nosso coração. O teu amor pelo Pai manifestou-se na obediência pronta e generosa com que Te dispuseste a realizar o seu projecto salvador. Nessa troca de amor, descubro também o imenso amor do Pai, e o teu, por mim e por cada um dos homens. Esse amor não permitiu que fôssemos abandonados ao horror do pecado. Contemplando-Te na cruz, descubro o mistério de amor incomensurável com que fui salvo, com que todos fomos salvos. Eu Te dou graças, de todo o coração, pedindo que me ajudes a corresponder a esse amor. Amen.

    Contemplatio

    «Quando tiver sido elevado da terra atrairei tudo a mm», dizia Nosso Senhor falando da sua cruz redentora (Jo 12).

    Sim, Senhor, a vossa cruz atraiu, durante séculos, tudo a vós. Mas hoje é o vosso lado aberto que nos fascina. A revelação do vosso Coração vem remover o nosso e arrebatá-lo num insaciável amor por vós.

    Coração por coração: nós queremos dar-nos a vós sem reservas, como vós vos destes a nós. Alguns santos, para melhor marcar a vossa tomada de posse dos seus corações gravaram sobre os seus peitos o vosso nome sagrado.

    Um dia em que o bem aventurado Henrique Suso tinha feito isto, dissestes-lhe estas palavras benevolentes: «Acima de tudo, aprende a esconder-te no meu lado aberto e na ferida que o amor fez ao meu Coração! Hei-de colorir-te com a púrpura do meu sangue; ligar-me-ei a ti por laços indissolúveis e o meu espírito unír-se-á ao teu com uma união eternal» (Livro da sabedoria eterna, c. 22).

    Ó bom Mestre, não terei repouso enquanto não me admitirdes também no vosso Coração (leão Dehon, OSP 2, p. 384).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:

    «Os nosso olhos estão voltados para o senhor- (SI 122, 2).

  • Quarta-feira - 5ª Semana da Quaresma

    Quarta-feira - 5ª Semana da Quaresma

    20 de Março, 2024

    Lectio
    Primeira leitura: Daniel 3, 14-20.91-92.95

    14 Disse-lhes Nabucodonosor: «Chadrac, Mechac e Abed-Nego, é verdade que rejeitais o culto aos meus deuses e a adoração à estátua de ouro erigida por mim? 15 Pois bem! Estais dispostos, no momento em que ouvirdes o som da trombeta, da flauta, da cítara, da lira, da harpa, do saltério e de qualquer outro instrumento musical, a prostrar-vos em adoração diante da estátua que eu fiz? Se não o fizerdes, sereis logo lançados dentro da fornalha ardente. E qual o deus que poderá libertar-vos da minha mão?»16Chadrac, Mechac e Abed-Nego responderam ao rei Nabucodonosor: «Não vale a pena responder-te a propósito disto. 17 Se isso assim ~ o Deus que nós servimos pode livrar-nos da fornalha incandescente, e até mesmo, ó rei, da tua mão. 18 E ainda que o não faça, fica sabendo, ó rei, que não prestamos culto aos teus deuses e que não adoramos a estátua de ouro que tu levantaste.» 19Então explodiu a fúria de Nabucodonosor contra Chadrac, Mechac e Abed-Nego; a expressão do seu rosto mudou e levantou a voz para mandar que se aquecesse a fornalha sete vezes mais que de costume. 20 Em seguida, ordenou aos soldados mais vigorosos do seu exército que amarrassem Chadrac, Mechac e Abed-Nego, a fim de os lançar na fornalha incandescente. 91 (24)Então o rei Nabucodonosor, estupefacto, levantou-se repentinamente, dizendo para os seus conselheiros: «Não foram três homens, atados de pés e mãos, que lançámos ao fogo?»Responderam eles ao rei: «Com certeza». Nabucodonosor, tomando a palavra, disse:«Bendito seja o Deus de Chadrac, de Mechac e de Abed-Nego! Ele enviou o seu anjo para libertar os seus servos que, confiando nele, expuseram a vida, transgredindo as ordens do rei, antes que prostrarem-se em adoração diante de um outro deus que não fosse o Deus deles. 92 (25)«Pois bem - replicou o rei - vejo quatro homens soltos, que passeiam no meio do fogo, sem este lhes causar mal; o quarto tem o aspecto de um filho de Deus.» 95 (28)Nabucodonosor, tomando a palavra, disse:«Bendito seja o Deus de Chadrac, de Mechac e de Abed-Nego! Ele enviou o seu anjo para libertar os seus servos que, confiando nele, expuseram a vida, transgredindo as ordens do rei, antes que prostrarem-se em adoração diante de um outro deus que não fosse o Deus deles.

    o episódio dos três jovens, que escaparam ilesos à fornalha ardente, mostra que o Deus dos hebreus é o único Deus verdadeiro, e que os ídolos dos babilónios, tal como os deuses impostos por Antíoco IV Epifânio, não o são. Só Javé é Deus da vida. Servi-I' O é optar pela vida, mesmo que seja preciso sofrer e morrer. O martírio torna perfeita a fé daqueles que puseram a sua confiança em Deus e é o melhor testemunho para os próprios perseguidores, como se verifica pela confissão de fé de Nabucodonosor (cf. v. 95).

    A narrativa é rica de pormenores pitorescos, ainda que trágicos, o que lhe confere solenidade. Javé é, de verdade grande. Mesmo que não seja possível prestar-lhe o culto devido, é o único Deus (v. 96). Diante d 'Ele, os cultos idolátricos são pura vaidade.

    Evangelho: João 8, 31-42

    31 Naquele tempo dizia Jesus aos judeus que nele tinham acreditado: «Se permanecerdes fiéis à minha mensagem, sereis verdadeiramente meus discípulos, 32conhecereis a verdade e a verdade vos tornará livres.» 33Replicaram-Ihe: «Nós somos descendentes de Abraão e nunca fomos escravos de ninguém! Como é que Tu dizes: 'Sereis Iivres?» 34Jesus respondeu-lhes: «Em verdade, em verdade vos digo: todo aquele que comete o pecado é servo do pecado, 35 e o servo não fica na família para sempre; o filho é que fica para sempre. 36 Pois bem, se o Filho vos libertar, sereis realmente livres. 37 Eu sei que sois descendentes de Abraão; no entanto, procurais matar-me, porque não aderis à minha palavra. 38 Eu comunico o que vi junto do Pai, e vós fazeis o que ouvistes ao vosso psi» 39E1es replicaram-lhe: «O nosso pai é Abraão!» Jesus disse-lhes: «Se fôsseis filhos de Abraão, faríeis as obras de Abraão! 40 Agora, porém, vós pretendeis matar-me, a mim, um homem que vos comunicou a verdade que recebi de Deus. Isso não o fez Abraão! 41 Vós fazeis as obras do vosso psi» Eles disseram-lhe, então: «Nós não nascemos da prostituição. Temos um só Pai, que é Deus.»42Disse-Ihes Jesus: «Se Deus fosse vosso Pai, ter-me-íeis amor, pois é de Deus que Eu saí e vim. Não vim de mim próprio, mas foi Ele que me enviou.

    Diante daqueles que se vangloriam de ser filhos de Abraão (v. 33), Jesus clarifica alguns importantes temas como o discipulado (v. 31), a liberdade e o gozo da intimidade familiar (vv. 32-36), da filiação e da paternidade (vv. 37-42). Prosseguindo o seu discurso, num crescendo dramático, Jesus termina revelando a sua divindade: «Eu SOLP> (v. 58). Os seus adversários, porém, endurecem posições e tentam lapidá­I' O (v. 59). Assim revelam ser escravos do pecado. Só a fé, que leva a confiar na Palavra, liberta do pecado, como aconteceu com Abraão. A fé no Filho leva os discípulos a permanecerem n ' Ele (v. 31), Palavra do Pai, como filhos livres que permanecem na casa paterna (v. 35). Quem procede de outro modo, revela ter outra origem (v. 41), intenções perversas (v. 37) e escravidão (v. 34), ainda que não se dê conta disso ou não o queira admitir.

    Meditatio

    A liberdade é um valor de que todos desejamos usufruir. Mas nem sempre a procuramos onde a podemos encontrar. Os três jovens, de que nos fala a primeira leitura, são um maravilhoso exemplo de liberdade. Recusam corajosamente adorar o poder real, mesmo sendo condenados à fornalha ardente. Nabucodonosor pergunta: «Qual o deus que poderá libertar-vos da minha mão?». Os jovens respondem: «Não vale a pena responder-te a propósito disto. Se isso assim ~ o Deus que nós servimos pode livrar-nos da fornalha incandescente, e até mesmo, ó rei, da tua mãe». Este gesto de liberdade condenou-os ao suplício. Aparentemente perderam a liberdade: foram amarrados e lançados ao fogo. Mas o Deus, em Quem confiam, intervém para os libertar. O rei verifica o facto. E converte-se à fé.

    Quando Deus deixa de ser apenas uma ideia mais ou menos abstracta, quando a fé em Jesus Cristo se torna vida, podemos experimentar a liberdade cristã. Não é que a vida se torne mais fácil. A verdadeira fé em Deus, e uma relação pessoal com Jesus, seu Filho, na fé e no amor, revelam exigências até aí desconhecidas. Estas exigências estabelecem novos laços, que não escravizam, mas dilatam os corações e fazem avançar os crentes pela via dos mandamentos divinos.

    Como os Judeus, que se diziam filhos de Abraão, talvez também nós nos digamos cristãos apenas porque somos fiéis a umas tantas observâncias. Mas isso não é suficiente para fazer de nós filhos de Deus, nem filhos da Igreja. Ser filhos é, em primeiro lugar, ser livres. Jesus, o Filho, revela-nos a verdadeira liberdade. Contemplando-O, verificamos que essa liberdade consiste na renúncia a nós mesmos para afirmarmos o Outro, os outros. O pecado é exactamente o contrário: faz-nos ver tudo a partir de nós mesmos e dos nossos interesses, coloca-nos no centro do universo. É a escravidão de que fala Jesus.

    Podemos permanecer na escravidão, mesmo falando muito de liberdade e de libertação. Não podemos libertar-nos por nós mesmos. Seremos livres na medida em que abrirmos o coração à Palavra, que é presença de Cristo no meio de nós, e à sua poderosa salvação. Só ela nos arrancará da idolatria e, sobretudo, da egolatria, para nos guiar até à liberdade do amor.

    A liberdade é um dom do Espírito Santo: «O fruto do Espírito é amor, alegria, paz, paciência, benevolência, bondade, fidelidade, mansidão, autodomínio; contra estas coisas não há lei» (Gal 5, 22). Há, portanto, perfeita liberdade. As nossas Constituições lembram-nos que a liberdade é um fruto do mistério pascal de Cristo:

    "Pela Sua morte e ressurreição (Cristo) abriu-nos ao dom do Espírito e à liberdade dos filhos de Deus (Rom 8, 21" (Cst. 11). É que, "onde está o Espírito há liberdade' (2 Cor 3, 17). Basta que pensemos nos preciosos frutos do Espírito (cf. Gal 5, 22) e, em particular, no "autodomínio", quando, nos nossos pensamentos, desejos, afectos, palavras, acções não nos deixamos guiar pelo nosso eu (egoísmo), mas pelo Espírito de Deus.

    Oratio

    Senhor Jesus, faz-me compreender que, para viver como filho do Pai, não me basta ser baptizado, mas também preciso de fazer as suas obras, e de crescer na escuta da sua voz, deixando que a tua palavra lance raízes em mim, e tome gradualmente posse de todo o meu ser. Faz-me também compreender que me tornas livre apenas na medida em que abro à tua palavra, não só a minha inteligência, mas também a minha vida. Só quando ela for totalmente qulada por Ti, serei realmente livre: livre do pecado que me escraviza, livre da inveja que me separa dos outros, livre da preguiça e do orgulho que me paralisam. Então, mesmo no meio dos sofrimentos da vida, também quando tiver de sofrer para ser fiel ao teu amor, serei livre e, como os jovens da fornalha ardente, cantarei os teus louvores, celebrarei a tua vitória. A tua gloriosa Paixão faz-nos vitoriosos contra o pecado, contra todas as dificuldades, contra o sofrimento. Faz-nos livres! Obrigado, Senhor! Amen.

    Contemplatio

    O divino Mestre na Eucaristia está inteiramente desprendido da vida exterior. «Contempla, ama, adora as perfeições de Deus; imola-se à glória de seu Pai, fora de todo o criado, como numa vasta solidão onde os objectos da terra não o podem atingir.

    «É preciso tudo perder de vista, tudo esquecer e esquecer-se de si mesmo para imitar esta vida divina.

    Peçamos ao Sagrado Coração como um favor sermos por vezes retirados nesta solidão perfeita, somente sob o olhar de Deus, na companhia do nosso bem-amado Jesus, não tendo liberdade nem acção senão para amar e adorar o nosso Deus, para nos sacrificarmos e perdermos nele.

    Do seu tabernáculo, Jesus não fala a nenhuma criatura. Nenhum barulho, nenhum movimento não se faz aí ouvir, mas, diante do seu Pai, o seu silêncio é bem mais profundo e mais sublime. Dir-se-ia que toda a sua ocupação seja calar-se. É todo amor, aniquilamento, imolação, prece; mas tudo se passa no silêncio, nas profundidades de si mesmo e da sua divindade. Como este silêncio é uma linguagem poderosa e forte! Presta homenagem à grandeza de Deus, às suas perfeições infinitas, ao seu domínio soberano, a todos os seus atributos que Jesus louva com um hino eterno e sem fim e num misterioso silêncio».

    Quereria nas minhas adorações fazer calar em mim as criaturas para me unir à adoração de Jesus para com o seu Pai (Leão Dehon, OSP 3, p. 691s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra: «A verdade vos tornará Iivres» (Jo 8, 31).

  • Quinta-feira - 5ª Semana da Quaresma

    Quinta-feira - 5ª Semana da Quaresma

    21 de Março, 2024

    Lectio
    Primeira leitura: Génesis 17, 3-9

    3 Abrão prostrou-se com o rosto por terra e Deus disse-lhe: 4 «A aliança que faço contigo é esta: serás pai de inúmeros povos. 5 Já não te chamarás Abrão, mas sim Abraão, porque Eu farei de ti o pai de inúmeros povos. 6 Tomsr-te-ei extremamente fecundo, farei que de ti nasçam povos e terás reis por descendentes. 7 Estabeleço a minha aliança contigo e com a tua posteridade, de geração em geração; será uma aliança perpétua, em virtude da qual Eu serei o teu Deus e da tua descendência. 8 Dar­te-ei, a ti e à tua descendência depois de ti, o país em que resides como estrangeiro, toda a terra de Canaã, em possessão perpétua, e serei Deus para eles.» 9 Deus disse a Abraão: «Da tua parte, cumprirás a minha aliança, tu e a tua descendência, nas futuras gerações.

    Regressado do exílio, o povo de Israel está reduzido a um pequeno «resto», privado dos dons prometidos a Abraão (v. 8), o mesmo Abraão que Deus tinha chamado «pai de inúmeros pOV09> (v. 5; cf. Gn 12, 2). A tradição sacerdotal lembra, nestes poucos versículos, a vocação de Abraão, para que o povo reencontre a esperança na certeza da aliança com Deus (w. 2.7; Dt 5, 4-7). Deus, com efeito, não pode renegar a aliança, porque não pode renegar a Si mesmo. Esta certeza é fundamento seguro para a esperança do povo, tal como já o fora Abraão que, por isso, esperou contra toda a esperança. Foi Deus quem Se revelou a Si mesmo (v. 1) e revelou a Abraão o nome novo: «pai de inúmeros pOV09> (v. 5), de acordo com um projecto divino de salvação (v. 6) no qual era chamado a ser protagonista. Esta vocação e missão implicavam caminhar diante do Senhor em integridade de vida (cf. v. 1). Abraão e da sua posteridade seriam de Deus, e Deus seria O Deus de Abraão e da sua posteridade. Abraão responde à proposta divina com um gesto de adoração e de acção de graças que se torna escuta. E Deus pode falar-lhe: «Abrão prostrou-se com o rosto por terra e Deus disse-lhe ... » (v. 3).

    Evangelho: João 8, 51-59

    Naquele tempo, disse Jesus aos judeus: 51 Em verdade, em verdade vos digo: se alguém observar a minha palavra, nunca morrerá.»52Disseram-lhe, então, os judeus: «Agora é que estamos certos de que tens demónio! Abraão morreu, os profetas também, e Tu dizes: 'Se alguém observar a minha palavra, nunca experimentará a morte?53Porventura és Tu maior que o nosso pai Abraão, que morreu? E os profetas morreram também! Afinal, quem é que Tu pretendes ser?»54Jesus respondeu: «Se Eu me glorificar a mim mesmo, a minha glória nada valerá. Quem me glorifica é o meu Pai, de quem dizeis: 'É o nosso oeusi". e, no entanto, não o conheceis. Eu é que o conheço; se dissesse que não o conhecia, seria como vós: um mentiroso. Mas Eu conheço-o e observo a sua palavra. 56 Abraão, vosso pai, exultou pensando em ver o meu dia; viu-o e ficou feliz.» 57Disseram-Ihe, então, os judeus: «Ainda não tens cinquenta anos e viste Abraão?» 58 Jesus respondeu-lhes: «Em verdade, em verdade vos digo: antes de Abraão existir, Eu SOU!»59 Então, agarraram em pedras para lhe atirarem. Mas Jesus escondeu-se e saiu do templo.

    Jesus afirma, com solenidade, - «Em verdade, em verdade vos dig(J» -, que a sua Palavra é vida e dá a vida a quem a acolhe. Os seus ouvintes, naquela ocasião não a acolheram, como se vê no versículo final: «Então, agarraram em pedras para lhe atirarem». Entre os dois versículos encontramos o diálogo-confronto que tem por horizonte a antítese vida-morte, e como ponto de referência Abraão, de quem os judeus se dizem descendentes. Jesus vai respondendo indirectamente às perguntas provocatórias que lhe são feitas. Mas, das suas respostas, emerge a clara afirmação de que é o Filho de Deus, cuja glória procura. É Deus que o leva a falar. Por isso, com verdade, pode dizer: «antes de Abraão existir, Eu sou». Só reconhecendo a Deus, que se manifesta no seu Filho feito homem, se pode ter a vida.

    Há uma perfeita comunhão entre o Pai e o Filho. É para ela que se encaminha a história da salvação, prometida a Abraão que, na fé, entreviu a sua realização. Esta afirmação é um escândalo para os Judeus que, apenas segundo a carne, são filhos de Abraão.

    Meditatio

    A adesão à verdade leva à liberdade: «a verdade vos tornará Iivres» (Jo 8, 32).

    Trata-se da liberdade do pecado, mas também da liberdade diante da morte: «se alguém observar a minha palavra, nunca morrere». Jesus promete tudo isto, comprometendo a sua palavra: «Em verdade, em verdade vos dig(J». Trata-se de uma fórmula solene, que garante a palavra dada com a própria personalidade de quem a pronuncia. No essencial, Jesus diz-nos que o segredo da liberdade é a obediência à sua palavra, uma obediência nascida do mais fundo do coração de quem a soube acolher.

    Abraão soube acolher a palavra de Deus e obedecer-lhe. Tornou-se o modelo dos crentes, e exultou de alegria, na esperança de ver o dia de Jesus: «exultou pensando em ver o meu dia; viu-o e ficou teu», diz o Senhor.

    Também nós somos chamados, neste tempo da Paixão e da Páscoa, a ver o dia de Jesus e a permanecer na alegria. Abraão viu o dia de Cristo, o dia da Ressurreição, em prefiguração, isto é, participando em acontecimentos que deixavam entrever o desígnio divino de ressuscitar o seu Cristo, principalmente no nascimento de Isaac e no seu sacrifício no Moriá. Sendo velho muito avançado em idade, e sendo a sua mulher estéril, acreditou que Deus é capaz de ressuscitar os mortos. E aconteceu o nascimento de Isaac, que o encheu de alegria. Quando Deus lhe pediu o sacrifício do filho, Abraão dispos-se a sacrificá-lo. Parecia que a promessa de Deus ia ficar por cumprir. Mas Abraão na hesita na sua fé: «Deus providenaerá», diz ele ao filho que lhe pergunta pelo cordeiro a sacrificar. E Deus providenciou. Isaac desceu vivo do Moriá. De certo modo, foi sacrificado e permaneceu vivo, tornando-se figura de Cristo morto e ressuscitado. São figuras imperfeitas, mas Abraão pôde já ver nelas o dia do sacrifício real de Cristo, premissa da Ressurreição para uma vida plena e gloriosa. Viu e alegrou-se!

    A fé é um combate pela vida. A fé enfrenta a morte na sua forma mais insidiosa e quotidiana, aquela que se apresenta como a «inutilidade da existência». Jesus, o verdadeiro descendente de Abraão, no combate que opõe a morte à vida, revela uma fé que abre para uma inesperada esperança. No muro de angústia que nos aprisiona, abre uma brecha por onde pode irromper a vida, porque Ele é a vida: «antes de Abra&ati
    lde;o existir, Eu sou».

    Abraão, como tantos outros servos e amigos de Deus do Antigo Testamento, preanuncia o "Ecce venid' de Cristo: "Eis-me aquI', diz o pai dos crentes, quando Deus o chama para o sacrifício de Isaac (Gen 22, 1). "Eis-me aqui" deve continuar no nosso "Ecce venio", unido ao "Ecce venio" de Cristo, porque "somos chamados na Igreja a procurar e a realizar, como o único necessário, uma vida de união à oblação de Cristo" (Cst. 26).

    Como a nossa "vida religiosa e apostólica" está unida "de forma explícita ... à oblação reparadora de Cristo ao Pai pelos homens" (Cst. 6), assim também o nosso Ecce venio ... "configura a nossa existência com a de Cristo, pela redenção do mundo e para Glória do Pai" (Cst. 58).

    A obediência religiosa radicada na Encarnação e na Páscoa de Cristo, participa da sua missão salvífica. É necessariamente apostólica. Como a obediência religiosa é comunhão de amor com o Pai, em Cristo (cf. Cst. nn. 53.56.58), assim também é comunhão de amor, de serviço em favor dos homens, sempre em Cristo, sob a influência do Espírito (cf. Cst. nn. 53.56.58).

    Oratio

    Senhor Jesus Cristo, cordeiro imolado e ressuscitado, para glória e alegria do Pai e para nossa salvação, nós Te louvamos e bendizemos, nós Te damos graças. Eis­nos aqui, dispostos a escutar a voz do Pai e a obedecer-Lhe, dispostos a unir o nosso «Ecce venio» ao de Abraão, e ao de todos os amigos de Deus, tanto do Antigo como do Novo Testamento, mas sobretudo ao teu. Ajuda-nos a viver na fé e na disponibilidade confiante no Pai e no seu projecto de amor e salvação. Ajuda-nos a viver na fé na tua ressurreição, a vencer permanentemente as forças da morte e a alegrar-nos, porque a tua vitória será também a nossa vitória. Ajuda-nos a vencer a morte, encarando-a e oferecendo-a como participação na tua morte. Ajuda-nos a vencer tudo quanto nos pode causar tristeza, pessimismo, desânimo, tudo quanto nos possa fazer capitular diante das dificuldades da vida. Que, em todas as situações, ressoe aos nossos ouvidos a tua palavra: «Coragem: Eu venci o mundo: (Jo 15, 33). Amen.

    Contemplatio

    Todos estes domingos nos colocam diante dos olhos o Antigo Testamento nos grandes acontecimentos que prepararam a redenção. Meditámos no pecado de Adão, depois no castigo do dilúvio. Eis o sacrifício de Abraão, uma das mais belas figuras do sacrifício redentor.

    Deus quer mostrar-nos o preço daquilo que fez por nós e a grandeza do seu amor. Escolheu Abraão. Dá-lhe tardiamente um filho, Isaac, o filho da promessa, do qual nascerá todo um povo. Deste povo abençoado sairá o Messias. - E quando Isaac se tornou um adolescente, Deus pede a Abraão o seu sacrifício. Que provação! Não é apenas um filho, é o filho do milagre e da promessa, o filho pelo qual deve vir a Abraão toda a sua glória.

    Abraão consente em sacrificá-lo, depois a intervenção divina impede a imolação.

    Deus quis assim mostrar-nos que ao dar-nos o seu Filho e ao sacrificá-lo, nos testemunha um imenso amor. Como tão pouco o compreendi até a este momento! Como sou frio, ingrato, insensível!

    Os grandes dias de páscoa aproximam-se, não vou sacudir a minha indolência? (Leão Dehon, OSP 3, p. 183)

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:

    «Se alguém observar a minha palavra, nunca morrerá» (Jo 8, 51).

  • Sexta-feira - 5ª Semana da Quaresma

    Sexta-feira - 5ª Semana da Quaresma

    22 de Março, 2024

    Lectio

    Primeira leitura: Jeremias 20, 10-13

    Disse Jeremias: «Eu ouvia as invectivas da multidão: ‘Terror por toda a parte! Denunciai-o, vamos denunciá-lo!’ Todos os meus amigos esperavam que eu desse um passo em falso: ‘Talvez ele se deixe enganar e assim o poderemos dominar e nos vingaremos dele’. Mas o Senhor está comigo como herói poderoso e os meus perseguidores cairão vencidos. Ficarão cheios de vergonha pelo seu fracasso, ignomínia eterna que não será esquecida. Senhor do Universo, que sondais o justo e perscrutais os rins e o coração, possa eu ver o castigo que dareis a essa gente, pois a Vós confiei a minha causa. Cantai ao Senhor, louvai o Senhor, que salvou a vida do pobre das mãos dos perversos».

    Jeremias chamou o povo à conversão durante anos: Mas o povo não o quis escutar. Agora, deve anunciar que o juízo de Deus é irrevogável, e que o castigo vai abater-se sobre Israel: Jerusalém irá cair às mãos do rei de Babilónia. É nesta situação, extremamente difícil e dolorosa, que o profeta pronuncia a sua última «confissão» (vv. 7-18). O texto é simultaneamente autobiográfico e paradigmático do destino do verdadeiro crente. Jeremias evoca a sua vocação (vv. 7-9), recorda os momentos de mal-estar e de rebeldia, provocados pelas perseguições, pelas calúnias e pelas traições de que foi vítima (v. 10). Mas Jeremias, tal como Job, depois destes momentos de desabafo, renova o seu acto de fé em Deus (vv. 11-13) que sempre esteve com ele e que jamais o abandonará: «O Senhor, porém, está comigo, como poderoso çuerrem» (v. 11). Foi o que Deus lhe tinha garantido no momento em que o chamou: «Eu estou contigo para te salvam (Jer 1, 19). Estas palavras ecoaram em cada um dos momentos da vida do profeta, particularmente nos mais difíceis. E continuam a ecoar. Por isso, Jeremias rende-se completamente a Deus, deixando para trás as resistências e as rebeldias.

    Evangelho: João 10, 31-42

    Naquele tempo, os judeus agarraram em pedras para apedrejarem Jesus, Então Jesus disre-lhes: «Apresentei-vos muitas boas obras, da parte de meu Pai. Por qual dessas obras Me quereis apedrejar?» Responderam os judeus: «Não é por qualquer boa obra que Te queremos apedrejar: é por blasfémia, porque Tu, sendo homem, Te fazes Deus». Disse-lhes Jesus: «Não está escrito na vossa Lei: ‘Eu disse: vós sois deuses’? Se a Lei chama ‘deuses’ a quem a palavra de Deus se dirigia – e a Escritura não pode abolir-se –, de Mim, que o Pai consagrou e enviou ao mundo, vós dizeis: ‘Estás a blasfemar’, por Eu ter dito: ‘Sou Filho de Deus’!» Se não faço as obras de meu Pai, não acrediteis. Mas se as faço, embora não acrediteis em Mim, acreditai nas minhas obras, para reconhecerdes e saberdes que o Pai está em Mim e Eu estou no Pai». De novo procuraram prendê-l’O, mas Ele escapou-Se das suas mãos. Jesus retirou-Se novamente para além do Jordão, para o local onde anteriormente João tinha estado a baptizar e lá permaneceu. Muitos foram ter com Ele e diziam: «É certo que João não fez nenhum milagre, mas tudo o que disse deste homem era verdade». E muitos ali acreditaram em Jesus.

    Durante os dias da festa da Dedicação do Templo, Jesus anda livremente no pórtico de Salomão, quando é rodeado pelos judeus que, mais uma vez, o interrogam. O Senhor responde-lhes com frontalidade. Gera-se, então, mais um vivo debate, que aumenta de intensidade, a ponto de os adversários de Jesus agarrarem em pedras para O lapidarem. Várias vezes tinham tentado prendê-I'O por causa das suas «obras», nomeadamente as curas em dia de sábado. Agora acusarn-nO de blasfemo, por se fazer igual a Deus, sendo um homem (v. 33).

    Jesus responde, primeiro referindo a Palavra de Deus, que todos aceitam, e, depois, apelando para a obras realizadas, que os seus adversários puderam testemunhar. Trata-se da última tentativa para lhes abrir o coração à fé. Jesus apela para as suas obras que são «palavra». Se Jesus não é condenável por causa de nenhuma delas, porque não acreditar na verdade do que diz? Mas a comunicação manifesta-se impossível. Por isso, Jesus volta para além do Jordão, onde João dera testemunho da verdade, onde apareceram os primeiros discípulos, e onde muitos começam a acreditar. Na experiência da recusa, brota um germe de fé nova, que antecipa o evento pascal.

    Meditatio

    «A paixão é a obra-prima do amor do Coração de Jesus», escreveu leão Dehon (OSP 3, p. 305). De facto, o Coração de Jesus alcançou a vitória sobre o mal servindo­-se de todos os sofrimentos para manifestar um amor maior: «Deus demonstra o seu amor para connosco: quando ainda éramos pecadores é que Cristo morreu por nÓ9> (Rm 5,8).

    A primeira leitura de hoje faz-nos entrar nos sentimentos de Jesus, e ajuda-nos a compreender, por quanto é possível, a vitória que alcançou na sua paixão. Jeremias, tendo anunciado o castigo de Deus, sente-se abandonado por todos, e enfrenta a hostilidade da multidão. Sabe que não se pode salvar pelos seus próprios meios, e abandona-se a Deus: «Senhor do universo, examinas o justo, sondas os rins e os corações. Que eu possa contemplar a tua vingança contra eles, pois a ti confiei a minha causal» O abandono nas mãos de Deus é já uma vitória. Mas o profeta não renuncia à víngança, entregando-a, todavia, nas mãos de Deus, que é justo e saberá fazer justiça. E um primeiro passo. Mas Jesus irá mais longe. Não lhe escutamos palavras semelhantes durante toda a Paixão. Ele sabe que o Pai lhe há-de fazer justiça, punindo o pecado, porque o mal não pode triunfar. Mas afirma-o com sentimentos de profunda dor, e até chorando, como faz quando fala da destruição da Jerusalém, que resiste à conversão (cf. lc 13, 34). No alto da cruz, não pede a Deus a vingança dos seus inimigos, mas que lhes perdoe: «Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem!» (Lc 23, 34).

    No evangelho, Jesus revela a sua identidade, não só por meio de palavras, mas também por meio de obras: «Se não faço as obras do meu Pai, não acrediteis em mim; mas se as faço, embora não queirais acreditar em mim, acreditai nas obras, e assim vireis a saber e ficareis a compreender que o Pai está em mim e Eu no Pai». Diante desta afirmação, mais uma vez os ânimos se dividem. Enquanto «muitos ali creram nel(!», outros não acreditaram e até se acirraram mais contra Ele.

    Provavelmente estas tendências contraditórias, no que se refere à fé, talvez também se encontrem nos nossos corações. A nossa caminhada de fé tem momentos altos e momentos baixos. Por vezes, temos a sensação de que a multidão, de que nos fala o evangelho de hoje, est&
    aacute; dentro de nós. Jesus ensina-nos a resistir a estas oscilações perigosas. Para isso, é preciso fundamentar-nos solidamente na Sagrada Escritura. Aí encontramos as palavras que dão fundamento e solidez à nossa fé porque, nelas, descobrimos a Palavra que é Jesus Cristo.

    Dando solidez à nossa fé, a Palavra de Deus, sobretudo os evangelhos, permitem sintonizar os nossos sentimentos com os de Jesus Cristo. Assim, depois de um esforço semelhante ao que fez Jeremias, será mais fácil para nós reagirmos à maneira do Coração de Jesus, durante toda a sua vida, e particularmente na sua Paixão.

    Oratio

    Senhor Jesus, Tu afirmaste solenemente à multidão que invectivava contra Ti: «Se não faço as obras do meu Pai, não acrediteis em mim; mas se as faço, embora não queirais acreditar em mim, acreditai nas obras, e assim vireis a saber e ficareis a compreender que o Pai está em mim e Eu no Pap>. Assim mostraste que Te revelas, não só por palavras, mas também por obras. Ajuda-me a viver em união contigo, e a escutar atentamente as tuas palavras, para ter em mim os sentimentos que estavam no teu Coração. Que nas minhas actividades, que em todas as circunstâncias, mesmo nas mais difíceis, com as minhas palavras e com as minhas obras, eu posso ser sinal do teu amor sem limites. Que saiba perdoar aos meus irmãos todas as suas faltas para comigo, imaginárias ou reais. Que eu saiba rezar por eles, e oferecer-me generosamente, em espírito de amor e de reparação. Amen.

    Contemplatio

    A paixão é a obra-prima do amor do Sagrado Coração. Era dela que o profeta Habacuc dizia: «Domine, audivi auditionem tuam et timui (Hab 3): Senhor, ouvi falar da vossa obra, da vossa obra por excelência e fiquei tomado de espanto». Santo Agostinho dá este sentido moral ao texto do profeta. S. Paulo não cessa de estar num êxtase de amor ao contemplar este admirável mistério: «Jesus Cristo mostrou-nos tanto mais amor, diz, quanto deu a sua vida por nós pecadores e Impios» (Rom 5). E S. João, o apóstolo bem-amado, exclama: «Jesus Cristo amou-me e lavou-me com o seu sangue. (Ap 1, 5).

    Devemos, portanto, tentar, nós também, penetrar nas profundezas deste abismo de caridade e excitar-nos ao amor do Sagrado Coração, vendo quanto Ele nos amou.

    Jesus Cristo é realmente, nos mistérios da Paixão, o livro escrito por fora e por dentro, e quais são as letras que vemos traçadas neste livro? Apenas estas: Amor. Os chicotes, os espinhos, os cravos escreveram-nas em caracteres de sangue sobre a sua carne divina; mas não nos contentemos em ler e em admirar exteriormente esta escritura divina no; penetremos até ao Coração, e veremos uma maravilha bem maior: é o amor inesgotável e inesgotado, que não tem em conta o que sofre, e que se dá sem se cansar.

    É a graça dos amigos do Sagrado Coração saber sempre descobrir o amor de Nosso Senhor sob a exterioridade dos seus mistérios. Mas onde podemos nós ver mais do que na Paixão? Se não o vemos aí, ou se não o vemos senão superficialmente, convençamo-nos de que havemos de retirar pouco proveito destes grandes mistérios dos sofrimentos de Jesus Cristo e que prestaremos pouca glória a Deus. Para retirar todo o fruto possível desta divina contemplação, estabeleçamos primeiro alguns princípios, depois falaremos dos sentimentos especiais que ela deve excitar em nós.

    O primeiro princípio é este: a paixão do Salvador tira todo o seu mérito e todo o seu preço diante do seu Pai não tanto dos seus sofrimentos exteriores nem mesmo da sua morte, mas do seu Coração, do seu amor que o fez dar-se assim todo a nós.

    O segundo princípio, é que Nosso Senhor quis suportar estes sofrimentos extraordinários a fim de melhor nos mostrar o seu amor e de nada poupar para ganhar o nosso. Este amor teria podido ser igualmente grande, se Ele nos tivesse resgatado por um mínimo sofrimento, mas que acção teria exercido sobre nós? Ter-nos-ia deixado insensíveis, e o Sagrado Coração queria a toda a força ganhar os nossos corações.

    O terceiro princípio é que o Sagrado Coração tendo-se empenhado por amor, pelo seu Ecce venio, a tudo sofrer por nós, os seus sofrimentos e a sua morte foram outros tantos actos de amor que operavam a nossa Redenção; e o Coração de Jesus era a fonte donde brotavam todos os seus méritos com os seus sofrimentos. Tal era a vontade divina à qual o Sagrado Coração livremente se submeteu (Leão Dehon, OSP 2, p.305s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra: «Eu Te amo, Senhor, minha força (SI 17, 2b).

  • Sábado - 5ª Semana da Quaresma

    Sábado - 5ª Semana da Quaresma

    23 de Março, 2024

    Lectio

    Primeira leitura: Ezequiel 37, 21-28

    21 E então lhes dirás: Assim fala o Senhor Deus: Eis que Eu tomarei os filhos de Israel de entre as nações, por onde se dispersaram; vou reuni-los de toda a parte e reconduzi-los ao seu país. 22 Farei deles uma só nação na minha terra, nas montanhas de Israel, e apenas um rei reinará sobre todos eles; nunca mais serão duas nações, nem serão divididos em dois reinos. 23 Não se mancharão mais com os seus ídolos e nunca mais cometerão infames abominações. Eu os salvarei das suas rebeldias, pelas quais pecaram, e os purificarei; eles serão o meu povo e Eu serei o seu Deus.240 meu servo David será o seu rei e eles terão um só pastor; caminharão segundo os meus preceitos, observarão os meus mandamentos e os porão em prática. 25 Habitarão o país que Eu dei ao meu servo Jacob e no qual habitaram seus pais; aí ficarão eles, os seus filhos e os filhos de seus filhos para sempre. David, meu servo, será para sempre o seu chefe. 26 Farei com eles uma aliança de paz; será uma aliança eterna; Eu os estabelecerei e os multiplicarei; e colocarei o meu santuário no meio deles para sempre. 27 A minha morada será no meio deles. Serei o seu Deus e eles serão o meu povo. 28 Então, reconhecerão as nações que Eu sou o Senhor que santifica Israel, quando tiver colocado o meu santuário no meio deles para sempre.»

    Ezequiel anuncia simbolicamente o regresso de Israel do exílio e a reunificação do povo sob a orientação de um só rei-pastor. Já aconteceu o castigo anunciado, a deportação para Babilónia, em 586 a. C. Mas trata-se de um castigo terapêutico e temporal, em vista da purificação da idolatria e da cura da desobediência. A promessa de Deus é uma aliança eterna. O Espírito do Senhor repousa sobre o povo, e o povo é chamado a repousar na terra do seu Deus, em paz e em prosperidade. Deus está para sempre no meio do seu povo. Assim todos ficarão a saber que é Javé, «o Senhor que santifica Israel» (v. 28), e quem é Israel, o povo santificado pela presença de Deus. Como diz o próprio Deus: «Serei o seu Deus e eles serão o meu povo» (v. 27), com a carga afectiva que manifestam os dois pronomes possessivos.

    Evangelho: João 11, 45-56

    Naquele tempo, 45 muitos dos judeus que tinham vindo a casa de Maria, ao verem o que Jesus fez, creram nele. 46 Alguns deles, porém, foram ter com os fariseus e contaram-lhes o que Jesus tinha feito. 47 Os sumos sacerdotes e os fariseus convocaram então o Conselho e diziam: «Que havemos nós de fazer, dado que este homem realiza muitos sinais miraculosos?48Se o deixarmos assim, todos irão crer nele e virão os romanos e destruirão o nosso Lugar santo e a nossa nação.» 49Mas um deles, Caifás, que era Sumo Sacerdote naquele ano, disse-lhes: «Vós não entendeis nada,50nem vos dais conta de que vos convém que morra um só homem pelo povo, e não pereça a nação inteira.» 510ra ele não disse isto por si mesmo; mas, como era Sumo Sacerdote naquele ano, profetizou que Jesus devia morrer pela nação. 52 E não só pela nação, mas também para congregar na unidade os filhos de Deus que estavam dispersos. 53 Assim, a partir desse dia, resolveram dar-lhe a morte. 54 Por isso, Jesus já não andava em público, mas retirou-se dali para uma região vizinha do deserto, para uma cidade chamada Efraim e lá ficou com os discípulos. 55 Estava próxima a Páscoa dos judeus e muita gente do país subiu a Jerusalém antes da Páscoa para se purificar. 56Procuravam então Jesus e perguntavam uns aos outros no templo: «Que vos parece? Ele virá à Festa?»

    Os chefes dos judeus estão de cabeça perdida. O «sinal» da ressurreição de Lázaro fez precipitar os acontecimentos, e decidiram matar Jesus, que se tornara demasiadamente incómodo e perigoso. As multidões já O tinham querido proclamar rei, declarando-o libertador da nação. Se continuar assim, os Romanos irão intervir e destruir o templo, coisa que, de modo nenhum, pode acontecer.

    Jesus afirmara ser o novo templo, o ponto de convergência de todo o Israel e da humanidade inteira. Mas a sua palavra não foi compreendida. E aparece Caifás que intervém com toda a sua autoridade: a eliminação de Jesus é uma exigência de estado. O bem comum exige que seja eliminado. E tudo isto se torna profecia. A missão de Jesus consiste, de facto, em reunir os filhos de Deus dispersos e em fazer de todos os povos um povo novo, na unidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo. É o que acontece, porque Ele dá a vida «pelos» homens. Enquanto os judeus levam por diante o processo histórico, o Pai vai realizando o seu desígnio de salvação, graças à adesão filial de Cristo à sua obra. O evangelista João passa habilmente da história à teologia.

    Meditatio

    Caifás afirma que Jesus deve morrer em nome dos superiores interesses da nação. O evangelista João acrescenta que deve morrer, não só pela razão invocada, mas também para reunir os filhos de Deus dispersos: «Não só pela nação, mas também para congregar na unidade os filhos de Deus que estavam dispersos». A morte de Jesus realiza, de modo inimaginável, aquilo que já fora anunciado por Ezequiel, quando da dispersão e do cativeiro em Babilónia: «Eu tomarei os filhos de Israel de entre as nações, por onde se dispersaram; vou reuni-los de toda a parte e reconduzi-los ao seu pais».

    Para realizar a unidade do povo de Deus, perspectivam-se dois caminhos: o dos Judeus, que passa pela morte de Jesus, para evitar a reacção violenta dos romanos contra o templo e contra a nação; o caminho de Deus, inconsciente expresso por Caifás: «convém que morra um só homem pelo POV(]». A morte de Jesus realiza a unidade e garante-a com a sua presença no meio de nós como verdadeiro Templo de Deus.

    Estamos, de facto, dispersos entre as nações, mas também desunidos entre nós.

    Mas Cristo está connosco para nos reunir e reconciliar, de acordo com o projecto do Pai. Para isso, morreu e ressuscitou. A obra da redenção, que realiza no coração do mundo, passa pela reconciliação e pela unidade do seu povo.

    A reparação, que queremos viver, pessoal e comunitariamente, é também "cooperação na obra da redenção" de Cristo "no coração do mundo" (Cst. 23). Queremos ser, com Ele, "servidores da reconciliação" (Cst. 7), em união "com a oblação reparadora de Cristo ao Pai pelos homens" (Cst. 6). Na nossa solidariedade com Cristo, nada de essencial temos para Lhe dar; é apenas solidariedade de comunhão com Ele (cf. Gal 2, 20), completando na nossa "carne o que falta aos sofrimentos de Cristo pelo Seu Corpo que é a Igreja" (Coi 1, 24).

    Não se trata dos sofrimentos de expiação como os de Cristo, já completos e perfeitos em si mesmos, mas das tribulações apostólicas que Cristo sofreu por primeiro por causa do anúncio do Reino. O Apóstolo revive esses sofrimentos ao anunciar a Boa Nova aos pagãos. De acordo com a interpretação de Santo Agostinho estas tribulações são de todos os cristãos, e, com maior razão, de todo aquele que por vocação e por um carisma de oblação reparadora, é chamado a sofrer pela propagação do Evangelho em união com Cristo (cf. TOB, nota a).

    Todavia esta solidariedade é expressa por Jesus, com insuperável eficácia, na alegoria da videira (cf. Jo 15, 1-11) e por Paulo com a imagem do corpo e dos membros (cf. 1 Cor 12, 12-27).

    Oratio

    Senhor Jesus, durante este tempo da Paixão, quero recolher-me diante do realismo da tua cruz. Vieste ao mundo para nos tornar participantes da maravilhosa promessa de que Deus é tudo em todos. Essa promessa, todavia, não suprime os conflitos, nem nos dá a paz de um modo qualquer. De facto, Tu mesmo entraste no centro do conflito que dilacera o coração humano, levando até ele a vitória do amor, uma vitória alcançada mediante a loucura da cruz e pelo sacrifício da obediência que coincide com a glória eterna.

    Ajuda-me a percorrer também esse caminho, para entrar na glória, que começa desde já. Que jamais eu ceda à tentação de fugir do combate, permitindo que a divisão se radique no mundo, e fazendo coro com os teus inimigos. Ajuda-me a aceitar generosamente a luta, confiando na tua graça, invocada na oração. Assim participarei, desde já, na vitória definitiva do amor e na alegria do Pai. Amen.

    Contemplatio

    o Espírito Santo é o laço pelo qual Nosso Senhor nos une ao seu Pai e a si mesmo. Foi a graça que Nosso Senhor pediu para nós na sua oração depois da ceia. «Pedi por vós, diz aos seus apóstolos, e por todos aqueles que, esclarecidos e convertidos pela pregação evangélica, hão-de acreditar em mim, a fim de que todos formem um mesmo corpo, do qual eu sou o chefe, que eles sejam um, na unidade de uma mesma fé, de uma mesma esperança, de um mesmo amor, como o meu Pai está em mim e eu nele, para que vós também sejais um em nós e assim o mundo, tocado pelo divino espectáculo da vossa caridade fraterna e da vossa vida celeste, seja forçado a reconhecer no estabelecimento da Igreja uma obra divina e sobre-humana e acredite que meu Pai me enviou para salvar o mundo».

    E a glória que o seu Pai lhe deu de ser, em virtude da união hipostática, o seu Filho único e consubstancial, Nosso Senhor de algum modo no-Ia comunicou, dela nos tornou participantes, elevando-nos à sublime dignidade de filhos e de herdeiros de Deus, divinae consortes naturae, confirmando assim a nossa união com ele (Leão Dehon, OSP 3, p. 464).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra: «Dos dois povos, fez um só» (Ef 2, 14).

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