Week of Out 30th

  • 31º Domingo do Tempo Comum - Ano C

    31º Domingo do Tempo Comum - Ano C


    30 de Outubro, 2022

    ANO C

    31º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    Tema do 31º Domingo do Tempo Comum

    A liturgia deste domingo convida-nos a contemplar o quadro do amor de Deus. Apresenta-nos um Deus que ama todos os seus filhos sem excluir ninguém, nem sequer os pecadores, os maus, os marginais, os "impuros"; e mostra como só o amor é transformador e revivificador.
    Na primeira leitura um "sábio" de Israel explica a "moderação" com que Deus tratou os opressores egípcios. Essa moderação explica-se por uma lógica de amor: esse Deus omnipotente, que criou tudo, ama com amor de Pai cada ser que saiu das suas mãos - mesmo os opressores, mesmo os egípcios - porque todos são seus filhos.
    O Evangelho apresenta a história de um homem pecador, marginalizado e desprezado pelos seus concidadãos, que se encontrou com Jesus e descobriu n'Ele o rosto do Deus que ama... Convidado a sentar-se à mesa do "Reino", esse homem egoísta e mau deixou-se transformar pelo amor de Deus e tornou-se um homem generoso, capaz de partilhar os seus bens e de se comover com a sorte dos pobres.
    A segunda leitura faz referência ao amor de Deus, pondo em relevo o seu papel na salvação do homem (é d'Ele que parte o chamamento inicial à salvação; Ele acompanha com amor a caminhada diária do homem; Ele dá-lhe, no final da caminhada, a vida plena)... Além disso, avisa os crentes para que não se deixem manipular por fantasias de fanáticos que aparecem, por vezes, a perturbar o caminho normal do cristão.

    LEITURA I - Sab 11,22-12,2

    Leitura do Livro da Sabedoria

    Diante de Vós, Senhor, o mundo inteiro
    é como um grão de areia na balança,
    como a gota de orvalho que de manhã cai sobre a terra.
    De todos Vós compadeceis, porque sois omnipotente,
    e não olhais para os seus pecados,
    para que se arrependam.
    Vós amais tudo o que existe
    e não odiais nada do que fizestes;
    porque, se odiásseis alguma coisa,
    não a teríeis criado.
    e como poderia subsistir,
    se Vós não a quisésseis?
    Como poderia durar,
    se não a tivésseis chamado à existência?
    Mas a todos perdoais,
    porque tudo é vosso, Senhor, que amais a vida.
    O vosso espírito incorruptível está em todas as coisas.
    Por isso castigais brandamente aqueles que caem
    e advertis os que pecam, recordando-lhes os seus pecados,
    para que se afastem do mal
    e acreditem em Vós, Senhor.

    AMBIENTE

    O "Livro da Sabedoria" é o mais recente de todos os livros do Antigo Testamento (aparece durante a primeira metade do séc. I a.C.). O seu autor - um judeu de língua grega, provavelmente nascido e educado na Diáspora (Alexandria?) - exprimindo-se em termos e concepções do mundo helénico, faz o elogio da "sabedoria" israelita, traça o quadro da sorte que espera o justo e o ímpio no mais-além e descreve (com exemplos tirados da história do Êxodo) as sortes diversas que tiveram os egípcios (idólatras) e o hebreus (fiéis a Jahwéh). O seu objectivo é duplo: dirigindo-se aos seus compatriotas judeus (mergulhados no paganismo, na idolatria, na imoralidade), convida-os a redescobrirem a fé dos pais e os valores judaicos; dirigindo-se aos pagãos, convida-os a constatar o absurdo da idolatria e a aderir a Jahwéh, o verdadeiro e único Deus... Para uns e para outros, só Jahwéh garante a verdadeira "sabedoria", a verdadeira felicidade.
    O texto que nos é proposto pertence à terceira parte do livro (cf. Sab 10,1-19,22). Nessa parte, recorrendo, sobretudo, à técnica do midrash, o autor faz a comparação entre os castigos que Deus lançou contra aos "ímpios" (os pagãos) e a salvação reservada aos "justos" (o Povo de Deus).
    Depois de descrever como a "sabedoria" de Deus que se manifestou na história de Israel (cf. Sab 10,1-11,14), o autor faz referência ao pecado dos egípcios, que rendiam culto "a répteis irracionais e a bichos miseráveis" (Sab 11,15); e manifesta o seu espanto de que o castigo de Deus sobre os egípcios tenha sido tão moderado e benevolente (cf. Sab 11,17-20). Porque é que Deus foi tão moderado e não exterminou totalmente os egípcios? É a essa questão que o nosso texto responde.

    MENSAGEM

    Fundamentalmente, o autor encontra três razões para justificar a moderação e a benevolência de Deus.
    A primeira tem a ver com a grandeza e a omnipotência de Deus (cf. Sab 11,22). Quem é grande e poderoso, não se sente incomodado e posto em causa pelos actos daqueles que são pequenos e finitos... Ele vê as coisas com suficiente distância, percebe as razões do agir do homem, não perde o "fair play"; daí resulta a tolerância e a misericórdia.
    A segunda vem dessa lógica que caracteriza sempre a atitude de Deus em relação ao homem: a lógica do perdão (cf. Sab 11,23). Ele não quer a morte do pecador, mas que este se converta e viva; por isso, "fecha os olhos" diante do pecado do homem, a fim de o convidar ao arrependimento... Repare-se, no entanto, que esta lógica não se exerce aqui sobre o Povo de Deus, mas sobre um império pagão e opressor: é a universalidade da salvação que aqui é sugerida.
    A terceira tem a ver com o amor de Deus (cf. Sab 11,24-26), que se derrama sobre todas as criaturas. A criação foi a obra de amor de um pai; e esse pai ama todos os seus filhos. Ele é o Senhor que "ama a vida".
    É porque todos os homens levam dentro de si esse "sopro de vida" que Deus infundiu sobre a criação, que Ele se preocupa, corrige, admoesta, perdoa as faltas, faz que se afastem do mal e estabeleçam comunhão com Ele (cf. Sab 12,1-2).

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pode fazer-se a partir dos seguintes elementos:

    • O Deus que este texto apresenta é uma figura benevolente e tolerante, cheia de bondade e misericórdia, que não quer a destruição do pecador, mas a sua conversão e que ama todos os homens que criou, mesmo aqueles que praticam acções erradas. Ora, todos nós conhecemos bem este quadro de Deus, pois ele aparece-nos a par e passo... Mas já o interiorizámos suficientemente?

    • Interiorizar esta "fotografia" de Deus significa "empapar-nos" da lógica do amor e da misericórdia e deixar que ela transpareça em gestos para com os nossos irmãos. Isso acontece, realmente? Qual é a nossa atitude para com aqueles que nos fizeram mal, ou cujos comportamentos nos desafiam e incomodam?

    • Muitas vezes, percebemos certos males que nos incomodam como "castigos" de Deus pelo nosso mau proceder. No entanto, este texto deixa claro que Deus não está interessado em castigar os pecadores... Quando muito, procura fazer-nos perceber - com a pedagogia de um pai cheio de amor - o sem sentido de certas opções e o mal que nos
    fazem certos caminhos que escolhemos.

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 144(145)

    Refrão: Louvarei para sempre o vosso nome,
    Senhor meu Deus e meu Rei.

    Quero exaltar-Vos meu Deus e meu Rei
    e bendizer o vosso nome para sempre.
    Quero bendizer-vos, dia após dia,
    e louvar o vosso nome para sempre.

    O Senhor é clemente e compassivo,
    paciente e cheio de bondade.
    O Senhor é bom para com todos
    e a sua misericórdia se estende a todas as criaturas.

    Graças Vos dêem, Senhor, todas as criaturas
    e bendigam-Vos os vossos fiéis.
    Proclamem a glória do vosso Reino
    e anunciem os vossos feitos gloriosos.

    O Senhor é fiel à sua palavra
    e perfeito em todas as suas obras.
    O Senhor ampara os que vacilam
    e levanta todos os oprimidos.

    LEITURA II - 2 Tes 1,11-2,2

    Leitura da Segunda Epístola do apóstolo São Paulo aos Tessalonicenses

    Irmãos:
    Oramos continuamente por vós,
    para que Deus vos considere dignos do seu chamamento
    e, pelo seu poder,
    se realizem todos os vosso bons propósitos
    e se confirme o trabalho da vossa fé.
    Assim o nome de Nosso Senhor Jesus Cristo
    será glorificado em vós, e vós n'Ele,
    segundo a graça do nosso Deus e do Senhor Jesus Cristo.
    Nós vos pedimos, irmãos,
    a propósito da vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo
    e do nosso encontro com Ele:
    Não vos deixeis abalar facilmente nem alarmar
    por qualquer manifestação profética,
    por palavras ou por cartas,
    que se digam vir de nós,
    pretendendo que o dia do Senhor está iminente.

    AMBIENTE

    Forçado a deixar Filipos, Paulo chegou a Tessalónica pelo ano 50. Segundo o seu costume, pregou primeiro aos judeus na sinagoga, obtendo algum sucesso; mas os judeus - incomodados pelo testemunho de Paulo - sublevaram a multidão e o apóstolo teve de abandonar, à pressa, a cidade. De lá, dirigiu-se para Bereia, Atenas e, depois, Corinto.
    Em Tessalónica ficou uma comunidade entusiasta e fervorosa, constituída na sua maioria por pagãos convertidos... Mas Paulo estava inquieto, pois chegaram-lhe notícias da hostilidade dos judeus para com os cristãos de Tessalónica; e essa comunidade, ainda insuficientemente catequizada, com uma fé muito "verde", corria riscos. Paulo enviou Timóteo a Tessalónica, para saber notícias e encorajar os cristãos... Quando Timóteo voltou, Paulo estava em Corinto. As notícias eram boas: os tessalonicenses continuavam a viver com entusiasmo a fé e a dar testemunho de Jesus. Havia, apenas, algumas questões de doutrina que os preocupavam - nomeadamente a questão da segunda vinda do Senhor. Paulo decidiu-se, então, a escrever aos cristãos de Tessalónica, animando-os a viverem na fidelidade ao Evangelho e esclarecendo-os quanto à doutrina sobre o "dia do Senhor". Estamos no ano 51.
    Embora não haja qualquer dúvida de que a Primeira Carta aos Tessalonicenses provém de Paulo, há quem ponha em causa a autoria paulina da Segunda Carta aos Tessalonicenses. De qualquer forma, a Segunda Carta aos Tessalonicenses é considerada pela Igreja um texto inspirado que deve, portanto, ser visto como Palavra de Deus.

    MENSAGEM

    O texto que nos é proposto apresenta dois temas. O primeiro (cf. 2 Tess 1,11-12) expõe uma súplica de Paulo, para que os tessalonicenses sejam cada vez mais dignos do chamamento que Deus lhes fez; o segundo (cf. 2 Tess 2,1-2) refere-se à vinda do Senhor.
    A primeira parte põe em relevo o papel de protagonista que Deus desempenha na salvação do homem. Não basta a boa vontade e os bons propósitos do homem; é preciso que Deus acompanhe os esforços do crente e lhe dê a força de percorrer até ao fim o caminho do Evangelho. De resto, tudo é dom de Deus que chama, que anima e que leva o homem para a meta.
    A segunda parte é o início da doutrina sobre o "dia do Senhor". A intenção fundamental de Paulo é denunciar e desautorizar alguns fanáticos e fantasistas que, invocando visões ou mesmo cartas pretensamente escritas por Paulo, anunciavam a iminência do fim do mundo... Isto estava a provocar perturbações na comunidade, porque alguns - alvoroçados pela proximidade da segunda vinda de Jesus - demitiam-se das suas responsabilidades e esperavam ociosamente o acontecimento.

    ACTUALIZAÇÃO

    Considerar, para a reflexão pessoal e comunitária, as seguintes linhas:

    • No nosso caminho pessoal ou comunitário, rumo à salvação, Deus está sempre no princípio, no meio e no fim. É preciso reconhecer que é Ele quem está por detrás do chamamento que nos foi feito, que é Ele quem anima e dá forças ao longo da caminhada, que é Ele quem nos espera no final do caminho, para nos dar a vida plena. Tenho consciência desta centralidade de Deus? Tenho consciência de que a salvação não é uma conquista minha, mas um dom de Deus?

    • Ao longo do caminho, é preciso estar atento para saber discernir o certo do errado, o verdadeiro do falso, o que é um desafio de Deus e o que é o fanatismo ou a fantasia de algum irmão perturbado ou em busca de protagonismo. O caminho para discernir o certo do errado está na Palavra de Deus e numa vida de comunhão e de intimidade com Deus.

    ALELUIA - Jo 3,16

    Aleluia. Aleluia.

    Deus amou tanto o mundo que lhe deu o seu Filho unigénito;
    quem acredita nele tem a vida eterna.

    EVANGELHO - Lc 19,1-10

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas

    Naquele tempo,
    Jesus entrou em Jericó e começou a atravessar a cidade.
    Vivia ali um homem rico chamado Zaqueu,
    que era chefe de publicanos.
    Procurava ver quem era Jesus,
    mas, devido à multidão, não podia vê-l'O,
    porque era de pequena estatura.
    Então correu mais à frente e subiu a um sicómoro,
    para ver Jesus,
    que havia de passar por ali.
    Quando Jesus chegou ao local,
    olhou para cima e disse-lhe:
    «Zaqueu, desce depressa,
    que Eu hoje devo ficar em tua casa».
    Ele desceu rapidamente
    e recebeu Jesus com alegria.
    Ao verem isto, todos murmuravam, dizendo:
    «Foi hospedar-Se em cada dum pecador».
    Entretanto, Zaqueu apresentou-se ao Senhor, dizendo:
    «Senhor, vou dar aos pobres metade dos meus bens
    e, se causei qualquer prejuízo a alguém,
    restituirei quatro vezes mais».
    Disse-lhe Jesus:
    «Hoje entrou a salvação nesta casa,
    porque Zaqueu também é filho de Abraão.
    Com efeito, o Filho do homem veio procurar e salvar
    o que estava perdido».

    AMBIENTE

    O episódio de hoje coloca-nos em Jericó, o oásis situado nas margens do mar Morto, a cerca de 34 quilómetros de Jerusalém. Era a última etapa dos peregrinos que, da Pereia e da Galileia, se dirigiam a Jerusalém para celebrar as grandes festividades do culto judaico (o que indica que o "caminho de Jerusalém", que temos vindo a percorrer sob
    a condução de Lucas, está a chegar ao fim).
    No tempo de Jesus, é uma cidade próspera (sobretudo devido à produção de bálsamo), dotada de grandes e belos jardins e palácios (por acção de Herodes, o Grande, que fez de Jericó a sua residência de inverno). Situada num lugar privilegiado de uma importante rota comercial, era um lugar de oportunidades, que devia proporcionar negócios chorudos (e também várias possibilidades de negócios "duvidosos").
    O personagem que se defronta com Jesus é, mais uma vez, um publicano (neste caso, um "chefe dos publicanos"). O nosso herói é, portanto, um homem que o judaísmo oficial considerava um pecador público, um explorador dos pobres, um colaboracionista ao serviço dos opressores romanos e, portanto, um excluído da comunidade da salvação.

    MENSAGEM

    Voltamos aqui a um dos temas predilectos de Lucas: Jesus é o Deus que veio ao encontro dos homens e Se fez pessoa para trazer, em gestos concretos, a libertação a todos os homens - nomeadamente aos marginalizados e excluídos, colocados pela doutrina oficial à margem da salvação.
    Zaqueu (é o nome do publicano em causa) era, naturalmente, um homem que colaborava com os opressores romanos e que se servia do seu cargo para enriquecer de forma imoral (exigindo impostos muito acima do que tinha sido fixado pelos romanos e guardando para si a diferença, como aliás era prática corrente entre os publicanos). Era, portanto, um pecador público sem hipóteses de perdão, excluído do convívio com as pessoas decentes e sérias. Era um marginal, considerado amaldiçoado por Deus e desprezado pelos homens. A referência à sua "pequena estatura" - mais do que uma indicação de carácter físico - pode significar a sua pequenez e insignificância, do ponto de vista moral.
    Este homem procurava "ver" Jesus. O "ver" indica aqui, provavelmente, mais do que curiosidade: indica uma procura intensa, uma vontade firme de encontro com algo novo, uma ânsia de descobrir o "Reino", um desejo de fazer parte dessa comunidade de salvação que Jesus anunciava. No entanto, o "mestre" devia parecer-lhe distante e inacessível, rodeado desses "puros" e "santos" que desprezavam os marginais como Zaqueu. O subir "a um sicómoro" indica a intensidade do desejo de encontro com Jesus, que é muito mais forte do que o medo do ridículo ou das vaias da multidão.
    Como é que Jesus vai lidar com este excluído, que sente um desejo intenso de conhecer a salvação que Deus oferece e que espreita Jesus do meio dos ramos de um sicómoro? Jesus começa por provocar o encontro; depois, sugere a Zaqueu que está interessado em entrar em comunhão com Ele, em estabelecer com Ele laços de familiaridade ("quando Jesus chegou ao local, olhou para cima e disse-lhe: «Zaqueu, desce depressa, que Eu hoje devo ficar em tua casa»"). Atente-se neste quadro "escandaloso": Jesus, rodeado pelos "puros" que escutam atentamente a sua Palavra, deixa todos especados no meio da rua para estabelecer contacto com um marginal e para entrar na sua casa. É a exemplificação prática do "deixar as noventa e nove ovelhas para ir à procura da que estava perdida"... Aqui torna-se patente a fragilidade do coração de Deus que, diante de um pecador que busca a salvação, deixa tudo para ir ao seu encontro.
    Como é que a multidão que rodeia Jesus reage a isto? Manifestando, naturalmente, a sua desaprovação às atitudes incompreensíveis de Jesus ("ao verem isto, todos murmuravam, dizendo: «foi hospedar-se em casa de um pecador»"). É a atitude de quem se considera "justo" e despreza os outros, de quem está instalado nas suas certezas, de quem está convencido de que a lógica de Deus é uma lógica de castigo, de marginalização, de exclusão. No entanto, Jesus demonstra-lhes que a lógica de Deus é diferente da lógica dos homens e que a oferta de salvação que Deus faz não exclui nem marginaliza ninguém.
    Como é que tudo termina? Termina com um banquete (onde está Zaqueu, o chefe dos publicanos) que simboliza o "banquete do Reino". Ao aceitar sentar-Se à mesa com Zaqueu, Jesus mostra que os pecadores têm lugar no "banquete do Reino"; diz-lhes, também, que Deus os ama, que aceita sentar-Se à mesa com eles - isto é, quer integrá-los na sua família e estabelecer com eles laços de comunhão e de amor. Jesus mostra, dessa forma, que Deus não exclui nem marginaliza nenhum dos seus filhos - mesmo os pecadores - mas a todos oferece a salvação.
    E como é que Zaqueu reage a essa oferta de salvação que Deus lhe faz? Acolhendo o dom de Deus e convertendo-se ao amor. A repartição dos bens pelos pobres e a restituição de tudo o que foi roubado em quádruplo, vai muito além daquilo que a lei judaica exigia (cf. Ex 22,3.6; Lev 5,21-24; Nm 5,6-7) e é sinal da transformação do coração de Zaqueu... Repare-se, no entanto, que Zaqueu só se resolveu a ser generoso após o encontro com Jesus e após ter feito a experiência do amor de Deus. O amor de Deus não se derramou sobre Zaqueu depois de ele ter mudado de vida; mas foi o amor de Deus - que Zaqueu experimentou quando ainda era pecador - que provocou a conversão e que converteu o egoísmo em generosidade. Prova-se, assim, que só a lógica do amor pode transformar o mundo e os corações dos homens.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pode partir das seguintes linhas:

    • A questão central posta por este texto é, portanto, a questão da universalidade do amor de Deus. A história de Zaqueu revela um Deus que ama todos os seus filhos sem excepção e que nem sequer exclui do seu amor os marginalizados, os "impuros", os pecadores públicos: pelo contrário, é por esses que Deus manifesta uma especial predilecção. Além disso, o amor de Deus não é condicional: Ele ama, apesar do pecado; e é precisamente esse amor nunca desmentido que, uma vez experimentado, provoca a conversão e o regresso do filho pecador. É esta Boa Nova de um Deus "com coração" que somos convidados a anunciar, com palavras e gestos.

    • A vida revela, contudo, que nem sempre a atitude dos crentes em relação aos pecadores está em consonância com a lógica de Deus... Muitas vezes, em nome de Deus, os crentes ou as Igrejas marginalizam e excluem, assumem atitudes de censura, de crítica, de acusação que, longe de provocar a conversão do pecador, o afastam mais e o levam a radicalizar as suas atitudes de provocação. Já devíamos ter percebido (o Evangelho de Jesus tem quase dois mil anos) que só o amor gera amor e que só com amor - não com intolerância ou fanatismo - conseguiremos transformar o mundo e o coração dos homens. Na verdade, como é que acolhemos
    e tratamos os que têm comportamentos socialmente inaceitáveis? Como é que acolhemos e integramos os que, pelas suas opções ou pelas voltas que a vida dá, assumem atitudes diferentes das que consideramos correctas, à luz dos ensinamentos da Igreja?

    • Testemunhar o Deus que ama e que acolhe todos os homens não significa, contudo, branquear o pecado e pactuar com o que está errado. O pecado gera ódio, egoísmo, injustiça, opressão, mentira, sofrimento; é mau e deve ser combatido e vencido. No entanto, distingamos entre pecador e pecado: Deus convida-nos a amar todos os homens e mulheres, inclusive os pecadores; mas chama-nos a combater o pecado que desfeia o mundo e que destrói a felicidade do homem.

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 31º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 31º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. PALAVRA CELEBRADA NA EUCARISTIA.
    A Palavra de Deus não se limita ao tempo da proclamação e da escuta da Palavra. Na preparação da celebração, procurar que algumas expressões da liturgia da Palavra estejam presentes no momento penitencial, nalguma intenção da oração dos fiéis, num momento de acção de graças...

    3. BILHETE DE EVANGELHO.
    É verdade que Zaqueu tinha subido a um sicómoro, mas é Jesus que ergue os olhos e interpela o publicano de Jericó: "Zaqueu, desce depressa, que Eu hoje devo ficar em tua casa". A iniciativa de Jesus provoca em Zaqueu toda uma mudança, pois ele nunca teria ousado convidar Jesus de quem ouvira falar. Sente-se reconhecido não como "cobrador de impostos" e ladrão, mas como alguém que pode manifestar o homem que é verdadeiramente capaz de ser: generoso para com os pobres, reparador das faltas que tenha podido ocasionar. Na casa de Zaqueu, Jesus faz-nos ver o que veio fazer ao vir ao encontro da humanidade: ajuda-o a encontrar o seu próprio rosto... Sim, Ele veio "procurar e salvar o que estava perdido", para restabelecer a imagem de Deus no rosto do homem que o pecado tinha afundado.

    4. À ESCUTA DA PALAVRA.
    A história de Zaqueu é uma história de olhares... Há o olhar de Zaqueu, que procurava ver quem era Jesus; correu e subiu a um sicómoro para ver Jesus que devia passar por aí. Há o olhar de Jesus que, ao chegar a esse lugar, ergueu os olhos... Há, enfim, o olhar da multidão, que, ao ver tudo isso, recriminava Jesus por ir a casa de um pecador. Três olhares, tão diferentes uns dos outros! Bem o sabemos: o olhar é uma linguagem para lá das palavras. Os nossos olhares falam muito mais do que tantos discursos. As nossas palavras podem mentir, os nossos olhares não. EM primeiro lugar, reparemos no olhar da multidão. Jesus tinha curado um mendigo cego; ao ver isso, a multidão celebrou os louvores de Deus. Ao ver o maravilhoso, a multidão maravilhou-se. E depois, tudo muda de repente. Após a atitude de Jesus para com Zaqueu, a multidão olha Jesus com hostilidade. Versatilidade das multidões, sem dúvida. Mas também versatilidade dos nossos próprios olhares. Basta uma coisita de nada para que o meu olhar sobre aquele que estimava mude, quando percebo que ele não era "bem" aquilo que eu pensava! Em segundo lugar, reparemos no olhar de Zaqueu. Mais do que um olhar de simples curiosidade, é um olhar de desejo. Ele tinha ouvido dizer que este Jesus não falava como os escribas e os fariseus. Além disso, Ele fazia milagres. Não viria Ele da parte de Deus? Então, ele quer ver este rabino que não é como os outros. Mas a sua procura continua tímida. Não ousa avançar demasiado. E eu? Qual é o meu desejo de ver Jesus, de O conhecer? Não sou demasiado tímido quando se trata da minha ligação com Jesus e da minha fé? Finalmente, há o olhar de Jesus, que ergueu os olhos para Zaqueu. Que viu Ele? Um pecador à margem da Lei, banido por todos? Não, Jesus viu um homem rejeitado por todos, um homem habitado por um desejo, talvez não muito explícito, de ser acolhido por Ele próprio. Viu um homem que não tinha ainda compreendido que Deus o amava, apesar dos seus pecados, que Deus o olhava unicamente à luz do seu amor primeiro e gratuito. Então, Jesus colocou no seu olhar sobre Zaqueu todo este amor que transformou o publicano. E que o salvou!

    5. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Pode-se escolher a oração eucarística nº 4, que reúne em si toda a alegre plenitude deste dia.

    6. PALAVRA PARA O CAMINHO DA VIDA...
    Levar a Palavra de Deus como luz para mais uma semana de trabalho, de estudo... Ao longo dos dias da semana que se segue, procurar rezar e meditar algumas frases da Palavra de Deus: "Cantai ao Senhor um cântico novo"...; "A Palavra de Deus não está encadeada"...; "Se morremos com Cristo, também com Ele viveremos"...; "Levanta-te e segue o teu caminho; a tua fé te salvou"... Procurar transformá-las em atitudes e em gestos de verdadeiro encontro com Deus e com os próximos que formos encontrando nos caminhos percorridos da vida...

     

     

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • Solenidade de Todos os Santos - Ano C

    Solenidade de Todos os Santos - Ano C


    1 de Novembro, 2022

    ANO C
    SOLENIDADE DE TODOS OS SANTOS

    Breves introduções às leituras: Primeira leitura: Como descrever a felicidade dos mártires e dos santos na sua condição celeste, invisível? Para isso, o profeta recorre a uma visão.
    Salmo responsorial: O salmo de hoje proclama as condições de entrada no Templo de Deus. Ele anuncia também a bem-aventurança dos corações puros. Nós somos este povo imenso que marcha ao encontro do Deus santo.
    Segunda leitura: Desde o nosso baptismo, somos chamados filhos de Deus e o nosso futuro tem a marcada da eternidade.
    Evangelho: Que futuro reserva Deus aos seus amigos, no seu Reino celeste? Ele próprio é fonte de alegria e de felicidade para eles.

    LEITURA I - Ap 7,2-4.9-14

    Leitura do Apocalipse de São João

    Eu, João, vi um Anjo que subia do Nascente,
    trazendo o selo do Deus vivo.
    Ele clamou em alta voz
    aos quatro Anjos a quem foi dado o poder
    de causar dano à terra e ao mar:
    «Não causeis dano à terra, nem ao mar, nem às árvores,
    até que tenhamos marcado na fronte
    os servos do nosso Deus».
    E ouvi o número dos que foram marcados:
    cento e quarenta e quatro mil,
    de todas as tribos dos filhos de Israel.
    Depois disto, vi uma multidão imensa,
    que ninguém podia contar,
    de todas as nações, tribos, povos e línguas.
    Estavam de pé, diante do trono e na presença do Cordeiro,
    vestidos com túnicas brancas e de palmas na mão.
    E clamavam em alta voz:
    «A salvação ao nosso Deus, que está sentado no trono,
    e ao Cordeiro».
    Todos os Anjos formavam círculo
    em volta do trono, dos Anciãos e dos quatro Seres Vivos.
    Prostraram-se diante do trono, de rosto por terra,
    e adoraram a Deus, dizendo:
    «Amen! A bênção e a glória, a sabedoria e a acção de graças,
    a honra, o poder e a força
    ao nosso Deus, pelos séculos dos séculos. Amen!».
    Um dos Anciãos tomou a palavra e disse-me:
    «Esses que estão vestidos de túnicas brancas,
    quem são e de onde vieram?».
    Eu respondi-lhe:
    «Meu Senhor, vós é que o sabeis».
    Ele disse-me:
    «São os que vieram da grande tribulação,
    os que lavaram as túnicas
    e as branquearam no sangue do Cordeiro».

    Breve comentário

    As primeiras perseguições tinham feito cruéis destruições nas comunidades cristãs, ainda tão jovens. Iriam estas comunidades desaparecer, acabadas de fundar? As visões do profeta cristão trazem uma mensagem de esperança nesta provação. É uma linguagem codificada, que evoca Roma, perseguidora dos cristãos, sem a nomear directamente, aplicando-lhe o qualificativo de Babilónia. A revelação proclamada é a da vitória do Cordeiro. Que paradoxo! O próprio Cordeiro foi imolado. Mas é o Cordeiro da Páscoa definitiva, o Ressuscitado. Ele transformou o caminho de morte em caminho de vida para todos aqueles que O seguem, em particular pelo martírio, e eles são numerosos; participam doravante ao seu triunfo, numa festa eterna.

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 23 (24)

    Refrão: Esta é a geração dos que procuram o Senhor.

    Do Senhor é a terra e o que nela existe,
    o mundo e quantos nele habitam.
    Ele a fundou sobre os mares
    e a consolidou sobre as águas.

    Quem poderá subir à montanha do Senhor?
    Quem habitará no seu santuário?
    O que tem as mãos inocentes e o coração puro,
    o que não invocou o seu nome em vão.

    Este será abençoado pelo Senhor
    e recompensado por Deus, seu Salvador.
    Esta é a geração dos que O procuram,
    que procuram a face de Deus.

     

    LEITURA II - 1Jo 3,1-3

    Leitura da Primeira Epístola de São João

    Caríssimos:
    Vede que admirável amor o Pai nos consagrou
    em nos chamar filhos de Deus.
    E somo-lo de facto.
    Se o mundo não nos conhece,
    é porque O não conheceu a Ele.
    Caríssimos, agora somos filhos de Deus
    e ainda não se manifestou o que havemos de ser.
    Mas sabemos que, na altura em que se manifestar,
    seremos semelhantes a Deus,
    porque O veremos tal como Ele é.
    Todo aquele que tem n’Ele esta esperança
    purifica-se a si mesmo,
    para ser puro, como ele é puro.

    Breve comentário

    Segunda mensagem de esperança. Ela responde às nossas interrogações sobre o destino dos defuntos. Que vieram a ser? Como sabê-lo, pois desapareceram dos nossos olhos? E nós próprios, que viremos a ser?
    A resposta é uma dedução absolutamente lógica: se Deus, no seu imenso amor, faz de nós seus filhos, não nos pode abandonar. Ora, em Jesus, vemos já a que futuro nos conduz a pertença à família divina: seremos semelhantes a Ele.

     

    ALELUIA - Mt 11,28

    Aleluia. Aleluia.

    Vinde a Mim, vós todos os que andais cansados e oprimidos
    e Eu vos aliviarei, diz o Senhor.

     

    EVANGELHO - Mt 5,1-12

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

    Naquele tempo,
    ao ver as multidões, Jesus subiu ao monte e sentou-Se.
    Rodearam-n’O os discípulos
    e Ele começou a ensiná-los, dizendo:
    «Bem-aventurados os pobres em espírito,
    porque deles é o reino dos Céus.
    Bem-aventurados os humildes,
    porque possuirão a terra.
    Bem-aventurados os que choram,
    porque serão consolados.
    Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça,
    porque serão saciados.
    Bem-aventurados os misericordiosos,
    porque alcançarão misericórdia.
    Bem-aventurados os puros de coração,
    porque verão a Deus.
    Bem-aventurados os que promovem a paz,
    porque serão chamados filhos de Deus.
    Bem-aventurados os que sofrem perseguição por amor da justiça,
    porque deles é o reino dos Céus.
    Bem-aventurados sereis, quando, por minha causa,
    vos insultarem, vos perseguirem
    e, mentindo, disserem todo o mal contra vós.
    Alegrai-vos e exultai,
    porque é grande nos Céus a vossa recompensa».

    AMBIENTE

    Depois de dizer quem é Jesus (cf. Mt 1,1-2,23) e de definir a sua missão (cf. Mt 3,1-4,16), Mateus vai apresentar a concretização dessa missão: com palavras e com gestos, Jesus propõe aos discípulos e às multidões o "Reino". Neste enquadramento, Mateus propõe-nos hoje um discurso de Jesus sobre o "Reino" e a sua lógica.
    Uma característica importante do Evangelho segundo Mateus reside na importância dada pelo evangelista aos "ditos" de Jesus. Ao longo do Evangelho segundo Mateus aparecem cinco longos discursos (cf. Mt 5-7; 10; 13; 18; 24-25), nos quais Mateus junta "ditos" e ensinamentos provavelmente proferidos por Jesus em várias ocasiões e contextos. É provável que o autor do primeiro Evangelho visse nesses cinco discursos uma nova Lei, destinada a substituir a antiga Lei dada ao Povo por meio de Moisés e escrita nos cinco livros do Pentateuco.
    O primeiro discurso de Jesus - do qual o Evangelho que nos é hoje proposto é a primeira parte - é conhecido como o "sermão da montanha" (cf. Mt 5-7). Agrupa um conjunto de palavras de Jesus, que Mateus coleccionou com a evidente intenção de proporcionar à sua comunidade uma série de ensinamentos básicos para a vida cristã. O evangelista procurava, assim, oferecer à comunidade cristã um novo código ético, uma nova Lei, que superasse a antiga Lei que guiava o Povo de Deus.
    Mateus situa esta intervenção de Jesus no cimo de um monte. A indicação geográfica não é inocente: transporta-nos à montanha da Lei (Sinai), onde Deus Se revelou e deu ao seu Povo a antiga Lei. Agora é Jesus, que, numa montanha, oferece ao novo Povo de Deus a nova Lei que deve guiar todos os que estão interessados em aderir ao "Reino".
    As "bem-aventuranças" que, neste primeiro discurso, Mateus coloca na boca de Jesus, são consideravelmente diferentes das "bem-aventuranças" propostas por Lucas (cf. Lc 6,20-26). Mateus tem nove "bem-aventuranças", enquanto que Lucas só apresenta quatro; além disso, Lucas prossegue com quatro "maldições", que estão ausentes do texto mateano; outras notas características da versão de Mateus são a espiritualização (os "pobres" de Lucas são, para Mateus, os "pobres em espírito") e a aplicação dos "ditos" originais de Jesus à vida da comunidade e ao comportamento dos cristãos. É muito provável que o texto de Lucas seja mais fiel à tradição original e que o texto de Mateus tenha sido mais trabalhado.

    MENSAGEM

    As "bem-aventuranças" são fórmulas relativamente frequentes na tradição bíblica e judaica. Aparecem, quer nos anúncios proféticos de alegria futura (cf. Is 30,18; 32,20; Dn 12,12), quer nas acções de graças pela alegria presente (cf. Sl 32,1-2; 33,12; 84,5.6.13), quer nas exortações a uma vida sábia, reflectida e prudente (cf. Prov 3,13; 8,32.34; Sir 14,1-2.20; 25,8-9; Sl 1,1; 2,12; 34,9). Contudo, elas definem sempre uma alegria oferecida por Deus.
    As "bem-aventuranças" evangélicas devem ser entendidas no contexto da pregação sobre o "Reino". Jesus proclama "bem-aventurados" aqueles que estão numa situação de debilidade, de pobreza, porque Deus está a ponto de instaurar o "Reino" e a situação destes "pobres" vai mudar radicalmente; além disso, são "bem-aventurados" porque, na sua fragilidade, debilidade e dependência, estão de espírito aberto e coração disponível para acolher a proposta de salvação e libertação que Deus lhes oferece em Jesus (a proposta do "Reino").
    As quatro primeiras "bem-aventuranças" referidas por Mateus (vers. 3-6) estão relacionadas entre si. Dirigem-se aos "pobres" (as segunda, terceira e quarta "bem-aventuranças" são apenas desenvolvimentos da primeira, que proclama: "bem-aventurados os pobres em espírito"). Saúdam a felicidade daqueles que se entregam confiadamente nas mãos de Deus e procuram fazer sempre a sua vontade; daqueles que, de forma consciente, deixam de colocar a sua confiança e a sua esperança nos bens, no poder, no êxito, nos homens, para esperar e confiar em Deus; daqueles que aceitam renunciar ao egoísmo, que aceitam despojar-se de si próprios e estar disponíveis para Deus e para os outros.
    Os "pobres em espírito" são aqueles que aceitam renunciar, livremente, aos bens, ao próprio orgulho e auto-suficiência, para se colocarem, incondicionalmente, nas mãos de Deus, para servirem os irmãos e partilharem tudo com eles.
    Os "mansos" não são os fracos, os que suportam passivamente as injustiças, os que se conformam com as violências orquestradas pelos poderosos; mas são aqueles que recusam a violência, que são tolerantes e pacíficos, embora sejam, muitas vezes, vítimas dos abusos e prepotências dos injustos… A sua atitude pacífica e tolerante torná-los-á membros de pleno direito do "Reino".
    Os "que choram" são aqueles que vivem na aflição, na dor, no sofrimento provocados pela injustiça, pela miséria, pelo egoísmo; a chegada do "Reino" vai fazer com que a sua triste situação se mude em consolação e alegria…
    A quarta bem-aventurança proclama felizes "os que têm fome e sede de justiça". Provavelmente, a justiça deve entender-se, aqui, em sentido bíblico - isto é, no sentido da fidelidade total aos compromissos assumidos para com Deus e para com os irmãos. Jesus dá-lhes a esperança de verem essa sede de fidelidade saciada, no Reino que vai chegar.
    O segundo grupo de "bem-aventuranças" (vers. 7-11) está mais orientado para definir o comportamento cristão. Enquanto que no primeiro grupo se constatam situações, neste segundo grupo propõem-se atitudes que os discípulos devem assumir.
    Os "misericordiosos" são aqueles que têm um coração capaz de compadecer-se, de amar sem limites, que se deixam tocar pelos sofrimentos e alegrias dos outros homens e mulheres, que são capazes de ir ao encontro dos irmãos e estender-lhes a mão, mesmo quando eles falharam.
    Os "puros de coração" são aqueles que têm um coração honesto e leal, que não pactua com a duplicidade e o engano.
    Os "que constroem a paz" são aqueles que se recusam a aceitar que a violência e a lei do mais forte rejam as relações humanas; e são aqueles que procuram ser - às vezes com o risco da própria vida - instrumentos de reconciliação entre os homens.
    Os "que são perseguidos por causa da justiça" são aqueles que lutam pela instauração do "Reino" e são desautorizados, humilhados, agredidos, marginalizados por parte daqueles que praticam a injustiça, que fomentam a opressão, que constroem a morte… Jesus garante-lhes: o mal não vos poderá vencer; e, no final do caminho, espera-vos o triunfo, a vida plena.
    Na última "bem-aventurança" (vers. 11), o evangelista dirige-se, em jeito de exortação, aos membros da sua comunidade que têm a experiência de ser perseguidos por causa de Jesus e convida-os a resistir ao sofrimento e à adversidade. Esta última exortação é, na prática, uma aplicação concreta da oitava "bem-aventurança".
    No seu conjunto, as "bem-aventuranças" deixam uma mensagem de esperança e de alento para os pobres e débeis. Anunciam que Deus os ama e que está do lado deles; confirmam que a libertação está a chegar e que a sua situação vai mudar; asseguram que eles vivem já na dinâmica desse "Reino" onde vão encontrar a felicidade e a vida plena.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão e a partilha podem fazer-se à volta dos seguintes elementos:

    • Jesus diz: "felizes os pobres em espírito"; o mundo diz: "felizes vós os que tendes dinheiro - muito dinheiro - e sabeis usá-lo para comprar influências, comodidade, poder, segurança, bem-estar, pois é o dinheiro que faz andar o mundo e nos torna mais poderosos, mais livres e mais felizes". Quem é, realmente, feliz?

    • Jesus diz: "felizes os mansos"; o mundo diz: "felizes vós os que respondeis na mesma moeda quando vos provocam, que respondeis à violência com uma violência ainda maior, pois só a linguagem da força é eficaz para lidar com a violência e a injustiça". Quem tem razão?

    • Jesus diz: "felizes os que choram"; o mundo diz: "felizes vós os que não tendes motivos para chorar, porque a vossa vida é sempre uma festa, porque vos moveis nas altas esferas da sociedade e tendes tudo para serdes felizes: casa com piscina, carro com telefone e ar condicionado, amigos poderosos, uma conta bancária interessante e um bom emprego arranjado pelo vosso amigo ministro". Onde está a verdadeira felicidade?

    • Jesus diz: "felizes os que têm ânsia de cumprir a vontade de Deus"; o mundo diz: "felizes vós os que não dependeis de preconceitos ultrapassados e não acreditais num deus que vos diz o que deveis e não deveis fazer, porque assim sois mais livres". Onde está a verdadeira liberdade, que enche de felicidade o coração?

    • Jesus diz: "felizes os que tratam os outros com misericórdia"; o mundo diz: "felizes vós quando desempenhais o vosso papel sem vos deixardes comover pela miséria e pelo sofrimento dos outros, pois quem se comove e tem misericórdia acabará por nunca ser eficaz neste mundo tão competitivo". Qual é o verdadeiro fundamento de uma sociedade mais justa e mais fraterna?

    • Jesus diz: "felizes os sinceros de coração"; o mundo diz: "felizes vós quando sabeis mentir e fingir para levar a água ao vosso moinho, pois a verdade e a sinceridade destroem muitas carreiras e esperanças de sucesso". Onde está a verdade?

    • Jesus diz: "felizes os que procuram construir a paz entre os homens"; o mundo diz: "felizes vós os que não tendes medo da guerra, da competição, que sois duros e insensíveis, que não tendes medo de lutar contra os outros e sois capazes de os vencer, pois só assim podereis ser homens e mulheres de sucesso". O que é que torna o mundo melhor: a paz ou a guerra?

    • Jesus diz: "felizes os que são perseguidos por cumprirem a vontade de Deus"; o mundo diz: "felizes vós os que já entendestes como é mais seguro e mais fácil fazer o jogo dos poderosos e estar sempre de acordo com eles, pois só assim podeis subir na vida e ter êxito na vossa carreira". O que é que nos eleva à vida plena?

    ALGUMAS REFLEXÕES À LUZ DO EVANGELHO
    (adaptadas de "Signes d’aujourd’hui")

    REFLEXÃO 1:
    CELEBRAR OS SANTOS NA RESSURREIÇÃO

    As Bem-aventuranças revelam a realidade misteriosa da vida em Deus, iniciada no Baptismo. Aos olhos do mundo, o que os servidores de Deus sofrem, são efectivamente formas de morte: ser pobre, suportar as provas (os que choram) ou as privações (ter fome e sede) de justiça, ser perseguido, ser partidário da paz, da reconciliação e da misericórdia, num mundo de violência e de lucro, tudo isso aparece como não rentável, votado ao fracasso, consequentemente, à morte.
    Mas que pensa Cristo? Ele, ao contrário, proclama felizes todos os seus amigos que o mundo despreza e considera como mortos, consola-os, alimenta-os, chama-os filhos de Deus, introdu-los no Reino e na Terra Prometida.
    A Solenidade de Todos os Santos abre-nos assim o espírito e o coração às consequências da Ressurreição. O que se passou em Jesus realizou-se também nos seus bem amados, os nossos antepassados na fé, e diz-nos igualmente respeito: sob as folhas mortas, sob a pedra do túmulo, a vida continua, misteriosa, para se revelar no Grande Dia, quando chegar o fim dos tempos. Para Jesus, foi o terceiro dia; para os seus amigos, isso será mais tarde.

    REFLEXÃO 2:
    O EVANGELHO NO PRESENTE

    Os membros de uma mesma família têm traços do rosto comuns…
    As pessoas que partilham toda uma vida juntos acabam por se parecerem…
    Esta festa anual de Todos os Santos reúne inúmeros rostos que trazem em si a imagem e a semelhança de Deus.

    Um rosto de humanidade transfigurada. Enquanto vivos, os santos não se consideravam como tais, longe disso! Eles não esculpiam a sua efígie num fundo de auto-satisfação… Contrariamente àquilo que geralmente aparece nas imagens ditas piedosas e nas biografias embelezadas, eles não foram perfeitos, nem à primeira, nem totalmente, nem sobretudo sem esforço. Eles tinham fraquezas e defeitos contra os quais se bateram toda a vida. Alguns, como S. Agostinho, vieram de longe, transfigurados pelo amor de Deus que acolheram na sua existência. Quanto mais se aproximaram da luz de Deus, tanto mais viram e reconheceram as sombras da sua existência.
    Peregrinos do quotidiano, a maior parte deles não realizaram feitos heróicos nem cumpriram prodígios. É certo que alguns têm à sua conta realizações espectaculares, no plano humanitário, no plano espiritual, ou ainda na história da Igreja. Mas muitos outros, a maioria, são os santos da simplicidade e do quotidiano! Canoniza-se muito pouco estas pessoas do quotidiano!

    Um rosto com traços de Cristo.
    Encontramos em cada um dos santos e das santas um mesmo perfil. Poderíamos mesmo desenhar o seu retrato-robô comum. Por muito frequentar Cristo, deixaram-se modelar pelos seus traços.
    Como Jesus, os santos tiveram que viver muitas vezes em sentido contrário às ideias recebidas e aos comportamentos do seu tempo. Viver as Bem-aventuranças não é evidente: ser pobre de coração num mundo que glorifica o poder e o ter; ser doce num mundo duro e violento; ter o coração puro face à corrupção; fazer a paz quando outros declaram a guerra…
    Os santos foram pessoas "em marcha" (segundo uma tradução hebraizante de "bem-aventurado"), isto é, pessoas activas, apaixonadas pelo Evangelho… Os santos foram homens e mulheres corajosos, capazes de reagir e de afirmar a todo o custo aquilo que os fazia viver. Eles mostram-nos o caminho da verdade e da liberdade.
    Aqueles que frequentaram os santos - aqueles que os frequentam hoje - afirmam que, junto deles, sentimos que nos tornamos melhores. O seu exemplo ilumina. A sua alegria é o seu testemunho mais belo. A sua felicidade é contagiosa.

    REFLEXÃO 3:
    TER UM CORAÇÃO DE POBRE (Gérard Naslin)

    Eram quatro casais amigos à volta da mesma mesa. Os copos estavam bem cheios e os pratos bem guarnecidos. No meio da refeição, a conversa centra-se nos acontecimentos da actualidade: Fala-se dos estrangeiros e imigrantes. O debate aquece e cada um proclama o slogan tantas vezes repetido, o cliché veiculado pelos media… Todos parecem em uníssono.
    Entretanto, um dos convivas, que estava em silêncio há alguns minutos, abrindo a boca, disse: "Não estou de acordo convosco, e vou dizer-vos porquê. Para mim, todo o homem é uma história sagrada, eu acredito nisso, deixai-me dizê-lo". Imaginai o tempo de silêncio que se seguiu, enquanto os olhares e os garfos mergulharam nos pratos.
    Naquela noite, ao longo de uma refeição entre amigos, passou-se qualquer coisa que nos faz ver o que é o Reino de Deus: um homem só, ousava deixar a multidão para dizer: "Não estou de acordo!" em nome da sua fé no homem e, no caso preciso, em nome da sua fé em Deus.
    Não foi o que se passou no cimo de uma montanha da Palestina, há 2000 anos, quando um homem, Jesus de Nazaré, tendo diante de si os seus discípulos que tinham deixado a multidão para o seguir, "abrindo a boca", se pôs a instrui-los e lhes falou de felicidade, mas de modo nenhum como o mundo fala dela?!
    São estes discípulos que ele declara "bem-aventurados". São Lucas, no seu Evangelho, será ainda mais preciso, pois escreverá: "erguendo os olhos para os discípulos…" E que lhes disse Ele? "Bem-aventurados vós, os pobres de coração, porque vosso é o Reino de Deus!".
    Eis a força contestatária de Jesus. E as outras seis bem-aventuranças estão lá para ilustrar a primeira, a da pobreza do coração. Quanto à última, ela aparece como a conclusão: "Sim, se vós viveis dessa vida, esperai ser perseguidos, porque isso impedirá as pessoas de dormir; isso inquietá-las-á, e como as pessoas não gostam de ser inquietadas, vós sereis perseguidos".
    As bem-aventuranças, se as queremos tomar a sério e sobretudo vivê-las, colocam-nos em situação de contestação e fazem-nos assumir riscos. Sim, em certos momentos, fazem-nos dizer, e sobretudo viver, um "Não estou de acordo" em nome da nossa fé.
    Porque é que Jesus declara "felizes" os seus discípulos? Porque eles são pobres de coração, porque eles estão libertos de tudo o que poderia entravar a sua liberdade. Com efeito, a alegria é o fruto da liberdade.
    Mas de que pobreza fala Jesus? Fala da pobreza que permite crer, esperar e amar.

    O pobre é aquele que "faz crédito" em Deus.
    "Fazer crédito" ou dizer "credo", é a mesma coisa. Quando se fala de noivos, fala-se de duas pessoas que confiam entre si, que se fiam uma na outra, que "fazem crédito". A desconfiança torna a pessoa infeliz. Confiar é aceitar um certo abandono: aquele que grita em direcção a Deus no meio do seu sofrimento ou da sua confusão, é aquele que confia sempre em Deus.

    O pobre é também aquele que espera.
    O rico não pode esperar, está plenamente satisfeito. O pobre, esse, está sempre virado para um futuro que espera que seja melhor; e, depois, ele procura, porque pensa nunca ter totalmente encontrado. A sua vida é uma procura, e todos os sinais que ele encontra enchem-no de alegria e fazem-no avançar. O pobre é aquele que aceita ser criticado pela Palavra de Deus. Com efeito, pôr-se em questão só é possível para aquele que espera tornar-se melhor.

    O pobre é aquele que ama.
    Por não estar plenamente satisfeito consigo mesmo, o pobre está disponível para servir os seus irmãos. Não centrado em si próprio, abre os olhos e vê aqueles que esperam os seus gestos de amor; ouve os gritos dos seus irmãos e abre as suas mãos vazias para as estender àquele que tem necessidade. A sua pobreza fá-lo receber e, ao mesmo tempo, dar o pouco que tem.
    Jesus conhecia o coração do homem, e soube reconhecer no coração dos seus discípulos esta aspiração a crer, a esperar e a amar; é a razão pela qual ele os escolheu e chamou.
    As bem-aventuranças vão, em tantas situações, contra a corrente, porque um homem, um dia, ousou abrir a boca para dizer aos seus discípulos: "Sois do mundo, e ao mesmo tempo não sois do mundo… Vós não sois do mundo do cada um para si, do consumo, da violência, da vingança, do comprometimento… E face a este mundo deveis dizer: não estou de acordo! É certo que sereis perseguidos ou, pelo menos, rir-se-ão de vós, ou procurarão fazer-vos calar. Felizes sereis, porque fareis ver onde está a verdadeira felicidade. Chamar-vos-ão santos".
    Festejamos neste dia todos aqueles que tomam de tal modo a sério as bem-aventuranças que são hoje plenamente felizes.
    Queremos experimentar ser já felizes? Basta-nos ter um coração de pobre.

    REFLEXÃO 4:
    A SANTIDADE DE MUITOS

    Fruto da conversão realizada pelo Evangelho é a santidade de muitos homens e mulheres do nosso tempo; não só daqueles que foram proclamados oficialmente santos pela Igreja, mas também dos que, com simplicidade e no dia a dia da existência, deram testemunho da sua fidelidade a Cristo. Como não pensar aos inumeráveis filhos da Igreja que, ao longo da história do continente europeu, viveram uma santidade generosa e autêntica no mais recôndito da vida familiar, profissional e social? «Todos eles, como "pedras vivas" aderentes a Cristo "pedra angular", construíram a Europa como edifício espiritual e moral, deixando aos vindouros a herança mais preciosa. O Senhor Jesus havia prometido: "Aquele que acredita em Mim fará também as obras que Eu faço; e fará obras maiores do que estas, porque Eu vou para o Pai'' (Jo 14,12). Os santos são a prova viva da realização desta promessa, e ajudam a crer que isto é possível mesmo nos momentos mais difíceis da história». [nº 14 da Exortação Apostólica Ecclesia in Europa de João Paulo II]

    REFLEXÃO 5:
    ALGUMAS PALAVRAS DE BENTO XVI EM PORTUGAL SOBRE O DINAMISMO DA SANTIDADE

    • O horizonte para que deve tender todo o caminho pastoral é a santidade. Não era isso também o objectivo último da indulgência jubilar, enquanto graça especial oferecida por Cristo para que a vida de cada baptizado pudesse purificar-se e renovar-se profundamente? […]
    Na verdade, colocar a programação pastoral sob o signo da santidade é uma opção carregada de consequências. Significa exprimir a convicção de que, se o Baptismo é um verdadeiro ingresso na santidade de Deus através da inserção em Cristo e da habitação do seu Espírito, seria um contra-senso contentar-se com uma vida medíocre, pautada por uma ética minimalista e uma religiosidade superficial.
    Perguntar a um catecúmeno: «Queres receber o Baptismo?» significa ao mesmo tempo pedir-lhe: «Queres fazer-te santo?» Significa colocar na sua estrada o radicalismo do Sermão da Montanha: «Sede perfeitos, como é perfeito vosso Pai celeste» (Mt 5,48).
    [João Paulo II, Novo Millennio Ineunte 30-31]

    • Decisivo é conseguir inculcar em todos os agentes evangelizadores um verdadeiro ardor de santidade, cientes de que o resultado provém sobretudo da união com Cristo e da acção do seu Espírito. […]
    A Igreja tem necessidade sobretudo de grandes correntes, movimentos e testemunhos de santidade entre os fiéis, porque é da santidade que nasce toda a autêntica renovação da Igreja, todo o enriquecimento da fé e do seguimento cristão, uma reactualização vital e fecunda do cristianismo com as necessidades dos homens, uma renovada forma de presença no coração da existência humana e da cultura das nações.
    [Bento XVI, Discurso aos Bispos em Fátima, 13 de Maio de 2010]

    • "É nos Santos que a Igreja reconhece os seus traços característicos e, precisamente neles, saboreia a sua alegria mais profunda. Irmana-os, a todos, a vontade de encarnar na sua existência o Evangelho, sob o impulso do eterno animador do Povo de Deus que é o Espírito Santo. […]
    É preciso voltar a anunciar com vigor e alegria o acontecimento da morte e ressurreição de Cristo, coração do cristianismo, fulcro e sustentáculo da nossa fé, alavanca poderosa das nossas certezas, vento impetuoso que varre qualquer medo e indecisão, qualquer dúvida e cálculo humano. A ressurreição de Cristo assegura-nos que nenhuma força adversa poderá jamais destruir a Igreja. Portanto a nossa fé tem fundamento, mas é preciso que esta fé se torne vida em cada um de nós. […]
    Queridos Irmãos e jovens amigos, Cristo está sempre connosco e caminha sempre com a sua Igreja, acompanha-a e guarda-a, como Ele nos disse: «Eu estou sempre convosco, até ao fim dos tempos» (Mt 28, 20). Nunca duvideis da sua presença! Procurai sempre o Senhor Jesus, crescei na amizade com Ele, comungai-O. Aprendei a ouvir e a conhecer a sua palavra e também a reconhecê-Lo nos pobres. Vivei a vossa vida com alegria e entusiasmo, certos da sua presença e da sua amizade gratuita, generosa, fiel até à morte de cruz. Testemunhai a alegria desta sua presença forte e suave a todos, a começar pelos da vossa idade. Dizei-lhes que é belo ser amigo de Jesus e que vale a pena segui-Lo. Com o vosso entusiasmo, mostrai que, entre tantos modos de viver que hoje o mundo parece oferecer-nos - todos aparentemente do mesmo nível –, só seguindo Jesus é que se encontra o verdadeiro sentido da vida e, consequentemente, a alegria verdadeira e duradoura.
    Buscai diariamente a protecção de Maria, a Mãe do Senhor e espelho de toda a santidade. Ela, a Toda Santa, ajudar-vos-á a ser fiéis discípulos do seu Filho Jesus Cristo.
    [Bento XVI, Homilia em Lisboa, 11 de Maio de 2010]

    • A relação com Deus é constitutiva do ser humano: foi criado e ordenado para Deus, procura a verdade na sua estrutura cognitiva, tende ao bem na esfera volitiva, é atraído pela beleza na dimensão estética. A consciência é cristã na medida em que se abre à plenitude da vida e da sabedoria, que temos em Jesus Cristo. A visita, que agora inicio sob o signo da esperança, pretende ser uma proposta de sabedoria e de missão. […] Viver na pluralidade de sistemas de valores e de quadros éticos exige uma viagem ao centro de si mesmo e ao cerne do cristianismo para reforçar a qualidade do testemunho até à santidade, inventar caminhos de missão até à radicalidade do martírio.
    [Bento XVI, Discurso na chegada a Lisboa, 11 de Maio de 2010]

    • "Sim! O Senhor, a nossa grande esperança, está connosco; no seu amor misericordioso, oferece um futuro ao seu povo: um futuro de comunhão consigo. […] A nossa esperança tem fundamento real, apoia-se num acontecimento que se coloca na história e ao mesmo tempo excede-a: é Jesus de Nazaré. […] Mas quem tem tempo para escutar a sua palavra e deixar-se fascinar pelo seu amor? Quem vela, na noite da dúvida e da incerteza, com o coração acordado em oração? Quem espera a aurora do dia novo, tendo acesa a chama da fé? A fé em Deus abre ao homem o horizonte de uma esperança certa que não desilude; indica um sólido fundamento sobre o qual apoiar, sem medo, a própria vida; pede o abandono, cheio de confiança, nas mãos do Amor que sustenta o mundo.
    [Bento XVI, Homilia em Fátima, 13 de Maio de 2010]

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA

    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • Comemoração de Todos os fiéis Defuntos

    Comemoração de Todos os fiéis Defuntos


    2 de Novembro, 2022

    A Igreja, acolhendo uma tradição monástica que vem do século XI, dedica o dia 2 de Novembro à memória dos fiéis defuntos. Depois de ter celebrado a glória e a felicidade dos Santos, no dia 1 de Novembro, a Igreja dedica o dia 2 à oração de sufrágio pelos "irmãos que adormeceram na esperança da ressurreição". Assim fica perfeita a comunhão de todos os crentes em Cristo.
    Lectio
    Primeira leitura: Job 19, 1.23-27ª

    Job respondeu, dizendo: 2«Até quando afligireis a minha alma e me atormentareis com vãs palavras? 23Quem me dera que as minhas palavras se escrevessem e se consignassem num livro, 24ou gravadas em chumbo com estilete de ferro, ou se esculpissem na pedra para sempre! 25Eu sei que o meu redentor vive e prevalecerá, por fim, sobre o pó da terra; 26e depois de a minha pele se desprender da carne, na minha própria carne verei a Deus. 27Eu mesmo o verei, os meus olhos e não outros o hão-de contemplar! As minhas entranhas consomem-se dentro de mim.

    Os amigos de Job tentam consolá-lo, recorrendo a uma sabedoria superficial, expressa em frases feitas e lugares comuns. É o que tantas vezes acontece quando pretendemos confortar alguém que sofre. As palavras de Job são muito diferentes. No meio do sofrimento, vendo-se às portas da morte e trespassado pela solidão, compreende que Deus é o seu redentor, aquele parente próximo que, segundo os costumes hebreus, deve comprometer-se a resgatar, à sua própria custa, ou a vingar, o seu familiar em caso de escravidão, de pobreza, de assassínio. Job sente Deus como o seu último e definitivo defensor, como alguém que está vivo e se compromete em favor do homem que morre, porque entre Deus e o homem há uma espécie de parentesco, um vínculo indissolúvel. Job afirma-o com vigor: os seus olhos contemplarão a Deus com a familiaridade de quem não é estranho à sua vida.
    Segunda leitura: Romanos 5, 5-11

    Irmãos: A esperança não engana, porque o amor de Deus foi derramado nos nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado. 6De facto, quando ainda éramos fracos é que Cristo morreu pelos ímpios. 7Dificilmente alguém morrerá por um justo; por uma pessoa boa talvez alguém se atreva a morrer. 8Mas é assim que Deus demonstra o seu amor para connosco: quando ainda éramos pecadores é que Cristo morreu por nós. 9E agora que fomos justificados pelo seu sangue, com muito mais razão havemos de ser salvos da ira, por meio dele. 10Se, de facto, quando éramos inimigos de Deus, fomos reconciliados com Ele pela morte de seu Filho, com muito mais razão, uma vez reconciliados, havemos de ser salvos pela sua vida. 11Mais ainda, também nos gloriamos em Deus, por Nosso Senhor Jesus Cristo, por quem agora recebemos a reconciliação.

    O homem pode ter esperança diante da morte. Como intuiu Job, Deus é, de verdade, o nosso Redentor, porque nos ama. Empenhou-se em resgatar-nos da escravidão do pecado e da morte com o preço do sangue do seu Filho (vv. 6-9) e de modo absolutamente gratuito. De facto, nós éramos pecadores, ímpios, inimigos; mas o Senhor reconheceu-nos como "seus", e morreu por nós arrancando-nos à morte eterna. Acolhemos esta graça por meio do batismo, participando no mistério pascal de Cristo. A sua morte reconciliou-nos com o Pai, e a sua ressurreição permite-nos viver como salvos. Quebrando os laços do pecado, e deixando-nos guiar pelo Espírito derramado em nossos corações, atualizamos cada dia a graça do nosso novo nascimento.
    Evangelho: João 6, 37-40

    Naquele tempo, Jesus disse à multidão: Todos os que o Pai me dá virão a mim; e quem vier a mim Eu não o rejeitarei, 38porque desci do Céu não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou. 39E a vontade daquele que me enviou é esta: que Eu não perca nenhum daqueles que Ele me deu, mas o ressuscite no último dia. 40Esta é, pois, a vontade do meu Pai: que todo aquele que vê o Filho e nele crê tenha a vida eterna; e Eu o ressuscitarei no último dia.»

    O centro desta perícopa é a vontade de Deus, para a qual está totalmente voltada a missão de Jesus (v. 38). Essa vontade é um desígnio de vida e de salvação oferecido a todos os homens, pela mediação de Cristo, para que nenhum se perda (v. 39). O desígnio de Deus manifesta, pois, a sua ilimitada gratuidade e, ao mesmo tempo, a sua caridade atenta e cuidadosa por cada um de nós. Para acolhê-la, é preciso o livre consentimento da fé: que acredita no Filho tem, desde já, a vida eterna, porque adere Àquele que é a ressurreição e a vida, o único que pode levar-nos para além do intransponível limite da morte.
    Meditatio

    O silêncio é a melhor atitude perante a morte. Introduzindo-nos no diálogo da eternidade e revelando-nos a linguagem do amor, põe-nos em comunhão profunda com esse mistério imperscrutável. Há um laço muito forte entre os que deixaram de viver no espaço e no tempo e aqueles que ainda vivem neles. É verdade que o desaparecimento físico dos nossos entes queridos nos causa grande sofrimento, devido à intransponível distância que se estabelece entre eles e nós. Mas, pela fé e pela oração, podemos experimentar uma íntima comunhão com eles. Quando parece que nos deixam, é o momento em que se instalam mais solidamente na nossa vida, permanecem presentes, fazem parte da nossa interioridade. Encontramo-los na pátria que já levamos no coração, lá onde habita a Santíssima Trindade. Escreveu o Pe. Dehon: "Vivo muito com os meus mortos: os meus pais, amigos, antigos diretores, antigos alunos. Uma centena dos meus religiosos já partiu para junto do Bom Deus, entre eles, homens que muito trabalharam e rezaram... Saúdo-os todas as manhãs e todas as noites, com os meus padroeiros celestes" (NQT XLIV, 139).
    Paulo encoraja-nos a vivermos positivamente o mistério da morte, confrontando-nos com ela todos os dias, aceitando-a como lei de natureza e de graça, para sermos progressivamente despojados do que deve perecer até nos vermos milagrosamente transformados no que devemos ser. Deste modo, a "morte quotidiana" revela-se um nascimento: o lento declínio e o pôr-do-sol tornam-se aurora luminosa. Todos os sofrimentos, canseiras e tribulações da vida fazem parte desta "morte quotidiana" que nos levará à vida imortal. Havemos de viver fixando os olhos na bem-aventurada esperança, confiando na fidelidade do Senhor, que nos prometeu a eternidade. Vivendo assim, quando chegar ao termo desta vida, não veremos descer as trevas da noite, mas veremos erguer-se a aurora da eternidade, onde teremos a alegria de nos sentir uma só coisa com o Senhor. Depois de muitas tribulações, seremos completamente seus, e essa pertença será plena bem-aventurança na visão do seu rosto.
    Para o cristão, o sofrimento é um tempo de "disponibilidade pura", de "pura oblação" e, ao mesmo tempo, uma forma eminente de apostolado, em união a Cristo vítima, na comunhão dos santos, para salvação do mundo. Vivendo assim, prepara-se, assim, para o supremo ato de oblação, para o último apostolado, o da morte: configurados "a Cristo na morte" (Fil 3, 10) (Cf. Cst n. 69).Se a morte de Cristo na Cruz é o ato de apostolado mais eficaz, que remiu o mundo, o mesmo se pode dizer da morte do cristão em união com a morte de Cristo. Não se quer com isto dizer que, sob o ponto de vista humano, a morte do cristão deva ser uma "morte bonita", tal como não foi bonita, com certeza, a morte de Cristo aos olhos dos homens. Foi, pelo contrário, uma "liturgia esquálida", de abandono e de desolação. O importante é que seja uma morte "para Cristo e em Cristo" (S. Inácio de Antioquia, SC 10, 132). Imolados com Ele, com Ele ressuscitaremos.
    Se, na humildade do dia a dia, vivemos a nossa oblação-imolação com Cristo, oblato e imolado pela salvação do mundo, estamos preparados para o último apostolado da nossa vida: a oblação-imolação da nossa morte, o extremo sacrifício, consumado pelo fogo do Espírito, como aconteceu na morte de Cristo na cruz: "Por um Espírito eterno ofereceu a Si mesmo sem mancha, a Deus" (Heb 9, 14). A morte é, então, a nossa última oferta, o momento da suprema, pura oblação: "Se morrermos com Ele, com Ele viveremos" (2 Tm 2, 11).
    Oratio

    Senhor, quero hoje rezar-te por aqueles que desapareceram no mistério da morte. Dá o descanso àqueles que expiam, luz aos que esperam, paz aos que anseiam pelo teu infinito amor. Descansem em paz: na paz do porto seguro, na paz da meta alcançada, na tua paz, Senhor. Vivam no teu amor aqueles que amaste, aqueles que me amaram. Não esqueças o bem que me fizeram, o bem que fizeram a outros. Esquece tudo o mal que praticaram, risca-o do teu livro. Aos que passaram pela dor, àqueles que parecem ter sido imolados por um iníquo destino, revela, com o teu rosto, os segredos da tua justiça, os mistérios do teu amor. Concede-me aquela vida interior que permite comunicar com o mundo invisível em que se encontram os nossos defuntos: esse mundo fora do tempo e do espaço, esse mundo que não é lugar, mas estado, e mundo que não está longe de mim, mas à minha volta, esse mundo que não é de mortos, mas de vivos. Ámen.
    Contemplatio

    O amor ultrapassa o temor e a esperança. O amor não destrói o temor nem a esperança, mas retira-lhes o que o amor-próprio lhe pode misturar de visões mercenárias. O amor não conhece habitualmente outro temor senão o temor filiar, isto é, o medo de desagradar a um Pai bem-amado. Sendo filho do amor, este temor é de uma atenção e delicadeza totalmente diferentes do medo da justiça divina e dos seus castigos. Leva a evitar as mínimas faltas, as mais pequenas imperfeições voluntárias. Em vez de comprimir e de gelar o coração, alarga-o e aquece-o. Não causa nenhuma perturbação, nenhum alarme; e mesmo quando escapa alguma falta, reconduz docemente a alma ao seu Deus através de um arrependimento tranquilo e sincero. Procura acalmar-se e reparar abundantemente da mágoa que se lhe pôde causar. De resto, não se inquieta nem perde a confiança. O amor tira também à esperança o que ela tem de demasiado pessoal. Aquele que ama não sabe outra coisa senão contar com Deus, nem fazer boas obras principalmente com o objetivo de acumular méritos; e por este nobre desinteresse, merece incomparavelmente mais. Esquecendo tudo o que fez por Deus, não pensa noutra coisa senão em fazer ainda mais. Não se apoia sobre si mesmo; visa a recompensa celeste menos sob o título de recompensa do que como uma garantia de amar o seu Deus com todas as suas forças e de ser por Ele amado durante a eternidade. Sem excluir a esperança, que lhe é natural, considera a felicidade mais do lado do bom agrado do seu Deus e da sua glória que lhe pertence do que do lado do seu próprio interesse. E quando o amor está no seu ponto mais elevado de perfeição, estaria disposto a sacrificar a sua felicidade própria à vontade divina, se exigisse dele este sacrifício. Coloca a sua felicidade no cumprimento desta vontade. O coração dos Santos atingiu mesmo sobre a terra este grau de pureza. É a disposição dos bem-aventurados no céu. É preciso, portanto, que o amor seja purificado a este grau neste mundo, ou no outro pelas penas do purgatório. Há, portanto, que deliberar sobre esta escolha? E quando a via do amor não tivesse outra vantagem senão a de nos isentar do purgatório ou de lhe abreviar consideravelmente a duração, poderíeis hesitar em abraçá-la? (Leão Dehon, OSP 2, p. 16s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive a palavra:
    «Dai-lhes, Senhor, o eterno descanso,
    entres os esplendores da luz perpétua.
    Fazei que descansem em paz.
    Ámen»

     

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    Comemoração de Todos os fiéis Defuntos (2 de Novembro)

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