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  • 02º Domingo do Advento - Ano A

    02º Domingo do Advento - Ano A


    4 de Dezembro, 2022

    ANO A
    2.º DOMINGO DO ADVENTO

    Tema do 2.º Domingo do Advento
    A liturgia deste domingo convida-nos a despir esses valores efémeros e egoístas a que, às vezes, damos uma importância excessiva e a realizar uma revolução da nossa mentalidade, de forma a que os valores fundamentais que marcam a nossa vida sejam os valores do "Reino".

    Na primeira leitura, o profeta Isaías apresenta um enviado de Jahwéh, da descendência de David, sobre quem repousa a plenitude do Espírito de Deus; a sua missão será construir um reino de justiça e de paz sem fim, de onde estarão definitivamente banidas as divisões, as desarmonias, os conflitos.

    No Evangelho, João Baptista anuncia que a concretização desse "Reino" está muito próxima... Mas, para que o "Reino" se torne realidade viva no mundo, João convida os seus contemporâneos a mudar a mentalidade, os valores, as atitudes, a fim de que nas suas vidas haja lugar para essa proposta que está para chegar... "Aquele que vem" (Jesus) vai propor aos homens um batismo "no Espírito Santo e no fogo" que os tornará "filhos de Deus" e capazes de viver na dinâmica do "Reino".

    A segunda leitura dirige-se àqueles que receberam de Jesus a proposta do "Reino": sendo o rosto visível de Cristo no meio dos homens, eles devem dar testemunho de união, de amor, de partilha, de harmonia entre si, acolhendo e ajudando os irmãos mais débeis, a exemplo de Jesus.

     

    LEITURA I - Is 11, 1-10

    Leitura do Livro de Isaías
    Naquele dia,
    sairá um ramo do tronco de Jessé
    e um rebento brotará das suas raízes.
    Sobre ele repousará o espírito do Senhor:
    espírito de sabedoria e de inteligência,
    espírito de conselho e de fortaleza,
    espírito de conhecimento e de temor de Deus.
    Animado assim do temor de Deus,
    não julgará segundo as aparências,
    nem decidirá pelo que ouvir dizer.
    Julgará os infelizes com justiça
    e com sentenças retas os humildes do povo.
    Com o chicote da sua palavra atingirá o violento
    e com o sopro dos seus lábios exterminará o ímpio.
    A justiça será a faixa dos seus rins
    e a lealdade a cintura dos seus flancos.
    O lobo viverá com o cordeiro
    e a pantera dormirá com o cabrito;
    o bezerro e o leãozinho andarão juntos
    e um menino os poderá conduzir.
    A vitela e a ursa pastarão juntamente,
    suas crias dormirão lado a lado;
    e o leão comerá feno como o boi.
    A criança de leite brincará junto ao ninho da cobra
    e o menino meterá a mão na toca da víbora.
    Não mais praticarão o mal nem a destruição
    em todo o meu santo monte:
    o conhecimento do Senhor encherá o país,
    como as águas enchem o leito do mar.
    Nesse dia, a raiz de Jessé surgirá como bandeira dos povos;
    as nações virão procurá-la e a sua morada será gloriosa.

    AMBIENTE

    A primeira leitura apresenta-nos um poema que alimenta o sonho do regresso a essa época ideal do reinado de David e que dá fôlego à corrente messiânica.

    Não é claro o enquadramento histórico em que este oráculo aparece. Para alguns autores, contudo, este poema (e outros semelhantes) surge na fase final da atividade profética de Isaías...

    Quando o rei Ezequias atingiu a maioridade e começou a dirigir os destinos de Judá (por volta de 714 a.C.), preocupou-se em consolidar uma frente anti-assíria (a potência que, nessa época, ameaçava os países da zona), com o Egipto, a Fenícia e a Babilónia. Isaías condenou essas iniciativas... Elas significavam um colocar a confiança e a esperança no poder de exércitos estrangeiros, negligenciando o poder de Jahwéh: eram, portanto, um grave sinal de infidelidade ao Deus de Judá. Essas iniciativas, na opinião do profeta, não poderiam conduzir senão à ruína da nação... De facto, as previsões funestas de Isaías realizaram-se quando Senaquerib invadiu Judá, cercou Jerusalém e obrigou Ezequias a submeter-se ao poderio assírio (701 a.C.).

    Por essa altura, desiludido com a política dos reis de Judá, o profeta teria começado a sonhar com um tempo novo, sem armas e sem guerras, de justiça e de paz sem fim. Tal "reino" só poderia surgir da iniciativa de Jahwéh (os reis humanos de há muito que se haviam revelado incapazes de conduzir o Povo em direção a um futuro de paz); e o instrumento de Jahwéh na implementação desse "reino" seria, na opinião do profeta, um descendente de David. Este texto será, talvez, dessa época em que a profecia e o sonho de um mundo melhor se combinam.

    MENSAGEM
    Na primeira parte do poema (vers. 1-5), o profeta apresenta a personagem que será o instrumento de Deus na realização desse "reino" de justiça e de paz...

    Em primeiro lugar, o profeta anuncia que esse instrumento de Deus virá "da raiz de Jessé". Jessé era o pai de David; portanto, ele será da descendência de David (o que nos liga à promessa feita por Deus a David - cf. 2 Sm 7) e, presumivelmente, fará voltar esse tempo ideal de bem-estar, de abundância e de paz que o Povo de Deus conheceu durante o reinado ideal de David.

    Em segundo lugar, essa personagem será animada pelo Espírito de Deus ("ruah Jahwéh"). É o mesmo Espírito que ordenou o universo na aurora da criação (cf. Gn 1,2), que animou os heróis carismáticos de Israel (cf. Jz 3,10; 6,34; 11,29), que inspirou os profetas (cf. Nm 11,17; 1 Sm 10,6.10; 19,20; 2 Sm 23,2; 2 Re 2,9; Mi 3,8; Is 48,16; 61,1; Zac 7,12). Esse Espírito confere a esse enviado de Deus as virtudes eminentes dos seus antepassados: sabedoria e inteligência como Salomão, espírito de conselho e de fortaleza como David, espírito de conhecimento e de temor de Deus como os patriarcas e profetas (aos seis dons aqui enunciados, a tradução grega dos "Setenta" acrescentará a "piedade": é esta a origem da nossa lista dos sete dons do Espírito Santo).

    Da plenitude dos carismas brota o exercício da justiça e a construção de um "reino" onde os direitos dos mais pobres são respeitados e onde os oprimidos conhecerão a liberdade e a paz. Desse "reino" serão excluídas, definitivamente, a injustiça, a mentira, a opressão... Tal será o "reino" que o "messias" virá inaugurar.

    Na segunda parte do oráculo (vers. 6-9), o profeta apresenta - recorrendo a imagens muito belas - o quadro desse mundo novo que o "Messias" vai instaurar. A revolta do homem contra Deus (cf. Gn 3) havia introduzido no mundo fatores de desequilíbrio que quebraram a harmonia entre o homem e a natureza (cf. Gn 3,17-19), entre o homem e o seu irmão (cf. Gn 4)... Mas agora o "Messias" trará a paz e, dessa forma, cumprir-se-á o projeto inicial que Deus tinha para o mundo e para o homem: os animais selvagens e os animais domésticos viverão em harmonia (o lobo e o cordeiro; a pantera e o cabrito, o bezerro e o leão; a vaca e o urso) e todos eles estarão submetidos ao homem (representado pela criança - isto é, o homem na sua fragilidade máxima). A própria serpente (o animal que despoletou a desarmonia universal, ao estar na origem do afastamento do homem do Deus criador) comungará desta harmonia e desta paz sem fim: é a superação total do desequilíbrio, do conflito, da divisão que o pecado do homem introduziu no mundo.

    Destruídas as inimizades, superadas as desarmonias, o homem viverá em paz, em comunhão total com o seu Deus (vers. 9). No primeiro paraíso, o homem escolheu ser adversário de Deus e escolheu viver no orgulho e na autossuficiência; agora, por ação do "Messias", ele regressou à comunhão com o seu criador e passou a viver no "conhecimento de Deus". É o regresso ao paraíso original.

    ATUALIZAÇÃO
    Para a reflexão, considerar as seguintes questões:

    ¨  Para nós, cristãos, Jesus Cristo é o "Messias" que veio tornar realidade o sonho do profeta. Ele iniciou esse "reino" novo de justiça, de harmonia, de paz sem fim... Cheio do Espírito de Deus, Ele passou pelo mundo convidando os homens a tornarem-se "filhos de Deus" e a viverem no amor, na partilha, no dom da vida... Nós, seguidores de Jesus, temos dado um contributo efetivo para que o "Reino" se torne realidade no mundo?

     

    ¨  A Igreja deve ser o sinal vivo desse "reino" novo de justiça e de paz... É isso que acontece? Ela tem anunciado - com palavras e com gestos - o projeto de Jesus? As nossas comunidades cristãs e religiosas dão testemunho de harmonia, de entendimento, de amor sem limites?

    ¨  Que a realidade do "Reino" se concretize ou não, depende também daquilo que faço ou não faço. Em termos pessoais: o que é que, nas minhas atitudes, nos meus comportamentos, é contratestemunho e impede o nascimento do "Reino" da felicidade e da paz?

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 71 (72)

    Refrão: Nos dias do Senhor nascerá a justiça e a paz para sempre.

    Ó Deus, dai ao rei o poder de julgar
    e a vossa justiça ao filho do rei.
    Ele governará o vosso povo com justiça
    e os vossos pobres com equidade.

    Florescerá a justiça nos seus dias
    e uma grande paz até ao fim dos tempos.
    Ele dominará de um ao outro mar,
    do grande rio até aos confins da terra.

    Socorrerá o pobre que pede auxílio
    e o miserável que não tem amparo.
    Terá compaixão dos fracos e dos pobres
    e defenderá a vida dos oprimidos.

    O seu nome será eternamente bendito
    e durará tanto como a luz do sol;
    nele serão abençoadas todas as nações,
    todos os povos da terra o hão-de bendizer.

     

    LEITURA II - Rom 15, 4-9

    Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Romanos
    Irmãos:

    Tudo o que foi escrito no passado
    foi escrito para nossa instrução,
    a fim de que, pela paciência e consolação que vêm das Escrituras,
    tenhamos esperança.
    O Deus da paciência e da consolação vos conceda
    que alimenteis os mesmos sentimentos uns para com os outros,
    segundo Cristo Jesus,
    para que, numa só alma e com uma só voz,
    glorifiqueis a Deus, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo.
    Acolhei-vos, portanto, uns aos outros,
    como Cristo vos acolheu,
    para glória de Deus.
    Pois Eu vos digo que Cristo Se fez servidor dos judeus,
    para mostrar a fidelidade de Deus
    e confirmar as promessas feitas aos nossos antepassados.
    Por sua vez, os gentios dão glória a Deus pela sua misericórdia,
    como está escrito:
    «Por isso eu Vos bendirei entre as nações
    e cantarei a glória do vosso nome».

    AMBIENTE
    A Carta aos Romanos - já o dissemos no passado domingo - é uma carta de reconciliação, endereçada aos romanos, mas dirigida a toda a Igreja fundada por Jesus. Pretende - numa altura em que fundos culturais diversos e sensibilidades diferentes dividiam os cristãos vindos do judaísmo e os cristãos vindos do paganismo - afastar o perigo da divisão da Igreja e levar todos os crentes (judeo-cristãos e pagano-cristãos) a redescobrir a unidade da fé e a igualdade fundamental de todos diante de Deus. Desde que optaram por Cristo e receberam o batismo, todos receberam o dom de Deus, tiveram acesso à salvação e tornaram-se irmãos, chamados a viver no amor.

    O texto que nos é proposto pertence à segunda parte da carta. Nessa parte (que vai de Rm 12,1 a 15,13), Paulo exorta os cristãos a viver no amor; em concreto, dá aos cristãos algumas indicações de carácter prático acerca do comportamento que devem assumir para com os irmãos.

    MENSAGEM
    O texto que nos é apresentado como segunda leitura tem de ser entendido no contexto mais amplo de uma perícope que vai de 15,1 a 15,13. Literariamente, esta perícope está construída na base de dois parágrafos simétricos (cf. Rm 15,1-6 e 15,7-13) que apresentam uma mesma sequência e uma mesma organização: a) exortação; b) motivação cristológica; c) iluminação a partir da Escritura; d) súplica final.

    Na primeira parte da perícope (cf. Rm 15,1-6), Paulo exorta os cristãos a vencer qualquer tipo de egoísmo e de autossuficiência e a dar as mãos aos mais débeis e necessitados (a); como motivo para este comportamento, Paulo apresenta o exemplo de Cristo, que não procurou seguir um caminho de facilidade, mas escolheu o amor e o dom da vida (b); este comportamento que Paulo pede aos cristãos (e é aqui que começa o texto de hoje) é aquele que a Escritura - que foi escrita para nossa instrução - nos sugere (c); e, finalmente, Paulo pede ao "Deus da perseverança e da consolação" que dê aos cristãos de Roma a harmonia, a fim de que louvem a Deus com um só coração e uma só alma (d).

    Na segunda parte da perícope (cf. Rm 15,7-13), Paulo começa por exortar os crentes a não fazerem discriminações, mas a acolherem todos (a); como motivo para este comportamento, Paulo aponta o exemplo de Cristo, que acolheu todos os homens (b); e Paulo justifica o que disse atrás com o exemplo da Escritura (e é neste ponto que termina o trecho que a liturgia nos propõe como segunda leitura), citando explicitamente vários textos do Antigo Testamento (c); finalmente, Paulo pede ao "Deus da esperança" que cumule os crentes "de alegria e de paz, na fé" (d).

    O mais importante de tudo isto é a mensagem fundamental que sobressai nesta dupla estrutura: a comunidade deve viver em harmonia, acolhendo e ajudando os mais fracos, sem discriminar nem excluir ninguém, no amor e na partilha. Cristo é o exemplo que os membros da comunidade devem ter sempre diante dos olhos... Convém também não esquecer que o ser capaz de viver deste jeito é um dom de Deus, dom que os crentes devem pedir em todos os momentos ao Pai.

    ATUALIZAÇÃO
    Refletir as seguintes questões:

    ¨  A comunidade cristã, como rosto visível de Cristo no mundo, tem de ser o lugar do amor, da partilha fraterna, da harmonia, do acolhimento. No entanto, com bastante frequência encontramos comunidades onde os irmãos estão divididos: criticam os outros de forma avulsa, tomam atitudes agressivas que afastam os mais débeis, discriminam aqueles que não entram na sua "panelinha", estão aferrados ao poder e fazem tudo para dominar os outros e para afirmar a sua superioridade... Isto acontece na minha comunidade? Eu tenho algumas responsabilidades nessa situação? O que posso fazer para mudar as coisas?

    ¨  Convém não esquecer que a conversão à harmonia, à partilha com os mais pobres, ao amor fraterno, ao dom da vida é algo exigente, que não pode ser feito contando apenas com a boa vontade do homem; mas é algo que só pode ser feito com a força e com a ajuda de Deus... Lembro-me de pedir a Deus a sua ajuda para vencer o meu egoísmo e a minha autossuficiência e para amar verdadeiramente os meus irmãos? Estou disposto a ir ao seu encontro e a deixar que Ele converta o meu coração e a minha vida?

     

    ALELUIA - Lc 3, 4.6

    Aleluia. Aleluia.

    Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas
    e toda a criatura verá a salvação de Deus.

     

    EVANGELHO - Mt 3, 1-12

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
    Naqueles dias,
    apareceu João Baptista a pregar no deserto da Judeia, dizendo:
    «Arrependei-vos, porque está perto o reino dos Céus».
    Foi dele que o profeta Isaías falou, ao dizer:
    «Uma voz clama no deserto:
    'Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas'».
    João tinha uma veste tecida com pelos de camelo
    e uma cintura de cabedal à volta dos rins.
    O seu alimento eram gafanhotos e mel silvestre.
    Acorria a ele gente de Jerusalém,
    de toda a Judeia e de toda a região do Jordão;
    e eram batizados por ele no rio Jordão,
    confessando os seus pecados.
    Ao ver muitos fariseus e saduceus que vinham ao seu batismo,
    disse-lhes:
    «Raça de víboras,
    quem vos ensinou a fugir da ira que está para vir?
    Praticai ações
    que se conformem ao arrependimento que manifestais.
    Não penseis que basta dizer:
    'Abraão é o nosso pai',
    porque eu vos digo:
    Deus pode suscitar, destas pedras, filhos de Abraão.
    O machado já está posto à raiz das árvores.
    Por isso, toda a árvore que não dá fruto
    será cortada e lançada ao fogo.
    Eu batizo-vos com água,
    para vos levar ao arrependimento.
    Mas Aquele que vem depois de mim é mais forte do que eu
    e não sou digno de levar as suas sandálias.
    Ele batizar-vos-á no Espírito Santo e no fogo.
    Tem a pá na sua mão:
    há de limpar a eira e recolher o trigo no celeiro.
    Mas a palha, queimá-la-á num fogo que não se apaga».

     

    AMBIENTE
    Depois do Evangelho da Infância (cf. Mt 1-2), Mateus apresenta a figura que prepara os homens para acolher Jesus: João Baptista.

    João foi o guia carismático de um movimento de cariz popular, que anunciava a proximidade do juízo de Deus. Vivia no deserto de Judá, nas margens do rio Jordão. A sua mensagem estava centrada na urgência da conversão, pois o "juízo de Deus" estava iminente; incluía um rito de purificação pela água, um rito muito frequente, aliás, entre alguns grupos judeus da época. É possível que João estivesse, de alguma forma, relacionado com essa comunidade essénia que estava instalada em Qûmran: o tema do juízo de Deus e os rituais de purificação pela água faziam parte do dia a dia da comunidade essénia.

    Segundo a mais antiga tradição cristã, Jesus esteve muito relacionado com o movimento de João nos inícios da sua vida pública e alguns discípulos de João tornaram-se, a partir de certa altura, discípulos de Jesus (cf. Jo 1,35-42).

    Os primeiros cristãos identificaram João com o mensageiro anunciado em Is 40,3 e com Elias (2 Re 1,8) que, segundo a tradição judaica, anunciaria a chegada do Messias (Mt 11,14; 17,11; Mal 3,23-24 ou, noutras versões, 4,5-6). Nesta interpretação, João seria o precursor que vem preparar o caminho e Jesus o Messias, enviado por Deus para anunciar o reinado de Jahwéh.

     

    MENSAGEM
    Nesta primeira apresentação do Baptista, há vários fatores que nos interessa pôr em relevo: a figura, a mensagem, as reações ao anúncio e a comparação entre o batismo de João e o batismo de Jesus.

    A figura do Baptista é uma figura que, por si só, nos questiona e interpela. João aparece ligado ao deserto (o lugar das privações, do despojamento, mas também o lugar tradicional do encontro entre Jahwéh e Israel) e não ao Templo ou aos sítios "in" onde se reúne a sociedade seleta de Jerusalém; usa "uma veste tecida com pelos de camelo e uma cintura de cabedal à volta dos rins" (é dessa forma que se vestia, também, Elias - cf. 2 Re 1,8), não as roupas finas, com pregas cuidadosamente estudadas, dos sacerdotes da capital; a sua alimentação frugal (de "gafanhotos e mel silvestre") está em profundo contraste com as iguarias finas que enchem as mesas da classe dirigente... João é, portanto, um homem que - não só com palavras, mas também com a sua própria pessoa - questiona um certo jeito de viver, voltado para as coisas, para os bens materiais, para o "ter". Convida a uma conversão, a uma mudança de valores, a esquecer o supérfluo, para dar atenção ao essencial.

    O que é que João prega? Mateus resume o anúncio de João numa frase: "convertei-vos ("metanoeite"), porque está perto o Reino dos céus" (vers. 2). O verbo grego (metanoéo) aqui utilizado tem, normalmente, o sentido de "mudar de mentalidade"; mas aqui deve ser visto na perspetiva do Antigo Testamento, isto é, como um apelo a um retorno incondicional ao Deus da Aliança.

    Porque é que esta "conversão" é tão urgente? Porque o "Reino dos céus" está perto. Muito provavelmente, João ligava a vinda iminente do "Reino" ao "juízo de Deus", que iria destruir os maus e inaugurar, com os bons, um mundo novo (por isso, fala da "cólera que está para vir" - vers. 7; e acrescenta: "o machado já está posto à raiz das árvores. Por isso, toda a árvore que não dá fruto será cortada e lançada ao fogo" - vers. 10). A conversão era urgente, na perspetiva de João, pois aproximava-se a intervenção justiceira de Deus na história humana; quem não estivesse do lado de Deus seria aniquilado... É uma perspetiva muito em voga em certos ambientes apocalípticos da época, nomeadamente na teologia dos essénios de Qûmran.

    Quem são os destinatários desta mensagem? Aparentemente, é uma mensagem destinada a todos. Mateus fala da "gente que acorria de Jerusalém, de toda a Judeia e de toda a região do Jordão" e que era batizada "por ele no rio Jordão, confessando os seus pecados" (vers. 5-6).

    No entanto, Mateus faz uma referência especial aos fariseus e saduceus, para quem João tem palavras duríssimas: "raça de víboras, quem vos ensinou a fugir da ira que está para vir? Praticai ações que se conformem ao arrependimento que manifestais. Não penseis que basta dizer: «Abraão é nosso pai»..." (vers. 7-9). Trata-se de pessoas que "à cautela" ou por curiosidade vêm ao encontro de João; no entanto, sentem que o "juízo de Deus" não os atingirá porque eles são filhos de Abraão, são membros privilegiados do Povo eleito e estão do lado dos bons: Deus não terá outro remédio senão salvá-los, quando vier para julgar o mundo e condenar os maus. João avisa que não há salvação assegurada obrigatoriamente a quem tem o nome inscrito nos registos do povo eleito: é preciso viver em contínua conversão e fazer as obras de Deus: "toda a árvore que não dá fruto, será cortada e lançada ao fogo" (vers. 10).

    Neste texto aparece também, em relevo, um rito praticado por João. Consistia na imersão na água do rio Jordão das pessoas que aderiam a esse apelo à conversão. Era, aliás, um rito praticado em certos ambientes judaicos para significar a purificação do coração (nos ambiente essénios, os banhos quotidianos expressavam o esforço em direção a uma vida pura e a aspiração à graça purificadora)... O batismo de João significava o arrependimento, o perdão dos pecados e a agregação ao "resto de Israel", subtraído à ira de Deus.

    No entanto, João avisa: "aquele que vem depois de mim (...) batizar-vos-á no Espírito Santo e no fogo" (vers. 11). De facto, o batismo de Jesus vai muito além do batismo de João: confere a quem o recebe a vida de Deus (Espírito) e torna-o "filho de Deus"; além disso, implica uma incorporação na Igreja (a comunidade dos que aderiram à proposta de salvação que Cristo trouxe) e a participação ativa na missão da Igreja (cf. At 2,1-4). Não significa, apenas, o arrependimento e o perdão dos pecados; significa um quadro de vida completamente novo, uma relação de filiação com Deus e de fraternidade com Jesus e com todos os outros batizados.

     

    ATUALIZAÇÃO
    A reflexão pode partir dos seguintes dados:

    ¨  A questão dominante que o Evangelho de hoje nos apresenta é a da conversão. Não é possível acolher "aquele que vem" se o nosso coração estiver cheio de egoísmo, de orgulho, de autossuficiência, de preocupação com os bens materiais... É preciso, portanto, uma mudança da nossa mentalidade, dos nossos valores, dos nossos comportamentos, das nossas atitudes, das nossas palavras; é preciso um despojamento de tudo o que rouba espaço ao "Senhor que vem". Estou disposto a esta mudança, para que no meu coração haja lugar para Jesus? O que é que, prioritariamente, deve mudar na minha vida?

    ¨  A figura de João Baptista obriga-nos a questionar as nossas prioridades e valores fundamentais. Ele não se apresenta de "smoking", pois a sua prioridade não é brilhar em alguma festa do jet-set; nem usa gravata e camisa de seda, pois a sua prioridade não é impressionar os chefes ou mostrar que é um homem de sucesso em termos de ganhos anuais; nem petisca pratos delicados com molhos esquisitos e nomes franceses, pois a sua prioridade não é a satisfação de apetites físicos; nem promete bem-estar e riqueza aos seus interlocutores, pois a sua prioridade não é receber aplausos das massas; nem busca o apoio da hierarquia civil ou religiosa, pois a sua prioridade não é o triunfo, as honras, o poder... João Baptista é alguém para quem a prioridade é o anúncio do "Reino dos céus". Ora, o "Reino" é despojamento, simplicidade, amor total, partilha, dom da vida... São esses valores que ele procura anunciar, com palavras e com atitudes. E quanto a mim, quais são os valores que me fazem "correr"? Quais são as minhas prioridades? Os meus valores são os valores do "Reino" ou são esses valores efémeros e fúteis a que a civilização ocidental dá tanta importância, mas que não trazem nada de duradouro e de verdadeiro à vida dos homens?

    ¨  O texto evangélico deixa claro que não chega ser "filho de Abraão" para ter acesso à salvação que Jesus veio oferecer, mas é preciso viver uma vida de fidelidade a Deus. Quer dizer: não chega ter o nome inscrito no livro de registos de batismo da paróquia, nem ter casado na Igreja, nem ter posto os filhos na catequese e aparecer lá para tirar fotografias na festa da primeira comunhão (o estatuto do "cristão não praticante" faz tanto sentido como um círculo quadrado); mas é preciso uma conversão séria, empenhada, nunca acabada ao "Reino" e aos seus valores e uma vida coerente com a fé que escolhemos quando fomos batizados.

    ¨  João deixa claro que receber o batismo de Jesus é receber o batismo do Espírito... Equivale a aceitar ser "filho de Deus", a viver em comunhão com Deus, no amor e na partilha com os irmãos que caminham ao nosso lado. É esse o caminho que eu procuro, dia a dia, percorrer?

     

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 2.º DOMINGO DO ADVENTO
    (algumas são adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.

    Ao longo dos dias da semana anterior ao 2.º Domingo do Advento, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. PRESTAR ATENÇÃO À VIRGEM MARIA.

    A proximidade da Solenidade da Imaculada Conceição, a celebrar nesta semana, cujo dogma foi proclamado a 8 de dezembro de 1854 pelo Papa Pio IX, pode convidar-nos hoje a uma atenção particular à Virgem Maria. Esta atenção pode ser expressa por uma decoração mais cuidada de uma imagem da Virgem. Mas ao longo da celebração, ou talvez no final da missa, algumas crianças podem levar um ramo de flores e/ou algumas lamparinas acesas que colocam aos pés da imagem, enquanto a assembleia canta um cântico a Nossa Senhora com tonalidade do Advento ou alguém lê uma oração ou um poema.

    3. JOÃO BAPTISTA, PROFETA-PERCURSOR.

    João Baptista é, em cada ano, uma grande figura deste tempo do Advento. Falamos bastante dele, mas será que o conhecemos bem? Na preparação da liturgia, pode-se comunicar melhor como João Baptista tem um verdadeiro lugar de charneira entre o Antigo e o Novo Testamento. Pode ser uma maneira de sublinhar, nas celebrações destes domingos, a iminência da vinda de Cristo, a iminência do Reino. As admonições e algumas intenções da oração dos fiéis podem ser redigidas nesse sentido. Ou ainda, porque não viver de perto esta celebração com João Baptista? Ele pode ser mencionado no início do rito penitencial, no início do credo, no início do "Cordeiro de Deus" (foi João Baptista que assim designou Jesus).

    4. BILHETE DE EVANGELHO.

    Aos homens à procura de um coração novo, Deus dá uma terra nova. Jesus veio para falar de novidade: "Convertei-vos! Acreditai na Boa Nova!" Temos necessidade de ouvir palavras novas (ternura, amor, perdão, solidariedade, respeito...) que façam calar as palavras antigas (violência, ódio, vingança, indiferença, racismo...). Temos necessidade de ver gestos novos (assinatura de paz, reconciliação, dom, partilha...) que façam desaparecer os gestos antigos (declaração de guerra, rancor, crispação, egoísmo...). Preparar-se para o Natal... não será dispor-se a falar uma linguagem nova e a fazer novas ações? Essa poderá ser a nossa maneira de acolher Aquele que vem fazer todas as coisas novas. Mas não as fará sem nós...

    5. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.

    Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.

    No final da primeira leitura:
    Bendito sejas, nosso Pai, por nos teres enviado e dado o teu Filho Jesus. N'Ele reconhecemos a plenitude do teu Espírito: sabedoria, discernimento, conselho, fortaleza, conhecimento e piedade.
    Nós Te pedimos pela nossa terra: que o conhecimento de Jesus lhe obtenha a paz, realizando o tempo em que o lobo habitará com o cordeiro.

    No final da segunda leitura:
    Nós Te bendizemos pelo dom dos livros santos que lemos nas nossas assembleias e pelo dom do teu Filho, que Se fez servidor da nossa humanidade e nos acolheu, apesar dos nossos pecados.
    Nós Te pedimos por todas as comunidades cristãs: faz com que estejamos de acordo e vivamos em comunhão segundo o teu Espírito Santo.

    No final do Evangelho:
    Nós Te damos graças por João Baptista, o precursor, pelos apelos à conversão e pelo batismo no Espírito, que nos incorporou no teu Filho.
    Abrimos as mãos para Ti e pedimos-Te ainda por nós mesmos: pelo teu Espírito, produz nos nossos corações os frutos que esperas.

     

    6. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.

    Pode-se escolher a Oração Eucarística II, pois relaciona-se mais explicitamente com os textos da liturgia da Palavra de hoje...

     

    7. PALAVRA EXPLICADA 1: ESCRITURAS OU LIVROS SAGRADOS.

    No início da segunda leitura deste domingo, o apóstolo refere-se às Escrituras, que se poderiam denominar também Livros Sagrados. Tais referências são frequentes no Novo Testamento. Assim, Jesus podia mesmo dizer que as Escrituras  dão testemunho d'Ele (Jo 5,39) e os evangelistas apresentam, muitas vezes, as suas palavras e os seus atos como o cumprimento das Escrituras (Mt 1,22; 2,15; etc.). Trata-se aqui dos Livros que os cristãos consideram como constituindo o Antigo Testamento (expressão empregue pelo apóstolo Paulo, 2 Cor 3,14) e aos quais juntaram progressivamente os escritos que constituem o Novo Testamento. O catálogo dos livros reconhecidos, que se chama o Cânon (ou regra) das Escrituras, foi estabelecido pela prática litúrgica. Dito de outro modo, eram considerados como Livros Sagrados aqueles que poderiam ser lidos nas assembleias das sinagogas, para os judeus (como Isaías em Lc 4,17), ou nas igrejas, para os cristãos (primeira menção em 1 Ts 5,27).

     

    8. PALAVRA EXPLICADA 2: FILHOS DE ABRAÃO.

    Na Oração Eucarística I, recordamos que a Deus Lhe agradou "acolher o sacrifício do nosso pai Abraão". Assim, como cristãos, reconhecemo-nos filhos de Abraão. Este título refere-se à Aliança que Deus fez com Abraão, prometendo-lhe uma descendência inumerável (Gen 15,1-6). Ora, Abraão e a sua mulher Sara, estéril até essa altura, eram de idade avançada (Gen 18,9-15). O nascimento do seu filho, Isaac, foi para eles um dom inesperado de Deus. Em seguida, Deus recusou que este filho Lhe fosse oferecido em sacrifício (Gen 22,11-18). Isaac foi, pois, reconhecido como o filho da promessa e Abraão como o pai dos crentes, porque tinha dado a Deus a sua plena confiança (Gen 15,6). Isso foi amplamente comentado nos escritos do Novo Testamento, para demonstrar que a verdadeira descendência de Abraão não vinha da geração física, mas da fé: são filhos de Abraão todos aqueles que dão a Deus a sua confiança sem reservas; é por esta fé que são justificados por Deus e não em razão dos seus próprios atos (Rom 4, etc.).

     

    9. ATENÇÃO ÀS CRIANÇAS: A MARAVILHOSA HISTÓRIA CONTADA POR ISAÍAS.

    A primeira leitura deste domingo é uma página profética muito bela. Se houver oportunidade de passar algum tempo com as crianças durante a liturgia da Palavra, pode-se utilizar algumas linguagens mais adaptadas: explicar às crianças que Isaías representa aqui a felicidade que Jesus nos traz (harmonia, paz, reconciliação para toda a criação); com as cartas de jogo que representam diversos animais, pode-se ver os que podem estar juntos ou não (por exemplo, um lobo e um cordeiro juntos, o que pode acontecer?); depois, descobrimos que, em Jesus, a felicidade é possível. O que Isaías imagina para os animais pode acontecer também com as pessoas, se elas quiserem...

     

    10. PALAVRA PARA O CAMINHO.

    Convertei-vos! Um sonho muito belo este de Isaías! No estado atual do mundo, como imaginar a sua realização? A chave é-nos dada por João: "Convertei-vos!" Reconhecer o nosso pecado! Deixar o fogo do Espírito queimar-nos e transformar-nos! É a partir de cada um de nós que começa o mundo novo. É a partir do coração novo de cada um de nós que o mundo poderá ter um novo coração! Mais uma semana para rezar e praticar a conversão! Mãos à obra!

     

     

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    Proposta para
    Escutar, Partilhar, Viver e Anunciar a Palavra nas Comunidades Dehonianas
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • Solenidade da Imaculada Conceição - Ano A

    Solenidade da Imaculada Conceição - Ano A


    8 de Dezembro, 2022

    ANO A
    SOLENIDADE DA IMACULADA CONCEIÇÃO DA VIRGEM SANTA MARIA
    Padroeira de Portugal e Moçambique

    Tema da Solenidade da Imaculada Conceição

    Na Solenidade da Imaculada Conceição somos convidados a equacionar o tipo de resposta que damos aos desafios de Deus. Ao propor-nos o exemplo de Maria de Nazaré, a liturgia convida-nos a acolher, com um coração aberto e disponível, os planos de Deus para nós e para o mundo.
    A segunda leitura garante-nos que Deus tem um projeto de vida plena, verdadeira e total para cada homem e para cada mulher, um projeto que desde sempre esteve na mente do próprio Deus. Esse projeto, apresentado aos homens através de Jesus Cristo, exige de cada um de nós uma resposta decidida, total e sem subterfúgios.
    A primeira leitura mostra, recorrendo à história mítica de Adão e Eva, o que acontece quando rejeitamos as propostas de Deus e preferimos caminhos de egoísmo, de orgulho e de autossuficiência... Viver à margem de Deus leva, inevitavelmente, a trilhar caminhos de sofrimento, de destruição, de infelicidade e de morte.
    O Evangelho apresenta a resposta de Maria ao plano de Deus. Ao contrário de Adão e Eva, Maria rejeitou o orgulho, o egoísmo e a autossuficiência e preferiu conformar a sua vida, de forma total e radical, com os planos de Deus. Do seu "sim" total, resultou salvação e vida plena para ela e para o mundo.

    LEITURA I - Gen 3, 9-15.20

    Leitura do Livro do Génesis

    Depois de Adão ter comido da árvore,
    o Senhor Deus chamou-o e disse-lhe: «Onde estás?»
    Ele respondeu:
    «Ouvi o rumor dos vossos passos no jardim
    e, como estava nu, tive medo e escondi-me».
    Disse Deus:
    «Quem te deu a conhecer que estavas nu?
    Terias tu comido dessa árvore, da qual te proibira comer?»
    Adão respondeu:
    «A mulher que me destes por companheira
    deu-me do fruto da árvore e eu comi».
    O Senhor Deus perguntou à mulher:
    «Que fizeste?»
    E a mulher respondeu:
    «A serpente enganou-me e eu comi».
    Disse então o Senhor Deus à serpente:
    «Por teres feito semelhante coisa,
    maldita sejas entre todos os animais domésticos
    e entre todos os animais selvagens.
    Hás de rastejar e comer do pó da terra
    todos os dias da tua vida.
    Estabelecerei inimizade entre ti e a mulher,
    entre a tua descendência e a descendência dela.
    Esta te esmagará a cabeça
    e tu a atingirás no calcanhar».
    O homem deu à mulher o nome de 'Eva',
    porque ela foi a mãe de todos os viventes.

    AMBIENTE

    O relato jahwista de Gn 2,4b-3,24 sobre as origens da vida e do pecado, ao qual pertence o texto que hoje nos é proposto como primeira leitura, é, de acordo com a maioria dos comentadores, um texto do séc. X a.C., que deve ter aparecido em Judá na época do rei Salomão. Apresenta-se num estilo exuberante e vivo e parece ser obra de um catequista popular, que ensina recorrendo a imagens sugestivas, coloridas e fortes.
    Não podemos, de forma nenhuma, ver neste texto uma reportagem jornalística de acontecimentos passados na aurora da humanidade. A finalidade do autor não é científica ou histórica, mas teológica: mais do que ensinar como o mundo e o homem apareceram, ele quer dizer-nos que na origem da vida e do homem está Jahwéh e que na origem do mal e do pecado estão as opções erradas do homem. Trata-se, portanto, de uma página de catequese.
    Esta longa reflexão sobre as origens da vida e do mal que desfeia o mundo está estruturada num esquema tripartido, com duas situações claramente opostas e uma realidade central que aparece como charneira e ao redor da qual giram a primeira e a terceira parte...
    Na primeira parte (cf. Gn 2,4b-25), o autor descreve a criação do paraíso e do homem; apresenta a criação de Deus como um espaço ideal de felicidade, onde tudo é bom e o homem vive em comunhão total com o criador e com as outras criaturas.
    Na segunda parte (cf. Gn 3,1-7), o autor descreve o pecado do homem e da mulher; mostra como as opções erradas do homem introduziram na comunhão do homem com Deus e com o resto da criação fatores de desequilíbrio e de morte.
    Na terceira parte (cf. Gn 3,8-24), o autor apresenta o homem e a mulher confrontados com o resultado das suas opções erradas e as consequências que daí advieram, quer para o homem, quer para o resto da criação.
    Na perspetiva do catequista jahwista, Deus criou o homem para a felicidade... Então, pergunta ele, como é que hoje conhecemos o egoísmo, a injustiça, a violência que desfeiam o mundo? A resposta é: algures na história humana, o homem que Deus criou livre e feliz fez escolhas erradas e introduziu na criação boa de Deus dinamismos de sofrimento e de morte.
    O nosso texto pertence à terceira parte do tríptico. Os personagens intervenientes são Deus, que "passeia no jardim à brisa do dia" (vers. 8a), Adão e Eva, que se esconderam de Deus por entre o arvoredo do jardim (vers. 8b).

    MENSAGEM

    A nossa leitura começa com a "investigação" de Deus... Antes de proferir a sua acusação, Deus - o acusador e juiz - investiga, descobre e estabelece os factos.
    Primeira pergunta feita por Deus ao homem: "onde estás?" A resposta do homem é já uma confissão da sua culpabilidade: "ouvi o rumor dos vossos passos no jardim e, como estava nu, tive medo e escondi-me" (vers. 9-10). A vergonha e o medo são sinal de uma perturbação interior, de uma rutura com a anterior situação de inocência, de harmonia, de serenidade e de paz. Como é que o homem chegou a esta situação? Evidentemente, desobedecendo a Deus e percorrendo caminhos contrários àqueles que Deus lhe havia proposto. A resposta do homem trai, portanto, o seu segredo e a sua culpa.
    Depois desta constatação, a segunda pergunta feita por Deus ao homem é meramente retórica: "terias tu comido dessa árvore, da qual te proibira de comer?" (vers. 11). A árvore em causa, a "árvore do conhecimento do bem e do mal", significa o orgulho, a autossuficiência, o prescindir de Deus e das suas propostas, o querer decidir por si só o que é bem e o que é mal, o pôr-se a si próprio em lugar de Deus, o reivindicar autonomia total em relação ao criador. A situação do homem, perturbado e em rutura, é já uma resposta clara à pergunta de Deus... É evidente que o homem "comeu da árvore proibida", isto é, escolheu um caminho de orgulho e de autossuficiência em relação a Deus. Daí a vergonha e o medo.
    Ao defender-se, o homem acusa a mulher e, ao mesmo tempo, acusa veladamente o próprio Deus pela situação em que está: "a mulher que me deste por companheira deu-me do fruto da árvore e eu comi" (vers. 12). Adão representa essa humanidade que, mergulhada no egoísmo e na autossuficiência, esqueceu os dons de Deus e vê em Deus um adversário; por outro lado, a resposta de Adão mostra, igualmente, uma humanidade que quebrou a sua unidade e se instalou na cobardia, na falta de solidariedade, no ódio. Escolher caminhos contrários aos de Deus não pode senão conduzir a uma vida de rutura com Deus e com os outros irmãos.
    Vem, depois, a "defesa" da mulher: "a serpente enganou-me e eu comi" (vers. 13). Entre os povos cananeus, a serpente estava ligada aos rituais de fertilidade e de fecundidade. Os israelitas deixavam-se fascinar por esses cultos e, com frequência, abandonavam Jahwéh para seguir os rituais religiosos dos cananeus e assegurar, assim, a fecundidade dos campos e dos rebanhos. Na época em que o autor jahwista escreve, a serpente era, pois, o "fruto proibido", que seduzia os crentes e os levava a abandonar a Lei de Deus. A "serpente" é, neste contexto, um símbolo literário de tudo aquilo que afastava os israelitas de Jahwéh. A resposta da "mulher" confirma tudo aquilo que até agora estava sugerido: é verdade, a humanidade que Deus criou prescindiu de Deus, ignorou as suas propostas e enveredou por outros caminhos. Achou, no seu egoísmo e autossuficiência, que podia encontrar a verdadeira vida à margem de Deus, prescindindo das propostas de Deus.
    Diante disto, não são precisas mais perguntas. Está claramente definida a culpa de uma humanidade que pensou poder ser feliz em caminhos de egoísmo e de autossuficiência, totalmente à margem dos caminhos que foram propostos por Deus.
    Que tem Deus a acrescentar? Pouco mais, a não ser condenar como falsos e enganosos esses cultos e essas tentações que seduziam os israelitas e os colocavam fora da dinâmica da Aliança e dos mandamentos (vers. 14-15). O nosso catequista jahwista sabe que a serpente é um animal miserável, que passa toda a sua existência mordendo o pó da terra. O autor vai servir-se deste dado para pintar, plasticamente, a condenação radical de tudo aquilo que leva os homens a afastar-se dos caminhos de Deus e a enveredar por caminhos de egoísmo e de autossuficiência.
    O que é que significa a inimizade e a luta entre a "descendência" da mulher e a "descendência" da serpente? Provavelmente, o autor jahwista está apenas a dar uma explicação etiológica (uma "etiologia" é uma tentativa de explicar o porquê de uma determinada realidade que o autor conhece no seu tempo, a partir de um pretenso acontecimento primordial, que seria o responsável pela situação atual) para o facto de a serpente inspirar horror aos humanos e de toda a gente lhe procurar "esmagar a cabeça"; mas a interpretação judaica e cristã viu nestas palavras uma profecia messiânica: Deus anuncia que um "filho da mulher" (o Messias) acabará com as consequências do pecado e inserirá a humanidade numa dinâmica de graça.
    Atenção: o autor sagrado não está a falar de um pecado cometido nos primórdios da humanidade pelo primeiro homem e pela primeira mulher; mas está a falar do pecado cometido por todos os homens e mulheres de todos os tempos... Ele está apenas a ensinar que a raiz de todos os males está no facto de o homem prescindir de Deus e construir o mundo a partir de critérios de egoísmo e de autossuficiência. Não conhecemos bem este quadro?

    ATUALIZAÇÃO

    • Um dos mistérios que mais questiona os nossos contemporâneos é o mistério do mal... Esse mal que vemos, todos os dias, tornar sombria e deprimente essa "casa" que é o mundo, vem de Deus, ou vem do homem? A Palavra de Deus responde: o mal nunca vem de Deus... Deus criou-nos para a vida e para a felicidade e deu-nos todas as condições para imprimirmos à nossa existência uma dinâmica de vida, de felicidade, de realização plena.

    • O mal resulta das nossas escolhas erradas, do nosso orgulho, do nosso egoísmo e autossuficiência. Quando o homem escolhe viver orgulhosamente só, ignorando as propostas de Deus e prescindindo do amor, constrói cidades de egoísmo, de injustiça, de prepotência, de sofrimento, de pecado... Quais os caminhos que eu escolho? As propostas de Deus fazem sentido e são, para mim, indicações seguras para a felicidade, ou prefiro ser eu próprio a fazer as minhas escolhas, à margem das propostas de Deus?

    • O nosso texto deixa também claro que prescindir de Deus e caminhar longe dele leva o homem ao confronto e à hostilidade com os outros homens e mulheres. Nasce, então, a injustiça, a exploração, a violência. Os outros homens e mulheres deixam de ser irmãos para passarem a ser ameaças ao próprio bem-estar, à própria segurança, aos próprios interesses. Como é que eu me situo face aos meus irmãos? Como é que eu me relaciono com aqueles que são diferentes, que invadem o meu espaço e interesses, que me questionam e interpelam?

    • O nosso texto ensina, ainda, que prescindir de Deus e dos seus caminhos significa construir uma história de inimizade com o resto da criação. A natureza deixa de ser, então, a casa comum que Deus ofereceu a todos os homens como espaço de vida e de felicidade, para se tornar algo que eu uso e exploro em meu proveito próprio, sem considerar a sua dignidade, beleza e grandeza. O que é que a criação de Deus significa para mim: algo que eu posso explorar de forma egoísta, ou algo que Deus ofereceu a todos os homens e mulheres e que eu devo respeitar e guardar com amor?

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 97 (98)

    Refrão: Cantai ao Senhor um cântico novo:
    o Senhor fez maravilhas.

    Cantai ao Senhor um cântico novo,
    pelas maravilhas que Ele operou.
    A sua mão e o seu santo braço
    Lhe deram a vitória.

    O Senhor deu a conhecer a salvação,
    revelou aos olhos das nações a sua justiça.
    Recordou-Se da sua bondade e fidelidade
    em favor da casa de Israel.

    Os confins da terra puderam ver
    a salvação do nosso Deus.
    Aclamai o Senhor, terra inteira,
    exultai de alegria e cantai.

    LEITURA II - Ef 1, 3-6.11-12

    Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Efésios

    Bendito seja Deus, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo,
    que do alto dos Céus nos abençoou
    com toda a espécie de bênçãos espirituais em Cristo.
    N'Ele nos escolheu, antes da criação do mundo,
    para sermos santos e irrepreensíveis,
    em caridade, na sua presença.
    Ele nos predestinou, conforme a benevolência da sua vontade,
    a fim de sermos seus filhos adotivos, por Jesus Cristo,
    para louvor da sua glória
    e da graça que derramou sobre nós, por seu amado Filho.
    Em Cristo fomos constituídos herdeiros,
    por termos sido predestinados,
    segundo os desígnios d'Aquele que tudo realiza
    conforme a decisão da sua vontade,
    para sermos um hino de louvor da sua glória,
    nós que desde o começo esperámos em Cristo.

    AMBIENTE

    A cidade de Éfeso, capital da Província romana da Ásia, estava situada na costa ocidental da Ásia Menor. O seu importante porto e a sua numerosa população, faziam dela uma cidade florescente. Paulo passou em Éfeso na sua segunda viagem missionária (cf. At 18,19-21) e, durante a sua terceira viagem missionária, fez de Éfeso o quartel-general, a partir do qual evangelizou toda a zona ocidental da Ásia Menor.
    A Carta aos Efésios é, provavelmente, um dos exemplares de uma "carta circular" enviada a várias igrejas da Ásia Menor, numa altura em que Paulo está na prisão (em Roma?). O seu portador é um tal Tíquico. Estamos por volta dos anos 58/60.
    Alguns veem nesta carta uma espécie de síntese da teologia paulina, numa altura em que a missão do apóstolo está praticamente terminada no oriente. O tema mais importante da Carta aos Efésios é aquilo que o autor chama "o mistério": trata-se do projeto salvador de Deus, definido e elaborado desde sempre, escondido durante séculos, revelado e concretizado plenamente em Jesus, comunicado aos apóstolos e, nos "últimos tempos", tornado presente no mundo pela Igreja.
    O texto que nos é hoje proposto aparece no início da carta. É parte de um hino litúrgico que deve ter circulado nas comunidades cristãs antes de ser enxertado aqui por Paulo. Este hino dá graças pela ação do Pai (cf. Ef 1,3-6), do Filho (cf. Ef 1,7-12) e do Espírito Santo (cf. Ef 1,13-14) no sentido de oferecer aos homens a salvação.

    MENSAGEM

    A ação de graças dirige-se a Deus, pois Ele é a fonte última de todas as graças concedidas aos homens. Essas graças atingiram os homens através do Filho, Jesus Cristo.
    Qual é então, segundo este hino, a ação do Pai?
    O Pai, no seu amor, elegeu-nos desde sempre, "antes da criação do mundo". Elegeu-nos para quê? A resposta é: "para sermos santos e irrepreensíveis". A palavra "santo" indica a situação de alguém que foi separado do mundo e consagrado a Deus, para o serviço de Deus; a palavra "irrepreensível" era usada para falar das vítimas oferecidas em sacrifício a Deus, que deviam ser imaculadas e sem defeito... Significa, pois, uma santidade, isto é, uma consagração a Deus verdadeira e radical.
    Além de nos eleger, o Pai predestinou-nos "para sermos seus filhos adotivos". Através de Cristo, o Pai ofereceu-nos a sua vida e integrou-nos na sua família na qualidade de filhos. O fim desta ação de Deus é o louvor da sua glória.
    "Eleição" e "adoção como filhos" resultam do imenso amor de Deus pelos homens, um amor que é gratuito, incondicional e radical.
    E Jesus Cristo, o Filho, que papel teve neste processo?
    Nos vers. 7-10, que, no entanto, a liturgia deste dia não conservou, o autor do hino refere-se ao sangue derramado de Cristo e ao seu significado redentor. A morte de Jesus na cruz é o sinal evidente do espantoso amor de Deus pelos homens; e dessa forma, Deus ensinou-nos a viver no amor, no amor total e radical. Através de Cristo, Deus derramou sobre nós a sua graça, tornando-nos pessoas novas e diferentes, capazes de viver no amor. Assim, Deus manifestou-nos o seu projeto de salvação, que o hino chama "o mistério", e que consiste em levar-nos a uma identificação plena com Jesus, na sua ilimitada capacidade de amar e de dar vida, a uma unidade e harmonia totais com Jesus. Identificando-nos com Cristo e ensinando-nos a viver no amor total e radical, Deus reconciliou-nos consigo, com todos os outros e com a própria natureza. Da ação redentora de Cristo nasceu, pois, um Homem Novo, capaz de um novo tipo de relacionamento com Deus, com os outros homens e mulheres e com toda a criação, não marcado pelo egoísmo, pelo orgulho, pela autossuficiência, mas marcado pelo amor e pelo dom da vida.
    Dessa forma, e voltamos agora a retomar o texto que a liturgia deste dia nos propõe, em Cristo fomos constituídos filhos de Deus e herdeiros da salvação, conforme o projeto de Deus preparado desde toda a eternidade em nosso favor (vers. 11-12).

    ATUALIZAÇÃO

    • O nosso texto afirma, de forma clara, que Deus tem um projeto de vida plena e total para os homens, um projeto que desde sempre esteve na mente de Deus. É muito importante termos isto em conta: não somos um acidente de percurso na evolução inexorável do cosmos, mas somos atores principais de uma história de amor que o nosso Deus sempre sonhou e que Ele quis escrever e viver connosco... No meio das nossas desilusões e dos nossos sofrimentos, da nossa finitude e do nosso pecado, dos nossos medos e dos nossos dramas, não esqueçamos que somos filhos amados de Deus, a quem Ele oferece continuamente a vida definitiva, a verdadeira felicidade.

    • De acordo com o nosso texto, Deus "elegeu-nos... para sermos santos e irrepreensíveis". Já vimos que "ser santo" significa ser consagrado para o serviço de Deus. O que é que isto implica em termos concretos? Entre outras coisas, implica tentar descobrir o plano de Deus, o projeto que Ele tem para cada um de nós e concretizá-lo dia a dia com verdade, fidelidade e radicalidade. No meio das solicitações do mundo e das exigências da nossa vida profissional, social e familiar, temos tempo para Deus, para dialogar com Ele e para tentar perceber os seus projetos e propostas? E temos disponibilidade e vontade de concretizar as suas propostas, mesmo quando elas não são conciliáveis com os nossos interesses pessoais?

    • O nosso texto afirma, ainda, a centralidade de Cristo nesta história de amor que Deus quis viver connosco... Jesus veio ao nosso encontro, cumprindo com radicalidade a vontade do Pai e oferecendo-se até à morte para nos ensinar a viver no amor. Como é que assumimos e vivemos essa proposta de amor que Jesus nos apresentou? Aprendemos com Ele a amar sem exceção e com radicalidade?

    ALELUIA - cf. Lc 1, 28

    Aleluia. Aleluia.

    Ave, Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco,
    bendita sois Vós entre as mulheres.

    EVANGELHO - Lc 1, 26-38

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas

    Naquele tempo,
    o Anjo Gabriel foi enviado por Deus
    a uma cidade da Galileia chamada Nazaré,
    a uma Virgem desposada com um homem chamado José.
    O nome da Virgem era Maria.
    Tendo entrado onde ela estava, disse o Anjo:
    «Ave, cheia de graça, o Senhor está contigo».
    Ela ficou perturbada com estas palavras
    e pensava que saudação seria aquela.
    Disse-lhe o Anjo:
    «Não temas, Maria,
    porque encontraste graça diante de Deus.
    Conceberás e darás à luz um Filho,
    a quem porás o nome de Jesus.
    Ele será grande e chamar-Se-á Filho do Altíssimo.
    O Senhor Deus Lhe dará o trono de seu pai David;
    reinará eternamente sobre a casa de Jacob
    e o seu reinado não terá fim».
    Maria disse ao Anjo:
    «Como será isto, se eu não conheço homem?».
    O Anjo respondeu-lhe:
    «O Espírito Santo virá sobre ti
    e a força do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra.
    Por isso o Santo que vai nascer será chamado Filho de Deus.
    E a tua parenta Isabel concebeu também um filho na sua velhice
    e este é o sexto mês daquela a quem chamavam estéril;
    porque a Deus nada é impossível».
    Maria disse então:
    «Eis a escrava do Senhor;
    faça-se em mim segundo a tua palavra».

    AMBIENTE

    O texto que nos é hoje proposto pertence ao "Evangelho da Infância" na versão de Lucas. De acordo com os biblistas atuais, os textos do "Evangelho da Infância" pertencem a um género literário especial, chamado homologese. Este género não pretende ser um relato jornalístico e histórico de acontecimentos; mas é, sobretudo, uma catequese destinada a proclamar certas realidades salvíficas: que Jesus é o Messias, que Ele vem de Deus, que Ele é o "Deus connosco". Desenvolve-se em forma de narração e recorre às técnicas do midrash haggádico, uma técnica de leitura e de interpretação do texto sagrado usada pelos rabbis judeus da época de Jesus. A homologese utiliza e mistura tipologias (factos e pessoas do Antigo Testamento, encontram a sua correspondência em factos e pessoas do Novo Testamento) e aparições apocalípticas (anjos, aparições, sonhos) para fazer avançar a narração e para explicitar determinada catequese sobre Jesus. O Evangelho que nos é hoje proposto deve ser entendido a esta luz: não interessa, pois, estar aqui à procura de factos históricos; interessa, sobretudo, perceber o que é que a catequese cristã primitiva nos ensina, através destas narrações, sobre Jesus.
    A cena situa-nos numa aldeia da Galileia, chamada Nazaré. A Galileia, região a norte da Palestina, à volta do Lago de Tiberíades, era considerada pelos judeus uma terra longínqua e estranha, em permanente contacto com as populações pagãs e onde se praticava uma religião heterodoxa, influenciada pelos costumes e pelas tradições pagãs. Daí a convicção dos mestres judeus de Jerusalém de que "da Galileia não pode vir nada de bom". Quanto a Nazaré, era uma aldeia pobre e ignorada, nunca nomeada na história religiosa judaica e, portanto, de acordo com a mentalidade judaica, completamente à margem dos caminhos de Deus e da salvação.
    Maria, a jovem de Nazaré que está no centro deste episódio, era "uma virgem desposada com um homem chamado José". O casamento hebraico considerava o compromisso matrimonial em duas etapas: havia uma primeira fase, na qual os noivos se prometiam um ao outro (os "esponsais"); só numa segunda fase surgia o compromisso definitivo (as cerimónias do matrimónio propriamente dito)... Entre os "esponsais" e o rito do matrimónio, passava um tempo mais ou menos longo, durante o qual qualquer uma das partes podia voltar atrás, ainda que sofrendo uma penalidade. Durante os "esponsais", os noivos não viviam em comum; mas o compromisso que os dois assumiam tinha já um carácter estável, de tal forma que, se surgia um filho, este era considerado filho legítimo de ambos. A Lei de Moisés considerava a infidelidade da "prometida" como uma ofensa semelhante à infidelidade da esposa (cf. Dt 22,23-27)... E a união entre os dois "prometidos" só podia dissolver-se com a fórmula jurídica do divórcio. José e Maria estavam, portanto, na situação de "prometidos": ainda não tinham celebrado o matrimónio, mas já tinham celebrado os "esponsais".

    MENSAGEM

    Depois da apresentação do "ambiente" do quadro, Lucas apresenta o diálogo entre Maria e o anjo.
    A conversa começa com a saudação do anjo. Na boca deste, são colocados termos e expressões com ressonância vétero-testamentária, ligados a contextos de eleição, de vocação e de missão. Assim, o termo "ave" (em grego, "kaire") com que o anjo se dirige a Maria é mais do que uma saudação: é o eco dos anúncios de salvação à "filha de Sião", uma figura fraca e delicada que personifica o Povo de Israel, em cuja fraqueza se apresenta e representa essa salvação oferecida por Deus e que Israel deve testemunhar diante dos outros povos (cf. 2 Re 19,21-28; Is 1,8;12,6; Jer 4,31; Sof 3,14-17). A expressão "cheia de graça" significa que Maria é objeto da predileção e do amor de Deus. A outra expressão "o Senhor está contigo" é uma expressão que aparece com frequência ligada aos relatos de vocação no Antigo Testamento (cf. Ex 3,12 - vocação de Moisés; Jz 6,12 - vocação de Gedeão; Jer 1,8.19 - vocação de Jeremias) e que serve para assegurar ao "chamado" a assistência de Deus na missão que lhe é pedida. Estamos, portanto, diante do "relato de vocação" de Maria: a visita do anjo destina-se a apresentar à jovem de Nazaré uma proposta de Deus. Essa proposta vai exigir uma resposta clara de Maria.
    Qual é, então, o papel proposto a Maria no projeto de Deus?
    A Maria, Deus propõe que aceite ser a mãe de um "filho" especial... Desse "filho" diz-se, em primeiro lugar, que ele se chamará "Jesus". O nome significa "Deus salva". Além disso, esse "filho" é apresentado pelo anjo como o "Filho do Altíssimo", que herdará "o trono de seu pai David" e cujo reinado "não terá fim". As palavras do anjo levam-nos a 2 Sm 7 e à promessa feita por Deus ao rei David através das palavras do profeta Nathan. Esse "filho" é descrito nos mesmos termos em que a teologia de Israel descrevia o "messias" libertador. O que é proposto a Maria é, pois, que ela aceite ser a mãe desse "messias" que Israel esperava, o libertador enviado por Deus ao seu Povo para lhe oferecer a vida e a salvação definitivas.
    Como é que Maria responde ao projeto de Deus?
    A resposta de Maria começa com uma objeção... A objeção faz sempre parte dos relatos de vocação do Antigo Testamento (cf. Ex 3,11; 6,30; Is 6,5; Jer 1,6). É uma reação natural de um "chamado", assustado com a perspetiva do compromisso com algo que o ultrapassa; mas é, sobretudo, uma forma de mostrar a grandeza e o poder de Deus que, apesar da fragilidade e das limitações dos "chamados", faz deles instrumentos da sua salvação no meio dos homens e do mundo.
    Diante da "objeção", o anjo garante a Maria que o Espírito Santo virá sobre ela e a cobrirá com a sua sombra. Este Espírito é o mesmo que foi derramado sobre os juízes (Oteniel - cf. Jz 3,10; Gedeão - cf. Jz 6,34; Jefté - cf. Jz 11,29; Sansão - cf. Jz 14,6), sobre os reis (Saul - cf. 1 Sm 11,6; David - cf. 1 Sm 16,13), sobre os profetas (cf. Maria, a profetisa irmã de Aarão - cf. Ex 15,20; os anciãos de Israel - cf. Nm 11,25-26; Ezequiel - cf. Ez 2,1; 3,12; o Trito-Isaías - cf. Is 61,1), a fim de que eles pudessem ser uma presença eficaz da salvação de Deus no meio do mundo. A "sombra" ou "nuvem" leva-nos, também, à "coluna de nuvem" (cf. Ex 13,21) que acompanhava a caminhada do Povo de Deus em marcha pelo deserto, indicando o caminho para a Terra Prometida da liberdade e da vida nova. A questão é a seguinte: apesar da fragilidade de Maria, Deus vai, através dela, fazer-se presente no mundo para oferecer a salvação a todos os homens.
    O relato termina com a resposta final de Maria: "eis a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra". Afirmar-se como "serva" significa, mais do que humildade, reconhecer que se é um eleito de Deus e aceitar essa eleição, com tudo o que ela implica, pois, no Antigo Testamento, ser "servo do Senhor" é um título de glória, reservado àqueles que Deus escolheu, que Ele reservou para o seu serviço e que Ele enviou ao mundo com uma missão (essa designação aparece, por exemplo, no Deutero-Isaías - cf. Is 42,1; 49,3; 50,10; 52,13; 53,2.11 - em referência à figura enigmática do "servo de Jahwéh"). Desta forma, Maria reconhece que Deus a escolheu, aceita com disponibilidade essa escolha e manifesta a sua disposição de cumprir, com fidelidade, o projeto de Deus.

    ATUALIZAÇÃO

    • A liturgia deste dia afirma, de forma clara e insofismável, que Deus ama os homens e tem um projeto de vida plena para lhes oferecer. Como é que esse Deus cheio de amor pelos seus filhos intervém na história humana e concretiza, dia a dia, essa oferta de salvação? A história de Maria de Nazaré, bem como a de tantos outros "chamados", responde, de forma clara, a esta questão: é através de homens e mulheres atentos aos projetos de Deus e de coração disponível para o serviço dos irmãos que Deus atua no mundo, que Ele manifesta aos homens o seu amor, que Ele convida cada pessoa a percorrer os caminhos da felicidade e da realização plena. Já pensámos que é através dos nossos gestos de amor, de partilha e de serviço que Deus se torna presente no mundo e transforma o mundo?

    • Outra questão é a dos instrumentos de que Deus se serve para realizar os seus planos... Maria era uma jovem mulher de uma aldeia obscura dessa "Galileia dos pagãos" de onde não podia "vir nada de bom". Não consta que tivesse uma significativa preparação intelectual, extraordinários conhecimentos teológicos, ou amigos poderosos nos círculos de poder e de influência da Palestina de então... Apesar disso, foi escolhida por Deus para desempenhar um papel primordial na etapa mais significativa na história da salvação. A história vocacional de Maria deixa claro que, na perspetiva de Deus, não são o poder, a riqueza, a importância ou a visibilidade social que determinam a capacidade para levar a cabo uma missão. Deus age através de homens e mulheres, independentemente das suas qualidades humanas. O que é decisivo é a disponibilidade e o amor com que se acolhem e testemunham as propostas de Deus.

    • Diante dos apelos de Deus ao compromisso, qual deve ser a resposta do homem? É aí que somos colocados diante do exemplo de Maria... Confrontada com os planos de Deus, Maria responde com um "sim" total e incondicional. Naturalmente, ela tinha o seu programa de vida e os seus projetos pessoais; mas, diante do apelo de Deus, esses projetos pessoais passaram naturalmente e sem dramas a um plano secundário. Na atitude de Maria não há qualquer sinal de egoísmo, de comodismo, de orgulho, mas há uma entrega total nas mãos de Deus e um acolhimento radical dos caminhos de Deus. O testemunho de Maria é um testemunho questionante, que nos interpela fortemente... Que atitude assumimos diante dos projetos de Deus: acolhemo-los sem reservas, com amor e disponibilidade, numa atitude de entrega total a Deus, ou assumimos uma atitude egoísta de defesa intransigente dos nossos projetos pessoais e dos nossos interesses egoístas?

    • É possível alguém entregar-se tão cegamente a Deus, sem reservas, sem medir os prós e os contras? Como é que se chega a esta confiança incondicional em Deus e nos seus projetos? Naturalmente, não se chega a esta confiança cega em Deus e nos seus planos sem uma vida de diálogo, de comunhão, de intimidade com Deus. Maria de Nazaré foi, certamente, uma mulher para quem Deus ocupava o primeiro lugar e era a prioridade fundamental. Maria de Nazaré foi, certamente, uma pessoa de oração e de fé, que fez a experiência do encontro com Deus e aprendeu a confiar totalmente n'Ele. No meio da agitação de todos os dias, encontro tempo e disponibilidade para ouvir Deus, para viver em comunhão com Ele, para tentar perceber os seus sinais nas indicações que Ele me dá dia a dia?

    SUGESTÃO PARA REFLEXÃO NA SOLENIDADE DA IMACULADA CONCEIÇÃO

    Ler e refletir a Nota Pastoral dos Bispos Portugueses:
    "Na celebração do 150º aniversário da definição dogmática da Imaculada Conceição"
    (Conferência Episcopal Portuguesa, Fátima, 11 de novembro de 2004)

    1. Desde os primórdios da sua história, Portugal soube sempre acolher-se ao regaço da Mãe de Jesus. Como povo em crescimento e em busca da consolidação de fronteiras, dedicou, desde os primeiros tempos da sua história, uma terna e filial afeição à Virgem Maria que escolhera como sua Senhora.
    De entre as inúmeras invocações, com que a Ela se dirige, sobressai, desde muito cedo, no horizonte de um culto sempre crescente, a da Imaculada Conceição. No Calendário de Salisbury, adotado pelo primeiro bispo de Lisboa reconquistada, Gilberto Hastings (1147-1166), já figurava a referência ao mistério de Maria Imaculada.
    À medida que Portugal se consolidava e se expandia pelo mundo, a veneração e devoção à sua Senhora ia aumentando. No século XVII, o culto de Maria, no Mistério da sua Imaculada Conceição, fazia parte da cultura nacional. Sinais disso, entre muitos outros, são: a consagração de Portugal a Maria Imaculada, a entrega da coroa real à imagem da Senhora da Conceição de Vila Viçosa, pelo Rei D. João IV, e o juramento a que se obrigou o corpo docente da Universidade de Coimbra - de defender e ensinar que Maria fora concebida sem pecado
    No dia 8 de Dezembro de 1854, Pio IX, depois de ter consultado o episcopado do mundo inteiro, declarou solenemente, fazendo apelo à autoridade suprema do seu magistério: "A doutrina segundo a qual a Bem-aventurada Virgem Maria, no primeiro instante da sua conceição, foi por especial privilégio de Deus Omnipotente, com vista aos méritos de Jesus Cristo, Salvador do género humano, preservada imune de toda a mácula do pecado original, é revelada por Deus e deve por isso ser acreditada por todos os fieis, firmemente e com constância" (Bula Ineffabilis Deus - 08-12-1854).
    Esta definição dogmática, nada acrescentou à fé e devoção do povo português, mas contribuiu, e muito, para as confirmar e robustecer. Prova disso, foi o dinamismo suscitado entre os fiéis de Portugal, no sentido de erguer um monumento nacional que assinalasse a definição de Pio IX. Em 1869 concluía-se esse primeiro monumento, no Sameiro, seguindo-se-lhe a construção dum santuário dedicado à Imaculada Conceição de Maria, cuja imagem foi coroada solenemente há cem anos.
    A Conferência Episcopal Portuguesa, tendo tudo isto presente, quer associar-se às celebrações da Igreja Universal, que assinalam os 150 anos da definição do dogma com o objetivo de estimular os cristãos a um maior aprofundamento desta verdade de fé; e espera, com esta nota, poder contribuir para uma maior veneração d'Aquela que foi redimida de um modo original, pelos méritos do nosso único Salvador, Jesus Cristo.

    2. A iconografia da Imaculada pode ser motivo fecundo de meditação. As alusões bíblicas e teológicas são uma fonte de catequese de longo alcance.
    O dragão pisado pela Virgem lembra antes de mais o mítico Leviatã (Is 27,1; Sl 74,14), monstro marinho que na Bíblia evoca a resistência das águas primordiais ao poder criador e redentor de Deus. Na mesma tradição, esse triunfo de Deus sobre a antiga serpente tem concretização histórica na anunciada vitória da descendência de Eva: "ela esmagar-te-á a cabeça, ao tentares mordê-la no calcanhar" (Gn 3,9-15). Ecos desse combate cósmico percorrem as visões do Apocalipse e estão presentes no sinal aparecido no céu de "uma mulher vestida de Sol, tendo a Lua debaixo dos seus pés e coroada de doze estrelas" (Ap 12,1-6.15-17).
    A descendência de Eva e a mulher do Apocalipse personificam o povo de Deus de que nascerá a seu tempo o Messias, o Emanuel, Deus connosco.
    Para a Tradição cristã, esses símbolos enraízam na história. Assim, os Padres da Igreja não cessam de apelidar a Mãe de Jesus de Nova Eva, Filha de Sião, Aquela que, na sua plenitude de graça, realiza o que em Eva estava prefigurado. Não por mérito próprio, mas como a mais perfeitamente redimida ou como diz o Vaticano II: "remida de modo mais sublime" (LG 53), Maria agiganta-se, aos nossos olhos como verdadeiramente "cheia de graça".

    3. Segundo o testemunho de Lucas, a maternidade de Maria implicou um ato livre de fé, mais decisivo para a história pública da salvação do que a fé de Abraão ou a Aliança do Sinai.
    Ato de confiante aceitação, tornou-o possível a ação prévia da graça divina, como recorda o Anjo na sua saudação: "Salve, ó cheia da graça, o Senhor está contigo" (Lc 1,28). Na linguagem dos teólogos, a obediência na fé, sem a qual Maria não seria a Mãe de Deus, é pura graça do mesmo Deus.
    Sem a graça divina, a razão e a liberdade humanas permanecem irremediavelmente fechadas em si mesmas, envolvidas por sombras e desejos de uma humanidade pecadora. A jovem de Nazaré abriu caminho à salvação de todos por um ato de desprendimento pessoal: uma resposta arriscada, mas livre e graciosa, ao apelo de Deus para ser Mãe do Salvador. A resposta nasceu de um chamamento, cuja radicalidade e liberdade plena, no caso especial de Maria, a fé cristã assinala, fazendo-as remontar ao primeiro momento da sua existência, o momento da sua Conceição Imaculada.

    4. Todos pecámos em Adão; e todos fomos redimidos e salvos em Cristo (cf. Rm 5,17-18).
    A nossa salvação aconteceu graças aos méritos de Jesus Cristo, que por nós se entregou como Redentor dos pecados que contraímos. A salvação de Maria foi igualmente alcançada mercê da Redenção de seu Filho que Lhe aplicou os seus méritos, preservando-a de contrair o pecado.
    Santo Agostinho, na senda de São Paulo, confirma que todos pecaram "exceto a Virgem Santa Maria, a respeito da Qual, pela honra do Senhor, não é permitido que qualquer questão se levante relacionada com o pecado" (De Natura et Gratia, c. 42).
    O pecado tolda a consciência e endurece o coração. Cheia de graça, Maria, concebida sem pecado, sofre com redobrada violência, a Paixão e Morte de seu Filho, consequência dos pecados dos homens. Bem avisava Simeão que uma espada lhe atravessaria a alma. Tudo isto, aliás, é sentido e vivido pelo povo fiel que encontra, no Coração Imaculado de Maria, um refúgio de Mãe, sempre disponível para acolher as alegrias e tristezas dos filhos e filhas de Deus. Mas o sentido da fé faz-nos ainda descobrir, em Maria, uma outra dimensão de vida: Ela, que não foi tocada pelo pecado, tem uma especial sensibilidade de afeto maternal para com aqueles que pecam; intercede por eles e acompanha-os, de perto, para que se convertam e vivam como verdadeiros filhos de Deus.

    5. Meditar no mistério da Imaculada Conceição de Maria há de levar-nos, antes de mais, ao apreço pelo mistério amoroso da ação redentora de seu divino Filho. Tal Redenção refulge, esplendorosamente, na pessoa de Maria, primeira redimida. Nela se revela a delicadeza da Providência divina que chama cada homem e cada mulher a colaborar na obra da salvação de todos: antes de mais, pelo exercício de uma grande radicalidade e liberdade interior, inspiradas nos apelos de Deus e enraizados no dom gratuito do seu amor; depois, pela correspondência a esse dom, na total fidelidade à nossa filiação divina que Maria, como Mãe, quer tornar cada vez mais sólida em nós.
    A Rosa de Ouro que o Santo Padre oferece, tão carinhosa e paternalmente, ao Santuário do Sameiro, aí ficará como marca indelével de uma presença simbólica do Sumo Pontífice e do seu amor devocional a Nossa Senhora.
    Queira Deus que um tal gesto papal se transforme num permanente apelo, para todos os portugueses, no sentido de cultivarmos e mantermos sempre viçosas as rosas do nosso amor a Maria. Que ela não nos deixe murchar a fé e a devoção que tantos séculos de história construíram no coração das gentes desta praia lusitana.

    Que Maria Santíssima, nossa Mãe Imaculada, olhe para Portugal e por Portugal bem como por toda a humanidade, nos difíceis caminhos da paz.

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • 03º Domingo do Advento - Ano A

    03º Domingo do Advento - Ano A


    11 de Dezembro, 2022

    ANO A
    3.º DOMINGO DO ADVENTO

    Tema do 3.º Domingo do Advento

    A liturgia deste domingo lembra a proximidade da intervenção libertadora de Deus e acende a esperança no coração dos crentes. Diz-nos: "não vos inquieteis; alegrai-vos, pois a libertação está a chegar".
    A primeira leitura anuncia a chegada de Deus, para dar vida nova ao seu Povo, para o libertar e para o conduzir, num cenário de alegria e de festa, para a terra da liberdade.
    O Evangelho descreve-nos, de forma bem sugestiva, a ação de Jesus, o Messias (esse mesmo que esperamos neste Advento): Ele irá dar vista aos cegos, fazer com que os coxos recuperem o movimento, curar os leprosos, fazer com que os surdos ouçam, ressuscitar os mortos, anunciar aos pobres que o "Reino" da justiça e da paz chegou. É este quadro de vida nova e de esperança que Jesus nos vai oferecer.
    A segunda leitura convida-nos a não deixar que o desespero nos envolva enquanto esperamos e aguardarmos a vinda do Senhor com paciência e confiança.

    LEITURA I - Is 35, 1-6a.10

    Leitura do Livro de Isaías

    Alegrem-se o deserto e o descampado,
    rejubile e floresça a terra árida,
    cubra-se de flores como o narciso,
    exulte com brados de alegria.
    Ser-lhe-á dada a glória do Líbano,
    o esplendor do Carmelo e do Sáron.
    Verão a glória do Senhor,
    o esplendor do nosso Deus.
    Fortalecei as mãos fatigadas
    e robustecei os joelhos vacilantes.
    Dizei aos corações perturbados:
    «Tende coragem, não temais:
    Aí está o vosso Deus,
    vem para fazer justiça e dar a recompensa.
    Ele próprio vem salvar-nos».
    Então se abrirão os olhos dos cegos
    e se desimpedirão os ouvidos dos surdos.
    Então o coxo saltará como um veado
    e a língua do mudo cantará de alegria.
    Voltarão os que o Senhor libertar,
    hão de chegar a Sião com brados de alegria,
    com eterna felicidade a iluminar-lhes o rosto.
    Reinarão o prazer e o contentamento
    e acabarão a dor e os gemidos.

    AMBIENTE

    Os capítulos 34-35 do Livro de Isaías são habitualmente chamados "pequeno apocalipse de Isaías", para distinguir do "grande apocalipse de Isaías", que aparece nos capítulos 24-27; descrevem os últimos combates travados por Jahwéh contra as nações, particularmente contra Edom e a vitória definitiva do Povo de Deus. Estes dois capítulos parecem poder ser relacionados com os capítulos 40-55 do Livro de Isaías, cujo autor é esse Deutero-Isaías que atuou na Babilónia entre os exilados, na fase final do Exílio. Por que razão estes dois capítulos se apresentam separados do seu "ambiente natural" (Is 40-55)? Provavelmente, foram atraídos pelas peças escatológicas soltas de Is 28-33 e, especialmente, pelo capítulo 33.
    Depois de apresentar o julgamento de Deus (cf. Is 34,1-4) e o castigo de Edom (cf. Is 34,5-15), o autor descreve, por contraste, a transformação extraordinária do deserto sírio, pelo qual vão passar os israelitas libertados, que regressam do Exílio. A intenção do profeta é consolar os exilados, desanimados, frustrados e mergulhados no desespero, porque a libertação tarda e parece que Deus os abandonou. Este tema será desenvolvido em profundidade nos capítulos 40-55 do Livro de Isaías.

    MENSAGEM

    Temos aqui um autêntico "hino à alegria", destinado a acordar a esperança e a revitalizar o ânimo dos exilados. Qual a razão dessa alegria? É que Deus "aí está para fazer justiça": Ele vai intervir na história, vai salvar Judá do cativeiro, vai abrir uma estrada no deserto para que o seu Povo possa regressar em triunfo a Sião.
    O profeta começa por interpelar a natureza e pedir-lhe que se prepare para a ação libertadora de Deus em favor do seu Povo: o deserto e o descampado, estéreis e desolados, são convidados a revestir-se de vida abundante (como o Líbano, o monte Carmelo ou a planície do Sharon, zonas proverbiais de vida e de fecundidade) e a enfeitar-se de flores de todas as formas e cores (vers. 1-2). Dessa forma, a própria natureza manifestará a sua alegria pela intervenção salvadora de Jahwéh; mas, sobretudo, será o cenário adequado para essa intervenção de Deus, destinada a levar vida nova ao Povo. Além disso, a magnificência das árvores e das plantas será a imagem da glória e da beleza do Senhor e falará a todos da grandeza de Deus, da sua capacidade para fazer brotar vida onde só há morte, desolação, esterilidade.
    Depois, a palavra do profeta dirige-se aos homens (vers. 3-4). Nada de desânimo, nada de cobardia, nada de baixar os braços: Deus aí está para salvar e libertar o seu Povo. Os exilados devem unir-se à natureza nessa corrente de alegria e de vida nova, pois a libertação chegou.
    O resultado da iniciativa salvadora e libertadora de Deus será que os olhos dos cegos se abrirão e se desimpedirão os ouvidos dos surdos... O coxo não apenas andará, mas saltará como um veado; o mudo não apenas falará, mas cantará de alegria (vers. 5-6). A ação de Deus é excessiva, verdadeiramente transformadora e geradora de vida nova em abundância.
    A marcha do Povo da terra da escravidão para a terra da liberdade será, pois, um novo êxodo, onde se repetirão as maravilhas operadas pelo Deus libertador aquando do primeiro êxodo; no entanto, este segundo êxodo será ainda mais grandioso, quanto à manifestação e à ação de Deus. Será uma peregrinação festiva, uma procissão solene, feita na alegria e na festa. O resultado final desse segundo êxodo será o reencontro com Sião, a eterna felicidade, a alegria sem fim (vers. 10).

    ATUALIZAÇÃO

    Ter em conta os seguintes elementos:

    • Para os otimistas, o nosso tempo é um tempo de grandes realizações, de grandes descobertas, em que se abre todo um mundo de possibilidades ao homem; para os pessimistas, o nosso tempo é um tempo de sobreaquecimento do planeta, de subida do nível do mar, de destruição da camada do ozono, de eliminação das florestas, de risco de holocausto nuclear... Para uns e para outros, é um tempo de desafios, de interpelações, de procura, de risco... Como é que nós nos relacionamos com este mundo? Vemo-lo com os olhos da esperança, ou com os óculos negros do desespero?

    • Os crentes não podem, contudo, esquecer que "Deus aí está": a sua intervenção faz com que o deserto se revista de vida e que na planície árida do desespero brote a flor da esperança. É com esta certeza da presença de Deus e com a convicção de que Ele não nos deixará abandonados nas mãos das forças da morte que somos convidados a caminhar pela vida e a enfrentar a história.

    • O Advento é o tempo em que se anuncia e espera a intervenção salvadora de Deus em favor do seu Povo. No entanto, Ele só virá se eu estiver disposto a acolhê-l'O; Ele só intervirá se eu estiver disposto a receber de braços abertos a proposta de libertação que Ele me vem fazer... Estou preparado para acolher o Senhor? Ele tem lugar na minha vida? A sua proposta libertadora encontrará eco no meu coração?

    • O profeta é o homem que rema contra a maré... Quando todos cruzam os braços e se afundam no desespero, o profeta é capaz de olhar para o futuro com os olhos de Deus e ver, para lá do horizonte do sol poente, um novo amanhã. Ele vai, então, gritar aos quatro ventos a esperança, fazer com que o desespero se transforme em alegria e que o imobilismo se transforme em luta empenhada por um mundo melhor. É este testemunho de esperança que procuramos dar?

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 145 (146)

    Refrão 1: Vinde, Senhor, e salvai-nos.
    Refrão 2: Vinde salvar-nos, Senhor.

    O Senhor faz justiça aos oprimidos,
    dá pão aos que têm fome
    e a liberdade aos cativos.

    O Senhor ilumina os olhos dos cegos,
    o Senhor levanta ao abatidos,
    o Senhor ama os justos.

    O Senhor protege os peregrinos,
    ampara o órfão e a viúva
    e entrava o caminho aos pecadores.

    O Senhor reina eternamente.
    O teu Deus, ó Sião,
    é rei por todas as gerações.

    LEITURA II - Tg 5, 7-10

    Leitura da Epístola de São Tiago

    Irmãos:
    Esperai com paciência a vinda do Senhor.
    Vede como o agricultor espera pacientemente
    o precioso fruto da terra,
    aguardando a chuva temporã e a tardia.
    Sede pacientes, vós também,
    e fortalecei os vossos corações,
    porque a vinda do Senhor está próxima.
    Não vos queixeis uns dos outros,
    a fim de não serdes julgados.
    Eis que o Juiz está à porta.
    Irmãos, tomai como modelos de sofrimento e de paciência
    os profetas, que falaram em nome do Senhor.

    AMBIENTE

    A carta de onde foi extraída a nossa segunda leitura de hoje é um escrito de um tal Tiago (cf. Tg 1,1), que a tradição liga a esse Tiago "irmão" do Senhor, que presidiu à Igreja de Jerusalém e do qual os Evangelhos falam, acidentalmente, como filho de certa Maria (cf. Mt 13,55;27,56). Teria morrido decapitado em Jerusalém no ano 62... No entanto, a atribuição deste escrito a tal personagem levanta bastantes dificuldades. O mais certo é estarmos perante um outro qualquer Tiago, desconhecido até agora (o "Tiago, filho de Alfeu" - de que se fala em Mc 3,18 e par. - e o "Tiago, filho de Zebedeu" e irmão de João - de que se fala em Mc 1,19 e par. - também não se encaixam neste perfil). É, de qualquer forma, um autor que escreve em excelente grego, recorrendo até, com frequência, à "diatribe" - um género muito usado pela filosofia popular helénica. Inspira-se particularmente na literatura sapiencial, para dela extrair lições de moral prática; mas depende também profundamente dos ensinamentos do Evangelho. Trata-se de um sábio judeo-cristão que repensa, de maneira original, as máximas da sabedoria judaica, em função do cumprimento que elas encontraram na boca e no ensinamento de Jesus.
    A carta foi enviada "às doze tribos que vivem na Diáspora" (Tg 1,1). Provavelmente, a expressão alude a cristãos de origem judaica, dispersos no mundo greco-romano, sobretudo nas regiões próximas da Palestina - como a Síria ou o Egipto; mas, no geral, a carta parece dirigir-se a todos os crentes, exortando-os a que não percam os valores cristãos autênticos herdados do judaísmo através dos ensinamentos de Cristo. Denuncia, sobretudo, certas interpretações consideradas abusivas da doutrina paulina da salvação pela fé, sublinhando a importância das obras; e ataca com extrema severidade os ricos (cf. Tg 1,9-11;2,5-7;4,13-17;5,1-6).
    O nosso texto pertence à terceira parte da carta (Tg 3,14-5,20). Aí, o autor apresenta, num conjunto de desenvolvimentos e de sentenças aparentemente sem ordem nem lógica, indicações concretas destinadas a favorecer uma vida cristã mais autêntica.

    MENSAGEM

    Depois de uma violenta denúncia dos ricos que oprimem os pobres e que enriquecem retendo os salários dos seus trabalhadores (cf. Tg 5,1-6), o autor da carta dirige-se aos pobres e convida-os a esperar com paciência a vinda do Senhor (como o agricultor, depois de ter feito o seu trabalho, fica pacientemente, mas cheio de esperança, à espera que a terra produza os seus frutos). Todo o enquadramento está dominado pela perspetiva da vinda do Senhor.
    A questão é, portanto, esta: os pobres vivem numa situação intolerável de exploração e de injustiça; mas não devem resolver o seu problema com queixas e violências: devem confiar em Deus e esperar a intervenção que os salvará e libertará. A paciência e a espera confiada no Senhor são as atitudes corretas nestes tempos em que se prepara a intervenção final de Deus na história.
    Haverá, aqui, um apelo à passividade, a cruzar os braços, a demitir-se da luta pelo mundo melhor? Não devemos entender o apelo de Tiago nesta perspetiva; o que há aqui é um apelo a confiar no Senhor e a não embarcar no mesmo esquema injusto e violento dos opressores... O acento é posto na esperança que deve alumiar o coração de quem sofre: a libertação está a chegar.

    ATUALIZAÇÃO

    A reflexão pode partir dos seguintes elementos:

    • Muitos irmãos nossos fazem, todos os dias, a experiência intolerável de viver na injustiça, no medo, no sofrimento, à margem da vida, privados de dignidade... Tiago diz-lhes: "apesar do sem sentido da vida, apesar do sofrimento, Deus não vos abandonou nem esqueceu, mas vai libertar-vos; aproxima-se a dia da intervenção salvadora de Deus... Esperai-O, não com o coração cheio de revolta, que vos destrói e que magoa todos aqueles que, sem ter culpa, vivem e caminham a vosso lado, mas com esperança e confiança".

    • Atenção: isto não significa instalar-se numa resignação que aliena e numa passividade que é renúncia à própria dignidade humana... Isto significa, sobretudo, não deixar que sentimentos agressivos e destrutivos tomem posse de nós, pois a libertação de Deus não pode chegar a qualquer coração dominado pelo ódio, pelo rancor, pelo desejo de vingança.

    • Nós, Igreja de Jesus, testemunhas do projeto libertador de Deus, temos de anunciar o projeto libertador de Deus aos escravos e oprimidos e não deixar que a luz da esperança se apague... Anunciamos a salvação aos pobres e oprimidos, com as nossas palavras e com os nossos gestos?

    • A salvação de Deus chega ao mundo através do nosso testemunho... Lutamos, objetivamente, para tornar realidade o projeto libertador de Deus e para silenciar a opressão, a injustiça, tudo o que rouba a vida e a dignidade a qualquer homem ou a qualquer mulher?

    ALELUIA - Is 61, 1

    Aleluia. Aleluia.

    O Espírito do Senhor está sobre mim:
    enviou-me a anunciar a boa nova aos pobres.

    EVANGELHO - Mt 11, 2-11

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

    Naquele tempo,
    João Baptista ouviu falar, na prisão, das obras de Cristo
    e mandou-Lhe dizer pelos discípulos:
    «És Tu Aquele que há de vir ou devemos esperar outro?»
    Jesus respondeu-lhes:
    «Ide contar a João o que vedes e ouvis:
    os cegos veem, os coxos andam, os leprosos são curados,
    os surdos ouvem, os mortos ressuscitam
    e a boa nova é anunciada aos pobres.
    E bem-aventurado aquele que não encontrar em Mim
    motivo de escândalo».
    Quando os mensageiros partiram,
    Jesus começou a falar de João às multidões:
    «Que fostes ver ao deserto? Uma cana agitada pelo vento?
    Então que fostes ver? Um homem vestido com roupas delicadas?
    Mas aqueles que usam roupas delicadas
    encontram-se nos palácios dos reis.
    Que fostes ver então? Um profeta?
    Sim - Eu vo-lo digo - e mais que profeta.
    É dele que está escrito:
    'Vou enviar à tua frente o meu mensageiro,
    para te preparar o caminho'.
    Em verdade vos digo:
    Entre os filhos de mulher,
    não apareceu ninguém maior do que João Baptista.
    Mas o menor no reino dos Céus é maior do que ele».

    AMBIENTE

    Na secção precedente do Evangelho (cf. Mt 4,17-11,1), Mateus apresentou de forma sistemática o anúncio do "Reino", manifestado nas palavras e nos gestos de Jesus, e difundido pelos seus discípulos... Agora, começa outra secção, em que todo o interesse do evangelista é mostrar as atitudes que as distintas pessoas ou grupos vão assumir diante de Jesus (cf. Mt 11,2-12,50). A narração é retomada com a pergunta dos enviados de João Baptista, que está na prisão, por ordem de Herodes Antipas, a quem o Baptista havia criticado por viver maritalmente com a cunhada (cf. Mt 14,1-5): Jesus é mesmo "o que está para vir"?
    A pergunta não é ociosa... João esperava um Messias que viesse lançar fogo à terra, castigar os maus e os pecadores, dar início ao "juízo de Deus" (cf. Mt 3,11-12); mas, ao contrário, Jesus aproximou-Se dos pecadores, dos marginais, dos impuros, estendeu-lhes a mão, mostrou-lhes o amor de Deus, ofereceu-lhes a salvação (cf. Mt 8-9). João e os seus discípulos estão, pois, desconcertados: Jesus será o Messias esperado, ou é preciso esperar um outro que venha atuar de uma forma mais decidida, mais lógica e mais justiceira?
    Mateus tem um interesse especial pela figura de João Baptista. Para ele, João é o precursor que veio preparar os homens para acolher Jesus. É provável que, ao fazer esta apresentação, o evangelista se queira dirigir aos discípulos de João que ainda continuavam ativos na época em que o Evangelho foi escrito... Mateus pretende clarificar as coisas e "piscar o olho" aos discípulos de João, no sentido de que eles adiram à proposta cristã e entrem na Igreja de Jesus.

    MENSAGEM

    O texto de hoje divide-se em duas partes... Na primeira, Jesus responde à pergunta de João e dá a entender que Ele é o Messias (vers. 2-6); na segunda, temos a apreciação que o próprio Jesus faz da figura e da ação profética de João (vers. 7-11).
    Jesus tem consciência de ser o Messias? A resposta é obviamente positiva; para dá-la, Jesus recorre a um conjunto de citações de Isaías que definem, na perspetiva dos profetas, a ação do Messias enviado de Deus: dar vida aos mortos (cf. Is 26,19), curar os surdos (cf. Is 29,18), dar vista aos cegos, dar liberdade de movimentos aos coxos (cf. Is 35,5-6), anunciar a Boa Nova aos pobres (cf. Is 61,1). Ora, se Jesus realizou estas obras (cf. Mt 8-9), é porque Ele é o Messias, enviado por Deus para libertar os homens e para lhes trazer o "Reino". A sua mensagem e os seus gestos contêm uma proposta libertadora que Deus faz aos homens.
    Na segunda parte, temos a declaração de Jesus sobre o Baptista. Mateus utiliza um recurso retórico muito conhecido: uma série de perguntas que convidam os ouvintes a dar uma resposta concreta. A resposta às duas primeiras questões é, evidentemente, negativa: João não é um pregador oportunista cuja mensagem segue as modas, nem um elegante convencido que vive no luxo. A resposta à terceira é positiva: João é um profeta e mais do que um profeta. A declaração, que começa com uma referência à Escritura (cf. Ex 23,20; Mal 3,1), pretende clarificar qual a relação entre ambos e o lugar de João no "Reino": João é o precursor do Messias; é "Elias", aquele que tinha de vir antes, a fim de preparar o caminho para o Messias (cf. Mal 3,23-24)... No entanto, aqueles que entraram no "Reino" através do seguimento de Jesus são mais do que Ele.

    ATUALIZAÇÃO

    A reflexão deste texto pode partir das seguintes questões:

    • O texto evangélico identifica Jesus com a presença salvadora e libertadora de Deus no meio dos homens. Neste tempo de espera, somos convidados a aguardar a sua chegada, com a certeza de que Deus não nos abandonou, mas continua a vir ao nosso encontro e a oferecer-nos a salvação.

    • Os "sinais" que Jesus realizou enquanto esteve entre nós têm de continuar a acontecer na história; agora, são os discípulos de Jesus que têm de continuar a sua missão e de perpetuar no mundo, em nome de Jesus, a ação libertadora de Deus.
    Os que vivem amarrados ao desespero de uma doença incurável encontram em nós um sinal vivo do Cristo libertador que lhes traz a salvação?
    Os "surdos", fechados num mundo sem comunicação e sem diálogo, encontram em nós a Palavra viva de Deus que os desperta para a comunhão e para o amor?
    Os "cegos", encerrados nas trevas do egoísmo ou da violência, encontram em nós o desafio que Deus lhes apresenta de abrir os olhos à luz?
    Os "coxos", impedidos de andar, encontram em nós a proximidade dos caminhos de Deus?
    Os presos, privados da liberdade, escondidos atrás das grades em que a sociedade os encerra, encontram em nós a Boa Nova da liberdade?
    Os "pobres", marginalizados, sem voz nem dignidade, sentem em nós o amor de Deus?

    • Mais uma vez, somos interpelados e questionados pela figura vertical e coerente de João... Ele não é um pregador da moda, cujas ideias variam conforme as flutuações da opinião pública ou os interesses dos poderosos; nem é um charlatão bem vestido, que prega para ganhar dinheiro, para defender os seus interesses, ou para ter uma vida cómoda e sem grandes exigências... Mas é um profeta, que recebeu de Deus uma missão e que procura cumpri-la, com fidelidade e sem medo.
    A minha vida e o meu testemunho profético cumprem-se com a mesma verticalidade e honestidade, ou estou disposto e vender-me a interesses menos próprios, se isso me trouxer benefícios?

    • A "dúvida" de João acerca da messianidade de Jesus não é chocante, mas é sinal de uma profunda honestidade... Devemos ter mais medo daqueles que têm certezas inamovíveis, que estão absolutamente certos das suas verdades e dos seus dogmas, do que daqueles que procuram, honestamente, as respostas às questões que a vida todos os dias coloca.
    Sou um fundamentalista, que nunca se engana e raramente tem dúvidas, ou alguém que sabe que não tem o monopólio da verdade, que ouve os irmãos, e que procura, com eles, descobrir o caminho verdadeiro?

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 3.º DOMINGO DO ADVENTO
    (algumas são adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 3.º Domingo do Advento, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. UMA ASSEMBLEIA EM ALEGRIA.
    Tudo deverá concorrer para que a assembleia celebre em estado de alegria: luzes, flores, música... mas também uma primeira leitura (um imenso grito de alegria!) lida por um leitor feliz e que contagie felicidade, sem falar do próprio presidente, cujo tom influenciará muito o clima deste domingo. Que estes elementos brotem do interior de todos os que participam na celebração, comungando da enorme felicidade em acolher a Palavra de Deus na Eucaristia...

    3. A PAZ, A ALEGRIA.
    Este terceiro domingo do Advento é o domingo da alegria. A alegria está intimamente ligada à paz. Paz e alegria: duas grandes riquezas que queremos para o nosso mundo. Na preparação da liturgia, seria interessante procurar formas de dar um real conteúdo à nossa esperança, ver como as palavras "paz" e "alegria" podem ressoar no coração de cada um: procurar propor gestos concretos que vão neste sentido para os habitantes do bairro ou da cidade; procurar que a nossa oração deste dia seja mais verdadeira e consequente na vida concreta. E como convidar os cristãos a ser testemunhas da paz e da alegria de Cristo? A festa de Natal, este ano, mudará alguma coisa à nossa volta? É importante preparar a liturgia neste sentido, para que a celebração continue nas situações de vida durante a semana...

    4. BILHETE DE EVANGELHO.
    Aos homens que reconhecem a sua fragilidade, Deus manifesta o seu poder. Não é frequente reconhecermos os nossos desvios, os nossos erros, a nossa fragilidade, a nossa vulnerabilidade. Porém, isso seria reconhecer simplesmente a nossa humanidade... Os pais não perdem a honra ao reconhecer diante dos seus filhos que se enganaram. A Igreja não se rebaixa ao reconhecer os seus erros do passado; ao contrário, eleva-se. Os cristãos não se entristecem ao reconhecer o seu pecado; ao contrário, dão a Deus a alegria de os perdoar. Deixemos Deus manifestar o seu poder, concedendo-nos o seu perdão! Basta que nos reconheçamos frágeis. Então, a nossa fragilidade mudar-se-á em força. De frágeis tornar-nos-emos fortes, fortes de ser amados.

    5. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
    Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.

    No final da primeira leitura:
    Deus nosso Salvador, gritamos a nossa alegria e exultamos, porque vens até nós, como outrora, quando pelos profetas anunciaste ao teu povo exilado o fim da provação e o regresso do cativeiro. Nós Te pedimos pelos infelizes e desencorajados: fortifica as mãos cansados, torna firmes os joelhos dobrados, ilumina os seus rostos.

    No final da segunda leitura:
    Nós Te bendizemos, Senhor, pela tua paciência: como o agricultor, Tu preparaste a terra e lançaste a semente da Boa Nova. Nós Te pedimos pelas nossas comunidades: que o teu Espírito nos livre de gemer uns contra os outros, que Ele nos fortaleça na concórdia e nos guie na preparação de uma nova terra.

    No final do Evangelho:
    Nós Te damos graças, Senhor, por João Baptista, por quem preparaste o caminho para o teu Filho e manifestaste o cumprimento das Escrituras. Nós Te suplicamos por aqueles cuja vista está tapada, os passos incertos, a vida envenenada... novos leprosos presentes nos nossos caminhos. Que o teu Espírito nos inspire as palavras e os gestos capazes de os abrir à tua presença.

    6. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Pode-se escolher a Oração Eucarística III da Assembleia com Crianças, pois exprime bem o clima das leituras.

    7. PALAVRA EXPLICADA 1: SALMO E ALELUIA.
    Na liturgia da Palavra, Deus está em diálogo com o seu Povo, pela alternância entre as leituras bíblicas e o cântico dos salmos. No domingo, na organização em três leituras, a primeira leitura é um extrato do Antigo Testamento ou, no tempo pascal, dos Atos dos Apóstolos. Esta proclamação revela à assembleia ações que Deus cumpriu no passado, ou propõe uma meditação sobre a solicitude de Deus a seu respeito. Esta escuta suscita sentimentos de ação de graças que a assembleia exprime pelo cântico do Salmo, respondendo à Palavra de Deus através de outras palavras da Bíblia: é verdadeiramente um diálogo no Espírito Santo, que proclamamos haver falado pelos Profetas. A segunda leitura é extraída dos escritos apostólicos. É seguida da aclamação ao Evangelho, seja um Aleluia com o seu versículo, seja, durante a Quaresma, um versículo com outra aclamação. Quando a liturgia da Palavra comporta apenas uma leitura antes do Evangelho, o Salmo e a aclamação do Evangelho seguem-se imediatamente.

    8. PALAVRA EXPLICADA 2: REFRÃO SÂLMICO.
    Para o Salmo que responde à primeira leitura, o lecionário propõe um refrão, também chamado antífona, e alguns versículos. Esta fórmula permite a toda a assembleia participar neste momento importante, que é resposta à Palavra de Deus. Os refrães são frases curtas, extraídas do próprio Salmo ou de um outro texto, como o da noite de Natal: "Hoje, um Salvador nasceu, é Cristo, o Senhor". Para favorecer a participação de toda a assembleia, o coro, ou um solista, canta primeiro o refrão, para o fazer ouvir à assembleia, e esta retoma-o de seguida. Em seguida, o solista, ou o coro, canta os versículos do Salmo. No fim ou nos intervalos dos versículos, retoma-se o refrão. A sua brevidade permite que a assembleia o guarde mais facilmente na memória, não somente para a participação na celebração, mas para que possa ser retomado por cada um na oração pessoal e familiar.

    9. ATENÇÃO ÀS CRIANÇAS: ALEGRIA! ALEGRIA! ALEGRIA!
    Domingo da Alegria: a palavra aparece quatro vezes na primeira leitura; o Salmo e o Evangelho dão as razões profundas da alegria. Trata-se de fazer descobrir às crianças que somos feitos para a alegria. Elas poderão dizê-lo nalgum momento da celebração: acendendo a terceira vela, a vela da alegria; animando um o outro cântico de alegria (Aleluia, Santo); ou agradecendo ao Senhor com uma oração após a comunhão. Por exemplo: "Jesus, Tu oferece-nos a verdadeira alegria, a alegria que vem de Ti. Enche os nossos corações com o teu amor, para podermos levar a tua alegria àqueles que encontrarmos".

    10. PALAVRA PARA O CAMINHO.
    Paciência! Uma palavra em sentido contrário aos nossos comportamentos: exigimos tudo, imediatamente! Dois milénios em que esperamos a vinda do Senhor! Ainda não veio! Mas já está! Renovemos, reajustemos o nosso olhar de fé e redescubramo-l'O bem presente, e em ação, em lugares e situações em que tantas vezes não esperávamos encontrá-l'O! Sempre em atitude de alegria e de esperança!

     

     

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • 04º Domingo do Advento - Ano A

    04º Domingo do Advento - Ano A


    18 de Dezembro, 2022

    ANO A
    4º DOMINGO DO ADVENTO
    Tema do 4º Domingo do Advento

    A liturgia deste domingo diz-nos, fundamentalmente, que Jesus é o "Deus-connosco", que veio ao encontro dos homens para lhes oferecer uma proposta de salvação e de vida nova.
    Na primeira leitura, o profeta Isaías anuncia que Jahwéh é o Deus que não abandona o seu Povo e que quer percorrer, de mãos dadas com ele, o caminho da história... É n'Ele (e não nas sempre falíveis seguranças humanas) que devemos colocar a nossa esperança.
    O Evangelho apresenta Jesus como a incarnação viva desse "Deus connosco", que vem ao encontro dos homens para lhes apresentar uma proposta de salvação. Contém, naturalmente, um convite implícito a acolher de braços abertos a proposta que Ele traz e a deixar-se transformar por ela.
    Na segunda leitura, sugere-se que, do encontro com Jesus, deve resultar o testemunho: tendo recebido a Boa Nova da salvação, os seguidores de Jesus devem levá-la a todos os homens e fazer com que ela se torne uma realidade libertadora em todos os tempos e lugares.

    LEITURA I - Is 7,10-14

    Leitura do Livro de Isaías
    Naqueles dias,
    o Senhor mandou ao rei Acaz a seguinte mensagem:
    «Pede um sinal ao Senhor teu Deus,
    quer nas profundezas do abismo,
    quer lá em cima nas alturas».
    Acaz respondeu:
    «Não pedirei, não porei o Senhor à prova».
    Então Isaías disse:
    «Escutai, casa de David:
    Não vos basta que andeis a molestar os homens
    para quererdes também molestar o meu Deus?
    Por isso, o próprio Senhor vos dará um sinal:
    a virgem conceberá e dará à luz um filho
    e o seu nome será Emanuel».

    AMBIENTE

    Em 734 a.C., Acaz sobe ao trono de Judá (o Povo de Deus está, nesta altura, dividido: a norte, há um reino formado por dez tribos, com o nome de Israel e com a capital na Samaria; a sul, há outro reino, formado por duas tribos, com o nome de Judá e com a capital em Jerusalém). Por esta época, Judá goza de alguma prosperidade económica e de relativa tranquilidade política... No entanto, as campanhas militares de Tiglat-Pileser III, rei da Assíria, rapidamente lançam os países da zona em alvoroço e anunciam tempos complicados para os pequenos reinos da terra de Canaan.
    As coisas complicam-se quando Pecah, rei de Israel, tenta formar uma coligação anti-assíria, capaz de resistir às investidas imperialistas de Tiglat-Pileser III. O rei de Israel pretende que essa coligação integre a Síria e Judá. No entanto, Acaz, rei de Judá, recusa-se a embarcar nessa aventura; então Pecah, rei de Israel, e Rezin, da Síria, lançam as suas tropas contra Judá. Acaz, assustado, decide pedir a ajuda dos assírios para resistir aos invasores. O profeta Isaías, no entanto, não concorda: para ele, a única esperança e segurança com que Judá deve contar é Jahwéh, o seu Deus; confiar a segurança da nação a potências e a exércitos estrangeiros é abandonar Deus e expor o país a dependências que só podem trazer sofrimento e opressão. No entanto, Acaz insiste em pedir a ajuda da Assíria... É então que o profeta Isaías se dirige ao rei e lhe pede que, se não acredita nas suas recomendações, peça a Deus um "sinal" para decidir o que Deus quer e o que é melhor para o Povo. Acaz tem a decisão tomada e recusa pedir a Deus um "sinal"... Mas Isaías quer, mesmo assim, deixar ao rei um "sinal" de Deus...

    MENSAGEM

    O "sinal" de Deus é este: "a jovem (em hebraico: "ha-'almah") conceberá e dará à luz um filho, e o seu nome será Deus connosco" (em hebraico: "'Imanu El") (vers. 14). O profeta refere-se a quê, em concreto?
    Certamente ao facto histórico da gravidez da jovem esposa do rei (Abia, filha de Zacarias; o título "a jovem" aparece, aliás, em certos textos de Ugarit para designar a esposa do rei) e posterior nascimento do filho Ezequias, que veio a ocupar o trono de Judá quando Acaz morreu... O nascimento desse bebé será a garantia de que a descendência de David continuará e de que, apesar do ataque dos inimigos (Pecah de Israel e Rezin de Damasco), Judá terá um futuro. Este bebé é, portanto, um sinal de que "Deus está connosco" e que continua a cuidar do seu Povo e a oferecer-lhe um futuro de esperança.
    Ao abordar este texto, a versão grega dos "Setenta" utilizou o vocábulo "parthénos" ("virgem") para traduzir o hebraico "'almah" ("jovem"). Por isso, desde o séc. II a.C. (ou até antes), uma parte da tradição judaica viu neste nascimento excepcional uma referência ao Messias, que haveria de nascer de uma "virgem". A tradição cristã, naturalmente, aplicou este oráculo a Jesus; e Maria, a mãe de Jesus, passou a ser essa "virgem" nomeada no texto grego de Is 7,14.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pode fazer-se a partir das seguintes linhas:
    • O facto decisivo, neste texto, é a afirmação de que Deus não abandona o seu Povo, mas que é e será sempre o "Deus-connosco". A próxima celebração do nascimento de Jesus recorda e celebra esse facto fundamental: Deus ama-nos de tal forma que continua a vir ao nosso encontro... Neste tempo de espera da vinda, somos convidados a tomar consciência do amor de Deus, que se manifesta numa presença permanente a nosso lado; com Ele a dar-nos a mão e a palmilhar connosco a estrada da vida, podemos enfrentar todos os desafios.
    • A partir deste texto e do ambiente em que ele nasce, podemos também pôr o problema das falsas seguranças e das falsas esperanças. Acaz confiava mais na segurança dos exércitos estrangeiros do que em Jahwéh... Em que é que o homem de hoje coloca a sua confiança e a sua esperança? Para evitar um holocausto nuclear, é no equilíbrio das armas que podemos confiar? Para termos uma sociedade mais justa e mais fraterna, é nos políticos que podemos confiar? Para nos sentirmos seguros e confortáveis, é no dinheiro que podemos confiar? Para iludirmos a doença ou a morte, é nos novos medicamentos ou nos progressos da medicina que podemos confiar? Onde está a nossa "rocha segura" que não falha: em Deus ou nas estruturas humanas?
    • Acaz não quis ou não soube "ler" os "sinais" que Deus colocou diante dos seus olhos, não conseguiu fazer a escolha acertada e acabou por conduzir o seu Povo por caminhos de morte e de desgraça... Isto coloca-nos o problema dos "sinais": um erro na leitura do radar pode fazer em destroços um avião ou um navio; uma falha na sinalização luminosa causa um desastre inevitável... Estamos atentos aos "sinais" que Deus semeia na estrada d
    a nossa vida e através dos quais nos indica o caminho a seguir, ou caminhamos numa alegre inconsciência, ao sabor da corrente, desviando-nos por atalhos que nos afastam do objectivo e nos fazem sofrer?

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 23 (24)

    Refrão 1: Venha o Senhor: é Ele o rei glorioso.
    Refrão 2: O Senhor virá: Ele é o rei da glória.
    Do Senhor é a terra e o que nela existe,
    o mundo e quantos nele habitam.
    Ele a fundou sobre os mares
    e a consolidou sobre as águas.
    Quem poderá subir à montanha do Senhor?
    Quem habitará no seu santuário?
    O que tem as mãos inocentes e o coração puro,
    que não invocou o seu nome em vão nem jurou falso.
    Este será abençoado pelo Senhor
    e recompensado por Deus, seu Salvador.
    Esta é a geração dos que O procuram,
    que procuram a face do Deus de Jacob.

    LEITURA II - Rom 1,1-7

    Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Romanos
    Paulo, servo de Jesus Cristo,
    apóstolo por chamamento divino,
    escolhido para o Evangelho
    que Deus tinha de antemão prometido pelos profetas
    nas Sagradas Escrituras, acerca de seu Filho,
    nascido da descendência de David, segundo a carne,
    mas, pelo Espírito que santifica,
    constituído Filho de Deus em todo o seu poder
    pela sua ressurreição de entre os mortos:
    Ele é Jesus Cristo, Nosso Senhor.
    Por Ele recebemos a graça e a missão de apóstolo,
    a fim de levarmos todos os gentios a obedecerem à fé,
    para honra do seu nome,
    dos quais fazeis parte também vós,
    chamados por Jesus Cristo.
    A todos os que habitam em Roma,
    amados por Deus e chamados a serem santos,
    a graça e a paz de Deus nosso Pai
    e do Senhor Jesus Cristo.

    AMBIENTE

    A "Carta aos Romanos" é uma carta escrita no final da terceira viagem missionária de Paulo. Preparando-se para partir de Corinto a caminho de Jerusalém, o apóstolo sente que terminou a sua missão no Mediterrâneo oriental e prepara-se para continuar o seu trabalho missionário no ocidente. O seu olhar dirige-se, agora, para Roma e para a Península Ibérica (cf. Rm 15,24): os seus planos passam por anunciar aí o Evangelho de Jesus... Estamos no ano 57 ou 58.
    Paulo está preocupado com o futuro da Igreja, pois manifestam-se algumas dificuldades de relacionamento entre judeo-cristãos e pagano-cristãos, fruto das diferenças sociais, culturais e religiosas subjacentes aos dois grupos. Na comunidade de Roma, essas diferenças sentem-se com alguma intensidade e ameaçam a unidade da Igreja... Nesta situação, Paulo escreve para sublinhar aquilo que a todos une e insiste que todos - judeus e não judeus - fazem parte do mesmo Povo de Deus e devem viver no amor e na fraternidade.
    O texto que nos é hoje proposto é parte da introdução à carta. Sabendo que se trata de uma comunidade que não foi fundada por ele, Paulo adopta singulares precauções diplomáticas, a fim de não melindrar os cristãos de Roma. Começa por se apresentar e por definir a missão que Deus lhe confiou.

    MENSAGEM

    Num começo solene, Paulo define-se a si mesmo com três apelativos: ele é servo de Jesus Cristo, é apóstolo por chamamento divino e é eleito para anunciar o Evangelho.
    Dizer que é "servo de Jesus Cristo" significa dizer que ele pôs a sua vida, incondicionalmente, ao serviço de Jesus Cristo. A designação "servo" não tem aqui qualquer conotação com escravidão (o que, de resto, estaria em contradição com a consciência que Paulo tem da liberdade cristã); mas deve ser entendida como entrega amorosa a Cristo. Desta forma, Paulo define o sentido da sua actividade missionária: é um serviço a Cristo e ao seu projecto libertador em favor dos homens.
    Dizer que é "apóstolo por chamamento divino" equivale a dizer que ele é uma testemunha fiel de Jesus e da sua mensagem. Deus chamou-o para dar esse testemunho; e Paulo, consciente desse facto, está disposto a enfrentar todas as dificuldades, a fim de ser fiel a esse chamamento.
    Dizer que é "escolhido para o Evangelho" quer dizer que Paulo tem consciência de ser, desde sempre (inclusive, antes do seu nascimento), eleito por Deus para a tarefa de levar a Boa Nova da libertação aos homens de toda a terra. Ele nasceu para anunciar o Evangelho e para ser testemunha do projecto de salvação que Deus quer oferecer aos homens.
    Estes três apelativos têm como centro o anúncio do "Evangelho". Na perspectiva de Paulo, o "Evangelho" é a proposta libertadora de Deus, que se tornou viva e presente no mundo através da pessoa de Jesus Cristo, o Messias, e que se destina à salvação de todos os homens. Não se trata de uma colecção de textos mortos, ou de uma doutrina bem ou mal articulada; mas trata-se de uma proclamação viva, activa, transformadora, capaz de gerar vida nova e liberdade plena naqueles que a escutam e a acolhem. Paulo sente que toda a sua vida está ao serviço desse projecto e que a sua missão é levá-lo a todos os homens.
    No nosso texto há, ainda, uma primitiva fórmula, na qual Paulo afirma a sua fé em Jesus Cristo, nascido da descendência de David, mas constituído Filho de Deus pelo Espírito que santifica; o seu poder manifestou-se na ressurreição - a "prova provada" da sua filiação divina.

    ACTUALIZAÇÃO

    Para a reflexão, considerar os seguintes dados:
    • A primeira coisa que convém ter em conta, a partir do texto, é que Jesus Cristo veio ao mundo para apresentar aos homens um projecto de salvação; esse projecto é o caminho seguro para deixarmos cair as cadeias que nos oprimem e para chegarmos à vida plena que Deus nos quer oferecer. Neste tempo de Advento, esperamos a salvação de Deus, que vem ao nosso encontro oferecer-nos a vida nova.
    • Ser cristão é ser chamado a testemunhar no mundo essa proposta de vida nova e de liberdade. Não se trata de aceitar umas fórmulas de fé cobertas de poeira, nem de estudar nos livros um sistema filosófico ou teológico coerente, que ensinamos com lógica e com alguma pedagogia; trata-se de trazer ao mundo uma proposta viva, transformadora, libertadora, da qual damos testemunho com palavras e com gestos concretos. É isso que acontece? Testemunho a minha fé com a vida? O meu testemunho é transformador e libertador para os meus irmãos escravizados?
    • Para Paulo, o anúncio do Evangelho não é uma forma de sobressair, de se elevar acima dos outros, de adquirir importância e estatuto; mas é uma missão que Deus confia àqueles que elege e que deve ser cumprida com amor e com espírito de serviço. É desta forma que eu testemunho o Evangelho?

    ALELUIA - Mt 1,23

    Aleluia. Aleluia.
    A Virgem conceberá e dará à luz um Filho,
    que será chamado Emanuel, Deus connosco.

    EVANGELHO - Mt 1,18-24
    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
    O nascimento de Jesus deu-se do seguinte modo:
    Maria, sua Mãe, noiva de José,
    antes de terem vivido em comum,
    encontrara-se grávida por virtude do Espírito Santo.
    Mas José, seu esposo,
    que era justo e não queria difamá-la,
    resolveu repudiá-la em segredo.
    Tinha ele assim pensado,
    quando lhe apareceu num sonho o Anjo do Senhor,
    que lhe disse:
    «José, filho de David,
    não temas receber Maria, tua esposa,
    pois o que nela se gerou é fruto do Espírito Santo.
    Ela dará à luz um Filho
    e tu pôr-Lhe-ás o nome de Jesus,
    porque Ele salvará o povo dos seus pecados».
    Tudo isto aconteceu para se cumprir o que o senhor anunciara
    por meio do Profeta, que diz:
    «A Virgem conceberá e dará à luz um Filho,
    que será chamado 'Emanuel',
    que quer dizer 'Deus connosco'».
    Quando despertou do sono,
    José fez como o Anjo do Senhor lhe ordenara
    e recebeu sua esposa.

    AMBIENTE

    O texto que nos é hoje proposto pertence ao "Evangelho da Infância" na versão de Mateus. De acordo com os biblistas actuais, os textos do "Evangelho da Infância" pertencem a um género literário especial, chamado homologese. Este género não pretende ser um relato jornalístico e histórico de acontecimentos; mas é, sobretudo, uma catequese destinada a proclamar certas realidades salvíficas (que Jesus é o Messias, que Ele vem de Deus, que Ele é o "Deus connosco"). Desenvolve-se em forma de narração e recorre às técnicas do midrash haggádico (uma técnica de leitura e de interpretação do texto sagrado usada pelos rabbis judeus da época de Jesus). A homologese utiliza e mistura tipologias (factos e pessoas do Antigo Testamento, encontram a sua correspondência em factos e pessoas do Novo Testamento) e aparições apocalípticas (anjos, aparições, sonhos) para fazer avançar a narração e para explicitar determinada catequese sobre Jesus. O Evangelho que nos é hoje proposto deve ser entendido a esta luz: não interessa, pois, estar aqui à procura de factos históricos; interessa, sobretudo, perceber o que é que a catequese cristã primitiva nos ensina, através destas narrações, sobre Jesus.
    Há ainda outra questão que importa ter em conta, para percebermos o pano de fundo da narração que nos é proposta: a situação de Maria e José. O casamento hebraico considerava o compromisso matrimonial em duas etapas: havia uma primeira fase, na qual os noivos se prometiam um ao outro (os "esponsais"); só numa segunda fase surgia o compromisso definitivo (as cerimónias do matrimónio propriamente dito)... Entre os "esponsais" e o rito do matrimónio, passava um tempo mais ou menos longo, durante o qual qualquer uma das partes podia voltar atrás, ainda que sofrendo uma penalidade. Durante os "esponsais", os noivos não viviam em comum; mas o compromisso que os dois assumiam tinha já um carácter estável, de tal forma que, se surgia um filho, este era considerado filho legítimo de ambos. A Lei de Moisés considerava a infidelidade da "prometida" como uma ofensa semelhante à infidelidade da esposa (cf. Dt 22,23-27)... E a união entre os dois "prometidos" só podia dissolver-se com a fórmula jurídica do divórcio. Ora, segundo o texto que nos é proposto, José e Maria estavam na situação de "prometidos": ainda não tinham celebrado o matrimónio, mas já tinham celebrado os "esponsais".

    MENSAGEM

    Segundo a narração de Mateus, José apercebeu-se que Maria estava grávida, durante a fase dos esponsais... Como sabia não ser o pai do bebé que estava para chegar, resolveu abandonar Maria, em segredo; mas um anjo do Senhor apareceu-lhe em sonhos e esclareceu o mistério: "Aquele que vai nascer é fruto do Espírito Santo". O que é que temos aqui? Reportagem de acontecimentos históricos?
    O anúncio do anjo a José (vers. 20-24) segue o esquema dos relatos do Antigo Testamento, em que se anuncia o nascimento de uma personagem importante (cf. Jz 13): a) o anúncio está rodeado de sinais divinos (o "anjo do Senhor", o sonho); b) que provocam medo e espanto; c) o mensageiro divino anuncia qual será o nome e a missão da criança que vai nascer; d) dá-se um sinal que confirma o anúncio (o cumprimento das Escrituras). A função destes anúncios é vincular a personagem, desde o seu nascimento, com o projecto divino. Este mesmo esquema estereotipado é, aliás, usado por Lucas para descrever o nascimento de João Baptista (cf. Lc 1,5-25).
    Neste episódio temos, portanto, não uma descrição de factos históricos, mas uma catequese sobre Jesus (que é apresentada recorrendo a esquemas literários, conhecidos dos escritores bíblicos). Então, o que é que esta catequese procura ensinar?
    Fundamentalmente, procura-se mostrar que Jesus vem de Deus, que a sua origem é divina (Maria encontra-se grávida por virtude do Espírito Santo" - vers. 18). Procura-se, ainda, ensinar qual será a missão de Jesus: o nome que Lhe é atribuído mostra que Ele vem de Deus com uma proposta de salvação para os homens ("Jesus" significa "Jahwéh salva"). Também se diz, de forma clara, que Ele é o Messias de Deus, da descendência de David, que os profetas anunciaram (a referência ao seu nascimento de uma "virgem" não deve ser vista como a afirmação do dogma da virgindade de Maria, mas como a afirmação de que Jesus é o Messias anunciado pelos profetas - nomeadamente pelo texto de Is 7,14 - enviado por Deus para restaurar o reino de David).
    De qualquer forma, a figura de José desempenha aqui um papel muito interessante... O anjo dirige-se a ele como "filho de David" (vers. 20) e pede-lhe que receba Maria e que ponha um nome à criança (vers. 21). A imposição do nome é o rito através do qual um pai recebe uma criança como filha. Assim, Jesus passa a fazer parte da família de David e a ser, naturalmente, a esperança para a restauração desse reino ideal de paz e de felicidade pelo qual todo o Povo ansiava. Pela obediência de José, realizam-se os planos e as promessas de Deus ao seu Povo.

    ACTUALIZAÇÃO

    Reflectir a partir das seguintes questões:
    • Esse Jesus que esperamos é - de acordo com a catequese que a primitiva comunidade cristã nos apresenta por intermédio de Mateus - o "Deus que vem ao encontro dos homens", para lhes oferecer a salvação. A festa do Natal que se aproxima deve ser o encontro de cada um de nós com este Deus; e esse encontro só será possível se tivermos o coração disponível para O acolher e para abraçar a proposta que Ele nos veio fazer. &Eacute
    ; isto que acontece?
    • Com frequência, o Natal é a festa pagã do consumismo, das prendas obrigatórias, da refeição melhorada, das tradições familiares que têm de ser respeitadas mesmo quando não significam nada... O meu Natal - este Natal que estou a preparar no meu coração - é uma celebração pagã ou um verdadeiro encontro com esse Deus libertador, cuja proposta de salvação estou interessado em escutar e acolher?
    • A figura de Maria é uma figura incontornável para quem prepara o Natal: é a figura que está sempre disponível para escutar os apelos de Deus e que lhes responde com um "sim" de disponibilidade total... É esse "sim" e essa disponibilidade que tornam possível a presença salvadora de Deus no mundo. Estou na mesma atitude de disponibilidade aos desafios de Deus? Sou capaz de dizer todos os dias "sim", de forma a que, através de mim, Deus possa nascer no mundo e salvar os homens?
    • Outra figura que nos interpela e questiona neste tempo de Advento é a figura de José... Ele é o homem a quem Deus envolve nos seus planos - planos que, provavelmente, lhe parecem misteriosos e inacessíveis - mas que tudo aceita, numa obediência total a Deus. Sou capaz de acolher os projectos de Deus - mesmo quando eles desorganizam os meus projectos pessoais - com a mesma disponibilidade de José, na obediência total aos esquemas de Deus?

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 4º DOMINGO DO ADVENTO
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 4º Domingo do Advento, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. FAVORECER OS TEMPOS DE SILÊNCIO.
    O gesto-símbolo para este domingo pode ser a comunhão em silêncio: é no silêncio e na contemplação que Maria acolheu o Corpo Sagrado; é num profundo recolhimento que podemos receber nas nossas mãos o grão lançado à terra... Recolhimento que deverá caracterizar o conjunto de toda esta missa, a começar pelas pausas que serão indicadas no rito de abertura da celebração.

    3. RENOVAR A PROFISSÃO DE FÉ.
    Depois da homilia e de um breve tempo de silêncio, todos se levantam; em seguida, o leitor da segunda leitura vai ao ambão e, lenta e solenemente, proclama de novo esta passagem da Carta aos Romanos: «...nascido da descendência de David, segundo a carne, mas, pelo Espírito que santifica, constituído Filho de Deus em todo o seu poder pela sua ressurreição de entre os mortos: Ele é Jesus Cristo, Nosso Senhor». Depois, após uma breve pausa, o presidente da assembleia diz: "Irmãos e irmãs, nós que acreditamos nesta Boa Nova, professemos a nossa fé!"

    4. BILHETE DE EVANGELHO.
    Aos homens perdidos, Deus oferece a sua presença. O Povo de Deus estava perdido, esperava o Messias prometido pelos Profetas e não O via chegar. Maria e José estavam perdidos, porque não havia lugar para eles. Os pastores estavam perdidos, eram excluídos em toda a parte. Os Magos estavam perdidos, não sabiam onde devia nascer o Messias. E eis que Deus oferece a sua presença: Ele é o Emanuel, Deus connosco! Depois do Natal, ninguém está totalmente perdido. A solidão total não existe mais. Deus está sempre presente. Mas é necessário que os seus mediadores manifestem esta presença. Se estamos perdidos, estendamos a mão para conseguirmos agarrar outra. Se encontrarmos um irmão perdido, estendamos a mão para que Natal seja verdadeiramente Natal para ele e ele saiba que Deus está bem presente entre os seus.

    5. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
    Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.
    No final da primeira leitura:
    Nós Te louvamos pelas promessas feitas ao teu povo, à Casa de David. Tu abriste-nos o espírito: da casa de tijolos orientaste-nos para esta casa de pedras vivas cuja fundação e lar é Jesus.
    Nós Te pedimos pela tua Casa, que é a tua Igreja, na multidão das suas comunidades: que ela manifeste a presença do Emanuel!
    No final da segunda leitura:
    Nós Te damos glória, Deus nosso Pai, pela graça e pela paz, pelo apelo de Ti recebido, pela Boa Nova do teu Filho, pela sua ressurreição de entre os mortos e pelo teu Espírito que santifica.
    Nós Te suplicamos por todas as nações pagãs: que o teu Nome seja honrado um dia em todas as línguas da terra.
    No final do Evangelho:
    Nós Te damos graças pela vinda misteriosa de Jesus à nossa humanidade, como Filho de David. Nós Te louvamos pela acção do teu Espírito em Maria, por esta nova criação, aurora de uma nova humanidade.
    Nós Te pedimos pelas tuas comunidades: que elas acolham e partilhem a vida nova recebida pela comunicação do teu Filho.

    6. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Pode-se escolher a Oração Eucarística IV.

    7. PALAVRA EXPLICADA 1: SONHOS.
    As advertências transmitidas pelos sonhos são numerosas no relato da infância do Evangelho segundo São Mateus. Os beneficiários são os anjos (Mt 2,12), mas sobretudo José (Mt 1,20; 2,13.19.22), habitualmente representado "sonhador" nos ícones da Natividade. Numerosas personagens bíblicas foram advertidas durante a noite, em sonho: Jacob, pela visão da escada a ligar o céu (Gen 28,12), o profeta Natã, enviado em missão junto de David (2 Sam 7,4), o apóstolo Paulo, pela sua estadia na Macedónia (Act 16,9), etc. Através de mensagens invisíveis enviadas por Deus, como os anjos, a comunicação de noite, em sonhos e visões, era o meio privilegiado e ideal para transmitir as suas informações e as suas instruções. Na liturgia, numerosas tradições tiveram como origem tais visões pelo sonho. É o caso para o louvor celeste "Santo, Santo, Santo, o Senhor", comunicado ao profeta Isaías (Is 6) e para todas as aclamações recebidas das visões do Apocalipse, como a de Ap 7,2.14.

    8. PALAVRA EXPLICADA 2: POVO SANTO.
    A segunda leitura deste domingo termina com estas palavras: "todos os amados por Deus e chamados a serem santos". Daí o povo de Deus ser chamado "povo santo". Este título, tão frequente nas orações eucarísticas incluindo os prefácios, vem da Bíblia. Na expressão "povo santo", a santidade não se reduz a uma conduta virtuosa ou íntegra que a palavra "santo" sugere familiarmente. Esta santidade é a comunicação de Deus ao seu povo, desde a assembleia do Sinai: "Sereis santos para Mim, porque Eu sou santo" (Lev 20,26). Tal título e outros semelhantes como "nação santa", dados às nossas comunidades, manifestam a continuidade da obra de Deus: o que Ele começou no Sinai realiza-o de domingo a domingo nas nossas liturgias.

    9. ATENÇÃO ÀS CRIANÇAS: A MISSÃO DE JOSÉ.
    Uma partilha de Evangelho pode ser útil hoje com as crianças, para lhes fazer transmitir qual é a bela missão de José. É possível que algumas crianças, vivendo numa família "recomposta", admitam mais facilmente que outras que Jesus tenha podido ter um "verdadeiro papá" e um "outro papá". O importante é que todos descubram que Jesus é "Deus" mas que teve necessidade como nós, para crescer, de um pai e de uma mãe. José envolveu Maria e José com toda a sua ternura. As crianças dirão a toda a assembleia o que José fez por Jesus: deu-lhe o seu nome (como hoje se "declara" um nascimento), trabalhou para o alimentar e o ajudar a crescer, protegeu Jesus. Poder-se-á terminar com uma breve oração a São José: "Obrigado, José, por teres tomado o cuidado de Jesus. Hoje, reza-Lhe por nós, para que Ele proteja todas as crianças".

    10. PALAVRA PARA O CAMINHO.
    Sinais! Deus está sempre a dar-nos sinais, mas nós procuramos quase sempre do lado do extraordinário. Raramente Deus está no extraordinário. O sinal que Ele nos oferece é o de uma família humana, como as nossas, em que Ele se faz corpo para ser "Deus connosco". Que espaço Lhe abrimos nas nossas vidas de homens e de mulheres para que o Sinal da sua Presença e do seu Amor seja lisível para todos os que O procuram hoje? Só com o coração aberto a Deus poderemos acolher os irmãos... Só deixando que Deus seja Natal nas nossas vidas poderemos ser Natal para os outros... Nem mais! Mãos à obra em mais uma semana que Deus nos concede, a semana do Natal!

     

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • Missa da meia-noite de Natal - Ano A

    Missa da meia-noite de Natal - Ano A


    24 de Dezembro, 2022

    ANO A
    SOLENIDADE DO NATAL DO SENHOR
    – MISSA DA MEIA-NOITE

    Tema da "Missa da meia-noite" de Natal

    A liturgia desta noite fala-nos de um Deus que ama os homens; por isso, não os deixa perdidos e abandonados a percorrer caminhos de sofrimento e de morte, mas envia "um menino" para lhes apresentar uma proposta de vida e de liberdade. Esse "menino será "a luz" para "o povo que andava nas trevas".
    A primeira leitura anuncia a chegada de "um menino", da descendência de David, dom de Deus ao seu Povo; esse "menino" eliminará a guerra, o ódio, o sofrimento e inaugurará uma era de alegria, de felicidade e de paz sem fim.
    O Evangelho apresenta a realização da promessa profética: Jesus, o "menino de Belém", é o Deus que vem ao encontro dos homens para lhes oferecer - sobretudo aos pobres e marginalizados - a salvação. A proposta que Ele traz não será uma proposta que Deus quer impor pela força; mas será uma proposta que Deus oferece ao homem com ternura e amor.
    A segunda leitura lembra-nos as razões pelas quais devemos viver uma vida cristã autêntica e comprometida: porque Deus nos ama verdadeiramente; porque este mundo não é a nossa morada permanente e os valores deste mundo são passageiros; porque, comprometidos e identificados com Cristo, devemos realizar as obras d'Ele.

    LEITURA I - Is 9,1-6

    Leitura do Livro de Isaías

    O povo que andava nas trevas viu uma grande luz;
    para aqueles que habitavam nas sombras da morte
    uma luz começou a brilhar.
    Multiplicastes a sua alegria,
    aumentastes o seu contentamento.
    Rejubilam na vossa presença,
    como os que se alegram no tempo da colheita,
    como exultam os que repartem despojos.
    Vós quebrastes, como no dia de Madiã,
    o jugo que pesava sobre o povo,
    o madeiro que ele tinha sobre os ombros
    e o bastão do opressor.
    Todo o calçado ruidoso da guerra
    e toda a veste manchada de sangue
    serão lançados ao fogo e tornar-se-ão pasto das chamas.
    Porque um menino nasceu para nós,
    um filho nos foi dado.
    Tem o poder sobre os ombros
    e será chamado «Conselheiro admirável, Deus forte,
    Pai eterno, Príncipe da paz».
    O seu poder será engrandecido numa paz sem fim,
    sobre o trono de David e sobre o seu reino,
    para o estabelecer e consolidar por meio do direito e da justiça,
    agora e para sempre.
    Assim o fará o Senhor do Universo.

    AMBIENTE

    No Livro do profeta Isaías aparece um conjunto de oráculos ditos "messiânicos", que falam desse mundo de justiça e de paz que Deus, num futuro sem data marcada, vai oferecer ao seu Povo. No entanto, não é seguro se esses textos provêm do profeta, ou se são oráculos posteriores que o editor final da obra de Isaías enxertou no texto original do profeta... É o caso deste texto que nos é proposto.
    Se for de Isaías, o nosso texto pertence, provavelmente, à fase final da vida do profeta... Estamos na época do rei Ezequias, no final do séc. VIII a.C.; o rei, desdenhando as indicações do profeta (para quem as alianças políticas são sintoma de grave infidelidade para com Jahwéh, pois significam colocar a confiança e a esperança nos homens), envia embaixadas ao Egipto, à Fenícia e à Babilónia, procurando consolidar uma frente contra a grande potência da época - a Assíria. A resposta de Senaquerib, rei da Assíria, não tarda: tendo vencido, sucessivamente, os membros da coligação, volta-se contra Judá, devasta o país e põe cerco a Jerusalém (701 a.C.). Ezequias tem de submeter-se e fica a pagar um pesado tributo aos assírios.
    Desiludido com os reis e com a política, o profeta teria, então, começado a sonhar com um tempo novo, sem guerra nem armas, onde reinam a justiça, o direito e o "temor de Deus". Este texto pode ser dessa época.
    O "menino" aqui referenciado, da descendência de David, pode também estar relacionado com o "Emanuel" de Is 7,14-17. Trata-se, em qualquer caso, de um texto que vai alimentar a esperança messiânica e que vai potenciar o sonho de um futuro novo, de paz e de felicidade para o Povo de Deus.

    MENSAGEM

    Para descrever a situação de opressão, de frustração, de desespero, de falta de perspectivas, de desconfiança em relação ao futuro em que a comunidade nacional estava mergulhada, o profeta fala de um "povo que andava nas trevas" e que habitava "nas sombras da morte". O panorama é sombrio e parece não haver saída, pois os reis de Judá já provaram ser incapazes de conduzir o seu Povo em direcção à felicidade e à paz.
    Mas, de repente, aparece uma "luz". Essa luz acende a esperança e provoca uma explosão de alegria. Para descrever essa alegria, o profeta utiliza duas imagens extremamente sugestivas: é como quando, no fim das colheitas, toda a gente dança feliz celebrando a abundância dos alimentos; é como quando, após a caçada, os caçadores dividem a presa abundante.
    Mas porquê essa alegria e essa felicidade? Porque o jugo da opressão que pesava sobre o Povo foi quebrado e a paz deixou de ser uma miragem para se tornar uma realidade. No quadro que representa a vitória da paz, vemos os símbolos da guerra (o pesado calçado dos guerreiros e as roupas ensanguentadas) a serem destruídos pelo fogo. Quem é que provocou a alegria do Povo, derrotou a opressão, venceu a guerra, restaurou a paz? O autor não o diz claramente; mas ninguém duvida que tudo isso é acção do Deus libertador.
    Como foi que Deus instaurou essa nova ordem? Foi através de "um menino", enviado para restaurar o trono de David e para reinar no direito e na justiça (as palavras "mishpat" e "zedaqa", utilizadas neste contexto, evocam uma sociedade onde as decisões dos tribunais fundamentam uma recta ordem social, onde os direitos dos pobres e dos oprimidos são respeitados e onde, enfim, há paz). O quádruplo nome desse "menino" evoca títulos de Deus ou qualidades divinas (o título "conselheiro maravilhoso" celebra a capacidade de conceber desígnios prodigiosos e é um atributo de Deus - cf. Is 25,1; 28,29; o título "Deus forte" é um nome do próprio Jahwéh - cf. Dt 10,17; Jr 32,18; Sl 24,8; o título "príncipe da paz" leva, também, a Jahwéh, aquele que é "a paz" - cf. Is 11,6-9; Mi 5,4; Zac 9,10; Sl 72,3.7). Quanto ao título "Pai eterno", é um título do rei - cf. 1 Sm 24,12 - e é um título dado ao faraó nas cartas de Tell el-Amarna). Fica, assim, claro que esse "menino" é um dom de Deus ao seu Povo e que, com ele, Deus residirá no meio do seu Povo, oferecendo-lhe cada dia a justiça, o direito, a paz sem fim.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão deste texto pode fazer-se a parti
    r dos seguintes elementos:

    • É Jesus, o "menino de Belém", que dá sentido pleno a esta profecia messiânica de Isaías. Ele é "aquele que veio de Deus" para vencer as trevas e as sombras da morte que ocultavam a esperança e instaurar o mundo novo da justiça, da paz e da felicidade. O nascimento de Jesus que celebramos esta noite significa que, efectivamente, este "Reino" chegou e incarnou no meio dos homens. No entanto: Ele é hoje uma realidade instituída, viva, actuante na história humana? Porquê?

    • Acolher Jesus, celebrar o seu nascimento, é aceitar esse projecto de justiça e de paz que Ele veio trazer aos homens. Esforçamo-nos por tornar realidade o "Reino de Deus"? Como lidamos com a injustiça, a opressão, a guerra, a violência: com a indiferença de quem sente que não tem nada a ver com isso, ou com a inquietação de quem se sente responsável pela instauração do "Reino de Deus"?

    • Em que ou em quem coloco a minha esperança e a minha segurança? Nos políticos que me prometem tudo e se servem da minha ingenuidade para fins próprios? No dinheiro que se desvaloriza e que não serve para comprar a paz do meu coração? Na situação sólida da minha empresa, que pode desfazer-se diante das próximas convulsões sociais ou durante a próxima crise energética? Isaías diz que só podemos confiar em Deus e nesse "menino" que Ele mandou ao nosso encontro, se quisermos encontrar a "luz" e a paz.

    • Reparemos, ainda, no "jeito" de Deus: Ele não se serve da força e do poder para intervir na história e para mudar o mundo; mas é através de um "menino" - símbolo máximo da fragilidade e da dependência - que Deus propõe aos homens o seu projecto de salvação. Temos consciência de que é na simplicidade e na humildade que Deus age no mundo? E nós, seguimos os passos de Deus e respeitamos a sua lógica quando queremos propor algo aos nossos irmãos?

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 95 (96)

    Refrão: Hoje nasceu o nosso Salvador, Jesus Cristo, Senhor.

    Cantai ao Senhor um cântico novo,
    cantai ao Senhor, terra inteira,
    cantai ao Senhor, bendizei o seu nome.

    Anunciai dia a dia a sua salvação,
    publicai entre as nações a sua glória,
    em todos os povos as suas maravilhas.

    Alegrem-se os céus, exulte a terra,
    ressoe o mar e tudo o que ele contém,
    exultem os campos e quanto neles existe,
    alegrem-se as árvores das florestas.

    Diante do Senhor que vem,
    que vem para julgar a terra:
    julgará o mundo com justiça
    e os povos com fidelidade.

    LEITURA II - Tito 2,1-14

    Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo a Tito

    Caríssimo:
    Manifestou-se a graça de Deus,
    fonte de salvação para todos os homens,
    ensinando-nos a renunciar à impiedade e aos desejos mundanos
    para vivermos, no tempo presente,
    com temperança, justiça e piedade,
    aguardando a ditosa esperança e a manifestação da glória
    do nosso grande Deus e Salvador, Jesus Cristo,
    que Se entregou por nós,
    para nos resgatar de toda a iniquidade
    e preparar para Si mesmo um povo purificado,
    zeloso das boas obras.

    AMBIENTE

    Tito, o destinatário desta carta, é um cristão convertido por Paulo (cf. Tt 1,4), que acompanhou o apóstolo em algumas missões importantes (participou, com Paulo, no concílio de Jerusalém - cf. Ga 2,1-2; esteve com ele em Éfeso; por duas vezes, foi enviado a Corinto, a fim de resolver conflitos entre Paulo e essa comunidade - cf. 2 Cor 7,6-7; 8,16-17) e que foi animador da Igreja de Creta (cf. Tt 1,5).
    No entanto, esta carta não parece ser de Paulo; parece, antes, ser um texto tardio, surgido quando a preocupação fundamental das comunidades cristãs já não se centrava na vinda iminente do Senhor, mas em definir a conduta dos cristãos no tempo presente. Estamos numa época de certo marasmo, em que os cristãos perderam o entusiasmo inicial e em que muitos aparecem instalados, acomodados numa fé morna e sem grandes exigências. Era preciso recordar os fundamentos da fé e exortar a uma vida cristã exigente e comprometida. Neste contexto, a preocupação fundamental do autor desta carta será apresentar uma série de conselhos práticos que ajudem os cristãos a viver, com coerência e com verdade, a sua fé no meio do mundo.

    MENSAGEM

    Neste fragmento, verdadeiro centro e coração de toda a carta, o autor tenta dar aos cristãos razões válidas para viver uma vida cristã autêntica e comprometida. Quais são essas razões?
    A primeira é o amor ("kharis") de Deus, que foi oferecido a todos os homens. É esse amor que possibilita a renúncia à impiedade e aos desejos deste mundo e a vivência da temperança, da justiça e da piedade; sendo os destinatários desse amor transformador e renovador, temos de viver uma vida nova e comprometida com o Evangelho.
    A segunda é a esperança na manifestação gloriosa de Cristo, que convida os homens a perceber que a terra não é a sua pátria definitiva; quem espera a segunda vinda de Cristo, percebe que só faz sentido olhar para os bens essenciais; consequentemente, desprezará os bens materiais, que só interessam a este mundo.
    A terceira é a obra redentora levada a cabo por Cristo. Cristo entregou-Se totalmente, até à morte, para nos salvar do egoísmo, do orgulho, do pecado e para fazer de nós homens novos. Ligados a Ele pelo baptismo, tornamo-nos um com Ele e recebemos vida d'Ele... Se estamos ligados a Cristo e se recebemos d'Ele vida, essa vida tem de manifestar-se na nossa existência diária.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pode fazer-se a partir das seguintes questões:

    • Temos consciência do amor de Deus e que a incarnação de Jesus é o sinal mais expressivo desse amor por nós? Sendo os destinatários de um tal amor, amamos Deus da mesma maneira? A nossa vida é uma resposta coerente ao amor de Deus - isto é, um compromisso autêntico com Deus e com os seus valores?

    • A nossa civilização ocidental institucionalizou e sacralizou uma série de valores efémeros (dinheiro, poder, êxito profissional, "status" social, bens de consumo...) e montou uma máquina de publicidade eficaz para os apresentar como a chave da verdadeira felicidade. No entanto, com frequência esses valores estão em absoluta contradição com os valores do Evangelho... Aprendemos, com Jesus, a ter um olhar crítico sobre os valores que o mundo nos propõe e a confrontar, dia a dia, a nossa vida com os valores do Evangelho?

    • É Cristo a nossa referência? É d'Ele que recebemos vida? O seu "jeito" de viver (no amor, na entrega, no dom da vida) foi assumido na nossa vida de todos os dias e na nossa relação com os irmãos que
    nos rodeiam?

    ALELUIA - Lc 2,10-11

    Aleluia. Aleluia.

    Anuncio-vos uma grande alegria:
    Hoje nasceu o nosso salvador, Jesus Cristo, Senhor.

    EVANGELHO - Lc 2,1-14

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas

    Naqueles dias, saiu um decreto de César Augusto,
    para ser recenseada toda a terra.
    Este primeiro recenseamento efectuou-se
    quando Quirino era governador da Síria.
    Todos se foram recensear, cada um à sua cidade.
    José subiu também da Galileia, da cidade de Nazaré,
    à Judeia, à cidade de David, chamada Belém,
    por ser da casa e da descendência de David,
    a fim de se recensear com Maria, sua esposa,
    que estava para ser mãe.
    Enquanto ali se encontravam,
    chegou o dia de ela dar à luz
    e teve o seu Filho primogénito.
    Envolveu-O em panos e deitou-O numa manjedoura,
    porque não havia lugar para eles na hospedaria.
    Havia naquela região uns pastores que viviam nos campos
    e guardavam de noite os rebanhos.
    O Anjo do Senhor aproximou-se deles
    e a glória do Senhor cercou-os de luz;
    e eles tiveram grande medo.
    Disse-lhes o Anjo: «Não temais,
    porque vos anuncio uma grande alegria para todo o povo:
    nasceu-vos hoje, na cidade de David, um Salvador,
    que é Cristo Senhor.
    Isto vos servirá de sinal:
    encontrareis um Menino recém-nascido,
    envolto em panos e deitado numa manjedoura».
    Imediatamente, juntou-se ao Anjo
    uma multidão do exército celeste,
    que louvava a Deus, dizendo:
    «Glória a Deus nas alturas
    e paz na terra aos homens por Ele amados».

    AMBIENTE

    Lucas é o evangelista mais preocupado com as referências históricas... O seu Evangelho está cheio de indicações que procuram situar com precisão os acontecimentos... No que diz respeito ao nascimento de Jesus, Lucas apresenta, também, algumas indicações que pretendem situar o acontecimento numa época e num espaço concreto... Dessa forma, Lucas dá a entender que não estamos diante de um facto lendário, mas de algo perfeitamente integrado na vida e na história dos homens.
    Há, no entanto, um problema... Lucas é um cristão de origem grega, que não conhece a Palestina e que tem noções muito básicas da história do Povo de Deus... Por isso, as suas indicações históricas e geográficas são, com alguma frequência, imprecisas e inexactas. Pode ser o caso das indicações fornecidas a propósito do nosso texto, já que não é muito fácil explicá-las.
    É duvidoso que Quirino, como governador, tenha ordenado um recenseamento na época em que Jesus nasceu (só por volta do ano 6 d.C. é que ele se tornou governador da Síria, embora possa ter sido "legado" romano na Síria entre 12 e 8 a.C.... Pode, realmente, nessa altura, ter ordenado um recenseamento que teve efeitos práticos na Palestina por volta de 6/7 a.C., altura do nascimento de Jesus).
    De qualquer forma, convém ter em conta que Lucas não está a escrever história, mas a fazer teologia e a apresentar uma catequese sobre Jesus, o Filho de Deus que veio ao encontro dos homens para lhes apresentar uma proposta de salvação.

    MENSAGEM

    A primeira indicação importante vem da referência a Belém como o lugar do nascimento de Jesus... É uma indicação mais teológica do que geográfica: o objectivo do autor é sugerir que este Jesus é o Messias, da descendência de David (a família de David era natural de Belém), anunciado pelos profetas (cf. Miq 5,1). Fica, desta forma, claro que o nascimento de Jesus se integra no plano de salvação que Deus tem para os homens - plano que os profetas anunciaram e cuja realização o Povo de Deus aguardava ansiosamente.
    Uma segunda indicação importante resulta do "quadro" do nascimento. Lucas descreve com algum pormenor a pobreza e a simplicidade que rodeiam a vinda ao mundo do libertador dos homens: a falta de lugar na hospedaria, a manjedoira dos animais a fazer de berço, os panos improvisados que envolvem o bebé, a visita dos pastores... É na pobreza, na simplicidade, na fragilidade, que Deus Se manifesta aos homens e lhes oferece a salvação. Os esquemas de Deus não se impõem pela força das armas, pelo poder do dinheiro ou pela eficácia de uma boa campanha publicitária; mas Deus escolhe vir ao encontro dos homens na simplicidade, na fraqueza, na ternura de um menino nascido no meio de animais, na absoluta pobreza. É assim que Deus entra na nossa história... É assim a lógica de Deus.
    Uma terceira indicação é dada pela referência às "testemunhas" do nascimento: os pastores. Trata-se de gente considerada rude, violenta, marginal, que invadiam com os rebanhos as propriedades alheias e que tinham fama de se apropriar da lã, do leite e das crias do rebanho em benefício próprio. Eram, com frequência, colocados ao lado dos publicanos e dos cobradores de impostos pela rígida moral dos fariseus: uns e outros eram pecadores públicos, incapazes de reparar o mal que tinham feito, tantas eram as pessoas a quem tinham prejudicado. Ora, Lucas coloca, precisamente, esses marginais como as "testemunhas" que acolhem Jesus. O evangelista sugere, desta forma, que é para estes pecadores e marginalizados que Jesus vem; por isso, a chegada de um tal "salvador" é uma "boa notícia": a partir de agora, os pobres, os débeis, os marginalizados, os pecadores, são convidados a integrar a comunidade dos filhos amados de Deus. Eles vêm ao encontro dessa salvação que Deus lhes oferece em Jesus e são convidados a integrar a comunidade da nova aliança, a comunidade do "Reino".
    Uma quarta indicação aparece nos títulos dados a Jesus pelos anjos que anunciam o nascimento: Ele é "o salvador, Cristo Senhor". O título "salvador" era usado, na época de Lucas, para designar o imperador ou os deuses pagãos; Lucas, ao chamar Jesus desta forma, apresenta-O como a única alternativa possível a todos os absolutos que o homem cria... O título "Cristo" equivale a "Messias": aplicava-se, no judaísmo palestinense do séc. I, a um rei da descendência de David, que viria restaurar o reino ideal de justiça e de paz da época davídica; dessa forma, Lucas sugere que o "menino de Belém" é esse rei esperado. O título "Senhor" expressa o carácter transcendente da pessoa de Jesus e o seu domínio sobre a humanidade. Com estes três títulos, a catequese lucana apresenta Jesus aos homens e define o seu papel e a sua missão.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão sobre este texto pode partir das seguintes indicações:

    • O menino de Belém leva-nos a contemplar o incrível amor de um Deus que Se preocupa até ao extremo com a vida e a felicidade dos homens e que envia o próprio Filho ao mundo para apresentar aos homens um projecto de salvação/
    libertação. Nesse menino de Belém, Deus grita-nos a radicalidade do seu amor por nós.

    • O presépio apresenta-nos a lógica de Deus que não é, tantas vezes, igual à lógica dos homens: a salvação de Deus não se manifesta nos encontros internacionais onde os donos do mundo decidem o destino dos homens, nem nos gabinetes ministeriais, nem nos conselhos de administração das multinacionais, nem nos salões onde se concentram as estrelas do jet-set, mas numa gruta de pastores onde brilha a fragilidade, a dependência, a ternura, a simplicidade de um bebé recém-nascido. Qual é a lógica com que abordamos o mundo: a lógica de Deus ou a lógica dos homens?

    • A presença libertadora de Jesus neste mundo é uma "boa notícia" que devia encher de felicidade os pobres, os débeis, os marginalizados e dizer-lhes que Deus os ama, que quer caminhar com eles e que quer oferecer-lhes a salvação. É essa proposta que nós, os seguidores de Jesus, passamos ao mundo? Nós, Igreja, não estaremos demasiado ocupados a discutir questões laterais, esquecendo o essencial, o anúncio libertador aos pobres?

    • Jesus - o Jesus da justiça, do amor, da fraternidade e da paz - já nasceu, de forma efectiva, na vida de cada um de nós, nas nossas famílias, nas nossas casas religiosas, nas nossas comunidades cristãs?

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA A SOLENIDADE DE NATAL ("Missa da meia-noite")
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao Dia de Natal, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa...

    2. UMA ASSEMBLEIA EXCEPCIONAL.
    Com vigília de Natal ou não, é preciso não esquecer que grande parte da assembleia nesta missa é composta por cristãos que só vêm à igreja uma vez por ano: precisamente nesta noite! É preciso que também eles se encontrem nesta liturgia de Natal... e não sejam "enxotados" por só virem à igreja uma vez no ano. A atitude de acolhimento passa por aí... talvez a partir dessa atitude possa haver mais participação na vida da Igreja.

    3. EVANGELIÁRIO LEVADO DO PRESÉPIO.
    O Evangeliário pode estar no presépio, na penumbra. Antes do Evangelho, o presidente da assembleia (precedido de crianças com lamparinas acesas) vem buscá-lo solenemente e leva-o em procissão até ao lugar da proclamação do Evangelho. No final, o Evangelho é levado de novo (com o grupo de crianças à frente com lamparinas acesas na mão) em procissão para o presépio, agora iluminado, e coloca-o aí: nesta noite, o Verbo fez-Se carne.

    4. BILHETE DE EVANGELHO.
    É a noite em que é belo acreditar na luz... Eram muitos a caminhar na noite... A noite da espera por Maria e José com as suas questões, os seus medos, mas também a sua fé no futuro. A noite da pobreza para os pastores. A noite da interrogação para os magos vindos do Oriente. Ora, da noite jorra a luz. Uma luz que preenche a espera: "chegaram os dias em que ela devia dar à luz". Uma luz que ilumina os pobres: "a glória do Senhor envolveu-os com a sua luz". Uma luz que guia os peregrinos: "a estrela que tinham visto levantar-se precedia-os". No coração da nossa noite, ergamos os olhos, há uma luz a jorrar...

    5. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
    Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.

    No final da primeira leitura:
    Jesus, Filho de Deus e Filho de David, em Ti o povo que caminhava nas trevas da noite viu erguer-se uma grande luz; criança que nos é dada, Tu és o Deus forte, o Príncipe da Paz, Conselheiro admirável.
    Tantos povos e pessoas habitam ainda países das sombras. Guia-os nos caminhos da vida, da luz, do direito e da paz.

    No final da segunda leitura:
    Bendito sejas, Deus Nosso Pai, porque em Jesus, teu Filho, a tua graça tornou-se visível e manifestou-se para a salvação de todos os homens.
    Purifica-nos das paixões egoístas desta terra, faz de nós um povo ardente que irradie a justiça e o bem. Que o teu Espírito nos inspire a viver no mundo presente como homens razoáveis, justos e religiosos.

    No final do Evangelho:
    Jesus, Messias, nosso irmão, Tu que Te tornaste criança e que foste colocado num presépio, Tu que o Pai glorificou pela ressurreição, glória a Ti no mais alto dos céus. Com os anjos, prostramo-nos diante de Ti.
    Que a tua presença no meio de nós traga de novo a Paz ao mundo, que o teu Espírito faça de nós portadores de Luz, de Paz e de Alegria.

    6. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Pode-se escolher a Oração Eucarística II, com as variantes próprias da Festa de Natal. O presidente pode cantar a parte da narração da instituição.

    7. PALAVRA EXPLICADA: GLORIA IN EXCELSIS DEO.
    As nossas assembleias retomam as aclamações e hinos celestes que nos são revelados na Bíblia, como "Santo, Santo, Santo é o Senhor, o céu e a terra estão cheios da vossa glória" (Is 6,3; Ap 4,8). A estas palavras celestes acrescentamos as aclamações e invocações dos Evangelhos: "Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do mundo" (mensagem de João Baptista, Jo 1,29), "Bendito o que vem em nome do Senhor" (entrada de Jesus em Jerusalém, Jo 12,13). Certas aclamações fazem parte de todas as celebrações eucarísticas, como "Santo, Santo, Santo é o Senhor". Nas mais antigas fórmulas da liturgia eucarística romana, o "Glória a Deus no mais alto dos céus" (Lc 2,14) só era proclamado no Natal, por causa do Evangelho desta festa. Depois, a sua proclamação foi estendida a outras festas. No missal actual, faz parte das aclamações dominicais, mas é omitido durante dois períodos de tonalidade penitencial (cor roxa), o Advento e a Quaresma.

    8. ATENÇÃO ÀS CRIANÇAS: UMA NOITE DE FESTA.
    Vai-se dormir tarde esta noite! Tem-se mesmo o direito de dançar nesta noite! Seria bom que, com as crianças presentes, se possa viver um verdadeiro momento de alegria, de festa, de cântico. Envolver as crianças à volta da Palavra (primeira leitura), no cântico do Salmo, no cântico do Glória... louvando a Deus, com gestos.

    9. PALAVRA PARA O CAMINHO.
    Uma Criança! Nas trevas e no caos de uma sociedade que só crê na força, na violência, na guerra..., Natal é a inversão destes valores. «Deus connosco" numa Criança! Estamos preparados para arriscar com Ele nesta aventura, a única capaz de inverter a espiral infernal do Mal? Natal é isso! E levantar-se-á sobre o mundo uma grande Luz!

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • Missa do Dia de Natal - Ano A

    Missa do Dia de Natal - Ano A


    25 de Dezembro, 2022

    ANO A
    SOLENIDADE DO NATAL DO SENHOR - MISSA DO DIA

    Tema da "Missa do Dia" de Natal

    A liturgia deste dia convida-nos a contemplar o amor de Deus, manifestado na incarnação de Jesus... Ele é a "Palavra" que Se fez pessoa e veio habitar no meio de nós, a fim de nos oferecer a vida em plenitude e nos elevar à dignidade de "filhos de Deus".
    A primeira leitura anuncia a chegada do Deus libertador. Ele é o rei que traz a paz e a salvação, proporcionando ao seu Povo uma era de felicidade sem fim. O profeta convida, pois, a substituir a tristeza pela alegria, o desalento pela esperança.
    A segunda leitura apresenta, em traços largos, o plano salvador de Deus. Insiste, sobretudo, que esse projecto alcança o seu ponto mais alto com o envio de Jesus, a "Palavra" de Deus que os homens devem escutar e acolher.
    O Evangelho desenvolve o tema esboçado na segunda leitura e apresenta a "Palavra" viva de Deus, tornada pessoa em Jesus. Sugere que a missão do Filho/"Palavra" é completar a criação primeira, eliminando tudo aquilo que se opõe à vida e criando condições para que nasça o Homem Novo, o homem da vida em plenitude, o homem que vive uma relação filial com Deus.

    LEITURA I - Is 52,7-10

    Leitura do Livro de Isaías

    Como são belos sobre os montes
    os pés do mensageiro que anuncia a paz,
    que traz a boa nova, que proclama a salvação
    e diz a Sião: «O teu Deus é Rei».
    Eis o grito das tuas sentinelas que levantam a voz.
    Todas juntas soltam brados de alegria,
    porque vêem com os próprios olhos
    o Senhor que volta para Sião.
    Rompei todas em brados de alegria, ruínas de Jerusalém,
    porque o Senhor consola o seu povo,
    resgata Jerusalém.
    O Senhor descobre o seu santo braço à vista de todas as nações
    e todos os confins da terra verão a salvação do nosso Deus.

    AMBIENTE

    Entre 586 e 539 a.C., o Povo de Deus experimenta a dura prova do Exílio na Babilónia. À frustração pela derrota e pela humilhação nacional, juntam-se as saudades de Jerusalém e o desespero por saber a cidade de Deus - orgulho de todo o israelita - reduzida a cinzas. Ao povo exilado, parece que Deus os abandonou definitivamente e que desistiu de Judá (alguns perguntam mesmo se Jahwéh será o Deus libertador - como anunciava a teologia de Israel - ou será um "bluff", incapaz de proteger o seu Povo e de salvar Judá). Rodeado de inimigos, perdido numa terra estranha, ameaçado na sua identidade, sem perspectivas de futuro, com a fé abalada, Judá está desolado e abandonado e não vê saída para a sua triste situação. Quando, já na fase final do Exílio, as vitórias de Ciro, rei dos Persas, anunciam o fim da Babilónia, os exilados começam a ver uma pequenina luz ao fundo do túnel; mas, então, a libertação aparece-lhes como o resultado da acção de um rei estrangeiro e não como resultado da acção libertadora de Jahwéh... Ora, isso agrava mais ainda a crise de confiança em Jahwéh por parte dos exilados.
    É neste contexto que aparece o testemunho profético do Deutero-Isaías. A sua mensagem (cf. Is 40-55) é uma mensagem de consolação e de esperança (os capítulos que recolhem a palavra do Deutero-Isaías são, precisamente, conhecidos como "Livro da Consolação"); diz que a libertação está próxima e é obra de Jahwéh.
    O nosso texto está integrado na segunda parte do "Livro da Consolação" (cf. Is 40-55). Aí, o profeta (que na primeira parte - Is 40-48 - havia, sobretudo, anunciado a libertação do cativeiro e um "novo êxodo" do Povo de Deus, rumo à Terra Prometida) fala da reconstrução e da restauração de Jerusalém. O profeta garante que Deus não Se esqueceu da sua cidade em ruínas e vai voltar a fazer dela uma cidade bela e cheia de vida, como uma noiva em dia de casamento. É neste ambiente que podemos situar a primeira leitura de hoje.

    MENSAGEM

    Para revitalizar a esperança dos exilados, o profeta põe-nos a contemplar um quadro, fictício mas sugestivo quanto ao significado: à Jerusalém desolada e em ruínas, chega um mensageiro com uma "boa notícia". Qual é essa "boa notícia" que o mensageiro traz? Ele anuncia "a paz" ("shalom": paz, bem-estar, harmonia, felicidade), proclama a "salvação" e promete o "reinado de Deus". A questão é, portanto, esta: Deus assume-se como "rei" de Judá... Ele não reinará à maneira desses reis que conduziram o Povo por caminhos de egoísmo e de morte, de desgraça em desgraça até à catástrofe final do Exílio; mas Jahwéh exercerá a realeza de forma a proporcionar a "salvação" ao seu Povo - isto é, inaugurando uma era de paz, de bem-estar, de felicidade sem fim.
    Num desenvolvimento muito bonito, o profeta/poeta põe as sentinelas da cidade (alertadas pelo anúncio do "mensageiro") a olhar na direcção em que deve chegar o Senhor. De repente, soa o grito das sentinelas... Não é, no entanto, um grito de alarme, mas de alegria contagiante: elas vêem o próprio Jahwéh regressar ao encontro da sua cidade. Com Deus, Jerusalém voltará a ser uma cidade bela e harmoniosa, cheia de alegria e de festa. O profeta/poeta convida as próprias pedras da cidade em ruínas a cantar em coro, porque a libertação chegou. E a salvação que Deus oferece à sua cidade e ao seu Povo será testemunhada por toda a terra, como se o mundo estivesse de olhos postos na acção vitoriosa de Deus em favor de Judá.

    ACTUALIZAÇÃO

    Para reflectir este texto, podemos servir-nos dos seguintes elementos:

    • A alegria pela libertação do cativeiro da Babilónia e pela "salvação" que Deus oferece ao seu Povo anuncia essa outra libertação, plena e total, que Deus vai oferecer ao seu Povo através de Jesus. É isso que celebramos hoje: o nascimento de Jesus significa que a opressão terminou, que chegou a paz definitiva, que o "reinado de Deus" alcançou a nossa história. Para que essa "boa notícia" se cumpra é, no entanto, preciso acolher Jesus e aderir ao "Reino" que Ele veio propor.

    • A alegria contagiante das sentinelas e os brados de contentamento das próprias pedras da cidade convidam-nos a acolher com alegria e em festa o Deus que veio libertar-nos... Se temos consciência da opressão que, dia a dia, nos rouba a vida e nos impede de ser livres e felizes, certamente sentiremos um grande contentamento ao deparar com essa proposta de liberdade que Jesus veio trazer. É essa alegria que nos anima, neste dia em que celebramos a chegada libertadora de Jesus?

    • As sen
    tinelas atentas que, nas montanhas em redor de Jerusalém, identificam a chegada do Deus libertador são um modelo para nós: convidam-nos a ler, atentamente, os sinais da presença libertadora de Deus no mundo e a anunciar a todos os homens que Deus aí está, para reinar sobre nós e para nos dar a salvação e a paz. Somos sentinelas atentas que descobrem os sinais do Senhor nos caminhos da história e anunciam o seu "reinado", ou somos sentinelas negligentes que não vigiam nem alertam e que fazem com que o Deus libertador seja acolhido com indiferença pelo povo da "cidade"?

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 97 (98)

    Refrão: Todos os confins da terra
    viram a salvação do nosso Deus.

    Cantai ao Senhor um cântico novo
    pelas maravilhas que Ele operou.
    A sua mão e o seu santo braço
    Lhe deram a vitória.

    O Senhor deu a conhecer a salvação,
    revelou aos olhos das nações a sua justiça.
    Recordou-Se da sua bondade e fidelidade
    em favor da casa de Israel.

    Os confins da terra puderam ver
    a salvação do nosso Deus.
    Aclamai o Senhor, terra inteira,
    exultai de alegria e cantai.

    Cantai ao Senhor ao som da cítara,
    ao som da cítara e da lira;
    ao som da tuba e da trombeta,
    aclamai o Senhor, nosso Rei.

    LEITURA II - Hebr 1,1-6

    Leitura da Epístola aos Hebreus

    Muitas vezes e de muitos modos
    falou Deus antigamente aos nossos pais, pelos Profetas.
    Nestes dias, que são os últimos,
    falou-nos por seu Filho,
    a quem fez herdeiro de todas as coisas
    e pelo qual também criou o universo.
    Sendo o Filho esplendor da sua glória
    e imagem da sua substância,
    tudo sustenta com a sua palavra poderosa.
    Depois de ter realizado a purificação dos pecados,
    sentou-Se à direita da Majestade no alto dos Céus
    e ficou tanto acima dos Anjos
    quanto mais sublime que o deles
    é o nome que recebeu em herança.
    A qual dos Anjos, com efeito, disse Deus alguma vez:
    «Tu és meu Filho, Eu hoje Te gerei?»
    E ainda: «Eu serei para Ele um Pai
    e Ele será para Mim um Filho?»
    E de novo,
    quando introduziu no mundo o seu Primogénito, disse:
    «Adorem-n'O todos os Anjos de Deus».

    AMBIENTE

    A Carta aos Hebreus é um escrito de autor anónimo e cujos destinatários, em concreto, desconhecemos (o título "aos hebreus" provém das múltiplas referências ao Antigo Testamento e ao ritual dos "sacrifícios" que a obra apresenta). É possível que se dirija a uma comunidade cristã constituída maioritariamente por cristãos vindos do judaísmo; mas nem isso é totalmente seguro, uma vez que o Antigo Testamento era um património comum, assumido por todos os cristãos - quer os vindos do judaísmo, quer os vindos do paganismo. Trata-se, em qualquer caso, de cristãos em situação difícil, expostos a perseguições e que vivem num ambiente hostil à fé... São, também, cristãos que facilmente se deixam vencer pelo desalento, que perderam o fervor inicial e que cedem às seduções de doutrinas não muito coerentes com a fé recebida dos apóstolos... O objectivo do autor é estimular a vivência do compromisso cristão e levar os crentes a crescer na fé. Para isso, expõe o mistério de Cristo (apresentado, sobretudo, como "o sacerdote" da Nova Aliança) e recorda a fé tradicional da Igreja.
    O texto que nos é hoje proposto pertence ao prólogo do sermão. Nesse prólogo, o pregador apresenta a visão global e as coordenadas fundamentais que ele vai, depois, desenvolver ao longo da obra.

    MENSAGEM

    Temos aqui esboçadas, em traços largos, as coordenadas fundamentais da história da salvação. Deus é o protagonista dessa história...
    O texto alude ao projecto salvador de Deus. Esse projecto manifestou-se, numa primeira fase, através dos porta-vozes de Deus - os profetas; eles transmitiram aos homens a proposta salvadora e libertadora de Deus.
    Veio, depois, uma segunda etapa da história da salvação: "nestes dias que são os últimos", Deus manifestou-se através do próprio "Filho" - Jesus Cristo, o "menino de Belém", a Palavra plena, definitiva, perfeita, através da qual Deus vem ao nosso encontro para nos "dizer" o caminho da salvação e da vida nova. O nosso texto reflecte então - sem contudo desenvolver uma lógica muito ordenada - sobre a relação de Jesus com o Pai, com os homens e com os anjos (o que nos situa no ambiente de uma comunidade que dava importância excessiva ao culto dos "anjos" e que lhes concedia um papel preponderante na salvação do homem).
    Como é que se define a relação de Jesus com o Pai? Para o autor da Carta aos Hebreus, Jesus, o "Filho", identifica-Se plenamente com o Pai. Ele é o esplendor da glória do Pai, a imagem do ser do Pai, a reprodução exacta e perfeita da substância do Pai: desta forma, o autor da carta afirma que Jesus procede do Pai e é igual ao Pai. N'Ele manifesta-se o Pai; quem olha para Ele, encontra o Pai.
    Definida a relação de Jesus com Deus, o autor reflecte sobre a relação de Jesus com o mundo... O Filho está na origem do universo (e, portanto, também do homem); por isso, Ele tem um senhorio pleno sobre toda a criação. Essa soberania expressa-se, inclusive, na incarnação e redenção: Ele veio ao encontro do homem e purificou-o do pecado: dessa forma, Ele completou a obra começada pela Palavra criadora, no início. É como "o Senhor" - que possui soberania sobre os homens e sobre o mundo, que cria e que salva - que os homens o devem ver e acolher.
    A igualdade fundamental do "Filho" com o Pai fá-lo muito superior aos anjos: os anjos não são "filhos"; mas Jesus é "o Filho" e o próprio Deus proclamou essa relação de filiação plena, real, perfeita. Não são os anjos que salvam, mas sim "o Filho".
    Sendo a Palavra última e definitiva de Deus, Ele deve ser escutado pelos homens como o caminho mais seguro para chegar a essa vida nova que o Pai nos quer propor. É tendo consciência desse facto que devemos acolher o "menino de Belém".

    ACTUALIZAÇÃO

    Na reflexão, convém dar atenção aos seguintes dados:

    • Celebrar o nascimento de Jesus é, em primeiro lugar, contemplar o amor de um Deus que nunca abandonou os homens à sua sorte; por isso, rompeu as distâncias, encontrou forma de dialogar com o homem e enviou o próprio Filho para conduzir o homem ao encontro da vida definitiva, da salvação plena. No dia de Natal, nunca será demais insistir nisto: o Deus em quem acreditamos é o Deus do amor e da relação, que continua a nascer no mundo, a apostar nos homens, a querer dialogar com eles, e que não desiste de p
    ropor aos homens - apesar da indiferença com que as suas propostas são, às vezes, acolhidas - um caminho para chegar à felicidade plena.

    • Jesus Cristo é a Palavra viva e definitiva de Deus, que revela aos homens o verdadeiro caminho para chegar à salvação. Celebrar o seu nascimento é acolher essa Palavra viva de Deus... "Escutar" essa Palavra é acolher o projecto que Jesus veio apresentar e fazer dele a nossa referência, o critério fundamental que orienta as nossas atitudes e as nossas opções. A Palavra viva de Deus (Jesus) é, de facto, a nossa referência? O que Ele diz orienta e condiciona as minhas atitudes, os meus valores, as minhas tomadas de posição? Os valores do Evangelho são os meus valores? Vejo no Evangelho de Jesus a Palavra viva de Deus, a Palavra plena e definitiva através da qual Deus me diz como chegar à salvação, à vida definitiva?

    ALELUIA

    Aleluia. Aleluia.

    Santo é o dia que nos trouxe a luz.
    Vinde adorar o Senhor.
    Hoje, uma grande luz desceu sobre a terra.

    EVANGELHO - Jo 1,1-18

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João

    No princípio era o Verbo
    e o Verbo estava com Deus
    e o Verbo era Deus.
    No princípio, Ele estava com Deus.
    Tudo se fez por meio d'Ele
    e sem Ele nada foi feito.
    N'Ele estava a vida
    e a vida era a luz dos homens.
    A luz brilha nas trevas
    e as trevas não a receberam.
    Apareceu um homem enviado por Deus, chamado João.
    Veio como testemunha,
    para dar testemunho da luz,
    a fim de que todos acreditassem por meio dele.
    Ele não era a luz,
    Mas veio para dar testemunho da luz.
    O Verbo era a luz verdadeira,
    que, vindo ao mundo, ilumina todo o homem.
    Estava no mundo
    e o mundo, que foi feito por Ele, não O conheceu.
    Veio para o que era seu
    e os seus não O receberam.
    Mas, àqueles que O receberam e acreditaram no seu nome,
    deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus.
    Estes não nasceram do sangue,
    nem da vontade da carne, nem da vontade do homem,
    mas de Deus.
    E o Verbo fez-Se carne e habitou entre nós.
    Nós vimos a sua glória,
    glória que Lhe vem do Pai como Filho Unigénito,
    cheio de graça e de verdade.
    João dá testemunho d'Ele, exclamando:
    «Era deste que eu dizia:
    'O que vem depois de mim passou à minha frente,
    porque existia antes de mim'».
    Na verdade, foi da sua plenitude que todos nós recebemos
    graça sobre graça.
    Porque, se a Lei foi dada por meio de Moisés,
    a graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo.
    A Deus, nunca ninguém O viu.
    O Filho Unigénito, que está no seio do Pai,
    é que O deu a conhecer.

    AMBIENTE

    A Igreja primitiva recorreu, com frequência, a hinos para celebrar, expressar e anunciar a sua fé. O prólogo ao Evangelho segundo João (que hoje nos é proposto) é um desses hinos.
    Não é certo se este hino foi composto por João, ou se o autor do Quarto Evangelho usou um primitivo hino cristão conhecido da comunidade joânica, adaptando-o de forma a que ele servisse de prólogo à sua obra. O que é certo é que o hino cristológico que chegou até nós expressa, em forma de confissão, a fé da comunidade joânica em Cristo enquanto Palavra viva de Deus, a sua origem eterna, a sua procedência divina, a sua influência no mundo e na história, possibilitando aos homens que O acolhem e escutam tornar-se "filhos de Deus". Essas grandes linhas, enunciadas neste prólogo, vão depois ser desenvolvidas pelo evangelista ao longo da sua obra.

    MENSAGEM

    O prólogo ao Quarto Evangelho começa com a expressão "no princípio": dessa forma, João enlaça o seu Evangelho com o relato da criação (cf. Gn 1,1), oferecendo-nos assim, desde logo, uma chave de interpretação para o seu escrito... Aquilo que ele vai narrar sobre Jesus está em relação com a obra criadora de Deus: em Jesus vai acontecer a definitiva intervenção criadora de Deus no sentido de dar vida ao homem e ao mundo... A actividade de Jesus, enviado do Pai, consiste em fazer nascer um homem novo; a sua acção coroa a obra criadora iniciada por Deus "no princípio".
    João apresenta, logo a seguir, a "Palavra" ("Lógos"). A "Palavra" é - de acordo com o autor do Quarto Evangelho - uma realidade anterior ao céu e à terra, implicada já na primeira criação. Esta "Palavra" apresenta-se com as características que o "Livro dos Provérbios" atribuía à "sabedoria": pré-existência (cf. Prov 8,22-24) e colaboração com Deus na obra da criação (cf. Prov 8,24-30). No entanto, essa "Palavra" não só estava junto de Deus e colaborava com Deus, mas "era Deus". Identifica-se totalmente com Deus, com o ser de Deus, com a obra criadora de Deus. É como que o projecto íntimo de Deus, que se expressa e se comunica como "Palavra". Deus faz-Se inteligível através da "Palavra". Essa "Palavra" é geradora de vida para o homem e para o mundo, concretizando o projecto de Deus.
    Essa "Palavra" veio ao encontro dos homens e fez-se "carne" (pessoa). João identifica claramente a "Palavra" com Jesus, o "Filho único cheio de amor e de verdade", que veio ao encontro do homem. Nessa pessoa (Jesus), podemos contemplar o projecto ideal de homem, o homem que nos é proposto como modelo, a meta final da criação de Deus.
    Essa "Palavra" "montou a sua tenda no meio de nós". O verbo "skênéô" ("montar a tenda") aqui utilizado alude à "tenda do encontro" que, na caminhada pelo deserto, os israelitas montavam no meio ou ao lado do acampamento e que era o local onde Deus residia no meio do seu Povo (cf. Ex 27,21; 28,43; 29,4...). Agora, a "tenda de Deus", o local onde Ele habita no meio dos homens, é o Homem/Jesus. Quem quiser encontrar Deus e receber d'Ele vida em plenitude ("salvação"), é para Jesus que se tem de voltar.
    A função dessa "Palavra" está ligada ao binómio "vida/luz": comunicar ao homem a vida em plenitude; ou, por outras palavras, trata-se de acender a luz que ilumina o caminho do homem, possibilitando-lhe encontrar a vida verdadeira, a vida plena.
    Jesus Cristo vai, no entanto, deparar-se com a oposição à "vida/luz" que Ele traz. Ao longo do Evangelho, João irá contando essa história do confronto da "vida/luz" com o sistema injusto e opressor que pretende manter os homens prisioneiros do egoísmo e do pecado (e que João identifica com a Lei. Os dirigentes judeus que enfrentam Jesus e o condenam à morte são o rosto visível dessa Lei). Recusar a "vida/luz" significa preferir continuar a caminhar nas trevas (que se identificam com a mentira
    , a escravidão, a opressão), independentemente de Deus; significa recusar chegar a ser homem pleno, livre, criação acabada e elevada à sua máxima potencialidade.
    Mas o acolhimento da "Palavra" implica a participação na vida de Deus. João diz mesmo que acolher a "Palavra" significa tornar-se "filho de Deus". Começa, para quem acolhe a "Palavra"/Jesus, uma nova relação entre o homem e Deus, aqui expressa em termos de filiação: Deus dá vida em plenitude ao homem, oferecendo-lhe, assim, uma qualidade de vida que potencia o seu ser e lhe permite crescer até à dimensão do homem novo, do homem acabado e perfeito. Isto é uma "nova criação", um novo nascimento, que não provém da carne e do sangue, mas sim de Deus.
    A incarnação de Jesus significa, portanto, que Deus oferece à humanidade a vida em plenitude. Sempre existiu no homem o anseio da vida plena, conforme o projecto original de Deus; mas, na prática, esse anseio fica, muitas vezes, frustrado pelo domínio que o egoísmo, a injustiça, a mentira (o pecado) exercem sobre o homem. Toda a obra de Jesus consistirá em capacitar o homem para a vida nova, para a vida plena, a fim de que Ele possa realizar em si mesmo o projecto de Deus: a semelhança com o Pai.

    ACTUALIZAÇÃO

    Na reflexão, considerar as seguintes linhas:

    • A transformação da "Palavra" em "carne" (em menino do presépio de Belém) é a espantosa aventura de um Deus que ama até ao inimaginável e que, por amor, aceita revestir-Se da nossa fragilidade, a fim de nos dar vida em plenitude. Neste dia, somos convidados a contemplar, numa atitude de serena adoração, esse incrível passo de Deus, expressão extrema de um amor sem limites.

    • Acolher a "Palavra" é deixar que Jesus nos transforme, nos dê a vida plena, a fim de nos tornarmos, verdadeiramente, "filhos de Deus". O presépio que hoje contemplamos é, apenas, um quadro bonito e terno ou uma interpelação a acolher a "Palavra", de forma a crescermos até à dimensão do homem novo?

    • Hoje, como ontem, a "Palavra" continua a confrontar-se com os sistemas geradores de morte e a procurar eliminar, na origem, tudo o que rouba a vida e a felicidade do homem. Sensíveis à "Palavra", embarcados na mesma aventura de Jesus - a "Palavra" viva de Deus - como nos situamos diante de tudo aquilo que rouba a vida do homem? Podemos pactuar com a mentira, o oportunismo, a violência, a exploração dos pobres, a miséria, as limitações aos direitos e à dignidade do homem?

    • Jesus (esse menino do presépio) é para nós a "Palavra" suprema que dá sentido à nossa vida, ou deixamos que outras "palavras" nos condicionem e nos induzam a procurar a felicidade em caminhos de egoísmo, de alienação, de comodismo, de pecado? Quais são essas "palavras" que às vezes nos seduzem e nos afastam da "Palavra" eterna de Deus que ecoa no Evangelho que Jesus veio propor?

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA A SOLENIDADE DE NATAL - "Missa do Dia"
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao Dia de Natal, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa...

    2. ALEGRIA, SERENIDADE, PAZ.
    Os cristãos que vêm à igreja neste dia de Natal esperam a celebração de um grande dia de festa. É necessário fazer com que a celebração seja tão festiva como a da noite... Uma celebração que apele à alegria, à serenidade e à paz.

    3. EVANGELIÁRIO LEVADO DO PRESÉPIO.
    Como na "Missa da meia-noite", o Evangeliário pode estar no presépio, na penumbra. Antes do Evangelho, o presidente da assembleia (precedido de crianças com lamparinas acesas) vem buscá-lo solenemente e leva-o em procissão até ao lugar da proclamação do Evangelho. No final, o Evangelho é levado de novo (com o grupo de crianças à frente com lamparinas acesas na mão) em procissão para o presépio, agora iluminado, e coloca-o aí: nesta noite, o Verbo fez-Se carne.

    4. BILHETE DE EVANGELHO.
    Deus dá a Palavra... Deus dá-nos uma prenda extraordinária, dando o seu Filho. Deus dá-nos a sua Palavra: porque uma boca humana exprime o pensamento de Deus, sabemos o que agrada a Deus. Deus dá-nos a sua Luz: pondo os nossos passos nos passos de Cristo, estamos na verdade. Deus dá-nos a sua Vida: o seu Filho veio fazer a sua morada em nós, oferece-nos "comungar" a sua vida. Deus dá-nos o seu Nome: somos da sua família, somos os seus filhos. Que mistério! Não um mistério incompreensível, mas que mistério a descobrir sem cessar e nos alegrarmos nele, pois é o mistério do Amor.

    5. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
    Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.

    No final da primeira leitura:
    Deus Nosso Pai, pela vinda do teu Filho Jesus ao nosso mundo, fizeste-nos descobrir a Luz que dissipa as trevas, que ultrapassa os ódios e as discórdias, a Alegria que alivia toda a pena.
    Nós Te confiamos a nossa pobre terra, sacudida pelos barulhos da guerra. Que a Boa Nova de Natal console e inspire os povos oprimidos.

    No final da segunda leitura:
    Jesus, Filho do Deus vivo, reflexo resplandecente da glória do Pai, Tu que levas todas as coisas pela tua Palavra poderosa, Tu que purificaste e reconciliaste a humanidade, nós Te bendizemos.
    Mantém-nos simples e rectos diante da tua face, torna-nos atentos à tua Palavra e à dos profetas e apóstolos, que nos falam de Ti.

    No final do Evangelho:
    Jesus, Palavra de Deus, bendito sejas, porque a tua vinda iluminou a nossa terra com uma nova claridade e afastou as trevas da incerteza e do desencorajamento.
    Tu que habitaste entre nós e nos deste o poder de nos tornarmos filhos de Deus, reafirma em nós a fé do nosso baptismo, torna-nos atentos à tua presença.

    6. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Pode-se escolher a Oração Eucarística III, com as variantes próprias da Festa de Natal.

    7. PALAVRA EXPLICADA: A FREQUÊNCIA DA EUCARISTIA.
    Havia uma prática singular, com a qual o Concílio Vaticano II acabou. Outrora, no Natal, os padres celebravam três missas, que o missal situava, respectivamente, à meia-noite, na aurora e no dia (antes do meio-dia). Esta prática vinha das recolhas litúrgicas romanas mais antigas (os sacramentários, século VII), que tinham registado três formulários de missa para a noite e o dia de Natal. Ao longo dos tempos, estas três missas foram consideradas obrigatórias para cada padre. Por comodidade, de modo abusivo, alguns padres celebravam-nas "de enfiada". A mesma prática acontecia do Dia de Defuntos (2 de Novembro). Fora destes dois dias particulares, para os quais a prática das três missas já não é imposta hoje, uma comunidade paroquial celebra a Eucaristia apenas uma vez por dia, a não ser que a exiguidade dos locais disponíveis obriguem a celebrá-las em assembleia sucessivas.

    8. ATENÇÃO ÀS CRIANÇAS: CELEBRAR O MISTÉRIO DE NATAL.
    Utilizar cânticos que sejam "entendidos" pelas crianças, que sejam autêntica festa do Mistério!

    9. PALAVRA PARA O CAMINHO.
    Mensageiros... Múltiplas mensagens atravessam o nosso espaço continuamente, portadoras de notícias de todo o género, que se perdem muitas vezes nas ilusões da comunicação. Discípulos de Cristo, somos mensageiros da sua Boa Nova para o mundo. Em que redes nos situamos para permitir que esta Boa Nova se espalhe a toda a terra? Uso aos vossos portáveis!

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

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