Week of Out 2nd

  • 27º Domingo do Tempo Comum - Ano C

    27º Domingo do Tempo Comum - Ano C


    2 de Outubro, 2022

    ANO C
    27º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    Tema do 27º Domingo do Tempo Comum

    Na Palavra de Deus que hoje nos é proposta, cruzam-se vários temas (a fé, a salvação, a radicalidade do "caminho do Reino", etc.); mas sobressai a reflexão sobre a atitude correcta que o homem deve assumir face a Deus. As leituras convidam-nos a reconhecer, com humildade, a nossa pequenez e finitude, a comprometer-nos com o "Reino" sem cálculos nem exigências, a acolher com gratidão os dons de Deus e a entregar-nos confiantes nas suas mãos.
    Na primeira leitura, o profeta Habacuc interpela Deus, convoca-o para intervir no mundo e para pôr fim à violência, à injustiça, ao pecado... Deus, em resposta, confirma a sua intenção de actuar no mundo, no sentido de destruir a morte e a opressão; mas dá a entender que só o fará quando for o momento oportuno, de acordo com o seu projecto; ao homem, resta confiar e esperar pacientemente o "tempo de Deus".
    O Evangelho convida os discípulos a aderir, com coragem e radicalidade, a esse projecto de vida que, em Jesus, Deus veio oferecer ao homem... A essa adesão chama-se "fé"; e dela depende a instauração do "Reino" no mundo. Os discípulos, comprometidos com a construção do "Reino" devem, no entanto, ter consciência de que não agem por si próprios; eles são, apenas, instrumentos através dos quais Deus realiza a salvação. Resta-lhes cumprir o seu papel com humildade e gratuidade, como "servos que apenas fizeram o que deviam fazer".
    A segunda leitura convida os discípulos a renovar cada dia o seu compromisso com Jesus Cristo e com o "Reino". De forma especial, o autor exorta os animadores cristãos a que conduzam com fortaleza, com equilíbrio e com amor as comunidades que lhes foram confiadas e a que defendam sempre a verdade do Evangelho.

    LEITURA I - Hab 1,2-3; 2,2-4

    Leitura da Profecia de Habacuc

    «Até quando, Senhor, chamarei por Vós
    e não Me ouvis?
    Até quando clamarei contra a violência
    e não me enviais a salvação?
    Porque me deixais ver a iniquidade
    e contemplar a injustiça?
    Diante de mim está a opressão e a violência,
    levantam-se contendas e reina a discórdia?»
    O Senhor respondeu-me:
    «Põe por escrito esta visão
    e grava-as em tábuas com toda a clareza,
    de modo que a possam ler facilmente.
    Embora esta visão só se realize na devida altura,
    ela há-de cumprir-se com certeza e não falhará.
    Se parece demorar, deves esperá-la,
    porque ela há-de vir e não tardará.
    Vede como sucumbe aquele que não tem alma recta;
    mas o justo viverá pela sua fidelidade».

    AMBIENTE

    Sobre a vida e a personalidade de Habacuc, não sabemos nada: o título do livro não indica o lugar do nascimento do profeta, nem o tempo histórico em que o profeta viveu. A menção dos "caldeus" (Hab 1,6) parece situar a proclamação de Habacuc na época em que os babilónios, depois de desmembrarem o império assírio, procuravam impor o seu domínio aos povos de Canaan. Estaríamos, pois, nos finais do séc. VII a.C....
    O rei de Judá é, nesta altura, Joaquim (609-598 a.C.). Trata-se de um rei fraco, incompetente, que explora o povo, que deixa aumentar as injustiças e cavar um fosso cada vez maior entre ricos e pobres; além disso, o rei desenvolve uma política aventureirista de alianças com as super-potências da época... Apesar das simpatias pró-egípcias de Joaquim, Judá sente já o peso do imperialismo babilónio e vê-se obrigado a pagar um pesado tributo a Nabucodonosor. Prepara-se a queda de Jerusalém nas mãos dos babilónios, a morte de Joaquim, a deportação do seu filho e sucessor Joaquin (que reinou apenas três meses - cf. 2 Re 24,8) e a partida para o exílio de uma parte significativa da classe dirigente de Judá (primeira deportação: 597 a.C.).

    MENSAGEM

    O nosso texto começa por expor a queixa do profeta: "até quando, Senhor, clamarei sem que me escutes? Até quando gritarei 'violência', sem que me salves?" (Hab 1,2)... Habacuc grita a sua impaciência (e a impaciência do seu Povo), questionando a atitude complacente de Deus para com o pecado; ele não compreende que Deus contemple, impassível, as lutas e contendas do seu tempo... Habacuc sente-se interpelado pelo que o rodeia e não concebe que Deus (esse mesmo Deus que Se manifestou como libertador e salvador na história do Povo e que Se proclama fiel aos compromissos que assumiu para com os homens) não ponha fim a tantas grosseiras violações do seu projecto para o mundo. O profeta não se limita a escutar a Palavra de Jahwéh e a transmiti-la; mas ele próprio toma a iniciativa, pergunta a Deus, exige respostas. E, como uma sentinela vigilante, o profeta fica à espera que Deus Se justifique (cf. Hab 2,1).
    Finalmente, Deus digna-Se responder. A mensagem é de esperança, pois a resposta de Deus deixa claro que Ele não fica indiferente diante do mal que desfeia o mundo e que o momento da vingança divina está para chegar; ao homem, resta esperar com paciência o tempo da acção de Deus (cf. Hab 2,2-5): nessa altura, o orgulhoso e o prepotente receberão o castigo e o justo triunfará.
    Em conclusão: diante da injustiça e da opressão, Jahwéh parece, muitas vezes, indiferente e ausente; mas, de acordo com o seu plano (que o homem não conhece em pormenor), Ele encontrará o momento ideal para intervir, para castigar o imperialismo, o orgulho, a injustiça e a opressão.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão e partilha podem fazer-se de acordo com as seguintes linhas:

    ¨ Com frequência encontramos pessoas que nos questionam acerca da relação entre Deus, a sua justiça e a situação do mundo: se Deus existe, como é que Ele pode pactuar com a injustiça e a opressão? Se Deus existe, porque é que há crianças a morrer de cancro ou de fome? Se Deus existe, porque é que os bons sofrem e os maus são compensados com glória, honras e triunfos? Se Deus existe, porquê o sofrimento inocente? Estas são as questões que, hoje, mais obstaculizam a crença em Deus... A nossa resposta tem de ser o reconhecimento humilde de que os projectos de Deus ultrapassam infinitamente a nossa pequenez e finitude e que nós nunca conseguiremos explicar e abarcar os esquemas de Deus...

    ¨ Sobretudo, importa perceber que os caminhos de Deus não são iguais aos nossos. Deus tem o seu próprio ritmo; e o ritmo de Deus não é o ritmo da nossa impaciência, da nossa correria, do nosso egoísmo, dos nossos interesses... Do ponto de vista de Deus, as coisas integram-se num "todo" que nós, na nossa pequenez, não podemos abarcar. Resta-nos respeitar - mesmo sem entender - o ritmo de Deus.

    ¨ Além disso, precisamos de aprende
    r a confiar em Deus, a entregarmo-nos nas suas mãos, a sentir que Ele é um Pai que nos ama e que, aconteça o que acontecer, está a escrever a história por caminhos direitos (embora os caminhos pelos quais Deus conduz o mundo nos pareçam, tantas vezes, estranhos, misteriosos, enigmáticos, incompreensíveis). Há que confiar na bondade e na magnanimidade desse Deus que nos ama como filhos e que tudo fará, sempre, para nos oferecer vida e felicidade.

    ¨ Mesmo sem entender, a nossa missão é continuar a dar testemunho... Deus chama-nos a denunciar tudo o que impede a realização plena do projecto de felicidade que Ele tem para o homem (a injustiça, a violência, a repressão, o egoísmo, o medo...); mas quanto ao tempo exacto e aos moldes da intervenção salvadora e libertadora de Deus no mundo e na história pessoal de cada homem ou mulher, isso só a Deus diz respeito.

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 94 (95)

    Refrão: Se hoje ouvirdes a voz do Senhor,
    não fecheis os vossos corações.

    Vinde, exultemos de alegria no Senhor,
    aclamemos a Deus, nosso Salvador.
    Vamos à sua presença e dêmos graças,
    ao som de cânticos aclamemos o Senhor.

    Vinde, prostremo-nos em terra,
    adoremos o Senhor que nos criou.
    O Senhor é o nosso Deus
    e nós o seu povo, as ovelhas do seu rebanho.

    Quem dera ouvísseis hoje a sua voz:
    «Não endureçais os vossos corações,
    como em Meriba, como no dia de Massa no deserto,
    onde vossos pais Me tentaram e provocaram,
    apesar de terem visto as minhas obras».

    LEITURA II - 2 Tim 1,6-8.13-14

    Leitura da Segunda Epístola do apóstolo São Paulo a Timóteo

    Caríssimo:
    Exorto-te a que reanimes o dom de Deus
    que recebeste pela imposição das minhas mãos.
    Deus não nos deu um espírito de timidez,
    mas de fortaleza, de caridade e moderação.
    Não te envergonhes de dar testemunho de Nosso Senhor,
    nem te envergonhes de mim, seu prisioneiro.
    Mas sofre comigo pelo Evangelho,
    confiando no poder de Deus.
    Toma como norma as sãs palavras que me ouviste,
    segundo a fé e a caridade que temos em Jesus Cristo.
    Guarda a boa doutrina que nos foi confiada,
    com o auxílio do Espírito Santo, que habita em nós.

    AMBIENTE

    A Segunda Carta a Timóteo contém, como a primeira, conselhos pastorais de Paulo para o seu grande colaborador e sucessor na animação das Igrejas da Ásia: esse Timóteo que acompanhou Paulo nas suas viagens missionárias e que, segundo a tradição, foi bispo de Éfeso.
    Também aqui, é muito duvidoso que seja Paulo o autor deste texto. Os argumentos são os mesmos que vimos, a propósito da Primeira Carta a Timóteo: linguagem diferente da utilizada habitualmente por Paulo, estilo diferente, doutrinas diferentes e, sobretudo, um contexto eclesial que nos situa mais no final do séc. I ou princípios do séc. II do que na época de Paulo (o grande problema destas cartas já não é o anunciar o Evangelho, mas o "conservar a fé", frente aos falsos mestres que se infiltram nas comunidades e que ensinam falsas doutrinas).
    De qualquer forma, quem escreve a carta (e que se apresenta na pele de Paulo) diz encontrar-se na prisão e pressentir a proximidade da morte. Exorta insistentemente Timóteo a perseverar no ministério e a conservar a sã doutrina. É uma espécie de "testamento", no qual Timóteo (que aqui representa todos os animadores das comunidades cristãs) é convidado a manter-se fiel ao ministério e à doutrina recebidos dos apóstolos.

    MENSAGEM

    O autor da carta começa por exortar Timóteo (e os animadores das comunidades cristãs, em geral) a que reanime o carisma que recebeu quando Paulo e o colégio dos anciãos lhe impuseram as mãos, consagrando-o para o ministério apostólico (vers. 6-8). É um pedido lógico: mesmo que a opção de doar a vida a Deus e aos irmãos já tenha sido tomada, essa decisão fundamental necessita, cada dia, de ser aprofundada e confirmada... As desilusões, os fracassos, a monotonia, a fragilidade humana arrefecem o entusiasmo original; e é necessário, a cada instante, redescobrir o sentido das opções fundamentais que, um dia, o discípulo fez. Na sequência, são recordadas a Timóteo três das qualidades fundamentais que devem estar sempre presentes no apóstolo: a fortaleza frente às dificuldades, o amor que o impulsionará para uma entrega total a Cristo e aos homens e a prudência (ou moderação) necessária para a animação e orientação da comunidade.
    Na segunda parte do texto que nos é proposto (vers. 13-14), Timóteo é exortado a conservar-se fiel à sã doutrina recebida de Paulo. Estamos - como já dissemos atrás - numa época em que as heresias começam a infiltrar-se na comunidade cristã e a confundir os cristãos. O animador da comunidade tem o dever de ensinar a doutrina verdadeira e de defender a comunidade de tudo aquilo que a afasta da verdade do Evangelho de Jesus, fielmente transmitido pelo testemunho apostólico.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão e partilha podem partir dos seguintes dados:

    ¨ A interpelação do autor da Segunda Carta a Timóteo dirige-se, antes de mais, a todos aqueles que um dia aceitaram o Baptismo e optaram por Cristo... Na verdade, o mundo que nos rodeia apresenta imensos desafios que, muitas vezes, nos desmobilizam do serviço do Evangelho e dos valores de Jesus. É por isso que é preciso redescobrir os fundamentos do nosso compromisso. Quais são os interesses que influenciam a minha vida e que condicionam as minhas opções: os meus gostos pessoais, as indicações da moda, as sugestões da sociedade, ou as exigências e os valores do Evangelho de Jesus?

    ¨ Como é que eu revitalizo, dia a dia, o meu compromisso com Cristo e com os irmãos? Há muitos caminhos para aí chegar... Mas a comunhão com Deus, a oração, a escuta e partilha da Palavra de Deus, os sacramentos são formas privilegiadas para redescobrir o sentido das minhas opções e do meu compromisso com Deus. Isto faz sentido, para mim? É este o caminho que venho procurando seguir? Mantenho com Deus esse diálogo necessário?

    ¨ O nosso texto interpela de forma directa os animadores das comunidades cristãs. Convida-os a redescobrir, cada dia, esse entusiasmo que lhes enchia o coração no dia em que optaram pela entrega da própria vida a Cristo e aos irmãos. Convida-os a despirem-se da preguiça, da inércia, do comodismo e a fazerem da sua vida, em cada dia, um dom corajoso ao "Reino". É isso que acontece comigo? Sou forte, corajoso, sem medo, quando se trata de vencer as dificuldades que me impedem de me dar a Cristo e aos outros? O que me impulsiona é o amor, ou são interesses próprios e egoístas? Sou uma pessoa moderada e de bom senso, que não trata os irmãos da comunidade de forma
    agressiva e prepotente?

    ¨ No texto há, ainda, um convite a conservar a doutrina verdadeira... O que é que isto significa: um conservar inalteradas as fórmulas e os ritos, ou um redescobrir cada dia o essencial, adaptando-o sempre às novas realidades e aos novos desafios que o mundo põe? Como é que sabemos se estamos em consonância com a proposta de Jesus?

    ALELUIA - 1 Pedro 1,25

    Aleluia. Aleluia

    A palavra do Senhor permanece eternamente.
    Esta é a palavra que vos foi anunciada.

    EVANGEHO - LUCAS 17,5-10

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas

    Naquele tempo,
    os Apóstolos disseram ao Senhor:
    «Aumenta a nossa fé».
    O Senhor respondeu:
    «Se tivésseis fé como um grão de mostarda,
    diríeis a esta amoreira:
    'Arranca-te daí e vai plantar-te no mar',
    e ela obedecer-vos-ia.
    Quem de vós, tendo um servo a lavrar ou a guardar gado,
    lhe dirá quando ele volta do campo:
    'Vem depressa sentar-te à mesa'?
    Não lhe dirá antes:
    'Prepara-me o jantar e cinge-te para me servires,
    até que eu tenha comido e bebido.
    Depois comerás e beberás tu.
    Terá de agradecer ao servo por lhe ter feito o que mandou?
    Assim também vós,
    quando tiverdes feito tudo o que vos foi ordenado, dizei:
    'Somos inúteis servos:
    fizemos o que devíamos fazer'».

    AMBIENTE

    Continuamos a percorrer o "caminho de Jerusalém" e a deparar com as "lições" que preparam os discípulos para o desafio de compreender e de dar testemunho do "Reino". Desta vez, o nosso texto junta um "dito" de Jesus sobre a fé e uma parábola que convida à humildade.
    Nas "etapas" anteriores, Jesus tinha avisado os discípulos da dificuldade de percorrer o "caminho do Reino" (disse-lhes que entrar no "Reino" é "entrar pela porta estreita" - Lc 13,24; convidou-os à humildade e à gratuidade - cf. Lc 14,7-14; avisou-os de que é preciso amar mais o "Reino" do que a própria família, os próprios interesses ou os próprios bens - cf. Lc 14,26-33; exigiu-lhes o perdão como atitude permanente - cf. Lc 17,5-6); agora, são os discípulos que, preocupados com a exigência do "Reino", pedem mais "fé".
    O "dito" sobre a fé que ocupa a primeira parte do Evangelho que hoje nos é proposto aparece numa forma um pouco diferente em Mt 17,20 (um "dito" análogo lê-se também em Mc 11,23 e Mt 21,21, a propósito da figueira seca). No estado actual do texto, é muito difícil definir o contexto original do "dito" de Jesus, o seu enquadramento e o seu significado... Aqui, no entanto, ele serve a Lucas para manifestar a preocupação dos discípulos com a dificuldade em percorrer esse difícil "caminho do Reino".

    MENSAGEM

    A primeira parte do nosso texto é, portanto, constituída por um "dito" sobre a fé (vers. 5-6). Depois das exigências que Jesus apresentou, quanto ao caminho que os discípulos devem percorrer para alcançar o "Reino", a resposta lógica destes só pode ser: "aumenta-nos a fé". O que é que a fé tem a ver com a exigência do "Reino"?
    No Novo Testamento em geral e nos sinópticos em particular, a fé não é, primordialmente, a adesão a dogmas ou a um conjunto de verdades abstractas sobre Deus; mas é a adesão a Jesus, à sua proposta, ao seu projecto - ou seja, ao projecto do "Reino". No entanto, os discípulos têm consciência de que essa adesão não é um caminho cómodo e fácil, pois supõe um compromisso radical, a vitória sobre a própria fragilidade, a coragem de abandonar o comodismo e o egoísmo para seguir um caminho de exigência... Pedir a Jesus que lhes aumente a fé significa, portanto, pedir-Lhe que lhes aumente a coragem de optar pelo "Reino" e pela exigência que o "Reino" comporta; significa pedir que lhes dê a decisão para aderirem incondicionalmente à proposta de vida que Jesus lhes veio apresentar.
    Jesus aproveita, na sequência, para recordar aos discípulos o resultado da "fé". A imagem utilizada por Jesus (a ordem dada à "amoreira" para se arrancar da terra e ir plantar-se a ela própria no mar) mostra que, com a "fé" tudo é possível: quando se adere a Jesus e ao "Reino" com coragem e determinação, isso implica uma transformação completa da pessoa do discípulo e, em consequência, uma transformação do mundo que o rodeia. Aderir ao "Reino" com radicalidade é ter na mão a chave para mudar a história, mesmo que essa transformação pareça impossível... O discípulo que adere ao "Reino" com coragem e determinação é capaz de autênticos "milagres"... E isto não é conversa fiada: quantas vezes a tenacidade e a coragem dos discípulos de Jesus transformam a morte em vida, o desespero em esperança, a escravidão em liberdade!
    Na segunda parte do nosso texto (vers. 7-10), Lucas descreve a atitude que o homem deve assumir diante de Deus. Os fariseus estavam convencidos de que bastava cumprir os mandamentos da Torah para alcançar a salvação: se o homem cumprisse as regras, Deus não teria outro remédio senão salvá-lo... A salvação dependia, de acordo com esta perspectiva, dos méritos do homem. Deus seria, assim, apenas um contabilista, empenhado em fazer contas para ver se o homem tinha ou não direito à salvação...
    Jesus coloca as coisas numa dimensão diferente. A atitude do discípulo - desse discípulo que adere a Jesus e ao "Reino", que faz as "obras do Reino" e que constrói o "Reino" - frente a Deus não deve ser a atitude de quem sente que fez tudo muito bem feito e que, por isso, Deus lhe deve algo; mas deve ser a atitude de quem cumpre o seu papel com humildade, sentindo-se um servo que apenas fez o que lhe competia.
    O que Jesus nos pede no Evangelho de hoje é que percorramos, com coragem e empenho, o "caminho do Reino". Quando o discípulo aceita percorrer esse caminho, é capaz de operar coisas espantosas, milagres que transformam o mundo... E, cumprida a sua missão, resta ao discípulo sentir-se servo humilde de Deus, agradecer-Lhe pelos seus dons, entregar-se confiada e humildemente nas suas mãos.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pode fazer-se a partir das seguintes coordenadas:

    ¨ A "fé" é, antes de mais, a adesão à pessoa de Jesus Cristo e ao seu projecto. Posso dizer, de facto, que é a "fé" que conduz e que anima a minha vida? Jesus é o eixo central à volta do qual se constrói a minha existência? É Jesus que marca o ritmo e a cor das minhas opç&
    otilde;es e dos meus projectos?

    ¨ O "Reino" é uma realidade sempre "a fazer-se"; mas apresentam-se, com frequência, situações de injustiça, de violência, de egoísmo, de sofrimento, de morte, que impedem a concretização do "Reino". Como é que eu - homem ou mulher de fé - ajo, nessas circunstâncias? A minha "fé" em Jesus conduz-me a um empenho concreto pelo "Reino" e entusiasma-me a lutar contra tudo o que impede a concretização do "Reino"? A minha "fé" nota-se nos meus gestos? Há algo de novo à minha volta pelo facto de eu ter aderido a Jesus e pelo facto de eu estar a percorrer o "caminho do Reino"? Quais são os "milagres" que a minha "fé" pode fazer?

    ¨ Nós, homens, somos, com frequência, muito ciosos dos nossos direitos, dos nossos créditos, daquilo que nos devem pelas nossas boas acções. Quando transportamos isto para a relação com Deus, construímos um deus que não é mais do que um contabilista, que escreve nos seus livros os nossos créditos e os nossos débitos, a fim de nos pagar religiosamente, de acordo com os nossos merecimentos... Na realidade - diz-nos o Evangelho de hoje - não podemos exigir nada de Deus: existimos para cumprir, humildemente, o papel que Ele nos confia, para acolher os seus dons e para O louvar pelo seu amor. É nesta atitude que o discípulo de Jesus deve estar sempre.

    ¨ De certas pessoas diz-se que "não dão ponto sem nó", para descrever o seu egoísmo e as suas atitudes interesseiras. Porque é que fazemos as coisas? O que é que motiva as nossas acções e gestos: o amor desinteressado, ou o interesse pela retribuição?

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 27º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 27º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. PALAVRA CELEBRADA NA EUCARISTIA.
    A Palavra de Deus não se limita ao tempo da proclamação e da escuta da Palavra. Na preparação da celebração, pode-se prever que algumas expressões da liturgia da Palavra estejam presentes no momento penitencial, nalguma intenção da oração dos fiéis, num momento de acção de graças...

    3. BILHETE DE EVANGELHO.
    O pedido "aumenta a nossa fé" que os Apóstolos fazem a Jesus é uma bela oração também para nós. No Evangelho de Mateus, diz-se que, no momento da partida de Jesus, "alguns tiveram dúvidas", enquanto Jesus lhes assegura que estará com eles todos os dias até ao fim dos tempos. Isto quer dizer que a fé não é da ordem da evidência, mas do crescimento: não somos crentes uma vez por todas, tornamo-nos crentes. E esta fé, precisa Jesus, manifesta-se humildemente, porque a confiança não suporta grandes declarações, verifica-se no quotidiano e nas pequenas coisas, pode mesmo operar grandes coisas, porque Deus Se deixa tocar pela confiança que n'Ele depositamos. Deus deixa-Se tocar pela humildade do servo, pois tal é a única e verdadeira atitude que espera daqueles que põem n'Ele a sua confiança. O servo não procura, então, a glória, mas somente a alegria de ter feito o seu dever.

    4. À ESCUTA DA PALAVRA.
    "Aumenta a nossa fé!" Jesus já tinha ouvido uma súplica semelhante, quando o pai da criança epiléptica lhe havia suplicado: "Vem em ajuda da minha pouca fé!" A resposta de Jesus é surpreendente, até provocadora, sem dúvida: "Se tivésseis fé como um grão de mostarda, diríeis a esta amoreira: 'arranca-te daí e vai plantar-te no mar', e ela obedecer-vos-ia". A sua resposta, na realidade, força-nos a ir para além do imediato e do sensacional. A fé é já um caminho humano. Quando duas pessoas se amam, sabem muito bem que o seu amor não se pode demonstrar cientificamente. O amor descobre-se como um dom gratuito, mas constrói-se na confiança. Posso dizer àquele ou àquela que amo "eu sei que te amo", porque sei o que vibra dentro de mim. Mas ao mesmo tempo não posso dizer-lhe "creio que tu me amas", porque não estou na pele do outro. O amor implica, pois, um salto num certo desconhecido que, no plano das relações humanas, pode, sem dúvida, apoiar-se nas provas "tangíveis", mas que são fracas. Quando se trata da nossa relação com Deus, a fé é, sem dúvida, mais difícil, porque não tem, ou tem muito pouco, suporte "afectivo". Mas o "princípio", finalmente, é o mesmo. Sou convidado a ter confiança na Palavra de Deus, que se exprimiu plenamente em Jesus e foi transmitida pelos seus primeiros discípulos. Jesus dá-lhes como missão serem suas testemunhas autorizadas. Posso, sem dúvida, pôr em causa o seu testemunho, não aderir a Ele, exigindo provas convincentes. Mas posso igualmente comprometer-me noutro caminho, da relação amorosa com Jesus. A fé só se pode viver numa relação de amor que nos faz ver para lá das aparências, porque os homens vêem com os olhos, mas Deus vê com o coração. "Sim, Jesus, aumenta em mim a fé, para que eu possa amar-Te sempre cada vez mais".

    5. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Pode-se escolher a oração eucarística para as circunstâncias especiais V-C, pela sua insistência em Cristo "Verbo, mediador" e no Evangelho de que devemos ser servidores.

    6. PALAVRA PARA O CAMINHO...
    Levar a Palavra de Deus como luz para mais uma semana de trabalho, de estudo... Ao longo dos dias da semana que se segue, procurar rezar e meditar algumas frases da Palavra de Deus: «Senhor, aumenta a nossa fé!»; «Não te envergonhes de dar testemunho de Nosso Senhor...»; «Se hoje ouvirdes a voz do Senhor, não fecheis os vossos corações»; «Exultemos de alegria no Senhor!». Procurar transformá-las em atitudes e em gestos de verdadeiro encontro com Deus e com os próximos que formos encontrando nos caminhos percorridos da vida...

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehnianos.org - www.dehonianos.org

    Santos Anjos da Guarda

    Santos Anjos da Guarda


    2 de Outubro, 2022

    O Anjos, criaturas puramente espirituais e dotadas de inteligência e vontade, servem a Deus e são seus mensageiros. Eles "

    veem constantemente a face de meu Pai que está no Céu" (Mt 18, 10). São "poderosos mensageiros, que cumprem as suas ordens" (Sl 103, 20). São encarregados por Deus de proteger a humanidade. O povo de Deus sempre sentiu o dever de corresponder à sua silenciosa e benévola companhia, honrando-os. Em 1615, entrou no Calendário romano a celebração que hoje lhes dedicamos.

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 23, 20-23a

    Eis que o que diz o Senhor: "Eu envio um anjo diante de ti, para te guardar no caminho e para te fazer entrar no lugar que Eu preparei. 21Mantém-te atento na sua presença e escuta a sua voz. Não lhe causes amargura, porque ele não suportará a vossa transgressão, porque está nele a minha autoridade. 22Mas se escutares a sua voz e se fizeres tudo o que Eu falar, Eu serei inimigo dos teus inimigos e serei adversário dos teus adversários, 23pois o meu anjo caminhará diante de ti.

    Estamos no epílogo do código da aliança, numa seção com caráter de pregação, possivelmente de origem eloísta. Logo no início aparece-nos a figura de um anjo, que irá à frente do povo na sua caminhada para a Terra Prometida, para o proteger e orientar. Chama-se o anjo de Deus ou anjo de Javé, idêntico ao próprio Deus. O povo deve, pois, obedecer-lhe. O enquadramento contextual do texto permite também afirmar que o anjo de Deus é, agora, a Lei, palavra de Deus encarnada na palavra humana. Mas poderão ser igualmente os acontecimentos futuros, todos eles mensageiros potenciais de Deus, testemunhas da sua palavra e da sua ação. Em última análise, como já dissemos, o anjo é o próprio Deus com o homem. Importa que o homem tome consciência dessa presença e se torne digno dela, deixando-se guiar docilmente.

    Evangelho: Mateus 18, 1-5.10

    Naquele tempo, os discípulos aproximaram-se de Jesus e perguntaram-lhe: «Quem é o maior no Reino do Céu?» 2Ele chamou um menino, colocou-o no meio deles 3e disse: «Em verdade vos digo: Se não voltardes a ser como as criancinhas, não podereis entrar no Reino do Céu.4Quem, pois, se fizer humilde como este menino será o maior no Reino do Céu. 5Quem receber um menino como este, em meu nome, é a mim que recebe.» 10«Livrai-vos de desprezar um só destes pequeninos, pois digo-vos que os seus anjos, no Céu, vêem constantemente a face de meu Pai que está no Céu.

    Na literatura judaica, a função dos anjos era tripla: adoração e louvor de Deus; agentes ou mensageiros divinos nos assuntos humanos; guardiães dos homens e das nações (Heb 12, 15). Segundo uma crença generalizada, eram poucos os anjos que tinham acesso direto a Deus. Tendo em conta estas premissas, o ensinamento tem por alvo a dignidade dos pequeninos que acreditam em Jesus: se os seus anjos têm essa dignidade, quanto maior será a dignidade dos crentes ao serviço dos quais eles estão!
    Como Deus nos protege com os seus anjos, assim também nós havemos de proteger os irmãos, sobretudo os mais frágeis e pequenos.

    Meditatio

    Esta memória dos anjos recorda-nos que, no caminho da vida, não estamos sós. Deus não nos abandona. Deus caminha connosco.
    Há, com efeito, uma criação visível, que podemos ver, pelo menos parcialmente, com os olhos da carne; e há uma criação invisível, mas real, que só os sentidos espirituais nos permitem perceber, por meio da fé, da oração, da iluminação interior que vem do Espírito Santo.
    Os anjos são, em primeiro lugar, um sinal luminoso da divina Providência, da bondade paterna de Deus, que nada, do que é necessário, deixa faltar aos seus filhos. Intermediários entre a terra e o céu, os anjos são criaturas invisíveis postas à nossa disposição para nos guiarem no caminho de regresso à casa do Pai. Vêm do Céu para nos reconduzirem ao Céu e nos fazer pregustar algo das realidades celestes. Por vezes, podemos experimentar a presença dos anjos de modo muito concreto e sensível, desde que a saibamos reconhecer. Trata-se de encontros "casuais", - que todavia se tornam fundamentais e determinantes na nossa vida - ou de auxílio súbito e inesperado, em situações de perigo. Pode ser também uma intuição repentina, que nos permite dar-nos conta de um erro, de um esquecimento. Como não sentir-nos guiados, protegidos, nesses momentos? Os anjos protegem-nos de tantos perigos de que nem nos damos conta. Sobretudo do perigo de nos tornarmos ímpios, de não escutarmos nem obedecermos à Palavra de Deus. Os anjos sugerem-nos pensamentos de retidão e de humildade. Sugerem-nos bons sentimentos.
    Havemos também de ser anjos Deus em relação aos outros, ajudando-os a ver e a orientar-se pelos caminhos de Deus.
    O P. Dehon rezava: "Anjos do Senhor, recomendai-me à misericórdia do Sagrado Coração." (OSP 4, p. 317).

    Oratio

    Pai santo, Deus eterno e providente, nós vos damos graças por Cristo, Nosso Senhor. Proclamamos a vossa imensa glória, que resplandece nos Anjos e nos Arcanjos, e, honrando estes mensageiros celestes, exaltamos a vossa infinita bondade, porque a veneração que eles merecem é sinal da vossa incomparável grandeza sobre todas as criaturas. Por isso, com a multidão dos Anjos, que celebram a vossa divina majestade, Vos louvamos e bendizemos. Ámen. (cf. Prefácio dos Anjos).

    Contemplatio

    Os Anjos louvam a Deus e servem-n'O. «Eles são milhares de milhares, diz Daniel, à volta do trono de Deus, ocupados em servi-l'O» (Dan 7, 10). «Anjos do céu, diz o salmo, bendizei o Senhor, vós que executais as suas ordens» (Sl 102). Deus envia-os junto das criaturas. O seu nome significa «mensageiros». «São os enviados de Deus, diz S. Paulo, vêm ajudar os homens a realizarem a sua salvação» (Heb 1, 14). Há os anjos das nações e os anjos de cada um de nós. Deus dizia ao seu povo por Moisés: «Enviarei o meu anjo diante de vós. Conduzir-vos-á, guardar-vos-á e dirigir-vos-á para a terra que vos prometi» (Ex 23). Deus acrescentava: «Honrai-o, escutai a sua voz quando vos fala por Moisés. Se lhe obedecerdes, sereis abençoados e triunfareis sobre os vossos inimigos. Se o desprezardes, sereis castigados» (Ibid.). «Deus ordenou aos seus anjos, diz o salmo, que vos guardassem em todos os vossos caminhos. Levar-vos-ão nas suas mãos para que eviteis as pedras do caminho» (Sl 90). Trata-se aqui dos anjos de cada um de nós. «Respeitai as crianças, diz Nosso Senhor, os seus anjos veem constantemente a face de meu Pai» (Mt 18, 10). Os anjos vigiam particularmente as crianças. (L. Dehon, OSP 4, p. 315).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Anjos do Senhor, bendizei o Senhor!" (Sl 103, 20).

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    Santos Anjos da Guarda (02 Outubro)

  • S. Francisco de Assis

    S. Francisco de Assis


    4 de Outubro, 2022

    S. Francisco de Assis nasceu em 1181, ou 1182. Filho de um rico comerciante, Francisco sonhava tornar-se cavaleiro. Desviado desse ideal, procurou com persistência vontade de Deus. O encontro com os leprosos, e a oração diante do Crucifixo na igreja de S. Damião, levaram-no a abandonar a família e a iniciar uma vida evangélica penitencial. Bem depressa o Senhor lhe deu irmãos dispostos a viverem o evangelho sine glossa, em fraternidade. O papa Honório III aprovou a Regra e a vida dos frades menores, em 1222. No ano seguinte, Francisco recebeu os estigmas do Crucificado, selo da sua conformidade com o único Senhor e Mestre. Faleceu em 1226, sendo canonizado em 1228. Grande amigo da Natureza, S. Francisco é padroeiro dos ecologistas. É também um dos padroeiros da Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus, Dehonianos.

    Lectio

    Primeira leitura: Gálatas 6, 14-18

    Irmãos: Longe de mim gloriar-me, a não ser na cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo. 15Pois nem a circuncisão vale alguma coisa nem a incircuncisão, mas sim uma nova criação. 16Paz e misericórdia para todos quantos seguirem esta regra, bem como para o Israel de Deus. 17De agora em diante ninguém mais me venha perturbar; pois eu levo no meu corpo as marcas de Jesus. 18A graça de Nosso Senhor Jesus Cristo esteja com o vosso Espírito, irmãos!Ámen.

    Ao terminar a sua Carta aos Gálatas, Paulo declara ter agido retamente ao desmascarar a hipocrisia dos que defendiam a necessidade da circuncisão e da observância de lei hebraica para os cristãos (v. 12). Em seguida, afirma que não procura a glória do mundo, mas se sente honrado por estar em comunhão com Jesus Crucificado, cujo amor redentor afastara dele toda a ambição, orgulho e egoísmo. O seu único motivo de orgulho é a cruz do Senhor, que iniciou uma nova economia fundamentada, não na Lei, mas no Espírito. Acolhendo e pondo em prática o amor misericordioso de Deus, o cristão pode usufruir da plenitude dos bens messiânicos. Consciente de tal dom, Paulo não quer ouvir falar de outras doutrinas. A sua pertença exclusiva ao Senhor é manifestada pelos sofrimentos que, a seu exemplo, suporta para Lhe ser fiel (v. 17).

    Evangelho: Mateus 11, 25-30

    Naquele tempo, Jesus exclamou: «Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos entendidos e as revelaste aos pequeninos. 26Sim, ó Pai, porque isso foi do teu agrado. 27Tudo me foi entregue por meu Pai; e ninguém conhece o Filho senão o Pai, como ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar.» 28«Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, que Eu hei-de aliviar-vos.29Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito. 30Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve.

    A relação entre Jesus e o Pai é única, como declara o nosso texto. Jesus é o Filho do Pai, de Quem recebeu tudo, por Quem é conhecido, e a Quem conhece como mais ninguém. Jesus revela-nos esse conhecimento, que é dom recíproco de amor. Na sua oração de bênção, Jesus reconhece que só os pequenos, os que não presumem de si mesmos, estão em condições de conhecer o amor do Pai e viver em comunhão com Ele. Que se fecha na sua "sabedoria" autoexclui-se dessa vida e comunhão. Francisco de Assis foi um desses pequenos e humildes que encontraram respiro e vida nova nas palavras e gestos de Jesus.

    Meditatio

    Francisco de Assis foi um daqueles pequenos, que receberam de coração aberto e disponível a revelação de Jesus, como Filho muito amado do Pai. O Evangelho, sine glossa, tornou-se a única regra da sua vida, regra que também propôs àqueles que se lhe quiseram juntar como irmãos. Para Francisco, tudo se resumia à relação com Jesus, no amor. Os estigmas, que recebeu já perto do fim da sua vida, são sinal da intensíssima relação com Jesus, que o levou a identificar-se com Ele também fisicamente. Numa época em que os homens da Igreja procuravam riquezas e grandezas, Francisco quis permanecer pobre e pequeno diante de Deus e dos homens. Por causa disso, nem aceitou ser ordenado sacerdote, permanecendo simplesmente irmão entre os irmãos, como o mais pequeno de todos, por amor do Senhor.
    Para ele realizaram-se plenamente as palavras de Jesus: "o meu jugo é suave e o meu fardo é leve" (v. 30). Quanta alegria enchia o coração de Francisco, pobre de tudo e rico de tudo, que no amor do Senhor sentia como suaves os maiores sofrimentos. "Carregai as cargas uns dos outros e assim cumprireis plenamente a lei de Cristo." (Gl 6, 2). As cargas dos outros: é esse o jugo do Senhor. S. Francisco compreendeu-o desde o princípio da sua conversão. No fim da vida, contava: "Estando eu em pecado, parecia-me coisa excessivamente amarga ver os leprosos, mas o próprio Senhor me conduziu para meio deles e eu exercia misericórdia para com eles". Este é o jugo, que consiste em carregar as cargas dos outros, mesmo que isso nos parece muito duro. E continuava Francisco: "Carregando-as, o que me parecia amargo, converteu-se para mim em doçura na alma e no corpo". Pouco mais adiante, encontramos a segunda frase de Paulo: "Cada um terá de carregar o próprio fardo" (Gl 6, 5). Aqui, trata-se de não julgar os outros, de ter muita compreensão por todos, de não impor aos outros os nossos pontos de vista e os nossos modos de fazer, de vermos os nossos próprios defeitos e de não aproveitar os defeitos dos outros para lhes impor pesos que não estão de acordo com o pensamento do Senhor. "Ninguém se deve julgar o primeiro entre os irmãos", recomendou. "Quem jejua, não julgue os que comem". A caridade não critica os outros, não os julga, mas ajuda-os.
    Carreguemos, também nós, o jugo do Senhor, os fardos dos outros, e não os sobrecarreguemos com críticas e juízos sem misericórdia. Assim conheceremos melhor o Filho de Deus, que morreu por nós, e nele o Pai que está nos céus, com a mesma alegria de S. Francisco.

    Oratio

    Fazei, ó meu Deus, exclamava, que a doce violência do vosso amor me desapegue de todas as coisas sensíveis e me consuma inteiramente, a fim de que eu possa morrer por vosso amor infinito. Eu vo-lo peço por vós mesmo, ó Filho de Deus, que morrestes por amor de mim. Meu Deus e meu tudo! Quem sois vós, e quem sou eu, senão um verme de terra? Desejo amar-vos, Senhor adorável. Consagrei-vos a minha alma e o meu corpo com tudo o que sou. Levar-me-ei a fazer com ardor o que mais contribuir para vos glorificar. Sim, meu Deus, este é o único objeto dos meus desejos. (Oração de S. Francisco, citada por Leão Dehon, in OSP 4, p. 322)

    Contemplatio

    O Coração de Francisco foi, como o de Jesus, um porto de refúgio no qual todos os pobres corações humanos, agitados pela tempestade, podiam encontrar um asilo. O coração de Francisco foi um coração de apóstolo, um coração de fogo. Semelhante a um carro inflamado, percorria o mundo, ardendo por arrastar atrás de si todos os homens para os conduzir ao céu. O seu coração inflamado de amor gerou três ordens que deram e que dão tantos santos ao céu. Depois do capítulo geral da sua ordem em 1219, enviou religiosos para a Grécia, para África, para a França, para a Inglaterra, para aí estender o reino de Deus. Tinha reservado para si a missão da Síria e /323 do Egipto onde esperava encontrar o martírio! O coração de Francisco não estava simplesmente aberto às misérias morais, mas também às misérias físicas. Oh! Como amava os pobres e a pobreza! Como era terno para com os doentes e os aflitos! S. Francisco diz-nos a todos como S. Paulo: «Sede meus imitadores». A seu exemplo, entremos no Coração de Jesus pelo amor e pela imitação. (Leão Dehon, OSP 4, p. 322s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Carregai as cargas uns dos outros
    e assim cumprireis plenamente a lei de Cristo." (Gal 6, 2).

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    S. Francisco de Assis (04 Outubro)

  • Nossa Senhora do Rosário

    Nossa Senhora do Rosário


    7 de Outubro, 2022

    O Rosário, que apareceu entre os séculos XV e XVI, foi divulgado pelos Dominicanos, tornando-se uma das mais populares devoções marianas. Nossa Senhora recomendou-o insistentemente em Fátima.

    A memória de Nossa Senhora do Rosário, inicialmente celebrada por algumas famílias religiosas, entrou na liturgia de toda a Igreja por disposição do Papa S. Pio V, dominicano, em 1572. Com essa festa, então abertamente chamada "comemoração da Bem-aventurada Virgem Maria da Vitória", o Papa queria agradecer a Nossa Senhora a sua intervenção na vitória da frota cristã contra a dos turcos, em Lepanto, a 7 de Outubro de 1571. Atualmente celebra-se simplesmente a memória de Nossa Senhora do Rosário.

    Lectio

    Primeira leitura: Atos, 1, 12-14

    Os Apóstolos desceram, do monte chamado das Oliveiras, situado perto de Jerusalém, à distância de uma caminhada de sábado, e foram para Jerusalém. 13Quando chegaram à cidade, subiram para a sala de cima, no lugar onde se encontravam habitualmente.Estavam lá: Pedro, João, Tiago, André, Filipe, Tomé, Bartolomeu, Mateus, Tiago, filho de Alfeu, Simão, o Zelota, e Judas, filho de Tiago.14E todos unidos pelo mesmo sentimento, entregavam-se assiduamente à oração, com algumas mulheres, entre as quais Maria, mãe de Jesus, e com os irmãos de Jesus.

    Depois de ter convivido durante quarenta dias com os discípulos, Jesus elevou-se ao céu. Então os Onze, que tinham andado dispersos, com outros discípulos e familiares de Jesus, entre os quais a sua mãe, reuniram-se provavelmente em casa de um deles, enquanto esperavam o Pentecostes, em que haviam de receber o Espírito Santo prometido. Neste texto, Lucas antecipa algumas notas sobre o modo de vida da primitiva comunidade eclesial de Jerusalém, que irá desenvolver depois. Uma característica evidente é a oração partilhada pelos irmãos e irmãs de modo assíduo e concorde. Depois do Pentecostes, em que Maria também participará (At 2, 1), a comunidade eclesial irá desenvolver a sua identidade e a diaconia. A oração, que precede o Pentecostes, é como que uma preparação; a assiduidade à oração e a concórdia entre os irmãos são garantia de crescimento e de futuro para a comunidade.

    Evangelho: Lucas 1, 26-38

    Naquele tempo, o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia chamada Nazaré,27a uma virgem desposada com um homem chamado José, da casa de David; e o nome da virgem era Maria. 28Ao entrar em casa dela, o anjo disse-lhe: «Salve, ó cheia de graça, o Senhor está contigo.» 29Ao ouvir estas palavras, ela perturbou-se e inquiria de si própria o que significava tal saudação. 30Disse-lhe o anjo: «Maria, não temas, pois achaste graça diante de Deus. 31Hás-de conceber no teu seio e dar à luz um filho, ao qual porás o nome de Jesus.32Será grande e vai chamar-se Filho do Altíssimo. O Senhor Deus vai dar-lhe o trono de seu pai David, 33reinará eternamente sobre a casa de Jacob e o seu reinado não terá fim.» 34Maria disse ao anjo: «Como será isso, se eu não conheço homem?» 35O anjo respondeu-lhe: «O Espírito Santo virá sobre ti e a força do Altíssimo estenderá sobre ti a sua sombra. Por isso, aquele que vai nascer é Santo e será chamado Filho de Deus. 36Também a tua parente Isabel concebeu um filho na sua velhice e já está no sexto mês, ela, a quem chamavam estéril,37porque nada é impossível a Deus.» 38Maria disse, então: «Eis a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra.» E o anjo retirou-se de junto dela.

    A devoção do Rosário encontrou na anunciação a Maria o primeiro quadro para contemplação. O colóquio entre Deus e a jovem Maria, mediado pelo anjo Gabriel, - "força de Deus" -, decorre num clima de serena e alegre disponibilidade obediente da humilde «serva do Senhor». A disponibilidade de Maria decorre da reflexão ou meditação sobre a palavra proferida pelo enviado de Deus. Maria tenta uma exegese da mensagem, verdadeiramente surpreendente, pois se trata de um grandioso projeto de Deus, que a envolve. A contemplação de Maria sobre o primeiro mistério do seu envolvimento evangélico e messiânico é iluminada pela disponibilidade do Senhor, pronto a dar explicações. Maria acolhe-as e medita-as no seu coração. Deus não impõe uma tarefa absurda, mas "esforça-se" por convencer aquele que chama a participar nela.

    Meditatio

    S. Lucas oferece à meditação do devoto de Maria, na memória de Nossa Senhora do Rosário, uma sequência histórica de acontecimentos que têm o seu princípio na perícopa do evangelho que escutamos hoje e passa imediatamente para a dos Atos dos Apóstolos que também escutámos na primeira leitura. São duas paragens na peregrinação devocional do Rosário: uma com que começam os "mistérios gozosos" e outra que encontramos do terceiro dos mistérios gloriosos. Essa disposição dos quadros a contemplar dá-nos uma metodologia para a nossa meditação que nos ensina e ajuda a passar do individual ao comunitário, da contemplação à ação.
    De fato, a Anunciação é, para a Virgem Maria, uma experiência muito pessoal de Deus, uma paragem na contemplação da palavra de Deus, junto ao próprio Deus. É um evento gozado na solidão. Essa solidão ou experiência individual não significa isolamento: de fato, Aquela que recebeu o anúncio, partilha a vida da comunidade, a espera da manifestação poderosa e gloriosa do Espírito Santo. Põe em comum a sua experiência de Deus.
    A Anunciação constitui para Maria uma subida aos cumes da contemplação dos mistérios de Deus, uma aproximação, guiada pela luz da palavra divina, ao projeto que Deus quer realizar com a sua disponibilidade. Essa contemplação sustenta a obediência consciente. A Virgem da Anunciação não permanece imóvel no seu genuflexório, com o livro entre as mãos, como a imaginaram muitos pintores. Atua em si mesma de acordo com a Palavra recebida, meditada, contemplada e rezada; atua na comunidade, nascida do amor de Jesus e da fé em Cristo ressuscitado; e tudo com assiduidade e em concórdia com os outros discípulos.
    A atitude de Maria marca a primitiva comunidade e orienta-a para o uso dos meios que façam dela, o mais possível, comunidade do Senhor: a assiduidade ao "ensino dos Apóstolos", a "união fraterna", a "fração do pão", a oração e a partilha dos bens (cf. At 2, 42.44).
    Os primeiros monges pretendiam viver este mesmo espírito que animou, primeiro a Maria e, depois, a comunidade de Jerusalém. Daí a importância que davam à escuta da Palavra, à oração, à Eucaristia, à partilha de bens, à união fraterna. O mesmo espírito deve animar as nossas atuais comunidades. Daí a necessidade de usar os mesmos meios.

    Oratio

    Ó Maria, Mãe de Deus, Rainha e Mãe dos homens, eu vos ofereço as homenagens da minha veneração e do meu amor filial. Quero viver como vosso filho dedicado, consolando-vos e obedecendo-vos em tudo. Pela vossa poderosa intercessão, fazei que todos os meus pensamentos e ações sejam conformes à vossa vontade e à do vosso divino Filho. (Leão Dehon, OSP 4, p. 338).

    Contemplatio

    As orações dos santos são poderosas junto de Deus; e todavia não são mais do que as orações de servos. Mas as de Maria são orações de Mãe. Santo Antonino dizia: «a oração de Maria tem sobre o coração de Jesus a força de uma ordem». Também considera impossível que a divina Mãe peça ao Filho uma graça e que o Filho lhe recuse. «É impossível - dizia - que a Mãe não seja ouvida». É por isso que S. Bernardo nos exorta a pedir, por intercessão de Maria, todas as graças que desejamos alcançar de Deus. «Procuremos a graça - escreve - mas procuremo-la por Maria, porque ela é mãe; ela é sempre ouvida, e não pode obter uma recusa». Deste modo, vemos a imensa família dos cristãos recorrer a Maria como mãe amada e dedicada. Quem poderá contar os santuários, os altares, as imagens, as bandeiras, os escapulários, as imagens de Maria? A todo o momento, de todos os lugares da terra, se eleva um apelo filial: «Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós pecadores». E eu mesmo grito: «Augusta Mãe de Deus, rogai a Jesus por mim. Vede as misérias da minha alma, e tende piedade de mim. Sim, rogai e não cesseis jamais de rogar por mim, enquanto não me virdes no céu, seguro da minha salvação eterna. Ó Maria, sois a minha esperança, não me abandoneis». (Leão Dehon, OSP 4, p. 337).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós pecadores».
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    Nossa Senhora do Rosário (07 Outubro)

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