Semana de Out 1st

  • 26º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    26º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    1 de Outubro, 2023

    ANO A
    26º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    Tema do 26º Domingo do Tempo Comum

    A liturgia do 26º Domingo do Tempo Comum deixa claro que Deus chama todos os homens e mulheres a empenhar-se na construção desse mundo novo de justiça e de paz que Deus sonhou e que quer propor a todos os homens. Diante da proposta de Deus, nós podemos assumir duas atitudes: ou dizer "sim" a Deus e colaborar com Ele, ou escolher caminhos de egoísmo, de comodismo, de isolamento e demitirmo-nos do compromisso que Deus nos pede. A Palavra de Deus exorta-nos a um compromisso sério e coerente com Deus - um compromisso que signifique um empenho real e exigente na construção de um mundo novo, de justiça, de fraternidade, de paz.
    Na primeira leitura, o profeta Ezequiel convida os israelitas exilados na Babilónia a comprometerem-se de forma séria e consequente com Deus, sem rodeios, sem evasivas, sem subterfúgios. Cada crente deve tomar consciência das consequências do seu compromisso com Deus e viver, com coerência, as implicações práticas da sua adesão a Jahwéh e à Aliança.
    O Evangelho diz como se concretiza o compromisso do crente com Deus... O "sim" que Deus nos pede não é uma declaração teórica de boas intenções, sem implicações práticas; mas é um compromisso firme, coerente, sério e exigente com o Reino, com os seus valores, com o seguimento de Jesus Cristo. O verdadeiro crente não é aquele que "dá boa impressão", que finge respeitar as regras e que tem um comportamento irrepreensível do ponto de vista das convenções sociais; mas é aquele que cumpre na realidade da vida a vontade de Deus.
    A segunda leitura apresenta aos cristãos de Filipos (e aos cristãos de todos os tempos e lugares) o exemplo de Cristo: apesar de ser Filho de Deus, Cristo não afirmou com arrogância e orgulho a sua condição divina, mas assumiu a realidade da fragilidade humana, fazendo-se servidor dos homens para nos ensinar a suprema lição do amor, do serviço, da entrega total da vida por amor. Os cristãos são chamados por Deus a seguir Jesus e a viver do mesmo jeito, na entrega total ao Pai e aos seus projectos.

    LEITURA I - Ez 18,25-28

    Leitura da Profecia de Ezequiel

    Eis o que diz o Senhor:
    «Vós dizeis: 'A maneira de proceder do Senhor não é justa'.
    Escutai, casa de Israel:
    Será a minha maneira de proceder que não é justa?
    Não será antes o vosso modo de proceder que é injusto?
    Quando o justo se afastar da justiça,
    praticar o mal o vier a morrer,
    morrerá por causa do mal cometido.
    Quando o pecador se afastar do mal que tiver realizado,
    praticar o direito e a justiça,
    salvará a sua vida.
    Se abris os seus olhos e renunciar às faltas que tiver cometido,
    há-de viver e não morrerá».

    AMBIENTE

    Ezequiel, o "profeta da esperança", exerceu o seu ministério na Babilónia no meio dos exilados judeus. O profeta fez parte dessa primeira leva de exilados que, em 597 a.C., Nabucodonosor deportou para a Babilónia.
    A primeira fase do ministério de Ezequiel decorreu entre 593 a.C. (data do seu chamamento à vocação profética) e 586 a.C. (data em que Jerusalém foi conquistada uma segunda vez pelos exércitos de Nabucodonosor e uma nova leva de exilados foi encaminhada para a Babilónia). Nesta fase, o profeta preocupou-se em destruir as falsas esperanças dos exilados (convencidos de que o exílio terminaria em breve e que iam poder regressar rapidamente à sua terra) e em denunciar a multiplicação das infidelidades a Jahwéh por parte desses membros do Povo judeu que escaparam ao primeiro exílio e que ficaram em Jerusalém.
    A segunda fase do ministério de Ezequiel desenrolou-se a partir de 586 a.C. e prolongou-se até cerca de 570 a.C. Instalados numa terra estrangeira, privados de Templo, de sacerdócio e de culto, os exilados estavam desiludidos e duvidavam de Jahwéh e do compromisso que Deus tinha assumido com o seu Povo. Nessa fase, Ezequiel procurou alimentar a esperança dos exilados e transmitir ao Povo a certeza de que o Deus salvador e libertador não tinha abandonado nem esquecido o seu Povo.
    Até esta altura, Israel reflectia a sua relação com Deus em termos colectivos e não em termos individuais. A catequese de Israel considerava que a Aliança tinha sido feita, não com cada israelita individualmente, mas com toda a comunidade. Assim, as infidelidades de uns (inclusive dos antepassados) traziam sofrimento e morte a toda a comunidade; e a fidelidade de outros (inclusive dos antepassados) era fonte de vida e de bênção para todos.
    Os exilados liam à luz desta perspectiva teológica o drama que tinha caído sobre eles. Consideravam que eram justos e bons, que não tinham pecado e que estavam ali a expiar os pecados de toda a nação. Havia até um refrão muito repetido por esta altura: "os pais comeram as uvas verdes, mas são os dentes dos filhos que ficam embotados" (Ez 18,2b). Parece ser uma reprovação velada à acção de Deus que, na perspectiva da teologia da época, fez dos exilados o bode expiatório de todas as infidelidades da nação. É justo, isto? Está certo que os justos paguem pelos pecadores?
    É a estas questões que o profeta Ezequiel vai tentar responder.

    MENSAGEM

    Na verdade, os membros do Povo de Deus que estão exilados na Babilónia não podem "sacudir a água do capote" e presumir de justos e inocentes: não há justos e inocentes neste processo, uma vez que todos, sem excepção, são responsáveis por atitudes de infidelidade a Jahwéh e de desrespeito pelos seus mandamentos. Fará algum sentido que os exilados acusem Jahwéh de ser injusto, depois de terem violado sistematicamente a aliança e terem cometido tantos pecados e infidelidades (vers. 25)?
    Para além disso, Israel não pode continuar a esconder-se atrás de uma responsabilidade colectiva, que implica todos, mas não responsabiliza ninguém. Chegou a altura de cada membro do Povo de Deus se sentir pessoalmente responsável diante de Deus pelas suas acções e pelos compromissos assumidos no âmbito da Aliança. Cada membro do Povo de Deus tem de descobrir que, quando fizer escolhas erradas e se obstinar nelas, sofrerá as consequências; e que quando abandonar os caminhos de egoísmo e de pecado e optar por Deus e pelos seus valores, encontrará a vida (vers. 26-28).
    Significa isto que o pecado de um membro da comunidade não afecta os outros irmãos, membros da mesma comunidade? É claro que afecta. O pecado introduz sempre elementos de desequilíbrio, de desarmonia, de egoísmo, de ruptura, que atingem todos aqueles que caminham connosco... Mas o que Ezequiel aqui pretende sublinhar é que cada homem ou mulher tem de sentir-se pessoalmente responsável diante de Deus pelas suas opções e pelos seus actos.
    Esta superação da mentalidade co
    lectiva, dando lugar à responsabilidade individual, é um dos grandes progressos na história teológica de Israel. Doravante, o Povo aprenderá a reagir em termos individuais e não em termos de massa. Está aberto o caminho para uma Nova Aliança: uma Aliança que não é feita genericamente com uma comunidade, mas uma Aliança pessoal e interior, feita com cada crente.

    ACTUALIZAÇÃO

    Considerar, na reflexão, os seguintes desenvolvimentos:

    • Antes de mais, a leitura convida-nos a tomar consciência de que um compromisso com Deus é algo que nos implica profundamente e que devemos sentir pessoalmente, sem rodeios, sem evasivas, sem subterfúgios. No nosso tempo - no tempo da cultura do plástico, do "light", do efémero - há alguma tendência a não assumir responsabilidades, a não absolutizar os compromissos (no mundo do futebol e da política há até uma máxima que define a flutuabilidade, a incoerência, a contradição em que as pessoas se movem: "o que é verdade hoje, é mentira amanhã"). Mas, com Deus, não há meias tintas: ou se assume, ou não se assume. Como é que eu sinto esses compromissos que assumi com Deus no dia do meu Baptismo e que ao longo da vida, nas mais diversas circunstâncias, confirmei? Trata-se de algo que eu levo a sério e que eu aplico coerentemente a toda a minha existência e às opções que faço, ou de algo que eu só me lembro quando se trata de fazer uma bonita festa de casamento na igreja ou de cumprir a tradição e baptizar os filhos?

    • O profeta Ezequiel convida-nos também a assumir, com verdade e coerência, a nossa responsabilidade pelos nossos gestos de egoísmo e de auto-suficiência em relação a Deus e em relação aos irmãos. Entre nós, no entanto, muitas vezes "a culpa morre solteira". Há homens e mulheres que não têm o mínimo para viver dignamente? A culpa é da conjuntura económica internacional... Há situações de violência extrema e de injustiça? A culpa é do governo que não legisla nem coloca suficientes polícias nas ruas... A minha comunidade cristã está dividida, estagnada e não testemunha suficientemente o amor de Jesus? A culpa é do Papa, ou do bispo, ou do padre... E a minha culpa? Eu não terei, muitas vezes, a minha quota-parte de responsabilidades em tantas situações negativas com que, dia a dia, convivo pacificamente? Eu não precisarei de me "converter"?

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 24 (25)

    Refrão: Lembrai-Vos, Senhor, da vossa misericórdia.

    Mostrai-me, Senhor, os vossos caminhos,
    ensinai-me as vossas veredas.
    Guiai-me na vossa verdade e ensinai-me,
    porque Vós sois Deus, meu Salvador:
    em vós espero sempre.

    Lembrai-Vos, Senhor, das vossas misericórdias
    e das vossas graças que são eternas.
    Não recordeis as minhas faltas
    e os pecados da minha juventude.
    Lembrai-Vos de mim segundo a vossa clemência,
    por causa da vossa bondade, Senhor.

    O Senhor é bom e recto,
    ensina o caminho aos pecadores.
    Orienta os humildes na justiça
    e dá-lhes a conhecer os seus caminhos.

    LEITURA II - Filip 2,1-11

    Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Filipenses

    Irmãos:
    Se há em Cristo alguma consolação,
    algum conforto na caridade,
    se existe alguma consolação nos dons do Espírito Santo,
    alguns sentimentos de ternura e misericórdia,
    então, completai a minha alegria,
    tendo entre vós os mesmos sentimentos e a mesma caridade,
    numa só alma e num só coração.
    Não façais nada por rivalidade nem por vanglória;
    mas, com humildade,
    considerai os outros superiores a vós mesmos,
    sem olhar cada um aos seus próprios interesses,
    mas aos interesses dos outros.
    Tende em vós os mesmos sentimentos
    que havia em Cristo Jesus.
    Ele, que era de condição divina,
    não Se valeu da sua igualdade com Deus,
    mas aniquilou-Se a Si próprio.
    Assumindo a condição de servo,
    tornou-Se semelhante aos homens.
    Aparecendo como homem, humilhou-Se ainda mais,
    obedecendo até à morte, e morte de cruz.
    Por isso, Deus O exaltou
    e Lhe deu um nome que está acima de todos os nomes,
    para que ao nome de Jesus todos se ajoelhem,
    no céu, na terra e nos abismos,
    e toda a língua proclame que Jesus Cristo é o Senhor,
    para glória de Deus Pai.

    AMBIENTE

    Filipos, cidade situada no norte da Grécia, era uma cidade habitada maioritariamente por veteranos romanos do exército. Estava organizada à maneira de Roma e era uma espécie de Roma em miniatura. Os seus habitantes gozavam dos mesmos privilégios dos habitantes das cidades de Itália.
    A comunidade cristã de Filipos foi fundada por Paulo no verão de 49, no decurso da sua segunda viagem missionária. Numa das estadias de Paulo na prisão (em Éfeso?), a comunidade enviou um dos seus membros para o ajudar e uma generosa quantia em dinheiro para prover às necessidades do apóstolo.
    Apesar de ser uma comunidade viva, piedosa e generosa, a comunidade cristã de Filipos não era uma comunidade perfeita. O desprendimento, a humildade, a simplicidade, não eram valores demasiado apreciados entre os altivos patrícios romanos que compunham a comunidade.
    É neste enquadramento que podemos situar o texto que esta leitura nos apresenta. Trata-se de um texto que, em termos literários, apresenta duas partes. A primeira (vers. 1-5), em prosa, contém recomendações concretas de Paulo aos Filipenses acerca dos valores que devem cultivar. A segunda (vers. 6-11), em poesia, apresenta aos Filipenses o exemplo de Cristo (trata-se, provavelmente, de um hino pré-paulino, recitado nas celebrações litúrgicas cristãs e que Paulo integrou no texto da carta).

    MENSAGEM

    Na primeira parte (vers. 1-5), Paulo, em tom solene, pede aos altivos romanos que constituem a comunidade de Filipos que não se deixem dominar pelo orgulho, pela auto-suficiência, pela vaidade, pela ambição, que só provocam egoísmo e divisão. Recomenda-lhes que vivam unidos, que se amem e que sejam solidários, pois foi isso que Cristo, não só com palavras, mas com a própria vida, ensinou aos seus discípulos.
    Na segunda parte (vers. 6-11), Paulo vai referir-se, com mais pormenor, ao exemplo de Cristo. Para apresentar esse exemplo, Paulo recorre, então, ao tal hino litúrgico, que celebrava a "Kenosis" ("despojamento") de Cristo e a sua exaltação.
    Cristo Jesus - nomeado no princípio, no meio e no fim - constitui o motivo do hino. Dado que os Filipenses são cristãos, quer dizer, dado que Cristo é o protótipo a cuja imagem estão configurados, têm a iniludível obrigação de comportar-se como Cristo. Como &
    eacute; o exemplo de Cristo?
    O hino começa por aludir subtilmente ao contraste entre Adão (o homem que reivindicou ser como Deus e lhe desobedeceu - cf. Gn 3,5.22) e Cristo (o Homem Novo que, ao orgulho e revolta de Adão responde com a humildade e a obediência ao Pai). A atitude de Adão trouxe fracasso e morte; a atitude de Jesus trouxe exaltação e vida.
    Em traços precisos, o hino define o "despojamento" ("kenosis") de Cristo: Ele não afirmou com arrogância e orgulho a sua condição divina, mas aceitou fazer-Se homem, assumindo com humildade a condição humana, para servir, para dar a vida, para revelar totalmente aos homens o ser e o amor do Pai. Não deixou de ser Deus; mas aceitou descer até aos homens, fazer-Se servidor dos homens, para garantir vida nova para os homens. Esse "abaixamento" assumiu mesmo foros de escândalo: Ele aceitou uma morte infamante - a morte de cruz - para nos ensinar a suprema lição do serviço, do amor radical, da entrega total da vida.
    No entanto, essa entrega completa ao plano do Pai não foi uma perda nem um fracasso: a obediência e entrega de Cristo aos projectos do Pai resultaram em ressurreição e glória. Em consequência da sua obediência, do seu amor, da sua entrega, Deus fez d'Ele o "Kyrios" ("Senhor" - nome que, no Antigo Testamento, substituía o nome impronunciável de Deus); e a humanidade inteira ("os céus, a terra e os infernos") reconhece Jesus como "o senhor" que reina sobre toda a terra e que preside à história.
    É óbvio o apelo à humildade, ao desprendimento, ao dom da vida que Paulo faz aos Filipenses e a todos os crentes: o cristão deve ter como exemplo esse Cristo, servo sofredor e humilde, que fez da sua vida um dom a todos; esse caminho não levará ao aniquilamento, mas à glorificação, à vida plena.

    ACTUALIZAÇÃO

    Para reflexão, podem considerar-se as seguintes indicações:

    • Os valores que marcaram a existência de Cristo continuam a não ser demasiado apreciados em muitos dos nossos ambientes contemporâneos. De acordo com os critérios que presidem ao nosso mundo, os grandes "ganhadores" não são os que põem a sua vida ao serviço dos outros, com humildade e simplicidade, mas são os que enfrentam o mundo com agressividade, com auto-suficiência e fazem por ser os melhores, mesmo que isso signifique não olhar a meios para passar à frente dos outros. Como pode um cristão (obrigado a viver inserido neste mundo e a ser competitivo) conviver com estes valores?

    • Paulo tem consciência de que está a pedir aos seus cristãos algo realmente difícil; mas é algo que é fundamental, à luz do exemplo de Cristo. Também a nós é pedido um passo em frente neste difícil caminho da humildade, do serviço, do amor: será possível que, também aqui, sejamos as testemunhas da lógica de Deus?

    ALELUIA - Jo 10,27

    Aleluia. Aleluia.

    As minhas ovelhas ouvem a minha voz, diz o Senhor;
    Eu conheço-as e elas seguem-Me.

    EVANGELHO - Mt 21,28-32

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

    Naquele tempo,
    disse Jesus aos príncipes dos sacerdotes
    e aos anciãos do povo:
    «Que vos parece?
    Um homem tinha dois filhos.
    Foi ter com o primeiro e disse-lhe:
    'Filho, vai hoje trabalhar na vinha'.
    Mas ele respondeu-lhe: 'Não quero'.
    Depois, porém, arrependeu-se e foi.
    O homem dirigiu-se ao segundo filho
    e falou-lhe do mesmo modo.
    Ele respondeu: 'Eu vou, Senhor'.
    Mas de facto não foi.
    Qual dos dois fez a vontade ao pai?»
    Eles responderam-Lhe: «O primeiro».
    Jesus disse-lhes:
    «Em verdade vos digo:
    Os publicanos e as mulheres de má vida
    irão diante de vós para o reino de Deus.
    João Baptista veio até vós,
    ensinando-vos o caminho da justiça,
    e não acreditastes nele;
    mas os publicanos e as mulheres de má vida acreditaram.
    E vós, que bem o vistes,
    não vos arrependestes, acreditando nele».

    AMBIENTE

    O texto que nos é proposto neste domingo situa-nos em Jerusalém, na etapa final da caminhada terrena de Jesus. Pouco antes, Jesus entrara em Jerusalém e fora recebido em triunfo pela multidão (cf. Mt 21,1-11); no entanto, o entusiasmo inicial da cidade foi sendo substituído, aos poucos, por uma recusa categórica em acolher Jesus e o seu projecto.
    Os chefes dos sacerdotes e os anciãos do povo - os líderes religiosos judaicos - aparecem como o motor da oposição a Jesus. Eles não estão dispostos a reconhecer Jesus como o Messias de Deus e a aceitar que Ele tenha um mandato de Deus para propor aos homens uma nova realidade - a realidade do Reino. Há uma tensão no ar, que anuncia a proximidade da paixão e da morte de Jesus.
    No quadro que antecede o episódio que nos é hoje proposto - mas que está em relação directa com ele - os líderes judeus encontraram-se com Jesus no Templo; perguntaram-Lhe com que autoridade Ele agia e quais eram as suas credenciais (cf. Mt 21,23-27). Jesus respondeu-lhes convidando-os a pronunciarem-se sobre a origem do baptismo de João. Os líderes judaicos não quiseram responder: se dissessem que João Baptista não vinha de Deus, tinham medo da reacção da multidão (que considerava João um profeta); se admitissem que o baptismo de João vinha de Deus, temiam que Jesus lhes perguntasse porque não o aceitaram... Diante do silêncio embaraçado dos seus interlocutores, Jesus deu-lhes a entender que não tinha uma resposta para lhes dar, enquanto eles continuassem de coração fechado, na recusa obstinada da novidade de Deus (anunciada por João e proposta pelo próprio Jesus).
    Na sequência, Jesus vai apresentar três parábolas, destinadas a ilustrar a recusa de Israel em acolher a proposta do Reino. Com elas, Jesus convida os líderes da nação judaica a reflectir sobre a situação de "gueto" em que se instalaram e a reconhecerem o sem sentido das suas posições fixistas e conservadoras. O nosso texto é a primeira dessas três parábolas.

    MENSAGEM

    A parábola dos dois filhos ilustra duas atitudes diversas diante dos desafios e das propostas de Deus.
    O primeiro filho foi convidado pelo pai a trabalhar "na vinha". A sua primeira resposta foi negativa: "não quero". No contexto familiar da Palestina do tempo de Jesus, trata-se de uma resposta totalmente reprovável, particularmente porque uma atitude deste tipo ia contra todas as convenções sociais... Enchia um pai de vergonha e punha em causa a sua autoridade diante dos familiares, dos amigos, dos vizinhos. No entanto, este primeiro filho acabou por reconsiderar e por ir trabalhar na vinha (vers. 28-29).
    O segundo filho, diante do mesmo convite, respondeu: "vou, sim, senhor". Deu ao pai uma respos
    ta satisfatória, que não punha em causa a sua autoridade e a sua "honra". Ficou bem visto diante de todos e todos o consideraram um filho exemplar. No entanto, acabou por não ir trabalhar na vinha (vers. 30).
    A questão posta, em seguida, por Jesus, é: "qual dos dois fez a vontade do pai?" A resposta é tão óbvia que os próprios interlocutores de Jesus não têm qualquer pejo em a dar: "o primeiro" (vers. 31).
    A parábola ensina que, na perspectiva de Deus, o importante não é quem se comportou bem e não escandalizou os outros; mas, de acordo com a lógica de Deus, o importante é cumprir, realmente, a vontade do pai. Na perspectiva de Deus, não bastam palavras bonitas ou declarações de boas intenções; mas é preciso uma resposta adequada e coerente aos desafios e às propostas do Pai (Deus).
    É certo que os fariseus, os sacerdotes, os anciãos do Povo, disseram "sim" a Deus ao aceitar a Lei de Moisés... A sua atitude - como a do filho que disse "sim" e depois não foi trabalhar para a vinha - foi irrepreensível do ponto de vista das convenções sociais; mas, do ponto de vista do cumprimento da vontade de Deus, a sua atitude foi uma mentira, pois recusaram-se a acolher o convite de João à conversão. Em contrapartida, aqueles que, de acordo com o "política e religiosamente correcto" disseram "não" (por exemplo, os cobradores de impostos e as prostitutas), cumpriram a vontade do Pai: acolheram o convite de João à conversão e acolheram a proposta do Reino que Jesus veio apresentar (vers. 32).
    Lida no contexto do ministério de Jesus, esta parábola dava uma resposta àqueles que O acusavam de acolher os pecadores e os marginais - isto é, aqueles que, de acordo com as "convenções", disseram não a Deus. Jesus deixa claro que, na perspectiva de Deus, não interessam as convenções externas, mas a atitude interior. O que honra a Deus não é o que cumpre ritos externos e que dá "boa impressão" às massas; mas é o que cumpre a vontade de Deus.
    Mais tarde, a comunidade de Mateus leu a mesma parábola numa perspectiva um pouco diversa. Ela serviu para iluminar a recusa do Evangelho por parte dos judeus e o seu acolhimento por parte dos pagãos. Israel seria esse "filho" que aceitou trabalhar na vinha mas, na realidade, não cumpriu a vontade do Pai; os pagãos seriam esse "filho" que, aparentemente, esteve sempre à margem dos projectos do Pai, mas aceitou o Evangelho de Jesus e aderiu ao Reino.

    ACTUALIZAÇÃO

    Para a reflexão, ter em conta os seguintes desenvolvimentos:

    • Antes de mais, a parábola dos dois filhos chamados para trabalhar "na vinha" do pai sugere que, na perspectiva de Deus, todos os seus filhos são iguais e têm a mesma responsabilidade na construção do Reino. Deus tem um projecto para o mundo e quer ver todos os seus filhos - sem distinção de raça, de cor, de estatuto social, de formação intelectual - implicados na concretização desse projecto. Ninguém está dispensado de colaborar com Deus na construção de um mundo mais humano, mais justo, mais verdadeiro, mais fraterno. Tenho consciência de que também eu sou chamado a trabalhar na vinha de Deus?

    • Diante do chamamento de Deus, há dois tipos de resposta... Há aqueles que escutam o chamamento de Deus, mas não são capazes de vencer o imobilismo, a preguiça, o comodismo, o egoísmo, a auto-suficiência e não vão trabalhar para a vinha (mesmo que tenham dito "sim" a Deus e tenham sido baptizados); e há aqueles que acolhem o chamamento de Deus e que lhe respondem de forma generosa. De que lado estou eu? Estou disposto a comprometer-me com Deus, a aceitar os seus desafios, a empenhar-me na construção de um mundo mais bonito e mais feliz, ou prefiro demitir-me das minhas responsabilidades e renunciar a ter um papel activo no projecto criador e salvador que Deus tem para os homens e para o mundo?

    • O que é que significa, exactamente, dizer "sim" a Deus? É ser baptizado ou crismado? É casar na igreja? É fazer parte de uma confraria qualquer da paróquia? É fazer parte da equipa que gere a Fábrica da Igreja? É ter feito votos num qualquer instituto religiosos? É ir todos os dias à missa e rezar diariamente a Liturgia das Horas? Atenção: na parábola apresentada por Jesus, não chega dizer um "sim" inicial a Deus; mas é preciso que esse "sim" inicial se confirme, depois, num verdadeiro empenho na "vinha" do Senhor. Ou seja: não bastam palavras e declarações de boas intenções; é preciso viver, dia a dia, os valores do Evangelho, seguir Jesus nesse caminho de amor e de entrega que Ele percorreu, construir, com gestos concretos, um mundo de justiça, de bondade, de solidariedade, de perdão, de paz. Como me situo face a isto: sou um cristão "de registo", que tem o nome nos livros da paróquia, ou sou um cristão "de facto", que dia a dia procura acolher a novidade de Deus, perceber os seus desafios, responder aos seus apelos e colaborar com Ele na construção de uma nova terra, de justiça, de paz, de fraternidade, de felicidade para todos os homens?

    • Nas nossas comunidades cristãs aparecem, com alguma frequência, pessoas que sabem tudo sobre Deus, que se consideram família privilegiada de Deus, mas que desprezam esses irmãos que não têm um comportamento "religiosamente correcto" ou que não cumprem estritamente as regras do "bom comportamento" cristão... Atenção: não temos qualquer autoridade para catalogar as pessoas, para as excluir e marginalizar... Na perspectiva de Deus, o importante não é que alguém se tenha afastado ou que tenha assumido comportamentos marginais e escandalosos; o essencial é que tenha acolhido o chamamento de Deus e que tenha aceitado trabalhar "na vinha". A este propósito, Jesus diz algo de inaudito aos "santos" príncipes dos sacerdotes e anciãos do povo: "os publicanos e as mulheres de má vida irão diante de vós para o Reino de Deus". Hoje, que é que isto significa? Hoje, quem são os "vós"? Hoje, quem são os "publicanos e mulheres de má vida"?

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 26º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 26º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. DURANTE A CELEBRAÇÃO.
    O rito penitencial poderá ser preparado com mais cuidado, para não ser vivido de maneira demasiado mecânica e rotineira. As intenções penitenciais podem ser ditas mais lentamente para melhor serem interiorizadas, os silêncios podem permitir a cada um entrar nesta atitude de conversão à qual nos chama o Senhor.

    3. PALAVRA DE VIDA.
    É sempre fácil fazer belas promessas e proferir belas declarações. O que conta são os actos. Quantas mães disseram ao seu filho de quando em vez: "Pára de me dizer que gostas de mim... Prova-me!". Muitas vezes exprimimos a Deus a nossa confiança através de uma bela profissão de fé, muitas vezes reafirmamos-Lhe o nosso amor através de belas orações, mas Ele espera que Lhe manifestemos esta confiança e este amor. Não basta dizer os actos de fé, de esperança e de caridade. É preciso pôr em acção a nossa fé, a nossa esperança e a nossa caridade. Então, seremos verdadeiros praticantes, pondo em prática o que ouvimos e vivemos na missa.

    4. UM PONTO DE ATENÇÃO.
    O Salmo Responsorial. No interior da liturgia da Palavra, o salmo não é uma peça mestra, pois ele exprime a mensagem da primeira leitura. Mas é muitas vezes um tempo de meditação e de oração, é o caso de hoje. Não basta contentar-se em ler o salmo, é preciso lê-lo bem. Salmodiar este texto não é difícil, o cântico favorece a interiorização. O solista deve preparar-se muito bem para cantar o salmo, cujo refrão é cantado pela assembleia. Se alguém souber tocar flauta, poderá acompanhar a melodia do solista ou tocar algumas notas depois do refrão, antes de cada estrofe.

    5. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE...
    Tomar parte numa acção caritativa... Procuremos tomar a nossa quota-parte numa acção caritativa da paróquia, no bairro ou na cidade, um serviço particular a prestar nesta semana... Não temos a tendência, muitas vezes, de deixar que as equipas "especializadas" façam e, quanto a nós, ficarmos apenas no dizer?

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

    S. Teresa do Menino Jesus, Virgem

    S. Teresa do Menino Jesus, Virgem


    1 de Outubro, 2023

    Santa Teresa do Menino Jesus nasceu em Alençon, França, em 1873. É a filha mais nova dos Beatos Luís Martin e Célia Guérin, casal cristão exemplar. Aos 15 anos, Teresa entrou no Carmelo de Lisieux. A vida de clausura e de contemplação, a vivência da infância espiritual, não a impediram de ser missionária. Pelo contrário, viveu de modo extraordinário o ideal de Santa Teresa de Ávila: "Vim para salvar almas e sobretudo a fim de rogar pelos sacerdotes". A entrega de amor fê-la vítima de amor. Faleceu aos 24 anos de idade, em 1897. Pio XI canonizou-a em 1925, proclamando-a Padroeira das Missões.

    Lectio

    Primeira leitura: Isaías 66, 10-14

    Alegrai-vos com Jerusalém, rejubilai com ela, vós todos que a amais; regozijai-vos com ela, vós todos os que estáveis de luto por ela. 11Como criança amamentando-se ao peito materno, ficareis saciados com o seu seio reconfortante, e saboreareis as delícias do seu peito abundante. 12Porque, assim diz o Senhor: «Vou fazer com que a paz corra para Jerusalém como um rio, e a riqueza das nações, como uma torrente transbordante. Os seus filhinhos serão levados ao colo, e acariciados sobre os seus regaços. 13Como a mãe consola o seu filho, assim Eu vos consolarei; em Jerusalém sereis consolados. 14Ao verdes isto, os vossos corações pulsarão de alegria, e os vossos ossos retomarão vigor,como a erva fresca. A mão do Senhor há-de manifestar-se aos seus servos, e a sua ira aos seus inimigos.

    Jerusalém foi consolada por Deus, fonte de toda a consolação. Agora é chamada a oferecer essa mesma consolação, como mãe generosa, aos filhos das suas entranhas. O profeta especifica essas consolações, que não são promessas vãs ou retórica vazia, mas paz e segurança a todos os níveis. Acabaram-se os tempos das tensões e das guerras, acabaram-se as ameaças dos inimigos. A cidade santa está em paz, dom de Deus, e pode oferecê-la aos seus habitantes. Aliás a Nova Jerusalém identifica-se com Javé, que, pela sua presença e pelo seu espírito, atrairá todos os povos para lhes oferecer a paz e a consolação definitivas.

    Evangelho: Mateus 18, 1-5

    Naquela hora, os discípulos aproximaram-se de Jesus e perguntaram-lhe: «Quem é o maior no Reino do Céu?» 2Ele chamou um menino, colocou-o no meio deles 3e disse: «Em verdade vos digo: Se não voltardes a ser como as criancinhas, não podereis entrar no Reino do Céu. 4Quem, pois, se fizer humilde como este menino será o maior no Reino do Céu. 5Quem receber um menino como este, em meu nome, é a mim que recebe.

    Ao dizer estas palavras, Jesus parece pensar na humildade das crianças, que não têm pretensões, que têm consciência de ser crianças e aceitam a sua pequenez, a sua impotência e a necessidade que têm dos pais para sobreviver. Na relação com Deus, estas palavras têm ainda mais sentido: que é o homem diante d´Ele?
    A humildade é necessária particularmente aos dirigentes da comunidade cristã pelo que eles são - bem pouca coisa - e pelo que são os outros, - filhos de Deus.

    Meditatio
    Os pensamentos de Deus são bem diferentes dos nossos, tal como os seus caminhos são distantes dos nossos. Os nossos pensamentos vêm do orgulho; os pensamentos de Deus vêm da humildade. Os nossos caminhos são esforço para nos tornarmos grandes; os caminhos de Deus conduzem à pequenez. Como quem quer ir para o Norte deve caminhar em direção oposta ao Sul, assim, para avançar nos caminhos de Deus devemos tomar a direção oposta ao nosso orgulho.
    Teresa tinha grandes ambições: queria ser simultaneamente contemplativa e ativa, apóstola, doutora, missionária e mártir. Aliás, parecia-lhe pouco um só martírio e desejava-os todos. Acabou por descobrir que, no coração da Igreja, é o amor que tudo anima e move. Então, escreve: "Compreendi que o Amor encerra todas as Vocações e que o Amor é tudo!... E, num transporte de alegria delirante, exclamei: encontrei finalmente a minha vocação; a minha vocação é o Amor! No Coração da Igreja Minha Mãe, eu serei o Amor, assim serei tudo, assim o meu sonho será realizado." E, enquanto, no seu tempo, muitas pessoas fervorosas se ofereciam a Deus como vítimas da sua justiça, Teresa preferiu entregar-se ao seu Amor Misericordioso. Descobrira esse amor ao meditar na parábola do filho pródigo ou, melhor dizendo, do pai misericordioso. Dizia a santa de Lisieux: "Deus infinitamente Misericordioso, que se dignou perdoar com tanta bondade os pecados do filho pródigo, não será também justo comigo, que estou sempre a seu lado?" Para Teresa, Deus manifesta-se justo exatamente na sua misericórdia e no seu perdão a quem deles necessita. A Justiça de Deus é Amor e Misericórdia. Foi aceitando a sua pequenez e pobreza, e acolhendo e caminhando no amor misericordioso de Deus que ela chegou à Santidade.
    Como escreveu o P. Dehon: "A união íntima a Cristo na sua oblação e imolação de amor é-nos confirmada pela sua predileção pela oferta como vítima "ao Amor misericordioso" de Santa Teresa de Lisieux. "Nascemos do espírito de Santa Margarida Maria, aproximando-nos do da Ir. Teresa". Seguidamente o Pe. Dehon transcreve a fórmula com que a santa se ofereceu como vítima ao Amor misericordioso. Depois, conclui: "Com a Ir. Teresa, abandonamo-nos completamente à vontade divina" (Diário XLV, 53.55-56: Abril de 1925).
    A descoberta do Deus Misericordioso foi o ponto mais importante do Caminho Espiritual de Teresa do Menino Jesus. Essa perceção levou-a a dar-se conta da sua missão na Terra: anunciar que Deus não é Castigador, mas Misericordioso. Esta confiança na Misericórdia de Deus, tomou, transformou e entreteceu toda a sua vida e tornou-se o grande motor do que fez e disse até ao fim dos seus dias. Como vemos há uma forte semelhança e quase identidade entre a experiência espiritual e a missão do P. Dehon e de Santa Teresa.

    Oratio

    Ó Cristo Senhor, Tu nos escolheste e chamaste ao teu serviço pelo grande Amor que tens a Deus Pai e aos teus irmãos. Foste tu quem nos escolheu e não nós a Ti. Faz, pois, com que possamos, hoje, segundo o desígnio da tua chamada, dar frutos de salvação ao mundo, pelo qual nos oferecemos, como pessoas e como comunidade. Aviva em nós o espírito do Pe. Dehon, o qual, por teu amor, não se cansava de trabalhar para que toda a humanidade fosse, um dia, recapitulada em Ti. Torna-nos um testemunho vivo do teu amor na Igreja. Ámen.

    Contemplatio

    O Pai de misericórdia que nos ama ternamente chama-nos. Chama-nos seus filhinhos. Descreveu-se com complacência na parábola do filho pródigo. Eu sou este filho pródigo, que viveu, se não na luxúria, pelo menos na vaidade e na inutilidade. Volto para o meu Pai, hesitante, tímido, temeroso, mas ele está lá, que me acolhe com amor. O seu coração bate fortemente no seu peito. Deseja-me com ardor, observa, procura. E se regresso, atira-se ao meu pescoço e aperta-me contra si, coração contra coração. E chama os seus servos, os seus anjos, para me darem tudo o que perdi. Nada falta: o manto de outrora, o anel de nobreza, os sapatos, e o vitelo gordo para a festa. O Coração de Jesus está emocionado; os seus olhos choram de ternura, mas sorriem de alegria: «Alegremo-nos, diz o bom Mestre, este filho estava morto e reviveu, estava perdido e foi encontrado». (Leão Dehon, OSP 3, p. 653).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "No Coração da Igreja Minha Mãe, eu serei o Amor" (Santa Teresa do Menino Jesus).

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    S. Teresa do Menino Jesus, Virgem (01 Outubro)

  • Santos Anjos da Guarda

    Santos Anjos da Guarda


    2 de Outubro, 2023

    O Anjos, criaturas puramente espirituais e dotadas de inteligência e vontade, servem a Deus e são seus mensageiros. Eles "

    veem constantemente a face de meu Pai que está no Céu" (Mt 18, 10). São "poderosos mensageiros, que cumprem as suas ordens" (Sl 103, 20). São encarregados por Deus de proteger a humanidade. O povo de Deus sempre sentiu o dever de corresponder à sua silenciosa e benévola companhia, honrando-os. Em 1615, entrou no Calendário romano a celebração que hoje lhes dedicamos.

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 23, 20-23a

    Eis que o que diz o Senhor: "Eu envio um anjo diante de ti, para te guardar no caminho e para te fazer entrar no lugar que Eu preparei. 21Mantém-te atento na sua presença e escuta a sua voz. Não lhe causes amargura, porque ele não suportará a vossa transgressão, porque está nele a minha autoridade. 22Mas se escutares a sua voz e se fizeres tudo o que Eu falar, Eu serei inimigo dos teus inimigos e serei adversário dos teus adversários, 23pois o meu anjo caminhará diante de ti.

    Estamos no epílogo do código da aliança, numa seção com caráter de pregação, possivelmente de origem eloísta. Logo no início aparece-nos a figura de um anjo, que irá à frente do povo na sua caminhada para a Terra Prometida, para o proteger e orientar. Chama-se o anjo de Deus ou anjo de Javé, idêntico ao próprio Deus. O povo deve, pois, obedecer-lhe. O enquadramento contextual do texto permite também afirmar que o anjo de Deus é, agora, a Lei, palavra de Deus encarnada na palavra humana. Mas poderão ser igualmente os acontecimentos futuros, todos eles mensageiros potenciais de Deus, testemunhas da sua palavra e da sua ação. Em última análise, como já dissemos, o anjo é o próprio Deus com o homem. Importa que o homem tome consciência dessa presença e se torne digno dela, deixando-se guiar docilmente.

    Evangelho: Mateus 18, 1-5.10

    Naquele tempo, os discípulos aproximaram-se de Jesus e perguntaram-lhe: «Quem é o maior no Reino do Céu?» 2Ele chamou um menino, colocou-o no meio deles 3e disse: «Em verdade vos digo: Se não voltardes a ser como as criancinhas, não podereis entrar no Reino do Céu.4Quem, pois, se fizer humilde como este menino será o maior no Reino do Céu. 5Quem receber um menino como este, em meu nome, é a mim que recebe.» 10«Livrai-vos de desprezar um só destes pequeninos, pois digo-vos que os seus anjos, no Céu, vêem constantemente a face de meu Pai que está no Céu.

    Na literatura judaica, a função dos anjos era tripla: adoração e louvor de Deus; agentes ou mensageiros divinos nos assuntos humanos; guardiães dos homens e das nações (Heb 12, 15). Segundo uma crença generalizada, eram poucos os anjos que tinham acesso direto a Deus. Tendo em conta estas premissas, o ensinamento tem por alvo a dignidade dos pequeninos que acreditam em Jesus: se os seus anjos têm essa dignidade, quanto maior será a dignidade dos crentes ao serviço dos quais eles estão!
    Como Deus nos protege com os seus anjos, assim também nós havemos de proteger os irmãos, sobretudo os mais frágeis e pequenos.

    Meditatio

    Esta memória dos anjos recorda-nos que, no caminho da vida, não estamos sós. Deus não nos abandona. Deus caminha connosco.
    Há, com efeito, uma criação visível, que podemos ver, pelo menos parcialmente, com os olhos da carne; e há uma criação invisível, mas real, que só os sentidos espirituais nos permitem perceber, por meio da fé, da oração, da iluminação interior que vem do Espírito Santo.
    Os anjos são, em primeiro lugar, um sinal luminoso da divina Providência, da bondade paterna de Deus, que nada, do que é necessário, deixa faltar aos seus filhos. Intermediários entre a terra e o céu, os anjos são criaturas invisíveis postas à nossa disposição para nos guiarem no caminho de regresso à casa do Pai. Vêm do Céu para nos reconduzirem ao Céu e nos fazer pregustar algo das realidades celestes. Por vezes, podemos experimentar a presença dos anjos de modo muito concreto e sensível, desde que a saibamos reconhecer. Trata-se de encontros "casuais", - que todavia se tornam fundamentais e determinantes na nossa vida - ou de auxílio súbito e inesperado, em situações de perigo. Pode ser também uma intuição repentina, que nos permite dar-nos conta de um erro, de um esquecimento. Como não sentir-nos guiados, protegidos, nesses momentos? Os anjos protegem-nos de tantos perigos de que nem nos damos conta. Sobretudo do perigo de nos tornarmos ímpios, de não escutarmos nem obedecermos à Palavra de Deus. Os anjos sugerem-nos pensamentos de retidão e de humildade. Sugerem-nos bons sentimentos.
    Havemos também de ser anjos Deus em relação aos outros, ajudando-os a ver e a orientar-se pelos caminhos de Deus.
    O P. Dehon rezava: "Anjos do Senhor, recomendai-me à misericórdia do Sagrado Coração." (OSP 4, p. 317).

    Oratio

    Pai santo, Deus eterno e providente, nós vos damos graças por Cristo, Nosso Senhor. Proclamamos a vossa imensa glória, que resplandece nos Anjos e nos Arcanjos, e, honrando estes mensageiros celestes, exaltamos a vossa infinita bondade, porque a veneração que eles merecem é sinal da vossa incomparável grandeza sobre todas as criaturas. Por isso, com a multidão dos Anjos, que celebram a vossa divina majestade, Vos louvamos e bendizemos. Ámen. (cf. Prefácio dos Anjos).

    Contemplatio

    Os Anjos louvam a Deus e servem-n'O. «Eles são milhares de milhares, diz Daniel, à volta do trono de Deus, ocupados em servi-l'O» (Dan 7, 10). «Anjos do céu, diz o salmo, bendizei o Senhor, vós que executais as suas ordens» (Sl 102). Deus envia-os junto das criaturas. O seu nome significa «mensageiros». «São os enviados de Deus, diz S. Paulo, vêm ajudar os homens a realizarem a sua salvação» (Heb 1, 14). Há os anjos das nações e os anjos de cada um de nós. Deus dizia ao seu povo por Moisés: «Enviarei o meu anjo diante de vós. Conduzir-vos-á, guardar-vos-á e dirigir-vos-á para a terra que vos prometi» (Ex 23). Deus acrescentava: «Honrai-o, escutai a sua voz quando vos fala por Moisés. Se lhe obedecerdes, sereis abençoados e triunfareis sobre os vossos inimigos. Se o desprezardes, sereis castigados» (Ibid.). «Deus ordenou aos seus anjos, diz o salmo, que vos guardassem em todos os vossos caminhos. Levar-vos-ão nas suas mãos para que eviteis as pedras do caminho» (Sl 90). Trata-se aqui dos anjos de cada um de nós. «Respeitai as crianças, diz Nosso Senhor, os seus anjos veem constantemente a face de meu Pai» (Mt 18, 10). Os anjos vigiam particularmente as crianças. (L. Dehon, OSP 4, p. 315).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Anjos do Senhor, bendizei o Senhor!" (Sl 103, 20).

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    Santos Anjos da Guarda (02 Outubro)

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XXVI Semana - Segunda-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XXVI Semana - Segunda-feira

    2 de Outubro, 2023

    Lectio

    Primeira leitura: Zacarias 8, 1-8

    A palavra do Senhor do universo foi-me dirigida de novo nestes termos: 2«Assim fala o Senhor do universo: 'Sinto por Sião um amor ardente, que me provoca ciúme e grande cólera.'» 3Assim fala o Senhor do universo: «Volto a Sião e vou habitar no meio de Jerusalém. Jerusalém será chamada 'Cidade Fiel', e a montanha do Senhor do universo, 'Montanha Santa'.» 4Assim fala o Senhor do universo: «Velhos e velhas sentar-se-ão ainda nas praças de Jerusalém; cada um terá na mão o seu bastão, por causa da sua muita idade. 5As praças da cidade ficarão cheias de meninos e meninas que brincarão nelas.» 6Assim fala o Senhor do universo: «Se isto parece um milagre aos olhos do resto deste povo, acaso será impossível aos meus olhos, naqueles dias?» - oráculo do Senhor do universo. 7Assim fala o Senhor do universo: «Eis que Eu salvo o meu povo dos países do Oriente e dos países do Ocidente. 8Eu os levarei a habitarem em Jerusalém. Eles serão o meu povo e Eu serei o seu Deus em fidelidade e em justiça.»

    Ao terminar a primeira parte do seu livro, Zacarias apresenta-nos, num mosaico de pequenos oráculos de salvação, um decálogo dos tempos messiânicos. São oráculos independentes, fechados na sua expressão literária mas abertos à realização escatológica; fiéis à tradição mas vigorosos na sua perene actualidade. Cada um deles é uma verdadeira injecção de optimismo, é a confirmação de muitos desejos e esperanças frustrados pela malícia do povo. Os dois primeiros sugerem a fidelidade de Deus à aliança. É por causa dessa fidelidade que Deus ama Sião e não tolera o sofrimento do seu povo. O Senhor vai perdoar Judá, e vai fazê-lo voltar. Jerusalém renascerá, santificada pela palavra de Deus, fiel e dócil a essa mesma palavra (v. 3).
    Vêm, depois, os oráculos de fertilidade: os habitantes da cidade vão ter vida longa e uma fecundidade inesperada (vv. 4-6); vão multiplicar-se; os exilados vão regressar. Alguns objectam que tudo isto são sonhos irrealizáveis. Mas o profeta insiste: «Se isto parece um milagre aos olhos do resto deste povo, acaso será impossível aos meus olhos, naqueles dias?» - oráculo do Senhor do universo» (v. 6). O que parece impossível aos homens é possível a Deus.

    Evangelho: Lucas 9, 46-50

    Naquele tempo, 46veio-lhes então ao pensamento qual deles seria o maior. 47Conhecendo Jesus os seus pensamentos, tomou um menino, colocou-o junto de si 48e disse-lhes:«Quem acolher este menino em meu nome, é a mim que acolhe, e quem me acolher a mim, acolhe aquele que me enviou; pois quem for o mais pequeno entre vós, esse é que é grande.» 49João tomou a palavra e disse: «Mestre, vimos alguém expulsar demónios em teu nome e impedimo-lo, porque ele não te segue juntamente connosco.» 50Jesus disse-lhe: «Não o impeçais, pois quem não é contra vós é por vós.»

    O evangelho de hoje lembra-nos duas atitudes fraternas muito comuns na vida dos santos. A primeira atitude é a da humildade, que se opõe a toda a ambição (vv. 46-48). Outra é a tolerância (cf. Vv. 49 ss.). São temas frequentes nos evangelhos que, no fundo, sublinham a necessidade de ultrapassar a auto-suficiência de quem aspira a títulos e dignidades, bem como o orgulho de grupo, que se pode encontrar em algumas comunidades cristãs. Põe vezes, pensa-se que os mais importantes são os que possuem mais dotes ou responsabilidades na gestão dessas comunidades. Por outro lado, é bastante espontâneo o desejo de ser o primeiro num grupo. Também os apóstolos caem nesse engano. Discutem sobre o lugar que ocupam e sobre quem é o primeiro entre eles. Mas Jesus não embarca nesse tipo de discussões. Toma uma criança e coloca-a ao seu lado, no lugar de maior dignidade, afirmando: «quem for o mais pequeno entre vós, esse é que é grande» (v. 48b). O pequeno é grande porque é fraco e pobre: é pequeno de corpo, precisa dos outros, não tem liberdade de acção, é inútil. É símbolo do discípulo último e pobre. Mas também é imagem de Jesus que se abandona nos braços do Pai: «Quem acolher este menino em meu nome, é a mim que acolhe, e quem me acolher a mim, aco­lhe aquele que me envio» (v. 48ª).
    Perante a atitude ciumenta dos apóstolos, Jesus ensina a tolerância: «Mestre, vimos alguém expulsar demónios em teu nome e impedimo‑lo, por­que ele não te segue juntamente connosco.» (v. 49). Mas Jesus não está de acordo: «Não o impeçais» (v. 50). O discípulo deve ter um coração aberto e tolerante. Deus envia quem quer a anunciar a Palavra e a fazer o bem. Não tem necessariamente que pertencer ao grupo de Jesus ou que ser importante. Não conta o arauto: conta a mensagem, o evangelho anunciado. Deus tem muitos modos de falar aos homens.

    Meditatio

    A Palavra de Deus é sempre viva e penetrante. O texto de Zacarias, que hoje escutamos, é um hino ao poder de Deus, que torna possível o que aos olhos dos homens parece impossível: «Se isto parece um milagre aos olhos do resto deste povo, acaso será impossível aos meus olhos, naqueles dias?» (v. 6). Estas palavras ecoarão, mais tarde no Evangelho: «Aos homens é impossível, mas a Deus tudo é possível» (Mt 19, 26; cf. Mc 10, 16). As palavras do profeta são, pois, um convite à esperança. Deus conduz infalivelmente a realização do seu projecto de salvação. Muitas vezes fá-lo por caminhos e com métodos que nada têm a ver com a lógica humana. É o que sugere o menino que Jesus colocou junto de si (v. 42). O próprio Deus, para nos salvar, se fez Menino simples e pobre, mas rico de amor para com todos.
    A fraternidade, que todos desejamos, tem condições. A primeira é, sem dúvida, a humildade. Se nos pomos a discutir sobre quem é o maior, está tudo estragado. Os Apóstolos ainda viviam muito influenciados pela lógica humana. Por isso, «veio-lhes ao pensamento qual deles seria o maior» (v. 46). O desejo de ser grande é natural ao homem e não é um mal. Foi Deus que nos pôs no coração esse desejo, para que façamos por crescer. A questão é que não o façamos à custa dos outros, e saibamos onde está a verdadeira grandeza. Deus não nos repreende por buscá-la, mas ensina-nos o justo caminho para a encontrar: «quem for o mais pequeno entre vós, esse é que é grande» (v. 48). A verdadeira grandeza alcança-se pelo serviço amoroso e humilde aos outros. Foi esse o caminho escolhido por Jesus, caminho sintetizado no gesto do lava-pés (Jo 13, 1ss.). O Senhor serviu por amor e com humildade. Foi, por excelência, o servo de Deus e dos homens. Por isso é que Deus O exaltou e Lh
    e deu um nome que está acima de todos os nomes (cf. Fl 2, 9). O caminho da verdadeira grandeza passa pelo acolhimento dos pequenos e fracos e pelo serviço que lhes prestamos por amor e com humildade.
    A tolerância é outra condição para a fraternidade: «Mestre, vimos alguém expulsar demónios em teu nome e impedimo-lo, porque ele não te segue juntamente connosco.» Jesus disse-lhe: «Não o impeçais, pois quem não é contra vós é por vós» (vv. 49s.). No seguimento de Cristo, nem todos caminham do mesmo modo, nem tal se pode exigir. Há que respeitar cada um, com as suas capacidades, com os seus carismas, com a sua vocação. Que sentido fazem certas lutas, mais ou menos visíveis, entre comunidades, entre grupos, entre movimentos, na Igreja? Jesus acrescenta uma frase que nos pode parecer contraditória: «quem não é contra vós é por vós» (v. 50). Noutra ocasião tinha dito: «Quem não está comigo, é contra mim» (Mt 12, 30). Mas não há contradição, porque não se trata de Jesus, mas dos discípulos e do modo como O seguem. Os discípulos devem alegrar-se quando virem que outros seguem a Jesus, ainda que de modo diferente do deles. Como estes princípios teriam podido, e podem ainda, evitar tantas discussões, tantas divisões entre os cristãos, e dentro das próprias comunidades!

    Oratio

    Pai santo, que amas os pequenos e humildes, ajuda-me a caminhar na simplicidade e na humildade. Dá-me um coração manso e humilde como o do teu Filho Jesus. Que, como Ele, eu saiba servir a todos por amor e com humildade, porque só esse é o caminho que leva à verdadeira grandeza. Cria em mim, Senhor, um coração livre da mania das grandezas, livre do triunfalismo, um coração agradecido por tudo quanto tens feito por mim, por tudo quanto queres fazer servindo-te de mim. Dá um coração tolerante, compreensivo, misericordioso para com todos. Amen.

    Contemplatio

    Ó doce misericórdia de Deus, toda cheia de compaixão e de clemência, venho na dor e na angústia do meu coração recorrer aos vossos conselhos: porque vós sois toda a minha esperança e toda a minha confiança. Vós nunca desprezastes o infeliz, nunca repelistes um pecador, por muito repugnantes que fossem as chagas da sua alma... A vossa mão generosa dignar-se-á fazer-me uma esmola bastante abundante para reparar a minha vida que perdi. A vossa caridade dignar-se-á cobrir todos os meus pecados e suprir a todas as minhas negligências. - E vós, amor divino, o meu Jesus é o vosso real cativo. Fostes vós que o fizestes prisioneiro no Getsémani e ligastes depois com cordas e cadeias. Apoderastes-vos da sua pessoa e dos seus bens para enriquecerdes o céu e a terra com este precioso espólio, para cumulardes de bens todos os seres indo buscar aos tesouros de um tão glorioso prisioneiro. Com o preço de um tão rico espólio, de um tão ilustre cativo, vós podeis, ó amor, resgatar a minha vida que eu tinha perdido, e dar-me, não sete vezes, mas cem vezes o valor das minhas obras tão inúteis até ao presente. Apoderai-vos de mim também, ó amor e encadeai-me com o meu Jesus amado, a fim de que nunca mais me separe dele. (Leão Dehon, OSP 3, p. 487).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a Palavra:
    «Mostrai-me, Senhor, as maravilhas do vosso amor» (cf. Sl 16, 7ª)

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XXVI Semana - Terça-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XXVI Semana - Terça-feira

    3 de Outubro, 2023

    Lectio

    Primeira leitura: Zacarias 8, 20-23

    Assim fala o Senhor do universo: «Virão povos e habitantes de grandes cidades. 21E os habitantes de uma cidade irão para outra, dizendo: 'Vamos implorar a face do Senhor! - Eu também irei procurar o Senhor do universo!' 22E numerosos povos e nações poderosas virão procurar o Senhor do universo em Jerusalém e implorar a face do Senhor.» 23Assim fala o Senhor do universo: «Naqueles dias, dez homens de todas as línguas das nações tomarão um judeu pela dobra do seu manto e dirão: 'Nós queremos ir convosco, porque soubemos que Deus está convosco'.»

    O último oráculo é um verdadeiro evangelho posto na boca dos pagãos: «Naqueles dias, dez homens de todas as línguas das nações tomarão um judeu pela dobra do seu manto e dirão: 'Nós queremos ir convosco, porque soubemos que Deus está convosco» (v. 23).
    A comunidade dos regressados do exílio era propensa a uma atitude penitencial. Mas essa atitude não podia abafar a alegria da salvação realizada por Deus em favor do seu povo. O jejum é importante. Mas é a alegria que deve caracterizar a nova comunidade, que, para isso, deve amar a verdade e a paz. Para além do regresso dos exilados, como motivo de festa, há também a reunião de todos os povos em Jerusalém. Esses povos hão-de reconhecer o Senhor e tornar-se mestres do caminho que a Ele conduz (v. 23).
    Toda esta esperança, que o profeta procura incutir no seu povo, baseia-se na confiança no Senhor e na certeza profunda na sua fidelidade.

    Evangelho: Lc 9, 51-56

    51Como estavam a chegar os dias de ser levado deste mundo, Jesus dirigiu-se resolutamente para Jerusalém 52e enviou mensageiros à sua frente. Estes puseram-se a caminho e entraram numa povoação de samaritanos, a fim de lhe prepararem hospedagem. 53Mas não o receberam, porque ia a caminho de Jerusalém. 54Vendo isto, os discípulos Tiago e João disseram: «Senhor, queres que digamos que desça fogo do céu e os consuma?» 55Mas Ele, voltando-se, repreendeu-os. 56E foram para outra povoação.

    Depois do ministério na Galileia, com todas as suas palavras, a sua mensagem, os seus milagres e o testemunho do seu amor, Jesus caminha decididamente para Jerusalém, para a realização do seu destino. O caminho de Jerusalém levará Jesus até à cruz e à ressurreição. É a sua «hora» (cf. Jo 12, 23;16, 32). A hora manifesta a vontade de Jesus de dar a vida. Essa vontade acompanhou-o toda a vida. Nele tudo tendia para o momento do dom. Nessa hora, Jesus acolhe todo o sofrimento dos homens e dá a vida para os salvar. A primeira parte do evangelho de Lucas (ministério na Galileia) visa a "compreensão" do Reino; a segunda visa a "realização" do Reino. Na primeira parte, o Reino é apresentado em parábolas, como um mistério que cresce no escondimento, um crescimento atribulado e fatigante; agora revela-se mais claramente como o mistério da morte e da ressurreição de Cristo. Ao falar deste itinerário, Lucas escreve que Jesus «se dirigiu resolutamente» (v. 51) para Jerusalém. Literalmente, «endureceu o rosto». É uma expressão do cântico do Servo: «Tornei o meu rosto duro como pedra» (Is 50, 7). Jesus vê claramente os sofrimentos que vai enfrentar. Mas abandona-se completamente à vontade do Pai.

    Meditatio

    Comecemos por dar atenção às belas palavras de Zacarias: «Naqueles dias, dez homens de todas as línguas das nações tomarão um judeu pela dobra do seu manto e dirão: 'Nós queremos ir convosco, porque soubemos que Deus está convosco» (v. 23). Que bom seria que isto continuasse a acontecer hoje com cada um dos membros do novo Povo de Deus, a Igreja. Na Igreja, todos os fiéis deviam ser capazes de fazer sentir que há neles algo de extraordinário: a presença divina, que transforma a vida. Um descrente, ou um simples ouvinte, que entre numa comunidade cristã, vendo o que ali se passa, deveria sentir a necessidade de se prostrar com o rosto por terra, adorar a Deus, e proclamar que Deus está realmente no meio de nós (cf. 1 Cor 14, 24s.), deixando-se atrair para a Igreja. O nosso modo de viver a caridade, a alegria, o Senhor, deve atrair a todos para o caminho da salvação.
    O evangelho ajuda-nos a compreender a atitude com que havemos de viver e reagir às dificuldades e oposições. Os discípulos indignaram-se com os habitantes de certa aldeia da Samaria, que não acolheram a Jesus, e propunham uma punição imediata para eles: «Senhor, queres que digamos que desça fogo do céu e os consuma?» (v. 34). Parecia-lhes justo punir quem não quisesse receber a Jesus. Provavelmente tinham em mente um episódio da vida de Elias. De facto, muita gente dizia que Jesus era Elias que tinha regressado à Terra. Ora, quando o rei Ocozias enviou um grupo de soldados para prender Elias, o profeta invocou o fogo do céu que desceu e reduziu a cinzas esses soldados (cf. 2 Rs 1, 10s.). Os discípulos estavam provavelmente convencidos que a sua reacção era impulsionada pelo Espírito de Deus. Mas Jesus não pensa do mesmo modo e repreende-os. Ele sabe que, sobre os homens que não acolhem a fé, pende a ameaça do castigo. Mas sabe que há tempo para a conversão e tempo para o castigo. Agora é o tempo da conversão! O tempo do juízo será no fim dos tempos. Agora reina a bondade, a misericórdia, a paciência divina. Agora é o tempo da paciência divina (cf. 2 Pd 3, 9ss). E nós devemos participar nessa paciência e não exigir o castigo imediato. Sem a paciência divina, de que Jesus nos dá exemplo, não há verdadeira caridade. Temos que aprender a ser mansos e humildes de coração, como Jesus. Assim suscitaremos nos outros o desejo de se juntarem a nós, porque Deus está connosco.

    Oratio

    Bendito sejas, Pai, pela paciência que usas para connosco, tantas vezes impacientes e severos com os outros. Bendito sejas pela tua misericórdia para connosco, que não éramos Israel, mas que pela tua morte nos tornámos participantes das promessas feitas ao teu povo, Israel. Bendito sejas pela tua fidelidade, pela qual continuaste a confiar em nós e a acreditar no nosso discipulado, apesar das nossas infidelidades e quedas. Agora, agarro-me à orla do teu manto do teu Filho Jesus, certo de encontrar em n´Ele a cura para todas as minhas chagas, certo de que me conduz à tua casa, Pai misericordioso. Amen.

    Contemplatio

    Ecce homo! Eis o Homem-Deus que tanto vos amou! - Eis o Homem-Deus, o homem santo por excelência, que aceita estes sofrimentos e estas ignomínias para reparar a glória do seu Pai e para salvar as nossas almas. Ah! Aquele é infinitamente amável sob o seu aspecto de sofrimento e de humilhação. Está presente em todo o heroísmo da virtude, no acto do mais perfeito amor pelo Pai e por nós. Ecce homo! Sim, contemplo-o, o Homem-Deus, admiro-o, agradeço-lhe, amo-o com toda a ternura do meu coraç&
    atilde;o. Ah! Senhor, é, portanto, por nós, por mim, para me dar a minha realeza que humilhastes a vossa! Tomastes a coroa de espinhos e o ceptro de cana, para me dar a coroa e o ceptro de ouro. Aceitastes o farrapo ensanguentado, para me dar a púrpura real. Senhor, neste mistério como no calvário, sois infinitamente amável. O nosso amor será sempre insuficiente para responder ao do vosso coração. Ofereço-vos em reparação todas as homenagens reais que jamais recebestes no céu e na terra. Todos os fiéis proclamaram a vossa realeza. Cada dia, elevam a vossa eucaristia sobre tronos. As cúpulas das nossas igrejas são coroas reais que procuram ser dignas de vós. Os príncipes cristãos humilharam as suas coroas aos vossos pés. Com toda a Igreja, reconheço e proclamo que sois o Rei dos reis e Senhor dos senhores. (Leão Dehon, OSP 3, p. 344s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a Palavra:
    «Nós queremos ir convosco,
    porque soubemos que Deus está convosco» (Zc 8, 23)

  • S. Francisco de Assis

    S. Francisco de Assis


    4 de Outubro, 2023

    S. Francisco de Assis nasceu em 1181, ou 1182. Filho de um rico comerciante, Francisco sonhava tornar-se cavaleiro. Desviado desse ideal, procurou com persistência vontade de Deus. O encontro com os leprosos, e a oração diante do Crucifixo na igreja de S. Damião, levaram-no a abandonar a família e a iniciar uma vida evangélica penitencial. Bem depressa o Senhor lhe deu irmãos dispostos a viverem o evangelho sine glossa, em fraternidade. O papa Honório III aprovou a Regra e a vida dos frades menores, em 1222. No ano seguinte, Francisco recebeu os estigmas do Crucificado, selo da sua conformidade com o único Senhor e Mestre. Faleceu em 1226, sendo canonizado em 1228. Grande amigo da Natureza, S. Francisco é padroeiro dos ecologistas. É também um dos padroeiros da Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus, Dehonianos.

    Lectio

    Primeira leitura: Gálatas 6, 14-18

    Irmãos: Longe de mim gloriar-me, a não ser na cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo. 15Pois nem a circuncisão vale alguma coisa nem a incircuncisão, mas sim uma nova criação. 16Paz e misericórdia para todos quantos seguirem esta regra, bem como para o Israel de Deus. 17De agora em diante ninguém mais me venha perturbar; pois eu levo no meu corpo as marcas de Jesus. 18A graça de Nosso Senhor Jesus Cristo esteja com o vosso Espírito, irmãos!Ámen.

    Ao terminar a sua Carta aos Gálatas, Paulo declara ter agido retamente ao desmascarar a hipocrisia dos que defendiam a necessidade da circuncisão e da observância de lei hebraica para os cristãos (v. 12). Em seguida, afirma que não procura a glória do mundo, mas se sente honrado por estar em comunhão com Jesus Crucificado, cujo amor redentor afastara dele toda a ambição, orgulho e egoísmo. O seu único motivo de orgulho é a cruz do Senhor, que iniciou uma nova economia fundamentada, não na Lei, mas no Espírito. Acolhendo e pondo em prática o amor misericordioso de Deus, o cristão pode usufruir da plenitude dos bens messiânicos. Consciente de tal dom, Paulo não quer ouvir falar de outras doutrinas. A sua pertença exclusiva ao Senhor é manifestada pelos sofrimentos que, a seu exemplo, suporta para Lhe ser fiel (v. 17).

    Evangelho: Mateus 11, 25-30

    Naquele tempo, Jesus exclamou: «Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos entendidos e as revelaste aos pequeninos. 26Sim, ó Pai, porque isso foi do teu agrado. 27Tudo me foi entregue por meu Pai; e ninguém conhece o Filho senão o Pai, como ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar.» 28«Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, que Eu hei-de aliviar-vos.29Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito. 30Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve.

    A relação entre Jesus e o Pai é única, como declara o nosso texto. Jesus é o Filho do Pai, de Quem recebeu tudo, por Quem é conhecido, e a Quem conhece como mais ninguém. Jesus revela-nos esse conhecimento, que é dom recíproco de amor. Na sua oração de bênção, Jesus reconhece que só os pequenos, os que não presumem de si mesmos, estão em condições de conhecer o amor do Pai e viver em comunhão com Ele. Que se fecha na sua "sabedoria" autoexclui-se dessa vida e comunhão. Francisco de Assis foi um desses pequenos e humildes que encontraram respiro e vida nova nas palavras e gestos de Jesus.

    Meditatio

    Francisco de Assis foi um daqueles pequenos, que receberam de coração aberto e disponível a revelação de Jesus, como Filho muito amado do Pai. O Evangelho, sine glossa, tornou-se a única regra da sua vida, regra que também propôs àqueles que se lhe quiseram juntar como irmãos. Para Francisco, tudo se resumia à relação com Jesus, no amor. Os estigmas, que recebeu já perto do fim da sua vida, são sinal da intensíssima relação com Jesus, que o levou a identificar-se com Ele também fisicamente. Numa época em que os homens da Igreja procuravam riquezas e grandezas, Francisco quis permanecer pobre e pequeno diante de Deus e dos homens. Por causa disso, nem aceitou ser ordenado sacerdote, permanecendo simplesmente irmão entre os irmãos, como o mais pequeno de todos, por amor do Senhor.
    Para ele realizaram-se plenamente as palavras de Jesus: "o meu jugo é suave e o meu fardo é leve" (v. 30). Quanta alegria enchia o coração de Francisco, pobre de tudo e rico de tudo, que no amor do Senhor sentia como suaves os maiores sofrimentos. "Carregai as cargas uns dos outros e assim cumprireis plenamente a lei de Cristo." (Gl 6, 2). As cargas dos outros: é esse o jugo do Senhor. S. Francisco compreendeu-o desde o princípio da sua conversão. No fim da vida, contava: "Estando eu em pecado, parecia-me coisa excessivamente amarga ver os leprosos, mas o próprio Senhor me conduziu para meio deles e eu exercia misericórdia para com eles". Este é o jugo, que consiste em carregar as cargas dos outros, mesmo que isso nos parece muito duro. E continuava Francisco: "Carregando-as, o que me parecia amargo, converteu-se para mim em doçura na alma e no corpo". Pouco mais adiante, encontramos a segunda frase de Paulo: "Cada um terá de carregar o próprio fardo" (Gl 6, 5). Aqui, trata-se de não julgar os outros, de ter muita compreensão por todos, de não impor aos outros os nossos pontos de vista e os nossos modos de fazer, de vermos os nossos próprios defeitos e de não aproveitar os defeitos dos outros para lhes impor pesos que não estão de acordo com o pensamento do Senhor. "Ninguém se deve julgar o primeiro entre os irmãos", recomendou. "Quem jejua, não julgue os que comem". A caridade não critica os outros, não os julga, mas ajuda-os.
    Carreguemos, também nós, o jugo do Senhor, os fardos dos outros, e não os sobrecarreguemos com críticas e juízos sem misericórdia. Assim conheceremos melhor o Filho de Deus, que morreu por nós, e nele o Pai que está nos céus, com a mesma alegria de S. Francisco.

    Oratio

    Fazei, ó meu Deus, exclamava, que a doce violência do vosso amor me desapegue de todas as coisas sensíveis e me consuma inteiramente, a fim de que eu possa morrer por vosso amor infinito. Eu vo-lo peço por vós mesmo, ó Filho de Deus, que morrestes por amor de mim. Meu Deus e meu tudo! Quem sois vós, e quem sou eu, senão um verme de terra? Desejo amar-vos, Senhor adorável. Consagrei-vos a minha alma e o meu corpo com tudo o que sou. Levar-me-ei a fazer com ardor o que mais contribuir para vos glorificar. Sim, meu Deus, este é o único objeto dos meus desejos. (Oração de S. Francisco, citada por Leão Dehon, in OSP 4, p. 322)

    Contemplatio

    O Coração de Francisco foi, como o de Jesus, um porto de refúgio no qual todos os pobres corações humanos, agitados pela tempestade, podiam encontrar um asilo. O coração de Francisco foi um coração de apóstolo, um coração de fogo. Semelhante a um carro inflamado, percorria o mundo, ardendo por arrastar atrás de si todos os homens para os conduzir ao céu. O seu coração inflamado de amor gerou três ordens que deram e que dão tantos santos ao céu. Depois do capítulo geral da sua ordem em 1219, enviou religiosos para a Grécia, para África, para a França, para a Inglaterra, para aí estender o reino de Deus. Tinha reservado para si a missão da Síria e /323 do Egipto onde esperava encontrar o martírio! O coração de Francisco não estava simplesmente aberto às misérias morais, mas também às misérias físicas. Oh! Como amava os pobres e a pobreza! Como era terno para com os doentes e os aflitos! S. Francisco diz-nos a todos como S. Paulo: «Sede meus imitadores». A seu exemplo, entremos no Coração de Jesus pelo amor e pela imitação. (Leão Dehon, OSP 4, p. 322s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Carregai as cargas uns dos outros
    e assim cumprireis plenamente a lei de Cristo." (Gal 6, 2).

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    S. Francisco de Assis (04 Outubro)

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XXVI Semana - Quarta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XXVI Semana - Quarta-feira

    4 de Outubro, 2023

    Lectio

    Primeira leitura: Neemias

    No mês de Nisan, no vigésimo ano do rei Artaxerxes, como o vinho estivesse diante do rei, tomei-o e ofereci-lho. Ora, jamais eu estivera triste na sua presença. 2O rei disse-me: «Porque tens o semblante tão sombrio? Não estás doente. Portanto, isso só pode ser tristeza do coração.» Eu fiquei muito conturbado, 3e respondi ao rei: «Viva o rei para sempre! Como não hei-de estar triste quando a cidade onde se encontram os túmulos dos meus pais está em ruínas, e as suas portas consumidas pelo fogo?» 4E o rei disse-me: «Que queres?» Então, fiz uma oração ao Deus do céu 5e disse ao rei: «Se aprouver ao rei, e se o teu servo achar graça diante de ti, deixa-me ir ao país de Judá, à cidade onde se encontram os túmulos dos meus pais, a fim de a reconstruir.» 6O rei, junto de quem a rainha se sentara, perguntou-me: «Quanto tempo durará essa viagem? Quando será o regresso?» Aprouve ao rei deixar-me partir, e eu indiquei-lhe a data do regresso. 7Prossegui: «Se o rei achar bem, dêem-me cartas para os governadores da outra margem do rio, de modo que me deixem passar para Judá; 8e também outra carta para Asaf, o intendente da floresta real, a fim de que me forneça madeira para construir as portas da cidadela do templo, para as muralhas da cidade e para a casa que eu habitar.» O rei concordou com o meu pedido porque me favorecia a bondosa mão de Deus.

    Neemias, que detém um alto cargo na corte persa, e intervém junto do rei em favor do seu povo, lembra José no Egipto, Daniel em Babilónia, Marduqueu, Ester e o próprio Esdras na Pérsia.
    Esdras dedicou-se sobretudo à reconstrução do templo; Neemias, à reconstrução da cidade. De qualquer modo, são os artífices da reconstrução pós-exílica. Mas a cronologia e a relação entre os dois levanta diversos problemas. Actualmente a disposição dos livros é Esdras-Neemias. Mas historiadores modernos pensam que a reconstrução das muralhas da cidade e toda a actividade profana e material de Neemias deve ter precedido a reforma religiosa de Esdras. Provavelmente foi o Cronista, levita do templo, que inverteu a ordem dos livros e colocou Esdras primeiro, a fim de acentuar a preeminência do sacerdócio e da vida religiosa da comunidade.
    Se lermos os primeiros seis capítulos de Neemias, ficaremos com melhor compreensão da sua audácia, coragem e fortaleza.
    A memória de Neemias, narrada em primeira pessoa, acaba por conduzir à presença protectora e providente de Deus, cuja mão guia os protagonistas da reconstrução do povo (v. 8).

    Evangelho: Lucas 9, 57-62

    Naquele tempo, 57Enquanto iam a caminho, disse-lhe alguém: «Hei-de seguir-te para onde quer que fores.» 58Jesus respondeu-lhe: «As raposas têm tocas e as aves do céu têm ninhos, mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça.» 59E disse a outro: «Segue-me.» Mas ele respondeu: «Senhor, deixa-me ir primeiro sepultar o meu pai.» 60Jesus disse-lhe: «Deixa que os mortos sepultem os seus mortos. Quanto a ti, vai anunciar o Reino de Deus.» 61Disse-lhe ainda outro: «Eu vou seguir-te, Senhor, mas primeiro permite que me despeça da minha família.» 62Jesus respondeu-lhe: «Quem olha para trás, depois de deitar a mão ao arado, não é apto para o Reino de Deus.»

    Como vimos ontem, depois do ministério na Galileia, Jesus tomou a direcção de Jerusalém. Não se trata só de mudança de caminho em sentido topográfico, mas também em sentido teológico e místico. Este novo caminho culminará na morte ressurreição de Jesus. É uma perspectiva paradigmática também para os discípulos. A vida cristã passa necessariamente por um encontro com Cristo no Calvário. Não basta contemplar a glória de Cristo; é preciso fixar o nosso olhar também na cruz, onde Cristo atingiu perfeição e chegou à glória (cf. Heb 5, 8s.)
    Os diálogos referidos no evangelho dizem-nos que, além dos Doze, havia outros que queriam seguir Jesus, ainda que não soubessem claramente o que isso significava. As exigências do seguimento de Cristo só se tornaram claras depois da Páscoa. Lucas não nos diz quem são os três interlocutores. Mateus diz-nos que um era um escriba e outro, um discípulo (8, 19.21). Em Lucas, os três retraem-se atemorizados pela "nudez" exigida por Jesus a quem O quer seguir. O primeiro apresentou-se por sua iniciativa. Jesus mostra-lhe o esvaziamento que segui-l´O significa: «o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça» (v. 58). O segundo já é discípulo, como nos informa Mateus. Jesus ordena-lhe que O siga. Mas ele pede licença para ir enterrar o pai. Jesus responde-lhe: «Deixa que os mortos sepultem os seus mortos» (v. 60). Para o Senhor, está morto tudo o que não seja o Deus vivo (cf. Jo 14, 6). O terceiro fez um programa que apresenta a Jesus: «Eu vou seguir‑te, Senhor, mas primeiro permite que me despeça da minha família» (v. 61). Mas Jesus diz-lhe: «Quem olha para trás, de­pois de deitar a mão ao arado, não é apto para o Reino de Deus» (v. 62).
    Não sabemos como acabaram estes episódios. O evangelho apenas refere o que Jesus oferece a quem o segue: o caminho da cruz. É preciso coragem!

    Meditatio

    A primeira leitura pode levar-nos, mais uma vez, à meditação sobre o dever de cada crente em colaborar na edificação do Povo de Deus e no fortalecimento da sua caminhada na fé. Como discípulos do Senhor, não podemos deixar de sentir uma verdadeira paixão pela sua comunidade, a Igreja.
    Mas a primeira leitura e o evangelho também nos podem levar a outra reflexão, sempre importante. As exigências de Jesus, no evangelho, são radicais: «"Segue-me"» ... Deixa que os mortos sepultem os seus mortos...Quem olha para trás, depois de deitar a mão ao arado, não é apto para o Reino de Deus». Na primeira leitura, a piedade filial é expressa de modo comovente: Neemias está triste porque a cidade onde estão os túmulos dos seus pais está em ruínas e quer reconstruí-la para que guarde dignamente esses túmulos. A presença de Jesus no meio de nós realiza grandes transformações na nossa vida. Agora, como lemos na Segunda Carta aos Coríntios, estamos no tempo em que «os que vivem, não devem viver mais para si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou. De agora em diante, não conhecemos ninguém à maneira humana... Se alguém está em Cristo, é uma nova criação. O que era antigo passou; eis que surgiram coisas novas» (2 Cor 5, 15ss.). O desapego que Jesus pede a quem O segue tem em vista esta vida nova, a nova criação que Ele realizou na sua morte e ressurreição. Agora vivemos em Deus, em Cristo Jesus. «Na nossa maneira de ser e de agir, - diz o n. 38 das nossas Consti
    tuições - pela participação na construção da cidade terrena e na edificação do Corpo de Cristo, devemos testemunhar eficazmente que é o Reino de Deus e a sua justiça que se devem procurar antes de tudo e acima de tudo (cf. Mt 6,33)». Por isso, o nosso estilo de vida deve ser desapegado de tudo e de todos, sóbrio e simples, denso de fé, e compreendido na caridade. De outro modo, nem ele nem a nossa pregação serão credíveis nem representarão a «Igreja dos pobres».
    Peçamos a graça de vivermos como ressuscitados na comunidade dos homens novos, que é a Igreja, contribuindo com a nossa vida desapegada e sóbria, e com nossa dedicação generosa, para a edificação da mesma.

    Oratio

    Senhor Jesus, que me chamaste à comunidade dos homens novos, nascidos do teu Lado aberto na cruz, infunde em mim o teu Espírito, que me torne membro vivo da tua Igreja. Que eu saiba seguir-te no caminho do desapego e da doação total, servindo o Reino, e servindo cada um dos irmãos e irmãs. Que eu saiba sempre reconhecer-te como Senhor da minha vida, e não me distraia de Ti com outras preocupações ou trabalhos. Que em todas as circunstâncias eu saiba contemplar-te ressuscitado e glorioso, ou mergulhado nos sofrimentos da tua paixão e morte. Amen.

    Contemplatio

    Preparai o caminho do Senhor. Há nas vossas almas perturbações e irregularidades, nada de igual, de limpo e de correcto, como era necessário que estivesse para um caminho real. Abaixai as elevações, que marcam o orgulho e a vaidade; aplanai estas partes baixas, que marcam a lassidão, a sensualidade, a avareza, a tibieza; endireitai estes caminhos tortuosos, que são as vias da hipocrisia e da inconstância; igualai os caminhos irregulares, que marcam os defeitos de carácter, a impaciência, a dureza, o mau humor. Preparai para o Salvador um caminho digno dele, onde ele avançará com prazer distribuindo as suas bênçãos. Assim falava S. João Baptista. E os seus ouvintes questionavam-no. Que havemos de fazer? Diziam de todas as partes na multidão. Ele respondia: Produzi dignos frutos de penitência, confessai os vossos pecados e mudai de vida. Que é preciso fazer, perguntavam alguns publicanos ou cobradores de impostos. Dizia-lhes: Não exijais nada para além do que vos foi prescrito. Que havemos de fazer? - perguntavam os soldados. Disse-lhes: Abstende-vos da violência e de toda a delação e contentai-vos com o vosso soldo. Acontecia, de facto, muito frequentemente que soldados denunciavam inocentes, como culpados de rebelião e de outros crimes, a fim de se apoderarem dos seus bens ou de receberem um salário vergonhoso. Em resumo, S. João recomenda a todos o cumprimento do dever de estado. É também cumprindo todos os deveres do meu estado e da minha vocação especial de amigo do Sagrado Coração que hei-de preparar os caminhos para o bom Mestre. Sei o que ele espera de mim, mas não o dou sempre. Pede de mim um coração puro e amoroso, uma grande fidelidade à minha regra de vida, com o hábito do recolhimento, da oração e da vida interior. Nestas condições, virá de boamente à minha alma e aí derramará as graças do seu divino Coração. (Leão Dehon, OSP 3, p. 210s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a Palavra:
    «Se alguém está em Cristo, é uma nova criação» (2 Cor 5, 17)

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XXVI Semana - Quinta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XXVI Semana - Quinta-feira

    5 de Outubro, 2023

    Lectio

    Primeira leitura: Neemias 8, 1-4a.5-6.7b-12

    Naqueles dias: 1os filhos de Israel já estavam instalados nas suas cidades. Então todo o povo se reuniu, como um só homem, na praça que fica diante da porta das Águas e pediu a Esdras, o escriba, que trouxesse o livro da Lei de Moisés, que o Senhor prescrevera a Israel. 2O sacerdote Esdras apresentou, pois, a Lei diante da assembleia de homens e mulheres e de todos quantos eram capazes de a compreender. Foi no primeiro dia do sétimo mês. 3Esdras leu o livro, desde a manhã até à tarde, na praça que fica diante da porta das Águas, e todo o povo escutava com atenção a leitura do livro da Lei. 4O escriba Esdras subiu para um estrado de madeira, mandado levantar para a ocasião. 5Esdras abriu o livro à vista de todo o povo, pois achava-se num lugar elevado acima da multidão. Quando o escriba abriu o livro, todo o povo se levantou. 6Então, Esdras bendisse o Senhor, o grande Deus, e todo o povo respondeu, levantando as mãos: «Ámen! Ámen!» Depois, inclinaram-se e prostraram-se diante do Senhor, com a face por terra 7e os outros levitas explicavam a Lei ao povo, e cada um ficou no seu lugar. 8E liam, clara e distintamente, o livro da Lei de Deus e explicavam o seu sentido, de modo que se pudesse compreender a leitura. 9O governador Neemias, Esdras, sacerdote e escriba, e os levitas que instruíam o povo disseram a toda a multidão: «Este é um dia consagrado ao Senhor, vosso Deus; não vos entristeçais nem choreis.» Pois todo o povo chorava ao ouvir as palavras da Lei. 10Então, Neemias disse-lhes:«Ide para as vossas casas, fazei um bom jantar, bebei vinho doce e reparti com aqueles que nada têm preparado; este é um dia grande, consagrado a Deus; não vos entristeçais, porque a alegria do Senhor é que é a vossa força.» 11Os levitas exortaram o povo ao silêncio: «Calai-vos! - diziam eles. Este é um dia santo; não vos lamenteis.» 12E todo o povo se retirou para comer e beber, repartir porções pelos pobres e entregar-se a grandes alegrias, porque tinham entendido o sentido das palavras que lhes tinham sido explicadas.

    O capítulo 8 de Neemias é a continuação de Esd 8, 36. Isto quer dizer que Ne 8-10 pertence às memórias de Esdras, verdadeiro protagonista destes capítulos. O texto que escutamos apresenta-nos o povo reunido pela Palavra, que inspira o serviço e o governo da comunidade. Regressado de Babilónia, o povo não reconstrói a sua vida religiosa apenas à volta do Templo e dos sacrifícios, mas começa a elaborar uma nova instituição: uma comunidade que se reúne para ler e rezar a Palavra, isto é, a Sinagoga. A religião de Israel torna-se a religião do Livro! Concluída a reforma civil e religiosa, Neemias e Esdras convocam todo o povo para que escute a leitura da Lei de Moisés. Esta assembleia em Jerusalém, durante a festa dos Tabernáculos, assinala o nascimento do judaísmo. Depois do exílio, o povo de Deus não recuperou a independência política, mas viveu sob o domínio sucessivo dos persas, gregos e romanos. Por isso, nunca mais formou uma entidade política, mas religiosa. Era uma espécie de "Igreja". Tinha o seu estatuto religioso próprio, que era a Lei, tinha a hierarquia sacerdotal e tinha como centro de coesão a cidade santa e o templo. Parte do povo judeu não vivia na Palestina, pois se tinha dispersado em diversas comunidades na diáspora. Este tipo de organização religiosa, que se estabelece na comunidade pós-exílica, foi o que veio a denominar-se "judaísmo". Tem um pai, Esdras; tem uma data de nascimento, 398 a. C.; tem um estatuto, a Lei de Moisés. A assembleia de que nos fala o nosso texto pode ser qualificada como uma renovação da aliança. De facto, Esdras faz alusão a um compromisso e a um documento selado e assinado pelos representantes da comunidade (Ne 10).

    Evangelho: Lucas 10, 1-12

    Naquele tempo, o Senhor designou outros setenta e dois discípulos e enviou-os dois a dois, à sua frente, a todas as cidades e lugares aonde Ele havia de ir. 2Disse-lhes:«A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos. Rogai, portanto, ao dono da messe que mande trabalhadores para a sua messe. 3Ide! Envio-vos como cordeiros para o meio de lobos. 4Não leveis bolsa, nem alforge, nem sandálias; e não vos detenhais a saudar ninguém pelo caminho. 5Em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: 'A paz esteja nesta casa!' 6E, se lá houver um homem de paz, sobre ele repousará a vossa paz; se não, voltará para vós. 7Ficai nessa casa, comendo e bebendo do que lá houver, pois o trabalhador merece o seu salário. Não andeis de casa em casa. 8Em qualquer cidade em que entrardes e vos receberem, comei do que vos for servido, 9curai os doentes que nela houver e dizei-lhes: 'O Reino de Deus já está próximo de vós.' 10Mas, em qualquer cidade em que entrardes e não vos receberem, saí à praça pública e dizei: 11'Até o pó da vossa cidade, que se pegou aos nossos pés, sacudimos, para vo-lo deixar. No entanto, ficai sabendo que o Reino de Deus já chegou.'» 12«Digo-vos: Naquele dia haverá menos rigor para Sodoma do que para aquela cidade.

    O sim cordial dos discípulos a Cristo torna-se a força da missão evangélica. Jesus manda os discípulos a fazer o que Ele mesmo fez. É o que a Igreja continua, ainda hoje, a fazer. Os Doze são o fundamento da missão da Igreja. Mas Jesus escolheu ao longo dos séculos, e continua a escolher hoje, muitos outros. A messe é grande e os operários são poucos. Os 72 de que nos fala o evangelho anunciam a mensagem do Reino. O número "Doze" evoca as doze tribos de Israel. O número "Setenta e dois" evoca os 72 povos da terra elencados em Gn 10. A missão dos discípulos é universal, destinada a toda a terra. Os Setenta e dois são sinal de todos quantos o Senhor da messe chama para o anúncio do Evangelho. Trata-se de uma empresa divina, do Reino, que só é possível realizar com a força de Deus, e não com as simples forças humanas.
    O verdadeiro operário do Reino, não é aquele que o anuncia, mas o próprio Jesus Cristo. É Ele que envia, que toma a palavra, que actua. Mais do que fazer, é preciso deixar Jesus fazer. O mais importante é ser como Ele, adoptar o seu estilo, com as suas vicissitudes e os seus frutos - e por isso com alegria. "Envio-vos como cordeiros para o meio de lobos» (v. 3). Não há que lamentar-se sobre as dificuldades da missão. Elas são o sinal do Reino. São obra do Espírito Santo. Jesus pede aos discípulos que não se preocupem: «Não vos preocupeis com o que haveis de dizer... Não sois vós a falar, mas é o Espírito do Pai que falará por vós» (10, 19 s). O Mestre não nos quer ver ansiosos. A missão é sempre um milagre do Senhor.

    Meditatio

    A primeira leitura apresenta-nos a comunidade reunida, que escuta a Palavra de Deus e reage. Os que t
    inham regressado do exílio não tinham um conhecimento adequado da Palavra do Senhor, até porque tinham esquecido o hebraico e tinham começado a falar aramaico. Era preciso ler a Lei, escrita em hebraico, e traduzi-la para aramaico, para que fosse compreendida pelo povo.: «Os outros levitas explicavam a Lei ao povo, e cada um ficou no seu lugar. E liam, clara e distintamente, o livro da Lei de Deus e explicavam o seu sentido, de modo que se pudesse compreender a leitura» (v. 7s.). A escuta e a compreensão da Palavra de Deus enchem de alegria o povo: «Todo o povo se retirou para comer e beber, repartir porções pelos pobres e entregar-se a grandes alegrias, porque tinham entendido o sentido das palavras que lhes tinham sido explicadas» (v. 12).
    Aqueles que estudam a Bíblia têm o dever de tornar possível esta festa, esta alegria. A sua missão é diferente da dos pregadores, que falam directamente ao povo. Os estudiosos preparam a pregação, explicando bem a Palavra de Deus, para que a pregação possa ser mais fiel à Palavra e mais frutuosa. Assim contribuem para a instrução do povo, para a sua alegria. «A alegria do Senhor é que é a vossa força», diz Neemias (v. 10). A força e a alegria vêm da Palavra de Deus, que é alimento e luz, que é a maior consolação que temos na terra.
    A escuta da Palavra de Deus provoca, em primeiro lugar, a conversão, que se torna caridade, atenção aos mais carenciados, impulso de partilha e de fraternidade: «Reparti com aqueles que nada têm preparado» (v. 10). O encontro salvífico com Deus, e a caridade para com o próximo, provocados pela escuta livre e acolhedora da Palavra, produzem em nós a verdadeira alegria, que jamais acabará: «Fiéis à escuta da Palavra... somos chamados a descobrir, cada vez mais, a Pessoa de Cristo e o mistério do seu Coração e a anunciar o seu amor que excede todo o conhecimento» (Cst 17).

    Oratio

    Senhor, a tua Palavra é realmente eficaz. Mas não é mágica. Exige acolhimento livre, consciente e activo, e paciência para esperar. Que eu seja terreno bom, onde a Palavra lance raiz, germine e dê fruto, tanto na minha vida pessoal, como na minha vida familiar, profissional, apostólica. Que a tua Palavra seja em mim impulso de caridade, de entrega, de missão, de anúncio do teu amor que excede todo o conhecimento, porque «a messe é grande, mas os trabalhadores são poucos». Amen.

    Contemplatio

    Fala-se pouco em Nazaré. O Evangelho não quis dar uma única palavra de S. José. Dá algumas de Maria, mas bem poucas. Assinala antes, por duas vezes, a sua vida de silêncio e de recolhimento: «Ela conservava e meditava no seu coração os mistérios de que tinha sido testemunha». Esta meditação habitual implica uma vida de calma, de silêncio e de união com Deus. Ouvia-se somente em Nazaré, na santa casa, algumas conversas curtas, afectuosas, discretas, em intervalos regrados, não invadindo nunca as horas sérias, sem lamentos nem murmurações, sem este fluxo de palavras, estes vãos propósitos que caracterizam os espíritos agitados, dissipados e curiosos. Cada um fazia abnegação de si para servir a Deus, seja directamente na oração, seja indirectamente ajudando o próximo. Nada senão as palavras necessárias para se entenderem no trabalho ou na vida de família, e algumas palavras de piedade para se ajudarem a amarem e a servirem a Deus. Oh! Como isto difere da minha maneira de agir! Como estou longe desta calma, desta discrição, desta reserva! Que farei hoje para disto me aproximar? (Leão Dehon, OSP 3, p. 67.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a Palavra:
    «A alegria do Senhor é a vossa força» (Ne 8, 10)

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XXVI Semana - Sexta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XXVI Semana - Sexta-feira

    6 de Outubro, 2023

    Lectio

    Primeira leitura: Baruc 1, 15-22

    Para o Senhor nosso Deus, a justiça; para nós, porém, a vergonha, estampada no rosto, como acontece hoje para os homens de Judá e os habitantes de Jerusalém, 16para os nossos reis e príncipes, os sacerdotes, os profetas e os nossos antepassados, 17porque pecámos contra o Senhor. 18Desobedecemos ao Senhor nosso Deus, não ouvimos a sua voz nem seguimos os mandamentos que Ele nos deu. 19Desde o dia em que o Senhor tirou os nossos pais da terra do Egipto até hoje, temos desobedecido ao Senhor, nosso Deus e, na nossa leviandade, recusámos ouvir a sua voz. 20Por isso, agora, persegue-nos o infortúnio e a maldição que o Senhor predissera pela boca de Moisés, seu servo, quando tirou os nossos pais da terra do Egipto, a fim de nos dar uma terra onde mana leite e mel. 21Nós, porém, não escutámos a voz do Senhor, nosso Deus, conforme a palavra dos profetas, que Ele nos enviou. 22Cada um de nós, andou segundo as inclinações do seu mau coração, servindo deuses estrangeiros e praticando o mal aos olhos do Senhor, nosso Deus".

    Depois da escuta da Palavra, na grande celebração presidida por Esdras e Neemias, Baruc apresenta-nos uma longa oração penitencial de que escutamos, hoje, os primeiros versículos. É a oração do povo regressado do exílio, mas submetido a poderes estrangeiros, na Palestina ou noutras zonas mais ou menos distantes. É a oração do povo de Deus em diáspora, que não quer perder a sua identidade.
    Este povo sente-se solidário na história passada feita de promessas divinas e de pecados do povo. A história é solidária no bem e no mal. O povo não correspondeu à generosidade de Deus. Revoltou-se e desobedeceu. Por isso, confessa as suas culpas, e reconhece a inocência e a justiça de Deus. Mas é a justiça de Deus que dá ao povo capacidade para recomeçar, ter nova esperança, e esperar o perdão.

    Evangelho: Lucas 10, 13-16

    Naquele tempo, Jesus disse: 13Ai de ti, Corozaim! Ai de ti, Betsaida! Porque, se em Tiro e em Sídon se tivessem operado os milagres que entre vós se realizaram, de há muito que teriam feito penitência, vestidas de saco e na cinza. 14Por isso, no dia do juízo, haverá mais tolerância para Tiro e Sídon do que para vós. 15E tu, Cafarnaúm, porventura serás exaltada até ao céu? É até ao inferno que serás precipitada. 16Quem vos ouve é a mim que ouve, e quem vos rejeita é a mim que rejeita; mas, quem me rejeita, rejeita aquele que me enviou.»

    O evangelho de hoje conclui a mensagem com que foram enviados os setenta e dois discípulos. Porque fala Jesus tão duramente das cidades de Corazim, Betsaida e Cafarnaúm? Que nos quer dizer Jesus?
    A condenação das três cidades deve se entendida a vários níveis. Em primeiro lugar, Jesus sublinha que estas cidades não acolheram a Palavra pregada por Ele, isto é, a graça do Evangelho, o apelo à conversão. Em segundo lugar, Jesus realça o abandono dos seus. Talvez se dê conta da hostilidade do povo. As cidades pagãs de Tiro e Sídon terão um juízo menos severo que o povo de Israel. Em terceiro lugar, Jesus prevê que o Evangelho ultrapasse as fronteiras da Galileia, que chegue aos gentios, enquanto as cidades que, por primeiras, ouviram a sua pregação permaneçam fechadas num judaísmo anticristão.
    Este evangelho é um aviso para todos aqueles que se excluem da graça do Senhor e caem na hipocrisia e na resistência sublinhadas pelos "Ai" de Jesus. Jesus lastima o maior dos pecados, o pecado contra o Espírito Santo: fechar os olhos às manifestações da graça, à oferta de perdão. É o grande risco da missão cristã. Jesus disse claramente: «Quem vos ouve é a mim que ouve, e quem vos rejeita é a mim que rejeita; mas, quem me rejeita, rejeita aquele que me enviou» (v. 16).

    Meditatio

    As duas leituras convidam-nos ao arrependimento e à penitência. O cristão, que quiser ser fiel a Jesus, deve sofrer com os seus pecados e com os que se cometem à sua volta, fazendo sua a oração de Baruc: «Para o Senhor nosso Deus, a justiça; para nós, porém, a vergonha, estampada no rosto» (v. 15). Trata-se de uma oração inspirada na catástrofe nacional, que aniquilou o povo judeu e o levou para o exílio. Perante esses factos, os Judeus voltaram-se para a sua vida e para a sua história, reconhecendo a sua infidelidade e o seu pecado: «Pecámos contra o Senhor. Desobedecemos ao Senhor nosso Deus, não ouvimos a sua voz nem seguimos os mandamentos que Ele nos deu» (v. 17s.).
    O novo povo de Deus, que é a Igreja, também precisa de olhar para a sua vida e para a sua história, reconhecer os seus pecados e manter uma atitude de contínua penitência e conversão. O duro aviso de Jesus às cidades ribeirinhas do lago de Genesaré também se dirige a nós, que lemos a Palavra de Deus e, particularmente, o Evangelho. Todos corremos o risco de deixar endurecer o coração e de nos fecharmos à escuta da Palavra, à penitência e à mudança de vida que ela cada dia nos sugere. Tanto Baruc como Jesus nos convidam a reconhecer e a confessar os nossos pecados, afirmando, ao mesmo tempo, a fidelidade e a misericórdia de Deus. Mas podemos e devemos pensar também nos pecados do mundo, no ódio que aqui e ali explode ferozmente, fazendo vítimas inocentes, na corrupção que torna possíveis tantos abusos, nos pobres que continuam a ser oprimidos, nos ricos que não querem partilhar os seus bens nem ceder nos seus privilégios, na imoralidade de toda a espécie que, como maré negra, nos cerca destruindo a vida. Há que tomar sobre nós tudo isto, com a solidariedade de quem partilha e quer, com Jesus, tirar o pecado do mundo: «Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo!» (Jo 1, 29).
    Escutemos as nossas Constituições, que são fruto da nossa leitura do Evangelho, à luz do nosso carisma: «Implicados no pecado, mas participantes na graça redentora, pela realização de todas as nossas tarefas, queremos unir-nos a Cristo presente na vida do mundo e, em solidariedade com Ele e com toda a humanidade e a criação inteira, oferecer-nos ao Pai como oblação viva, santa e agradável (cf. Rm 12,1). «Caminhai no amor segundo o exemplo de Cristo que nos amou e Se entregou por nós a Deus, como oferenda e sacrifício de agradável odor» (Ef 5,2) (Cst 22). A nossa reparação é cooperação na obra redentora de Deus no coração do mundo (cf. Cst 23), que consiste em libertar os homens do pecado e das suas consequências, e em transformá-lo em oblação santa e agradável a Deus.

    Oratio

    Pai santo, nós Te louvamos, bendizemos e damos graças, porque nos reconciliaste em Cristo e nos regeneraste pelo Espírito Santo, fazendo de nós homens novos, animados por um Espírito novo. Dá-nos a graça de cooperar alegre e generosamente na obra d
    a redenção, que realizas no coração do mundo, para que toda a humanidade e a criação inteira, libertas do pecado e das suas consequências, se tornem oblação viva, santa e agradável para Ti. Amen.

    Contemplatio

    Ecce homo! Eis o homem castigado por Deus em nosso lugar. - Eis o homem que, carregado com o pesado fardo dos nossos pecados dos quais se constituiu vítima expiatória, representa neste momento a humanidade em toda a sua miséria. Eis o homem-vítima que nos descreve Isaías. Já não tem beleza. Todo o seu corpo não é senão uma chaga. Dir-se-ia um leproso. Quando o vemos, desviamos dele o olhar. É um homem atingido pela justiça de Deus. Que é então o pecado para que tenha tais efeitos? Deus é, portanto, por ele muito ofendido, muito irritado, para que o possa punir até este ponto, mesmo naquele que não o cometeu, mas que dele aceitou a responsabilidade. E se o lenho verde, o justo por excelência, é assim tratado por causa dos pecados de outros, que será então do lenho seco, dos verdadeiros culpados, quando vier a hora do seu juízo? Este mistério do Ecce homo não é o mais adequado para nos excitar ao arrependimento, à conversão, ao ódio ao pecado? Eis o homem! Eis o vosso rei! Repete Pilatos. Eis onde caiu a vossa realeza, diz-nos o nosso Deus. Todo o homem era rei, pela graça de Deus. Todo o homem era chamado a reinar sobre si mesmo e sobre a natureza. Mas vede o homem do pretório, aquele que tomou sobre si todos os vossos pecados, que é feito da sua realeza? O seu ceptro é uma cana; o seu manto real, um farrapo tingido pelo sangue; a sua coroa, um ramo de espinhos entrançado. Eis o retrato do homem culpado, é um rei decaído, desonrado, injuriado, ridicularizado. Eu podia ser rei e posso ainda sê-lo: «Fizestes-nos reis e sacerdotes», dizem os eleitos falando a Deus, no Apocalipse (5,10), Mas é preciso para isso deixar de ofender a Deus, é preciso servi-lo real e sacerdotalmente, com força, com piedade, com o espírito de sacrifício e de devoção. (Leão Dehon, OSP 3, p. 343s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a Palavra:
    «Para o Senhor nosso Deus, a justiça; para nós, a vergonha» (Br 1, 15)

  • Nossa Senhora do Rosário

    Nossa Senhora do Rosário


    7 de Outubro, 2023

    O Rosário, que apareceu entre os séculos XV e XVI, foi divulgado pelos Dominicanos, tornando-se uma das mais populares devoções marianas. Nossa Senhora recomendou-o insistentemente em Fátima.

    A memória de Nossa Senhora do Rosário, inicialmente celebrada por algumas famílias religiosas, entrou na liturgia de toda a Igreja por disposição do Papa S. Pio V, dominicano, em 1572. Com essa festa, então abertamente chamada "comemoração da Bem-aventurada Virgem Maria da Vitória", o Papa queria agradecer a Nossa Senhora a sua intervenção na vitória da frota cristã contra a dos turcos, em Lepanto, a 7 de Outubro de 1571. Atualmente celebra-se simplesmente a memória de Nossa Senhora do Rosário.

    Lectio

    Primeira leitura: Atos, 1, 12-14

    Os Apóstolos desceram, do monte chamado das Oliveiras, situado perto de Jerusalém, à distância de uma caminhada de sábado, e foram para Jerusalém. 13Quando chegaram à cidade, subiram para a sala de cima, no lugar onde se encontravam habitualmente.Estavam lá: Pedro, João, Tiago, André, Filipe, Tomé, Bartolomeu, Mateus, Tiago, filho de Alfeu, Simão, o Zelota, e Judas, filho de Tiago.14E todos unidos pelo mesmo sentimento, entregavam-se assiduamente à oração, com algumas mulheres, entre as quais Maria, mãe de Jesus, e com os irmãos de Jesus.

    Depois de ter convivido durante quarenta dias com os discípulos, Jesus elevou-se ao céu. Então os Onze, que tinham andado dispersos, com outros discípulos e familiares de Jesus, entre os quais a sua mãe, reuniram-se provavelmente em casa de um deles, enquanto esperavam o Pentecostes, em que haviam de receber o Espírito Santo prometido. Neste texto, Lucas antecipa algumas notas sobre o modo de vida da primitiva comunidade eclesial de Jerusalém, que irá desenvolver depois. Uma característica evidente é a oração partilhada pelos irmãos e irmãs de modo assíduo e concorde. Depois do Pentecostes, em que Maria também participará (At 2, 1), a comunidade eclesial irá desenvolver a sua identidade e a diaconia. A oração, que precede o Pentecostes, é como que uma preparação; a assiduidade à oração e a concórdia entre os irmãos são garantia de crescimento e de futuro para a comunidade.

    Evangelho: Lucas 1, 26-38

    Naquele tempo, o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia chamada Nazaré,27a uma virgem desposada com um homem chamado José, da casa de David; e o nome da virgem era Maria. 28Ao entrar em casa dela, o anjo disse-lhe: «Salve, ó cheia de graça, o Senhor está contigo.» 29Ao ouvir estas palavras, ela perturbou-se e inquiria de si própria o que significava tal saudação. 30Disse-lhe o anjo: «Maria, não temas, pois achaste graça diante de Deus. 31Hás-de conceber no teu seio e dar à luz um filho, ao qual porás o nome de Jesus.32Será grande e vai chamar-se Filho do Altíssimo. O Senhor Deus vai dar-lhe o trono de seu pai David, 33reinará eternamente sobre a casa de Jacob e o seu reinado não terá fim.» 34Maria disse ao anjo: «Como será isso, se eu não conheço homem?» 35O anjo respondeu-lhe: «O Espírito Santo virá sobre ti e a força do Altíssimo estenderá sobre ti a sua sombra. Por isso, aquele que vai nascer é Santo e será chamado Filho de Deus. 36Também a tua parente Isabel concebeu um filho na sua velhice e já está no sexto mês, ela, a quem chamavam estéril,37porque nada é impossível a Deus.» 38Maria disse, então: «Eis a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra.» E o anjo retirou-se de junto dela.

    A devoção do Rosário encontrou na anunciação a Maria o primeiro quadro para contemplação. O colóquio entre Deus e a jovem Maria, mediado pelo anjo Gabriel, - "força de Deus" -, decorre num clima de serena e alegre disponibilidade obediente da humilde «serva do Senhor». A disponibilidade de Maria decorre da reflexão ou meditação sobre a palavra proferida pelo enviado de Deus. Maria tenta uma exegese da mensagem, verdadeiramente surpreendente, pois se trata de um grandioso projeto de Deus, que a envolve. A contemplação de Maria sobre o primeiro mistério do seu envolvimento evangélico e messiânico é iluminada pela disponibilidade do Senhor, pronto a dar explicações. Maria acolhe-as e medita-as no seu coração. Deus não impõe uma tarefa absurda, mas "esforça-se" por convencer aquele que chama a participar nela.

    Meditatio

    S. Lucas oferece à meditação do devoto de Maria, na memória de Nossa Senhora do Rosário, uma sequência histórica de acontecimentos que têm o seu princípio na perícopa do evangelho que escutamos hoje e passa imediatamente para a dos Atos dos Apóstolos que também escutámos na primeira leitura. São duas paragens na peregrinação devocional do Rosário: uma com que começam os "mistérios gozosos" e outra que encontramos do terceiro dos mistérios gloriosos. Essa disposição dos quadros a contemplar dá-nos uma metodologia para a nossa meditação que nos ensina e ajuda a passar do individual ao comunitário, da contemplação à ação.
    De fato, a Anunciação é, para a Virgem Maria, uma experiência muito pessoal de Deus, uma paragem na contemplação da palavra de Deus, junto ao próprio Deus. É um evento gozado na solidão. Essa solidão ou experiência individual não significa isolamento: de fato, Aquela que recebeu o anúncio, partilha a vida da comunidade, a espera da manifestação poderosa e gloriosa do Espírito Santo. Põe em comum a sua experiência de Deus.
    A Anunciação constitui para Maria uma subida aos cumes da contemplação dos mistérios de Deus, uma aproximação, guiada pela luz da palavra divina, ao projeto que Deus quer realizar com a sua disponibilidade. Essa contemplação sustenta a obediência consciente. A Virgem da Anunciação não permanece imóvel no seu genuflexório, com o livro entre as mãos, como a imaginaram muitos pintores. Atua em si mesma de acordo com a Palavra recebida, meditada, contemplada e rezada; atua na comunidade, nascida do amor de Jesus e da fé em Cristo ressuscitado; e tudo com assiduidade e em concórdia com os outros discípulos.
    A atitude de Maria marca a primitiva comunidade e orienta-a para o uso dos meios que façam dela, o mais possível, comunidade do Senhor: a assiduidade ao "ensino dos Apóstolos", a "união fraterna", a "fração do pão", a oração e a partilha dos bens (cf. At 2, 42.44).
    Os primeiros monges pretendiam viver este mesmo espírito que animou, primeiro a Maria e, depois, a comunidade de Jerusalém. Daí a importância que davam à escuta da Palavra, à oração, à Eucaristia, à partilha de bens, à união fraterna. O mesmo espírito deve animar as nossas atuais comunidades. Daí a necessidade de usar os mesmos meios.

    Oratio

    Ó Maria, Mãe de Deus, Rainha e Mãe dos homens, eu vos ofereço as homenagens da minha veneração e do meu amor filial. Quero viver como vosso filho dedicado, consolando-vos e obedecendo-vos em tudo. Pela vossa poderosa intercessão, fazei que todos os meus pensamentos e ações sejam conformes à vossa vontade e à do vosso divino Filho. (Leão Dehon, OSP 4, p. 338).

    Contemplatio

    As orações dos santos são poderosas junto de Deus; e todavia não são mais do que as orações de servos. Mas as de Maria são orações de Mãe. Santo Antonino dizia: «a oração de Maria tem sobre o coração de Jesus a força de uma ordem». Também considera impossível que a divina Mãe peça ao Filho uma graça e que o Filho lhe recuse. «É impossível - dizia - que a Mãe não seja ouvida». É por isso que S. Bernardo nos exorta a pedir, por intercessão de Maria, todas as graças que desejamos alcançar de Deus. «Procuremos a graça - escreve - mas procuremo-la por Maria, porque ela é mãe; ela é sempre ouvida, e não pode obter uma recusa». Deste modo, vemos a imensa família dos cristãos recorrer a Maria como mãe amada e dedicada. Quem poderá contar os santuários, os altares, as imagens, as bandeiras, os escapulários, as imagens de Maria? A todo o momento, de todos os lugares da terra, se eleva um apelo filial: «Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós pecadores». E eu mesmo grito: «Augusta Mãe de Deus, rogai a Jesus por mim. Vede as misérias da minha alma, e tende piedade de mim. Sim, rogai e não cesseis jamais de rogar por mim, enquanto não me virdes no céu, seguro da minha salvação eterna. Ó Maria, sois a minha esperança, não me abandoneis». (Leão Dehon, OSP 4, p. 337).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós pecadores».
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    Nossa Senhora do Rosário (07 Outubro)

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XXVI Semana - Sábado

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XXVI Semana - Sábado

    7 de Outubro, 2023

    Lectio

    Primeira leitura: Baruc 4, 5-12.27-29

    5Coragem, povo meu, que trazes o nome de Israel! 6Fostes vendidos às nações, mas não para serdes aniquilados. Porque provocastes a ira de Deus, fostes entregues aos inimigos. 7Irritastes o vosso criador, oferecendo sacrifícios aos demónios e não a Deus. 8Esquecestes o vosso criador, o Deus eterno, e contristastes Jerusalém, que vos alimentou. 9Quando viu precipitar-se sobre vós o castigo de Deus, disse: «Escutai, nações vizinhas de Sião! Deus enviou-me um grande tormento. 10Vi o cativeiro dos meus filhos e filhas, que o Eterno lhes infligiu. 11Eu tinha-os criado com alegria e despedi-os com lágrimas e tristeza. 12Que ninguém se regozije com a minha viuvez e o meu desamparo! Se estou deserta, é por causa dos pecados dos meus filhos, porque se afastaram da Lei de Deus. 27Coragem, meus filhos, clamai ao Senhor, porque aquele mesmo que vos provou, há-de lembrar-se de vós. 28Se um dia quisestes afastar-vos de Deus, convertei-vos, agora, e procurai-o com um empenho dez vezes maior; 29pois aquele que vos enviou o castigo vos trará a alegria eterna da vossa salvação.»

    Escutamos hoje um oráculo de consolação, semelhante aos que encontramos no Segundo e no Terceiro Isaías. A cidade de Jerusalém personifica todo o povo, comparado a uma viúva desolada, que reconhece a justeza do castigo recebido de Deus, porque pecou e esqueceu o Senhor, o seu poder e a sua paternidade.
    Reconhecida a justeza do castigo, o povo reconhece também o carácter pedagógico que ele tem. Por isso, surge a esperança no perdão: o povo castigado, ao reconhecer o seu pecado e a justiça do castigo, pode regressar a Deus e experimentar novamente a salvação, uma salvação que transcende os limites das expectativas humanas.
    Jerusalém exorta os seus filhos, maus e desobedientes, a corrigir-se e a retomar o caminho da maturidade e da positividade. Há que converter-se a Deus, Àquele que deu as Dez Palavras ao seu povo. E, depois do castigo, encontrará a alegria eterna da salvação (v. 29).

    Evangelho: Lucas 10, 17-24

    Naquele tempo, 17os setenta e dois discípulos voltaram cheios de alegria, dizendo: «Senhor, até os demónios se sujeitaram a nós, em teu nome!» 18Disse-lhes Ele:«Eu via Satanás cair do céu como um relâmpago. 19Olhai que vos dou poder para pisar aos pés serpentes e escorpiões e domínio sobre todo o poderio do inimigo; nada vos poderá causar dano. 20Contudo, não vos alegreis porque os espíritos vos obedecem; alegrai-vos, antes, por estarem os vossos nomes escritos no Céu.» 21Nesse mesmo instante, Jesus estremeceu de alegria sob a acção do Espírito Santo e disse: «Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos inteligentes e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, porque assim foi do teu agrado. 22Tudo me foi entregue por meu Pai; e ninguém conhece quem é o Filho senão o Pai, nem quem é o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho houver por bem revelar-lho.» 23Voltando-se, depois, para os discípulos, disse-lhes em particular: «Felizes os olhos que vêem o que estais a ver. 24Porque - digo-vos - muitos profetas e reis quiseram ver o que vedes e não o viram, ouvir o que ouvis e não o ouviram!»

    Os setenta e dois discípulos voltam «cheios de ale­gria» (v. 17) e Jesus revela-lhes o conteúdo profundo daquilo que fizeram.
    O tema é tratado em duas secções ligeiramente diferentes, mas unitárias (vv. 17-20 e vv. 21-24). Temos, em primeiro lugar a missão, considerada pelos 72 discípulos uma vitória na luta contra Satanás (v. 18); depois, a vitória sobre Satanás, que evidencia a capacidade dos discípulos em vencer o mal que há no mundo. Por isso são chamados «Felizes» (v. 23) e os seus nomes estão «escritos no Céu» (v. 20); em terceiro lugar, o evangelho faz notar que «os pequenos» (v. 21) estão abertos ao mistério e recebem a verdade de Jesus; finalmente, Jesus louva o Pai pelo dom concedido «aos pequenos» e revela a união de amor entre Ele e o Pai: «Tudo me foi entregue por meu Pai; e nin­guém conhece quem é o Filho senão o Pai...» (v. 22).
    Pode dizer-se que a missão é irradiação do amor que une o Pai e o Filho. Este amor, revelado «aos pequenos» é a força que destrói o mal. Os discípulos são «felizes» (v. 23) porque vêem e saboreiam desde já o amor do Pai e do Filho.

    Meditatio

    Jerusalém, comparada a uma viúva desamparada e desolada com a sorte dos seus filhos, mas também cheia de esperança na sua recuperação, faz-nos pensar em Maria, mãe da verdadeira Jerusalém, preocupada com os seus filhos, que não seguem o Senhor, mas andam afastados dele por causa dos seus pecados.
    De facto, nas suas diversas aparições, a Virgem manifesta sempre a sua materna solicitude pelos pecadores, exortando a rezar e a fazer penitência por eles. Pensemos nas aparições de Fátima, nas palavras de Maria e na seriedade e empenho com que os Pastorinhos as acolheram! Todavia, nas intervenções da Senhora, também há sempre palavras de encorajamento, semelhantes às de Jerusalém: «Coragem, meus filhos, clamai ao Senhor, porque aquele mesmo que vos provou, há-de lembrar-se de vós. Se um dia quisestes afastar-vos de Deus, convertei-vos, agora, e procurai-o com um empenho dez vezes maior; pois aquele que vos enviou o castigo vos trará a alegria eterna da vossa salvação» (v. 27ss.). Maria ama-nos e quer a nossa felicidade e a nossa alegria. Por isso, clama: «Fazei penitência!... Rezai pelos pobres pecadores!» O caminho da alegria e o caminho da conversão coincidem.
    A reparação do pecado, que ofende a Deus e prejudica o homem, deve ser um dos nossos principais objectivos como cristãos e como dehonianos: «O Padre Dehon espera que os seus religiosos sejam profetas do amor e servidores da reconciliação dos homens e do mundo em Cristo (cf. 2 Cor 5,18). Assim comprometidos com Ele, para reparar o pecado e a falta de amor na Igreja e no mundo, prestarão com toda a sua vida, com as orações, trabalhos, sofrimentos e alegrias, o culto de amor e de reparação que o seu Coração deseja (cf. NQ XXV, 5) (Cst 7). «Implicados no pecado, mas participantes na graça redentora, pela realização de todas as nossas tarefas, queremos unir-nos a Cristo presente na vida do mundo e, em solidariedade com Ele e com toda a humanidade e a criação inteira, oferecer-nos ao Pai como oblação viva, santa e agradável (cf. Rom 12,1).» (Cst 22).
    Voltando-nos para o evangelho, talvez não seja difícil reconhecer-nos nos discípulos que regressam cansados de uma missão cujos resultados não são fáceis de avaliar. Por um lado, não tiverem sucesso com pessoas junto das quais esperavam alcançá-lo; por outro lado, reconhecem o surpreendente acolhimento obtido junto de outras de quem o não esperavam. É o
    que acontece com todos aqueles que se dedicam ao anúncio do Evangelho. Então, é preciso voltarmos a escutar Jesus que dá graças ao Pai e rejubila no Espírito pelos seus imperscrutáveis desígnios que revelam o mistério do Reino aos últimos, aos humildes, e o escondem «aos sábios», aos soberbos, aos que contam com a sua presumida justiça. E, mais uma vez, nos podemos lembrar dos Pastorinhos e de tantos outros "pequenos e humildes" a quem Deus revelou por meio da Virgem Maria importantes mistérios do Reino.

    Oratio

    Senhor Jesus, hoje quero unir-me ao teu grito de júbilo no Espírito, porque me enche de comoção saber que também me tratas como amigo e confidente, e me tornaste participante do diálogo de amor com o Pai. Assim me fazes compreender quanto sou precioso aos olhos do mesmo Pai e como Ele pensou em mim desde toda a eternidade e me quis seu filho, à tua imagem, que és o Filho unigénito gerado antes de todos os séculos. Bendito é o Pai, Bendito é o Espírito e bendito sejas Tu, para sempre. Amen.

    Contemplatio

    O Coração de Maria é o refúgio dos pecadores. Deus quis muito particularmente fazer de Maria a esperança e a salvação dos pecadores. Os Padres da Igreja não se calam sobre este privilégio de Maria. A Idade Média, muito ávida de símbolos, comparou Maria ao astro da noite, porque ilumina o pecador, que caminha na noite dos seus pecados. «O sol, criado para brilhar durante o dia, é, diz o cardeal Hugo, a figura de Jesus, cuja luz alegra os justos que vivem no grande dia da graça divina; a lua, criada para luzir durante a noite, é a figura de Maria, cuja luz ilumina ainda os pecadores, mergulhados na noite do pecado». - «Se alguém, diz Inocêncio III, se encontra miseravelmente empenhado na noite do pecado, que levante os olhos para o astro do noite, que invoque Maria!». «A divina misericórdia, diz o P. Eudes, reina tão perfeitamente no Coração de Maria, que lhe faz levar o nome de Rainha e de Mãe de misericórdia. Ganhou de tal modo o coração da divina misericórdia, que lhe deu as chaves de todos os seus tesouros, e tornou-a absolutamente senhora». Recusará ela o seu concurso aos pecadores, ela que durante a sua vida ofereceu o seu divino Filho por eles, no Templo e no Calvário? (Leão Dehon, OSP 3, p. 670).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a Palavra:
    «Coragem: aquele que vos enviou o castigo
    vos trará a alegria eterna da vossa salvação» (Br 4, 27)

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