Liturgia

Week of Abr 7th

  • 02º Domingo da Páscoa - Ano B [atualizado]

    02º Domingo da Páscoa - Ano B [atualizado]

    7 de Abril, 2024

    ANO B

    2.º DOMINGO DA PÁSCOA

    Tema do 2.º Domingo da Páscoa

    A liturgia do segundo domingo do tempo pascal apresenta-nos a comunidade de Homens Novos que nasceu da cruz e da ressurreição de Jesus: a Igreja. Essa comunidade, acompanhada por Jesus, ressuscitado, vive e testemunha no mundo a Vida nova de Deus.

    Na primeira leitura o autor dos Atos dos Apóstolos deixa-nos, numa das “fotografias” que tirou à comunidade cristã de Jerusalém, os traços da comunidade ideal: é uma comunidade onde todos vivem unidos à volta da mesma fé e onde o amor fraterno se manifesta em gestos concretos de partilha e de dom. Ao viver assim, a comunidade dá testemunho da Vida nova que recebeu de Jesus.

    O Evangelho apresenta a comunidade da Nova Aliança, nascida da atividade criadora e vivificadora de Jesus. É uma comunidade que se reúne à volta de Jesus ressuscitado, que recebe d’Ele Vida, que é animada pelo Seu Espírito e que dá testemunho no mundo da Vida nova de Deus. Quem quiser “ver” e “tocar” Jesus ressuscitado, deve procurá-l’O no meio dessa comunidade que d’Ele nasceu e que d’Ele vive.

    A segunda leitura recorda aos membros da comunidade cristã os critérios que definem a vida cristã autêntica: o verdadeiro crente ama Deus, adere a Jesus Cristo e à proposta de salvação que Ele trouxe, e vive no amor aos irmãos. Quem vive desta forma, vence o mundo e passa a integrar a família de Deus.

     

    LEITURA – Atos dos Apóstolos 4,32-35

    A multidão dos que haviam abraçado a fé
    tinha um só coração e uma só alma;
    ninguém chamava seu ao que lhe pertencia,
    mas tudo entre eles era comum.
    Os Apóstolos davam testemunho da ressurreição do Senhor Jesus
    com grande poder
    e gozavam todos de grande simpatia.
    Não havia entre eles qualquer necessitado,
    porque todos os que possuíam terras ou casas
    vendiam-nas e traziam o produto das vendas,
    que depunham aos pés dos Apóstolos.
    Distribuía-se então a cada um conforme a sua necessidade.

     

    CONTEXTO

    O livro dos Atos dos Apóstolos, logo depois da introdução inicial (cf. At 1,1-11), oferece-nos um conjunto de histórias sobre a comunidade cristã de Jerusalém (cf. At 1,12-6,7). Mas o objetivo primordial de Lucas, o autor dos Atos, não é fornecer-nos um relato real e pormenorizado dos primeiros dias do cristianismo, após a ascensão de Jesus ao céu; o que ele pretende é propor-nos uma catequese sobre a forma como a Igreja de Jesus se deve estruturar e apresentar ao mundo. A comunidade cristã de Jerusalém é, de certo modo, a mãe e o modelo de todas as Igrejas. Lucas, ao falar dela, vai idealizá-la e “embelezá-la”, a fim de que ela funcione como exemplo para todas as Igrejas que depois irão surgir.

    Nesses capítulos dedicados à apresentação da Igreja de Jerusalém Lucas insere, a certa altura, três breves sumários que põem em relevo dimensões particularmente importantes da vida eclesial. No primeiro desses sumários sublinha-se especialmente a unidade, a fidelidade à oração e ao ensino dos apóstolos, o espírito fraterno e o testemunho que a comunidade dava aos habitantes de Jerusalém (cf. At 2,42-47); no segundo (e que é exatamente o texto que nos é proposto como primeira leitura neste segundo domingo do tempo pascal) a ênfase é posta na partilha dos bens e na solidariedade dos membros da comunidade (cf. At 4,32-35); no terceiro, realça-se a atividade curadora dos apóstolos, que despertava o interesse da cidade e atraía novos membros à comunidade (cf. At 5,12-16).

    Para entendermos todo o alcance da reflexão de Lucas precisamos de ter em conta a situação das comunidades cristãs no final da década de 80 do primeiro século. O entusiasmo inicial dos cristãos estava um tanto diluído: Jesus ainda não tinha vindo para instaurar definitivamente o “Reino de Deus” e, em contrapartida, posicionavam-se no horizonte próximo as primeiras grandes perseguições. Muitos dos crentes tinham-se instalado numa fé “morna” e inconsequente. Havia desleixo, falta de entusiasmo, acomodação, divisão, conflitos e confusão (até porque começavam a aparecer falsos mestres, com doutrinas estranhas e pouco cristãs). Neste contexto, Lucas recorda o essencial da experiência cristã e traça o quadro daquilo que a comunidade deve ser e testemunhar.

     

    MENSAGEM

    Como será, então, a comunidade cristã ideal, que nasce do Espírito e do testemunho dos apóstolos?

    Em primeiro lugar, é uma comunidade formada por pessoas muito diversas, mas que abraçaram a mesma fé (“a multidão dos que tinham abraçado a fé” – vers. 32a). A “fé” é, no Novo Testamento, a adesão a Jesus e ao seu projeto. Para todos os membros da comunidade, o Senhor Jesus Cristo é a referência fundamental, o cimento que a todos une num projeto comum.

    Em segundo lugar, é uma comunidade de crentes que têm “um só coração e uma só alma” (vers. 32a). Da adesão a Jesus resulta, obrigatoriamente, a comunhão e a união de todos os “irmãos” da comunidade. A comunidade de Jesus não pode ser uma comunidade onde cada um puxa para o seu lado, preocupado em defender apenas os seus interesses pessoais; mas tem de ser uma comunidade onde todos caminham na mesma direção, ajudando-se mutuamente, partilhando os mesmos valores e os mesmos ideais, formando uma verdadeira família de irmãos que vivem no amor.

    Em terceiro lugar, é uma comunidade onde existe partilha e solidariedade. Da comunhão com Cristo resulta a comunhão dos cristãos entre si; e isso tem implicações práticas. Em concreto, implica a renúncia a qualquer tipo de egoísmo, de autossuficiência, de fechamento em si próprio e uma abertura de coração para a partilha, para o dom, para o amor. Expressão concreta dessa partilha e desse dom é a comunhão dos bens: “ninguém chamava seu ao que lhe pertencia, mas tudo entre eles era comum” – vers. 32b). Num desenvolvimento que explicita este “pôr em comum”, Lucas conta que “não havia entre eles qualquer necessitado, porque todos os que possuíam terras ou casas vendiam-nas e traziam o produto das vendas, que depunham aos pés dos apóstolos. Distribuía-se então a cada um conforme a sua necessidade” (vers. 34-35). É uma forma concreta de mostrar que a vida nova de Jesus, assumida pelos crentes, não é “conversa fiada”; mas é uma efetiva libertação da escravidão do egoísmo e um compromisso verdadeiro com o amor, com a partilha, com o dom da vida. Num mundo onde a realização e o êxito se medem pelos bens acumulados e que não entende a partilha e o dom, a comunidade de Jesus é chamada a dar exemplo de uma lógica diferente e a propor um mundo que se baseie nos valores de Deus.

    Finalmente, a comunidade cristã é uma comunidade que dá testemunho: “os apóstolos davam testemunho da ressurreição de Jesus com grande poder” (vers. 33). Os gestos realizados pelos apóstolos infundiam em todos aqueles que os testemunhavam a inegável certeza da presença de Deus e do seu dinamismo de salvação.

    A comunidade cristã, nascida do dom de Jesus e do Espírito, é uma comunidade de homens e mulheres novos, que anuncia no meio do mundo a Vida plena e definitiva. Na vida e no testemunho daqueles discípulos do crucificado que se amavam, que partilhavam o que tinham, que viviam unidos, que eram solidários, que iam ao encontro dos doentes para lhes levar a cura e a salvação, os habitantes de Jerusalém encontravam o dinamismo e a presença viva de Jesus ressuscitado.

    A comunidade cristã de Jerusalém era, de facto, esta comunidade ideal? Possivelmente, não (outros textos dos Atos falam-nos de tensões e problemas – como acontece com qualquer comunidade humana); mas a descrição que Lucas aqui faz aponta para a meta a que toda a comunidade cristã deve aspirar, confiada na força do Espírito. Trata-se, portanto, de uma descrição da comunidade ideal, que pretende servir de modelo à Igreja e às Igrejas de todas as épocas.

     

    INTERPELAÇÕES

    • A comunidade cristã é uma “multidão” que abraçou a mesma fé – quer dizer, que aderiu a Jesus, aos seus valores, à sua proposta. A Igreja não é um grupo unido por uma ideologia, ou por uma mesma visão do mundo, ou pela simpatia pessoal dos seus membros; mas é uma comunidade que reúne pessoas de diferentes raças e culturas à volta de Jesus e do seu projeto de vida. Que lugar e que papel Jesus e as suas propostas ocupam na minha vida pessoal? Jesus é uma referência distante e pouco real, ou é uma presença constante que me questiona e que me aponta caminhos? Que lugar ocupa Jesus na vida e na programação da minha comunidade cristã? Ele é o centro, a referência a partir da qual se articula a liturgia, a vida sacramental, a catequese, a caridade da comunidade cristã onde eu faço a minha caminhada de fé?
    • A comunidade cristã é uma família unida, onde os irmãos têm “um só coração e uma só alma”. Tal facto resulta da adesão a Jesus: seria um absurdo aderir a Jesus e ao seu projeto e, depois, conduzir a vida de acordo com mecanismos de divisão, de fechamento, de egoísmo, de orgulho, de autossuficiência… A minha comunidade cristã é uma comunidade de irmãos que vivem no amor, ou é um grupo de pessoas isoladas, em que cada um procura defender os seus interesses, mesmo que para isso tenha de magoar e de espezinhar os outros? No que me diz respeito, esforço-me por amar todos, por respeitar a liberdade e a dignidade de todos, por potenciar os contributos e as qualidades de todos?
    • A comunidade cristã é uma comunidade de partilha. No centro dessa comunidade está o Cristo do amor, da partilha, do serviço, do dom da vida… O cristão não pode, portanto, viver fechado no seu egoísmo, indiferente à sorte dos outros irmãos. Em concreto, o nosso texto fala na partilha dos bens… Uma comunidade onde alguns esbanjam os bens e onde outros não têm o suficiente para viver dignamente, será uma comunidade que testemunha, diante dos homens, esse mundo novo de amor que Jesus veio propor? Será cristão aquele que, embora indo à igreja, só pensa em acumular bens materiais, recusando-se a escutar os dramas e sofrimentos dos irmãos mais pobres? Será cristão aquele que, embora contribuindo com donativos para as necessidades da paróquia, comete injustiças ou explora os seus servidores?
    • A comunidade cristã é uma comunidade que testemunha o Senhor ressuscitado. Como? Através de teorias bem elaboradas ou de discursos teológicos bem construídos, mas que passam ao lado da vida e dos problemas dos homens? Através de rituais solenes e majestosos, mas estéreis e vazios? O testemunho mais impressionante e mais convincente será sempre o testemunho de vida dos discípulos de Jesus… Se conseguirmos criar verdadeiras comunidades fraternas, que vivam no amor e na partilha, que sejam sinais no mundo dessa vida nova que Jesus veio propor, estaremos a anunciar que Jesus está vivo, que está a atuar em nós e que, através de nós, continua a apresentar ao mundo uma proposta de vida verdadeira. As nossas comunidades cristãs são lugares onde se sente pulsar, ao vivo e a cores, a Vida nova de Jesus?

     

    SALMO RESPONSORIAL – Salmo 117 (118)

    Refrão 1: Dai graças ao Senhor, porque Ele é bom,
    porque é eterna a sua misericórdia.

    Refrão 2: Aclamai o senhor, porque Ele é bom:
    o seu amor é para sempre.

    Refrão 3:  Aleluia.

     

    Diga a casa de Israel:
    é eterna a sua misericórdia.
    Diga a casa de Aarão:
    é eterna a sua misericórdia.
    Digam os que temem o Senhor:
    é eterna a sua misericórdia.

    A mão do Senhor fez prodígios,
    A mão do Senhor foi magnífica.
    Não morrerei, mas hei de viver,
    para anunciar as obras do Senhor.
    Com dureza me castigou o Senhor,
    mas não me deixou morrer.

    A pedra que os construtores rejeitaram
    tornou-se pedra angular.
    Tudo isto veio do Senhor:
    é admirável aos nossos olhos.
    Este é o dia que o Senhor fez:
    exultemos e cantemos de alegria.

     

    LEITURA II – 1 João 5,1-6

    Caríssimos:
    Quem acredita que Jesus é o Messias,
    nasceu de Deus,
    e quem ama Aquele que gerou
    ama também Aquele que nasceu d’Ele.
    Nós sabemos que amamos os filhos de Deus
    quando amamos a Deus e cumprimos os seus mandamentos,
    porque o amor de Deus
    consiste em guardar os seus mandamentos.
    E os seus mandamentos não são pesados,
    porque todo o que nasceu de Deus vence o mundo.
    Esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé.
    Quem é o vencedor do mundo
    senão aquele que acredita que Jesus é o Filho de Deus?
    Este é o que veio pela água e pelo sangue: Jesus Cristo;
    não só com a água, mas com a água e o sangue.
    É o Espírito que dá testemunho,
    porque o Espírito é a verdade.

     

    CONTEXTO

    A opinião tradicional atribuía a autoria da primeira Carta de João (como também a segunda e a terceira) ao apóstolo João, irmão de Tiago; no entanto, essa hipótese foi praticamente descartada pelos biblistas. Discute-se se o seu autor será o mesmo autor do Quarto Evangelho, atendendo à semelhança de vocabulário, de estilo e de doutrina entre os dois documentos; mas nem isso é consensual. Há ainda quem se questione se o autor desta carta (e das outras: a segunda e a terceira) não será um tal “João, o Presbítero” (cf. 2 Jo 1,1; 3 Jo 1,1), conhecido da tradição primitiva e que, aparentemente, era uma personagem distinta do “João, o apóstolo”. Seja como for, o autor da primeira Carta de João é alguém que pertence ao mundo joânico e que conhece bem a teologia joânica.

    Também não há, na primeira Carta de João, qualquer referência a um destinatário (pessoa ou comunidade) concreto. A missiva parece dirigir-se a um grupo de igrejas ameaçadas pelo mesmo problema: as heresias. Trata-se, provavelmente, de igrejas da Ásia Menor (à volta de Éfeso), onde estão a ser difundidas doutrinas incompatíveis com a revelação cristã, que ameaçam comprometer a pureza da fé.

    Quem são os autores dessas doutrinas heréticas? O autor da Carta chama-lhes “anticristos” (1 Jo 2,18.22; 4,3), “profetas da mentira” (1 Jo 4,1), “mentirosos” (1 Jo 2,22). Diz que eles “são do mundo” (1 Jo 4,5) e deixam-se levar pelo espírito do erro (1 Jo 4,6). Até há pouco tempo pertenciam à comunidade cristã (1 Jo 2,19); mas agora saíram e procuram desencaminhar os crentes que permaneceram fiéis (cf. 1 Jo 2,26; 3,7). Muito provavelmente são pessoas ligadas a grupos pré-gnósticos, cujas ideias começavam a circular, no final do séc. I, e a causar confusão e divisão nas comunidades joânicas. Estes “profetas da mentira” pretendiam “conhecer Deus” (1 Jo 2,4) e viver em comunhão com Deus (1 Jo 2,3); mas apresentavam uma doutrina e uma conduta em flagrante contradição com a revelação cristã. Recusavam-se a ver em Jesus o Messias (cf. 1 Jo 2,22) e o Filho de Deus (cf. 1 Jo 4,15), recusavam a encarnação (cf. 1 Jo 4,2) e ensinavam que o Cristo celeste tinha-Se apropriado do homem Jesus de Nazaré na altura do Batismo (cf. Jo 1,32-33), tinha-o utilizado para levar a cabo a revelação e tinha-o abandonado antes da paixão, porque o Cristo celeste não podia padecer. O comportamento moral destes hereges não era menos repreensível: pretendiam não ter pecados (cf. 1 Jo 1,8.10) e não guardavam os mandamentos (cf. 1 Jo 2,4), em particular o mandamento do amor fraterno (cf. 1 Jo 2,9).

    O autor da Primeira Carta de João adverte os cristãos contra as pretensões destes pregadores heréticos e explica-lhes os critérios da vida cristã autêntica.

     

    MENSAGEM

    Quais são, então, os critérios da vida cristã autêntica, que distinguem os verdadeiros crentes dos profetas da mentira?

    Antes de mais, os verdadeiros crentes são aqueles que amam a Deus e que amam, também, Jesus Cristo, o Filho que nasceu de Deus (vers. 1). Jesus de Nazaré é, ao contrário do que dizem os hereges, Filho de Deus desde a encarnação e em cada momento da sua existência terrena. A sua paixão e morte também fazem parte do projeto salvador de Deus (Jesus veio apresentar aos homens um projeto de salvação, “não só pela água, mas com a água e o sangue” – vers. 6).

    No entanto, amar a Deus significa cumprir os seus mandamentos. Quando amamos alguém, procuramos realizar obras que agradem àquele a quem amamos… Não se pode dizer que se ama a Deus se não se cumprem os seus mandamentos… E o mandamento de Deus é que amemos os nossos irmãos. Todo aquele que se considera filho de Deus e que pertence à família de Deus deve amar os irmãos que são membros da mesma família. Quem não ama os irmãos, não pode pretender amar a Deus e fazer parte da família de Deus (vers. 2-3).

    Quando o crente ama a Deus, acredita que Jesus é o Filho de Deus e vive de acordo com os mandamentos de Deus (sobretudo com o mandamento do amor aos irmãos), vence o mundo. Amar Deus, amar Jesus e amar os irmãos significa construir a própria vida numa dinâmica de amor; e significa, portanto, derrotar o egoísmo, o ódio, a injustiça que caracterizam a dinâmica do mundo (vers. 4-5).

    Esta Vida nova que permite aos crentes vencer o mundo é oferecida aos homens através de Jesus Cristo. A Vida nova que Jesus veio oferecer chega aos homens pela “água” (Batismo – isto é, pela adesão a Cristo e à sua proposta) e pelo “sangue” (alusão à vida de Jesus, feita dom na cruz por amor). O Espírito Santo atesta a validade e a verdade dessa proposta trazida por Jesus Cristo, por mandato de Deus Pai (vers. 6).

    Quando o homem responde positivamente ao desafio que Deus lhe lança (Batismo), cumpre os mandamentos de Deus e faz da sua vida um dom de amor aos irmãos (a exemplo de Cristo), vence o mundo, torna-se filho de Deus e membro da família de Deus.

     

    INTERPELAÇÕES

    • Amar a Deus significa cumprir os seus mandamentos – diz-nos o autor da primeira Carta de João. O amor a Deus não se diz em belas declarações, em palavras cheias de elevação, em solenes afirmações de princípios; diz-se, muito simplesmente, acolhendo as indicações de Deus e pautando por elas o nosso caminho de vida. Amamos a Deus quando o vemos como um Pai que nos ama e que só quer o nosso bem; amamos a Deus quando o levamos tão a sério que estamos dispostos a fazer a sua vontade, mesmo que isso afete os nossos projetos; amamos a Deus quando tudo o que vem dEle “conta” para nós; amamos a Deus quando caminhamos confiantes no caminho que Ele nos aponta, certos de que chegaremos a um porto seguro e feliz. É desta forma que eu amo a Deus?
    • De acordo com o autor da primeira Carta de João, amar a Deus implica amar também Jesus, o Filho de Deus. Também neste caso o nosso amor expressa-se mais em atitudes do que em palavras. Amamos a Jesus quando respondemos ao seu convite, tornamo-nos seus discípulos, acolhemos a sua Palavra, seguimo-Lo incondicionalmente no caminho do amor, do serviço, do dom da vida; amamos a Jesus quando, como Ele, lutamos contra tudo aquilo que suja o mundo e destrói a vida. É desta forma que eu amo Jesus?
    • Amar a Deus e aderir a Jesus implica amar os irmãos. Quem não ama os irmãos, não cumpre os mandamentos de Deus e não segue Jesus. Como Jesus, somos chamados a testemunhar o amor de Deus a todos os que caminham ao nosso lado, especialmente aos mais pobres, aos mais humildes, aos mais frágeis, aos que a sociedade e a religião condenam, aos que os senhores do mundo e da história humilham e desvalorizam. O amor total e sem fronteiras, o amor que nos leva a oferecer integralmente a nossa vida aos irmãos, o amor que se revela nos gestos simples de serviço, de perdão, de solidariedade, de doação, de atenção, de cuidado, está no nosso programa de vida?
    • Quem nasce de Deus e confia em Deus, quem acredita em Jesus e O segue – diz o autor da primeira Carta de João – “vence o mundo”. Os cristãos não se conformam com a lógica de egoísmo, de ódio, de injustiça, de violência que governa o mundo; a esta lógica, eles contrapõem a lógica do amor, a lógica de Jesus. O amor é um dinamismo que vence tudo aquilo que oprime o homem e que o impede de chegar à vida verdadeira e definitiva, à felicidade total. Ainda que o amor pareça, por vezes, significar fragilidade, debilidade, fracasso, frente à violência dos poderosos e dos senhores do mundo, a verdade é que o amor terá sempre a última e definitiva palavra. Só ele assegura a vida verdadeira e eterna, só ele é caminho para o mundo novo e melhor com que os homens sonham. Conformo-me com o mundo e os seus valores efémeros, ou sou dos que têm a ousadia de dar testemunho dos valores de Deus e de Jesus?

     

    ALELUIA – João 20,29

    Aleluia. Aleluia.

    Disse o Senhor a Tomé:
    «Porque Me viste, acreditaste;
    felizes os que acreditam sem terem visto».

     

    EVANGELHO – João 20,19-31

    Na tarde daquele dia, o primeiro da semana,
    estando fechadas as portas da casa
    onde os discípulos se encontravam,
    com medo dos judeus,
    veio Jesus, colocou-Se no meio deles e disse-lhes:
    «A paz esteja convosco».
    Dito isto, mostrou-lhes as mãos e o lado.
    Os discípulos ficaram cheios de alegria ao verem o Senhor.
    Jesus disse-lhes de novo:
    «A paz esteja convosco.
    Assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós».
    Dito isto, soprou sobre eles e disse-lhes:
    «Recebei o Espírito Santo:
    àqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhe-ão perdoados;
    e àqueles a quem os retiverdes serão retidos».
    Tomé, um dos Doze, chamado Dídimo,
    não estava com eles quando veio Jesus.
    Disseram-lhe os outros discípulos:
    «Vimos o Senhor».
    Mas ele respondeu-lhes:
    «Se não vir nas suas mãos o sinal dos cravos,
    se não meter o dedo no lugar dos cravos e a mão no seu lado,
    não acreditarei».
    Oito dias depois,
    estavam os discípulos outra vez em casa,
    e Tomé com eles.
    Veio Jesus, estando as portas fechadas,
    apresentou-Se no meio deles e disse:
    «A paz esteja convosco».
    Depois disse a Tomé:
    «Põe aqui o teu dedo e vê as minhas mãos;
    aproxima a tua mão e mete-a no meu lado;
    e não sejas incrédulo, mas crente».
    Tomé respondeu-Lhe:
    «Meu Senhor e meu Deus!»
    Disse-lhe Jesus:
    «Porque Me viste acreditaste:
    felizes os que acreditam sem terem visto».
    Muitos outros milagres fez Jesus na presença dos seus discípulos,
    que não estão escritos neste livro.
    Estes, porém, foram escritos
    para acreditardes que Jesus é o Messias, o Filho de Deus,
    e para que, acreditando, tenhais a vida em seu nome.

     

    CONTEXTO

    Jesus foi crucificado na manhã de uma sexta-feira – dia da “preparação” da Páscoa – e morreu pelas três horas da tarde desse dia. Já depois de morto, um soldado trespassou-lhe o coração com uma lança; e do coração aberto de Jesus saiu sangue e água (cf. Jo 19,31-37). O evangelista João vê no sangue que sai do lado aberto de Jesus o sinal do seu amor dado até ao extremo (cf. Jo 13,1): do amor do pastor que dá a vida pelas suas ovelhas (cf. Jo 10,11), do amor do amigo que dá a vida pelos seus amigos (cf. Jo 15,13); e vê na água que sai do coração trespassado de Jesus o sinal do Espírito (cf. Jo 3,5), desse Espírito que Jesus “entregou” aos seus e que é fonte de Vida nova. Da água e do sangue, do batismo e da eucaristia, nascerá a nova comunidade, a comunidade da Nova Aliança. Contudo, os discípulos que tinham subido com Jesus a Jerusalém e que seriam o embrião dessa comunidade da Nova Aliança, desapareceram sem deixar rasto. Estão escondidos, algures na cidade de Jerusalém, paralisados pelo medo. O projeto de Jesus falhou?

    No final da tarde dessa sexta-feira, o corpo morto de Jesus foi sepultado à pressa num túmulo novo, situado num horto ao lado do lugar onde se tinha dado a crucificação (cf. Jo 19,38-42). Depois veio o sábado, o último dia da semana, o dia da celebração da Páscoa judaica. Durante todo aquele sábado o túmulo de Jesus continuou cerrado.

    A partir daqui a narração de João muda de tempo e de registo. Chegamos ao “primeiro dia da semana”. É o primeiro dia de um tempo novo, o tempo da humanidade nova, nascida da ação criadora e vivificadora de Jesus. “No primeiro dia da semana”, Maria Madalena, a mulher que representa a nova comunidade, vai ao túmulo e vem de lá confusa e desorientada porque o túmulo está vazio (cf. Jo 20,1-2). Logo depois, ainda “no primeiro dia da semana”, Pedro e outro discípulo correm ao túmulo e constatam aquilo que Maria Madalena tinha afirmado: Jesus já não está encerrado no domínio da morte (cf. Jo 20,3-10). A comunidade de Jesus começa a despertar do seu letargo; começa a viver um tempo novo. “Ao entardecer do primeiro dia da semana” (“ou seja, ao concluir-se este primeiro dia da nova criação) a comunidade dos discípulos faz a experiência do encontro com Jesus, vivo e ressuscitado (cf. Jo 20,19-29).

     

    MENSAGEM

    O texto do Evangelho que a liturgia deste segundo domingo do tempo pascal nos propõe divide-se em duas partes.

    Na primeira (vers. 19-23), narra-se um encontro de Jesus ressuscitado com os discípulos. João começa por descrever a situação em que estavam os discípulos antes de Jesus lhes aparecer: o “anoitecer”, as “portas fechadas”, o “medo”, traduzem a insegurança e o desamparo que eles sentem diante desse mundo hostil que condenou Jesus à morte.

    Mas de repente o próprio Jesus apresenta-se “no meio deles” (vers. 19b). O crucificado está vivo; a morte não o derrotou. Os discípulos já não estão órfãos, abandonados à hostilidade do mundo. Ao colocar-se “no meio deles”, Jesus ressuscitado assume-Se como ponto de referência, fator de unidade, fonte de Vida, videira à volta da qual se enxertam os ramos (cf. Jo 15,5). A comunidade está centrada em Jesus, apenas em Jesus. Ele é o centro onde todos vão beber a água que dá a Vida eterna.

    A esta comunidade que se reúne à sua volta, Jesus transmite duplamente a paz (vers. 19 e 21). Não é apenas o tradicional cumprimento hebraico (“shalom”); significa, para além disso, que Jesus venceu tudo aquilo que assustava os discípulos: a morte, a opressão, a mentira, a violência, a hostilidade do mundo. Doravante os discípulos de Jesus não têm qualquer razão para viverem paralisados pelo medo.

    Depois (vers. 20a), Jesus mostra aos discípulos as mãos com a marca dos pregos e o lado que foi trespassado pela lança do soldado. Nesses “sinais” está, antes de mais, a prova da sua vitória sobre a morte e a maldade dos homens; mas também está a marca da sua entrega até à morte por obediência ao Pai e por amor aos homens. Neles está impressa, por assim dizer, a “identidade” de Jesus: é nesses sinais de amor e de doação que a comunidade reconhece Jesus vivo e presente no seu meio. A permanência desses “sinais” indica a permanência do amor de Jesus: Ele será sempre o Messias que ama e do qual brotarão a água e o sangue que constituem e alimentam a comunidade.

    A esta “apresentação” de Jesus, os discípulos respondem com a alegria (vers. 20b): eles estão alegres porque Jesus está vivo; mas também estão alegres porque sabem que começou um tempo novo, o tempo em que a morte já não assusta, o tempo do Homem Novo, do Homem livre, do Homem que se encontrou com a Vida definitiva.

    Em seguida, Jesus convoca os discípulos para a missão (vers. 21). Que missão? Precisamente a mesma que o Pai Lhe confiou a Ele: realizar no mundo a obra de Deus. Os discípulos concretizarão esta missão sempre em ligação com Jesus (eles são ramos ligados à videira/Jesus, pois só assim darão fruto – cf. Jo 15,1-8).

    Para que os discípulos possam concretizar a missão, Jesus realiza um gesto inesperado, mas bem significativo: “soprou” sobre eles (vers. 22). O verbo aqui utilizado é o mesmo do texto grego de Gn 2,7 (quando se diz que Deus soprou sobre o homem de argila, infundindo-lhe a vida de Deus). Com o “sopro” de Gn 2,7, o homem tornou-se um ser vivente; com este “sopro”, Jesus transmite aos discípulos a Vida nova, o Espírito Santo, que fará deles Homens Novos e que os capacitará para viverem como testemunhas de Jesus ressuscitado. Trata-se, em boa verdade, de uma nova Criação. Da atividade de Jesus, do seu testemunho, do seu amor, do seu dom nasceu uma nova humanidade, capaz de amar até ao extremo, de dar a vida, de realizar a obra de Deus. É este Espírito que, pelo tempo fora, constitui e anima a cada instante a comunidade de Jesus.

    Eis a comunidade da Nova Aliança, nascida da ação e do amor de Jesus!

    Na segunda parte (vers. 24-29), o evangelista João apresenta uma catequese sobre a maneira de os discípulos de Jesus de qualquer época chegarem à fé em Cristo ressuscitado. A história de Tomé, chamado Dídimo (“gémeo”), poderia ser a nossa história. Tomé é o nosso “gémeo”: também nós nem sempre nos contentamos com o testemunho que nos chegou dos primeiros discípulos; também nós gostaríamos de “ver”, de “tocar”, de ter provas palpáveis… Como podemos fazer a experiência de encontro com Jesus ressuscitado?

    Jesus ressuscitado apresenta-se aos discípulos “no primeiro dia da semana”, quando a comunidade está reunida. A comunidade dos discípulos é o lugar natural onde se manifesta e irradia o amor de Jesus; é o lugar onde desponta a Vida nova de Jesus. Por isso, é lá que se faz a experiência da presença de Jesus vivo. Mas Tomé “não estava com eles” (vers. 24). Estava fora da comunidade. “Se eu não vir o sinal dos pregos nas suas mãos e não meter o meu dedo nesse sinal dos pregos e a minha mão no seu lado, não acredito” – diz Tomé quando lhe falam do Ressuscitado (vers. 25). Em lugar de integrar-se e participar da mesma experiência que os outros discípulos fizeram em comunidade, pretende obter para si próprio uma demonstração particular de Deus. Tomé representa aqueles que vivem fechados em si próprios (está fora), que não fazem caso do testemunho da comunidade e que, por isso, nem percebem os sinais de Vida nova que nela se manifestam.

    Mas, “oito dias depois” (portanto, outra vez no primeiro dia da semana), Tomé já está novamente integrado na comunidade; e é aí que ele se encontra com Jesus ressuscitado, pois é aí que se manifestam os sinais de Vida nova que alimentam a fé no Ressuscitado (vers. 26-27). Esta experiência é tão impactante que, do coração rendido de Tomé, brota uma extraordinária declaração de fé, uma das mais belas de toda a Bíblia: “Meu Senhor e meu Deus!” (vers. 28). Também nós, os “gémeos” de Tomé, os que somos chamados a acreditar sem termos visto nem tocado, poderemos fazer a mesma experiência que Tomé fez: é no encontro com o amor fraterno, com o perdão dos irmãos, com a Palavra proclamada em comunidade, com o pão de Jesus partilhado, que se descobre e se experimenta Jesus ressuscitado. É por isso que a comunidade de Jesus continua a reunir-se “no primeiro dia da semana”, no “dia do Senhor” (o domingo).

     

    INTERPELAÇÕES

    • Nos relatos pascais aparece sempre, em pano de fundo, a convicção profunda de que a comunidade dos discípulos nunca estará sozinha, abandonada à sua sorte: Jesus ressuscitado, Aquele que venceu a morte, a injustiça, o egoísmo, o pecado, acompanhá-la-á em cada passo do seu caminho histórico. É verdade que os discípulos de Jesus não vivem num mundo à parte, onde a fragilidade e a debilidade dos humanos não os tocam. Como os outros homens e mulheres, eles experimentam o sofrimento, o desalento, a frustração, o desânimo; têm medo quando o mundo escolhe caminhos de guerra e de violência; sofrem quando são atingidos pela injustiça, pela opressão, pelo ódio do mundo; conhecem a perseguição, a incompreensão e a morte… Mas, apesar de tudo isso, não se deixam vencer pelo pessimismo e pelo desespero pois sabem que Jesus vai “no meio deles”, oferecendo-lhes a sua paz e apontando-lhes o horizonte da Vida definitiva. É com esta certeza que caminhamos e que enfrentamos as tempestades da vida? Os outros homens e mulheres que partilham o caminho connosco descobrem Jesus, vivo e ressuscitado, através do testemunho de esperança que damos?
    • O Espírito Santo é o grande dom que Jesus ressuscitado faz à comunidade dos discípulos. É Ele que nos transforma, que nos anima, que faz de nós pessoas novas, que nos capacita para sermos testemunhas e sinais da Vida de Deus; é Ele que nos dá a coragem e a generosidade para continuarmos no mundo a obra de Jesus. No entanto, o Espírito só atua em nós se estivermos disponíveis para o acolher. Ele não se impõe nem desrespeita a nossa liberdade. Estamos disponíveis para acolher o Espírito? O nosso coração está aberto aos desafios que o Espírito constantemente nos lança?
    • A comunidade cristã gira em torno de Jesus, é construída à volta de Jesus e é de Jesus que recebe Vida, amor e paz. Sem Jesus, seremos um rebanho de gente assustada, incapaz de enfrentar o mundo e de ter uma atitude construtiva e transformadora; sem Jesus, seremos um grupo de gente que se apoia em leis, que vive de ritos, que defende doutrinas e não a comunidade que vive e testemunha o amor de Deus; sem Jesus, estaremos divididos, mergulhados em conflitos estéreis, e não seremos uma comunidade de irmãos e de irmãs; sem Jesus, cairemos facilmente em caminhos errados e iremos beber a fontes que não matam a nossa sede de Vida… Na nossa comunidade, Cristo é verdadeiramente o centro? É para Ele que tudo tende e é d’Ele que tudo parte? Escutamos as suas palavras, alimentamo-nos d’Ele, vivemos d’Ele, estamos ligados a Ele como os ramos estão ligados à videira?
    • Não é em experiências pessoais, íntimas, fechadas, egoístas, que encontramos Jesus ressuscitado; mas encontramo-l’O sempre que nos reunimos em seu nome, em comunidade. É no diálogo comunitário, na Palavra partilhada, no pão repartido, no amor que une os irmãos em comunidade de vida, que fazemos a experiência da presença de Jesus vivo no meio de nós. O que é que a comunidade cristã significa para mim? Sinto-me bem a caminhar em comunidade, ou a minha experiência de fé é uma experiência isolada, à margem da riqueza e dos desafios que a comunidade me oferece? E, neste âmbito, o que é que significa, para mim, a participação na celebração da Eucaristia, no “primeiro dia da semana”, o dia do encontro comunitário à volta da mesa de Jesus?
    • É nos gestos de amor, de partilha, de serviço, de encontro, de fraternidade, que encontramos Jesus vivo, a transformar e a renovar o mundo; é com gestos de bondade, de misericórdia, de compaixão, de perdão que testemunhamos diante do mundo a Vida nova do Ressuscitado. Quem procura Cristo ressuscitado, encontra-O em nós? O amor de Jesus – amor total, universal e sem medida – transparece nos nossos gestos e na nossa vida?

     

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 2.º DOMINGO DE PÁSCOA
    (adaptadas, em parte, de “Signes d’aujourd’hui”)

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.

    Ao longo dos dias da semana anterior ao 2º Domingo de Páscoa, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus…

    2. BILHETE DE EVANGELHO.

    Apenas Jesus viveu a sua passagem da morte à vida. Os seus discípulos vão passar do medo à alegria e à paz, basta-lhes uma palavra – “a paz esteja convosco” – e verem as chagas ainda visíveis no Ressuscitado. Basta-lhes um sopro, o do Espírito de Cristo, para se tornarem embaixadores da reconciliação. Tomé vai passar da dúvida à fé, basta-lhe ver e tocar o que Cristo lhe oferece, então ele crê. “Há muitos outros sinais” cumpridos pelo Ressuscitado, precisa o evangelista, mas os que aqui são referidos são-no para que nós mesmos passemos do questionamento à afirmação – “Ele ressuscitou verdadeiramente!” – e para que O reconheçamos hoje, porque Ele não cessa de fazer sinal ainda e sempre.

    3. À ECUTA DA PALAVRA.

    “Meu Senhor e meu Deus!” Há a “fé do carvoeiro”. Ela não coloca qualquer questão. Ela é, muitas vezes, em si mesma, muito sólida, não se deixa levar por qualquer dúvida. E há uma fé “inquieta”, que não fica em repouso, que procura compreender. A dúvida, então, faz parte desta fé. Certamente, pode haver dúvidas destrutivas, aquela que nasce, por exemplo, de uma inveja, porque se desconfia da infidelidade do outro. Tal não é a dúvida de Tomé. Ele gostaria de acreditar no que lhe dizem os companheiros. Mas esta história da ressurreição de Jesus parece-lhe de tal modo fora da experiência humana mais comum e mais constante, que ele pede, de qualquer modo, um complemento de informação e para ver de mais perto. Não recusa crer, ele quer compreender melhor. A sua dúvida não é fechada, exprime um desejo de ser apoiada na fé. “Deixa de ser incrédulo, sê crente”. Mais do que uma reprovação, Jesus dirige-lhe um convite a ter uma confiança maior, total. Então, o Tomé da dúvida torna-se o Tomé que proclama a sua fé como nenhum dos seus discípulos o fez. Ele grita: “Meu Senhor e meu Deus!” A Igreja não abandonará jamais esta profissão de fé. Hoje ainda, ela termina grande parte das orações dirigidas ao Pai, dizendo: “Por Jesus Cristo, vosso Filho, nosso Deus e Senhor”. São as próprias palavras de Tomé que alimentam a fé e a oração da Igreja. Então, bem-aventurado Tomé!

    4. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE…

    Com Tomé… Ao longo da semana que se segue, a partir do grande encontro que Cristo teve connosco na celebração deste domingo, esforcemo-nos em Lhe dizer, como Tomé, a nossa fé. Somos chamados a um diálogo do coração… Mas daí jorrará uma verdadeira felicidade, que poderemos então partilhar à nossa volta.

     

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA

    Grupo Dinamizador:
    José Ornelas, Joaquim Garrido, Manuel Barbosa, Ricardo Freire, António Monteiro
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
    www.dehonianos.org

     

  • 2ª Semana - Segunda-feira - Páscoa

    2ª Semana - Segunda-feira - Páscoa

    8 de Abril, 2024

    2ª Semana - Segunda-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 4, 23-31

    Naqueles dias, logo que Pedro e João foram postos em liberdade, foram ter com os seus e contaram-lhes tudo quanto os sumos sacerdotes e os anciãos lhes tinham dito. 24Depois de tudo terem ouvido, ergueram a voz a Deus, numa só alma, e disseram:«Senhor, Tu é que fizeste o Céu, a Terra, o mar e tudo o que neles se encontra. 25Tu disseste pelo Espírito Santo e pela boca do nosso pai David, teu servo: 'Porque bramiram as nações e os povos formaram vãos projectos?
    26Levantaram-se os reis da Terra e os chefes coligaram-se contra o Senhor e contra o seu Ungido.' 27Sim, realmente, Herodes e Pôncio Pilatos coligaram-se nesta cidade
    com as nações e os povos de Israel, contra o teu Santo Servo Jesus, a quem ungiste,
    28para levarem a cabo tudo quanto determinaste antecipadamente, pelo teu poder e sabedoria. 29Agora, Senhor, tem em conta as suas ameaças e concede aos teus servos poderem anunciar a tua palavra com todo o desassombro, 30estendendo a tua mão
    para se operarem curas, milagres e prodígios, em nome do teu Santo Servo Jesus.»
    31Tinham acabado de orar, quando o lugar em que se encontravam reunidos estremeceu, e todos ficaram cheios do Espírito Santo, começando a anunciar a palavra de Deus com desassombro.

    Pedro e João, postos em liberdade, vão ter com os seus. Estes seus não eram certamente os 8.000 convertidos já referidos por Lucas, mas um pequeno grupo capaz de se reunir numa casa particular, talvez o núcleo original da Igreja (cf. Act 1,
    12-14), reunido em casa de Maria (Act 12, 12).
    A comunidade cristã reage à perseguição, não concertando estratégias humanas, mas com a oração. Esta oração, a mais pormenorizada que encontramos no Novo Testamento, está construída sobre um esquema tripartido, comum na época. Começa por invocar a Deus criador, menciona alguns dos seus atributos e, finalmente, apresenta o pedido. O ponto central da oração é constituído pela citação do Sl 2, 1-2. O que aí se anuncia foi integralmente realizado na paixão, morte e ressurreição de Jesus. Não importa, pois, que os reis da terra, representados em Herodes, conspirem contra Jesus, o Messias, e que os príncipes, representados por Pôncio Pilatos, se aliem contra o Senhor. A ressurreição de Jesus torna inútil toda essa oposição. A comunidade sabe que tem de passar pela mesma sorte de Jesus. Por isso, pede a Deus, não o fim da perseguição, mas a liberdade e o poder anunciar com palavras e obras a Boa Nova de Cristo morto e ressuscitado.
    A narrativa de Lucas termina referindo um estremecer do lugar onde estavam
    reunidos a rezar. Era, segundo a mentalidade comum, um sinal de que a oração fora benignamente escutada por Deus. De facto, todos foram cheios do Espírito Santo e começaram a anunciar com audácia a Palavra de Deus.

    Evangelho: João 3, 1-8

    Entre os fariseus, havia um homem chamado Nicodemos, um chefe dos judeus. 2Veio ter com Jesus de noite e disse-lhe: «Rabi, nós sabemos que Tu vieste da parte de Deus, como Mestre, porque ninguém pode realizar os sinais portentosos

    que Tu fazes, se Deus não estiver com ele.» 3Em resposta, Jesus declarou-lhe: «Em verdade, em verdade te digo: quem não nascer do Alto não pode ver o Reino de Deus.» 4Perguntou-lhe Nicodemos: «Como pode um homem nascer, sendo velho? Porventura poderá entrar no ventre de sua mãe outra vez, e nascer?» 5Jesus respondeu-lhe: «Em verdade, em verdade te digo: quem não nascer da água e do Espírito não pode entrar no Reino de Deus. 6Aquilo que nasce da carne é carne, e aquilo que nasce do Espírito é espírito. 7Não te admires por Eu te ter dito: 'Vós tendes de nascer do Alto.' vento sopra onde quer e tu ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem nem para onde vai. Assim acontece com todo aquele que nasceu do Espírito.»

    Nicodemos era um dirigente judeu muito representativo. Tinha ficado impressionado com as palavras e as acções de Jesus, na sua primeira intervenção, em Jerusalém. Por isso, decidiu entrevistar-se com ele. E mostra-se disposto a aceitar o ponto de vista de Jesus. Trata-se, pois, de um homem de boa vontade, com inquietações e sem preconceitos. As suas perguntas andaram à volta do tema do Reino de Deus, como nos dá a entender o evangelista. Como noutras ocasiões, João faz entrar Nicodemos em cena para provocar o ponto de apoio a partir do qual Jesus inculca os seus ensinamentos. As especulações dos judeus sobre o Reino de Deus não levam a bom porto. Para entrar nele é preciso nascer de novo. Esta é a expressão central da narrativa. A interpretação literal que Nicodemos faz dela dá a Jesus ocasião para ulteriores explicações.
    Na Antiguidade, havia a ideia de que, para entrar numa nova religião ou num
    sistema filosófico, era preciso «renascer». Hoje diríamos que é preciso mudar de mentalidade. Mas não é esse o sentido que Jesus dá à expressão. De facto, trata-se de um nascimento «do Alto» (v. 7) ou de Deus. Este nascimento tornou-se possível porque O do alto veio à terra (cf. Jo 1, 12-13). O nascimento «da carne e do sangue» é inadequado em ordem à pertença ao Reino. É precisa a acção do Espírito que é oferecido gratuitamente ao homem por Deus. O Espírito torna o homem capaz de responder a Deus. Água e Espírito: Jesus alude a dois elementos essenciais do baptismo, onde se realiza o novo nascimento.

    Meditatio

    Os primeiros cristãos reagem às perseguições com a oração. Não rezam para serem livres dos incómodos da perseguição. Rezam para não se deixarem bloquear pelas dificuldades e para não perderem a coragem de anunciar a Palavra. A sua oração é escutada, porque o Espírito vem dar-lhes força e coragem.
    Não se pode evangelizar sem fazer oração, muita oração. A evangelização, com efeito, é obra do Espírito Santo, que toca, não só o coração dos ouvintes, mas também o do evangelizador, tantas vezes tíbio e vacilante.
    O evangelho de hoje parece ter pouco a ver com o mistério pascal que estamos a celebrar: não fala de morte nem de ressurreição. Mas há uma relação profunda com a Páscoa e, na verdade, fala-se da ressurreição de Cristo e da nossa ressurreição. De facto, a Sagrada Escritura fala da ressurreição de Cristo como de um novo nascimento. Paulo, num seu discurso, aplica à ressurreição de Jesus o Salmo 2, onde Deus diz ao Filho: «Hoje Te gerei» (cf. Act 13, 16ss.). Na ressurreição, Cristo foi gerado para uma vida nova: era home
    m de carne e tornou-se homem «espiritual», de Espírito Santo. O mesmo Paulo, noutra passagem das suas cartas explica que, primeiro há o homem feito de terra e, depois, o homem celeste, que é Cristo ressuscitado (cf. 1 Cor 15, 44ss.). E tudo aconteceu por nós. O Filho assumiu corpo humano, de que não precisava, para tornar possível um novo nascimento para todos nós: «Em verdade, em verdade te digo: quem não nascer da água e do Espírito não

    pode entrar no Reino de Deus» (Jo 3, 5). Renascer da água e do Espírito Santo é dom de Cristo ressuscitado. Esse dom vem pelo sacramento do Baptismo que nos faz
    «renascer do alto» (v. 7) e introduz em nós um dinamismo que nos permite crescer e desenvolver-nos até à estatura de Cristo.
    Este nascimento, preanunciado a Nicodemos (cf. Jo 3, 3.5), realizou-se na
    transfixão do Lado, onde a água que brota de Cristo é sinal do dom do Espírito, do Baptismo, do nascimento da Igreja e, na Igreja, de cada um de nós. «Do Coração de Cristo, aberto na cruz, nasce o homem de coração novo, animado pelo Espírito e unido aos seus irmãos na comunidade de amor, que é a Igreja» (Cst 3).

    Oratio

    Senhor Jesus, faz-me compreender que «renascer do Alto» não é só ser baptizado mas também acolher cada dia o ser espiritual que o Pai nos dá pela tua Ressurreição. Preciso de renascer em cada etapa da minha vida. Por isso, não me hei-de espantar quando, por assim dizer, sentir as dores do parto. De facto, nascer do Espírito não acontece de uma vez para sempre, e as dificuldades da nossa vida são um chamamento a renascer mais uma vez.
    Que eu me abra de par em par ao teu Espírito para ser capaz de sempre renascer, sem desanimar com as dores que antecedem cada renascimento. Amen.

    Contemplatio

    É depois da sua ressurreição que Nosso Senhor dá aos seus apóstolos a missão definitiva de fundar a igreja e de nela fazer entrar todos os homens pelo sacramento do baptismo: «Ide, - diz-lhes -, pregai, ensinai todas as nações e baptizai-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo» (Mt 28, 19).
    Mas já tinha descrito os efeitos do baptismo em várias ocasiões e
    particularmente na conversa com Nicodemos. - «Em verdade, te digo, - tinha-lhe dito Jesus -, a não ser que renasça da água e do Espírito Santo, ninguém pode entrar no reino de Deus. O que nasceu da carne é carne e o que nasceu do Espírito é espírito. Não te surpreendas, portanto, por te ter dito: é preciso que nasçais de novo. O vento sopra onde quer. Tu escutas a sua voz, mas não sabes de onde vem, nem onde vai. Assim é com todo o homem que nasceu do Espírito» (Jo 3, 1).
    Nosso Senhor estabelece bem a distinção entre a vida natural e a vida sobrenatural. Descreve-nos o reino de Deus na nossa alma: uma vida nova e a acção misteriosa do Espírito Santo. O Espírito de Deus sopra onde quer; inspira a alma, eleva-a acima de si mesma no momento que escolheu. A sua acção só depende d' Ele. Se estivar lá, sente-se, escuta-se a sua voz e há a vida; se se afasta, é o definhamento e silêncio (Leão Dehon, OSP 4, p. 214).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Venha a nós o vosso reino» (Mt 6, 10).

  • 2ª Semana - Terça-feira - Páscoa

    2ª Semana - Terça-feira - Páscoa

    9 de Abril, 2024

    2ª Semana - Terça-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 4, 32-37

    32A multidão dos que haviam abraçado a fé tinha um só coração e uma só alma. Ninguém chamava seu ao que lhe pertencia, mas entre eles tudo era comum.
    33Com grande poder, os Apóstolos davam testemunho da ressurreição do Senhor Jesus, e uma grande graça operava em todos eles. 34Entre eles não havia ninguém necessitado, pois todos os que possuíam terras ou casas vendiam-nas, traziam o produto da venda 35e depositavam-no aos pés dos Apóstolos. Distribuía-se, então, a cada um conforme a necessidade que tivesse. 36Assim, um levita cipriota, de nome José, a quem os Apóstolos chamaram Barnabé, isto é, «filho da consolação», 37possuía uma terra; vendeu-a e trouxe a importância, que depositou aos pés dos
    Apóstolos.

    Lucas apresenta-nos mais um breve resumo sobre o teor de vida da Igreja nascida do Pentecostes, acentuando a eficácia do testemunho apostólico sobre a Ressurreição, que dá origem a uma nova criação, que justifica o estilo de vida da comunidade e, concretamente, a partilha de bens. Nesta partilha, notamos dois aspectos: o primeiro consiste em pôr em comum os próprios bens, partilhando o seu uso; mantendo cada um a propriedade dos seus bens, considera-se apenas administrador dos mesmos, pondo-os à disposição dos outros; o segundo aspecto consiste em vender os próprios bens, distribuindo o lucro pelos pobres; neste caso, vendidos os bens, apresentavam o lucro aos apóstolos que o distribuíam. Mas os Actos apresentam outras formas de partilha dos bens: Paulo falará do trabalho com as próprias mãos, para prover às necessidades dos seus e dos que são frágeis (cf. 20, 34s.).
    O que Lucas pretende sublinhar é que a partilha, nas suas diferentes formas, tem a sua raiz na comunhão de espírito e de corações dos fiéis. Do conjunto, podemos concluir que estamos perante a comunidade messiânica, herdeira das promessas feitas aos pais: «Em verdade, não deve haver pobres entre vós, porque o Senhor te abençoará na terra que Ele próprio te há-de dar em herança para a possuíres; mas só se ouvires a voz do Senhor, teu Deus, para guardares e cumprires todos estes preceitos.» (Dt 14, 4s.).

    Evangelho: Jo 3, 7b-15

    Naquele tempo, Jesus disse a Nicodemos: 7Não te admires por Eu te ter dito:
    'Vós tendes de nascer do Alto.' vento sopra onde quer e tu ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem nem para onde vai. Assim acontece com todo aquele que nasceu do Espírito.» 9Nicodemos interveio e disse-lhe: «Como pode ser isso?» 10Jesus respondeu- lhe: «Tu és mestre em Israel e não sabes estas coisas? 11Em verdade, em verdade te digo: nós falamos do que sabemos e damos testemunho do que vimos, mas vós não aceitais o nosso testemunho. 12Se vos falei das coisas da terra e não credes, como é que haveis de crer quando vos falar das coisas do Céu? 13Pois ninguém subiu ao Céu a não ser aquele que desceu do Céu, o Filho do Homem. 14Assim como Moisés ergueu a serpente no deserto, assim também é necessário que o Filho do Homem seja erguido ao alto, 15a fim de que todo o que nele crê tenha a vida eterna.

    O diálogo com Nicodemos transforma-se num monólogo com grande amplidão de horizontes. Lucas refere-nos palavras autênticas de Jesus e testemunhos pós- pascais, fundidos num único discurso. Estamos perante uma profissão de fé usada na liturgia da igreja joânica e que contém uma síntese da história da salvação.
    O evangelista desenvolve o tema do texto que ontem escutámos, centrado no testemunho de Cristo, Filho do homem descido do céu, o único capaz de revelar o amor de Deus pelos homens, como de facto fez, na sua morte e ressurreição (vv. 11-
    15). João insiste agora na importância da fé: para compreendermos a grande revelação do êxodo pascal, há que crescer na fé sobre o nosso destino espiritual. Há que acreditar em Cristo, ainda que não tenhamos subido ao céu para compreendermos os seus mistérios. Ele, que desceu do céu (v. 13), é capaz de anunciar a realidade do Espírito, e é capaz de estabelecer a verdadeira relação do homem com Deus. Só Jesus é o lugar ideal da presença de Deus. Esta revelação realizar-se-á na cruz, quando Jesus for entronizado, porque «todo o que nele crê tenha a vida eterna» (v. 15).
    A humanidade poderá compreender o evento escandaloso e desconcertante da salvação pela cruz e ser curada do seu mal, tal como os Hebreus, mordidos pelas serpentes no deserto, foram curados ao olharem a serpente de bronze elevada num poste (cf. Nm 21, 4-9). A salvação passa pela submissão a Deus e pela contemplação do Crucificado.

    Meditatio

    Os resumos de Lucas sobre a vida da primeira comunidade cristã permanecem como referência para as comunidades de todos os tempos. Os monges do século IV, perante o abrandamento de fervor espiritual ocorrido na Igreja, depois do édito de Milão, foram para o deserto e organizaram-se em comunidades que pretendiam reeditar a comunidade de Jerusalém. Nos momentos de dificuldades na vida cristã, e particularmente na vida religiosa, apela-se para o modelo fundante e insuperável da Igreja primitiva.
    A primeira leitura deixa-nos entrever o fascínio e a nostalgia da fraternidade,
    de uma Igreja fraterna. A comunhão é um dos pilares sobre o qual se pode reconstruir a Igreja e as próprias comunidades religiosas. A comunhão manifesta a novidade cristã. Comunidades fraternas, Igreja fraterna, mentalidade fraterna, que procuram acima de tudo relações fraternas, tornam-se sinal da presença de Deus e do seu Reino.
    O evangelho fala-nos da morte e da glorificação de Jesus, que ele mesmo anuncia a Nicodemos: «É necessário que o Filho do Homem seja erguido ao alto, a fim de que todo o que nele crê tenha a vida eterna» (v. 14). Jesus, elevado na cruz, alcançou a ressurreição que O elevou ao Céu: «Ninguém subiu ao Céu a não ser aquele que desceu do Céu, o Filho do Homem» (v. 13). Elevado na cruz e na ressurreição, Jesus revela-se como Aquele em Quem havemos de acreditar. Há pois que acolher as suas palavras sobre o Pai e sobre a vida eterna, a verdadeira vida. E, tendo acreditado, havemos de dar testemunho.
    Os cristãos, particularmente os religiosos, certamente imperfeitos, hão-de procurar criar um ambiente que promova o progresso espiritual de cada um. Para isso, hão-de esforçar-se por aprofundar as relações no Senhor, mesmo as mais normais, com cada um dos irmãos. A caridade, entre muitas outras coisas, incluindo a partilha de bens, h&aac
    ute;-de ser também uma esperança activa daquilo que os outros podem vir a ser com a ajuda do nosso apoio fraterno (cf. Cst 64). Assim todos testemunhamos que a fraternidade porque os homens anseiam é possível em Jesus

    Cristo (cf. Cst. 65). Assim também confessamos a Cristo, em nome do Qual estamos reunidos (cf. Cst. 67).

    Oratio

    Senhor, Pai misericordioso, dá-nos a graça de proclamar o poder do Senhor ressuscitado. O livro dos Actos diz-nos que os Apóstolos davam testemunho da Ressurreição de Jesus com grande força. Essa é também a nossa missão de cristãos e religiosos, hoje. Infunde em nós o Espírito Santo para que, pela nossa palavra ardorosa, e pela nossa vida de fé, de esperança e de caridade, demos um testemunho vigoroso do teu Filho Jesus, e da sua santa Ressurreição. Amen.

    Contemplatio

    S. Barnabé não era do número dos doze apóstolos, mas foi-lhe acrescentado e trabalhou muito com S. Paulo. Levita e cipriota, estudava as santas Letras em Jerusalém sob a direcção do Rabino Gamaliel, quando foi testemunha da cura do paralítico na piscina. Uniu-se então imediatamente aos discípulos de Nosso Senhor. Era um homem jovem, amável e bom. Era bom, dizem os Actos, e cheio de fé e ricamente dotado com os dons do Espírito Santo. Os apóstolos chamaram-no Barnabé, o que quer dizer «o Filho da consolação». Depois do Pentecostes, estava em Damasco quando aconteceu o milagre da conversão de S. Paulo. Fez-se o anjo da guarda de S. Paulo, conduziu-o a Jerusalém e apresentou-o aos apóstolos. Trabalharam juntos vários anos, e receberam a missão de pregarem a fé aos gentios. Ganharam quase toda a cidade de Antioquia.
    Barnabé era de uma família abastada. Tinha uma bela propriedade na ilha de
    Chipre. Vendeu-a e apresentou o valor aos apóstolos. Dava assim o grande exemplo do desapego e da vida religiosa (Leão Dehon, OSP 3, p. 644).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Todo o que crê em Mim tem a vida eterna» (Cf. Jo 3, 15).

  • 2ª Semana - Quarta-feira - Páscoa

    2ª Semana - Quarta-feira - Páscoa

    10 de Abril, 2024

    2ª Semana - Quarta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 5, 17-26

    Naqueles dias, 17Surgiu o Sumo-sacerdote com todos os seus sequazes, isto é, o partido dos saduceus; encheram-se de inveja 18e deitaram as mãos aos Apóstolos, metendo-os na prisão pública. 19Mas, durante a noite, o Anjo do Senhor abriu as portas da prisão e, depois de os ter conduzido para fora, disse-lhes: 20«Ide para o templo e anunciai ao povo a Palavra da Vida.» 21Obedientes a essas ordens, entraram no templo de manhã cedo e começaram a ensinar. Entretanto, chegou o Sumo-sacerdote com os seus sequazes; convocaram o Sinédrio e todo o Senado dos filhos de Israel e mandaram buscar os Apóstolos à cadeia. 22Os guardas foram lá, mas não os encontraram na prisão e voltaram, declarando: 23«Encontrámos a cadeia fechada com toda a segurança e os guardas de sentinela à porta, mas, depois de a abrirmos, não encontrámos ninguém no interior.» 24Esta notícia pôs os sumos- sacerdotes e o comandante do templo numa grande perplexidade acerca dos Apóstolos, e perguntavam a si próprios o que poderia significar tudo aquilo. 25Veio, então, alguém comunicar-lhes: «Os homens que metestes na prisão estão agora no templo a ensinar o povo.» 26O comandante do templo dirigiu-se imediatamente para lá com os guardas e trouxe os Apóstolos, mas não à força, pois receavam ser apedrejados pelo povo.

    O episódio narrado no texto de hoje mostra que a palavra de Deus não pode ser aprisionada (cf. 2 Tm 2, 9). Os sacerdotes do templo estão preocupados, particularmente os saduceus que estão furiosos com a pregação da ressurreição. Temem perder influência junto do povo. Prendem os apóstolos. Mas o anjo do Senhor liberta-os (cf. Sl 34, 8) para que possam voltar ao templo e pregar a «Palavra da Vida» (v. 20).
    Deus protege os anunciadores do Evangelho. Nada nem ninguém se pode opor ao projecto de Deus. A narrativa está cheia de ironia: Deus ri-se dos seus adversários, de acordo com o Salmo 2, citado na oração comunitária dos crentes.
    Deus prega uma partida aos sacerdotes e seus sequazes, reunidos com toda a sua força, para se oporem ao projecto divino. Tudo está sob controlo deles, mas os apóstolos escapam da prisão e continuam a pregar a Ressurreição de Jesus. Deus parece divertir-se, fintando os seus adversários. Quem pode resistir-lhe?

    Evangelho: João 3, 16-21

    16Tanto amou Deus o mundo, que lhe entregou o seu Filho Unigénito, a fim de que todo o que nele crê não se perca, mas tenha a vida eterna. 17De facto, Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele. 18Quem nele crê não é condenado, mas quem não crê já está condenado, por não crer no Filho Unigénito de Deus. 19E a condenação está nisto: a Luz veio ao mundo, e os homens preferiram as trevas à Luz, porque as suas obras eram más. 20De facto, quem pratica o mal odeia a Luz e não se aproxima da Luz para que as suas acções não sejam desmascaradas. 21Mas quem pratica a verdade aproxima-se da Luz, de modo a tornar-se claro que os seus actos são feitos segundo Deus.»

    A revelação, iniciada no encontro com Nicodemos, continua a desenvolver-se e chega à fonte da vida, o amor do Pai que dá o seu Filho para destruir o pecado e a morte. Entrevemos neste texto duas categorias joânicas clássicas: o amor e o juízo. Nos vv. 16s encontramos uma ideia cara a João: o carácter universal da obra salvadora de Cristo, que tem a sua origem na iniciativa misteriosa do amor de Deus pelos homens. O envio e a missão do Filho são a maior manifestação de um Deus que
    «é amor» (cf. 1 Jo 4, 8-10). A opção fundamental do homem consiste em aceitar ou
    rejeitar o amor de um Pai que se revelou em Cristo. Mas este amor não julga o mundo: ilumina-o (v. 17).
    Colocados perante a revelação do amor de Deus, há que tomar posição:
    acreditar em Jesus ou recusá-l´O. Quem acreditar em Jesus não será condenado; mas quem O rejeitar, e não acreditar no seu nome, já está condenado (v. 18). A causa da condenação é uma só: a incredulidade, a recusa da palavra de Jesus. No fim deste colóquio de Jesus com Nicodemos, e com cada um de nós, nada mais resta do que acolher o convite à conversão e a uma mudança radical de vida. Quem aceita Jesus, e dá espaço a um amor que nos transcende, encontra o que ninguém pode alcançar por si mesmo: a verdadeira vida.

    Meditatio

    Deus faz maravilhas pelos arautos da Boa Nova porque difundem a palavra de vida. Não os preserva da prisão, mas liberta-os, mais ou menos rapidamente. As vezes, a fraqueza da Palavra dura uma noite, outras vezes dura anos. Mas a Palavra acaba por vencer e por avançar irresistível até aos confins do mundo. Basta pensar no que se passou nos primeiros três séculos da vida da Igreja, até ao édito de Milão. Basta pensar no que se passou nos países da ex-União Soviética. Há tantas formas de prisão e de libertação! Mas Jesus acompanha o caminho da sua Palavra e, de vários modos, está presente aos seus mensageiros, acampando junto deles para os libertar das coacções externas e internas. A figura deste mundo passa. Mas a Palavra de Deus permanece.
    «Tanto amou Deus o mundo, que lhe entregou o seu Filho Unigénito, a fim de que todo o que nele crê não se perca, mas tenha a vida eterna» (Jo 3, 16).
    A ressurreição de Jesus ajuda-nos a verificar esta intenção de Deus. Se Jesus
    não tivesse ressuscitado, tudo permaneceria obscuro, porque o pecado dos homens levaria aparentemente a melhor, e o juízo de Deus cairia inexorável sobre esse pecado, que afastaria definitivamente o Filho do mundo. Jesus teria feito o possível para nos salvar, mas a malícia humana teria levado a melhor. A terra permaneceria nas sombras da morte.
    Mas Deus revela a sua intenção de amor ressuscitando o seu Filho, revelando assim que não quer o juízo, mas a salvação, a vida. A ressurreição manifesta a misericórdia de Deus para connosco e dá-nos uma esperança nova, que jamais há-de perecer, tal como Cristo ressuscitado e glorioso. O pecado está vencido, ultrapassado. Para além do pecado do homem, há uma vida nova que Deus nos oferece.
    «Cristo amou-nos e entregou-se a Deus por nós como oferta e sacrifício de agradável odor» (Ef 5, 2). Para nos remir do pecado, Cristo fez a oblação de si mesmo, que culminou na Cruz. O Pai aceitou a oblação do Filho e ressuscitou-O. Mas, na origem da oblação de Cristo está o próprio Pai que: «amou tanto o mundo que lhe deu o Seu Filho unigénito... não... para julgar o mundo, ma
    s para que o mundo seja salvo por meio d´Ele. Quem acredita n´Ele não é condenado..." (Jo 3, 16-18). S. João repete a mesma ideia na sua Primeira Carta: o Pai enviou o Seu Filho, Cristo Jesus, como "vítima de expiação pelos nossos pecados; não só pelos nossos pecados, mas também pelos de todo o mundo" (cf. 1 Jo 2, 2). S. Paulo acrescenta: "Foi

    Deus... que reconciliou o mundo Consigo em Cristo, não imputando aos homens o seus pecados..." (2 Cor 5, 19).

    Oratio

    Senhor, vejo que, quando queres alguma coisa, nada Te detém. Por isso, quando a tua palavra parece encarcerada, quando os teus apóstolos parecem prisioneiros, não devo perder a confiança no teu poder. Essa é, hoje, uma tentação grande e perigosa para todos nós, os teus discípulos. Diante das forças dos que se opõem à tua palavra, facilmente nos inquietamos, nos assustamos, nos deprimimos, nos arrependemos. Dá-nos a certeza de que, também hoje, estás com os teus mensageiros e os assistes, que o nosso dever é anunciar, e não ver o sucesso do anúncio. Esse sucesso é apenas para Ti, quando quiseres abrir a porta dos corações, quando quiseres preparar um novo povo, quando decidires que a tua Palavra deve retomar a corrida pelo mundo, o mundo geográfico e o mundo dos corações. Creio em Ti, Senhor, e na força do teu Espírito. Amen.

    Contemplatio

    Como Deus nos ama! Os pagãos tinham feito, do amor profano, um deus, que lançava as suas flechas sobre os corações dos homens. Era uma profanação. O nosso Deus é que é amor: Deus charitas est. É Deus e o seu Filho Jesus que lançam setas nos nossos corações para os ferirem de amor. - O Salvador não diz de si mesmo:
    «Deus colocou-me como sua seta eleita, posuit me sicut sagittam electam (Is 49, 2). E que seta, senão uma seta de amor?
    Jesus é a seta de amor saída da aljava de seu Pai. «Deus amou de tal modo o
    mundo, diz S. João, que lhe deu o seu Filho único» (Jo 3).
    A misericórdia de Deus pressionava-o para encontrar o meio de nos salvar, parecia ter saudades da nossa amizade. Não disse Ele: «Tenho as minhas delícias na amizade dos filhos dos homens» (Prov. 9).
    Era como o pai do filho pródigo, que vai ao encontro do culpado; ou como são
    um pai e uma mãe que perderam o seu filho bem-amado.
    A Santíssima Trindade escolheu a incarnação como o meio de recuperar o nosso coração. Ela lançou uma seta de amor, o menino de Belém» (Leão Dehon, OSP
    3, p. 26).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Cristo amou-nos e entregou-se por nós» (Ef 5, 2).

  • 2ª Semana - Quinta-feira - Páscoa

    2ª Semana - Quinta-feira - Páscoa

    11 de Abril, 2024

    2ª Semana - Quinta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 5, 27-33

    Naqueles dias, os guardas trouxeram os apóstolos e levaram-nos à presença do Sinédrio. O Sumo-sacerdote, interrogando-os, 28disse: «Proibimo-vos formalmente de ensinardes nesse nome, mas vós enchestes Jerusalém com a vossa doutrina e quereis fazer recair sobre nós o sangue desse homem.» 29Mas Pedro e os Apóstolos responderam: «Importa mais obedecer a Deus do que aos homens. 30O Deus dos nossos pais ressuscitou Jesus, a quem matastes, suspendendo-o num madeiro. 31Foi a Ele que Deus elevou, com a sua direita, como Príncipe e Salvador, a fim de conceder a Israel o arrependimento e a remissão dos pecados. 32E nós somos testemunhas destas coisas, juntamente com o Espírito Santo, que Deus tem concedido àqueles que lhe obedecem.» 33Enraivecidos com tal linguagem, pensaram a sério em matá-los.

    Os apóstolos estavam presos às ordens do Sumo-sacerdote, incitado pela aristocracia sacerdotal, onde se destacavam os saduceus. Competia ao Sinédrio julgá- los. O Sumo-sacerdote acusava os apóstolos de dois crimes: desobediência às ordens que lhes foram dadas, uma vez que continuavam a ensinar «em nome de Jesus», e difamação, uma vez que acusavam os chefes do povo de serem os responsáveis pela morte de Jesus.
    Pedro responde com um breve discurso. Reafirma o dever de obedecer antes a Deus que aos homens, porque só quem se submete a Deus recebe o Espírito Santo. Depois, centra-se no essencial do Kerygma cristão: a morte e a ressurreição de Jesus. E fá-lo contrapondo o que fizeram os chefes dos judeus e o que fez Deus: «vós matastes» Jesus; «Deus ressuscitou» Jesus (cf. vv. 30-31). É um esquema habitual no livro dos Actos. Pela ressurreição, Deus constituiu «esse homem, Príncipe e Salvador» (v. 31). Jesus é «Príncipe» porque é o novo Moisés, que guia o povo para a libertação e salvação; é «Salvador» porque, pela sua morte, nos alcançou o arrependimento e a remissão dos pecados.
    A defesa de Pedro, e dos outros apóstolos, termina apresentando-se, a si e a eles, como testemunhas oculares do Evangelho que pregam. E o seu testemunho é garantido pelo Espírito Santo. Isto deixa enraivecidos os judeus, que pensam matar os apóstolos, tal como tinham feito com Jesus.

    Evangelho: João 3, 31-36

    Naquele tempo, disse Jesus a Nicodemos: 31Aquele que vem do Alto está acima de tudo. Quem é da terra à terra pertence e fala da terra. Aquele que vem do Céu está acima de tudo 32e dá testemunho daquilo que viu e ouviu, mas ninguém aceita o seu testemunho. 33Quem aceita o seu testemunho reconhece que Deus é verdadeiro;
    34pois aquele que Deus enviou transmite as palavras de Deus, porque dá o Espírito sem
    medida. 35O Pai ama o Filho e tudo põe na sua mão. 36Quem crê no Filho tem a vida eterna; quem se nega a crer no Filho não verá a vida, mas sobre ele pesa a ira de Deus.

    Na conclusão do capítulo terceiro do seu evangelho, João recolhe sucessivas palavras de Jesus caras à comunidade joânica. O evangelista utiliza categorias espaciais como «do Alto», «da terra», para nos apresentar Jesus como único revelador do Pai e a sua importância para a vida do homem. A insistência em descobrir a origem e a natureza do Revelador tem uma intenção existencial clara. Nenhuma palavra que proceda «da terra», por autorizada que seja, pode comparar- se com as palavras do Revelador, que vem «do Alto», que está acima de todos. Por isso, todo o discípulo é chamado a verificar a sua relação com Jesus e o modo como escuta a sua palavra. Cristo vem «do Alto», pertence ao mundo divino e é superior a qualquer homem. O homem, ainda que seja um grande profeta, como João Baptista,
    «vem da terra» e permanece um ser terreno e limitado. É verdade que alguns ainda se recusam a crer. Mas há um «resto», que vive de fé, e são os crentes que manifestam «que Deus é verdadeiro». A sua fé confirma que o agir de Cristo está em comunhão com o agir do Pai.
    Finalmente, Cristo não é só o Revelador da Palavra de Deus, mas é a própria Palavra, é «espírito e vida» (Jo 6, 63). É, não só Aquele que tudo recebe do Pai, mas também Aquele que transmite tudo quanto possui, especialmente o seu Espírito Santo.

    Meditatio

    O texto evangélico que hoje escutamos revela-nos a plenitude de graça que recebemos do Ressuscitado. Ele é para nós revelação do imenso amor com que Deus nos ama. Esse imenso amor, com todos os dons que compreende, é derramado em nós no baptismo. A vida cristã consiste em viver, cada vez em maior plenitude, a riqueza que recebemos ao ser baptizados: a graça santificante e justificante, que nos torna capazes de crer em Deus, esperar n´Ele e de O amar, pelas virtudes teologais; o poder de vivermos e agirmos sob a moção do Espírito Santo e os seus dons; a capacidade de crescer no bem, pelas virtudes morais. O nosso primeiro esforço há-de ser tomar consciência de todos esses dons do amor de Deus, e não tentar conquistá- los. São-nos oferecidos gratuitamente no baptismo.
    A nossa vida há-de ser permeada de gratidão para com Deus, tão generoso
    para connosco. Ter a certeza desse amor é atitude fundamental na vida cristã. Se, na vida natural, quase tudo se alcança à custa de esforço e lentamente, na vida da graça tudo nos é dado. Há apenas que acolher e viver os dons que Deus gratuitamente nos oferece.
    A primeira leitura fala-nos de um dom de que hoje se fala pouco e de que os cristãos nem sempre têm suficiente consciência: a remissão dos pecados. Mas, quem tem o sentido de Deus, quem adverte a importância decisiva de estar em comunhão com Ele, quem sente por experiência própria a tragédia de estar longe d´Ele, quem toma a sério que o definitivamente válido é a comunhão com Deus, sabe que a remissão dos pecados é algo decisivo na nossa vida. Todos somos pecadores. Todos precisamos de perdão. Jesus remiu-nos do pecado, isto é, restabeleceu a comunhão filial, amiga, pacificadora com Deus. É o princípio de todos os bens messiânicos. Sem esse fundamento, nada se pode construir. Longe de Deus, sentimo-nos afastados da nossa origem e do nosso fim. É por isso que S. Pedro anuncia o Senhor ressuscitado como Aquele que restabelece a amizade entre o angustiado coração humano e o ardente coração de Deus Pai.
    O grande obstáculo ao acolhimento do amor gratuito de Deus é o pecado. "O Padre Dehon é muito sensível ao pecado... conhece os males da sociedade..." e "reconhece na recusa do amor de Cristo a
    causa mais profunda desta miséria humana", afirmam as nossas Constituições (cf. n. 4). Também nós, Oblatos- Sacerdotes do Coração de Jesus, tal como o Pe. Dehon, devemos estar

    "comprometidos... para reparar o pecado e a falta de amor na Igreja e no mundo (Cst 7; Cf. n. 79), isto é, o não acolhimento do amor de Deus e a falta de correspondência a esse amor, oferecendo-nos ao Pai "em solidariedade" com Cristo... como uma oblação viva, santa e agradável (cf. Rom 12, 1)... em sacrifício de suave odor (Ef 5, 2)" (n. 22).

    Oratio

    Obrigado, Senhor, por todos os teus dons. Obrigado pela remissão dos meus pecados. Facilmente esqueço que fui perdoado por ti, não só uma, mas muitas vezes. Facilmente esqueço a alegria que me traz o teu perdão, a alegria que me traz sentir- me reconciliado Contigo.
    Ensina-me a falar da salvação como perdão dos pecados e comunhão Contigo.
    Que jamais esqueça o teu amor benevolente e misericordioso quando, a tremer por causa das minhas culpas, me apresento diante de Ti. Mostra-me, então, o teu rosto benigno de salvador e infunde em mim o teu Espírito para remissão dos pecados. Unido a Ti, meu divino Salvador, quero ser arauto do teu amor diante de todos os meus irmãos e irmãs, para que também eles acolham o dom da remissão dos pecados, que a todos ofereces. Amen.

    Contemplatio

    Comentando a palavra do Salvador, S. Pedro diz-nos: «Sede submissos, por amor de Deus, a toda a instituição humana, seja ao rei como soberano; seja aos governadores, como enviados por ele, para punir os maus e para recompensar os bons... Porque tal é a vontade de Deus, que, fazendo o bem, fechais a boca dos insensatos e dos ignorantes. Sois livres, mas como servos de Deus, e não para vos cobrirdes da liberdade como de um véu que favorece a licenciosidade.
    Honrai a todos: amai os vossos irmãos, temei a Deus, respeitai o rei. Servos,
    sede submissos aos vossos senhores com todo o temor, não somente àqueles que são bons e doces, mas ainda àqueles que são impertinentes. Porque é uma glória suportar mágoas e sofrer injustamente por motivo de consciência para com Deus. Que glória há, de facto, em suportar os castigos que mereceis pelas vossas faltas?
    Mas se tendes de sofrer quando fizestes o bem, e o suportastes com paciência, eis o que é grande diante de Deus» (1Pd 2, 13).
    S. Paulo também diz a Tito: «Adverti os irmãos para que sejam submissos aos príncipes e aos poderosos, que obedeçam à sua palavra, que estejam prontos para todas as boas obras».
    Mas assim como devemos deferência e submissão à autoridade legítima, quando actua dentro dos limites das suas atribuições, do mesmo modo devemos mostrar-nos firmes na nossa resistência, quando ela se vira contra Deus e pisa aos pés os direitos da consciência.
    Aos seus juízes que lhes proibiam de falarem no futuro no nome de Jesus,
    Pedro e João responderam: «Pronunciai vós mesmos, e dizei, perante Deus, se é justo obedecer-vos antes que a Deus. Não podemos calar o que vimos e escutámos».
    – E chamados a juízo uma segunda vez, dizem ainda: «É a Deus que é preciso obedecer antes que aos homens» (Act 4-5). S. Paulo adverte-nos também para que conservemos a nossa dignidade de cidadãos e para fazermos respeitar os nossos direitos: «Sou cidadão romano, diz, e apelo a César» (Act 22) (Leão Dehon, OSP 4, p.
    78s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Qj.Jem crê no Filho tem a vida eterna>> (Jo 3, 36 ).

  • 2ª Semana - Sexta-feira - Páscoa

    2ª Semana - Sexta-feira - Páscoa

    12 de Abril, 2024

    2ª Semana - Sexta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 5, 34-42

    Naqueles dias, 34ergueu-se, então, um homem no Sinédrio, um fariseu chamado Gamaliel, doutor da Lei, respeitado por todo o povo. Mandou sair os acusados por alguns momentos 35e, tomando a palavra, disse: «Homens de Israel, tende cuidado com o que ides fazer a esses homens! 36Nos últimos tempos, apareceu Teudas, que se dizia alguém e ao qual seguiram cerca de quatrocentos homens. Ele foi liquidado e todos os seus partidários foram destroçados e reduzidos a nada. 37Depois dele, apareceu também Judas, o galileu, nos dias do recenseamento, e arrastou o povo atrás dele. Morreu, igualmente, e todos os seus adeptos foram dispersos. 38E, agora, digo-vos: não vos metais com esses homens, deixai-os. Se o seu empreendimento é dos homens, esta obra acabará por si própria; 39mas, se vem de Deus, não conseguireis destruí-los, sem correrdes o risco de entrardes em guerra contra Deus.»
    Concordaram, então, com as suas palavras. 40Trouxeram novamente os Apóstolos e, depois de os mandarem açoitar, proibiram-lhes de falar no nome de Jesus e libertaram-nos. 41Quanto a eles, saíram da sala do Sinédrio cheios de alegria, por terem sido considerados dignos de sofrer vexames por causa do Nome de Jesus. 42E todos os dias, no templo e nas casas, não cessavam de ensinar e de anunciar a Boa-Nova de Jesus, o Messias.

    A defesa de Pedro tornou-se uma gravíssima acusação contra os seus acusadores. Por isso, quiseram matar os apóstolos. Mas, graças à intervenção de Gamaliel, impôs-se a moderação. Como fariseu bom e douto, Gamaliel via com simpatia o movimento cristão, que pregava a ressurreição e se apresentava-se como cumprimento das Escrituras. Seria arbitrário excluí-lo sem mais. Por isso, o melhor era esperar.
    Todo o falso movimento messiânico se desfaz por si mesmo: Gamaliel lembra Teudas e Judas. Judas, o galileu, é bem conhecido. Chefiou uma rebelião contra Roma, no ano 6-7 da nossa era. O seu movimento foi continuado pelos zelotas. Teudas era bem conhecido no tempo em que Lucas escreve. Mas a sua rebelião aconteceu trinta anos depois da intervenção de Gamaliel. Lucas prescinde dessa circunstância e usa-o como exemplo de movimentos messiânicos fracassados. Para Gamaliel, sucederá o mesmo ao movimento cristão, se for falso. Por isso, não é preciso opor-se a ele. O raciocínio de Gamaliel foi aceite pelo Sinédrio que, depois de açoitar os apóstolos, os pôs em liberdade, com a proibição de continuarem a falar daquele «nome».
    Os apóstolos interpretaram os seus sofrimentos como honrarias concedidas por Deus. Tinham-se realizado neles as perseguições anunciadas por Jesus (cf. Mt 10, 17; 23, 34); tinham sido objecto de uma das bem-aventuranças de Jesus (cf. Mt 5, 11- 12); tinham sido equiparados a Jesus (cf. Mc 15, 15; Jo 19, 1). Por isso, puseram-se a pregar, com novo ânimo, a Jesus como Messias.

    Evangelho: João 6, 1-15

    Naquele tempo, Jesus partiu para a outra margem do lago da Galileia, ou de Tiberíades. 2Seguia-o uma grande multidão, porque presenciavam os sinais miraculosos que realizava em favor dos doentes. 3Jesus subiu ao monte e sentou-se ali com os seus discípulos. 4Estava a aproximar-se a Páscoa, a festa dos judeus.
    5Erguendo o olhar e reparando que uma grande multidão viera ter com Ele, Jesus disse então a Filipe: «Onde havemos de comprar pão para esta gente comer?» 6Dizia isto para o pôr à prova, pois Ele bem sabia o que ia fazer.
    Filipe respondeu-lhe: 7«Duzentos denários de pão não chegam para cada um comer um bocadinho.» 8Disse-lhe um dos seus discípulos, André, irmão de Simão Pedro: 9«Há aqui um rapazito que tem cinco pães de cevada e dois peixes. Mas que é isso para tanta gente?» 10Jesus disse: «Fazei sentar as pessoas.»
    Ora, havia muita erva no local. Os homens sentaram-se, pois, em número de uns cinco mil. 11Então, Jesus tomou os pães e, tendo dado graças, distribuiu-os pelos que estavam sentados, tal como os peixes, e eles comeram quanto quiseram.
    12Quando se saciaram, disse aos seus discípulos: «Recolhei os pedaços que sobraram, para que nada se perca». 13Recolheram-nos, então, e encheram doze cestos de pedaços dos cinco pães de cevada que sobejaram aos que tinham estado a comer.
    14Aquela gente, ao ver o sinal milagroso que Jesus tinha feito, dizia: «Este é realmente o Profeta que devia vir ao mundo!» 15Por isso, Jesus, sabendo que viriam arrebatá-lo para o fazerem rei, retirou-se de novo, sozinho, para o monte.

    O milagre da multiplicação dos pães introduz simbolicamente o «Discurso sobre o pão da vida». Trata-se de um dos sinais realizados por Jesus para revelar a sua identidade. João apresenta Jesus como o novo Moisés, guia de um novo êxodo. A multiplicação dos pães também é sinal de um novo maná, a Eucaristia.
    Ao narrar este milagre, João tem uma clara intenção cristológica. Mostra que Jesus possui um conhecimento sobre-humano. De facto, quando Jesus pergunta a Filipe, como resolver a situação, João acrescenta que «Ele bem sabia o que ia fazer» (v. 6). Depois Jesus distribui pessoalmente o pão e os peixes, à discrição, pelos que estavam sentados (v. 11), mostrando segurança na sua missão e no modo como realizá-la. Finalmente, recusa ser rei (v. 15).
    Para João, Jesus é Aquele em quem se realiza o passado e se concretiza a esperança de Israel. O pão que está para dar ao povo aperfeiçoa e ultrapassa a páscoa hebraica e coloca o milagre sob o signo do banquete eucarístico cristão. Jesus fala ao povo de nova aliança com Deus e de vida eterna. Depois, alerta Filipe para as dificuldades do momento e, só depois, intervém para multiplicar o pão. Todos são saciados, e ainda sobejam doze cestos de pão.
    Com este sinal, Jesus apresenta-se como o Messias esperado e que é preciso acolher.

    Meditatio

    As palavras de Gamaliel são muitas vezes usadas como exemplo de um conselho sábio. É verdade que podem ter outro tipo de interpretações: atitude de quem deixa correr as coisas, de quem não está para se inquietar desnecessariamente, quiçá de uma mentalidade fatalista... Mas, quando são ditadas pelo espírito de fé em Deus que actua na história, as palavras de Gamaliel são certamente positivas.
    As palavras do doutor da Lei, lidas como um conselho sábio, podem ajudar-nos a recuperar o sentido de Deus, que está presente e actua nos pequenos e grandes acontecimentos da nossa vida e da nossa história comum. É Ele o verdadeiro

    protagonista de tudo. Nós não passamos de pequenos e pobres colaboradores seus. J&aacute
    ; é muito quando, com nossas intervenções, não estragamos os projectos de Deus.
    Os Evangelhos devem ser lidos à luz da Páscoa do Senhor. O que hoje escutamos contém uma profecia em acção daquilo que Jesus ressuscitado nos dá, o pão vivo, que é Ele mesmo. Quem acolhe a Cristo, quem acredita n´Ele, é saciado.
    Para João, este milagre está relacionado com a Eucaristia. «Estava a aproximar-se a Páscoa» - escreve o evangelista, que certamente pensava na morte de Jesus. No versículo 15, João é ainda mais claro, quando escreve: «sabendo que viriam arrebatá-lo para o fazerem rei, retirou-se de novo, sozinho, para o monte». Jesus foi condenado porque recusou satisfazer os sonhos políticos do povo. Não querendo ser rei dos judeus, foi por eles recusado.
    Jesus retirou-se «para o monte». Ao anotar este pormenor, o quarto evangelista pensa em Jesus elevado da terra para atrair a Si todos os homens. Esta elevação começa na cruz, mas continua na ressurreição e na ascensão, quando Jesus volta para o Pai. A multiplicação dos pães é figura realizada em Jesus, na sua paixão e ressurreição gloriosa.
    A própria pergunta feita por Jesus a Filipe tem resposta na paixão e ressurreição, quando Jesus, entregando o seu corpo por nós, e derramando o seu sangue por nós, compra o pão que alimenta as nossas almas.
    Tal como Jesus é o pão bom que Se oferece a nós para ser comido, também nós devemos ser pão bom para Ele e para os irmãos, devemos tornar-nos nós mesmos eucaristia do Senhor, para qualquer pessoa, em qualquer situação, praticando os frutos do Espírito (cf. Gal 5, 22), que são as próprias exigências da Eucaristia: amor, paz, alegria...
    Deste modo, a nossa vida, tal como a do Pe. Dehon, torna-se "uma missa permanente" (Cst. 5).

    Oratio

    Obrigado, Senhor, porque, pelo sacrifício de Ti mesmo, te tornaste nosso alimento. Acolhemos, emocionados e agradecidos, o dom que nos fazes. Cremos em Ti, mas aumenta a nossa fé, para que possamos ser alimentados do pão que és Tu, e entrarmos na comunhão divina que faz de nós uma unidade com todos aqueles que comem do mesmo pão, o pão vivo que dá a vida. Com a fé, dá-me também sabedoria, que me permita discernir o que devo deixar fazer a Ti e o que devo eu próprio procurar fazer. Dá-me humildade para aceitar o que Tu queres e secundar os teus projectos misteriosos, mas infalíveis. Amen.

    Contemplatio

    Podemos aplicar à devoção ao Sagrado Coração (de Jesus), como as aplicamos à Eucaristia, estas palavras do livro da Sabedoria: «Panem de coelo praestitisti eis omne delectamentum in se habentem (Vós lhes destes o pão do céu que tem todos os sabores). É um pão do céu que tem todos os sabores. Como o maná do deserto, como o maná eucarístico, esta devoção é um alimento celeste que tem todos os gostos, todos os sabores espirituais e que se adapta maravilhosamente a todas as almas, quaisquer que sejam as suas necessidades, a sua condição, a sua atracção particular.
    A devoção ao Sagrado Coração reporta-se a todos os mistérios e a todos os estados de Nosso Senhor. Ela dá a explicação de tudo apenas com esta palavra: Amor.

    Como os fiéis encontram nesta devoção todos os motivos de confiança e todos os encorajamentos para a virtude, os sacerdotes hão-de nela encontrar o ideal da vida sacerdotal e o modelo do qual devem aproximar-se (Leão Dehon, OSP 2, p. 521).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Este é realmente o Profeta que devia vir ao mundo!» (Jo 6, 14).

  • 2ª Semana - Sábado - Páscoa

    2ª Semana - Sábado - Páscoa

    13 de Abril, 2024

    2ª Semana - Sábado

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 6, 1-7

    Naqueles dias, como o número de discípulos ia aumentando, houve queixas dos helenistas contra os hebreus, porque as suas viúvas eram esquecidas no serviço diário. 2Os Doze convocaram, então, a assembleia dos discípulos e disseram: «Não convém deixarmos a palavra de Deus, para servirmos às mesas. 3Irmãos, é melhor procurardes entre vós sete homens de boa reputação, cheios do Espírito e de sabedoria; confiar-lhes-emos essa tarefa. 4Quanto a nós, entregar-nos-emos assiduamente à oração e ao serviço da Palavra.» 5A proposta agradou a toda a assembleia e escolheram Estêvão, homem cheio de fé e do Espírito Santo, Filipe, Prócuro, Nicanor, Timão, Parmenas e Nicolau, prosélito de Antioquia. 6Foram apresentados aos Apóstolos que, depois de orarem, lhes impuseram as mãos. 7A palavra de Deus ia-se espalhando cada vez mais; o número dos discípulos aumentava consideravelmente em Jerusalém, e grande número de sacerdotes obedeciam à Fé.

    A realidade da primitiva Igreja era mais complexa do que, à primeira vista, deixam perceber os resumos idealizados de Lucas. A primeira comunidade integrava grupos de crentes de diferentes culturas, com mentalidades e posições sociais diferentes. As queixas dos helenistas contra os hebreus (v. 1) são um claro exemplo das dificuldades e tensões que havia. Os apóstolos reflectem e tomam decisões. Trata-se, em primeiro lugar, de um problema económico. As viúvas de homens da diáspora, que tinham vindo passar a Jerusalém os seus últimos dias, estavam sem apoio familiar. Para prestar este apoio, surge um novo ministério na Igreja, o dos diáconos. A eleição dos sete «homens de boa reputação» é feita pela comunidade. Os apóstolos confiam-lhes o ministério pela imposição das mãos, gesto que simboliza a comunicação do Espírito, e a associação e participação dos sete eleitos no seu próprio ofício apostólico. De facto, os diáconos não só cuidarão do serviço das mesas, mas também se vão dedicar à pregação. Serão os casos de Estêvão e de Filipe (cf. Act 6, 8dd; 8, 26ss.)

    Evangelho: João 6, 16-21

    Ao cair da tarde, os seus discípulos desceram até ao lago 17e, subindo para um barco, foram atravessando o lago em direcção a Cafarnaúm. 18Já tinha escurecido e Jesus ainda não fora ter com eles. Soprando uma forte ventania, o lago começou a agitar-se. 19Depois de terem remado mais ou menos uma légua, avistaram Jesus que se aproximava do barco, caminhando sobre o lago, e tiveram medo. 20Mas Ele disse-lhes:
    «Sou Eu, não tenhais medo!» 21Quiseram recebê-lo logo no barco, e o barco chegou imediatamente à terra para onde iam.

    A cena evangélica que hoje escutamos é narrada pelos Sinópticos e por João. Mas, enquanto em Mateus, Marcos e Lucas nos aparece estreitamente relacionada com a multiplicação dos pães, no quarto evangelho está apenas justaposta à narrativa desse milagre do Senhor.

    Os discípulos estão na barca, ao cair da noite. Tinham remado com esforço e lutado contra as dificuldades do momento, quando viram Jesus caminhar sobre as águas, e se encheram de medo. O encontro com o Mestre fá-los ultrapassar a angústia. As suas palavras «Sou Eu, não tenhais medo» dão-lhes confiança e serenidade, porque reconhecem em Jesus a presença poderosa e salvífica de Deus. O seu Mestre não é apenas o Messias que lhes mata a fome, mas é uma pessoa divina que vai ao seu encontro com amor. Ao reconhecerem a identidade de Jesus, os discípulos chegam «à terra para onde iam». Jesus é o lugar da presença de Deus no meio dos homens. O seu rosto humano esconde o seu mistério e a sua identidade. Mas quem sabe ler na pessoa de Jesus a manifestação de um Deus que ama, torna-se seu discípulo e permanece unido a Ele, apesar da aura inacessível que envolve a sua pessoa. As cenas da multiplicação dos pães e da caminhada sobre as águas tornam-se epifania de Cristo para os seus discípulos.

    Meditatio

    O texto da primeira leitura parece ofuscar os quadros idílicos da primitiva comunidade, que encontramos em vários resumos dos Actos. Mas, Lucas é realista: mesmo nas comunidades mais perfeitas, não faltam problemas e tensões. O que é preciso é enfrentá-los comunitariamente, para que não bloqueiem a comunidade e não atrapalhem a difusão do Evangelho. É o que fazem os Apóstolos, dando exemplo de flexibilidade e de sábia orientação da comunidade. Oxalá sempre se tivesse actuado assim ao longo da história da Igreja, e se possa actuar do mesmo modo no presente e no futuro!
    O episódio evangélico descrito por João é mais um dos que preparavam os discípulos para o mistério da morte e da ressurreição de Jesus. Ao caminhar sobre o mar, Jesus prefigura a sua travessia vitoriosa através da morte, muitas vezes comparada, na Sagrada Escritura, ao mar: «Cercavam-me as ondas da morte, assustavam-me as torrentes destruidoras, os laços do abismo me comprimiam (2 Sm 22, 5); «Cercaram- me as ondas da morte e as vagas destruidoras encheram-me de terror; envolveram- me os laços do Abismo» (Sl 18, 5). «Soprando uma forte ventania, o lago começou a agitar-se» (v. 18). Estas palavras prefiguram a paixão, a terrível tempestade que dispersará os discípulos. Mas Jesus, caminhando serenamente sobre o mar, dirige-se para a barca. Os discípulos assustam-se, como na paixão e mesmo no momento da ressurreição. Mas Jesus apresenta-se e diz-lhe: «Sou Eu, não tenhais medo!» (v. 20). Depois da paixão, Jesus ressuscitado também se apresenta aos discípulos dizendo:
    «Sou eu!... A paz esteja convosco; não temais».
    João diz-nos que, tendo reconhecido Jesus, «Quiseram recebê-lo logo no barco, e o barco chegou imediatamente à terra para onde iam» (v. 20). Quando se aceita Jesus no seu mistério de morte e de ressurreição, chegamos à outra margem: encontramos a luz e a paz de Deus.
    Como "Oblatos-Sacerdotes do Coração de Jesus" (Cst. 6) somos chamados a ser "profetas do amor e... servidores da reconciliação" (Cst. 7); "Na comunhão, mesmo para além dos conflitos, e no perdão recíproco quereríamos mostrar que a fraternidade por que os homens anseiam é possível em Jesus Cristo, e dela quereríamos ser fiéis servidores" (Cst. 65). Não devemos, por isso, deixar-nos bloquear pelas dificuldades do diálogo comunitário. É preciso ter coragem para começar, força e humildade para
    perseverar, como pobres, como pequenos segundo o Evangelho: "Sede alegres na esperança, fortes na tribulação, perseverantes na oração" (Rom 12, 12; cf. 1 Jo 4, 16).

    Oratio

    Senhor, quero hoje falar-te da minha comunidade, das tensões que por vezes surgem e da dificuldade em compô-las. Quando me sinto menos bem tratado por quem detém a autoridade, facilmente me impaciento e revolto; mas quando me pertence mandar, também facilmente considero como insatisfeitos e rebeldes aqueles que me criticam.
    Dá-me, Senhor, a sabedoria dos Doze, que escutam e sabem envolver toda a comunidade na solução das dificuldades e tensões. Dá às nossas comunidades capacidade de escuta e de participação. Dá-nos a todos criatividade suficiente para enfrentar e resolver com serenidade as normais dificuldades da vida comum. Que, no meio das tempestades, jamais esqueçamos que Tu estás presente junto daqueles que estão reunidos em teu nome. Amen.

    Contemplatio

    (O Coração de Jesus) é, primeiro, um lugar de refúgio e de segurança contra os inimigos da salvação. «É preciso retirar-nos, diz Margarida Maria, para a chaga do Sagrado Coração, como um pobre viajante que procura um porto seguro onde se colocar ao abrigo dos escolhos e das tempestades do mar agitado do mundo, onde estamos expostos a um contínuo naufrágio. - O Coração adorável é um adorável retiro onde vivemos ao abrigo de todas as tormentas. - É como um forte inexpugnável contra os assaltos do inimigo. - É a fonte das graças divinas. A graça do divino amor, qual é fonte de donde brota? Qual é o canal que a faz chegar até nós? Rezai ao Coração adorável do Salvador, que depois de ter sido um sol divino sempre brilhante e a aquecer, fazendo crescer todas as virtudes, e dissipando as trevas os nevoeiros, seja para vós uma fonte de água viva. - Considerai este Sagrado Coração no meio do vosso coração, como a fonte das águas vivas, para regar o jardim da vossa alma, onde as flores das virtudes estão todas murchas. Restituir-lhes-á a sua beleza natural, a fim de que a vossa alma se torne o jardim das suas delícias. - É uma fonte que tem prazer em derramar-se com abundância em favor dos seus amigos. - É a fonte inesgotável de tudo aquilo de que temos necessidade; fonte donde quanto mais se toma mais há a tomar, mais é abundante. Vamos buscar a esta fonte virtudes para a contemplação do Coração de Jesus em todos os mistérios da sua vida (Leão Dehon, OSP 4, p. 334s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Sou Eu, não tenhais medo!» (Jo 6, 20).

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