Eventos Junho 2025

  • 7ª Semana - Segunda-feira - Páscoa

    7ª Semana - Segunda-feira - Páscoa

    2 de Junho, 2025

    7ª Semana - Segunda-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 19, 1-8

    1Enquanto Apolo estava em Corinto, Paulo, depois de atravessar as regiões do interior, chegou a Éfeso. Encontrou alguns discípulos 2e perguntou-lhes: «Recebestes o Espírito Santo, quando abraçastes a fé?» Responderam: «Mas nós nem sequer ouvimos dizer que existe o Espírito Santo.» 3E indagou: «Então, que baptismo recebestes?» Responderam eles: «O baptismo de João.» 4«João - disse Paulo - ministrou apenas um baptismo de penitência e dizia ao povo que acreditasse naquele que ia chegar depois dele, isto é, Jesus.» 5Quando isto ouviram, baptizaram-se em nome do Senhor Jesus. 6E, tendo-lhes Paulo imposto as mãos, o Espírito Santo desceu sobre eles e começaram a falar línguas e a profetizar. 7Eram, ao todo, uns doze homens. 8Paulo foi, em seguida, à sinagoga, onde, durante três meses, falou desassombradamente e argumentava de forma a persuadir os seus ouvintes sobre o que dizia respeito ao Reino de Deus.

    As afirmações de Lucas neste texto mostram-nos que a situação nas primitivas comunidades cristãs foi muito mais complexa do que pensamos e mesmo de quanto Lucas nos deixa entrever. Havia muita gente com um pé no judaísmo e outro no cristianismo, meio discípulos de João Baptista e meio discípulos de Jesus. A pregação do Baptista tinha ultrapassado as fronteiras da Palestina e tinha feito discípulos entre os judeus da Diáspora. Estes ouviram falar de Jesus e aceitaram-no como Messias. Mas faltava-lhes uma informação completa sobre a doutrina e as exigências do Mestre. Tinham abraçado a fé, eram cristãos, mas apenas tinham recebido o baptismo de João, e nem tinham ouvido falar do Espírito Santo. Precisavam de receber o baptismo de Jesus para serem inseridos na comunidade cristã. Não sabemos se foi Paulo quem os baptizou. Mas foi ele quem lhes impôs as mãos, renovando o Pentecostes, como acontecera noutras circunstâncias, especialmente com Pedro e com João na Samaria. Lucas quer mostrar que Paulo tem o mesmo poder que os Doze.

    Evangelho: João 16, 29-33

    Naquele tempo, 29disseram os discípulos a Jesus: «Agora, sim, falas claramente e não usas nenhuma comparação. 30Agora vemos que sabes tudo e não precisas de que ninguém te faça perguntas. Por isso, cremos que saíste de Deus!»
    31Disse-lhes Jesus: «Agora credes? 32Eis que vem a hora - e já chegou - em que sereis dispersos cada um por seu lado, e me deixareis só, se bem que Eu não esteja só, porque o Pai está comigo. 33Anunciei-vos estas coisas para que, em mim, tenhais a paz. No mundo, tereis tribulações; mas, tende confiança: Eu já venci o mundo!»

    Os discursos de Jesus, ao longo do quarto evangelho, são quase sempre incompreendidos. Hoje, ouvimos os discípulos que, com entusiasmo, dizem a Jesus:
    «Agora, sim, falas claramente e não usas nenhuma comparação» (v. 29). É verdade que Jesus, nos discursos de adeus (Jo 14-16) falou mais claro. Mas também é verdade que, quando João escreve essas palavras, elas já eram iluminadas pela luz da Ressurreição e que, sobre a vida da Igreja, também já se projectava a luz do Pentecostes. Com a Ressurreição, tinha começado a nova era, e o Espírito Santo, o mestre interior, permitia aos discípulos a compreensão das palavras de Jesus. Ainda antes da Ressurreição, os discípulos pensaram conhecer a pessoa de Jesus, e ter uma fé adulta em Deus. Mas Jesus tem de lhes fazer compreender que a sua fé ainda é fraca e incompleta para enfrentar as provações que estão para vir (cf. v. 31). O Mestre anuncia, com amargura, que os seus amigos, que agora se afirmam crentes, O hão-de abandonar, porque não resistirão à prova da sorte humilhante a que será submetido. Mas o Senhor termina com palavras de esperança: «tende confiança: Eu já venci o mundo!» (v. 33).

    Meditatio

    Os apóstolos estavam convencidos de que tinham compreendido Jesus e o que Ele lhes dissera. Na verdade, não era assim: nem tinham compreendido a pessoa de Jesus nem a sua mensagem. A sua fé era ainda muito frágil. Precisavam mesmo do Espírito Santo. É o próprio Jesus que lhes faz notar a ilusão em que tinham caído:
    «Agora credes? Eis que vem a hora - e já chegou - em que sereis dispersos cada um por seu lado, e me deixareis só» (vv. 31-32). A provação estava próxima e revelaria a fragilidade da sua fé. Quando a fé se apoia em seguranças humanas, não resiste à provação. Mas, quando a provação encontra alguém devidamente ancorado na palavra do Senhor, e no abandono a Ele, então é purificada e lança-o no caminho de Jesus que afirma: «Eu não estou só, porque o Pai está comigo» (v. 32), e faz-nos tomar a sério as palavras do Senhor: «Tende confiança: Eu já venci o mundo!» (v. 33).
    As palavras de Jesus tinham um alcance que os discípulos não atingiam. Jesus ia voltar para o Pai através da paixão. Esse «regresso» é um mistério que transforma toda a natureza humana, para que os homens possam acreditar. Quando Jesus tiver realizado, pelo sofrimento e pela morte, essa transformação, poderá enviar o Espírito Santo, que fará dos Apóstolos uma nova criação. Então poderão acreditar plenamente, compreender toda a verdade.
    Nós já recebemos o Espírito Santo, e já acreditamos. Mas podemos e devemos crescer na fé. Há sempre novos horizontes que se abrem e que havemos de procurar atingir, como vemos na vida dos santos. Por isso, precisamos sempre de novos dons do Espírito, que nos revelem a superficialidade da nossa adesão a Cristo nas fases anteriores e a necessidade de enfrentar novas tribulações e de receber novas graças que nos façam crescer na intimidade e na união com Ele.
    Acolhamos em todos os momentos, em todas as situações o Espírito com os Seus dons. Só Ele nos fará conhecer, cada vez mais, a pessoa de Cristo e o mistério do seu Coração. Só Ele nos fará compreender a sua mensagem. Só Ele nos fará caminhar no amor, mesmo no meio das tribulações, irradiando os Seus frutos (cf. Gal 5, 22). Só Ele nos fará crescer à imagem de Cristo, fazendo-nos Eucaristia, para glória e alegria de Deus, e para salvação dos nossos irmãos. Poderemos, então, dizer com S. Paulo: «Já não sou eu que vivo; é Cristo que vive em Mim. A vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus que me amou e Se entregou por mim» (Gal 2, 20).
    Foi
    esta «experiência de fé do P. Dehon» (Cst 2). E há ser também a nossa! Tornar-nos-emos homens novos em Cristo «Homem novo» (Ef 4, 24). E «o seu Caminho será o nosso caminho» (Cst 12).

    Oratio

    Senhor Jesus, que na tua imensa bondade nos preparas para sermos uma nova criação no teu Espírito, e para aderirmos a Ti com fé profunda, dá-nos a graça de participarmos no teu mistério de sofrimento e de alegria, no teu mistério de caridade. Nós o pedimos por intercessão de S. João Evangelista, teu Apóstolo muito amado, e nosso preceptor na contemplação do teu Lado aberto e do teu Coração trespassado. Que ele nos ensine também o espírito de reparação, de expiação, de sacrifício, para repararmos os pecados dos outros e especialmente os nossos próprios pecados. Queremos consagrar-Te a nossa vida e fazer dela uma eucaristia para Glória e Alegria do Pai. Amen.

    Contemplatio

    S. João não apenas compadeceu no martírio de Jesus, ele mesmo foi mártir. Nosso Senhor tinha-lhe predito: «Bebereis o mesmo cálice que eu, tinha-lhe dito, e sereis baptizados no mesmo baptismo».
    S. João foi, como Jesus, preso, encadeado e condenado. Sofreu o suplício do azeite a ferver. Foi enviado em exílio para Patmos.
    Diz-nos no Apocalipse: «Eu, João, vosso irmão, participei nas tribulações dos mártires e na sua paciência; fui atirado para a ilha de Patmos para dar testemunho de Jesus Cristo, cujo Evangelho pregava» (Ap 1, 9).
    S. João é para nós o modelo da reparação e da imolação, como é o modelo do amor do Salvador.
    Amou a reparação e o sacrifício. Esteve no martírio com alegria. Tinha ouvido Jesus dizer aos apóstolos: «Devo ser baptizado com o baptismo do meu sangue e tenho pressa que isso aconteça». Tinha ouvido também o «Surgite eamus», - levantai-vos e vamos ao encontro do traidor». Como é que não teria desejado também as provações que deviam torná-lo semelhante ao seu bom Mestre? (Leão Dehon, OSP 3, p. 407).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Tende confiança: Eu já venci o mundo!» (Jo 16, 33).

  • 7ª Semana - Terça-feira - Páscoa

    7ª Semana - Terça-feira - Páscoa

    3 de Junho, 2025

    7ª Semana - Terça-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 20,17-27

    Naqueles dias, 17estando Paulo em Mileto, mandou chamar os anciãos da igreja de Éfeso. 18Quando chegaram junto dele, disse-lhes: «Sabeis como, desde o primeiro dia em que cheguei à Ásia, procedi sempre convosco. 19Tenho servido o Senhor com toda a humildade e com lágrimas, no meio das provações, que as ciladas dos judeus me acarretaram. 20Jamais recuei perante qualquer coisa que vos pudesse ser útil. Preguei e instruí-vos, tanto publicamente como nas vossas casas, 21afirmando a judeus e gregos a necessidade de se converterem a Deus e de acreditarem em Nosso Senhor Jesus. 22E agora, obedecendo ao Espírito, vou a Jerusalém, sem saber o que lá me espera; 23só sei que, de cidade em cidade, o Espírito Santo me avisa de que me aguardam cadeias e tribulações. 24Mas, a meus olhos, a vida não tem valor algum; basta-me poder concluir a minha carreira e cumprir a missão que recebi do Senhor Jesus, dando testemunho do Evangelho da graça de Deus. 25Agora sei que não vereis mais o meu rosto, todos vós, no meio de quem passei, proclamando o Reino. 26Por isso, tomo-vos hoje por testemunhas de que estou limpo do sangue de todos, 27pois jamais recuei, quando era preciso anunciar-vos todos os desígnios de Deus.

    Ao terminar a sua actividade evangelizadora em Mileto, Paulo faz um comovente discurso de adeus, onde se revela como missionário ideal e dirigente excepcional da comunidade cristã. Trata-se de um discurso cheio de densidade humana e inteligência espiritual. Emerge a figura de um homem totalmente dedicado ao serviço do Senhor, um serviço prestado com humildade, coragem e desinteresse. Espera-o um futuro onde não faltarão cadeias e tribulações. Mas conforta-o a presença iluminadora do Espírito por quem se sente seduzido. Nada o detém na corrida para a meta, porque o testemunho do «Evangelho da graça de Deus» (v. 24) é urgente.
    Neste discurso, Lucas acentua a exemplaridade de Paulo. Esta exemplaridade tem fundamento real na vida do apóstolo (cf. 1 Cor 4, 16; 11, 1; Gál 4, 12; 2 Cor 3, 1), mas o evangelista parece carregar as tintas para o apresentar como modelo e exemplo de missionário e pastor para as gerações futuras.

    Evangelho: João 17, 1-11a

    Naquele tempo, 1Jesus ergueu os olhos ao céu e disse: «Pai, chegou a hora! Manifesta a glória do teu Filho, de modo que o Filho manifeste a tua glória, 2segundo o poder que lhe deste sobre toda a Humanidade, a fim de que dê a vida eterna a todos os que lhe entregaste. 3Esta é a vida eterna: que te conheçam a ti, único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem Tu enviaste. 4Eu manifestei a tua glória na Terra, levando a cabo a obra que me deste a realizar. 5E agora Tu, ó Pai, manifesta a minha glória junto de ti, aquela glória que Eu tinha junto de ti, antes de o mundo existir.
    6Dei-te a conhecer aos homens que, do meio do mundo, me deste. Eles eram teus e Tu mos entregaste e têm guardado a tua palavra. 7Agora ficaram a saber que tudo quanto me deste vem de ti, 8pois as palavras que me transmitiste Eu lhas tenho transmitido. Eles receberam-nas e reconheceram verdadeiramente que Eu vim de ti, e creram que Tu me enviaste. 9É por eles que Eu rogo. Não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me confiaste, porque são teus. 10Tudo o que é meu é teu e o que é teu é meu; e neles se manifesta a minha glória. 11Doravante já não estou no mundo, mas eles estão no mundo, e Eu vou para ti.

    Começamos, hoje, a escutar a chamada «oração sacerdotal» de Jesus. Ao contrário dos Sinópticos, que a colocam no Getsémani, João contextualiza-a no Cenáculo. Depois dela, Jesus começa o caminho da paixão e da morte.
    A primeira parte desta oração é composta por dois textos (vv. 1-5 e 6-11ª), ligados entre si pelo tema do dom de todos os homens feito a Jesus pelo Pai. Os vv. 1-5 concentram-se no pedido da glória pela Filho. Estamos no momento mais solene do colóquio de Jesus com os discípulos. Jesus sabe que a sua hora está a chegar, e que a sua missão está próxima do fim. E, «levantando os olhos ao céu» (v. 1), dá início à sua oração.
    Em primeiro lugar, Jesus pede que a sua missão atinja o seu mais elevado objectivo: a sua glorificação, para que o Pai seja glorificado (v. 1-2). O Pai tinha colocado nas mãos do seu Filho Jesus todo o poder, até o de dar a própria vida por aqueles que Lhe confiou. A vida eterna consiste em conhecer o único verdadeiro Deus e Aquele que por Ele foi enviado aos homens, o Filho (v. 3). Esta vida eterna não é a contemplação de Deus, mas aquela que se adquire pela fé. Ao concluir a sua missão na terra, Jesus declara ter glorificado o Pai, realizando a missão que Ele Lhe confiou. Aqueles que acolheram o Filho, e cumprem a sua palavra, também O glorificam.

    Meditatio

    A liturgia oferece-nos, a partir de hoje, a escuta da «oração sacerdotal» que Jesus rezou antes da sua paixão. Essa oração deixa-nos entrever algo da unidade que existe entre Ele e o Pai: «Pai, manifesta a glória do teu Filho... manifesta a minha glória junto de ti...» (v. 1). Jesus pede ao Pai que O glorifique. Está consciente de que «chegou a hora», isto é, o tempo da sua paixão, que é também o tempo da sua
    glorificação, porque é a suprema manifestação do amor do Pai, que «entregou o Filho» (cf. Jo 3, 15), e do Filho que nos amou e se entregou por nós (cf. Ef 5, 1).
    Noutro capítulo do evangelho de João, lemos: «Agora a minha alma está perturbada. E que hei-de Eu dizer? Pai, salva-me desta hora? Mas precisamente para esta hora é que Eu vim! Pai, manifesta a tua glória!» (Jo 12, 27-28). Manifestar a glória do Pai é manifestar o Filho, para que o Filho possa glorificar o Pai: «Manifesta a glória do teu Filho, de modo que o Filho manifeste a tua glória» (v. 1). O Pai não pode ser glorificado, se o Filho o não for. Por isso, quando Jesus pede ao Pai que O glorifique, não está a manifestar qualquer espécie de orgulho, mas, sim, o seu infinito amor pelo Pai. Essa manifestação acontece na sua paixão e morte, em que o Pai intervém para dar a vitória ao Filho, que assume, então, o poder sobre toda a criatura humana e lhe comunica a vida eterna.
    Podemos perguntar: que é a vida eterna? Jesus responde: «Esta é a vida eterna: que te conheçam a ti, único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem Tu enviaste» (v. 3). Conhecer o Deus de Jesus Cristo, conhecer o Filho e o Espírito Santo, conhecê-los não só com a mente, mas também com o coração, conhecê-los estando em comunhão com Eles, conhecê-los esquecendo tudo o mais, esta é a «vida eterna». O resto pertence ao mundo das coisas que passam, à infinita vaidade de tudo, ao que não tem consistência, ao que tem vida efémera, ao que não vale a pena apegar-se. A vida do cristão há-de ser um contínuo progresso no conhecimento de Deus, um perene crescimento na ciência de Cristo, um permanente caminhar no Espírito. Isto também é a vida eterna... desde já!
    A glorificação do Filho acontece particularmente no Pentecostes, quando o Espírito Santo renova os Apóstolos e toda a Igreja. A relação entre o Pai e o Filho não é uma relação fechada, mas aberta, fecunda, tendente a transformar toda a criatura.
    A nossa vocação leva-nos a unirmos ao amor oblativo com que Jesus Cristo se entregou por nós, fazendo-nos novas criaturas, animadas pelo Espírito, levando-nos a entregar-nos também, de corpo e alma, ao serviço da glória de Deus e à salvação dos irmãos. Foi essa a maravilhosa «experiência de fé do Pe. Dehon» (cf. Cst 2-8), e há- de ser essa «a nossa experiência de fé» (Cst 9), «a nossa vocação religiosa» (Cst 15) e, portanto, «a nossa resposta» de «Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus» (Cst 16), doando-nos ao Pai «pelos nossos irmãos com e como Cristo» (Cst 21), «para Glória e Alegria de Deus» (Cst 25). No Antigo Testamento, a palavra «glória» (kabod em hebraico; doxa em grego) indica tudo aquilo que manifesta Deus aos homens, sobretudo como amor gratuito e salvador.

    Oratio

    Senhor Jesus, que pela tua oblação reparadora, me fizeste nova criatura, animada pelo teu Espírito, na comunidade de amor que é a Igreja, dá-me a graça de participar no teu mistério de sofrimento e de alegria, no teu mistério de caridade, para que, em mim e por mim, se manifeste a glória do Pai e a tua glória.
    Infunde no meu coração os dons da ciência e da sapiência, para que possa conhecer-te, saborear-te, amar-te e possuir-te cada vez mais. Infunde em mim o dom do conselho, para que Te procure e conheça no meio das ocupações e preocupações, que enchem a minha vida. Infunde em mim o dom do discernimento, para que possa escolher-Te, no meio de tudo quanto me envolve. Faz-me ver a luz do teu rosto em cada rosto humano, para que sempre busque e encontre a Ti. Que sejas glorificado e conhecido, primeiro e acima de quanto eu mesmo possa ser glorificado. Amen.

    Contemplatio

    Depois que o Salvador deu aos apóstolos as suas últimas recomendações, ergueu os olhos ao céu e rezou pelos sacerdotes:
    Meu Pai, diz, consumei a obra que me havíeis confiado, agora glorificai-me, glorificai a minha humanidade. Recomendo-vos também os meus discípulos. Separei- os do mundo, dei-lhes a conhecer a minha origem e a minha missão, peço-vos insistentemente por eles. Em breve deixá-los-ei para ir para Vós, não os abandoneis, protegei-os por causa de mim. Conservai-os no vosso amor e na caridade fraterna. Que sejam um entre si e connosco. Deverão viver no mundo pelo apostolado, mas peço-vos que os preserveis de toda a influência má. Protegei-os contra o demónio, conservai-os na verdade e na santidade, para que sejam capazes de cumprirem a sua missão. Envio-os ao mundo para o converterem e santificarem, como Vós me enviastes a mim mesmo. Vou agora sacrificar-me e imolar-me por eles, a fim de fecundar o seu ministério. Pelos méritos do meu sacrifício, receberão o Espírito Santo, que será o seu guia, a sua força e o seu santificador (Jo 17) (Leão Dehon, OSP
    4, p. 259).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Pai, manifesta a glória do teu Filho» (Jo 17, 1).

  • 7ª Semana - Quarta-feira - Páscoa

    7ª Semana - Quarta-feira - Páscoa

    4 de Junho, 2025

    7ª Semana - Quarta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 20, 28-38

    Naqueles dias, Paulo disse aos anciãos da Igreja de Éfeso: 28«Tomai cuidado convosco e com todo o rebanho, de que o Espírito Santo vos constituiu administradores para apascentardes a Igreja de Deus, adquirida por Ele com o seu próprio sangue. 29Sei que, depois de eu partir, se hão-de introduzir entre vós lobos temíveis que não pouparão o rebanho 30e que, mesmo no meio de vós, se hão-de erguer homens de palavras perversas para arrastarem discípulos atrás de si. 31Estai, pois, vigilantes e recordai-vos de que, durante três anos, de noite e de dia, não cessei de exortar, com lágrimas, cada um de vós. 32E agora, confio-vos a Deus e à palavra da sua graça, que tem o poder de construir o edifício e de vos conceder parte na herança com todos os santificados. 33Jamais cobicei prata, nem ouro, nem o vestuário de alguém. 34E bem sabeis que foram estas mãos que proveram às minhas necessidades e às dos meus companheiros. 35Em tudo vos demonstrei que deveis trabalhar assim, para socorrerdes os fracos, recordando-vos das palavras que o próprio Senhor Jesus disse: 'A felicidade está mais em dar do que em receber.'»
    36Depois destas palavras, ajoelhou-se com todos eles e orou. 37Todos romperam em pranto e, lançando-se ao pescoço de Paulo, começaram a abraçá-lo, 38consternados, sobretudo, com as palavras que lhes dissera: que não veriam mais o seu rosto. Em seguida, acompanharam-no ao barco.

    O discurso de Mileto tem um carácter intemporal que o torna válido para todos os tempos. Dirigindo-se aos presbíteros, Paulo pede-lhes zelo, humildade renúncia ao próprio egoísmo. Depois de ter falado do seu empenho e responsabilidade na fundação e direcção das comunidades cristãs, o Apóstolo parece querer inculcar esse mesmo empenho e responsabilidade nos presbíteros da Igreja. Eles foram colocados como pastores do rebanho que Deus adquiriu para Si.
    Paulo insiste no dever da vigilância. De facto, perspectivam-se tempos difíceis, com perigos internos e externos à comunidade, sobretudo o despontar de falsas doutrinas: «Sei que, depois de eu partir, se hão-de introduzir entre vós lobos temíveis que não pouparão o rebanho e que, mesmo no meio de vós, se hão-de erguer homens de palavras perversas para arrastarem discípulos atrás de si» (vv. 29.30). Mesmo com sofrimento, o pastor deve vigiar, dia e noite, sobre si, mas também sobre os que lhe estão confiados, para os defender dos inimigos. O Apóstolo está consciente de que pede algo de superior às forças humanas. Por isso, confia os pastores da Igreja «a Deus e à palavra da sua graça, que tem o poder de construir o edifício» (v. 32).
    Com este discurso, Lucas encerra a narração das actividades de Paulo no mundo grego. Esperam o Apóstolo outros trabalhos e provações.

    Evangelho: João 17, 11b-19

    Naquele tempo, Jesus ergueu os olhos ao céu e orou deste modo: Pai santo, guarda-os no teu nome, que Tu me deste, para serem um só, como Nós somos!
    12Enquanto estava com eles, Eu guardava-os no teu nome, que Tu me deste.

    Guardei-os e nenhum deles se perdeu, a não ser o homem da perdição, cumprindo-se desse modo a Escritura. 13Mas agora vou para ti e, ainda no mundo, digo isto para que eles tenham em si a plenitude da minha alegria. 14Entreguei-lhes a tua palavra, e o mundo odiou-os, porque eles não são do mundo, como também Eu não sou do mundo. 15Não te peço que os retires do mundo, mas que os livres do Maligno. 16De facto, eles não são do mundo, como também Eu não sou do mundo. 17Faz que eles sejam teus inteiramente, por meio da Verdade; a Verdade é a tua palavra. 18Assim como Tu me enviaste ao mundo, também Eu os enviei ao mundo, 19e por eles totalmente me entrego, para que também eles fiquem a ser teus inteiramente, por meio da Verdade.

    A segunda parte da «oração sacerdotal» começa com um pedido de Jesus ao Pai, para que proteja aqueles que acreditaram ou hão-de vir a acreditar n´Ele:
    «guarda-os em ti, para serem um só, como Nós somos!» (v. 11b). O texto subdivide-se em duas partes: começa por desenvolver o tema da oposição entre os discípulos e o mundo (vv. 11b-16); depois fala da santificação deles na verdade (vv. 17-19). E o Mestre pede ao Pai que proteja os seus amigos contra a oposição do mundo. Mas aparecem outros temas: a união entre os seus (v. 11), a sua guarda, com excepção de Judas (cf. v. 12), a preservação do maligno e do ódio do mundo (vv. 14s.). Depois vem o tema da santificação dos discípulos: «Faz que eles sejam teus inteiramente, por meio da Verdade; a Verdade é a tua palavra» (v. 17). Numa palavra, Jesus pede ao Pai
    «santo» que torne santos aqueles que Lhe pertencem, para que continuem no mundo a sua missão, sem se deixarem vencer pela força do maligno.

    Meditatio

    As palavras de Paulo, como as de Jesus, são «discursos de adeus». Paulo vê aproximar-se a hora do martírio; Jesus vê aproximar-se a hora de voltar para junto do Pai. Enquanto o discurso de Paulo é dramático, o de Jesus é sereno e cheio de paz. Paulo está preocupado com aqueles a quem confia as comunidades que fundou; Jesus está preocupado com os seus Apóstolos. Tanto Jesus como Paulo querem preservar os discípulos dos perigos e lançá-los como continuadores da missão.
    Paulo lembra aos pastores da Igreja de Éfeso as suas responsabilidades, e fala- lhes dos perigos que os espreitam: «lobos temíveis...homens de palavras perversas...» (v. 29.30). Jesus envia os seus discípulos para o mundo, apesar de saber que o mundo é o lugar do maligno, e que os odeia: «Assim como Tu me enviaste ao mundo, também Eu os enviei ao mundo» (v. 18). Paulo confia os pastores ao Senhor e à palavra da sua graça, que tem poder para edificar e conceder a herança a todos os santificados (cf. v 32), imitando Jesus que confia os discípulos ao Pai: «Pai santo, Tu que a mim te deste, guarda-os em ti, para serem um só, como Nós somos!» (v. 11).
    Os discípulos devem permanecer no mundo, sem se deixar contaminar por ele. Não é coisa fácil. Por isso, Jesus reza: «Por eles totalmente me entrego, para que também eles fiquem a ser teus inteiramente, por meio da Verdade» (v. 19). Os discípulos não devem ter medo. O desafio é grande, mas o poder de Deus é maior. S. Agostinho comenta: «Que quer dizer «por eles totalmente me entrego», se não que os santifico em mim mesmo enquanto eles são eu? De facto, Ele fala dos que são membros do seu corpo».
    Tudo isto nos leva a reflectir, mais uma vez, sobre o poder do mundo, mas também sobre a sua fraqueza. O mundo tem poder sobre quem se deixa seduzir por ele. Mas é fraco para quem se deixa guiar pela palavra de Jesus e pelo seu Espírito. A palavra e o Espírito de Jesus ajudam a discernir os vários rostos do mundo, a distinguir os apelos do Espírito dos subtis enganos do maligno, as mensagens de Deus da mentira do inimigo. E é maior a segurança quando a Palavra e o Espírito não são acolhidos e geridos individualmente, mas recebidos na comunidade dos discípulos, na Igreja.

    Oratio

    Ó Senhor, meu Salvador, com o teu servo Leão Dehon, quero pedir-Te a graça da união, o espírito de união. O lugar propício para essa união é o teu divino Coração. Compreendi que esta união é a fonte de toda a vida espiritual. Daqui em diante, aplicar-me-ei em não lhe pôr obstáculos. Fugirei da dissipação, da tibieza, da negligência. Ajuda-me, meu Deus, e perdoa-me todas as minhas negligências passadas.
    Por mim, quero também confiar-me à tua palavra. Lembra-me que não sou deste mundo, que Te pertenço. Santifica-me na tua verdade, assimila-me à tua mentalidade, à tua vida! Tu, que rezaste por mim, torna-me santo na verdade, para que eu siga sempre pelos teus caminhos, e use este mundo como Tu mesmo o usarias. Amen.

    Contemplatio

    Um dos frutos mais preciosos da vinda do Espírito Santo é a nossa união com Deus, união que será consumada na glória... Para confirmar esta união, Nosso Senhor comunicou-nos a sua vida sobrenatural. A sua vida manifesta-se em nós: agora fui glorificado neles. E como tudo é comum entre o seu Pai, o Espírito Santo e ele, como membros do corpo místico do qual é a cabeça, nós somos participantes da vida divina e, de algum modo, da natureza divina, participantes da natureza divina.
    Mas não esqueçamos as condições desta união: ela é um dom gratuito, é a obra da graça. É preciso, portanto, que sempre nos disponhamos a ela e lhe correspondamos. É por Nosso Senhor, pelo seu amor e pela sua imitação que lá havemos de chegar: Eu sou o caminho, a verdade e a vida. É por ele que vamos ao Pai.
    Procuremos sempre esta união que é a condição de toda a vida sobrenatural. É nesta união que havemos de encontrar a luz nas nossas dúvidas, a consolação nas provações e a força nas dificuldades; evitemos tudo o que se opõe a esta união, o pecado, a tibiez, a negligência, a dissipação, a sensualidade.
    Esta união receberá a sua consumação na vida futura. Nosso Senhor no-la prometeu. Não se afastou de nós senão por um tempo. Voltará para nos levar e nos reunir a ele e nos fazer participar a sua glória na ressurreição, na união eterna com ele. Regressarei e tomar-vos-ei comigo para que, onde Eu estiver, estejais vós também. (Leão Dehon, OSP 3, p. 485s.)

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Pai, que todos sejam um como Nós» (Jo 17, 11).

  • 7ª Semana - Quinta-feira - Páscoa

    7ª Semana - Quinta-feira - Páscoa

    5 de Junho, 2025

    7ª Semana - Quinta-feira - Páscoa

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 22, 30; 23, 6-11

    Naqueles dias, querendo o tribuno averiguar com imparcialidade do que era acusado pelos judeus, fê-lo desalgemar, convocou os sumos sacerdotes e todo o Sinédrio e mandou buscar Paulo, fazendo-o comparecer diante deles.
    6Sabendo que havia dois partidos no Sinédrio, o dos saduceus e o dos fariseus, Paulo bradou diante deles: «Irmãos, eu sou fariseu, filho de fariseus, e é pela nossa
    esperança, a ressurreição dos mortos, que estou a ser julgado.» 7Estas palavras desencadearam um conflito entre fariseus e saduceus e a assembleia dividiu-se,
    8porque os saduceus negam a ressurreição, assim como a existência dos anjos e dos espíritos, enquanto os fariseus ensinam publicamente o contrário. 9Estabeleceu-se
    enorme gritaria, e alguns escribas do partido dos fariseus ergueram-se e começaram a protestar com energia, dizendo: «Não encontramos nada de mau neste homem. E se um espírito lhe tivesse falado ou mesmo um anjo?» 10A discussão redobrou de
    violência, a tal ponto que o tribuno, receando que Paulo fosse despedaçado por eles, mandou descer a tropa para o arrancar das mãos deles e reconduzi-lo à fortaleza.
    11Na noite seguinte, o Senhor apresentou-se diante dele e disse-lhe: «Coragem!
    Assim como deste testemunho de mim em Jerusalém, assim é necessário que o dês também em Roma.»

    A defesa de Paulo diante do Sinédrio é relatada por Lucas de um modo que deixa supor uma profunda elaboração do texto, pois encontramos pormenores inverosímeis e outros que se adaptam às circunstâncias históricas. O Apóstolo fora a Jerusalém para visitar a comunidade e, a conselho de Tiago, tinha subido ao Templo. Descoberto pelos seus adversários, só não perdeu a vida porque interveio o tribuno romano, que até lhe permitiu falar à multidão. Paulo conta, mais uma vez, a história da sua conversão. Mas as suas palavras desencadeiam novo tumulto e o tributo manda reconduzi-lo à fortaleza, onde Paulo se declara cidadão romano. No dia seguinte, é levado ao sinédrio e pronuncia o seu discurso, em que habilmente explora a controvérsia existente entre fariseus e saduceus acerca da ressurreição. A confusão aumenta e, mais uma vez, Paulo é salvo pelos romanos. Mas o Senhor conforta o seu missionário e garante-lhe que o seu testemunho vai continuar, não só em Jerusalém, mas também no centro do próprio Império, em Roma.
    Evangelho: Jo 17, 20-26

    Naquele tempo, Jesus ergueu os olhos ao céu e disse: 20Pai, santo, não rogo só por eles, mas também por aqueles que hão-de crer em mim, por meio da sua palavra, 21para que todos sejam um só, como Tu, Pai, estás em mim e Eu em ti; para que assim eles estejam em Nós e o mundo creia que Tu me enviaste. 22Eu dei-lhes a glória que Tu me deste, de modo que sejam um, como Nós somos Um. 23Eu neles e Tu em mim, para que eles cheguem à perfeição da unidade e assim o mundo reconheça que Tu me enviaste e que os amaste a eles como a mim. 24Pai, quero que onde Eu estiver estejam também comigo aqueles que Tu me confiaste, para que contemplem a minha glória, a glória que me deste, por me teres amado antes da criação do mundo. 25Pai justo, o mundo não te conheceu, mas Eu conheci-te e estes reconheceram que Tu me enviaste. 26Eu dei-lhes a conhecer quem Tu és e continuarei a dar-te a conhecer, a fim de que o amor que me tiveste esteja neles e Eu esteja neles também.»

    Estamos na terceira parte da «oração sacerdotal». Jesus amplia o horizonte, fazendo referência a todos aqueles que, ao longo dos séculos, hão-de acreditar n´Ele pela palavra dos discípulos. Depois pede por todos os crentes (vv. 20-26). Pede especialmente, para eles, uma união e unidade semelhantes às que existem entre o Pai e o Filho, ou melhor ainda, que participem nessa união e nessa unidade (vv. 21-
    23). Pede pela salvação dos discípulos (vv. 24-26).
    Como o Pai está no Filho e o Filho está no Pai, também os crentes hão-de estar com eles, para que o mundo creia que Jesus é o enviado do Pai. Esta unidade é possível pelo amor, a única forma de uma pessoa estar noutra sem perder a sua própria identidade. Mas o amor é obediência, é realização da vontade do Pai.
    Meditatio

    Jesus quis partilhar connosco a glória que o Pai Lhe deu: «Eu dei-lhes a glória que Tu me deste, de modo que sejam um, como Nós somos Um» (v. 22). Que quer dizer o Senhor com estas palavras? Não é certamente a glória mundana, que tantas vezes procuramos, para satisfazer o nosso orgulho e a nossa vaidade. A glória de Cristo é a glória daquele que veio para servir, que se baixou ao nosso nível, que se identificou connosco, que nos lavou os pés. É, portanto, a puríssima glória daquele que jamais procurou a glória e que, por isso mesmo, foi glorificado pelo Pai. É a glória daquele que «se levantou da mesa, tirou o manto, tomou uma toalha e atou-a à cintura e, depois, deitou água na bacia e começou a lavar os pés aos discípulos e a enxugá-los com a toalha que atara à cintura» (Jo 13, 4-5) ou que, como escreve Paulo, «se rebaixou a si mesmo, tornando-se obediente até à morte e morte de cruz. Por isso mesmo é que Deus o elevou acima de tudo e lhe concedeu o nome que está acima de todo o nome» e lhe deu uma glória que está acima de toda a glória, a glória de «Senhor!».
    Trata-se, pois, de uma glória que vem do amor do Pai e que tem por objectivo fazer com que todos «sejam um»: «Eu dei-lhes a glória que Tu me deste, de modo que sejam um, como Nós somos Um» (v. 22). É, pois, uma glória dada por amor, esse amor que está na base da fraternidade entre os discípulos. Essa fraternidade é testemunho seguro e autorizado da verdade da nossa fé cristã. O cristianismo ganha credibilidade, e cresce em credibilidade, quando os fiéis se empenham em viver como irmãos e irmãs, que se aceitam uns aos outros como são para tender à unidade, quando não se deixam levar por rivalidades, mas se ajudam, se apoiam, são benevolentes uns com os outros. Há que ter tudo isto bem presente na vida espiritual, na missão, na pastoral, para darmos testemunho do «amor de Cristo num mundo à procura de uma unidade difícil e de novas relações entre pessoas e grupos» (Cst 43) e para colaborarmos eficazmente na construção de uma nova civilização, a
    «civilização do amor», que será, na terra, um reflexo da comunidade trinitária,
    conforme a oração de Jesus: «Que todos sejam um só. Como Tu, ó Pai, estás em Mim, e Eu em Ti, que também eles estejam em Nós, para que o mundo creia que Tu me enviaste» (Jo 17, 21). Notemos a insistência de Jesus, não só sobre a unidade no amor, mas também sobre a dimensão missionária da comunidade unida no amor. "Ut sint unum" («Para que sejam um») é um dos motes caros ao Pe. Dehon.

    Oratio

    «Ó Jesus, realiza o teu testamento. Vem a mim e dá-me também o amor do Pai. Devo da minha parte fazer o que é próprio para favorecer esta união. Devo viver junto de Ti, Contigo, em Ti, em união com o teu divino Coração, fazendo tão constantemente quanto possível actos de amor, de reconhecimento, de reparação e de oração». Assim Te rezava o teu servo Leão Dehon. Faço minha a sua oração, mas quero também pedir-Te que a graça da união Contigo me leve a empenhar-me na união com todos os meus irmãos e irmãs. Trabalhar pelo teu Reino é, sobretudo, mergulhar na fraternidade, que é sinal da tua presença, da presença do teu Reino. A tua mensagem, muitas vezes, não emerge, porque não emergem comunidades fraternas realizadas. Faz-me compreender o mistério da união Contigo, mas também o mistério da fraternidade e a força missionária da comunhão. Amen.
    Contemplatio

    «Quero que, onde eu estiver, eles estejam comigo». É a promessa do céu, a promessa da visão intuitiva e da posse de Deus: «Quero que eles vejam a minha glória, Ut videant claritatem meam». É mais do que uma oração, mais do que um desejo, Nosso Senhor exprime uma vontade, fala ao seu Pai como de igual para igual. Pede que os seus discípulos sejam testemunhas da glória que o seu Pai lhe destinou desde toda a eternidade.
    Depois recorda sumariamente as condições desta beatitude para os seus discípulos: «O mundo não os conhece, diz a seu Pai, e por causa disso não chega à salvação nem à glória do céu. Mas eu conheci-vos e vós me glorificastes. Os meus apóstolos conheceram-vos em mim, compreenderam que eu era vosso enviado. Dei- lhes a conhecer o vosso nome e dá-lo-ei a conhecer ainda mais».
    Conhecer Deus, conhecer prática e progressivamente Jesus e a revelação, eis,
    portanto, o caminho da beatitude.
    Este conhecimento começou pelo ensino comum da Igreja. Ele cresce sempre mais pelas luzes mais abundantes que Nosso Senhor comunica àqueles que se aplicam a conhecê-lo na oração e no recolhimento. Deve estar unido ao amor, que cresce em nós nas mesmas proporções. Quanto mais conhecemos a Deus mais o amamos, quanto mais nos tornamos dignos do seu amor, mais nos unimos intimamente com ele e com Jesus Cristo.Eis o caminho, eis a via: melhor conhecer Nosso Senhor para melhor o amar.
    «Pai, que o amor com que me amastes esteja neles e eu neles!». São as últimas palavras do testamento do Sagrado Coração. Nosso Senhor podia mostrar-se mais amoroso e mais terno por nós? Pensemos bem nestas palavras: «Meu Pai, amai- os como me amastes a mim desde toda a eternidade. Amai-me neles, amai-os como meus irmãos, como outros que eu mesmo...».
    Que diríamos nós sobre a terra de um príncipe real que dissesse ao seu pai:
    «Eis alguns dos vossos súbditos, adoptai-os como vossos filhos, amai-os como me amais a mim, dai-lhes uma parte da minha herança...». Isto seria o cúmulo da amizade, da abnegação, da dedicação, e isto nunca se viu, mas Nosso Senhor pediu isto por nós a seu Pai. E acrescentou: «E eu mesmo estarei neles, et ego in ipsis. Habitarei neles, viverei nos seus corações, serei um só com eles...».
    Foi esta união divina que nos foi prometida. Tornamo-nos participantes da natureza divina; divinae consortes naturae, como diz S. Pedro.
    Esta união estabelece-se pelo estado de graça e acrescenta-se cada dia pela vida interior. Está à minha disposição e posso torná-la todos os dias mais íntima. Que loucura se o não fizesse! (Leão Dehon, OSP 3, p. 490s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Qj.Je todos sejam um» ( Jo 17, 21 ).

  • 7ª Semana - Sexta-feira - Páscoa

    7ª Semana - Sexta-feira - Páscoa

    6 de Junho, 2025

    7ª Semana - Sexta-feira - Páscoa

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 25, 13-21

    Naqueles dias, 13o rei Agripa e Berenice chegaram a Cesareia e foram apresentar cumprimentos a Festo. 14Como se demorassem vários dias, Festo expôs ao rei o caso de Paulo, dizendo: «Está aqui um homem que Félix deixou preso, 15e contra o qual, estando eu em Jerusalém, os sumos-sacerdotes e os Anciãos dos judeus apresentaram queixa, pedindo a sua condenação. 16Respondi-lhes que não era costume dos romanos conceder a entrega de homem algum, antes de o acusado ter os acusadores na sua frente e dispor da possibilidade de se defender da acusação. 17Vieram, pois, comigo e, sem mais demoras, sentei-me, no dia seguinte, no tribunal e mandei comparecer o homem. 18Postos em frente dele, os acusadores não alegaram nenhum dos crimes que eu pudesse suspeitar; 19só tinham com ele discussões acerca da sua religião e de um certo Jesus, que morreu e Paulo afirma estar vivo. 20Quanto a mim, embaraçado perante um debate deste género, perguntei-lhe se queria ir a Jerusalém, a fim de lá ser julgado sobre o assunto.
    21Mas Paulo apelou para que a sua causa fosse reservada à decisão de Augusto e eu ordenei que o mantivessem preso até o enviar a César.»

    Paulo estava na prisão havia dois anos por ordem do procurador Félix que se tinha negado a pô-lo à disposição dos Judeus. Três dias depois da chegada de Pórcio Festo, os Judeus voltaram à carga, na esperança de que o novo procurador aproveitasse a oportunidade para se reconciliar com eles. Mas Festo preferiu actuar de acordo com o direito romano. Homem honesto, deu-se conta de que o que verdadeiramente dividia os Judeus do Apóstolo não era uma qualquer doutrina, mas um acontecimento, a ressurreição de Jesus. E propôs a Paulo ser julgado em Jerusalém, na sua presença. O Apóstolo não aceitou e apelou para César, na esperança de anunciar o Evangelho na própria capital do império.

    Aproveitando a passagem do rei Agripa por Cesareia, Festo expôs-lhe questão. Agripa interessou-se, quis ouvir pessoalmente Paulo e reconheceu a sua inocência. O Apóstolo não deixou perder a boa ocasião para anunciar ao rei e à sua corte a Boa Nova da Ressurreição, a ponto de Agripa afirmar: «Por pouco não me persuades a fazer-me cristão» (Act 26, 28). A Ressurreição de Jesus tornou-se tema de conversa na corte.

    Paulo não perde uma única oportunidade de anunciar Cristo Morto e Ressuscitado. Já antes, o fizera diante do Sinédrio (Actos 23, 6ss.) e diante de Pórcio Festo. Tirando partido dos seus direitos de cidadão romano, dispõe-se a ir testemunhar em Roma, diante do Imperador.
    A coragem de Paulo é espantosa e obriga várias categorias de pessoas a confrontar-se com o acontecimento da ressurreição de Jesus, fundamento do novo caminho de salvação, cuja notícia se ia espalhando pelo mundo.

    Evangelho: João 21, 15-19

    Quando Jesus se manifestou aos seus discípulos junto ao mar de Tiberíades, depois de terem comido, Jesus perguntou a Simão Pedro: «Simão, filho de João, tu amas-me mais do que estes?» Pedro respondeu: «Sim, Senhor, Tu sabes que eu gosto muito de ti.» Jesus disse-lhe: «Apascenta os meus cordeiros.» 16Voltou a perguntar- lhe uma segunda vez: «Simão, filho de João, tu amas-me?» Ele respondeu: «Sim, Senhor, Tu sabes que eu gosto muito de ti.» Jesus disse-lhe: «Apascenta as minhas ovelhas.» 17E perguntou-lhe, pela terceira vez: «Simão, filho de João, tu gostas muito de mim?» Pedro ficou triste por Jesus lhe ter perguntado, à terceira vez: 'Tu gostas muito de mim?' Mas respondeu-lhe: «Senhor, Tu sabes tudo; Tu bem sabes que eu gosto muito de ti!» E Jesus disse-lhe: «Apascenta as minhas ovelhas. 18*Em verdade, em verdade te digo: quando eras mais novo, tu mesmo atavas o cinto e ias para onde querias; mas, quando fores velho, estenderás as mãos e outro te há-de atar o cinto e levar para onde não queres.» 19E disse isto para indicar o género de morte com que ele havia de dar glória a Deus. Depois destas palavras, acrescentou:
    «Segue-me!»

    Simão é o centro da atenção do evangelista João, no texto que hoje lemos. O pescador da Galileia é chamado a ser pastor (vv. 15-17) e a dar testemunho de Cristo pelo martírio (vv. 18s.).
    Jesus exige a Pedro uma confissão de fé e de amor, antes de lhe confiar o cuidado pastoral da Igreja. Trata-se de uma condição indispensável para o exercício da função de guia espiritual. Jesus pede três vezes essa confissão a Pedro.
    A insistência de Jesus no amor compreende-se na relação de filial intimidade que Pedro tinha com Ele. No serviço pastoral, a relação de confiança e de comunhão com o Senhor precede a exigência das próprias qualidades humanas. Jesus conhece intimamente Pedro. Mas exige-lhe uma confissão explícita de fé e de amor. E, então, confia-lhe o serviço pastoral da Igreja: «Apascenta as minhas ovelhas» (v. 17).
    Depois do ministério pastoral, virá o testemunho do martírio. O verdadeiro amor vai até ao dom da própria vida: «Ninguém tem mais amor do que quem dá a vida pelos seus amigos» (Jo 15, 13).
    «Segue-me» (v. 19). Este mandato do Senhor é uma clara referência a outras palavras, tais como: «Não podes seguir-me agora; seguir-me-ás depois» (Jo 13, 36).

    Meditatio

    O procurador Festo resume ao rei Agripa a pregação de Paulo: «Os acusadores não alegaram nenhum dos crimes que eu pudesse suspeitar; só tinham com ele discussões acerca da sua religião e de um certo Jesus, que morreu e Paulo afirma estar vivo» (v. 19-29). Paulo pregava Jesus morto e ressuscitado. Era essa a razão pela qual os seus acusadores o queriam ver condenado.
    No evangelho, vemos Jesus, que esteve morto mas agora está vivo, a manifestar-se aos Apóstolos. Não se trata de um fantasma, mas de verdadeiro corpo humano, com um coração igualmente humano, que deseja ser amado: «Simão, filho de João, tu amas-me?» (v. 15). Pedro responde com modéstia. Ama o Senhor, mas não o diz com a mesma segurança em si com que o dizia antes da paixão, quando O negou. Experimentou a sua fragilidade, a sua inconstância e aprendeu que só o Senhor pode tornar consistente e forte o seu amor. Por isso, repete três vezes:
    «Senhor, Tu sabes que eu gosto muito de ti» (v. 15). Jesus nada mais pretende do

    que essa afirmação de amor para lhe confiar a Igreja: «Apascenta as minhas ovelhas!» (v. 15). O serviço a
    postólico fundamenta-se nesta ligação íntima com o Senhor. As qualidades humanas ajudam, e são até muito importantes. Mas de pouco valem sem a união com Jesus, o Supremo Pastor da Igreja. É Ele a fonte do amor com que somos chamados a amar a Deus, e a amar-nos uns aos outros. O único amor verdadeiramente consistente é aquele que vamos beber ao Coração de Cristo. Só esse amor nos torna capazes de seguir o Senhor até ao martírio, como aconteceu com Pedro. Antes da paixão, tinha perguntado a Jesus: «Senhor, para onde vais?». Jesus tinha-lhe respondido: «Para onde Eu vou tu não me podes seguir por agora; hás-de seguir-me mais tarde» (Jo 13, 36). Pedro parece não ter gostado da resposta e ripostou: «Por que não posso seguir-te agora? Eu daria a vida por ti!». Sabemos o que aconteceu poucas horas depois: negou o seu Senhor e Mestre, três vezes. Só podemos amar o Senhor e dar a vida por Ele, porque Ele nos amou e deu a vida por nós. Depois da sua Morte e Ressurreição é que Jesus convida Pedro a segui-Lo até à morte, dando por Ele a maior prova de amor.
    Abrir-nos ao amor de Cristo, acolhê-lo, é o fundamento de toda a generosidade: «Nisto consiste o Seu amor: não fomos nós que amámos a Deus, mas foi Ele, que nos amou... Amou-nos por primeiro...» (1 Jo 4, 19).

    Oratio

    Que hei-de dizer-te hoje, Senhor, perante a confissão de fé e de amor de Pedro? Aqui está a vida, o seu mistério, a sua luz, o seu sabor, o seu significado! Todas as outras questões não passam de simples ocasiões para Te dizer o meu «sim». Criaste-me para dizeres que me amas, e para pedir-me que corresponda ao teu amor. Pedes-mo como um mendigo! De facto, enviaste-me o teu Filho como servo para que não te sirva por medo, ou por espanto diante da tua grandeza, mas unicamente por amor. Tocaste-me o coração com a tua benevolência e a tua humildade. Conquistaste-me com o teu rosto desfigurado na cruz.
    Ainda que, como Pedro tenha hesitado, ou pecado, quero hoje dizer-te que Te amo, que quero amar-Te toda a vida, que jamais quero separar-me de Ti, que estou disposto a perder tudo por Ti.
    Dá-me a fé e o amor ardente de Pedro, e dá-me a coragem de Paulo para que, vivendo em Ti e para Ti, testemunhe a ressurreição do teu Filho Jesus, e o teu amor que excede todo o conhecimento. Amen.

    Contemplatio

    S. Paulo foi uma vítima sempre imolada pela glória de Deus e a salvação das almas. Nosso Senhor tinha dito: «Mostrar-lhe-ei tudo o que terá de sofrer pelo meu nome» (Act 1, 16). Sabia-se vítima. Dizia: «Não quero gloriar-me senão na cruz de Jesus. - Levo no meu corpo os seus estigmas» (Gal 6). «Gastar-me-ei e gastarei tudo pela salvação das vossas almas» (2Cor 12, 15). Enumera na sua segunda carta aos Coríntios tudo o que sofreu por Cristo: foi flagelado pelos Judeus; por três vezes foi flagelado e apedrejado três vezes. Três vezes naufragado; passou um dia e uma noite no fundo do mar. Sofreu a fome, a sede, o frio, a nudez. Deu a fórmula do puro amor quando disse: «Quer comais, quer bebais, quer façais qualquer outra coisa, fazei tudo pela glória de Deus» (1Cor 10, 31). Finalmente, morreu por Cristo como desejava, feliz por dar a sua vida por aquele que morreu por nós. S. Paulo tinha eminentemente Pedro é apóstolo do Sagrado Coração. - Pedro está entre os íntimos do Coração de Jesus. Está sempre junto de Jesus com João e Tiago (Leão Dehon, OSP 3, p 707).

    S. João amava Jesus mais ternamente. S. Pedro amava fortemente, amava muito porque muito lhe tinha sido perdoado. Caminhou sobre as águas para ir ter com Jesus. Defende Jesus ferindo Malco. Tem um momento de fraqueza no Sinédrio, mas repara-o generosamente com as suas lágrimas. Opõe a sua tríplice confissão de amor à sua tríplice negação. Jesus tinha-o mantido sempre entre os seus preferidos, com André, Tiago e João. Foram os primeiros que chamou. Foi viver em casa de Pedro. Toma-o consigo no Tabor, envia-o a preparar a Ceia com João, leva-o também para junto de si na agonia. Pedro e João correm ao túmulo. Jesus manda avisar Pedro a respeito da sua ressurreição e aparece-lhe em particular. É sempre a intimidade, sempre a união. O chefe da Igreja deve aliás possuir eminentemente o que possuem os seus membros. João é o apóstolo do Sagrado Coração, Pedro devia sê-lo também, embora com matizes na forma (Leão Dehon, OSP 3, p.703s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Senhor, Tu sabes que Te amo!» (Jo 21, 17).

  • 7ª Semana - Sábado - Páscoa

    7ª Semana - Sábado - Páscoa

    7 de Junho, 2025

    7ª Semana - Sábado - Páscoa

    Lectio

    Primeira leitura: Actos 28, 16-20.30s.

    16Quando entrámos em Roma, Paulo foi autorizado a ficar em alojamento próprio com o soldado que o guardava. 17Três dias depois, convocou os principais dos judeus e, quando estavam todos reunidos, disse-lhes:«Irmãos, embora nada tenha feito contra o povo ou contra os costumes paternos, fui preso em Jerusalém e entregue às mãos dos romanos. 18Estes, depois de me terem interrogado, queriam libertar-me, por não haver em mim crime algum digno de morte. 19Mas, como os judeus se opuseram, fui constrangido a apelar para César, sem querer, de modo algum, acusar o meu povo. 20Foi por este motivo que pedi para vos ver e falar, pois é por causa da esperança de Israel que trago estas cadeias.» 30Paulo permaneceu dois anos inteiros no alojamento que alugara, onde recebia todos os que iam procurá-lo, 31anunciando o Reino de Deus e ensinando o que diz respeito ao Senhor Jesus Cristo, com o maior desassombro e sem impedimento.

    Entre a leitura de ontem e a de hoje, temos a narrativa da atribulada viagem de Paulo até Roma: parte de Cesareia para a ilha de Creta, sofre uma grande tempestade durante 14 dias, demora-se em Malta, viaja até Roma e é calorosamente recebido pela comunidade cristã. Na capital do Império, o Apóstolo vive uma liberdade vigiada, que aproveita para anunciar o Reino de Deus com muita coragem.
    A obra de Lucas atingiu o objectivo: nada nem ninguém pode deter o caminho da Palavra, que chega ao coração do Império e é pregada «nos extremos confins da terra». Paulo é uma das muitas testemunhas de Jesus. É um modelo, um campeão da fé e do testmunho da mesma, mas não é o único. Paulo cumpriu a sua missão com fidelidade e coragem exemplares. Mas todo o cristão há-de ser testemunha da Ressurreição. Em todo o tempo e lugar, em todas as circunstâncias, o discípulo há-de proclamar Jesus como «Senhor» e Salvador, porque «a palavra de Deus não pode ser acorrentada» (2 Tm 2, 9).

    Evangelho: João 21, 20-25

    Naquele tempo, 20Pedro voltou-se e viu que o seguia o discípulo que Jesus amava, o mesmo que na ceia se tinha apoiado sobre o seu peito e lhe tinha perguntado: 'Senhor, quem é que te vai entregar?' 21Ao vê-lo, Pedro perguntou a Jesus: «Senhor, e que vai ser deste?» 22Jesus respondeu-lhe: «E se Eu quiser que ele fique até Eu voltar, que tens tu com isso? Tu, segue-me!» 23Foi assim que, entre os irmãos, correu este rumor de que aquele discípulo não morreria. Jesus, porém, não disse que ele não havia de morrer, mas sim: «Se Eu quiser que ele fique até Eu voltar, que tens tu com isso?»
    24Este é o discípulo que dá testemunho destas coisas e que as escreveu. E nós sabemos bem que o seu testemunho é verdadeiro. 25Há ainda muitas outras coisas
    que Jesus fez. Se elas fossem escritas, uma por uma, penso que o mundo não teria espaço para os livros que se deveriam escrever.

    No epílogo do evangelho de João, o discípulo amado aparece, mais uma vez, com Pedro. A presença de Pedro, cuja autoridade é reconhecida, serve para acreditar a de João e, de algum modo, a autoridade do próprio quarto evangelho que, directa ou indirectamente remonta ao discípulo amado.
    Quando o quarto evangelho foi escrito, os mártires eram já tidos em grande
    consideração. A morte de um mártir era o modo mais elevado de glorificar a Deus. Jesus tinha predito o martírio de Pedro. Mas não terá dito nada sobre o «outro discípulo»? Claro que disse: «Se Eu quiser que ele fique até Eu voltar, que tens tu com isso? Tu, segue-me!» (v. 22). Os primeiros cristãos julgavam iminente a segunda vinda de Jesus. Embora muitos morressem, muitos outros viveriam até ao regresso do Senhor. Entre eles, João. Mas a vinda do Senhor não aconteceu como pensavam. O próprio quarto evangelho inculca seriamente a presença, a actualidade das realidades escatológicas: o juízo final, a vida eterna... têm lugar aqui e agora, ainda que isso não exclua a dimensão do futuro. A morte do discípulo amado, entretanto ocorrida, desconcertou muito gente, e foi preciso esclarecer a sentença ambígua de Cristo. O capítulo 21 foi acrescentado para corrigir a má interpretação das palavras de Jesus. Esclarece-se, diante do testemunho de Pedro, o testemunho do discípulo que Jesus amava, testemunho que está na base do quarto evangelho. «E nós sabemos bem que o seu testemunho é verdadeiro» (v. 24). O «nós» indica a comunidade de discípulos que surgiu à volta do testemunho de João.

    Meditatio

    Estamos na vigília do Pentecostes. As leituras deste sábado não falam directamente do Espírito Santo, mas falam de testemunho. Do testemunho de João, que «dá testemunho destas coisas e que as escreveu» (v. 24) e do testemunho de Paulo, que «recebia todos os que iam procurá-lo, anunciando o Reino de Deus e ensinando o que diz respeito ao Senhor Jesus Cristo, com o maior desassombro e sem impedimento» (vv. 30-31).
    O testemunho do Evangelho é fruto da presença do Espírito Santo. É o que
    vemos no relato do Pentecostes (Actos 2, 1ss.): recebido o Espírito Santo, aqueles homens inconstantes e tímidos tornam-se apóstolos decididos e corajosos em Jerusalém, na Samaria, na Galileia e até aos confins da terra. O Espírito Santo é o protagonista da evangelização: por meio d´Ele, difunde-se a boa nova do Evangelho; é Ele que indica os caminhos a seguir, e as pessoas a escolher; os Apóstolos foram escolhidos por Jesus «no Espírito Santo» (Act 1, 2); foi o Espírito que ordenou:
    «Separai Barnabé e Paul para o trabalho (missão) a que Eu os chamei» (Act 13, 2); os Apóstolos afirmam: «O Espírito Santo e nós próprios resolvemos...» (Act 15, 28); o Espírito Santo proíbe a Paulo e a Timóteo «pregar a Palavra na província da Ásia» (Act 16, 6) e também na Bitínia (cf. Act 16, 7). Apenas lhes resta um caminho a percorrer, o caminho indicado pelo Espírito, que os levará à Macedónia, na Grécia e, portanto, à Europa (cf. Act 16, 9ss). «Movidos pelo Espírito Santo esses homens falaram em nome de Deus» (2 Pe 1, 21).
    A Igreja sempre acolheu o testemunho dos Apóstolos como verdadeiro, porque inspirado pelo Espírito Santo. Acolheu o testemunho de Pedro e o dos outros Apóstolos, incluindo o de João, definitivamente consignado por escrito pelos seus discípulos, já em finais do século I: «nós sabemos bem que o seu testemunho é verdadeiro» (v. 24), escrevem esses discípulos. É esse testemunho verdadeiro, de João e dos outros Apóstolos, que a Igreja contin
    ua a transmitir ao longo dos séculos para acreditarmos «que Jesus é o Messias, o Filho de Deu», e, crendo, tenhamos vida n´Ele (cf. Jo 20, 31.

    Oratio

    Senhor Jesus, perdoa as minhas curiosidades inúteis e faz-me ouvir o teu amoroso convite: «Segue-me», como o fizeste ao teu discípulo Pedro, e dá-me a graça da fidelidade até ao fim.
    Que o teu apóstolo João, seja o meu guia na descoberta do amor do teu
    coração, na assiduidade e na delicadeza com que quero realizar o teu serviço. Com o teu discípulo amado, e como ele, quero seguir-Te em toda, fazendo sempre o que mais Te agrada. Infunde em mim o teu Espírito Santo. Que Ele seja a minha força, o garante da minha fidelidade. Amen.

    Contemplatio

    S. João teve com Jesus todos os laços mais íntimos: foi seu familiar, seu discípulo, seu amigo, seu herdeiro. Tiago e João eram filhos de Salomé, a parente de Maria. Chamavam-nos os irmãos de Jesus; era costume chamar irmãos os parentes próximos. João deve ter conhecido Jesus em menino.
    Com Santo André, foi o primeiro que se ligou a Ele como discípulo (Jo 1,37). Tendo ouvido João Baptista chamar Jesus o Cordeiro de Deus, comprazia-se muito com doçura deste nome, meditava nele sem cessar, recorda-o muitas vezes no Apocalipse.
    S. João está sempre junto de Jesus. Quando Jesus chama à parte alguns apóstolos, para os seus mais belos milagres, para a transfiguração, para a agonia, S. João está sempre.
    Está sentado junto de Jesus. S. Pedro sabe bem que João é o amigo e que por ele poderá conhecer os segredos que Jesus não revela a todos.
    S. João pode contar em pormenor o discurso depois da Ceia, porque melhor que os outros ele tudo escutou e compreendeu.
    S. João ama como é amado. Segue Jesus por toda a parte. (Petrus vidit illum sequentem). Segui-lo-á até ao Calvário. Assiste à morte de Jesus, ao misterioso golpe de lança, ao enterro. Vê de perto o lado de Jesus aberto. Abraça-o sem dúvida como devia um dia fazer S. Francisco (Haurietis aquas in gaudio).
    S. João é o herdeiro de Jesus, que lhe legou a sua mãe e necessariamente com ela a casa de Nazaré e as recordações.
    Jesus disse a Pedro que João deve esperá-lo e recebê-lo sobre a terra. Voltarão a ver-se em Patmos. João irá reencontrar lá o divino Cordeiro com o lado ferido: Agnum occisum... quem pupugerunt.
    Ó divina amizade, que merece uma contemplação e uma admiração eterna! (Leão Dehon, OSP 4, p. 591s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Tu, segue-me!» (Jo 21, 22).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - X Semana - Segunda-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - X Semana - Segunda-feira

    9 de Junho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: 2 Coríntios 1, 1-7

    Paulo, apóstolo de Cristo Jesus por vontade de Deus, e o irmão Timóteo, à igreja de Deus que está em Corinto, como a todos os santos que estão na Acaia inteira, 2a vós, graça e paz da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo. 3Bendito seja Deus e Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai das misericórdias e o Deus de toda a consolação! 4Ele nos consola em toda a nossa tribulação, para que também nós possamos consolar aqueles que estão em qualquer tribulação, mediante a consolação que nós mesmos recebemos de Deus. 5Na verdade, assim como abundam em nós os sofrimentos de Cristo, também, por meio de Cristo, é abundante a nossa consolação. 6Se somos atribulados, é, pois, para vossa consolação e salvação. Se somos consolados, é para vossa consolação, que vos faz suportar os mesmos sofrimentos que também nós padecemos. 7E a nossa esperança a respeito de vós é firme, porque sabemos que, assim como sois participantes dos nossos sofrimentos, também o haveis de ser da nossa consolação.

    No começo da primeira parte da Segunda Carta aos Coríntios, Paulo dá graças a Deus por ter sido libertado do perigo de morte na Ásia. É um começo suave e humilde de uma carta bastante polémica em que o Apóstolo se defende das calúnias, que lhe dirigiam certos membros dessa comunidade, que ele próprio fundara. Mas Paulo também encontrou consolações em Corinto, particularmente o "sucesso" obtido com esta dura carta. De facto, alcançou a reconciliação e recuperou a confiança recíproca. O Apóstolo reconhece que essa consolação lhe vem de Deus, e que a pode partilhar com os irmãos. O versículos 8-11, omitidos no leccionário, elencam os sofrimentos suportados e libertações alcançadas graças à oração de muitos.

    Evangelho: Mateus 5, 1-12

    Naquele tempo, 1ao ver a multidão, Jesus subiu a um monte. Depois de se ter sentado, os discípulos aproximaram-se dele. 2Então tomou a palavra e começou a ensiná-los, dizendo: 3«Felizes os pobres em espírito, porque deles é o Reino do Céu. 4Felizes os que choram, porque serão consolados. 5Felizes os mansos, porque possuirão a terra. 6Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados. 7Felizes os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. 8Felizes os puros de coração, porque verão a Deus. 9Felizes os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus. 10Felizes os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o Reino do Céu. 11Felizes sereis, quando vos insultarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o género de calúnias contra vós, por minha causa. 12Exultai e alegrai-vos, porque grande será a vossa recompensa no Céu; pois também assim perseguiram os profetas que vos precederam.»

    Começamos hoje a ler o primeiro dos cinco grandes discursos em que Mateus agrupou os ensinamentos de Jesus. Este primeiro discurso, o «Sermão da Montanha», ou a Magna Carta do Reino, como alguém já lhe chamou, vai prolongar-se pelos capítulos sexto e sétimo. Mateus, além das mais importantes exigências éticas de Jesus aos seus discípulos, narra dez milagres (cc. 8-9). Assim nos apresenta Cristo mestre, cuja palavra divina, não só é autorizada, mas também eficaz.
    Mateus apresenta Cristo como o novo Moisés, aquele que promulga a nova lei, sobre o monte das Bem-aventuranças, de que o Sinai fora antecipação. No discurso das Bem-aventuranças, o evangelista colecciona e sistematiza ensinamentos ministrados por Jesus em diversas ocasiões. Assim seria mais fácil e prático utilizá-los na pregação e no ensino da Igreja.
    A expressão «pobres em espírito», ainda que não se encontre no Antigo Testamento, reflecte um aspecto fundamental do mesmo: a expectativa do Reino por parte dos pequenos e humildes. Estes hão-de possuir a terra (cf. Sl 37, 11) e, portanto, o Reino, que começa já agora. Por isso, é que é «deles é o Reino do Céu» (v. 3).
    A consolação é apresentada como um traço característico de Deus, e dom messiânico por excelência (Is 61, 2; cf. Lc 2, 25). O próprio Cristo se considera consolador e, a esse título, anuncia o dom do Espírito Santo (Jo 14, 26; 15, 26; 16, 7.
    O termo justiça indica o recto cumprimento da vontade divina, realizado com entusiasmo e determinação (fome e sede), conota o acesso à salvação, e será a razão de ser da incarnação do Verbo, cujo nome será «Senhor-nossa-Justiça» (Jr 23, 6).
    A expressão «coração puro» é recorrente na Sagrada Escritura e é sinónimo de «coração simples» (cf. Sl 24, 3s; 51, 12; 73, 13; Pr 22, 11; Sab 1, 1: Ef 6, 5). O homem de coração puro verá a Deus, não nesta terra, mas nos céus, onde «O veremos tal qual é» (1 Jo 3, 2), «face a face» (1 Cor 13, 12).
    «Obreiro da paz» é o próprio Deus (Cl 1, 20), tantas vezes definido como «Deus da paz».
    A perseguição «por causa da justiça» não é outra coisa senão o preço a pagar pela coerência e pelo testemunho evangélico.

    Meditatio

    Nesta semana, e na próxima, escutaremos textos da Segunda Carta de Paulo aos Coríntios e do Sermão da Montanha apresentado por S. Mateus nos capítulos 5 a 7 do seu evangelho. Nos dois livros, somos desafiados por Cristo de modo forte e incisivo. Em Paulo, o desafio parte da imagem do servo do Evangelho, delineada na "orgulhosa" auto-biografia do Apóstolo de Jesus Cristo por vontade de Deus. Em Mateus, temos o desafio da identidade do discípulo evangélico, colocado por Jesus na dimensão da bem-aventurança, que vai mais além do que é comum. Mas tanto a carta de Paulo, como o sermão de Jesus, estão de acordo no anúncio e na experiência de uma felicidade. Paulo identifica a felicidade com a consolação recebida de Deus como dom, Pai misericordioso, e partilhada com os irmãos. Jesus assimila a felicidade à bem-aventurança, como consciência dos bens confiados à pessoa humana tornada discípula. Esta felicidade também se chama alegria, serenidade, exultação, bem-estar, fortuna, consolação e bem-aventurança. O homem anseia por esta felicidade, tanto como pessoa, como sociedade. O salmo responsorial reflecte esse anseio: «Procurei o Senhor e Ele atendeu-me... Este pobre clamou e o Senhor o ouviu, salvou-o de todas as angústias».
    A condição para sermos consolados é aceitar, antes, a tribulação. Deus só pode consolar os que estão tristes, atribulados, desolados. É precisa uma situação negativa para
    que Deus possa realizar a sua obra positiva: «Felizes os que choram, porque serão consolados» (v. 4). E também Paulo escreve: «como abundam em nós os sofrimentos de Cristo, também, por meio de Cristo, é abundante a nossa consolação» (v. 5). É preciso lutar com Deus na desolação para receber a vitória, a consolação divina, porque não há vitória sem combate.
    A desolação pode ser pesada e tornar-se tentação para deixar de acreditar em Deus. Mas é na desolação que Deus quer consolar-nos. E consola-nos se lutamos e permanecemos firmes na fé e na esperança.
    A luta trava-se na oração, talvez difícil, porque a verdadeira desolação faz-nos sentir a oração penosa. Mas é preciso permanecer junto à cruz do Senhor, para que os nossos sofrimentos se tornem sofrimentos de Cristo, prelúdio de vitória e de consolação, que nos devolvem a certeza feliz de que Deus nos ama e está connosco. As tribulações de Paulo, e o seu estado de desolação, são provocados pelo ardor em pregar o Evangelho, surgem no seu coração de apóstolo: «Se somos atribulados, é, pois, para vossa consolação e salvação. Se somos consolados, é para vossa consolação, que vos faz suportar os mesmos sofrimentos que também nós padecemos» (v. 6). É pois um caminho para todos, particularmente para aqueles que querem ser verdadeiros apóstolos.
    Como dehonianos, queremos ser «servidores da reconciliação» (Cst 7), em união «com a oblação reparadora de Cristo ao Pai pelos homens» (Cst 6). Na nossa solidariedade com Cristo nada de essencial temos para Lhe dar; é uma solidariedade de comunhão com Ele (cf. Gl 2, 20). Completamos na nossa "carne o que falta aos sofrimentos de Cristo pelo Seu Corpo que é a Igreja" (Cl 1, 24). O que falta aos sofrimentos de Cristo são os sofrimentos dos seus enviados, dos seus missionários, que vão levar a Boa Notícia da Salvação realizada na morte e ressurreição do Senhor até aos confins da Terra.

    Oratio

    Senhor, nosso refúgio e fortaleza, nós Te louvamos e bendizemos, porque nos permites experimentar a tribulação, estás connosco e nos tornas capazes de uni-la à tua própria tribulação para glória do Pai e salvação do mundo. Nós Te louvamos e bendizemos, porque nos revelas o caminho seguro para a Felicidade, para a Bem-aventurança, o caminho que o teu Filho percorreu. Da cruz à luz! Obrigado pela pobreza iluminada pelo Espírito Santo, pelas aflições serenadas pela consolação que nos ofereces. Obrigado pela mansidão e pela paz experimentadas pelos teus filhos. Obrigado pela justiça entremeada pela graça que sacia, pela misericórdia alegre na partilha, pela pureza de coração orientada para visões divinas, pelas cruzes que marcam o itinerário do teu Filho crucificado, morto e ressuscitado. Amen.

    Contemplatio

    S. Paulo está apaixonado de amor por Cristo. O nome de Jesus está sempre nos seus lábios e na sua pena. A sua vida é Cristo: Para mim, viver é Cristo. Os seus êxtases e as suas visões foram o fruto do seu fervor. O seu amor por Cristo é indomável e invencível: «Quem poderia, diz, separar-nos do amor de Cristo? As tribulações? As angústias? A fome? O despojamento? Os perigos? As perseguições? A espada? Não, diz, ultrapassaremos tudo isso pelo amor daquele que nos amou primeiro. - Estou certo, diz, que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as virtudes, nem o presente, nem o futuro, nem a força, nem a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura poderá jamais separar-nos do amor de Cristo Jesus» (Rm 8). Nenhum homem formulou alguma vez um acto de amor mais vivamente apaixonado.
    Deu também o código da santa caridade pelo próximo! A caridade é paciente, é benevolente: não tem inveja, sem malevolência, sem orgulho, sem ambição, sem egoísmo e sem cólera. Não pensa mal nem se regozija com as faltas dos outros. Tudo sofre, crê, espera, suporta. É sem desfalecimento (1Cor 13). Que tema de meditação! (Leão Dehon, OSP 3, p. 706s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra
    «Se participamos nos sofrimentos de Cristo,
    também participaremos na sua consolação (cf. 2 Cor 1, 7).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - X Semana - Quarta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - X Semana - Quarta-feira

    11 de Junho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: 2 Coríntios 3, 4-11

    Irmãos, é por meio de Cristo, que temos esta confiança diante de Deus. 5Não é que sejamos capazes de conceber alguma coisa como de nós mesmos; é de Deus que provém a nossa capacidade. 6É Ele que nos torna aptos para sermos ministros de uma nova aliança, não da letra, mas do Espírito; porque a letra mata, enquanto o Espírito dá a vida.
    7Ora se o ministério da morte, gravado com letras em pedra, foi de tal glória que os filhos de Israel não podiam fixar o rosto de Moisés, por causa do esplendor que nele havia, aliás passageiro, 8quanto mais glorioso não será o ministério do Espírito? 9Na verdade, se o ministério da condenação foi glorioso, muito mais rico de glória será o ministério da justiça. 10Mesmo até o que, sob tal aspecto, foi glorioso, deixou de o ser por causa da glória eminentemente superior. 11Se, com efeito, foi glorioso o que era transitório, muito mais glorioso é o que permanece.

    Para melhor compreendermos este texto, convém ler o v. 3, omitido no Leccionário: «Vós (os Coríntios) sois uma carta de Cristo, confiada ao nosso ministério, escrita, não com tinta, mas com o Espírito do Deus vivo; não em tábuas de pedra, mas em tábuas de carne que são os vossos corações». "Esta confiança", que Paulo refere no v. 4 é confiança em si, como servidor do Evangelho, é confiança nos irmãos de Corinto, é confiança no Deus vivo, em Cristo, no Espírito. O Apóstolo acredita firmemente no poder de Deus, no seu ministério e na docilidade e disponibilidade dos Coríntios para receberem as mensagens, não como pergaminho que acolhe passivamente a tinta, mas como coração vivo e pulsante, apesar das presentes incompreensões, que julga transitórias.
    Depois desta afirmação de confiança, e dos fundamentos da mesma, Paulo suspende momentaneamente a evocação de feridas, para manifestar a convicção de que a Nova Aliança, a do «Espírito que dá a vida», é melhor do que a Antiga Aliança, a da «letra que mata». Mas continua a afirmar a sua identidade de ministro apto, plasmado por Deus, da Nova Aliança, que leva à perfeição a Antiga, e «que permanece».

    Evangelho: Mateus 5, 17-19

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 17 «Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas. Não vim revogá-los, mas levá-los à perfeição. 18Porque em verdade vos digo: Até que passem o céu e a terra, não passará um só jota ou um só ápice da Lei, sem que tudo se cumpra. 19Portanto, se alguém violar um destes preceitos mais pequenos, e ensinar assim aos homens, será o menor no Reino do Céu. Mas aquele que os praticar e ensinar, esse será grande no Reino do Céu.

    Jesus, tendo concluído o seu próprio ensinamento, toma agora posição perante a doutrina tradicional, introduzindo, de modo autorizado e solene, o seu próprio ensinamento com o «Amen ... vos digo», ou, como traduz o nosso texto, com o «em verdade vos digo». Esta expressão, recorrente no Sermão da Montanha, indica que aquilo que Jesus está para dizer é verdade, é digno de fé. Antes de sintetizar o ensinamento numa frase lapidar e programática (Mt 7, 12), Jesus esclarece a sua atitude e a dos seus discípulos perante a lei antiga. Não se trata de aboli-la, mas de aperfeiçoá-la, como várias vezes regista Mateus: 1, 22; 2, 15.17; 3, 15; 4, 14, etc.). Mas o carácter provocador das antíteses usadas por Jesus levará a que seja acusado de querer destruir a Lei e os Profetas.

    Meditatio

    Na primeira leitura, Paulo manifesta o seu entusiasmo pela Nova Aliança, dom da Santíssima Trindade aos homens. O Pai, o Filho e o Espírito Santo convidam-nos a entrar na sua intimidade, a participar da sua vida divina. O Apóstolo não cabe em si ao pensar que foi tornado ministro desta Aliança no Espírito, o que lhe permite ter confiança diante de Deus Pai, por meio de Cristo. O dom da Nova Aliança repete-se especialmente na Eucaristia, onde o sacerdote repete as palavras de Jesus: «Este cálice é a Nova Aliança no meu sangue» (Lc 22, 20).
    Alegremo-nos também nós pela Nova Aliança oferecida pela Santíssima Trindade à Igreja, Aliança que renova todas as coisas, que nos põe em novidade de vida, tornando-nos participantes da morte e da ressurreição de Cristo. O sangue da Nova Aliança, que recebemos na Eucaristia, une-nos a Ele, Mediador da Nova Aliança.
    Paulo compara a Antiga e a Nova Aliança. A Antiga, diz o Apóstolo, foi escrita em tábuas de pedra. É uma clara alusão à aliança do Sinai, quando Deus gravou em pedra os mandamentos, a Lei, que Israel tinha de observar para permanecer na Aliança. A essa Aliança "da pedra", Paulo opõe a Nova Aliança "do Espírito". A primeira é feita de leis exteriores. A segunda, a aliança do Espírito, é interior e escrita nos corações, como diz Jeremias.
    Trata-se, mais precisamente, de uma transformação do coração. Deus dá-nos um coração novo para nele infundir um Espírito novo, o Espírito de Deus. É ele a Nova Aliança, é Ele a nova lei interior. Já não se trata de uma lei feita de mandamentos exteriores, mas de uma lei que consiste num impulso interior, no gosto em fazer a vontade de Deus, num desejo de corresponder em tudo ao amor que vem de Deus e nos guia para Deus, ao amor que nos torna participantes da vida da Santíssima Trindade. «A letra mata», diz Paulo, «o Espírito dá vida». A letra mata porque se trata de preceitos que, não sendo observados, provocam a condenação. O Espírito, pelo contrário dá vida porque torna capazes de fazer a vontade de Deus, e a vontade divina é sempre vivificante. O Espírito é vida, é um dinamismo interior. Por isso é que a glória da Nova Aliança é muito superior à da Antiga.
    Traduzindo o pensamento do Apóstolo em termos mais compreensíveis à nossa mentalidade actual, poderíamos parafrasear as suas palavras do seguinte modo: «Se te deténs na superfície da letra, corres o risco de bloquear a vitalidade do Espírito; portanto, avança para a profundidade da criatividade espiritual». Também o axioma de Jesus se pode parafrasear: «Vai sempre mais além, amadurecendo na liberdade, em obediência e testemunho, serve o reino dos céus».
    A realidade do «homem de coração novo, animado pelo Espírito», que nasce do «Coração de Jesus, aberto na cruz» (Cst 3) é um tema importante para o Pe. Dehon e para nós. Um «coração novo animado pelo Espírito» é espiritualmente criativo e profundo, é um coraç&atil
    de;o livre e obediente, é um coração que testemunha e serve o Reino.

    Oratio

    Obrigado, Senhor, pela paciência com que perdoas a nossa superficialidade, o uso e abuso impensados das nossas pobres liberdades, a presunção em abolir jotas e ápices substanciosos da Lei e dos Profetas. Fortalece a nossa disponibilidade, por vezes tão tímida, para seguirmos aqueles que nos envias como guias, e que reflectem o fulgor do teu Espírito. Que nos acompanhe Jesus Cristo, teu Filho e Nosso Senhor, que nos ampare o teu Espírito Santo, para deixarmos amadurecer em nós a vida que Ele nos dá, e realizarmos, com profundidade e criatividade, o serviço do reino dos céus. Amen.

    Contemplatio

    Todo o Novo Testamento está cheio deste pensamento fundamental: fomos resgatados pelo sangue de Cristo. Todas as vítimas da antiga lei eram figuras da imolação de Cristo. Foi Ele que foi imolado simbolicamente desde a origem do mundo (Ap 17). O sangue do Coração de Jesus, é o preço da salvação que Deus esperava desde a falta de Adão, é a garantia da nossa paz, da nossa reconciliação com Deus; é o selo do Novo Testamento. Os apóstolos não pregam outra coisa. - Fostes justificados pelo sangue do Salvador, pela fé no seu sangue (Rm). - Cristo resgatou-vos com o seu sangue, para a remissão dos vossos pecados (Ef). - Estáveis longe de Deus, fostes aproximados dele pelo sangue de Cristo (Id.). - Entrastes no reino de Cristo resgatados pelo seu sangue (Cl 1, 14). - O sangue da cruz foi para vós o preço da reconciliação e da paz (Cl 1, 20). - Cristo, novo Pontífice, não ofereceu pela vossa redenção o sangue de bezerros, mas o seu próprio (Heb 9, 12). - O sangue de Cristo é o sinal da nova aliança como o do cordeiro era o sinal da antiga (Heb 9, 20). O sangue do Coração de Jesus é, portanto, a fonte de toda a graça, de toda a reconciliação e união com Deus de toda a virtude e de toda a perfeição. (Leão Dehon, OSP 4, p. 18).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «A letra mata, o Espírito dá a vida» (2 Cor 3, 6).

  • Tempo Comum – Anos Ímpares – X Semana – Quinta-feira

    Tempo Comum – Anos Ímpares – X Semana – Quinta-feira

    Todo o dia
    12 de Junho, 2025

    Primeira leitura: 2 Coríntios 5, 15-4, 1.3-6

    Irmãos, até hoje, todas as vezes que se lêem os escritos de Moisés, um véu cobre o coração dos filhos de Israel. 16Mas, quando se converterem ao Senhor, o véu será tirado. 17Ora, o Senhor é o Espírito e onde está o Espírito do Senhor, aí está a liberdade. 18E nós todos que, com o rosto descoberto, reflectimos a glória do Senhor, somos transfigurados na sua própria imagem, de glória em glória, pelo Senhor que é Espírito. 1Por isso, investidos neste ministério que nos foi concedido por misericórdia, não perdemos a coragem, 2mas repudiamos os subterfúgios vergonhosos, não procedendo com astúcia nem adulterando a palavra de Deus, antes, pela manifestação da verdade, recomendando-nos à consciência de todos os homens diante de Deus. 3Se, entretanto, o nosso Evangelho continuar velado, está velado para os que se perdem, 4para os incrédulos, cuja inteligência o deus deste mundo cegou, a fim de não verem brilhar a luz do Evangelho da glória de Cristo, que é imagem de Deus. 5Pois, não nos pregamos a nós mesmos, mas a Cristo Jesus, o Senhor, e nos consideramos vossos servos, por amor de Jesus. 6Porque o Deus que disse: das trevas brilhe a luz, foi quem brilhou nos nossos corações, para irradiar o conhecimento da glória de Deus, que resplandece na face de Cristo.

    Paulo continua a argumentar em defesa do seu ministério, apresentando a sua interpretação da história presente e futura de Israel. Como sucedeu com ele, ao converter-se, também Israel acabará por reconhecer a Nova Aliança, que levou à perfeição a Antiga Aliança mediada por Moisés, o homem do véu sobre o rosto (cf. Ex 34). Os israelitas mantêm o véu sobre o coração. Mas virá o dia em que lhes será tirado, «quando se converterem ao Senhor» (2 Cor 3, 16). A alegoria do rosto velado ou desvelado dá suporte a toda a argumentação do Apóstolo. Ele imagina-se como um Moisés, mas mediador do «Evangelho da glória de Cristo» (4, 4), por misericórdia de Deus. Por isso, o anuncia sempre e com coragem, custe o que custar, sem subterfúgios, sem manipulações, sem protagonismos pessoais. O Evangelho é luz que brilha. Se os “rebeldes” cegos e escravos do «deus deste mundo» permanecem de rosto velado, a responsabilidade é deles.
    Paulo situa a sua argumentação entre a autobiografia e a teologia trinitária. Esta é sugerida pelos nomes divinos: o Deus da criação, aquele que disse: «brilhe a luz» (v. 6; cf. Gn 1, 3), diante do qual se revela todo o conhecimento (cf. Rm 8, 27), o Cristo Senhor, em cujo rosto resplandece a glória divina (cf. Is 40, 2) e o Espírito, o Senhor que actua na liberdade revelando o conhecimento da glória divina e realizando a progressiva transformação do homem à imagem da glória de Deus.

    Evangelho: Mateus 5, 20-26

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 20Se a vossa justiça não superar a dos doutores da Lei e dos fariseus, não entrareis no Reino do Céu.» 21«Ouvistes o que foi dito aos antigos: Não matarás. Aquele que matar terá de responder em juízo. 22Eu, porém, digo-vos: Quem se irritar contra o seu irmão será réu perante o tribunal; quem lhe chamar ‘imbecil’ será réu diante do Conselho; e quem lhe chamar ‘louco’ será réu da Geena do fogo. 23Se fores, portanto, apresentar uma oferta sobre o altar e ali te recordares de que o teu irmão tem alguma coisa contra ti, 24deixa lá a tua oferta diante do altar, e vai primeiro reconciliar-te com o teu irmão; depois, volta para apresentar a tua oferta. 25Com o teu adversário mostra-te conciliador, enquanto caminhardes juntos, para não acontecer que ele te entregue ao juiz e este à guarda e te mandem para a prisão. 26Em verdade te digo: Não sairás de lá até que pagues o último centavo.»

    Jesus afirmou aos seus discípulos que não vinha ab-rogar a Lei, mas aperfeiçoá-la. Como vontade de Deus, devia ser aceite na sua totalidade sem a reduzir a árdua casuística, como faziam os doutores e os fariseus, tergiversando e defraudando a própria Lei. Formulado o princípio, Jesus deu seis exemplos concretos, começando sempre por «Ouvistes o que foi dito aos antigos … Eu, porém, digo-vos». A frase alude a alguma prescrição do Antigo Testamento, preparando o leitor para a nova interpretação.
    A primeira antítese refere-se ao quinto mandamento (Ex 20, 13; Dt 5, 17). Jesus compara o homicídio intencional ao material. O homicídio intencional pode conhecer diversas modalidades: a ira, o desprezo (chamar rhaká, isto é, imbecil) são ofensas para as quais está previsto o «juízo» do tribunal local, a sentença do sinédrio (o supremo tribunal sedeado em Jerusalém) e, finalmente, o fogo da Geena, a proverbial depressão a sudoeste da Cidade santa considerada, a partir do Novo Testamento, lugar de maldição.
    Quando alguém se deixa dominar pela ira e pelo desprezo dos outros, não está em condições para oferecer sacrifícios de acção de graças ou de expiação. Se, por qualquer razão tiverem sido iniciados nessas condições, apesar da sacralidade do culto, devem ser interrompidos para recompor a ordem social. Jesus equipara uma situação de índole moral simplesmente interior, a uma grave impureza legal, que implicava a suspensão do rito, segundo o ensinamento profético: «Quero misericórdia, e não sacrifício» (cf. Mt 9, 13; 12, 7). E nem vale a pena presumir o perdão de Deus, se não perdoarmos aos irmãos (cf. Mt 6, 12). Caso nos atrevamos a apresentar-nos diante do Senhor, a pedir misericórdia, sem antes a termos usados com os outros, teremos de pagar até ao último «cêntimo».

    Meditatio

    Na página da Segunda Carta aos Coríntios, que hoje escutamos, Paulo inspira-se na narrativa da Criação para falar do esplendor da vocação cristã: «Deus disse: das trevas brilhe a luz», «brilhou nos nossos corações, para irradiar o conhecimento da glória de Deus, que resplandece na face de Cristo» (v. 6). Quem está em Cristo é uma nova criatura. É imagem de Deus na semelhança com Cristo. O homem foi criado à imagem de Deus: «Façamos o ser humano à nossa imagem e semelhança» (Gn 1, 26). Mas só Cristo é imagem perfeita de Deus. Nós somos chamados a reflectir, como num espelho, a glória do Senhor, para sermos transformados nessa mesma imagem «de glória em glória» (2 Cor 3, 18).
    A vocação cristã leva-nos a duas atitudes fundamentais. A primeira é contemplar o rosto do Senhor. Só quem contempla o Senhor se deixa iluminar por Ele e pode reflectir a sua glória. Para sermos cristãos significativos, precisamos de nos colocar d
    iante do Senhor como a planta verde diante do Sol. Então receberemos a energia necessária para viver e crescer na fé, para a testemunhar, e ajudar outros à mesma vivência, crescimento e testemunho. «Vinde e sereis iluminados», diz um salmo. A escuta e a meditação da Palavra, a oração, a adoração eucarística, são excelentes meios para contemplar o Senhor, para sermos iluminados para nos enchermos do seu Espírito «que dá vida», que nos transforma interiormente, fazendo-nos, cada vez mais, imagem de Cristo, que faz de nós brilhantes faróis nas costas do mar bravo, que é este mundo.
    No evangelho, Jesus convida-nos a abrir o coração à caridade que brota do seu Coração, a ultrapassar a justiça dos escribas e dos fariseus, que não está orientada para o amor: «Ouvistes o que foi dito aos antigos: Não matarás. Aquele que matar terá de responder em juízo. Eu, porém, digo-vos: Quem se irritar contra o seu irmão será réu perante o tribunal» (vv. 21-22). Mas também nos explica o modo como fazer as nossas ofertas a Deus: «Se fores, portanto, apresentar uma oferta sobre o altar e ali te recordares de que o teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa lá a tua oferta diante do altar, e vai primeiro reconciliar-te com o teu irmão; depois, volta para apresentar a tua oferta» (vv. 23-24). Este modo de proceder é ainda mais necessário depois que a Eucaristia foi instituída. Ir ao altar é ir à fonte do amor, é acolher todo o Corpo de Cristo, é comunhão com Ele e com os irmãos. Não podemos receber a Cabeça, que é Cristo, e recusar o Corpo de Cristo, que são os irmãos. «Em Cristo, Deus reconciliou consigo o mundo», escreve Paulo. Se quisermos reflectir a glória do Senhor, havemos de deixar-nos ensopar pela sua mansidão, pedir a graça de um coração semelhante ao dele. Se acolhemos Jesus que Se deu a nós na Eucaristia, que Se pôs totalmente ao nosso serviço, temos que nos pôr também ao serviço dos irmãos. Havemos de procurar Aquele que vive, Cristo, nos que vivem ao nosso lado, nos irmãos. Adoramos neles a presença real de Cristo; servimo-l´O neles. Se dissemos “sim” ao amor de Cristo, devemos dizer “sim” ao amor dos irmãos. Assim Cristo continua em nós a Sua Missa, a Sua missão de caridade e de salvação do mundo. A Eucaristia celebrada, comungada, adorada, lança-nos «incessantemente, pelos caminhos do mundo ao serviço do Evangelho» (Cst 82).

    Oratio

    Espírito Santo, ilumina-me e torna-me dócil, para secundar a misericórdia e a salvação que me dás, e para que seja retirado o véu que ofusca a visão da tua glória. Senhor Jesus, guia-me pelos caminhos da justiça, visível em sinais de amor, de serviço, de entrega. Pai bom, perdoa a minha lentidão em me converter ao Evangelho, o egoísmo da minha liberdade, o desânimo, a dissimulação, as falsificações da tua santa palavra, todas as ocasiões perdidas de praticar a justiça como os “justos” que caminham seguindo o Justo, Jesus Cristo, teu Filho e nosso Senhor. Amen.

    Contemplatio

    Nosso Senhor escreveu-nos Ele mesmo a sua realeza de amor: Aprendei de mim que sou doce e humilde de Coração. O profeta tinha dito a Sião: «Eis que o teu rei vem a ti cheio de doçura» (Zac 9, 9). Mansidão infinita, doçura e humildade de coração, tal é o carácter do nosso divino rei Jesus. O seu jugo é doce, o seu fardo leve, e junto dele está a consolação e o alívio: «Vinde a mim vós todos que sofreis». No Calvário, a cruz é que é o seu trono; a lança é o seu ceptro; o sangue do seu Coração cobre todo o seu corpo como um manto de púrpura. O título da cruz proclama a sua realeza a todos os séculos: «Jesus de Nazaré, rei dos Judeus». É o reino do amor, o reino do Sagrado Coração. Qual é o código deste reino? Doçura e humildade, paciência e caridade, é toda a sua lei. Este reino tem um estandarte sagrado, é a cruz primeiro, é o crucificado /187 cujo peito está ferido pela lança. Depois o próprio crucificado afasta a cortina e mostra-nos no seu peito, o seu Coração aberto, e este Coração sagrado torna-se um segundo sinal acrescentado à cruz: sinal destinado a marcar uma nova efusão de amor do Salvador, um pedido de amor sempre mais premente, um pedido de reparação e de sacrifício por amor. O reino de Cristo torna-se o amor do Sagrado Coração. (Leão Dehon, OSP 4, p.186s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Irradiai o conhecimento da glória de Deus,
    que resplandece na face de Cristo.» (2 Cor 5, 6).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - X Semana - Sexta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - X Semana - Sexta-feira

    13 de Junho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: 2 Coríntios 4, 7-15

    Irmãos, nós trazemos em vasos de barro o tesouro do nosso ministério, para que se veja que este extraordinário poder é de Deus e não é nosso. 8Em tudo somos atribulados, mas não esmagados; confundidos, mas não desesperados; 9perseguidos, mas não abandonados; abatidos, mas não aniquilados. 10Trazemos sempre no nosso corpo a morte de Jesus, para que também a vida de Jesus seja manifesta no nosso corpo. 11Estando ainda vivos, estamos continuamente expostos à morte por causa de Jesus, para que a vida de Jesus seja manifesta também na nossa carne mortal. 12Assim, em nós opera a morte, e em vós a vida. 13Animados do mesmo espírito de fé, conforme o que está escrito: Acreditei e por isso falei, também nós acreditamos e por isso falamos, 14sabendo que aquele que ressuscitou o Senhor Jesus, também nos há-de ressuscitar com Jesus, e nos fará comparecer diante dele junto de vós. 15E tudo isto faço por vós, para que a graça, multiplicando-se na comunidade, faça aumentar a acção de graças, para a glória de Deus.

    O "tesouro" a que se refere Paulo é a luz que Deus faz brilhar no coração para que resplandeça o conhecimento da glória divina, que irradia em Cristo. O v. 6, omitido pela liturgia manifesta-nos esse sentido: «O Deus que disse: das trevas brilhe a luz, foi quem brilhou nos nossos corações, para irradiar o conhecimento da glória de Deus, que resplandece na face de Cristo». O "tesouro" é, pois, o conhecimento/experiência de Cristo, em cujo rosto resplandece a glória divina. O "vaso de barro» é a personalidade global do homem.
    Paulo volta à sua autobiografia, ainda que o «nós» (v. 7) possa envolver paradigmaticamente muitos outros, incluindo os irmãos da comunidade de Corinto. A imagem do «tesouro em vasos de barro» é sugestiva e eficaz para resumir a distância entre uma preciosidade e o estojo que a leva, entre a segurança do valor e a fragilidade da consciência que dele temos, entre o «extraordinário poder» que vem de Deus e a nudez da impotência humana. Não se trata de menosprezo pelo homem ou pela sua condição, mas de exaltação da genialidade divina. A aventura pessoal de Saulo/Paulo explica a opção didáctica do Apóstolo que usa pólos contrastantes para captar de modo quase provocatório a atenção dos leitores para que saibam ler os sinais.

    Evangelho: Mateus 5, 27-32

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 27«Ouvistes o que foi dito: Não cometerás adultério. 28Eu, porém, digo-vos que todo aquele que olhar para uma mulher, desejando-a, já cometeu adultério com ela no seu coração. 29Portanto, se a tua vista direita for para ti origem de pecado, arranca-a e lança-a fora, pois é melhor perder-se um dos teus órgãos do que todo o teu corpo ser lançado à Geena. 30E se a tua mão direita for para ti origem de pecado, corta-a e lança-a fora, porque é melhor perder-se um só dos teus membros do que todo o teu corpo ser lançado à Geena.»
    31«Também foi dito: Aquele que se divorciar da sua mulher, dê-lhe documento de divórcio. 32Eu, porém, digo-vos: Aquele que se divorciar da sua mulher - excepto em caso de união ilegal - expõe-na a adultério, e quem casar com a divorciada comete adultério.»

    Mateus apresenta-nos hoje mais uma antítese usada por Jesus, neste caso, visando o adultério. Mais uma vez, o Senhor acaba com a distinção, própria dos fariseus, entre a intenção e a acção, e declara o princípio da unidade: adultérios do coração, dos olhos, das mãos, são igualmente proibidos. São mencionados os olhos e as mãos pela participação que têm nos desejos do coração. Relativamente à certidão de repúdio, Jesus admite uma única excepção: o caso de união ilegal. Será só uma excepção, ou deverá entender-se que o divórcio, neste caso, não só é permitido, mas exigido pela lei judaica? Ainda não há uma resposta satisfatória. Mas notemos a posição de Cristo em defesa das categorias mais fracas e no restabelecimento da ordem social. Jesus tomará esta mesma atitude quando se referir às crianças (Mt 18, 1-10).

    Meditatio

    Cristo, misericórdia de Deus, morreu na cruz para nos salvar. O cristão é chamado a partilhar esse mistério de morte, que leva à vida.
    Na primeira leitura, esse mistério é expresso por Paulo quando fala do clima de perseguição em que exerce o seu ministério, isto é, quando proclama a ressurreição do Senhor no meio de muitas tribulações: «Somos atribulados, mas não esmagados; confundidos, mas não desesperados; perseguidos, mas não abandonados; abatidos, mas não aniquilados.» (vv. 8-9). Parece um discurso ilógico, e é desconcertante. É desconcertante se não se relacionar com o mistério de Cristo. Paulo acrescenta: «Trazemos sempre no nosso corpo a morte de Jesus, para que também a vida de Jesus seja manifesta no nosso corpo» (v. 10). Deus colocou nos vasos de barro da nossa pobre humanidade, pelo mistério de Cristo, o tesouro da sua ressurreição, «para que a vida de Jesus seja manifesta também na nossa carne mortal» (v. 11). Não podemos pretender uma vida tranquila, sem dificuldades, sem provações, sem perturbações. Não foi esse o caminho do Senhor, e não pode ser esse o nosso caminho. Que o Senhor nos ajude a ver em todos os sofrimentos a sua cruz, isto é, a passagem para a vida.
    As palavras duras do Evangelho pretendem alertar-nos para atitudes de condescendência e de cedências para com a nossa sociedade permissiva, que apenas busca a satisfação imediata, a felicidade aparente que a droga, o divórcio, o aborto, o desregramento sexual parecem dar. A nossa sociedade proclama diversas "libertações", em que facilmente nos podemos deixar levar, sem nos darmos conta da degradação da nossa dignidade humana. As tremendas palavras do Senhor: «Se a tua vista direita for para ti origem de pecado, arranca-a e lança-a fora... se a tua mão direita for para ti origem de pecado, corta-a e lança-a fora...», expressam a decisão com que havemos de evitar o mal e procurar o bem. O "bem" é tudo aquilo que nos permite realizar-nos como pessoas humanas, criadas à imagem de Deus, e destinadas à comunhão com Ele. Tudo aquilo que dificulte ou impeça a realização dessa fundamental vocação do homem há ser deitado fora, custe o que custar. Como dizem as nossas Constituições, «Partilhamos as aspirações dos nossos contemporâneos, como abertura possível ao advento de um mundo mais humano, ainda que elas contenham o risco de um malogro e de uma degradação» (Cst 37).
    Há iniciativas que exigem um grande sentido de responsabilidade e nas quais os cristãos, e particularmente, os religiosos podem e devem colaborar. Mas é sempre necessário um sábio discernimento pessoal e comunitário, para não serem instrumentalizados e não favorecerem maiores abusos e injustiças.
    Que o Senhor nos encha do seu Espírito, nos afaste do mal e nos impulsione para o bem. Que nos faça «luz do mundo».

    Oratio

    Eu Te bendigo, Pai bom, porque, pela palavra de Jesus, me escolheste como teu servo para glorificar o teu nome santo.
    Eu Te bendigo, Senhor Jesus, pela tua morte e ressurreição porque, por meio delas, venceste a minha morte e me preparaste para a ressurreição.
    Eu Te ofereço, Espírito Santo de Deus, como sacrifício de louvor, os meus olhos e as minhas mãos, para que me defendas de todo o escândalo causado ou sofrido, e purifiques toda a minha sensibilidade humana.
    Glória a Ti, Trindade Santíssima, pelos séculos dos séculos. Amen.

    Contemplatio

    Nada custa a quem ama, nem o trabalho, nem a fadiga, nem a dor. «O meu jugo é doce e o meu fardo é leve», diz o bom Mestre, porque não custa levar um fardo para aquele que se ama. «Quem ama a Deus, diz S. João, observa os mandamentos e os mandamentos são-lhe ligeiros» (Jo 5, 3). O amor faz tudo levar com alegria. Nada custava aos três hóspedes da santa casa de Nazaré, nem fadigas, nem privações, nem dores de qualquer género, porque tudo era para Deus e pelas almas. Jesus estava /200 já na mesma disposição do Calvário: «Tomou a cruz com alegria» (Heb 12, 2). Levava com a mesma alegria as cruzes de Nazaré. S. Paulo dizia no mesmo espírito: «Eu regozijo-me nas minhas tribulações» (2Cor 7, 2). Se soubesse dizer a todo o sofrimento que se apresenta: «Aceito-o pelo meu Bem-amado e pelas almas que lhe são caras», todo o sofrimento me seria ligeiro. É o que exprime Santo Agostinho quando diz: «Quando o trabalho é amado, já não há sofrimento». Ó minha alma, ama Jesus. É o segredo da felicidade como em Nazaré. (Leão Dehon, OSP 3, p. 199s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Trazemos no nosso corpo a morte de Jesus,
    para que também a vida de Jesus seja manifesta no nosso corpo» (2 Cor 4, 10).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - X Semana - Sábado

    Tempo Comum - Anos Ímpares - X Semana - Sábado

    14 de Junho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: 2 Coríntios 5, 14-21

    Irmãos, o amor de Cristo nos absorve completamente, ao pensar que um só morreu por todos e, portanto, todos morreram. 15Ele morreu por todos, a fim de que, os que vivem, não vivam mais para si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou. 16Por conseguinte, de agora em diante, não conhecemos ninguém à maneira humana. Ainda que tenhamos conhecido a Cristo desse modo, agora já não o conhecemos assim. 17Por isso, se alguém está em Cristo, é uma nova criação. O que era antigo passou; eis que surgiram coisas novas. 18Tudo isto vem de Deus, que nos reconciliou consigo por meio de Cristo e nos confiou o ministério da reconciliação. 19Pois foi Deus quem reconciliou o mundo consigo, em Cristo, não imputando aos homens os seus pecados, e pondo em nós a palavra da reconciliação. 20É em nome de Cristo, portanto, que exercemos as funções de embaixadores e é Deus quem, por nosso intermédio, vos exorta. Em nome de Cristo suplicamo-vos: reconciliai-vos com Deus. 21Aquele que não havia conhecido o pecado, Deus o fez pecado por nós, para que nos tornássemos, nele, justiça de Deus.

    Paulo continua a reflectir sobre a "novidade" da reconciliação e da graça da morte de Cristo por todos. Estes pensamentos cristológicos têm implicações eclesiológicas. A ligação entre as duas perspectivas, a relação entre Cristo e a igreja, está na reconciliação. Paulo está convencido de que a humanidade pecadora merece a indignação divina. Essa convicção é aperfeiçoada pelo conhecimento messiânico de Cristo, lugar, preço e sinal da reconciliação. É certo que a humanidade é pecadora. Mas Deus tomou a iniciativa de a renovar e aproximar transferindo o pecado para Cristo. A morte de Cristo é a manifestação mais clara do itinerário da reconciliação projectado por Deus. A morte é a encruzilhada de um itinerário cristológico global iniciado na Encarnação (cf. Gl 4, 4) e concluído na Ressurreição (cf. 1 Cor 15, 3-4.20-22). Esta perspectiva de Paulo encontra-se também em 1 Cor 15 e fez escola, como se nota na Carta aos Hebreus.
    A consequência eclesiológica é sugerida por algumas afirmações como: «O amor de Cristo nos absorve completamente» (v. 14), «O que era antigo passou; eis que surgiram coisas novas» (v. 17). Nota-se também nos vv. 20-22, onde Paulo fala na entrega do ministério que lhe foi feita, e na função de embaixador de Cristo. A igreja, para o Apóstolo, é a manifestação da reconciliação realizada por meio de Cristo e é espaço de serviço, de anúncio e activação da reconciliação.

    Evangelho: Mateus 5, 33-37

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 33«Do mesmo modo, ouvistes o que foi dito aos antigos: Não perjurarás, mas cumprirás diante do Senhor os teus juramentos. 34Eu, porém, digo-vos: Não jureis de maneira nenhuma: nem pelo Céu, que é o trono de Deus, 35nem pela Terra, que é o estrado dos seus pés, nem por Jerusalém, que é a cidade do grande Rei. 36Não jures pela tua cabeça, porque não tens poder de tornar um só dos teus cabelos branco ou preto. 37Seja este o vosso modo de falar: Sim, sim; não, não. Tudo o que for além disto procede do espírito do mal.»

    A quarta antítese refere-se ao segundo e ao oitavo mandamento (Ex 20, 7.16; Nm 30, 3ss.; Dt 23, 22-24). Na sociedade judaica abusava-se do juramento (Mt 23, 16-22). Porque não se podia pronunciar o nome divino, contornava-se o obstáculo referindo-se ao céu, à terra, a Jerusalém, à própria cabeça. Mas, mais uma vez, Jesus elimina a casuística ao afirmar: «Seja este o vosso modo de falar: Sim, sim; não, não. Tudo o que for além disto procede do espírito do mal» (v. 37).
    Num mundo onde predomina a mentira, seria necessário invocar Deus como testemunha do que afirmamos. Mas o cristão sabe que Deus está sempre presente, que não é preciso chamá-lo como testemunha. «Sim, sim», «não, não», proferidos na presença de Deus, equivalem a um juramento. A Carta de Tiago faz eco deste ensinamento de Cristo, quando diz: «Meus irmãos, não jureis, nem pelo Céu, nem pela Terra, nem façais qualquer outro juramento. Que o vosso «sim» seja sim e que o vosso "não" seja não, para não incorrerdes em condenação» (5, 12).

    Meditatio

    Paulo afirma na primeira leitura: «Ele morreu por todos, a fim de que, os que vivem, não vivam mais para si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou» (v. 15). A liturgia da Igreja retomou este conceito, transformando-o em oração: «E a fim de vivermos, não já para nós próprios, mas para Ele, que por nós morreu e ressuscitou, de Vós, Pai misericordioso, enviou aos que n´Ele crêem o Espírito Santo...» (Oração eucarística IV). Há uma espécie de troca: Cristo morreu por nós a fim de que possamos viver para Ele. Paulo toma muito a sério a morte de Cristo por todos: «um só morreu por todos e, portanto, todos morreram» (v. 14). Cristo assumiu a nossa morte, mas para a transformar. Morremos numa oferta, e isto faz da nossa morte uma passagem para Deus. É graça que recebemos em Cristo.
    Mas a liturgia utiliza uma outra perícopa, que se refere à reconciliação: «Foi Deus quem reconciliou o mundo consigo, em Cristo» (v. 19). Na fórmula da absolvição sacramental, o sacerdote reza: «Deus, Pai de misericórdia, que, pela morte e ressurreição de Cristo, reconciliou o mundo consigo...». A redenção não foi uma luta entre Cristo e Deus, como às vezes se pensa, como se Deus quisesse a nossa perdição, e Cristo tivesse querido evitar tal desgraça, oferecendo a sua vida por nós. Não. Foi Deus que quis reconciliar o mundo consigo. A redenção nasce do coração de Deus: «Tudo vem de Deus», afirma o Apóstolo. E tudo passa pelo coração de Cristo, porque o Pai nos reconcilia «em Cristo». Cristo é fiel ao Pai e realiza a sua vontade. Salva-nos com o Pai, e não contra a vontade do Pai. A graça, o amor, a novidade de vida, brotam do coração do Pai: «Deus, que nos amou e enviou o seu Filho como vítima de expiação pelos nossos pecados» (1 Jo 4, 10).
    No evangelho, continuamos a escutar o Sermão da Montanha, uma mensagem que configura uma espécie de bem-aventurança do "sim, sim" e "não, não". Aquele que, por vontade do Pai nos salvou, exige de nós, seus discípulos, clareza de convicções, de posições e de comportamentos. Não admite em nós aquela conduta que agora expressamos com um neologismo, o "nim", talvez &uacute
    ;til a quem prefere equilibrismos, indeterminação, meias tintas, atrasos e adiamentos nebulosos, navegar em águas turvas. A exigência do rabi de Nazaré raia a intolerância: tudo o que for além do "sim, sim" e "não, não», vem do espírito do mal. Mas o «em verdade vos digo», remete para a autoridade das suas palavras e, sobretudo, para a autoridade da sua personalidade. Paulo descobriu que Cristo foi "sim", que foi o lugar em que todas as promessas de Deus se tornaram "sim" (2 Cor 1, 19s.)

    Oratio

    Senhor Jesus, escuta a minha oração de louvor ao Pai, que tanto amou o mundo a ponto de Te enviar para o remir. Pela tua morte e ressurreição, a nossa morte é passagem para a vida. Obrigado, Senhor!
    Senhor Jesus, eu te bendigo porque vieste ao mundo, não para o condenar, mas para o salvar. Pela tua condenação e morte, fomos libertados para a vida. Obrigado, Senhor!
    Senhor Jesus, em Te louvo e agradeço pelo dom do Espírito Santo Consolador, Espírito de verdade. Ele convencerá o mundo do pecado, porque não crê em Ti. Aumenta a minha fé e faz-me apóstolo do amor com que o Pai Te entregou nas mãos dos homens e com que Tu Te ofereceste em sacrifício pela nossa redenção. Amen.

    Contemplatio

    Ninguém melhor do que S. João explicou a fonte da caridade. Uma parte da sua primeira epístola é sobre este tema: «Deus amou-nos até nos dar o seu Filho por nós. Cristo amou-nos até morrer por nós. Se, portanto, nós amamos Deus e Cristo, devemos amar os homens que lhes são tão caros» (Jo 4, 11). Deus poderia dizer-nos: Como? Eu amo todos os homens até lhes dar o meu Filho por eles e vós não os amais? Então não sois meus filhos, não tendes o meu espírito. «Se alguém diz que ama a Deus e não ama o seu irmão, mente. Não ama verdadeiramente a Deus, quem não ama o seu próximo». «Aliás, acrescenta S. João, Deus deu-nos um mandamento. Se o amamos, quer que amemos também o nosso próximo... e como é que havemos de amar o nosso próximo? Não somente em palavras, mas em obras e em verdade»... Se Deus me amou tanto, como não o amaria? Se o coração de Jesus me amou tanto, como é que não o amaria? Se amo a Deus e a Cristo, como é que não amaria o meu próximo que eles tanto amam? Que farei hoje para o provar? (Leão Dehon, OSP3, p. 199.

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Foi Deus quem reconciliou o mundo consigo, em Cristo»» (2 Cor 5, 19).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XI Semana - Segunda-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XI Semana - Segunda-feira

    16 de Junho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: 2 Coríntios 6, 1-10

    Irmãos: como colaboradores de Deus, exortamo-vos a não receber em vão a graça de Deus. 2Pois Ele diz: No tempo favorável, ouvi-te e, no dia da salvação, vim em teu auxílio. É este o tempo favorável, é este o dia da salvação. 3Não damos em nada qualquer motivo de escândalo, para que o nosso ministério não seja desacreditado. 4Ao contrário, em tudo nos recomendamos como ministros de Deus, com muita paciência nas tribulações, nas necessidades e nas angústias, 5nos açoites e nas prisões, nos tumultos e nas fadigas, nas vigílias e nos jejuns, 6pela pureza e pela ciência, pela magnanimidade e pela bondade, pelo Espírito Santo e pelo amor sem fingimento, 7pela palavra da verdade e pelo poder de Deus, pelas armas ofensivas e defensivas da justiça; 8na honra e na desonra, na má e na boa fama; tidos por impostores e, no entanto, verdadeiros; 9por desconhecidos e, no entanto, bem conhecidos; por agonizantes e, no entanto, eis-nos com vida; por condenados e, no entanto, livres da morte; 10por tristes, nós que estamos sempre alegres; por pobres, nós que enriquecemos a muitos; por nada tendo e, no entanto, tudo possuindo.

    Paulo, como colaborador de Deus, declara agir «como embaixador de Cristo», como se Deus exortasse servindo-se dele (cf. 2 Cor 5, 20.). Estas palavras do Apóstolo deixam-nos entrever o seu método de evangelização: não actua por iniciativa própria, mas porque foi habilitado por Deus. A robustez do seu serviço ao evangelho vem da autoridade de Deus, e amadurece no brio com que o exerce. A autoridade e o brio do Paulo estão patentes no esboço autobiográfico do «servo do Evangelho».

    Evangelho: Mateus 5, 38-42

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 38«Ouvistes o que foi dito: Olho por olho e dente por dente. 39Eu, porém, digo-vos: Não oponhais resistência ao mau. Mas, se alguém te bater na face direita, oferece-lhe também a outra. 40Se alguém quiser litigar contigo para te tirar a túnica, dá-lhe também a capa. 41E se alguém te obrigar a acompanhá-lo durante uma milha, caminha com ele duas. 42Dá a quem te pede e não voltes as costas a quem te pedir emprestado.»

    A quinta antítese consiste na chamada «lei de Talião» (Ex 21, 24; Lv 14, 19s.; Dt 19, 21). Essa lei, que já encontramos no Código de Hamurabi (séc. XVIII a. C.), foi necessária numa cultura em que a vingança não tinha limite. Baseava-se no princípio da retribuição e na exigência de reparação. Quando foi dada, era uma lei «progressista», pois punha freio à retorsão (cf. Gn 4, 23s.). Não deve ser julgada à luz do Evangelho. Os próprios judeus se sentiam embaraçados perante tão horrendo princípio. Por isso, em vez de a aplicarem à letra, substituíam-na por sanções pecuniárias.
    Jesus ensina a ser longânimes, a não responder com a vingança ou com a intolerância às ofensas. Assim se quebra a espiral da violência e da prepotência. Isto vale também quando é posta em causa a nossa integridade física e a integridade dos nossos bens, a começar pelo tempo: a capa (v. 40) servia para se defender das intempéries e para cobrir o corpo durante as horas de repouso; a milha (v. 41) era o caminho permitido em dia de sábado. Paulo retomará este ensinamento de Cristo e escreverá: «Não pagueis a ninguém o mal com o mal... Não te deixes vencer pelo mal, mas vence o mal com o bem» (Rm 12, 17.21).
    Estas exigências de Jesus não são contrárias à ordem que deve existir na sociedade. Ele próprio dá o exemplo: pede explicações a quem lhe bateu (Mc 14, 48; Jo 18, 23) e sofre a humilhação; Paulo, para se defender da injustiça, invoca a sua qualidade de cidadão romano, recorrendo mesmo ao supremo tribunal, a César. Uma coisa é a defesa dos próprios direitos, outra é a violência, a intolerância.

    Meditatio

    Paulo apresenta-se como um homem de contrastes, simultaneamente lutador e hipersensível. Os seus escritos são, por vezes, bastante difíceis de compreender exactamente por causa da insistência nos contrastes, nos paradoxos, com que não só procura evidenciar o aspecto desconcertante do mistério de Cristo, mas também como apresenta a sua vida de discípulo e de apóstolo. No texto que escutamos aparecem-nos vários desses contrastes referentes à sua vida e acção apostólica: somos tidos por impostores e, no entanto, verdadeiros; por desconhecidos e, no entanto, bem conhecidos; por agonizantes e, no entanto, eis-nos com vida; por condenados e, no entanto, livres da morte; por tristes, nós que estamos sempre alegres; por pobres, nós que enriquecemos a muitos; por nada tendo e, no entanto, tudo possuindo (vv. 8-10). É assim a vida do cristão, particularmente daquele que mais directamente se empenha no apostolado. O temperamento de Paulo era especialmente adequado para ilustrar a situação extraordinária do cristão neste mundo, situação tantas vezes marcada por contrastes e oposições. Em todas essas situações, o Apóstolo revela transparência, sabedoria, tolerância, sinceridade, amor. É o estilo do homem evangélico vencedor, capaz de perder algo de si mesmo, ou que lhe pertence, para beneficiar a muitos. É a "cultura" do discípulo de Jesus, que sabe carregar a cruz como momento favorável, como dia de salvação.
    No evangelho, Jesus convida os discípulos a viveram de modo desconcertante. Em vez de responderem ao mal com o mal, que é a reacção mais espontânea, até codificada no Antigo Testamento ("Olho por olho, dente por dente"), os discípulos devem contrapor ao mal o bem. É o contraste fundamental. «Se alguém te bater na face direita, oferece-lhe também a outra» (v. 39). Pode parecer uma atitude estúpida. Mas é profundamente cristã. S. Paulo vê-a como coisa divina.
    «Dá a quem te pede e não voltes as costas a quem te pedir emprestado» (v. 42). Quando damos algo aos outros, não o retiramos da nossa riqueza. Poderíamos orgulhar-nos ou fazer pesar a nossa "generosidade" sobre aqueles a quem damos. Damos da nossa pobreza. Assim mantemo-nos humildes, pois, se ajudamos os outros, é por graça de Deus que o fazemos. É o paradoxo da vida apostólica e espiritual. O Senhor deixa-nos na nossa pobreza, na nossa humildade. Mas é aí, em mais uma situação paradoxal, que se manifesta o seu poder! Embora «pobres, enriquecemos a muitos», porque deixamos Deus actuar na nossa pobreza. Quem é pobre, não é pobre só porque reduz ao mínimo as suas exigências, mas porque tem muito para dar aos outros. A generosidade do dom é a medida da nossa pobreza. Permanecer pobres, usando muitos bens, é o testemunho de muitos santos, que realizaram obras grandiosas; é um dos testemunhos mais necessários na nossa sociedade de
    bem-estar, onde a abundância dos bens, em vez de abrir os corações à generosidade, muitas vezes os fecha, encerrando cada vez mais os homens no seu egoísmo.
    Há religiosos que, por especial vocação, se sentem impelidos a servir Cristo Pobre, partilhando a condição social dos pobres (cf. Cst 50), e contentando-se com o que os pobres têm. Partilhando a vida dos sem recursos, a sua insegurança, as suas privações, demonstram que nenhuma situação social é pobre de bens espirituais e que a bondade de Deus até se inclina sobre os pobres com predilecção. Realiza-se, deste modo, a palavra do Senhor: «Bem-aventurados, vós, os pobres...» (Lc 6, 20). Será um anúncio credível e convincente, se o religioso que o proclama, demonstra, com a sua pobreza, que é bem-aventurado, porque é testemunho vivo de Cristo Pobre, que tem predilecção pelos pobres e se faz uma só coisa com eles. «A nossa predilecção irá para aqueles que têm maior necessidade de ser considerados e amados: estamos todos solidários com os nossos irmãos que se consagram ao seu serviço» (Cst 51).

    Oratio

    Louvado sejas, Senhor, porque nos mostras que, todo e qualquer momento, toda e qualquer situação é favorável ao amadurecimento da tua graça. Louvado sejas porque estás connosco, tanto nas situações e nos tempos de alegria, como nas situações e tempos de sofrimento.
    Ensina-nos a proclamar sempre a tua misericórdia para com todos. Ajuda-nos a viver de tal modo que jamais demos escândalo a quem quer que seja, para que não criemos obstáculos à eficácia do teu amor e da tua palavra.
    Que tudo quanto dermos seja fruto e expressão da nossa pobreza solidária e da tua graça providente e generosa. Amen.

    Contemplatio

    Dai facilmente, diz-nos Nosso Senhor, e emprestai também facilmente. A perfeição será mesmo quando vos não lamentardes se sois roubados (Mt 5, 42). Amai mesmo aqueles que vos perseguem e vos caluniam e rezai por eles. Se amardes apenas aqueles que vos fazem bem, os pagãos também fazem isso. Sede perfeitos como o vosso Pai celeste, que é bom para com todos, mesmo para com os ingratos e os maus; e faz levantar «o sol e descer a chuva sobre todos, sobre os bons e sobre os maus», sobre os injustos e sobre os pecadores (Lc 6). Não deis a ninguém o mal pelo mal, diz-nos S. Paulo, tende cuidado de fazer o bem, não somente diante de Deus, mas diante de todos os homens. Vivei em paz, se isso for possível e tanto quanto dependa de vós, com todos os homens... Se o vosso inimigo tiver fome, dai-lhe de comer... (Rm 12, 17). Dai esmola sem ostentação. Sabeis, diz S. Paulo, qual foi a caridade de Nosso Senhor Jesus Cristo, o qual, sendo rico, se fez pobre por amor de vós, a fim de vos enriquecer com a sua pobreza (2Cor 8, 9). É o Coração de Jesus quem fala em todas estas prescrições e todos estes conselhos sobre a caridade fraterna. Aí está todo o espírito do Evangelho que é totalmente oposto ao do paganismo. A revelação do Sagrado Coração veio dar ainda um incremento novo à fraternidade cristã. (Leão Dehon, OSP4, p. 67s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra
    «Não recebais em vão a graça de Deus» (2 Cor 6, 1).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XI Semana - Terça-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XI Semana - Terça-feira

    17 de Junho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: 2 Coríntios 8, 1-9

    Queremos dar-vos a conhecer, irmãos, a graça que Deus concedeu às igrejas da Macedónia. 2No meio das muitas tribulações com que foram provadas, a sua superabundante alegria e extrema pobreza transbordaram em tesouros de generosidade. 3Sou testemunha de que, segundo as suas possibilidades, e até além delas, com toda a espontaneidade 4e com muita insistência, pediram-nos a graça de participar neste serviço em favor dos santos. 5E indo além das nossas expectativas, deram-se a si mesmos, primeiro ao Senhor e depois a nós, pela vontade de Deus. 6Por isso, pedimos a Tito que, tal como a havia começado, levasse a bom termo, entre vós, esta obra de generosidade. 7Mas, dado que tendes tudo em abundância - fé, dom da palavra, ciência, toda a espécie de zelo e amor que em vós despertámos - cuidai também de sobressair nesta obra de caridade. 8Não o digo como quem manda, mas para pôr ainda à prova a sinceridade do vosso amor, servindo-me do zelo dos outros. 9Conheceis bem a bondade de Nosso Senhor Jesus Cristo que, sendo rico, se fez pobre por vós, para vos enriquecer com a sua pobreza.

    Sobrevoando uma longa secção, o Leccionário detém-se no contexto da colecta organizada em benefício da igreja de Jerusalém. Essa colecta tinha sido iniciada com bons resultados entre os Macedónios. Agora é a vez da comunidade de Corinto onde, um ano antes, tinha surgido a feliz ideia. Paulo não quer mandar. Apenas exorta à generosidade. Pode dizer-se que esta colecta é manifestação de um sentimento de internacionalidade, que se manifesta de modo muito concreto ao nível da economia. A comunidade de Jerusalém estava em apuros económicos. Apoiando-se em Tiago, «irmão do Senhor», era bastante tradicionalista. Mas as comunidades da emigração mais abertas, e economicamente mais fortes, não a desprezaram e dispuseram-se a ajudá-la. A distribuição igualitária de bens era uma consequência do acolhimento do Evangelho, de que Paulo se foi progressivamente dando conta. Paulo tem confiança de que a colecta dê frutos também em Corinto, aduzindo razões de comunhão eclesial, de partilha de bens, de testemunho de gratidáo para com Cristo que, sendo rico se fez pobre para nos enriquecer (v. 9).

    Evangelho: Mateus 5, 43-48

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 43«Ouvistes o que foi dito: Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo. 44Eu, porém, digo-vos: Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem. 45Fazendo assim, tornar-vos-eis filhos do vosso Pai que está no Céu, pois Ele faz com que o Sol se levante sobre os bons e os maus e faz cair a chuva sobre os justos e os pecadores. 46Porque, se amais os que vos amam, que recompensa haveis de ter? Não fazem já isso os cobradores de impostos? 47E, se saudais somente os vossos irmãos, que fazeis de extraordinário? Não o fazem também os pagãos? 48Portanto, sede perfeitos como é perfeito o vosso Pai celeste.»

    A sexta antítese refere-se ao maior dos mandamentos: o amor para com o próximo, já formulado no Levítico (19, 18). Todavia, no Antigo Testamento, o amor ao próximo limitava-se ao povo de Israel e àqueles que, de algum modo, tivessem sido integrados nele.
    Jesus cita também o ódio aos inimigos: «odiarás o teu inimigo» (v. 43). É verdade que esse preceito não estava escrito em qualquer página da Bíblia. Mas estava presente nas franjas do judaísmo mais extremista. Em Qunran, prescrevia-se o ódio a todos os filhos das trevas.
    Jesus torna universal o preceito do amor ao próximo. Se assim não fosse, os seus discípulos ficavam ao nível dos publicanos que, por solidariedade estavam unidos e se amavam uns aos outros; ou ao nível dos pagãos. Jesus, apoiando-se num princípio aceite pelos judeus - «deve imitar-se o comportamento de Deis» -, instaura o princípio do amor universal. Deus não faz distinções, faz erguer o Sol, e cair a chuva, para todos. Com esta afirmação, Jesus também deita por terra a pretensa preferência, e quase exlcusividade, do amor de Deus para com eles.

    Meditatio

    É curioso o modo como Paulo introduz o discurso que a Liturgia hoje nos propõe: «Queremos dar-vos a conhecer, irmãos, a graça que Deus concedeu às igrejas da Macedónia» (v. 1). Esta «graça» é, nada mais, nada menos, que a generosidade em favor da igreja de Jerusalém. Ser generoso é uma graça! Numa primeira reacção, poderíamos argumentar que não foi Deus que enviou recursos económicos à igreja de Jerusalém. Foram, sim, os Macedónios, que deram da sua própria pobreza. Mas Paulo chama a este esforço de partilha generosa uma graça de Deus, invertendo em certo sentido a situação. Mas é esta a leitura mais profunda deste gesto, como de toda a acção generosa. Isto, por duas razões. Primeiro porque, o que deram, afinal, tinham-no recebido de Deus; Deus ofereceu-lhes a possibilidade de ser generosos, passando a outros os dons que lhes tinha dado; poder dar é uma graça de Deus; a vontade de dar também é graça de Deus. A segunda razão é que, dando desinteressadamente, recebem de verdade o dom de Deus. A graça concedida por Deus às igrejas da Macedónia é a de viver no amor de Deus, receber o amor de Deus, participar activamente no seu amor. Não se pode receber o amor de Deus sem o transmitir a outros. Quem transmite o amor de Deus vive verdadeiramente nele, e recebe-o cada vez em maior grau. É este o sentido cristão da generosidade: união ao amor de Deus, condição para que este amor nos seja dado com uma generosidade cada vez maior, com aquela munificência de que fala Jesus no Evangelho, quando diz que o Pai faz surgir o sol para os bons e para os maus, e chover para os justos e injustos.
    O fascinante projecto evangélico, que Jesus vai delineando, desafia os discípulos a uma perfeição semelhante à de Deus: «Sede perfeitos como é perfeito o vosso Pai celeste» (v. 48). Este Pai está «no céu». Esta expressão simboliza a elevação, a pureza, o espaço alargado do Reino. Assim deve ser o amor dos discípulos: elevado, puro, largo. O discípulo não encerra ninguém nas categorias de próximo e inimigo, de aliado e perseguidor, de mau e bom, de amigo e irmão. Em todos vê, simplesmente, um filho do Pai que está no céu e, portanto, um irmão. Se alguém persiste em ser perseguidor, mau, o cristão não o julga tal, mas ama-o, reza por ele, faz-lhe bem. Jesus não generaliza. Aponta casos muito concretos de que devemos amar, para não corrermos o risco de dizer que amamos a todos, não amando ninguém.
    Como religiosos, é nossa tarefa lutar contra a miséria, aliviá-la e, se houver irmãos que têm o carisma de partilhar efectivamente a vida dos "miseráveis", há que encorajá-los e ajudá-los o mais possível nessa difícil missão.
    Mas o critério supremo da vida religiosa, como do cristianismo, não é a pobreza mas, sempre e só, a caridade. A pobreza evangélica é para libertar o religioso da escravidão da riqueza; mas também o liberta da escravidão da miséria. Para estar livre e se dedicar ao serviço da caridade, à oração, à actividade apostólica, o religioso não pode estar sujeito à preocupação diária de ganhar o pão, o vestuário, a digna habitação, meios de que não pode prescindir, enquanto vive nesta terra. Sem o necessário para viver, adeus liberdade! Afogar-se-ia fatalmente na luta pela sobrevivência, com todas as tensões e complicações, também psicológicas, que daí derivam. A vida religiosa, entre outras coisas, deve ser testemunho da verdadeira pobreza cristã, isto é, de um nível de vida digno da pessoa humana, que não é certamente o nível da indigência e da miséria. Os primeiros cristãos julgaram justamente um dever que entre eles não houvesse alguém «necessitado» (cf. Act 4, 34). No texto da primeira leitura, Paulo, ao solicitar ajuda para a igreja de Jerusalém, anota: «Não se trata de, ao aliviar os outros, vos fazer entrar em apuros, mas sim de que haja igualdade». (2 Cor 8, 13). Que todos tenham, pelo menos, o necessário para viver. «Que haja igualdade!».

    Oratio

    Ó Jesus, ensina-me a contemplar o Coração benevolente e generoso do Pai, para que o meu próprio coração se abra generoso para com todos os que passam por necessidades de pão, de presença amiga, de palavra confortante, de ajuda para acreditar no seu amor sem limites.
    Ajuda-me a agradecer a misericórdia que sempre usa para comigo, quando sou bom e quando sou mau. Ajuda-me a ser reconhecido para com todos os que me amam e fazem o bem. Pacifica em relação a mim todos os que me perseguem e odeiam.
    Que reconheça, cada vez mais, a graça com que, de rico, te fizeste pobre para me enriquecer com a tua pobreza. Amen.

    Contemplatio

    «A pobreza exterior abre uma bela via para a pobreza interior que faz o fundo da virtude da pobreza. Jesus praticou esta última com uma perfeição que só ele jamais poderá alcançar, porque foi nele que Deus reinou plenamente. O reino de Deus não se estabelece senão num verdadeiro pobre, que está desnudado de si mesmo e das criaturas, que não se procura nos dons de Deus, que morre incessantemente para todas as coisas sensíveis, que já não tem nem desejos, nem pensamentos, nem movimentos que lhe sejam próprios, que não vive senão do espírito de Deus, que nada procura fora dele, que permanece na sua pequenez e na sua dependência. Vai direito ao puro amor. Não está aí todo o Coração de Jesus? Um pobre religioso tem ainda algum cuidado com o vestuário e com o pão, e o seu coração está ocupado com isso. Jesus-Eucaristia não tem nenhum cuidado com os véus que o cobrem, são bem pouca coisa! «Ó adorável Jesus! O único pobre e o único onde Deus reinou e reina plenamente e sem resistência, quem poderá compreender o prodígio da vossa pobreza eucarística? Esta pobreza única dá uma glória infinita a Deus vosso Pai. Ó bem-aventurada pobreza! Bendito seja o dia em que vendo-nos perfeitamente desapegados de tudo o que é terreno, seremos ricos de Nosso Senhor, da sua vida em nós, do seu coração divino, vivendo e reinando nos nossos corações!». (Leão Dehon, OSP3, p. 697s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Cuidai de sobressair na caridade» (cf. 2 Cor 8, 7).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XI Semana - Quarta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XI Semana - Quarta-feira

    18 de Junho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: 2 Coríntios 9, 6-11

    Irmãos, ficai sabendo: Quem pouco semeia, também pouco colherá; mas quem semeia com generosidade, com generosidade também colherá. 7Cada um dê como dispôs em seu coração, sem tristeza nem constrangimento, pois Deus ama quem dá com alegria. 8E Deus tem poder para vos cumular de toda a espécie de graça, para que, tendo sempre e em tudo quanto vos é necessário, ainda vos sobre para as boas obras de todo o género. 9Como está escrito: Distribuiu, deu aos pobres; a sua justiça permanece para sempre. 10Aquele que dá a semente ao semeador e o pão em alimento, também vos dará a semente em abundância e multiplicará os frutos da vossa justiça. 11Assim, sereis enriquecidos em tudo, para exercer toda a espécie de generosidade que suscitará, por nosso intermédio, a acção de graças a Deus.

    Paulo continua a apontar razões para que os Coríntios sejam generosos na colecta a favor da igreja de Jerusalém. Essa colecta deve ser realizada de modo humano, isto é, livremente, apesar da obrigação decorrente da profissão da comum fé cristã. Para o Apóstolo, «o serviço da colecta não deve apenas prover às necessidades dos santos, mas tornar-se abundante fonte de muitas acções de graças a Deus» (2 Cor 9, 12). É que a colecta, que em si mesma já é liturgia, havia de ser entregue durante uma celebração litúrgica, multiplicando as eucaristias, isto é, as acções de graças a Deus.
    Mas Paulo também insiste em argumentações de tipo psicológico e antropológico para motivar a solidariedade entre comunidades unidas pela fé, mas com acentuadas diferenças étnicas, como eram a de Jerusalém e a de Corinto. Também argumentos humanos ajudam a levar por diante empresas como a solidariedade em circunstâncias desfavoráveis. Mas as coordenadas teológicas permanecem prioritárias, por exemplo a identidade de Deus, que «ama e dá com alegria», e a nossa convicção de que pensar e actuar com misericórdia é dom de Deus, que tem poder de nos «cumular de toda a espécie de graça».

    Evangelho: Mateus 6, 1-6.16-18

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 1«Guardai-vos de fazer as vossas boas obras diante dos homens, para vos tornardes notados por eles; de outro modo, não tereis nenhuma recompensa do vosso Pai que está no Céu. 2Quando, pois, deres esmola, não permitas que toquem trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas, nas sinagogas e nas ruas, a fim de serem louvados pelos homens. Em verdade vos digo: Já receberam a sua recompensa. 3Quando deres esmola, que a tua mão esquerda não saiba o que faz a tua direita, 4a fim de que a tua esmola permaneça em segredo; e teu Pai, que vê o oculto, há-de premiar-te.» 5«Quando orardes, não sejais como os hipócritas, que gostam de rezar de pé nas sinagogas e nos cantos das ruas, para serem vistos pelos homens. Em verdade vos digo: já receberam a sua recompensa. 6Tu, porém, quando orares, entra no quarto mais secreto e, fechada a porta, reza em segredo a teu Pai, pois Ele, que vê o oculto, há-de recompensar-te. 16«E, quando jejuardes, não mostreis um ar sombrio, como os hipócritas, que desfiguram o rosto para que os outros vejam que eles jejuam. Em verdade vos digo: já receberam a sua recompensa. 17Tu, porém, quando jejuares, perfuma a cabeça e lava o rosto, 18para que o teu jejum não seja conhecido dos homens, mas apenas do teu Pai que está presente no oculto; e o teu Pai, que vê no oculto, há-de recompensar-te.»

    Em Mt 4, 6.8, encontramos o princípio da interiorização («no segredo»). Agora, Jesus aponta outro importante princípio, o de «superar» a justiça dos doutores da Lei e dos fariseus (5, 20). E seguem-se as aplicações práticas no que se refere à esmola, à oração, ao jejum, que resumem as práticas religiosas tradicionais. Jesus não censura essas práticas, mas a forma e o objectivo com que eram realizadas, particularmente pelos fariseus. O discípulo de Cristo comporta-se de modo diferente dos fariseus, os «hipócritas» (vv. 2.5.16). Ainda que não mantenha as suas boas obras «no segredo» (Mt 5, 14), só o faz para que a soberania divina seja reconhecida. Segundo o princípio da retribuição, quem faz boas obras para ser estimado e louvado pelos outros, já recebe a sua recompensa; quem as faz por Deus, obtém d´Ele a retribuição.
    O valor da esmola (Sir 3, 29; 29, 12; Tb 4, 9-11) pode ser posto em causa pela ostentação com que é feita. O mesmo se diga da oração, muitas vezes exibida «nos cantos das ruas» (v. 5). Quanto ao jejum, Cristo partilha a posição dos profetas (cf. Is 58, 5-7). O verdadeiro jejum implica conversão a Deus, e deve ser feito com alegria, como indicam os sinais festivos indicados no evangelho: perfumar a cabeça, lavar o rosto (v. 17). E como a conversão é um assunto pessoal, entre Deus e o pecador, deve manter-se secreta entre ambos. E Deus não deixará de retribuir o que bem conhece.

    Meditatio

    «Deus ama quem dá com alegria», afirma Paulo. Com estas palavras, o Apóstolo procura estimular a generosidade dos Coríntios para com a igreja de Jerusalém. Deus é o primeiro dador. Ele mesmo está na alegria, é alegre. Por isso, tem particular predilecção e aprova o «alegre dador». Esta formulação do texto original aumenta a qualidade da pessoa. Deus ama, não só aquele que faz dons com alegria, mas ama sobretudo o dador alegre, isto é, aquele que é alegre e faz dons simultaneamente como unitária personalidade. Este passar do fazer dons com alegria (episódios de bondade) ao ser feliz dador (continuidade) é outro máximo a que somos chamados, como filhos de Deus.
    Jesus quer que entremos em comunhão com o Pai, dador de todos os bens. Deu-se a nós na Eucaristia para que, em comunhão com Ele, entremos em comunhão com o Pai. A recta intenção, ou sinceridade no amor, que nos leva a fazer o bem sem esperar recompensa, é condição para entrarmos em comunhão com Ele e com o Pai. Havemos de procurar a comunhão com Deus, e nada mais. Havemos de fazer o bem porque Deus ama o bem e porque, fazendo o bem estamos em comunhão com Ele. Que vale a recompensa terrena, diante da alegria de estar em comunhão com Deus? Jesus alerta-nos para tudo isto com imagens exageradas, que tocam a nossa fantasia e ficam impressas na memória: «Quando deres esmola, não permitas que toquem trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas, nas sinagogas e nas ruas, a fim de serem louvados pelos homens. Em verdade vos digo: Já receberam a sua recompensa» (v. 2); «Quando deres esmola, que a tua mão esquerda não saiba o que faz a tua direita, a fim de que a tua esmola permaneça em segredo; e teu Pai, que vê o oculto, há-de premiar-te» (v. 3-4). Trata-se de um estilo muito vivo us
    ado por Jesus para nos dizer que, quando fazemos o bem, quase nós mesmos o devemos ignorar, para não sermos tomados pela vanglória. O mesmo sucede com a concreta descrição dos que rezam «de pé nas sinagogas e nos cantos das ruas, para serem vistos pelos homens... Já receberam a sua recompensa» (v. 5).
    O cuidado com que Jesus ministrava os seus ensinamentos, ensina-nos, também a nós, a cuidar da forma do que fazemos por Deus, pelo Evangelho, mas também pelos mais carenciados. A esmola que lhes damos não é apenas a esmola, em sentido literal, mas também a misericórdia, a compaixão, a solidariedade que comunica o amor de Deus, que tem o seu supremo ícone no Coração trespassado de Cristo.

    Oratio

    Bendito sejais, Senhor, Deus nosso Pai, por Jesus, dom da tua compaixão. Renova em nós, que experimentámos a tua misericórdia, a bem-aventurança dos misericordiosos semelhante à tua, que és o Misericordioso. Bendito sejais, Senhor, Deus nosso Pai, por Jesus, irmão que em nosso nome Te deu glória, e agora intercede por nós junto de Ti. Renova em nós a bem-aventurança do coração puro para que possamos, Deus nosso Pai, ver-Te no segredo de nós mesmos e nos sinais das tuas criaturas. Bendito sejais, Senhor, Deus nosso Pai, por Jesus, homem forte que no jejum superou em nosso nome as provocações do maligno. Renova em nós a bem-aventurança da fome e da sede de justiça, para que possamos saciar-nos de toda a palavra que sai da tua boca. Amen.

    Contemplatio

    A bem-aventurada Margarida Maria recomenda sem cessar o amor de Nosso Senhor Jesus Cristo e do seu Coração Sagrado, mas ela repete muitas vezes também que Jesus não pode contentar-se com um amor tíbio e indolente. Pede um amor constante e generoso. Quer um amor que se sustenha igualmente nas aflições e nas consolações. «Que fraqueza não amar Nosso Senhor senão quando ele nos acaricia, dizia, e de arrefecer logo que ele nos prova! Isto não é um verdadeiro amor. Quem ama assim, ama-se demasiado a si mesmo para amar Jesus Cristo de todo o seu coração». «O fruto deste amor constante, generoso e uniforme, dizia ainda, é uma adesão absoluta a todas as vontades de Deus. Quem ama generosamente está pronto a sofrer com paciência os acontecimentos que o desgostam». «Deus ama aqueles que se dão a ele com alegria e com satisfação», diz-nos S. Paulo (2 Cor 11). A bem-aventurada dizia também: «A verdadeira marca do espírito de Deus é servi-lo com paz e contentamento. - Fazei todas as coisas, dizia, com um espírito livre na presença de Deus, com o único desejo de lhe agradar». O sinal do amor de Deus bem consolidado é a alegria calma e pacífica, santificada pela união com o Coração de Jesus. (Leão Dehon, OSP3, p. 608s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Deus ama quem dá com alegria » (2 Cor 9, 7).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XI Semana - Quinta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XI Semana - Quinta-feira

    19 de Junho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: 2 Coríntios 11, 1-11

    Irmãos: oxalá pudésseis suportar um pouco de insensatez da minha parte! Mas, de certo, ma suportareis. 2Sinto por vós um ciúme semelhante ao ciúme de Deus, pois vos desposei com um único esposo, Cristo, a quem devo apresentar-vos como virgem pura. 3Mas receio que, como a serpente seduziu Eva com a sua astúcia, os vossos pensamentos se deixem corromper, desviando-se da simplicidade que é devida a Cristo. 4Pois de boamente aceitais alguém que surge a pregar-vos outro Jesus diferente daquele que nós pregámos, ou acolheis um espírito diferente daquele que recebestes, ou um Evangelho diverso daquele que abraçastes. 5Ora, eu penso que em nada sou inferior a esses superapóstolos. 6E embora seja menos perito na palavra, não o sou, certamente, na ciência. Em tudo e de todas as maneiras vo-lo temos demonstrado. 7Porventura cometi alguma falta, ao humilhar-me para vos exaltar, quando vos anunciei gratuitamente o Evangelho de Deus? 8Despojei outras igrejas, recebendo delas o sustento para vos servir, 9e encontrando-me necessitado no meio de vós, não fui pesado a ninguém, pois os irmãos vindos da Macedónia é que proveram às minhas necessidades. Em tudo me guardei de vos ser molesto e continuarei a fazê-lo. 10Pela verdade de Cristo que está em mim, não me será tirado este motivo de glória nas regiões da Acaia. 11E porquê? Porque não vos amo? Deus o sabe!

    Para compreender a terceira parte da Segunda Carta aos Coríntios, é preciso perceber as posições das duas frentes em choque. Paulo luta contra «superapóstolos» (v. 5), «falsos apóstolos, obreiros fraudulentos, disfarçados de apóstolos de Cristo» (11, 13). A linguagem paulina é dura e está imbuída de uma fina e cortante ironia. Tratava-se, sem dúvida, de alguns judaizantes que tentavam criar desacordo na comunidade de Corinto, fazendo-se valer mais do que Paulo. Atribuíam grande valor ao próprio ministério apostólico, desprezando o de Paulo. Eram arrogantes, exigentes, duros, agressivos... Em relação a Paulo, censuravam-lhe precisamente o contrário. Acusavam-no de ser excessivamente benévolo e simples: «As suas cartas, dizem, são duras e enérgicas, mas quando está presente é fraco, e a sua palavra, desprezível» (10, 10). O Apóstolo defende-se destas e de outras acusações e declara o seu sentido de responsabilidade para com uma comunidade eclesial que ele mesmo, segundo a graça que lhe foi concedida, edificou como «sábio arquitecto» (1 Cor 3, 10). Orgulha-se também de ser o mediador do noivado da igreja de Corinto com Cristo. Apesar de celibatário (cf. 1 Cor 7, 7), Paulo conhece a vida matrimonial, servindo dessa imagem na sua eclesiologia cristológica (cf. Ef 5, 25b-27). Cristo é esposo, a Igreja é esposa. As núpcias são imagem do amor oblativo, libertador, purificador.

    Evangelho: Mateus 6, 7-15

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 7«Nas vossas orações, não sejais como os gentios, que usam de vãs repetições, porque pensam que, por muito falarem, serão atendidos. 8Não façais como eles, porque o vosso Pai celeste sabe do que necessitais antes de vós lho pedirdes.» 9«Rezai, pois, assim: 'Pai nosso, que estás no Céu, santificado seja o teu nome, 10venha o teu Reino; faça-se a tua vontade, como no Céu, assim também na terra. 11Dá-nos hoje o nosso pão de cada dia; 12perdoa as nossas ofensas, como nós perdoámos a quem nos tem ofendido; 13e não nos deixes cair em tentação, mas livra-nos do Mal.' 14Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também o vosso Pai celeste vos perdoará a vós. 15Se, porém, não perdoardes aos homens as suas ofensas, também o vosso Pai vos não perdoará as vossas.»

    Depois de ter criticado o modo de orar dos fariseus e dos pagãos, Jesus ensina o Pai nosso. No tempo de Jesus, todos os grupos ou seitas religiosas tinham as suas orações específicas. No texto paralelo de Lucas (11, 1-4), os discípulos de Jesus pedem ao Mestre uma oração própria, a exemplo da que João Baptista tinha ensinado aos seus discípulos.
    O cristão deve evitar a ostentação farisaica e a "poliloghia", o palavreado dos pagãos, que soavam aos ouvidos de Deus como um enfadonho blá-blá...
    Pai nosso que estais nos céus. Nas religiões antigas não era muito habitual dirigir-se a Deus como Pai. Mas, no Antigo Testamento, Deus era invocado com esse título, dada a sua relação especial com Israel, salvo da escravidão e protegido com evidentes sinais de intervenções divinas. Jesus é o Filho de Deus. Aqueles que O seguem participam dessa filiação divina. Por isso, O podem chamar Pai (abbá = papá, paizinho, pai querido).
    Santificado seja o vosso nome. Na linguagem bíblica, o nome é a pessoa. Invocar o nome de Deus é invocar a Deus. Se Deus é o santo por excelência, que significa pedir que seja santificado? Significa pedir que Se manifeste, Se dê a conhecer e cumpra as suas promessas. Significa também pedir que a nossa vida cristã coerente leve outros à fé. Uma vida cristã incoerente pode levar à blasfémia do nome de Deus.
    Venha a nós o vosso reino. O reino ou reinado de Deus significa a nova ordem ou estado das coisas, na qual a sua soberania é reconhecida e aceite. Este reino é actualidade e presença, a partir da presença de Jesus. Mas pede-se o seu reconhecimento no presente, e a sua plena revelação no futuro.
    O pão nosso de cada dia nos dai hoje. Pede-se a Deus poder para satisfazer as necessidades de cada dia e, provavelmente, o pão que é o próprio Cristo assimilado pela fé, o pão da eucaristia.
    Perdoai-nos as nossas ofensas. Todos temos dívidas para com Deus, isto é culpas ou pecados, uma que vivemos sob a sua «graça» e não lhe somos sempre fiéis. Mas o perdão que pedimos é condicionado pelo perdão que concedemos, ou não, aos nossos «devedores».
    Não nos deixeis cair em tentação. Aqui, tentação significa provação. Seremos julgados tendo em conta as nossas reacções às provações da nossa vida.
    Livrai-nos do mal. Há duas formas de traduzir esta petição: livrai-nos do mal ou livrai-nos do maligno. Nos tempos de Jesus, considerava-se que o maligno, o demónio, estava por detrás de qualquer mal. Hoje não se pensa assim. Mas o confronto com o demónio é algo que faz parte da nossa experiência.

    Meditatio

    Nos primeiros tempos da Igreja, o Pai nosso fazia parte da coisas secretas da fé cristã. Os catecúmenos só o recebiam na vigília do Baptismo, quando também lhes era explicada a Eucaristia. Os que o recebiam guardavam-no como uma verdadeira relíquia, e ficavam ansiosamente à espera do momento em que, saindo da fonte baptismal, «rodeados pelos irmãos e aprese
    ntados pela mãe Igreja», elevassem as mãos aos céus, e pudessem rezar pela primeira vez: «Pai nosso!», dando-se a conhecer a todos como filhos de Deus. É o que nos refere Tertuliano no seu livro sobre o Baptismo. É bom recordarmos estas coisas, porque talvez tenhamos banalizado o Pai nosso, repetindo-o maquinalmente, sem pensarmos no que estamos a dizer. Talvez tenhamos deixado perder o sentido de mistério tremendo que se esconde nessas palavras saídas da boca de Deus, e dirigidas aos ouvidos do mesmo Deus!
    Precisamos de recuperar o Pai nosso da rotina com que o rezamos e que é como que uma camada de pó, que sobre ele se foi depositando, não o deixando brilhar dentro de nós. Dirigimo-nos a Deus chamando-lhe «Pai» e essa palavra já não provoca em nós qualquer emoção! Temos, pois, que recebê-lo novamente das mãos de Jesus, como quando os Apóstolos, vendo-O rezar, Lhe disseram: «Senhor, ensina-nos a rezar!» (Lc 11, 1). Então, Jesus, disse-lhes: «Quando orardes, dizei: Pai nosso». Que enorme espanto terão sentido os Discípulos ao escutarem a oração do Senhor, ao pronunciá-la pela primeira vez! O Pai nosso nasce do Coração de Jesus! É a oração do Filho ao Pai. Foi ao observar essa relação de profunda intimidade na oração, que os Discípulos perceberam que não sabiam rezar, que tinham de aprender a rezar com Jesus. E pediram -Lhe: «Senhor, ensina-nos a rezar!» (Lc 11, 1). Jesus ensinou-lhes a sua oração. O Pai nosso é a oração da Cabeça, comunicada aos Membros, que se torna oração de todo o Corpo de Cristo, que é Ele (Cabeça) e a Igreja (Corpo).
    Quando rezamos o Pai nosso unimo-nos a Cristo que reza, unimo-nos aos seus sentimentos de respeito pelo Pai, aos seus sentimentos de ardor, de confiança, atrevimento, de emoção, de perseverança. O Pai nosso é a onda da oração de Jesus, que se propaga ao longo dos séculos e, como um pacífico tsunami, vai engrossando e tornando-se cada vez mais alterosa, ao recolher todas as vozes de súplica, todos os gritos que os homens erguem ao Céu.
    Há uma grande semelhança entre o Pai nosso e a Eucaristia. A Eucaristia, perpetua Jesus que se dá ao Pai pelos homens, Jesus que está no meio de nós «como Aquele que serve» (Lc 22, 37). No Pai nosso, perpetua-se a presença de Jesus que «reza». O Senhor poderia dizer: «Estou no meio de vós como Aquele que reza». Ele está «sempre vivo a interceder por nós» (Heb 7, 25). Na Eucaristia, comungamos no Corpo de Cristo; no Pai nosso, comungamos na oração de Cristo. Trata-se de uma verdadeira «comunhão espiritual», que podemos repetir todos as vezes que quisermos, mesmo quando não é possível a comunhão sacramental. O Pai nosso é o Evangelho abreviado, o Evangelho em oração. Escreve S. Cipriano: «São poucas as palavras, mas é grande o seu poder espiritual. Não falta absolutamente nada nesta oração de súplica e de louvor, que forma um verdadeira síntese da doutrina celeste». O Pai nosso é um sopro vivo do Evangelho, que sai da boca d´Aquele que é o Evangelho em Pessoa, Jesus. Procuremos lê-lo, meditá-lo e rezá-lo desse modo, e nessa perspectiva.

    Oratio

    Pai nosso, nós Te louvamos, bendizemos e adoramos. Cremos firmemente em Ti e no amor com que, do alto dos céus, vigias sobre nós. Renovamos a nossa confiança no teu nome santo, renovamos a nossa disposição de acolher a tua vontade e de a cumprir e ajudar a cumprir, porque a tua vontade é o nosso bem, a nossa realização pessoal e comunitária, a nossa santidade, a nossa salvação. Damos-Te graças pelo pão de cada dia, por tudo quanto nos ofereces para vivermos dignamente nesta terra, comprometendo-nos a reparti-lo com os irmãos. Perdoa-nos as nossas ofensas, e ajuda-nos a perdoar àqueles que nos tenham ofendido. Não nos deixes cair em qualquer espécie de tentação, particularmente na de esquecermos a tua paternidade e na de desconfiarmos da tua misericórdia. Amen.

    Contemplatio

    Pai-nosso que estais nos céus, eu vos peço que vos digneis perdoar às almas não vos terem amado, não vos terem prestado o culto que vos é devido, a vós, seu Pai augusto e querido, mas de vos terem afastado do seu coração onde vós desejáveis habitar; e para suprir à sua falta, eu vos ofereço o amor e a honra que o vosso Filho querido vos prestou sobre a terra, e esta abundante satisfação pela qual pagou a dívida de todos os seus pecados. Que o vosso nome seja santificado; eu vos conjuro, ó terno Pai, que vos digneis perdoar às almas... por terem honrado dignamente o vosso santo nome, de o terem muito raramente recordado com devoção, de o terem muitas vezes usado em vão, e por se terem tornado, pela sua vida desonrada, indignos do nome de cristão. E como satisfação por este pecado, eu vos ofereço a perfeitíssima santidade do vosso filho pela qual exaltou o vosso nome nas suas pregações, e o honrou em todas as suas santíssimas obras. Que o vosso reino venha; eu vos peço, ó terno Pai, que vos digneis perdoar às almas... por não terem desejado com fervor, nem procurado com cuidado a vós e ao vosso reino, no qual unicamente consistem o verdadeiro repouso e a eterna glória. Para expiar toda a indiferença que elas tiveram por toda a espécie de bem eu vos ofereço os santos desejos pelos quais o vosso Filho quis que o vosso reino chegue e que nós sejamos os co-herdeiros do seu reinado. Que a vossa vontade seja feita assim na terra como no céu; eu vos conjuro, ó terno Pai, que vos digneis perdoar às almas, e sobretudo aos religiosos, terem preferido a sua vontade à vossa e por não terem amado em toda a vossa vontade, para viverem e agirem muitas vezes seguindo a deles. E para reparar a sua desobediência, eu vos ofereço a união do dulcíssimo Coração do vosso Filho com a vossa santa vontade, do mesmo modo que apronta submissão com a qual ele vos obedeceu até à morte da cruz.
    Dai-nos hoje o nosso pão quotidiano; eu vos conjuro, ó terno Pai, para que perdoeis às almas não terem recebido o Santíssimo Sacramento do altar com os desejos, a devoção e o amor que ele merece; por se terem tornado, para um grande número, indignos, e por o terem muito raramente recebido. Para expiar o seu pecado, eu vos ofereço a perfeita santidade e a devoção do vosso Filho, bem como o ardente amor e o inefável desejo que o levaram a dar-nos este precioso tesouro. E perdoai-nos as nossas ofensas como nós perdoamos àqueles que nos ofenderam; eu vos conjuro, ó terno Pai, que vos digneis perdoar às almas os pecados nos quais elas caíram, sobretudo não perdoando àqueles que os tenham ofendido e não amando os seus inimigos. Por estes pecados, eu vos ofereço a oração da mais doce suavidade, que o vosso Filho fez sobre a cruz pelos seus inimigos. E não nos deixeis cair em tentação; eu vos conjuro, &oacute
    ; terno Pai, que perdoeis às almas não terem resistido aos seus vícios e às suas concupiscências, terem muitas vezes consentido nos embustes do demónio e da carne, e se deixarem voluntariamente envolver em muitas más acções. Pela multidão dos seus pecados, eu vos ofereço a gloriosa vitória pela qual o vosso Filho venceu o mundo e o demónio, assim como toda a sua santíssima vida, com todos os seus trabalhos e as suas fadigas, a sua tão amarga paixão e a sua morte. Mas livrai-nos do mal; de todo o mal e de toda pena, pelos méritos do vosso querido Filho, e conduzi-nos ao reinado da vossa glória, que outra não é senão vós mesmo. Assim seja. (Leão Dehon, OSP 4, pp. 429s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Senhor, ensina-nos a rezar» (Lc 11, 1).

  • Tempo Comum – Anos Ímpares – XI Semana – Sexta-feira

    Tempo Comum – Anos Ímpares – XI Semana – Sexta-feira

    20 de Junho, 2025

    Tempo Comum – Anos Ímpares – XI Semana – Sexta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: 2 Coríntios 11, 18.21b-30

    Irmãos: Já que muitos se gloriam por motivos humanos, também eu o vou fazer. 19Na verdade, tão sensatos como sois, suportais de bom grado os insensatos. 20Suportais quem vos escraviza, vos devora, vos explora, vos trata com arrogância, vos esbofeteia. 21Para nossa vergonha o digo: como fracos nos mostramos. Mas daquilo de que alguém se faz forte – eu falo como insensato – também eu me posso fazer. 22São hebreus? Também eu. São israelitas? Também eu. São descendentes de Abraão? Também eu. 23São ministros de Cristo? – Falo a delirar – eu ainda mais: muito mais pelos trabalhos, muito mais pelas prisões, imensamente mais pelos açoites, muitas vezes em perigo de morte. 24Cinco vezes recebi dos Judeus os quarenta açoites menos um. 25Três vezes fui flagelado com vergastadas, uma vez apedrejado, três vezes naufraguei, e passei uma noite e um dia no alto mar. 26Viagens a pé sem conta,perigos nos rios, perigos de salteadores, perigos da parte dos meus irmãos de raça, perigos da parte dos pagãos, perigos na cidade, perigos no deserto, perigos no mar, perigos da parte dos falsos irmãos! 27Trabalhos e duras fadigas, muitas noites sem dormir, fome e sede, frequentes jejuns, frio e nudez! 28Além de outras coisas, a minha preocupação quotidiana, a solicitude por todas as igrejas! 29Quem é fraco, sem que eu o seja também? Quem tropeça, sem que eu me sinta queimar de dor? 30Se é mesmo preciso gloriar-se, é da minha fraqueza que me gloriarei.

    Quase a terminar a sua carta, Paulo recorre à sua ficha sociológica, enumerando todos os seus títulos de orgulho, não sem uma certa manha, para se defender dos que se lhe opõem e atacam: hebreu, israelita, descendente de Abraão, ministro de Cristo, apóstolo sujeito a mil perigos, dotado de carismas especiais, sobretudo de um célebre arrebatamento místico até ao terceiro céu (11, 21-12, 6). Depois disto, volta atrás e procura justificar e expor as razões da sua conduta, não encontrando motivos suficientes para se arrepender. Não se arrepende de ter oferecido o Evangelho aos Coríntios, gratuitamente (11, 8-10). Mas insiste, sobretudo, no seu método dialéctico de exercer a autoridade. Não quer ser excessivamente brando, mas também não quer ser rigorista (10, 8-9). Havia já nessa altura alguns grupos espiritualistas, que criticavam a Igreja por ser dialogante. Paulo afirma que a Igreja deve estar organizada, que deve haver uma autoridade. Mas essa autoridade há-de caracterizar-se por duas atitudes: ser dialogante para que a comunidade pense por sua própria cabeça e contribua decisivamente, e não só consultivamente, para a sua vida e missão; a actuação dos responsáveis deve ser construtiva e não destrutiva da própria realidade comunitária. Mas, para determinar o que é construtivo e o que é negativo, é preciso recorrer sinceramente à consciência dessa comunidade.

    Evangelho: Mateus 6, 19-23

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 19«Não acumuleis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem os corroem e os ladrões arrombam os muros, a fim de os roubar. 20Acumulai tesouros no Céu, onde a traça e a ferrugem não corroem e onde os ladrões não arrombam nem furtam. 21Pois, onde estiver o teu tesouro, aí estará também o teu coração. 22A lâmpada do corpo são os olhos; se os teus olhos estiverem sãos, todo o teu corpo andará iluminado. 23Se, porém, os teus olhos estiverem doentes, todo o teu corpo andará em trevas. Portanto, se a luz que há em ti são trevas, quão grandes serão essas trevas!

    À primeira vista, Jesus condena a propriedade privada. Mas, observando o Evangelho, verificamos que Jesus permitia aos seus discípulos a propriedade de casa e campos (Mc 10, 29-30), as mulheres que Lhe prestavam assistência tinham os seus bens (Lc 8, 3; 10, 38) e os casos de Levi (Mc 2, 15) e de Zaqueu (Lc 19, 8) apontam na mesma direcção. O jovem rico é um caso à parte (Mc 10, 21).
    As palavras de Jesus compreendem-se a partir da oposição tesouro na terra e tesouro no céu. Quem agir segundo a justiça, praticar o bem, der esmola … terá um tesouro no céu. Era a mentalidade comum no tempo de Jesus, e que devemos ter em conta. Mas a afirmação de Jesus tem uma profundidade maior: a propriedade terrena é passageira e incerta… Como é que se obtém o tesouro no céu? Orientando o coração, isto é, a afectividade, o homem todo, com os seus apetites e desejos mais íntimos e profundos, para Deus. Esse é o tesouro que permanece seguro.
    Os olhos são a lâmpada do corpo porque nos permitem ver. Se estiverem sãos, isto é, postos em Deus, que é a luz fonte de toda a luz, será iluminado o mistério da escuridão humana. Se estiverem doentes, isto é, não postos em Deus, viveremos nas trevas, no mistério da nossa própria escuridão.

    Meditatio

    O evangelho de hoje alerta-nos para o perigo da cegueira: «A lâmpada do corpo são os olhos; se os teus olhos estiverem sãos, todo o teu corpo andará iluminado. Se, porém, os teus olhos estiverem doentes, todo o teu corpo andará em trevas» (v. 22-23a). Que ligação existe entre estas palavras e a primeira parte do evangelho? Existe, pelo menos, uma bastante directa: a doença dos olhos é a ambição. O ambicioso não vê mais do que o seu interesse. Por isso, vai atrás de tudo o que possa vir a possuir e, sem ver os outros, nem enxergar os verdadeiros valores, avança na direcção errada, como um verdadeiro cego. Mas o Senhor quer que os nossos olhos estejam sãos, para que todo o nosso corpo esteja iluminado. Olhos sadios são a recta intenção, a atitude altruísta. Estes olhos são dom da graça e resultado da nossa colaboração generosa com ela. Havemos de pedi-los ao Senhor.
    Aqueles que são iluminados pelo Senhor sabem que o tesouro não são os bens terrenos, certamente preciosos, mas sujeitos a deteriorar-se, a ser roubados. De qualquer modo, são passageiros. O verdadeiro tesouro é o reino dos céus. Em vista dele, vale a pena vender tudo quanto se tem, para o comprar e possuir. O reino torna-se visível no seguimento de Cristo, em pobreza evangélica compensada por «um tesouro no céu» (Mt 19, 21). O «céu» como lugar do depósito e de reapropriação do «tesouro» é certamente a «vida eterna no céu», mas é também o amadurecimento daquela vida que, «no reino dos céus», equivale ao discipulado do Evangelho, ao seguimento de Cristo, à comunhão eclesial na história.
    Os discípulos sabem que o Verbo de Deus é a luz verdadeiro que veio ao mundo para iluminar todo o homem (Jo 1, 4.9; 3, 19). Aprenderam do próprio Jesus que é Ele a «luz do mundo», de tal modo que, quem O segue «não anda nas trevas mas terá a luz da vida» (Jo 8, 12). Aprenderam que, eles mesmos, s&atilde
    ;o a luz do mundo, com o compromisso de testemunhar o seu fulgor (Mt 5, 14-16). Os discípulos sabem que as «trevas» estão fora do Reino, e naqueles que lhe são estranhos. As «trevas» são ausência dos valores evangélicos, afastamento e recusa existencial de Cristo. São lugar de choro e ranger de dentes (Mt 22, 13; 25, 30).
    Tal como Jesus, nós não somos do mundo, mas, como apóstolos, n´Ele Apóstolo, enviado pelo Pai, como religiosos de «um Instituto religioso apostólico» (Cst. 1), estamos no mundo, e devemos mesmo ser «luz do mundo» (Mt 5, 14). Diz Paulo: «Não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, a fim de conhecerdes a vontade de Deus: o que é bom, o que Lhe é agradável e o que é perfeito» (Rm 12, 2). Quando? No momento presente, no «Hoje de Deus» (Cst 144).

    Oratio

    Senhor, Tu és a luz do mundo. Cura os meus olhos, pois sinto que estão doentes. Dá-me um olhar puro, que me faça conhecer o caminho recto para alcançar o fim da minha vida, que és Tu. Cura a minha ambição pelos bens da terra, e até pelos bens espirituais. Ensina-me a partilhar todos os teus dons com generosidade e alegria. Assim estarei disposto para acolher o verdadeiro tesouro que és Tu. Sê, Senhor, a luz dos olhos e a alegria do meu coração. Amen.

    Contemplatio

    A pobreza eucarística de Jesus não oferece, como a sua pobreza de Nazaré, um exemplo sensível e fácil a imitar, mas inspira um espírito de pobreza que encontrará a sua realização na nossa vida, segundo a vocação de cada um de nós. Cabe-nos procurar que grau de pobreza, mesmo exterior, a vontade divina pede de nós. E se o nosso estado de vida não pede a pobreza exterior absoluta, resta praticar a pobreza espiritual, o desapego que constitui a primeira bem-aventurança promulgada por Nosso Senhor: «Bem-aventurados os pobres em espírito, porque o reino de Deus lhes pertence». Resta também a pobreza interior, o dom total de nós mesmos a Nosso Senhor, à sua vontade, à sua direcção, manifestada pela nossa regra de vida e pela sua Providência. A santa visitandina, Margarida Maria diz-nos, sob a inspiração do Sagrado Coração, que a alma mais desnudada e mais despojada de tudo possuirá mais o Coração de Jesus e encontrará nela a paz e a felicidade. Ó feliz pobreza! Bendito seja o dia em que, vendo-nos perfeitamente desapegados de tudo o terrestre, seremos ricos de Nosso Senhor, da sua vida em nós, do seu divino Coração, vivendo e reinando nos nossos corações.
    Para ganhar o Coração todo amável de Jesus, diz Margarida Maria, é preciso imitá-lo na sua pobreza, deixando-nos dar ou tirar as coisas, como se estivéssemos mortos e insensíveis a tudo; considerando-nos como pobres e pensando que se nos despojassem de tudo, não nos fariam injustiça. (Leão Dehon, OSP3, p. 668s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Senhor, Tu és a Luz, que ilumina a terra inteira,
    Tu és a Luz que ilumina a minha vida» (de um cântico litúrgico).

  • Tempo Comum – Anos Ímpares – XI Semana – Sábado

    Tempo Comum – Anos Ímpares – XI Semana – Sábado

    21 de Junho, 2025

    Tempo Comum – Anos Ímpares – XI Semana – Sábado

    Lectio

    Primeira leitura: 2 Coríntios 12, 1-10

    Irmãos: é necessário que me glorie? Na verdade, não convém! Apesar disso, recorrerei às visões e revelações do Senhor. 2Sei de um homem, em Cristo, que, há catorze anos – ignoro se no corpo ou se fora do corpo, Deus o sabe! – foi arrebatado até ao terceiro céu. 3E sei que esse homem – ignoro se no corpo ou se fora do corpo, Deus o sabe! – 4foi arrebatado até ao paraíso e ouviu palavras inefáveis que não é permitido a um homem repetir. 5Desse homem gloriar-me-ei; mas de mim próprio não me hei-de gloriar, a não ser das minhas fraquezas. 6Decerto, se quisesse gloriar-me, não seria insensato, pois diria a verdade. Mas abstenho-me, não vá alguém formar de mim um juízo superior ao que vê em mim ou ouve dizer de mim. 7E porque essas revelações eram extraordinárias, para que não me enchesse de orgulho, foi-me dado um espinho na carne, um anjo de Satanás, para me ferir, a fim de que não me orgulhasse. 8A esse respeito, três vezes pedi ao Senhor que o afastasse de mim. 9Mas Ele respondeu-me: «Basta-te a minha graça, porque a força manifesta-se na fraqueza.»De bom grado, portanto, prefiro gloriar-me nas minhas fraquezas, para que habite em mim a força de Cristo. 10Por isso me comprazo nas fraquezas, nas afrontas, nas necessidades, nas perseguições e nas angústias, por Cristo. Pois quando sou fraco, então é que sou forte.

    Paulo confidencia aos Coríntios o êxtase que teve, havia catorze anos. Não se trata da visão que aconteceu na estrada de Damasco, porque as datas não coincidem. O Apóstolo não se sente capaz de descrever exactamente o que lhe aconteceu: se saiu ou não saiu do corpo. Mas lembra-se do facto, que leva gravado na consciência. Por isso, não se trata de desdobramento da personalidade.
    A expressão «terceiro céu» poderá indicar uma etapa superior à «de cima». As «palavras inefáveis», não são palavras indizíveis, mas palavras reservadas aos iniciados, palavras íntimas, que não podiam ser espalhadas aos quatro ventos.
    Paulo não pretende com esta confidência demonstrar a sua fé. Sabe que a fé é um dom gratuito. Apenas quer dizer aos Coríntios que também ele teve experiências fora do comum, mas que isso não lhe permite ser orgulhoso e afirmar-se superior aos outros. Até tem um «espinho na carne» para não ser tentado de egocentrismo religioso. Esse «espinho» pode ser uma doença, mas também a angústia que tem pelo povo judeu, ou as contínuas lutas com os falsos irmãos.

    Evangelho: Mateus 6, 24-34

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 24«Ninguém pode servir a dois senhores: ou não gostará de um deles e estimará o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e ao dinheiro.» 25«Por isso vos digo: Não vos inquieteis quanto à vossa vida, com o que haveis de comer ou beber, nem quanto ao vosso corpo, com o que haveis de vestir. Porventura não é a vida mais do que o alimento, e o corpo mais do que o vestido? 26Olhai as aves do céu: não semeiam nem ceifam nem recolhem em celeiros; e o vosso Pai celeste alimenta-as. Não valeis vós mais do que elas? 27Qual de vós, por mais que se preocupe, pode acrescentar um só côvado à duração de sua vida? 28Porque vos preocupais com o vestuário? Olhai como crescem os lírios do campo: não trabalham nem fiam! 29Pois Eu vos digo: Nem Salomão, em toda a sua magnificência, se vestiu como qualquer deles. 30Ora, se Deus veste assim a erva do campo, que hoje existe e amanhã será lançada ao fogo, como não fará muito mais por vós, homens de pouca fé? 31Não vos preocupeis, dizendo: ‘Que comeremos, que beberemos, ou que vestiremos?’ 32Os pagãos, esses sim, afadigam-se com tais coisas; porém, o vosso Pai celeste bem sabe que tendes necessidade de tudo isso. 33Procurai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça, e tudo o mais se vos dará por acréscimo. 34Não vos preocupeis, portanto, com o dia de amanhã, pois o dia de amanhã já terá as suas preocupações. Basta a cada dia o seu problema.»

    A última secção do capítulo 6 de Mateus refere a alternativa de opção perante a qual se encontra o cristão: «Ninguém pode servir a dois senhores: ou não gostará de um deles e estimará o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e ao dinheiro.» Há pois que decidir-se pelo «senhor» a quem se quer servir: ou Deus, ou dinheiro, isto é, o lucro e, portanto, os bens do homem, mas também «a avidez» com que o homem os procura e os possui. A ânsia na busca de bens materiais revela «pouca fé», frequentemente denunciada por Mateus (8, 26¸14, 31; 16, 8; 17, 20), mas também pouca confiança na providência divina. Para inculcar essa confiança, Jesus aponta as aves do céu e os lírios dos campos. Se essas criaturas, que hoje vivem e amanhã estarão mortos, são alimentados pela providência de Deus, quanto os homens, a quem foi prometida a eternidade, serão alimentados por Deus! Há que hierarquizar as nossas necessidades e os bens: o primeiro lugar pertence aos bens espirituais, que dão o sentido e o justo valor aos bens materiais. A verdadeira preocupação do homem há-de ser «o Reino de Deus e a sua justiça» (v. 33), permanecer nele, permanecer no senhorio de Deus.

    Meditatio

    «De bom grado prefiro gloriar-me nas minhas fraquezas, para que habite em mim a força de Cristo», afirma Paulo (v. 9). Não é facil gloriar-nos das nossas fraquezas, da nossa sorte humilde, escondida, obscura. Mas, quando temos, ou julgamos ter, alguma razão para nos gloriar, facilmente caímos no orgulho. Paulo estava consciente desse perigo por causa das «revelações extraordinárias» que recebera. Deus permitiu-lhe o «espinho na carne», que lhe fazia recordar permanente a sua fragilidade, mas que também lhe dava a certeza de que a força de Deus lhe era mais do que suficiente para viver e realizar a missão que lhe fora confiada. «Basta-te a minha graça, porque a força manifesta-se na fraqueza», diz-lhe o Senhor. O Apóstolo confia, abandona-se, e acaba por verificar a verdade dessas palavras. Por isso, exclama: «Quando sou fraco, então é que sou forte» (v. 10). Estas palavras são resultado duma experiência forte e dura da sua fragilidade, mas também do poder de Deus, que está com aqueles que escolhe e chama ao seu serviço.
    A experiência de Paulo repetiu-se inúmeras vezes na vida dos santos. Mas, ainda antes de Paulo, fê-la a Virgem de Nazaré. Maria reconheceu a sua pequenez, a sua fragilidade, mas também se alegrou com ela, porque lhe atraía especial atenção de Deus: «O meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador. Porque pôs os olh
    os na humildade da sua serva» (Lc 1, 47). Perante a missão que o Senhor lhe confia, Maria permanece tranquila, contente, em paz, abandonada à vontade de Deus. Não se preocupa consigo, mas com o projecto em que Deus a quer envolver. E assim viverá toda a vida, ao lado de Jesus, cuidando dele, servindo, acompanhando-o até ao Calvário, em atitude de paz e de confiança.
    Como para Maria, como para Paulo, também para todo o Oblato-Sacerdote do Coração de Jesus, o apostolado é um acto de culto, uma liturgia, na qual Cristo oferece os homens como vítimas ao Pai (cf. Rm 15, 16; Fl 2, 17). É uma “redamatio”, uma resposta de amor, realizada na união de amor e de sofrimento com Cristo (cf. 2 Cor 2, 15; 4, 7.10.12; cf. Cst 31.35).
    Referindo-nos ao exemplo de Paulo, é significativo o facto de que ele não ponha em primeiro plano a organização da sua obra de evangelização em Corinto, as suas fadigas, o ter-se «feito tudo para todos» (1 Cor 9, 23). O que torna eficaz o seu apostolado é a sua assimilação a Cristo, o reviver o Seu sacrifício. Compreendemos como, mesmo na fraqueza do Apóstolo, de todo o Oblato-Sacerdote do Coração de Jesus, e de todo o cristão, a graça de Cristo, por meio do Espírito, alcance a sua máxima eficácia (cf. 2 Cor 12, 9-10; cf. Fl 2, 17).

    Oratio

    Senhor Jesus, dá-me a graça de ser humilde e confiante, de permanecer contente e feliz com a vontade do Pai em toda e qualquer situação. Que a Virgem Maria, tua e nossa Mãe, apoie a minha fé e a minha esperança, e me ensine a disponibilidade ao serviço da Palavra.
    Virgem misericordiosa, alegre com a fecunda presença do Espírito Santo em Ti, ensina-me a saborear o olhar do nosso Salvador e a glorificar contigo a misericórdia derramada sobre todas as gerações. Amen.

    Contemplatio

    Quem se humilha será glorificado. Aqui está o princípio da glória de Maria. Ela foi totalmente humilde diante de Deus, e a humildade é a fonte de todas as graças e da glória do céu. A doutrina espiritual ensina-nos os graus da humildade: a obediência aos preceitos divinos que é o grau mais elementar; a obediência aos conselhos, se a eles sou chamado; o amor pelas humilhações, se quero seguir mais plenamente a Jesus, unir-me ao seu divino Coração e contribuir com ele para a salvação das almas. Maria foi a humildade mesma, e Deus olhou com amor e cumulou com as suas graças a sua humilde serva. Onde me encontro, a respeito dos preceitos, dos conselhos, das humilhações? Ó Maria, não posso seguir-vos até aos mais elevados cumes da virtude, mas é preciso, no entanto, que eu caminhe sobre os vossos passos, se quero ir para o céu. É preciso que eu pratique o desapego, a pureza, a humildade. Peço-vos que me obtenhais esta graça. (Leão Dehon, OSP4, p. 501s).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Quando sou fraco, então é que sou forte» (2 Cor 12, 10).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XII Semana - Segunda-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XII Semana - Segunda-feira

    23 de Junho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 12, 1-9

    Naqueles dias, o Senhor disse a Abrão: «Deixa a tua terra, a tua família e a casa do teu pai, e vai para a terra que Eu te indicar. 2Farei de ti um grande povo, abençoar-te-ei, engrandecerei o teu nome e serás uma fonte de bênçãos. 3Abençoarei aqueles que te abençoarem, e amaldiçoarei aqueles que te amaldiçoarem. E todas as famílias da Terra serão em ti abençoadas.» 4Abrão partiu, como o Senhor lhe dissera, levando consigo Lot. Quando saiu de Haran, Abrão tinha setenta e cinco anos. 5Tomou Sarai, sua mulher, e Lot, filho do seu irmão, assim como todos os bens que possuíam e os escravos que tinham adquirido em Haran, e partiram todos para a terra de Canaã, e chegaram à terra de Canaã. 6Abrão percorreu-a até ao lugar de Siquém, até aos carvalhos de Moré. Os cananeus viviam, então, naquela terra. 7O Senhor apareceu a Abrão e disse-lhe: «Darei esta terra à tua descendência.» E Abrão construiu ali um altar ao Senhor, que lhe tinha aparecido. 8Deixando esta região, prosseguiu até ao monte situado ao oriente de Betel, e montou ali as suas tendas, ficando Betel ao ocidente e Ai ao oriente. Construiu também um altar ao Senhor e invocou o seu nome. 9Abrão continuou a sua viagem, acampando aqui e ali, em direcção ao Négueb.

    A figura de Abraão estabelece a ligação entre as origens da humanidade e as origens do povo bíblico. Abraão é uma chave na teologia da história: por um lado, encarna a promessa de bênção que desde o princípio se insinua no seio da humanidade pecadora; por outro lado, dá sentido e alcance universal à eleição particular do povo bíblico, que de outro modo seria sectário e não teria legitimação numa teologia monoteísta. Abraão é a chave onde a humanidade tem futuro e a eleição de Israel a sua etiologia.
    O imperativo divino suscita da parte de Abraão uma resposta livre. A Bíblia não diz a razão da sua eleição: ela é insondável tal como o desígnio de Deus. Israel reflectirá longamente sobre o mistério deste chamamento, que insere Abraão na linha dos grandes mediadores e profetas ou, mais ainda, o faz protótipo de todos os crentes, mas não encontra outra resposta senão a da sua própria eleição: «O Senhor ligou-se a vós e escolheu-vos... porque o Senhor vos ama» (cf. Dt 7, 7s.). Não se deve perguntar a razão desta eleição fundada no amor, mas responder com amor. É a perspectiva do autor sagrado que, apesar da "normalidade", para um povo nómada, da migração de Abraão, a vê com uma enorme carga simbólica, que faz do seu "êxodo" a chave de leitura de toda a experiência humana, no encontro com o Deus vivo que pede o abandono de toda a segurança humana. Abraão, confiante na palavra do Senhor, parte para uma terra ocupada por gente rica e poderosa, percorre-a de alto a baixo, acabando por se fixar no Négueb, zona árida e sem vida. A sua esperança está apenas no Senhor.

    Evangelho: Mateus 7, 1-5

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 1«Não julgueis, para não serdes julgados; 2pois, conforme o juízo com que julgardes, assim sereis julgados; e, com a medida com que medirdes, assim sereis medidos. 3Porque reparas no argueiro que está na vista do teu irmão, e não vês a trave que está na tua vista? 4Como ousas dizer ao teu irmão: 'Deixa-me tirar o argueiro da tua vista', tendo tu uma trave na tua? 5Hipócrita, tira primeiro a trave da tua vista e, então, verás melhor para tirar o argueiro da vista do teu irmão.»»

    Na base dos provérbios que o evangelho hoje nos apresente, e noutros semelhantes, está o princípio da retribuição, que se apoia numa norma de paridade: o mesmo que fizeres aos outros, te farão a ti. Desperta-nos a atenção o passivo dos verbos: «sereis julgados», «sereis medidos». Estamos perante o chamado passivo divino. O sujeito destes verbos é Deus. Na forma activa, diríamos: Deus vos julgará, vos medirá. Sendo assim, trata-se de uma verdadeira ameaça. Quem pode resistir ao julgamento ou à medida de Deus?
    Se virmos bem, Jesus não nos proíbe julgar e medir os outros, mas ensina-nos como fazê-lo. A medida do juízo divino será igual à que usarmos nos nossos julgamentos humanos. Na antiguidade, a medida com que se media a cessação de um bem, era a mesma que assegurava a sua restituição. Os rabinos, por sua vez, ensinavam que Deus Se servia de um duplo critério de juízo: a justiça e a bondade.
    O convite a não julgar forma como que uma espécie de refrão no Novo Testamento. O próprio Cristo Se apresenta como aquele que não vem julgar, mas salvar (Jo 3, 7; cf. Jo 8, 11; Lc 23, 34). Paulo também nos previne contra o risco de fazermos julgamentos: «ao julgares o outro, a ti próprio te condenas» (Rm 2, 1).

    Meditatio

    Começamos, hoje, a ouvir a história de Abraão, modelo da caminhada de fé dos crentes. O amor de Deus por este homem revela-se, no mínimo, desconcertante: «Deixa a tua terra, a tua família e a casa do teu pai, e vai» (v. 1). Para onde? «Para a terra que Eu te indicar» (v. 1). Tudo é obscuro para o Patriarca. Apenas brilha a luz de uma promessa de Deus: «Farei de ti um grande povo, abençoar-te-ei, engrandecerei o teu nome e serás uma fonte de bênçãos» (v. 2). Confiado na palavra do Senhor, Abraão partiu. Obedeceu na fé: «Abrão partiu, como o Senhor lhe dissera» (v. 4).
    Abraão chega com a família à terra de Canaã. Percorre-a, e conhece os seus habitantes. Talvez não lhe parecesse fácil tomar posse daquela terra. Mas Deus volta a falar-lhe: «Darei esta terra à tua descendência» (v. 7). O Patriarca vê delinear-se o projecto de Deus. É preciso que ele morra, para que as gerações futuras tenham vida. Então, «construiu ali um altar ao Senhor, que lhe tinha aparecido» (v. 7). E continuou a sua peregrinação: «Deixando esta região, prosseguiu até ao monte situado ao oriente de Betel, e montou ali as suas tendas... Construiu também um altar ao Senhor e invocou o seu nome... Continuou a sua viagem, acampando aqui e ali, em direcção ao Négueb». Basta-lhe estar em relação com Deus e cumprir a sua vontade.
    É assim que Deus educa Abraão, e cada um dos crentes, a sucessivos desapegos, que podem parecer exagerados, mas que conduzem à liberdade. Não há volta a dar: ou aceitamos o projecto de Deus que nos quer tornar dom para a sua glória e para o bem dos outros, ou nos fechamos no nosso egoísmo mesquinho que nos faz prisioneiros de nós mesmos. Abraão aceitou tornar-se dom incondicional, sem nada saber o que estava para acontecer. A fé é isto: é estar abertos, dispon&i
    acute;veis, aceitar caminhar nas trevas ao encontro de Alguém em quem confiamos, felizes por Lhe podermos dar o que nos pede, por O amarmos por Si mesmo, por pormos n´Ele a nossa alegria e o nosso amor, numa relação pessoal que Deus quer tornar cada vez melhor e mais bela. Tudo o resto é secundário. Deus repete-nos a sua palavra muitas vezes na vida, porque a nossa liberdade precisa de ser muitas vezes libertada.
    No evangelho, Jesus recomenda que não julguemos os outros. Ele também não julgou, mas entregou-Se para a todos salvar e justificar. Deu a vida para que todos tenhamos a vida. O seu juízo sobre o mundo é a cruz, um amor sem limites e misericordioso para com todos, sem qualquer excepção. Cada homem tem, para Jesus, o valor do amor que o Pai tem por Ele, seu Filho. Mas Deus amou tanto o mundo que entregou esse Filho para o salvar. Cada vez que não julgamos os outros, damos um grande passo rumo àquela terra prometida para onde nos levam as mais humildes manifestações de delicadeza, de amor e de respeito para com os irmãos. Não julgar, amar os irmãos, é partir de nós mesmos ao encontro do Senhor que, durante a peregrinação terrena apenas podemos ver nos ícones que são os nossos irmãos, particularmente o mais fracos e carenciados.
    A vida comunitária exige que cada um acolha os outros como realmente são, com a sua personalidade e funções, com as suas iniciativas e limitações... (Cst 66). Há que não julgar ninguém. Julgar é presumir que se conhecem as intenções profundas do coração. Mas só Deus as conhece. Ainda que não aprovemos, respeitamos a liberdade pessoal de cada um, as suas opiniões e convicções diferentes. «A vida comunitária exige que cada um acolha os outros como realmente são». É um acto de amor, que desejamos também para nós, tendo presente o ensinamento do Concílio Vaticano II: «Seja reconhecida aos fiéis, tanto eclesiásticos como leigos, a liberdade de investigar, de pensar, de manifestar com humildade e com coragem a sua opinião no campo em que são competentes» (GS 62).

    Oratio

    Senhor, Deus de Abraão, Tu também nos chamas pelo nome e mandas partir por caminhos desconhecidos, muitas vezes misteriosos e imprevisíveis. Faz-nos dóceis e obedientes, para que nos deixemos conduzir pela tua voz, e confiemos unicamente em Ti, que és Pai. Ensina-nos a amar todos quantos encontramos ao longo do caminho, porque também são teus filhos e nossos irmãos. Juntos chegaremos à terra prometida, que és Tu, com o Filho e o Espírito Santo. Amen.

    Contemplatio

    O nome de Jesus é mais glorioso que o de Adão. Adão foi o pai temporal de toda a raça humana. Devemos-lhe a vida, mas também as fraquezas que derivam do seu pecado. Jesus é o nosso Pai espiritual, a ele devemos-lhe a salvação. O nome de Jesus é mais glorioso que o de Abraão. Abraão foi o pai do povo hebreu, que foi o povo de Deus pelas promessas, pelas figuras, pela preparação do Messias. Jesus é o Pai do verdadeiro povo de Deus, de todas as almas unidas a Deus pela graça e pela glória. O nome de Jesus é maior que o de Moisés. Moisés tirou o seu povo da escravidão, do Egipto, e transmitiu-lhe a lei de Deus, conduziu-o até à entrada da Terra prometida. Jesus tirou-nos da escravidão do pecado, deu-nos a lei Evangélica, mais perfeita que a de Moisés; fez-nos entrar na Terra prometida da Igreja e da graça, aguardando a do céu. O nome de Jesus é maior que o de Josué, aquele que conduziu os Israelitas à Terra prometida, mas mais não era que a figura da Igreja e do céu. Um dia em que eram recitadas na epístola estas palavras: Deus deu-lhe um nome que está acima de todos os nomes, Santa Matilde conjurou Nosso Senhor a dar-lhe a conhecer este nome glorioso, que o seu Pai lhe deu; respondeu: «É o nome de Jesus ou de Salvador, porque eu sou o Salvador e o Redentor de todos os que existem, que existem e que devem existir na sucessão dos tempos... Sou o Salvador de todos os que obedeceram aos meus mandamentos ou que devem segui-los no futuro. Tal é o nome supremo e superior a todos os outros, que o meu Pai me reservou desde a origem» (Revelações, 16). Ó Jesus, adoro este nome que merece que em sua honra todo o joelho se dobre no céu, na terra e nos infernos. (Leão Dehon, OSP3, p. 23).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra
    «Deixa a tua terra e vai para a terra que Eu te indicar» (Gn 12, 1).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XII Semana - Terça-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XII Semana - Terça-feira

    24 de Junho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 13, 2.5-18

    Abrão era muito rico em rebanhos, prata e ouro. 5Lot, que acompanhava Abrão, possuía, igualmente, ovelhas, bois e tendas; 6a terra não era bastante grande para nela se estabelecerem os dois, porque os bens de ambos eram avultados. 7Houve questões entre os pastores dos rebanhos de Abrão e os pastores dos rebanhos de Lot. Os cananeus e os perizeus habitavam, então, aquela terra. 8Abrão disse a Lot: «Peço-te que entre nós e entre os nossos pastores não haja conflitos, pois somos irmãos. 9Aí tens essa região toda diante de ti. Separemo-nos. Se fores para a esquerda, irei para a direita; se fores para a direita, irei para a esquerda.» 10Lot ergueu os olhos e viu todo o vale do Jordão, que era inteiramente regado. Antes de o Senhor ter destruído Sodoma e Gomorra, estendendo-se até Soar, o vale era um maravilhoso jardim, como a terra do Egipto. 11Lot escolheu para si todo o vale do Jordão e dirigiu-se para o oriente, separando-se um do outro. 12Abrão fixou-se na terra de Canaã, e Lot nas cidades do vale, no qual ergueu as suas tendas até Sodoma. 13Ora, os habitantes de Sodoma eram perversos, e grandes pecadores diante do Senhor. 14Depois de Lot o ter deixado, Deus disse a Abrão: «Ergue os teus olhos e, do sítio em que estás, contempla o norte, o sul, o oriente e o ocidente. 15Toda a terra que estás a ver, dar-ta-ei, a ti e aos teus descendentes, para sempre. 16Farei que a tua descendência seja numerosa como o pó da terra, de modo que só se alguém puder contar o pó da terra é que a tua posteridade poderá ser contada. 17Levanta-te, percorre esta terra em todas as direcções, porque Eu ta darei.» 18Abrão desmontou as suas tendas e foi residir junto aos carvalhos de Mambré, próximo de Hebron; e ali construiu um altar ao Senhor.

    Abraão e o seu sobrinho Lot viram crescer a sua riqueza em rebanhos. Surgiram, então, problemas de espaço, de abastecimento de água e de pastagens, e foi preciso separar-se. Esta narrativa explica as relações entre os Israelitas e os Amonitas/Edomitas, na época da sedentarização. A memória do litígio entre os dois clãs é apresentada com uma nova profundidade teológica, cuja mensagem continua actual. A riqueza de Abraão e de Lot mostra os efeitos da bênção divina derramada sobre eles. Como chefe de clã, Abraão está preocupado que haja pastos abundantes e poços de água para todos. Quando escasseiam, oferece ao sobrinho a possibilidade de escolher. Assim revela um coração livre e desapegado das riquezas. Lot escolhe a melhor parte, que todavia se irá revelar sem futuro. A beleza do vale do Jordão antes da destruição de Gomorra, enfatizada na descrição, esconde o caruncho da corrupção dos seus habitantes. Abraão, sem descendentes, aceita a terra mais pobre, continuando a manifestar total confiança naquele Deus que o chamou e o mandou partir, mostrando-se capaz de ver para além do momento presente. Aceita Deus e a sua promessa. Então, o Senhor convida Abraão a erguer os olhos e a observar o país - todo o país - que será seu, e assegura-lhe uma descendência numerosa «como o pó da terra» (v. 16). Lot recebeu tudo imediatamente. Mas o presente revelou-se inconsistente para ele. Abraão, pelo contrário, acreditou no futuro de Deus e a sua esperança não foi desiludida.

    Evangelho: Mateus 7, 6.12-14

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 6«Não deis as coisas santas aos cães nem lanceis as vossas pérolas aos porcos, para não acontecer que as pisem aos pés e, acometendo-vos, vos despedacem.» 12«Portanto, o que quiserdes que vos façam os homens, fazei-o também a eles, porque isto é a Lei e os Profetas.» 13«Entrai pela porta estreita; porque larga é a porta e espaçoso o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que seguem por ele. 14Como é estreita a porta e quão apertado é o caminho que conduz à vida, e como são poucos os que o encontram!».»

    Mateus apresenta-nos dois provérbios de difícil compreensão, por várias razões: vêm logo depois de Jesus nos ter proibido julgar os outros e nos ter mandado aplicar a medida com moderação, compreensão e perdão; não encontramos provérbios paralelos na literatura judaica que nos ajudem a compreender estes; apenas lemos no Talmud: «não entregueis a um pagão as palavras da Lei» e «não coloqueis coisas santas em lugares impuros», mas não ajudam muito no nosso caso. Os sacrifícios oferecidos no templo eram chamados «santos»; as pérolas, sob o ponto de vista comercial, eram preciosas. As palavras «santo» e «pérolas» provavelmente indicavam o Evangelho, a Boa Nova. Os «cães» e os «porcos», por sua vez, não eram os pagãos, como alguns dizem, mas todas aqueles que, pagãos ou não, desprezavam a Boa Nova, tal como os porcos desprezam as pérolas.
    O evangelista aponta, depois, a regra de ouro: «o que quiserdes que vos façam os homens, fazei-o também a eles» (v.12). Este princípio encontra-se noutras religiões, nomeadamente no judaísmo. Mas com uma diferença: no judaísmo é formulado negativamente: «Não faças aos outros o que não queres que te façam a Ti» É uma diferença importante, porque, «não fazer» é sempre algo negativo. Mas a maior diferença é que Jesus eleva essa regra a princípio universal.
    Depois, Jesus cita os provérbios das duas portas e dos dois caminhos, usados entre os moralistas da época para indicar o caminho da virtude, estreito e difícil, e o do vício, espaçoso e fácil. Mas Jesus introduz uma mudança: a porta e o caminho estreitos, da renúncia, do seguimento, da cruz, levam à vida; a porta e o caminho espaçosos, da satisfação dos apetites desordenados, levam à perdição. Há que escolher.

    Meditatio

    O desapego, a que a fé leva o crente, dá-lhe uma grande liberdade de espírito. Os ricos, muitas vezes, andam preocupados em conservar e aumentar as suas riquezas. Abraão, pelo contrário, está mais preocupado em ter boas relações com os seus vizinhos, do que em ter abundância de pastos, de água e de rebanhos. Quer evitar conflitos com o seu sobrinho Lot e, com grande liberdade de espírito, antecipa a regra de ouro proclamada por Jesus: «o que quiserdes que vos façam os homens, fazei-o também a eles» (v. 12). Abraão diz ao sobrinho: «Peço-te que entre nós e entre os nossos pastores não haja conflitos, pois somos irmãos. Aí tens essa região toda diante de ti. Separemo-nos. Se fores para a esquerda, irei para a direita; se fores para a direita, irei para a esquerda» (vv. 8-9). Deixar ao outro escolher é o melhor modo de evitar conflitos. Mas não é uma decisão fácil, porque vemos melhor os nossos direitos, e os deve
    res dos outros, do que os seus interesses. Lot escolhe o fértil vale do Jordão, enquanto Abraão se contenta com a parte montanhosa e árida de Canaã. Podemos ver neste episódio uma aplicação ante litteram do ensinamento de Jesus: «Entrai pela porta estreita; porque larga é a porta e espaçoso o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que seguem por ele. Como é estreita a porta e quão apertado é o caminho que conduz à vida» (vv. 13-14). Jesus é, como sabemos, o caminho, o caminho estreito, que passa pela Cruz, mas que chega à Vida, à vida divina que é Ele mesmo. Jesus é também a porta estreita do desapego, do abandono, da abnegação, que nos dá acesso à Felicidade, à Bem-aventurança, que, ao fim e ao cabo, é Ele mesmo, com o Pai e o Espírito Santo.
    Lot escolheu o «caminho espaçoso», o caminho fácil, que, no seu termo, conduzia a Sodoma e a Gomorra, símbolos da corrupção e da perdição. Abraão optou pelo «caminho estreito», que levava a Canaã, a Terra Prometida: «Ergue os teus olhos e, do sítio em que estás, contempla o norte, o sul, o oriente e o ocidente. Toda a terra que estás a ver, dar-ta-ei, a ti e aos teus descendentes, para sempre» (vv. 14-15).
    Esta página leva-nos, mais uma vez, a meditar sobre a nossa situação neste mundo. Há sempre dois caminhos diante de nós: o que leva à vida e o que leva à morte. Há que optar por um deles. Em termos actuais, diríamos que temos de escolher entre o que nos agrada, o que nos satisfaz imediatamente, sem nos interessarmos pelos outros, e o que é justo e recto, o que é conforme à vontade de Deus e ao bem dos irmãos. Esta segunda opção pode parecer-nos dura e exigente no começo. Mas alarga-nos o coração e os horizontes. Leva à felicidade. Assim, vemos antecipadamente realizadas em Abraão as palavras de Jesus: «A felicidade está mais em dar do que em receber» (Act 20, 35).
    A nossa vida de oblação exige a opção pelo caminho apertado e pela porta estreita, em união com Cristo, vivendo a oblação de Cristo. Mas, essa opção, antes de ser fruto do nosso esforço, da nossa generosidade e boa vontade, é fruto do amor de Deus, da graça, da oração: é dom do Coração de Cristo, é sustentada pela Espírito.

    Oratio

    Dai-nos, Senhor, o vosso Espírito de Amor, para sermos com Cristo e em Cristo profetas do Amor e servidores da reconciliação na Igreja e no mundo.
    Dai-nos, Senhor, o vosso Espírito de Amor, para continuarmos no mundo a presença libertadora de Cristo, pondo toda a nossa vida ao serviço dos vossos desígnios de salvação.
    Dai-nos, Senhor, o vosso Espírito de Amor, para darmos, hoje e sempre, um testemunho vivo de oblação e de serviço na caridade para com todos quantos nos procuram.
    Dai-nos, Senhor, o vosso Espírito de Amor, para vivermos este dia num alegre esforço de fraternidade com todos aqueles com quem estamos comunitariamente unidos na oração, na vida e no trabalho.
    Dai-nos, Senhor, o vosso Espírito de Amor, para que, através de toda a nossa vida, das nossas orações, trabalhos e sofrimentos, prestemos um culto de amor e reparação ao Coração do vosso Filho.

    Contemplatio

    O melhor meio de adquirir uma força superior à das tentações é unir-se e abandonar-se inteiramente a Nosso Senhor e ao seu divino Coração. - Os motivos sobrenaturais são as únicas armas nas quais uma alma cuidadosa dos seus interesses eternos possa colocar a sua confiança. E entre estes motivos, os mais poderosos são aqueles que mais levam Nosso Senhor a participar no combate e que nos trazem assim o socorro de uma graça mais abundante. Nosso Senhor oferece a sua graça a todos, mas embora a sua graça seja gratuita, ordinariamente não a distribui senão em proporção das garantias que recebe. É preciso, portanto, julgar os sentimentos que Ele experimenta para com as almas nesta distribuição das graças segundo os de um bom pai de família para com as pessoas da sua casa. Um bom pai de família ajuda e defende sempre todos os seus bens; mas nos perigos instantes, presta um socorro mais pronto e mais poderoso à sua esposa, aos seus filhos, do que aos seus servos. Entre estes, protege com mais diligência e mais eficácia os que se tornaram mais caros ao seu coração pela sua afectuosa dedicação e pelos seus cuidados. Em último lugar, virão os escravos, que não se mostram fiéis e exactos senão por medo do castigo. Em que categoria nos havemos de colocar? Não depende de ninguém tornar-se esposa, esta escolha é reservada ao Senhor. Mas depende de nós tornarmo-nos seus filhos afectuosos. A única condição a preencher, é a de nos abandonarmos totalmente a Nosso Senhor e nos confiarmos ao seu divino Coração, como uma criança se abandona à sua mãe, darmo-nos generosamente a Ele, com amor, com o único objectivo de lhe agradarmos, e de lhe provarmos o nosso amor como for do seu agrado pedi-lo. Quando a generosidade não vai até ao abandono, quando a preocupação pelos direitos que pretenda ter-se sobre o próprio senhor, faz que deixemos dominar em nós, apesar de uma real afeição, a preocupação pela recompensa ligada aos nossos serviços, colocamo-nos entre os servos. E se o interesse domina a afeição, descemos ao nível do mercenário e do escravo. (Leão Dehon, OSP3, p. 278).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Mostra-me, Senhor, os teus caminhos
    e ensina-me as tuas veredas.» (Sl 25, 4).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XII Semana - Quarta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XII Semana - Quarta-feira

    25 de Junho, 2025 26 de Junho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 15, 1-12.17-18

    Naqueles dias, 1após estes acontecimentos, o Senhor disse a Abrão numa visão: «Nada temas, Abrão! Eu sou o teu escudo, a tua recompensa será muito grande.» 2Abrão respondeu: «Que me dareis, Senhor Deus? Vou-me sem filhos e o herdeiro da minha casa é Eliézer, de Damasco.» 3Acrescentou: «Não me concedeste descendência, e é um escravo, nascido na minha casa, que será o meu herdeiro.» 4Então a palavra do Senhor foi-lhe dirigida, nos seguintes termos: «Não é ele que será o teu herdeiro, mas aquele que sairá das tuas entranhas.» 5E, conduzindo-o para fora, disse-lhe: «Levanta os olhos para o céu e conta as estrelas, se fores capaz de as contar.» E acrescentou: «Pois bem, será assim a tua descendência.» 6Abrão confiou no Senhor, e Ele considerou-lhe isso como mérito. 7O Senhor disse-lhe depois: «Eu sou o Senhor que te mandou sair de Ur, na Caldeia, para te dar esta terra.» 8Perguntou-lhe Abrão: «Senhor Deus, como saberei que tomarei posse dela?» 9Disse-lhe o Senhor: «Toma uma novilha de três anos, uma cabra de três anos, um carneiro de três anos, uma rola e um pombo ainda novo.» 10Abrão foi procurar todos estes animais, cortou-os ao meio e dispôs cada metade em frente uma da outra; não cortou, porém, as aves. 11As aves de rapina desciam sobre as carnes mortas, mas Abrão afugentava-as. 12Ao pôr do sol, apoderou-se dele um sono profundo; ao mesmo tempo, sentiu-se apavorado e foi envolvido por densa treva. 17Quando o Sol desapareceu, e sendo completa a escuridão, surgiu um braseiro fumegante e uma chama ardente, que passou entre as metades dos animais. 18Naquele dia, o Senhor concluiu uma aliança com Abrão, dizendo-lhe: «Dou esta terra à tua descendência, desde o rio do Egipto até ao grande rio, o Eufrates.

    No texto do Génesis, que hoje escutamos, onde confluem tradições muito antigas, é narrada a aliança entre Deus e Abraão. Esta aliança continuará em Moisés, atingirá a perfeição e tornar-se-á definitiva em Jesus Cristo.
    Abraão é apresentado como um profeta a quem Deus revela numa visão uma palavra. O oráculo de salvação («Nada temas»), encerra uma garantia de protecção divina («Eu sou o teu escudo») e uma promessa («a tua recompensa será muito grande») (cf. v. 1). Mas a situação de Abraão é paradoxal: é-lhe prometida uma descendência numerosa como as estrelas do céu e... não tem filhos. A sua fé é fortemente provada. Por isso, pergunta: «Que me dareis, Senhor Deus?» Deus responde, prometendo-lhe um filho. Abraão acredita no Senhor. Segue-se a promessa da terra. Mas a fé do Patriarca continua a ser fortemente provada. E, mais uma vez, interroga a Deus: «Como saberei que tomarei posse dela?» (v. 9). Deus responde-lhe no contexto de um arcaico rito de aliança: passando entre as vítimas, Deus invoca sobre si a maldição, caso venha a faltar ao juramento feito. E, enquanto o sol se põe, Abraão cai num profundo torpor. Nesse estado extraordinário, semelhante ao de Adão quando Eva foi criada, entra em contacto com o mistério inefável de Deus. As aves de rapina tentam perturbar a realização da aliança entre Deus e os homens. Mas é nesta situação que Deus proclama a sua imutável fidelidade.

    Evangelho: Mateus 7, 15-20

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 5«Acautelai-vos dos falsos profetas, que se vos apresentam disfarçados de ovelhas, mas por dentro são lobos vorazes. 16Pelos seus frutos, os conhecereis. Porventura podem colher-se uvas dos espinheiros ou figos dos abrolhos? 17Toda a árvore boa dá bons frutos e toda a árvore má dá maus frutos. 18A árvore boa não pode dar maus frutos nem a árvore má, dar bons frutos. 19Toda a árvore que não dá bons frutos é cortada e lançada ao fogo. 20Pelos frutos, pois, os conhecereis.»

    Jesus não impôs a selecção dos seus seguidores. O convite é para todos. Por isso, a Igreja, a comunidade dos discípulos de Jesus, compõe-se de «bons e de maus». Naturalmente, não tardaram a surgir dificuldades na comunidade, e impôs-se o discernimento ou distinção dos espíritos.
    Na Igreja, povo de Deus, surgiram profetas que gozaram de grande estima, mas também falsos profetas. Havia que saber distingui-los. O critério para essa distinção era o fruto que produziam. A imagem da árvore encontra-se noutros textos bíblicos, por exemplo, em Is 61, 3, Jr 2, 21, Mt 15, 3, Jo 15, 1-8. A árvore boa dá bons frutos; a árvore má dá maus frutos.

    Meditatio

    A página do Génesis, que escutamos, é profunda e suscitou cuidada reflexão de Paulo. Abraão é apresentado como exemplo de fé: «Abraão acreditou em Deus e isso foi-lhe atribuído à conta de justiça», escreve o Apóstolo (Gl 3, 6; Rm 4, 3). No nosso texto, em que já podemos entrever o mistério de Cristo e da vida cristã, também descobrimos a esperança de Abraão, e a sua adesão ao mistério da caridade de Deus. O Patriarca escuta a palavra do Senhor: «Nada temas, Abrão! Eu sou o teu escudo, a tua recompensa será muito grande» (v. 1). Com esta palavra, Deus reaviva a fé de Abraão, que tem de ultrapassar as circunstâncias imediatas, que não parecem oferecer perspectivas de futuro: «Vou-me sem filhos e o herdeiro da minha casa é Eliézer, de Damasco» (v. 2). Mas o Senhor insiste: «Não é ele que será o teu herdeiro, mas aquele que sairá das tuas entranhas» (v. 4). Imediatamente Deus faz sair Abraão da sua tenda para contemplar o céu estrelado: «Levanta os olhos para o céu e conta as estrelas, se fores capaz de as contar.» E acrescentou: «Pois bem, será assim a tua descendência.» (v. 5). Abraão acreditou e a sua fé tornou-o justo.
    As palavras de Deus, que em sentido imediato se referem a Isaac, em última análise preanunciam Cristo, o herdeiro de Abraão por excelência, e a multidão de filhos de Abraão, que hão-de ser todos os que vierem a acreditar em Cristo. É o que diz Paulo na Carta aos Gálatas: «Os que dependem da fé é que são filhos de Abraão» (Gl 3, 7).
    Abraão acreditou em Deus. Nós havemos de escutar a palavra de Cristo para acreditarmos e encontrarmos a plenitude da vida. O texto do Génesis, que hoje escutamos, não só evoca a palavra do Senhor, mas também a sua acção, que conclui a aliança. O sacrifício misterioso, acompanhado simultaneamente por uma manifestação de terror e de esperança, é sinal profético do sacrifício de Cristo, que estabelecerá a nova e eterna Aliança. Assim Abraão é já misteriosamente introduzido no mistério de Cristo, e sê-lo-
    á ainda mais profundamente no momento do sacrifício de Isaac. Abraão escuta a Deus e, pela sua obediência, vê o dia de Cristo e enche-se de alegria, como dirá Jesus no evangelho de João.
    O exemplo de Abraão guia-nos na direcção certa, a da fé na palavra do Senhor e no fruto do Espírito, que transforma a vida em modo consequente à fé.
    A primeira e mais importante aliança, para nós, é a do Baptismo, que nos torna filhos de Deus e prontos a renunciar ao demónio e às suas seduções. O bom fruto que Deus espera de nós, e que testemunhemos a boa qualidade da árvore que somos, é a fidelidade constante aos nossos compromissos baptismais: «Com todos os nossos irmãos cristãos confessamos... que Cristo é o Senhor, no qual o Pai nos manifestou o seu amor e que continua presente no mundo para o salvar» (Cst 9). Esta confissão de fé em Jesus Cristo Senhor só é possível se permanecermos unidos a Ele e recebermos d´Ele a seiva divina, que é o seu Espírito.

    Oratio

    Nós te damos graças, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque no teu Filho Jesus revelaste o mistério do teu amor. Em união a Maria e a seu exemplo, acolhemos o dom da tua Aliança e a efusão do Espírito, dons esses provenientes do Coração trespassado de Cristo e simbolizados pelo sangue e pela água, para sermos servos fiéis e povo sacerdotal, no teu Reino de caridade. Unidos a Cristo Reparador, renovamos hoje a oferta de nós mesmos, para servirmos com amor o teu desígnio de salvação. Ámen.

    Contemplatio

    Os ouvintes de João são inumeráveis. «Jerusalém ia ter com ele, de todos os lugares das margens do Jordão» (Mt 3, 5). O povo, os grandes, e mesmo os soldados, sentem-se tocados. Todos têm boa vontade e pedem o baptismo de penitência. Só os Fariseus e os Saduceus, orgulhosos e sensuais, se abstêm e criticam, ou então vêm, mas sem convicção. S. João Baptista conhece-os, prevê a sua resistência ao Salvador. Fala-lhes com toda a severidade de um juiz e de um profeta, como faziam outrora Isaías e Jeremias: «Raça de víboras, diz-lhes, se quereis escapar à cólera divina, fazei penitência. Sois orgulhosos de serdes os filhos de Abraão, mas Deus não tem necessidade de vós, pode suscitar, quando quiser, filhos espirituais de Abraão, que vos substituirão. Quando uma árvore não dá bons frutos, é arrancada e lançada ao fogo. Vós sois esta árvore. O machado vai ferir. Eu por mim ofereço-vos o baptismo de penitência, depois de mim virá um maior e mais forte do que eu. Esse baptizará no Espírito Santo. Peneirará o seu grão e limpará a sua eira. Recolherá o grão nos seus granéis e queimará a palha». Os Fariseus não compreenderam e não se humilharam. A colheita de João foi mesmo assim muito bela. Todos os humildes confessavam os seus pecados e recebiam o baptismo de penitência. O nosso zelo dará grandes frutos como o de João, se formos como ele austeros e mortificados. (Leão Dehon, OSP 3, p. 208s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «A tua aliança é admirável;
    por isso a minha alma a observa.» (Sl 118 (119), 129).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XII Semana - Quarta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XII Semana - Quarta-feira

    25 de Junho, 2025 26 de Junho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 15, 1-12.17-18

    Naqueles dias, 1após estes acontecimentos, o Senhor disse a Abrão numa visão: «Nada temas, Abrão! Eu sou o teu escudo, a tua recompensa será muito grande.» 2Abrão respondeu: «Que me dareis, Senhor Deus? Vou-me sem filhos e o herdeiro da minha casa é Eliézer, de Damasco.» 3Acrescentou: «Não me concedeste descendência, e é um escravo, nascido na minha casa, que será o meu herdeiro.» 4Então a palavra do Senhor foi-lhe dirigida, nos seguintes termos: «Não é ele que será o teu herdeiro, mas aquele que sairá das tuas entranhas.» 5E, conduzindo-o para fora, disse-lhe: «Levanta os olhos para o céu e conta as estrelas, se fores capaz de as contar.» E acrescentou: «Pois bem, será assim a tua descendência.» 6Abrão confiou no Senhor, e Ele considerou-lhe isso como mérito. 7O Senhor disse-lhe depois: «Eu sou o Senhor que te mandou sair de Ur, na Caldeia, para te dar esta terra.» 8Perguntou-lhe Abrão: «Senhor Deus, como saberei que tomarei posse dela?» 9Disse-lhe o Senhor: «Toma uma novilha de três anos, uma cabra de três anos, um carneiro de três anos, uma rola e um pombo ainda novo.» 10Abrão foi procurar todos estes animais, cortou-os ao meio e dispôs cada metade em frente uma da outra; não cortou, porém, as aves. 11As aves de rapina desciam sobre as carnes mortas, mas Abrão afugentava-as. 12Ao pôr do sol, apoderou-se dele um sono profundo; ao mesmo tempo, sentiu-se apavorado e foi envolvido por densa treva. 17Quando o Sol desapareceu, e sendo completa a escuridão, surgiu um braseiro fumegante e uma chama ardente, que passou entre as metades dos animais. 18Naquele dia, o Senhor concluiu uma aliança com Abrão, dizendo-lhe: «Dou esta terra à tua descendência, desde o rio do Egipto até ao grande rio, o Eufrates.

    No texto do Génesis, que hoje escutamos, onde confluem tradições muito antigas, é narrada a aliança entre Deus e Abraão. Esta aliança continuará em Moisés, atingirá a perfeição e tornar-se-á definitiva em Jesus Cristo.
    Abraão é apresentado como um profeta a quem Deus revela numa visão uma palavra. O oráculo de salvação («Nada temas»), encerra uma garantia de protecção divina («Eu sou o teu escudo») e uma promessa («a tua recompensa será muito grande») (cf. v. 1). Mas a situação de Abraão é paradoxal: é-lhe prometida uma descendência numerosa como as estrelas do céu e... não tem filhos. A sua fé é fortemente provada. Por isso, pergunta: «Que me dareis, Senhor Deus?» Deus responde, prometendo-lhe um filho. Abraão acredita no Senhor. Segue-se a promessa da terra. Mas a fé do Patriarca continua a ser fortemente provada. E, mais uma vez, interroga a Deus: «Como saberei que tomarei posse dela?» (v. 9). Deus responde-lhe no contexto de um arcaico rito de aliança: passando entre as vítimas, Deus invoca sobre si a maldição, caso venha a faltar ao juramento feito. E, enquanto o sol se põe, Abraão cai num profundo torpor. Nesse estado extraordinário, semelhante ao de Adão quando Eva foi criada, entra em contacto com o mistério inefável de Deus. As aves de rapina tentam perturbar a realização da aliança entre Deus e os homens. Mas é nesta situação que Deus proclama a sua imutável fidelidade.

    Evangelho: Mateus 7, 15-20

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 5«Acautelai-vos dos falsos profetas, que se vos apresentam disfarçados de ovelhas, mas por dentro são lobos vorazes. 16Pelos seus frutos, os conhecereis. Porventura podem colher-se uvas dos espinheiros ou figos dos abrolhos? 17Toda a árvore boa dá bons frutos e toda a árvore má dá maus frutos. 18A árvore boa não pode dar maus frutos nem a árvore má, dar bons frutos. 19Toda a árvore que não dá bons frutos é cortada e lançada ao fogo. 20Pelos frutos, pois, os conhecereis.»

    Jesus não impôs a selecção dos seus seguidores. O convite é para todos. Por isso, a Igreja, a comunidade dos discípulos de Jesus, compõe-se de «bons e de maus». Naturalmente, não tardaram a surgir dificuldades na comunidade, e impôs-se o discernimento ou distinção dos espíritos.
    Na Igreja, povo de Deus, surgiram profetas que gozaram de grande estima, mas também falsos profetas. Havia que saber distingui-los. O critério para essa distinção era o fruto que produziam. A imagem da árvore encontra-se noutros textos bíblicos, por exemplo, em Is 61, 3, Jr 2, 21, Mt 15, 3, Jo 15, 1-8. A árvore boa dá bons frutos; a árvore má dá maus frutos.

    Meditatio

    A página do Génesis, que escutamos, é profunda e suscitou cuidada reflexão de Paulo. Abraão é apresentado como exemplo de fé: «Abraão acreditou em Deus e isso foi-lhe atribuído à conta de justiça», escreve o Apóstolo (Gl 3, 6; Rm 4, 3). No nosso texto, em que já podemos entrever o mistério de Cristo e da vida cristã, também descobrimos a esperança de Abraão, e a sua adesão ao mistério da caridade de Deus. O Patriarca escuta a palavra do Senhor: «Nada temas, Abrão! Eu sou o teu escudo, a tua recompensa será muito grande» (v. 1). Com esta palavra, Deus reaviva a fé de Abraão, que tem de ultrapassar as circunstâncias imediatas, que não parecem oferecer perspectivas de futuro: «Vou-me sem filhos e o herdeiro da minha casa é Eliézer, de Damasco» (v. 2). Mas o Senhor insiste: «Não é ele que será o teu herdeiro, mas aquele que sairá das tuas entranhas» (v. 4). Imediatamente Deus faz sair Abraão da sua tenda para contemplar o céu estrelado: «Levanta os olhos para o céu e conta as estrelas, se fores capaz de as contar.» E acrescentou: «Pois bem, será assim a tua descendência.» (v. 5). Abraão acreditou e a sua fé tornou-o justo.
    As palavras de Deus, que em sentido imediato se referem a Isaac, em última análise preanunciam Cristo, o herdeiro de Abraão por excelência, e a multidão de filhos de Abraão, que hão-de ser todos os que vierem a acreditar em Cristo. É o que diz Paulo na Carta aos Gálatas: «Os que dependem da fé é que são filhos de Abraão» (Gl 3, 7).
    Abraão acreditou em Deus. Nós havemos de escutar a palavra de Cristo para acreditarmos e encontrarmos a plenitude da vida. O texto do Génesis, que hoje escutamos, não só evoca a palavra do Senhor, mas também a sua acção, que conclui a aliança. O sacrifício misterioso, acompanhado simultaneamente por uma manifestação de terror e de esperança, é sinal profético do sacrifício de Cristo, que estabelecerá a nova e eterna Aliança. Assim Abraão é já misteriosamente introduzido no mistério de Cristo, e sê-lo-
    á ainda mais profundamente no momento do sacrifício de Isaac. Abraão escuta a Deus e, pela sua obediência, vê o dia de Cristo e enche-se de alegria, como dirá Jesus no evangelho de João.
    O exemplo de Abraão guia-nos na direcção certa, a da fé na palavra do Senhor e no fruto do Espírito, que transforma a vida em modo consequente à fé.
    A primeira e mais importante aliança, para nós, é a do Baptismo, que nos torna filhos de Deus e prontos a renunciar ao demónio e às suas seduções. O bom fruto que Deus espera de nós, e que testemunhemos a boa qualidade da árvore que somos, é a fidelidade constante aos nossos compromissos baptismais: «Com todos os nossos irmãos cristãos confessamos... que Cristo é o Senhor, no qual o Pai nos manifestou o seu amor e que continua presente no mundo para o salvar» (Cst 9). Esta confissão de fé em Jesus Cristo Senhor só é possível se permanecermos unidos a Ele e recebermos d´Ele a seiva divina, que é o seu Espírito.

    Oratio

    Nós te damos graças, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque no teu Filho Jesus revelaste o mistério do teu amor. Em união a Maria e a seu exemplo, acolhemos o dom da tua Aliança e a efusão do Espírito, dons esses provenientes do Coração trespassado de Cristo e simbolizados pelo sangue e pela água, para sermos servos fiéis e povo sacerdotal, no teu Reino de caridade. Unidos a Cristo Reparador, renovamos hoje a oferta de nós mesmos, para servirmos com amor o teu desígnio de salvação. Ámen.

    Contemplatio

    Os ouvintes de João são inumeráveis. «Jerusalém ia ter com ele, de todos os lugares das margens do Jordão» (Mt 3, 5). O povo, os grandes, e mesmo os soldados, sentem-se tocados. Todos têm boa vontade e pedem o baptismo de penitência. Só os Fariseus e os Saduceus, orgulhosos e sensuais, se abstêm e criticam, ou então vêm, mas sem convicção. S. João Baptista conhece-os, prevê a sua resistência ao Salvador. Fala-lhes com toda a severidade de um juiz e de um profeta, como faziam outrora Isaías e Jeremias: «Raça de víboras, diz-lhes, se quereis escapar à cólera divina, fazei penitência. Sois orgulhosos de serdes os filhos de Abraão, mas Deus não tem necessidade de vós, pode suscitar, quando quiser, filhos espirituais de Abraão, que vos substituirão. Quando uma árvore não dá bons frutos, é arrancada e lançada ao fogo. Vós sois esta árvore. O machado vai ferir. Eu por mim ofereço-vos o baptismo de penitência, depois de mim virá um maior e mais forte do que eu. Esse baptizará no Espírito Santo. Peneirará o seu grão e limpará a sua eira. Recolherá o grão nos seus granéis e queimará a palha». Os Fariseus não compreenderam e não se humilharam. A colheita de João foi mesmo assim muito bela. Todos os humildes confessavam os seus pecados e recebiam o baptismo de penitência. O nosso zelo dará grandes frutos como o de João, se formos como ele austeros e mortificados. (Leão Dehon, OSP 3, p. 208s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «A tua aliança é admirável;
    por isso a minha alma a observa.» (Sl 118 (119), 129).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XII Semana - Sexta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XII Semana - Sexta-feira

    27 de Junho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 17, 1.9-10.15-22

    1Abrão tinha noventa e nove anos, quando o Senhor lhe apareceu e lhe disse: «Eu sou o Deus supremo. Anda na minha presença e sê perfeito. 9Deus disse a Abraão: «Da tua parte, cumprirás a minha aliança, tu e a tua descendência, nas futuras gerações. 10Eis a aliança estabelecida entre mim e vós, que tereis de respeitar: todo o homem, entre vós, será circuncidado. 15Deus disse a Abraão: «Não chamarás mais à tua mulher, Sarai, mas o seu nome será Sara. 16Abençoá-la-ei e dar-te-ei um filho, por meio dela. Será por mim abençoada, e será mãe de nações, e dela sairão reis.» 17Abraão prostrou-se com o rosto por terra, e sorriu, dizendo para consigo: «Pode uma criança nascer de um homem de cem anos? E Sara, mulher de noventa anos, vai agora ter filhos?» 18Depois, disse a Deus: «Possa Ismael viver diante de ti!» 19Mas Deus respondeu-lhe: «Não! Sara, tua mulher, dar-te-á um filho, a quem hás-de chamar Isaac. Farei a minha aliança com ele, aliança que será perpétua para a sua descendência depois dele. 20Quanto a Ismael, também te escutei. Abençoá-lo-ei, torná-lo-ei fecundo e multiplicarei extremamente a sua descendência. Será pai de doze príncipes, e farei sair dele um grande povo. 21Porém, é com Isaac que Eu estabelecerei a minha aliança, Isaac que Sara te há-de dar, por esta mesma época do próximo ano.» 22E, tendo acabado de falar com ele, Deus desapareceu de junto de Abraão.

    Escutamos uma narrativa estruturada com o objectivo de dar um sentido próprio à circuncisão praticada em muitos povos. Deus apresenta-se a Abraão e pede-lhe para caminhar diante dele e a pertencer-Lhe totalmente. A aliança com Deus não obriga apenas ao cumprimento de certas leis. Obriga, sobretudo, a pertencer-Lhe, a ser povo de Deus. Abraão, prostrado diante de Deus, recebe a renovação da promessa de uma numerosa descendência. Deus muda-lhe também o nome, de Abrão para Abraão, o que significa que o Patriarca está completamente submetido a Deus. Dar nome a uma coisa ou a uma pessoa é tomar posse delas. O Senhor também muda o nome de Sarai para Sara: a partir de agora, ela é destinatária de uma bênção em referência à sua fecundidade.
    A reacção de Abraão, a partir do v. 17, é estranha, tendo em conta a solene prostração mencionada no v. 3. Mas testemunha o realismo da fé e da incredulidade que tantas vezes se alternam na caminhada do homem sobre a terra. O bom senso humano diz que Ismael pode ser o destinatário da bênção, dada a esterilidade de Sara e idade avançada tanto dela como do marido. Mas os caminhos de Deus não são os nossos caminhos. A aliança está reservada ao «filho do riso», Isaac, uma eloquente figura de Jesus, o verdadeiro filho da promessa de quem Abraão se alegrou (cf. Jo 8, 56), na esperança de o poder ver um dia. Mas a figura de Ismael, filho de Agar, é uma afirmação da acção salvadora universal. Também para ele Deus tem uma promessa de bênção, de fecundidade e de domínio real.

    Evangelho: Mateus 8, 1-4

    1Ao descer do monte, seguia-o uma enorme multidão. 2Foi, então, abordado por um leproso que se prostrou diante dele, dizendo-lhe: «Senhor, se quiseres, podes purificar-me.» 3Jesus estendeu a mão e tocou-o, dizendo: «Quero, fica purificado!» No mesmo instante, ficou purificado da lepra. 4Jesus, porém, disse-lhe: «Vê, não o digas a ninguém; mas vai mostrar-te ao sacerdote e apresenta a oferta que Moisés preceituou, para que lhes sirva de testemunho.»

    Depois de apresentar Jesus como Messias da palavra, no Sermão da Montanha, Mateus dá início a uma nova secção, onde nos apresenta o Messias das obras, o taumaturgo que vai ao encontro daqueles que sofrem. Os milagres de Jesus são prova da verdade das suas palavras.
    O evangelho de hoje apresenta-nos três milagres, que aconteceram em Cafarnaúm, onde Cristo teve a sua primeira casa, durante a missão pelas povoações das margens do mar de Tiberíades. Jesus actua em favor de pessoas atingidas pela desgraça, sem se importar com as normas de precaução e defesa previstas na Lei: toca o leproso, entra em casa de um pagão, aperta a mão de uma mulher doente, pessoas marginalizadas pela sociedade hebraica do tempo.
    O leproso pede para ser «purificado», pois sabia que a sua doença era considerada fruto do pecado e expressão de impureza legal. É por isso que Jesus manda o leproso ao sacerdote, que tem de verificar a cura. O gesto do leproso, que chama a Jesus «Senhor» e se prostra diante dele, significa simultaneamente reconhecimento da divindade e beijo da sua imagem. Não esqueçamos que este texto foi escrito depois da ressurreição, e à luz do mistério pascal. Encontramo-lo noutras páginas de Mateus (2, 2.8; 9, 18; 15, 25; 20, 20; 28, 9.17).

    Meditatio

    «Toda a Sagrada Escritura nos fala do Coração de Jesus», escreveu o Pe. Dehon. Mas, já antes dele, Santo Agostinho dizia que toda a Escritura está cheia de Cristo. A Constituição Conciliar Dei Verbum garante: «Deus dispôs sabiamente que o Novo Testamento estivesse escondido no Antigo e que o Antigo se tornasse claro no novo... Os livros do Antigo Testamento, integralmente assumidos na pregação evangélica, adquirem e manifestam o seu significado pleno no Novo, que iluminam e explicam». Sendo assim, a primeira leitura de hoje fala da ressurreição do Senhor. Paulo, na Carta aos Romanos, explica que Abraão, ao acreditar no anúncio do nascimento de Isaac, acreditou sem saber na ressurreição de Cristo, porque, tanto ele como Sara, eram velhos, «quase mortos». Acreditou firmemente que Deus, de dois seres tão avançados na idade, podia suscitar um filho, Isaac, que é promessa e profecia da ressurreição.
    Também o milagre referido no evangelho é anúncio da ressurreição de Cristo: «Jesus estendeu a mão e tocou-o, dizendo: «Quero, fica purificado!» (v. 3). O «toque» de Jesus no leproso, considerado pecador, impuro, capaz de tornar impuro quem com ele contactasse, ainda que inadvertidamente, é símbolo da paixão de Cristo. Jesus, ao fazer-se homem, tocou a nossa lepra. Apresentou-se à paixão como um «leproso», como pecador; em troca, pela sua morte e ressurreição, fonte de vida, curou-nos, purificou-nos ontológica e radicalmente. De facto, Ele é o santo de Deus, que assumiu o nosso pecado e que, apenas pela sua força, realizou em nosso favor o que nos era impossível realizar.
    Se Jesus não interviesse em nosso favor, com a sua vontade de bem e de salvação, para nos tornar santos, participantes da sua filial pureza e beleza, ser-nos-ia absolutamente impossível caminhar em integridade diante de Deus. Mas foi para isso que Ele veio ao mundo e morreu por nós. Resta-nos querer ser
    realmente purificados. Só na liberdade podemos ser curados dos nossos males, escolher o que é bom e fazer o bem. Só na liberdade, podemos acolher os dons do Espírito, viver as bem-aventuranças, irradiar os frutos e os carismas do mesmo Espírito.

    Oratio

    Pai de benevolência, em Quem encontrou plena aceitação o teu amado Filho, levantado na cruz para redenção do mundo; concede que sejamos purificados pela Água e pelo Sangue que brotaram do seu lado aberto e do seu Coração trespassado. Sepultados com Cristo e com Ele ressuscitados, queremos caminhar em novidade de vida, numa fé inabalável e numa esperança feliz. Ajuda-nos a dar morte ao mal que ainda está em nós, ao egoísmo e ao medo de nos abandonarmos generosamente a Ti. Livra-nos de nós mesmos, para que possamos servir-Te, em liberdade de espírito, quais hóstias vivas. Ámen.

    Contemplatio

    A humildade é o remédio para o orgulho. Mas para isso, não basta reconhecer o próprio nada nem aceitar humilhações merecidas. Ao aceitá-las, mais não fazemos que o nosso dever, não reparamos nada e podemos dizer: «Não passamos de servos inúteis». Nosso Senhor não aceitou senão humilhações merecidas? Foi ao contrário pelas suas humilhações imerecidas que nos testemunhou o seu amor reparando o nosso orgulho. Foi por isso que Ele amou os desprezos e que foi verdadeiramente humilde de coração. Queremos verdadeiramente curar o nosso orgulho, reparar as nossas faltas e ajudar à necessidade do nosso próximo pelas nossas reparações? Amemos a humildade, amemos os desprezos e as humilhações, como o orgulho afasta a graça, a humildade atrai-a. O Coração de Jesus ama os humildes. Procurarei a humildade de espírito e de coração. Não presumirei ser mais do que sou e isto será justiça. Aceitarei os desprezos e as humilhações. Desejo mesmo amá-los para me tornar semelhante a Nosso Senhor e unir o meu sacrifício ao seu. (Leão Dehon, OSP4, p. 557).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Senhor, se quiseres, podes purificar-me» (Mt 8, 2).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XII Semana - Sábado

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XII Semana - Sábado

    28 de Junho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 18, 1-15

    Naqueles dias, o Senhor apareceu a Abraão junto dos carvalhos de Mambré, quando ele estava sentado à porta da sua tenda, durante as horas quentes do dia. 2Abraão ergueu os olhos e viu três homens de pé em frente dele. Imediatamente correu da entrada da tenda ao seu encontro, prostrou-se por terra 3e disse: «Meu Senhor, se mereci o teu favor, peço-te que não passes adiante, sem parar em casa do teu servo. 4Permite que se traga um pouco de água para vos lavar os pés; e descansai debaixo desta árvore. 5Vou buscar um bocado de pão e, quando as vossas forças estiverem restauradas, prosseguireis o vosso caminho, pois não deve ser em vão que passastes junto do vosso servo.» Eles responderam: «Faz como disseste.» 6Abraão foi, sem perda de tempo, à tenda onde se encontrava Sara e disse-lhe: «Depressa, amassa já três medidas de flor de farinha e coze uns pães no borralho.» 7Correu ao rebanho, escolheu um vitelo dos mais tenros e gordos e entregou-o ao servo, que imediatamente o preparou. 8Tomou manteiga, leite e o vitelo já pronto e colocou-o diante deles. E ficou de pé junto dos estranhos, debaixo da árvore, enquanto eles comiam. 9Então, disseram-lhe: «Onde está Sara, tua mulher?» Ele respondeu: «Está aqui na tenda.» 10Um deles disse: «Passarei novamente pela tua casa dentro de um ano, nesta mesma época; e Sara, tua mulher, terá já um filho.» Ora, Sara estava a escutar à entrada da tenda, mesmo por trás dele. 11Abraão e Sara eram já velhos, de idade muito avançada, e Sara já não estava em idade de ter filhos. 12Sara riu-se consigo mesma e pensou: «Velha como estou, poderei ainda ter esta alegria, sendo também velho o meu senhor?» 13O Senhor disse a Abraão: «Porque está Sara a rir e a dizer: 'Será verdade que eu hei-de ter um filho, velha como estou?' 14Haverá alguma coisa que seja impossível para o Senhor? Dentro de um ano, nesta mesma época, voltarei à tua casa, e Sara terá já um filho.» 15Cheia de medo, Sara negou, dizendo: «Não me ri.» Mas Ele disse-lhe: «Não! Tu riste-te mesmo.»

    No nosso texto fundem-se dois temas caros às literaturas extra-bíblicas: a visita de uma divindade e a promessa de um filho a um casal estéril (cf. Jz 13, 8ss.). O nascimento anunciado aparece como um dom pela hospitalidade gratuitamente oferecida aos três homens misteriosos que Abraão viu fora da sua tenda (v. 2). O mais difícil é definir a relação entre estas três figuras e Deus. Os intérpretes, judeus e cristãos, procuram compreender a razão pela qual o texto fala de «três homens» com os verbos, ora no plural, ora no singular, como se se tratasse de um só, isto é, de Deus. Para o narrador, os três homens são manifestação de Deus, que, lida em chave cristã, é uma velada antecipação do mistério trinitário.
    Os versículos 1 a 8 apresentam Abraão como modelo de hospitalidade, preparando o tema dos versículos seguintes (9 a 16), centrado no riso de Sara por causa da promessa dum filho. A mulher revela a sua incredulidade perante uma promessa humanamente irrealizável, e torna-se figura de todo o crente, quando se vê confrontado com misterioso modo de agir de Deus: «Haverá alguma coisa que seja impossível para o Senhor?», perguntam os estranhos. O "sim" de Deus choca com a mentira da criatura, que tantas vezes não só não acredita, mas teme assumir a responsabilidade dos seus actos diante de Deus e, como criança, mente.
    A narrativa começa com uma visita de Deus ao homem, procede com a mentira do mesmo homem, e termina com o riso argentino do pequeno Isaac, um ano depois. Deus mantém a sua fidelidade e sorri com a incredulidade do homem.

    Evangelho: Mateus 8, 5-17

    Naquele tempo, 5entrando Jesus em Cafarnaúm, aproximou-se dele um centurião, suplicando nestes termos: 6«Senhor, o meu servo jaz em casa paralítico, sofrendo horrivelmente.» 7Disse-lhe Jesus: «Eu irei curá-lo.» 8Respondeu-lhe o centurião:«Senhor, eu não sou digno de que entres debaixo do meu tecto; mas diz uma só palavra e o meu servo será curado. 9Porque eu, que não passo de um subordinado, tenho soldados às minhas ordens e digo a um: 'Vai', e ele vai; a outro: 'Vem', e ele vem; e ao meu servo: 'Faz isto', e ele faz.» 10Jesus, ao ouvi-lo, admirou-se e disse aos que o seguiam: «Em verdade vos digo: Não encontrei ninguém em Israel com tão grande fé! 11Digo-vos que, do Oriente e do Ocidente, muitos virão sentar-se à mesa do banquete com Abraão, Isaac e Jacob, no Reino do Céu, 12ao passo que os filhos do Reino serão lançados nas trevas exteriores, onde haverá choro e ranger de dentes.» 13Disse, então, Jesus ao centurião: «Vai, que tudo se faça conforme a tua fé.» Naquela mesma hora, o servo ficou curado. 14Entrando em casa de Pedro, Jesus viu que a sogra dele jazia no leito com febre. 15Tocou-lhe na mão, e a febre deixou-a. E ela, levantando-se, pôs-se a servi-lo. 16Ao entardecer, apresentaram-lhe muitos possessos; e Ele, com a sua palavra, expulsou os espíritos e curou todos os que estavam doentes, 17para que se cumprisse o que foi dito pelo profeta Isaías: Ele tomou as nossas enfermidades e carregou as nossas dores.

    Este milagre, narrado por Mateus, também se encontra em Lucas e em João, com algumas diferenças. Enquanto Mateus fala da cura de um filho-servo (pais), Lucas da cura de um servo (dûlos) e João da cura de um filho (hyiós). Na realidade trata-se de um prodígio onde confluem o poder taumatúrgico de Cristo, que actua de modo imediato («naquela mesma hora»), mesmo à distância, e a fé do centurião elogiada pelo Mestre. Esta situação oferece a Cristo ocasião para estigmatizar a falta de fé dos seus conterrâneos e descrever as tristes consequências da mesma. As expressões «choro e ranger de dentes» são idiomáticas, indicando a enorme desespero daqueles que, no castigo, reconhecem as suas culpas. A cena do centurião é como que um prelúdio da missão ou anúncio do Evangelho aos pagãos.
    Jesus detém-se em Cafarnaúm, na casa de Pedro, cuja sogra estava doente com febre. E Jesus toma a iniciativa de a curar, - caso único em Mateus -, tocando-lhe, como fizera com o leproso. Uma vez curada, a mulher põe-se a servir, tornando-se a primeira «diaconisa» da história cristã.
    Os últimos versículos sintetizam a obra de Cristo em favor dos endemoninhados e dos doentes. Mateus aproveita para fazer uma releitura de Is 53, 4: enquanto o profeta fala de sofrimentos e dores, o evangelista fala de enfermidades e doenças. Trata-se de uma expiação libertadora, fruto da solidariedade de Cristo com os homens.

    Meditatio

    A primeira leitura mostra-nos como Deus tem em conta a hospitalidade. Abraão dá-nos uma boa lição da disponibilidade e generosidade com que deve ser praticada. «Durante as horas
    quentes do dia», repousava tranquilo à porta da tenda. Mas não se importou de ser incomodado pelos três misteriosos hóspedes que se aproximam: «Imediatamente correu da entrada da tenda ao seu encontro, prostrou-se por terra» (v. 2), pedindo-lhes que se detivessem em sua casa e comessem «um bocado de pão» (v. 5). Mais tarde, será o próprio Deus a oferecer aos homens o Pão descido do céu. Depois de lhes ter lavado os pés, tal como Jesus fará um dia aos Apóstolos, Abraão ordena a Sara, sua esposa, que prepare uma generosa refeição com o vitelo que, ele mesmo, vai buscar à manada. Assim fará o pai misericordioso ao ver regressar o filho pródigo. Abraão convida os seus hóspedes a repousar à sombra da árvore. Deus far-nos-á repousar à sombra da Cruz. A hospitalidade do Patriarca é solícita, modesta e generosa. A narrativa acaba por nos dizer que Abraão hospeda e alimenta o próprio Deus, que, antes de partir, lhe recompensa a generosidade com a promessa de um filho. Sara ri-se de tal promessa: tanto ela como o marido eram de avançada idade. Mas, um ano depois, ouvir-se o riso estridente do pequeno Isaac, filho do riso. Isaac, por sua vez, é figura de Jesus, nascido da Virgem Maria. Sobre Ele pesarão os pecados da humanidade. Maltratado, sofrerá sozinho o escárnio. Morto e ressuscitado, a todos salva: «Haverá alguma coisa que seja impossível para o Senhor» (v. 14).
    O autor da Carta aos Hebreus exorta os cristãos a não esquecerem a hospitalidade: «pois, graças a ela, alguns, sem o saberem, hospedaram anjos» (13, 2). São Bento, com grande concisão, escreve na sua Regra: «Vem um hóspede, vem Cristo». Acolher os outros dá-nos a certeza de receber ao próprio Cristo: «Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes» (Mt 25, 40). O melhor modo de acolher a Cristo é acolhê-lo como Ele quer ser acolhido. Marta afadigou-se para receber bem a Jesus. Mas a sua irmã, Maria, acolheu-O como Ele queria ser acolhido: «Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada», diz Jesus (Lc 10, 42). Mas há um modo ainda mais profundo de acolher a Cristo, que consiste em acolher na nossa própria carne os seus sofrimentos, em favor da Igreja, para completar a sua obra redentora: «alegro-me nos sofrimentos que suporto por vós e completo na minha carne o que falta às tribulações de Cristo, pelo seu Corpo, que é a Igreja», escreve Paulo (Cl 1, 24). Não se trata, de evidentemente, de completar os sofrimentos expiatórios de Cristo, que já estão completos. Mas o Apóstolo vive as suas tribulações apostólicas, como Cristo, por primeiro, as experimentou. Em Cristo, Paulo, e todo o que quer ser apóstolo, particularmente o que é chamado a ser Oblato-Sacerdote do Coração de Jesus, tem o seu lugar na cruz, ao lado do seu Senhor e Salvador, em favor do Corpo místico de Cristo.

    Oratio

    Pai santo, acolhe o nosso hino de bênção e de louvor no começo deste dia. Escondeste-nos o dia e a hora, em que Jesus Cristo, teu Filho, Senhor e Juiz da história, aparecerá nas nuvens do céu revestido de poder e majestade. Mas sabemos que Ele vem ao nosso encontro em cada homem e em cada tempo, para que O recebamos na fé e na caridade e demos testemunho da gloriosa esperança do seu Reino. Por isso, novamente nos disponibilizamos para nos unirmos à sua oblação no serviço generoso para com todos, especialmente para com os pequenos e os que sofrem. Amen.

    Contemplatio

    Santa Gertrudes, ao meditar sobre a hospitalidade oferecida a Jesus por Marta e por Maria em Betânia, estava toda inflamada por também receber Jesus. Beijava a chaga do lado de Jesus sobre o seu crucifixo e suplicava ao Sagrado Coração, pelo desejo que tinha de ir ter com os seus amigos de Betânia, de se dignar descer à pobre hospedaria do seu indigníssimo coração. O Senhor, cheio de bondade, que gosta de escutar aqueles que o invocam, favoreceu-a com a sua presença e disse-lhe esta palavra doce e atractiva: «Aqui estou, que é que me vais dar?» - Pobre de mim, Senhor, disse ela, não preparei nada que seja digno da vossa magnificência, e peço-vos que sejais vós mesmo a preparar em mim o que possa agradar à vossa divina bondade». - «Neste caso, diz o Senhor, dá-me a chave da tua alma para me permitir tomar e substituir tudo o que me convier, tanto para estar a meu gosto como para me repousar». - «E qual é esta chave?», disse ela. - «A tua vontade própria», diz Jesus Cristo. Ela compreendeu que se alguém tiver que dar hospitalidade a Nosso Senhor, é preciso que lhe entregue a chave da própria vontade, que se abandone plenamente ao seu beneplácito, e que espere com plena confiança na sua bondade que em todas as coisas ele operará a nossa salvação. (Leão Dehon, OSP4, p. 446).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Não vos esqueçais da hospitalidade» (Heb 13, 2).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XIII Semana - Segunda-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XIII Semana - Segunda-feira

    30 de Junho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 18, 16-33

    Naqueles dias, os homens que tinham estado com Abraão, junto do Carvalho de Mambré, levantaram-se e partiram em direcção de Sodoma, e Abraão acompanhou-os para deles se despedir. 17O Senhor disse, então: «Ocultarei a Abraão o que vou fazer? 18Ele deve tornar-se uma nação grande e poderosa e Eu abençoarei nele todos os povos da Terra. 19Escolhi-o, de facto, para que dê ordens a seus filhos e à sua casa depois dele, no sentido de seguirem os caminhos do Senhor, praticando a justiça e a rectidão, a fim de que o Senhor cumpra a favor de Abraão as promessas que lhe fez.» 20O Senhor acrescentou: «O clamor de Sodoma e Gomorra é imenso e o seu pecado agrava-se extremamente. 21Vou descer a fim de ver se, na realidade, a conduta deles corresponde ao brado que chegou até mim. E se não for assim, sabê-lo-ei.» 22Os homens partiram dali, e encaminharam-se para Sodoma. Abraão, porém, continuava ainda na presença do Senhor. 23Abraão aproximou-se e disse: «E será que vais exterminar, ao mesmo tempo, o justo com o culpado? 24Talvez haja cinquenta justos na cidade; matá-los-ás a todos? Não perdoarás à cidade, por causa dos cinquenta justos que nela podem existir? 25Longe de ti proceder assim e matar o justo com o culpado, tratando-os da mesma maneira! Longe de ti! O juiz de toda a Terra não fará justiça?» 26O Senhor disse: «Se encontrar em Sodoma cinquenta justos perdoarei a toda a cidade, por causa deles.» 27Abraão prosseguiu: «Pois que me atrevi a falar ao meu Senhor, eu que sou apenas cinza e pó, continuarei. 28Se, por acaso, para cinquenta justos faltarem cinco, destruirás toda a cidade, por causa desses cinco homens?» O Senhor respondeu: «Não a destruirei, se lá encontrar quarenta e cinco justos.» 29Abraão insistiu ainda e disse: «Talvez não se encontrem nela mais de quarenta.» O Senhor disse: «Não destruirei a cidade, em atenção a esses quarenta.» 30Abraão voltou a dizer: «Que o Senhor não se irrite, por eu continuar a insistir. Talvez lá se encontrem trinta justos.» O Senhor respondeu: «Se lá encontrar trinta justos, não o farei.» 31Abraão prosseguiu: «Perdoa, meu Senhor, a ousadia que tenho de te falar. Talvez não se encontrem lá mais de vinte justos.» O Senhor disse: «Em atenção a esses vinte justos, não a destruirei.» 32Abraão insistiu novamente: «Que o meu Senhor não se irrite; não falarei, porém, mais do que esta vez. Talvez lá não se encontrem senão dez.» E Deus respondeu: «Em atenção a esses dez justos, não a destruirei.» 33Terminada esta conversa com Abraão, o Senhor afastou-se, e Abraão voltou para a sua morada.

    As três personagens misteriosas que encobrem a manifestação de Deus a Abraão em Mambré (Gn 18, 1s.) puseram-se a caminho de Sodoma, como que para assinalá-la, enquanto Deus fica com o patriarca (Gn 18, 16.22), para suscitar nele precisamente a questão da cidade pecadora. A passagem que agora nos ocupa faz de prólogo à narração do pecado de Sodoma (Gn 19). Abraão, o «amigo de Deus», escolhido para ser o pai de uma grande nação, é apresentado como o grande intercessor, no contexto de uma precisa reflexão teológica. O Patriarca aparece, de facto, como o «pai da justiça e do direito», realidades que são a vida de aliança com Deus. O narrador indica o verdadeiro objectivo da narrativa no solilóquio de Deus. É importante que Abraão e a sua descendência compreendam o sentido do castigo de Sodoma, de modo que seja salva a justiça divina. O "caso" da cidade pecadora é um bom exemplo para tratar o tema da salvação dos justos e da punição dos maus, bem como do papel de um intercessor. No v. 20 é apresentado o clamor de Sodoma e Gomorra e o seu pecado. Por enquanto não se sabe de que pecado se trata. No capítulo 19 ficaremos a saber que se trata de uma gravíssima falta contra a hospitalidade. Voltam, então, à cena as três personagens da narrativa anterior, cujas funções se tornam claras. Duas dirigem-se a Sodoma, enquanto Deus continuava junto de Abraão. Abraão aparece como poderoso intercessor, sumamente interessado em salvar os justos. Deus acaba por se mostrar interessado em salvar as cidades em atenção a poucos justos. Bastavam dez. Aqui, Abraão detém-se. Não ousa avançar para o caso de haver um só justo. Ainda passará muito tempo, antes de aparecer o único Justo (cf. Is 53) capaz de salvar a todos pela oferta da própria vida e com o sacrifício perfeito, Jesus «sempre vivo a interceder por nós» (Heb 7, 21).

    Evangelho: Mateus 8, 18-22

    Naquele tempo, 18vendo Jesus em torno de si uma grande multidão, decidiu passar à outra margem. 19Saiu-lhe ao encontro um doutor da Lei, que lhe disse: «Mestre, seguir-te-ei para onde quer que fores.» 20Respondeu-lhe Jesus: «As raposas têm tocas e as aves do céu têm ninhos; mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça.» 21Um dos discípulos disse-lhe: «Senhor, deixa-me ir primeiro sepultar o meu pai.» 22Jesus, porém, respondeu-lhe: «Segue-me e deixa os mortos sepultar os seus mortos.»

    Jesus decide «passar à outra margem» (v. 18). Mas, antes de executar a sua decisão, ilustra as exigências requeridas a quem O quer seguir, as exigências da fé. Quem quiser seguir a Cristo, como o escriba, deve saber ao que se compromete, qual o modo de vida que o espera, quem é Aquele a quem escolheu. Sabendo isso, há-de estar disposto a aceitar os sofrimentos, as adversidades e a paixão como passagens obrigatórias. Foi esse o caminho do Senhor e Mestre, Jesus Cristo. A expressão «as raposas têm tocas e as aves do céu têm ninhos; mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça» está construída em estilo oriental: depois de duas imagens positivas, vem uma negativa. Alguns exegetas vêem aqui uma alusão ao celibato de Jesus: não tem casa, não tem família. A expressão «Filho do Homem», que aparece pela primeira vez no evangelho, indica a precariedade de Jesus, o seu ser sem casa nem raiz, sem referência nem refúgio. A contraposição entre Jesus e «os mortos» indica a ruptura que «Aquele que vive» veio inserir na experiência dos homens. Aquele que é a Vida, aponta o Caminho: não ter onde reclinar a cabeça, para dormir e para morrer, é condição para que a vida seja restituída à sua verdade.

    Meditatio

    A intercessão de Abraão é um exemplo de familiaridade e de respeito para com Deus. Abraão actua como os orientais gostavam, e gostam, de actuar no mercado: negoceiam, regateiam. Fala com Deus como falaria com um homem: «Se encontrar...cinquenta... quarenta e cinco... quarenta...trinta... vinte... dez...». Está consciente de que não tem direito a nada, porque
    é «apenas cinza e pó». Parece que Deus gosta da insistência e que, a cada novo pedido, condescenda com Abraão: «Não destruirei». Assim fica confirmado o papel de intercessores que os santos exercem no mundo. Abraão não ousa avançar mais na sua oração e perguntar: «E se houver apenas um justo?» O sentido da corresponsabilidade era tão forte no Antigo Testamento, que ninguém pensaria em tal possibilidade. Só muitos séculos depois virá ao mundo único justo capaz de salvar, não só as cidades corruptas, mas também toda a humanidade, purificando-a com o seu sangue. Em Jesus, Deus estará mais connosco, e escolherá amigos para associar à sua missão de Salvador. No evangelho de hoje, escutamo-l´O a afirmar a urgência de O seguirmos, por amor, desapegando-nos de tudo. Se aderirmos a Ele com todo o nosso ser e a nossa vida, seremos seus amigos, seus colaboradores e válidos intercessores em favor dos irmãos.
    Como cristãos, e como dehonianos, somos unidos «à acção de graças e à intercessão de Cristo», sentimo-nos «chamados a colocar toda a nossa vida ao serviço da Aliança de Deus com o seu Povo», e actuamos em prol da «unidade dos cristãos e de todos os homens» (Cst 84)
    Sabemos que as nossas frágeis forças humanas são insuficientes para realizar esta missão, mas recordamos a consoladora promessa de Cristo: «Eis que Eu estou convosco todos os dias até ai fim do mundo» (Mt 28, 20). Jesus, o Justo, que a todos salva, é o Emanuel, o Deus connosco, sobretudo por meio da Sua presença na Eucaristia, onde, como no Céu, vive a interceder por nós. A presença eucarística de Jesus, ensina-nos a fazer-nos eucaristia, presença amorosa e solícita no meio dos irmãos, a interceder por eles, a ser servidores da Aliança e a actuar em prol da unidade entre os cristãos e entre todos os homens: a «ser profetas do amor e servidores da reconciliação dos homens e do mundo em Cristo» (Cst 7).

    Oratio

    Bendito és Tu Senhor, nosso Pai, que nos envias o Espírito do teu Filho, para que possamos ser com Ele advogados e intercessores do teu povo. Em união com Cristo, oferecemo-nos a Ti e intercedemos pela salvação de todos homens. Infunde a tua misericórdia e a tua paz sobre os justos e os injustos, sobre os pobres e os infelizes, sobre os violentos e os que sofrem perseguição. Escuta, ó Pai, a nossa súplica e perdoa as nossas culpas. Renova o nosso coração e acolhe-nos na tua presença. Faz de nós um sacrifício perene e agradável. Amen.

    Contemplatio

    Embora toda a graça venha de Deus, o Sagrado Coração quer premiar todos os seus Santos: «Recebei, diz-lhes, a coroa, a auréola e a alegria que meu Pai vos preparou desde toda a eternidade». A mim, Nosso Senhor quer dizer-me: «Eis os meus amigos, eis aqueles que lavaram as suas túnicas no sangue do Cordeiro, vieram da grande tribulação, e agora servem a Deus no seu templo, estão ao abrigo das necessidades da vida terrestre e deixo-os beber nas fontes refrescantes das minhas chagas e sobretudo do meu Coração» (Ap7, 14). Como a S. João na grande visão de Patmos, Nosso Senhor mostra-me sucessivamente os profetas e os apóstolos, amadurecidos pela sabedoria, os evangelistas que conduzem o carro da Igreja, os mártires que levam a palma da vitória, as virgens que seguem por toda a parte o cordeiro e a multidão dos confessores que cantam o seu reconhecimento. Que grande lição para meditar! Eis, portanto, o caminho do céu: a sabedoria dos anciãos, o zelo dos evangelistas, dos pontífices e dos padres, a pureza das virgens, a piedade dos confessores, a força de alma dos mártires. Eis para mim um tema infinito de reflexões. E vejo que os anjos e os Santos colocam nos seus turíbulos celestes as orações da Igreja militante com as suas; e como hoje recorro à intercessão de todos os Santos, é de uma infinidade de turíbulos que as minhas humildes preces e louvores unidas às preces dos Santos se elevarão para Deus com uma eficácia infinita. (Leão Dehon, OSP 4, p. 419s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra
    «O Senhor é clemente e cheio de compaixão» (Sl 145 (144), 8).