Week of Jul 10th

  • S. Bento, Abade, Padroeiro da Europa

    S. Bento, Abade, Padroeiro da Europa


    11 de Julho, 2022

    S. Bento, patriarca dos monges ocidentais, nasceu em Núrcia, no ano 480. Ainda muito jovem, seduzido e impelido pelo Espírito, abraçou um período de absoluta solidão numa gruta em Subiaco. A sua fama atraiu-lhe discípulos. Organizou para eles a vida cenobítica, inicialmente em doze pequenos mosteiros à volta de Subiaco e, depois, no célebre cenóbio de Monte Cassino. Escreveu uma Regra que resume sabiamente a tradição monástica oriental, adaptando-a ao mundo latino. Esta escola de "serviço ao Senhor" é construída à volta da Palavra de Deus (Lectio divina), da Liturgia de louvor realizada em coro, e do trabalho em ambiente de fraternidade, de humilde e obediente serviço. S. Bento faleceu com 67 anos de idade, em Monte Cassino, no ano 547.

    Lectio

    Primeira leitura: Provérbios 2, 1-9

    Meu filho, se receberes as minhas palavrase guardares cuidadosamente os meus mandamentos,2prestando o teu ouvido à sabedoria, e inclinando o teu coração ao entendimento; 3se invocares a inteligência e fizeres apelo ao entendimento, 4se a buscares como se procura a prata e a pesquisares como um tesouro escondido,5então, compreenderás o temor do Senhor e chegarás ao conhecimento de Deus. 6Porque o Senhor é quem dá a sabedoria e da sua boca procedem o saber e o entendimento. 7Ele reserva a salvação para os rectos e é um escudo para os que procedem honestamente. 8Protege os caminhos dos justos e dirige os passos dos seus fiéis. 9Então, compreenderás a justiça e a equidade, a rectidão e todos os caminhos que conduzem ao bem.

    Só a busca interessada da verdade permite estabelecer uma relação correta com Javé, que dá a sabedoria e protege o sábio. É o ensinamento preciso que um pai dá ao seu filho, segundo esta página do livro dos Provérbios.
    S. Bento utiliza o mesmo estilo literário ao introduzir a Regra que escreve para os seus monges: "Escuta, filho, os preceitos do Mestre, e inclina o ouvido do teu coração; recebe de boa vontade e executa eficazmente o conselho de um bom pai,..." Acolher a Palavra de Deus é o caminho seguro para nos conformarmos a Cristo, Sabedoria do Pai.

    Evangelho: Mateus 19, 27-29

    Naquele tempo, disse Pedro a Jesus: «Nós deixámos tudo e seguimos-te. Qual será a nossa recompensa?»28Jesus respondeu-lhes: «Em verdade vos digo: No dia da regeneração de todas as coisas, quando o Filho do Homem se sentar no seu trono de glória, vós, que me seguistes, haveis de sentar-vos em doze tronos para julgar as doze tribos de Israel. 29E todo aquele que tiver deixado casas, irmãos, irmãs, pai, mãe, filhos ou campos por causa do meu nome, receberá cem vezes mais e terá por herança a vida eterna

    Jesus responde a Pedro com a linguagem figurada do profeta Daniel (cf. Dn 7, 9-14), onde se fala de tronos e do Filho do homem. Jesus realça o aspeto judicial desta figura misteriosa. Os discípulos, a quem foi dado conhecer o mistério do Reino (13, 11), estão intimamente associados a Jesus. O prémio prometido por Jesus parece que terá lugar "no dia da regeneração de todas as coisas" (v. 28), isto é, no mundo renovado, que resultou da última intervenção de Deus na história, que já teve lugar, quando enviou o seu Filho. A "regeneração" é a nova vida do homem novo concedida pela ação de Deus. Indica, pois o tempo da Igreja e refere-se a todos os crentes, àqueles que se submetem à senhoria de Deus e participam dela. Os discípulos são "juízes", isto é, "dirigentes" do povo de Deus, que devem administrar e defender esse povo.

    Meditatio

    S. Bento, depois de longo tempo na presença de Deus, a escutar a sua Palavra, vivendo em total desapego do mundo, em completo silêncio e em austera solidão, tornou-se um homem, capaz de orientar outros, que buscavam a Deus. Só dá fruto quem acolhe no coração e medita a Palavra de Deus, quem se deixa transformar por ela. As comunidades criadas por S. Bento caraterizam-se pela busca apaixonada de Deus, pela escuta atenta da Palavra, meditada e guardada no coração. Assim descobrem Jesus Cristo como sabedoria do Pai, como o verdadeiro tesouro, ao qual nada se deve antepor. Permanecendo estavelmente unidos a Ele, os discípulos permitem ao Espírito produzir neles os seus frutos. Esses frutos são o melhor prémio para quem deixa tudo para estar com o Senhor e "permanecer" n´Ele.
    A união de S. Bento com Deus explica a sublimidade da sua Regra, exigente e equilibrada, e a sua influência perene na vida de perfeição da Igreja. Bossuet falou assim da Regra de S. Bento: "Suma do cristianismo, resumo douto e misterioso do Evangelho, das instituições dos Santos Padres, de todos os conselhos de perfeição, na qual atingem o seu mais alto apogeu a prudência e a simplicidade, a humildade e o valor, a severidade e a doçura, a liberdade e a dependência, na qual a correção encontra toda a firmeza, a condescendência todo o encanto, a voz de comando todo o vigor, a sujeição todo o repoiso, o silêncio a sua gravidade, a palavra a sua graça, a força o seu exercício e a debilidade o seu apoio".
    Chamado por Pio XII "Pai da Europa", S. Bento foi proclamado por Paulo VI patrono do mesmo continente, em 1964.

    Oratio

    Senhor, nosso Deus e nosso Pai, eis-nos aqui, como filhos que se sentem amados por ti. Os nossos ouvidos estão atentos à tua palavra. Queremos corresponder ao teu amor. Sabes como ainda somos instáveis na fé e frágeis na caridade. Faz-nos, uns para os outros, sinais e sacramentos da tua mansidão e da tua bondade. Que todos possam verificar como é bom amar-nos como filhos do mesmo Pai, que és Tu, e servir-nos e honrar-nos uns aos outros em teu santo Nome. Ámen.

    Contemplatio

    S. Bento teve também a graça de trabalhar pelas almas. Na sua solidão, catequizava os pastores da montanha. Mais tarde, aceitou fazer a educação de alguns jovens piedosos de Roma, que as suas famílias lhe confiavam em Subiaco. Foi entre eles que recrutou S. Mauro e S. Plácido, seus amáveis discípulos. Sabia falar corajosamente aos grandes e recordar-lhes os seus deveres. Repreendeu ao bárbaro Tótila as suas depredações e as suas crueldades. Ordenou-lhe que não abusasse das suas vitórias, especialmente na ocupação da cidade de Roma. Que variedade nas suas obras e na sua ação social! Os seus discípulos, ao longo dos séculos, dedicar-se-ão também ao apostolado em todas as suas formas, segundo os tempos e as necessidades da Igreja. É preciso tomar forças no recolhimento, especialmente em cada manhã, e dedicar-se depois às obras, segundo a nossa vocação, segundo a vontade de Deus que nos é conhecida. É um dever para nós hoje rezar pela conservação da vida regular e monástica através das dificuldades que o demónio lhe suscita. Senhor, não priveis a vossa Igreja dos asilos que lhe destes para pôr os seus filhos ao abrigo das tempestades do século; mas fazei que, ao renunciarem ao mundo, se entreguem verdadeiramente à perfeição no claustro. (Leão Dehon, OSP 3, p. 314s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "O Senhor é quem dá a sabedoria" (Prov 2, 6).

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    S. Bento, Abade, Padroeiro da Europa (11 Julho)

    XV Semana - Segunda-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    XV Semana - Segunda-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    11 de Julho, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares
    XV Semana - Segunda-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Isaías 1, 10-17

    10Ouvi a palavra do Senhor, ó príncipes de Sodoma; escutai a lição do nosso Deus, povo de Gomorra: 11«De que me serve a mim a multidão das vossas vítimas? - diz o Senhor. Estou farto de holocaustos de carneiros, de gordura de bezerros. Não me agrada o sangue de vitelos, de cordeiros nem de bodes. 12Quando me viestes prestar culto, quem reclamou de vós semelhantes dons, ao pisardes o meu santuário? 13Não me ofereçais mais dons inúteis: o incenso é-me abominável; as celebrações lunares, os sábados, as reuniões de culto, as festas e as solenidades são-me insuportáveis. 14Abomino as vossas celebrações lunares, e as vossas festas; estou cansado delas, não as suporto mais. 15Quando levantais as vossas mãos, afasto de vós os meus olhos; podeis multiplicar as vossas preces, que Eu não as atendo. É que as vossas mãos estão cheias de sangue. 16Lavai-vos, purificai-vos, tirai da frente dos meus olhos a malícia das vossas acções. Cessai de fazer o mal, 17aprendei a fazer o bem; procurai o que é justo, socorrei os oprimidos, fazei justiça aos órfãos, defendei as viúvas.

    Isaías exerce a sua acção profética em Judá, na segunda metade do século VIII a. C., um período de notável desenvolvimento económico, mas também de relaxamento moral. O profeta clama contra o formalismo religioso. Os ricos, fechados no seu egoísmo, mostram-se insensíveis aos carenciados, cada vez mais numerosos. Mas continuam a praticar o culto, oferecendo numerosas vítimas em holocausto, no templo. Deus, pela boca de Isaías, compara o seu povo às cidades pecadoras de Sodoma e Gomorra, porque não respeita os direitos de Deus nem os deveres da Aliança. O seu culto, desligado da vida, não agrada ao Senhor. Não se pode pretender glorificar a Deus e pisar os fracos e pobres: «Quando levantais as vossas mãos, afasto de vós os meus olhos» (v. 15). Não se podem oferecer holocaustos com as mãos machadas pelo sangue de homicídios. Para beneficiar da Aliança, é preciso converter-se ao Senhor, e abandonar todas as formas de injustiça: «Cessai de fazer o mal, aprendei a fazer o bem; procurai o que é justo, socorrei os oprimidos, fazei justiça aos órfãos, defendei as viúvas» (vv. 16b-17). Se o povo escutar o profeta, poderá gozar de muitos bens terrenos, prelúdio dos bens celestes. Se não o escutar, será devorado pela espada dos assírios, que pairam no horizonte como terrível ameaça.

    Evangelho: Mateus 10, 34 - 11, 1

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus apóstolos: 34Não penseis que vim trazer a paz à terra; não vim trazer a paz, mas a espada. 35Porque vim separar o filho do seu pai, a filha da sua mãe e a nora da sua sogra; 36de tal modo que os inimigos do homem serão os seus familiares. 37Quem amar o pai ou a mãe mais do que a mim, não é digno de mim. Quem amar o filho ou filha mais do que a mim, não é digno de mim. 38Quem não tomar a sua cruz para me seguir, não é digno de mim. 39Aquele que conservar a vida para si, há-de perdê-la; aquele que perder a sua vida por causa de mim, há-de salvá-la.» 40«Quem vos recebe, a mim recebe; e quem me recebe, recebe aquele que me enviou. 41Quem recebe um profeta por ele ser profeta, receberá recompensa de profeta; e quem recebe um justo, por ele ser justo, receberá recompensa de justo. 42E quem der de beber a um destes pequeninos, ainda que seja somente um copo de água fresca, por ser meu discípulo, em verdade vos digo: não perderá a sua recompensa.» 1Quando Jesus acabou de dar estas instruções aos doze discípulos, partiu dali, a fim de ir ensinar e pregar nas suas cidades.

    «Não vim trazer a paz, mas a espada». Estas palavras contradizem as esperanças messiânicas do príncipe da paz (Is 9, 5), as esperanças de todos aqueles que trabalham e lutam pela paz, bem como as próprias palavras de Jesus, que declarou bem-aventurados os que trabalham pela paz (5, 9). Estamos diante de um paradoxo que não pode justificar a «guerra santa», certos apetites humanos ou determinadas intransigências religiosas. A luta não é dos discípulos contra os outros homens, mas dos outros homens contra os discípulos, nomeadamente contra os missionários do Reino. Mateus continua a tratar das exigências radicais da missão. Nada pode impedir o seguimento de Jesus, ainda que possa causar sofrimentos e provocar rupturas, mesmo dentro da própria família. A sorte do discípulo é semelhante à do seu Mestre. Jesus foi ignorado e não-acolhido pelos seus próprios familiares (cf. Mc 3, 21; Jo 1, 11). O amor à família é um valor. Mas o seguimento e o amor a Cristo devem sobrepor-se a tudo e a todos, devem ser vividos «com todo o teu coração, com toda a tua alma, com todo o teu entendimento e com todas as tuas forças» (Mc 12, 30). Para o cristão, isso é possível porque Ele nos amou primeiro, até ao ponto de dar a vida por nós.

    Meditatio

    A nossa relação com Deus não pode limitar-se a umas tantas conveniências. Acreditar em Deus, isto é, acolher o dom da fé, que Ele mesmo nos oferece gratuitamente, é assunto de coração, que não pode ficar pela fachada, ou limitar-se a determinados momentos. Deus ama-nos por primeiro e a tempo inteiro. Não podemos amá-lo diferentemente. Por isso, ao nosso culto, deve corresponder uma vida coerente: «De que me serve a mim a multidão das vossas vítimas?... quem reclamou de vós semelhantes dons, ao pisardes o meu santuário? ... Quando levantais as vossas mãos, afasto de vós os meus olhos... as vossas mãos estão cheias de sangue» (cf. vv. 11-15). Não agradam a Deus as ofertas, quando a vida de quem as faz é má: «Lavai-vos, purificai-vos, tirai da frente dos meus olhos a malícia das vossas acções...», - eis o que realmente quer. Uma vez purificados, sim, há que praticar a justiça: «aprendei a fazer o bem; procurai o que é justo» (vv. 16-17). Só agrada a Deus o sacrifício que está em harmonia com a vida.
    O culto dos chefes de Jerusalém, a quem Isaías dirigia a sua invectiva, era apenas sombra do verdadeiro culto inaugurado por Jesus. Agora podemos rezar, com o salmo responsorial «Aceita, Senhor, o nosso sacrifício de louvor». O sacrifício de Jesus tornou-se também nosso. E podemos oferecê-lo ao Pai, unindo-nos a Jesus, com todo o nosso ser, com toda a nossa vida. Jesus, que Se ofereceu inteiramente ao Pai, insere-nos no seu próprio caminho, desde que sejamos coerentes, desde que Lhe demos o primeiro lugar na nossa vida, como exige o evangelho de hoje: «Quem amar o pai ou a mãe... o filho ou filha mais do que a mim, não é digno de mim» (v. 37); «aquele que perder a sua vida por causa de mim, há-de salvá-la» (v. 39).
    O Espírito, por meio do P. Dehon, suscit
    ou-nos na Igreja como «Oblatos - Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus» (Cst 6.16), isto é, como chamados a unir a nossa vida religiosa e apostólica à oblação reparadora de Cristo ao Pai pelos homens. Toda a nossa vida há-de tornar-se oferenda de amor ao Pai, em comunhão com o sacrifício de Cristo, motivado pelo amor e nele realizado. Mas o amor é algo de muito concreto. Amar a Deus comporta amar o irmão, a irmã, amá-los no seu ser concreto, na situação em que se encontram. Fazer-lhes o bem pode traduzir-se em grandes gestos ou, mais provavelmente, em gestos quotidianos, que facilmente definimos como pequenos, e a que nem sempre damos a devida atenção. São exactamente esses gestos, aparentemente banais, os que mais nos custam a fazer com amor, principalmente quando temos pela frente pessoas difíceis, ou simplesmente desagradáveis. Mas passa por aí o nosso seguimento dos «passos de Cristo», que não nos deixa faltar a sua graça para os realizarmos com amor e fidelidade. Está sempre connosco «Aquele que nos precedeu neste caminho, que o tornou praticável e que deixou atrás de Si, como sinais dos seus passos, pegadas sangrentas» (Directório Espiritual). O seu caminho é o nosso caminho (Cst 12).

    Oratio

    Obrigado, Senhor, por me teres chamado a percorrer o teu próprio caminho de oblação total, até à imolação. Obrigado, porque vais à frente, estimulando os meus passos com o teu exemplo e amparando-os com a tua graça. Sabes como sou fraco e como, tantas vezes, cambaleio para um lado e para o outro, ao sabor das minhas inclinações. Mas Tu tens uma paciência infinita para me esperares, me fazeres ouvir a tua voz, me estenderes a tua mão misericordiosa. Que, jamais, me falte a tua graça, para arriscar à tua palavra, para ousar perder a vida por Ti e para fazer o bem aos meus irmãos. Não me deixes cair no formalismo de uma vida rotineira. Mantém-me na autenticidade do amor para contigo e para com o meu próximo, no quotidiano da vida, sabendo que é lá que me esperas, e queres recompensar. Amen.

    Contemplatio

    Nestas palavras: Ecce vento, Deus ut faciam voluntatem tuam: Eís que venho, ó Deus, para fazer a tua vontade (Heb 10, 7), e nestas outras: Ecce ancília Domini, fiat mihi secundum verbum tuum: Eis a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra (Lc 1, 38), encontram-se toda a nossa vocação, a nossa finalidade, o nosso dever, as nossas promessas.
    Em todas as circunstâncias e acontecimentos, tanto para o futuro como no presente, o ecce venio é quanto basta, desde que esteja gravado na mente e no coração ao mesmo tempo que nos lábios. Ecce venio: Eis que eu venho, ó Deus, para fazer a vossa vontade. Eis-me pronto a fazer, a empreender, a sofrer o que Vós quiserdes, a sacrificar o que me pedirdes.
    Podemos viver sem inquietações, uma vez que a vontade de Deus se faz conhecer a cada instante; e, se, devido à obscuridade, a incerteza invadir o espírito e o coração, perseveremos com paciência e amor neste estado até que praza à sabedoria e à bondade de Deus fazer brilhar de novo a sua luz.
    Uma vítima sabe que nada tem a escolher ou a desejar para si. A sua escolha está feita; o seu futuro está marcado, Quando e como se realizará o seu sacrifício, em que circunstâncias, que duração terá, tudo isso é deixado à livre escolha d'Aquele a quem ela pertence inteiramente.
    Assim, a nossa atitude é o abandono total, o completo deixar fazer, de olhos postos n'Aquele que nos precedeu neste caminho, que o tornou praticável e que deixou atrás de Si, como sinais dos seus passos, pegadas sangrentas. Tal é a nossa vocação.
    Se alguém se entrega deste modo a Nosso Senhor, Nosso Senhor dá-Se-lhe também e então nada lhe poderá faltar. Até os cabelos da vossa cabeça estão contados (Mt 10, 30), dizia Nosso Senhor aos seus discípulos. Não se vendem dois passarinhos por um asse? Todavia nem um deles cairá por terra sem consentimento do vosso Pai (Mt 10, 29).
    Nosso Senhor olha por todas as nossas necessidades, no tempo oportuno, se nos abandonarmos a Ele (Leão Dehon, DSP, ed. portuguesa, nn. 8-9).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Quem não tomar a sua cruz para me seguir,
    não é digno de mim» (Mt 10, 38).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • XV Semana - Terça-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    XV Semana - Terça-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    12 de Julho, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares
    XV Semana - Terça-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Isaías 7, 1-9

    No tempo em que, 1em Judá, reinava Acaz, filho de Jotam e neto de Uzias. Aconteceu que Recin, rei de Damasco e Pecá, filho de Remalias, rei de Israel, marcharam contra Jerusalém para a combater, mas não puderam apoderar-se dela. 2Chegou a notícia ao herdeiro de David: «Os sírios acampam em Efraim.» Ao ouvir isto, agitou-se o coração do rei e do seu povo, como se agitam as árvores das florestas impelidas pelo vento. 3Então o Senhor disse a Isaías: «Sai ao encontro de Acaz com o teu filho Chear-Yachub, na extremidade do aqueduto da piscina superior, junto à Calçada do Bataneiro, 4e diz-lhe: 'Tranquiliza-te, tem calma, não temas nem te acobardes diante do furor de Recin, rei da Síria, e de Pecá, filho de Remalias: não passam de dois tições fumegantes. 5De facto, a Síria, Efraim e o filho de Remalias decidiram a tua ruína dizendo: 6Vamos contra Judá e sitiemo-la, e proclamaremos rei o filho de Tabiel.'» 7Assim diz o Senhor Deus: «Tal não acontecerá nem se realizará. 8Assim como é verdade que a capital da Síria é Damasco, e que o chefe de Damasco é Recin; 9que a capital de Efraim é Samaria, e que o chefe da Samaria é o filho de Remalias; também é verdade que daqui a cinco ou seis anos Efraim será destruída, deixará de ser povo. Se não o acreditardes, não subsistireis.»

    A partir dos anos 735-733 a. C. a independência política de Judá estava seriamente ameaçada, seja a partir da Assíria, seja a partir de Efraim, aliado à Síria. É com este pano de fundo que abre, no capítulo 7 de Isaías, o chamado «livrinho do Emanuel». Enquanto Acaz prepara a defesa de Jerusalém, e o seu abastecimento de água em caso de assédio, Isaías vai ao encontro dele, com o seu filho simbolicamente chamado «um resto há-de voltar». Não foi um encontro propriamente amistoso, dadas as posições opostas do rei e do profeta no que se referia a política de alianças. Enquanto o rei pretendia aliar-se à Assíria, contra Efraim e a Síria, o profeta opunha-se a essa ideia, insistindo na necessidade de confiar unicamente no Deus da Aliança e das Promessas. O rei pode levar por diante os seus intentos. Judá sofrerá as consequências. Mas Deus não vai faltar à aliança estabelecida com a casa de David. Sobrará «um resto», que garantirá o cumprimento das promessas. Os reis vizinhos são bem pouca coisa diante do rei de Jerusalém, que é o próprio Javé. Há, pois, que confiar plenamente n´Ele!
    Acaz, céptico, deve ter sorrido às palavras de Isaías. O profeta, indignado, ameaça: «Se não o acreditardes, não subsistireis» (v. 9). Acaz devia saber que não era um rei semelhante aos seus vizinhos, mas apenas o representante de Javé, o verdadeiro rei de Jerusalém. Não aceitar essa condição era usurpar o lugar de Deus, era ser infiel à Aliança. Acaz despede-se com uma atitude diplomática de escuta. Mas o profeta não acredita nele.

    Evangelho: Mateus 11, 20-24

    Naquele tempo, 20Jesus começou então a censurar as cidades onde tinha realizado a maior parte dos seus milagres, por não se terem convertido: 21«Ai de ti, Corozaim! Ai de ti, Betsaida! Porque, se os milagres realizados entre vós, tivessem sido feitos em Tiro e em Sídon, de há muito se teriam convertido, vestindo-se de saco e com cinza. 22Aliás, digo-vos Eu: No dia do juízo, haverá mais tolerância para Tiro e Sídon do que para vós. 23E tu, Cafarnaúm, julgas que serás exaltada até ao céu? Serás precipitada no abismo. Porque, se os milagres que em ti se realizaram tivessem sido feitos em Sodoma, ela ainda hoje existiria. 24Aliás, digo-vos Eu: No dia do juízo, haverá mais tolerância para os de Sodoma do que para ti.»

    «A quem muito foi dado, muito será exigido; e a quem muito foi confiado, muito será pedido» (Lc 12, 48). O texto que hoje escutamos ilustra bem esta afirmação de Jesus. Corazim, Betsaida e Cafarnaúm beneficiaram da primeira actividade taumatúrgica e missionária de Jesus (vv. 21.23). Mas não se converteram. Jesus aponta-as como protótipos da "geração caprichosa" , semelhante às crianças que, em vez de participarem no jogo que outras crianças organizam nas praças, ficam sentadas sem ligarem ao que se passa (cf. Mt 11, 16-19).
    Os milagres, que Jesus realizou nas cidades próximas do lago de Genesaré, levantavam o véu sobre a sua identidade. Eram prova da acção do Espírito, da vitória sobre Satanás, da misericórdia de Deus, que sempre convida o extraviado a regressar à casa paterna. Eram, por assim dizer, obras-palavra, acções pedagógicas, cuja finalidade era levar ao acolhimento de Jesus e da sua mensagem, na fé: «Convertei-vos e acreditai no evangelho» (Mc 1, 15b). Mas as cidades da Galileia não corresponderam ao dom recebido. Tal correspondência pressupõe uma disponibilidade que vem da consciência da necessidade de ser salvo, de ser libertado do mal. Por isso, as cidades pecadoras, tal como Tiro, Sídon e Sodoma, são potencialmente mais dispostas ao evangelho e à conversão.

    Meditatio

    Acaz pensava que a estabilidade do seu reino podia vir da sua política de alianças. Mas Isaías insiste que a única garantia de estabilidade é a fé, que põe à nossa disposição a força de Deus. Na iminência da invasão sírio-efraimita, o rei treme e agita-se «como se agitam as árvores das florestas impelidas pelo vento» (v. 2). Mas Deus, por meio do seu profeta, diz-lhe: «Tranquiliza-te, tem calma» (v. 4). Trata-se de um claro convite à fé e à confiança n´Aquele que pode salvar (cf. Heb 7, 25). Precisamos de regressar a esta atitude de fé e confiança em Deus. Os nossos bons propósitos valem se, em vez de confiarmos em nós, confiamos em Deus. A vida cristã não existe sem a fé, e não subsiste se a fé não for alimentada e não crescer cada dia, porque, sem a fé, é impossível o amor.
    A fé, todavia, não afasta a lucidez da análise do que acontece à nossa volta. Pelo contrário, permite ver em profundidade e tirar as últimas consequências dos fenómenos políticos, sociais, familiares... A fé não impede a aquisição da necessária competência para tratar as questões contingentes. Pelo contrário, estimula-a, com a certeza de que nada se perde, nem mesmo as derrotas e os fracassos, porque Deus é o salvador de tudo quanto existe. A fé alarga os horizontes para além das aparências, e permite reconhecer a obra do Espírito Santo, que orienta o homem para a plena revelação do Pai em Cristo. Abrir-se a este reconhecimento é abrir-se à alegria, mesmo nas dificul
    dades e sofrimentos que a vida nos apresenta.
    Ao analisar a sociedade do seu tempo, com todos os problemas que a afligiam, o Pe. Dehon não o faz como um qualquer sociólogo. O seu olhar de teólogo e de místico, o seu olhar de fé, leva-o a observar a causa mais profunda dos males da sociedade e os remédios adequados para os combater. O mal-estar social é consequência da recusa do amor de Cristo, é consequência do pecado. Para remediar esse mal-estar, é preciso instaurar o Reino de Cristo nas almas e nas sociedades; «a solução da actual questão social» está na «reparação por meio do puro amor...». Esta afirmação do Fundador, perante os seus noviços, pode soar a espiritualismo. Mas a intensa acção social em S. Quintino, os congressos, o jornal, a revista, e os muitos livros de denúncia das injustiças e de divulgação da doutrina social da Igreja, dizem-nos que era um homem com os pés bem assentes na terra. Mas a sua fé mostrava-lhe que, para além de todas as medidas humanas, só a vivência do puro amor pode construir a tão suspirada "civilização do amor".

    Oratio

    Senhor Deus, vivifica em mim o dom da fé, para que possa vivê-lo e testemunhá-lo. Perdoa a dureza do meu coração, que, por vezes, me leva a viver como se Tu não existisses, ou a querer-Te diferente do que és. Perdoa-me escandalizar-me pelo modo como Te revelas na vida de Jesus, e, sobretudo, pelo modo como hoje Te queres revelar na vida da Igreja, e de cada um dos cristãos, também da minha, com todas as contradições, incoerências, fragilidades e infidelidades.
    Dá-me suficiente humildade para acolher-Te no modo como Te queres revelar: no Pão, na Palavra, no irmão, nos acontecimentos da história. Amen.

    Contemplatio

    É na docilidade às inspirações divinas que se encontra a paz, a alegria e a luz. Observemos como as coisas se passavam quando Nosso Senhor ensinava na Palestina. Encontrava corações dóceis, discípulos fiéis que o seguiam com diligência até nos desertos. Acreditavam na sua missão. Consideravam as suas acções, escutavam as suas palavras com fé, com respeito, com edificação. Convertiam-se, agarravam-se a Ele. Eram as ovelhas dóceis do Bom Pastor: Oves vocem ejus audiunt : As suas ovelhas ouvem-no (Jo 10, 3).
    Mas havia também corações indóceis, espíritos rebeldes, como os habitantes de Corozaim, de Cafarnaúm, de Betsaida. Nem os milagres, nem as pregações de Nosso Senhor os convertiam. Procuravam interpretar tudo humanamente e de tudo se escandalizavam. Aos seus olhos, João Baptista era um possesso e Nosso Senhor era o amigo dos pecadores.
    Quais são os escolhos nos quais encalham os espíritos indóceis? É a falta de fé, o orgulho secreto e a lassidão. A nossa pouca fé faz com que prestemos pouca atenção e estima por aquilo que nos vem de Deus; os mistérios não nos tocam, pensamos neles de um modo tão fraco, tão depressa os esquecemos; a sua palavra, as inspirações de Nosso Senhor fazem-nos pouca impressão, somos tão distraídos e tão esquecidos!
    O nosso orgulho secreto coloca-se de parte. Envergonhamo-nos da cruz, não nos podemos decidir a amar os desprezos. A nossa lassidão afasta-nos da doutrina da cruz, recuamos diante da mortificação, a nossa sensualidade tem medo dela. Recordemos as recomendações divinas: já no antigo Testamento o Espírito Santo nos tinha dito: «Tende para com o Senhor sentimentos rectos e buscai-o com sinceridade de coração» (Sab 1). E ainda: «A sabedoria divina entretém-se com as almas simples» (Prov 3, 32).
    Nosso Senhor recomendou a simplicidade dos cordeiros, a das pombas, a das crianças. Esta simplicidade honra-o, alegra-o, ganha o seu coração. (Leão Dehon, OSP 4, p. 570s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Se acreditardes, subsistireis» (cf. Is 7, 9b).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • XV Semana - Quarta-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    XV Semana - Quarta-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    13 de Julho, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares
    XV Semana - Quarta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Isaías 10, 5-7. 13-16

    Assim fala o Senhor: 5Ai da Assíria, vara da minha cólera, o bastão das suas mãos é o bastão do meu furor! 6Eu o atirei contra uma nação ímpia, e o lancei contra o povo, objecto do meu furor, para o saquear e despojar e para o calcar aos pés como lama das ruas. 7Mas ele não entendeu assim, nem eram estes os planos do seu coração. O seu propósito era destruir e exterminar muitas nações. 13Realmente ele afirma: «Foi pela força da minha mão que fiz isto, com a minha sabedoria, porque sou inteligente. Mudei as fronteiras dos povos, saqueei os seus tesouros, como um herói derrubei toda aquela gente. 14Apanhei com a minha mão a riqueza dos povos, como quem recolhe os ovos deixados num ninho. Juntei a terra inteira e ninguém bateu as asas, nem abriu a boca para piar.» 15Acaso gloriar-se-á o machado contra quem o maneja? Ou levantar-se-á a serra contra o serrador? Um bastão não pode comandar um homem, é o homem que faz mover o bastão. 16Por isso, o Senhor Deus do universo enfraquecerá com a doença aqueles guerreiros; debaixo do fígado acender-lhes-á uma febre como um fogo de incêndio.

    Este oráculo deve ser entendido no contexto da iminente ameaça da invasão assíria. O rei de Judá, Acaz primeiro, e o seu filho Ezequias, depois, adoptam políticas diferentes diante da super-potência estrangeira. Acaz opta por uma aliança-vassalagem; Ezequias, pela oposição. Mas ambos não escutam Isaías, que prega a fé em Deus, como garantia de estabilidade e de segurança para o reino de Judá. O profeta vê, cada vez mais, a Assíria como instrumento de punição usado por Deus para advertir o seu povo e chamá-lo à conversão. Assim, lança um dos pilares básicos da teologia bíblica: tudo está nas mãos de Deus. A criação e a história estão submetidas aos seus desígnios. Para melhor se fazer compreender, o profeta descreve antropomorficamente a Deus, como se fosse uma pessoa ofendida e ultrajada, e o seu povo espezinhado como pó dos caminhos. A situação não podia durar muito. Se Judá não compreendia o papel da Assíria nos planos divinos, menos ainda Assur o compreenderia. Nunca lhe passaria pela cabeça ser simples instrumento de um Deus estrangeiro. Mas enganou-se, diz Isaías, teólogo da história. A grandeza de um povo, Judá ou outro qualquer, não está na política ou sabedoria humanas, mas na fidelidade aos desígnios de Deus. A história veio a confirmar os oráculos de Isaías.

    Evangelho: Mateus 11, 25-27

    25Naquele tempo, Jesus tomou a palavra e disse: «Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos entendidos e as revelaste aos pequeninos. 26Sim, ó Pai, porque isso foi do teu agrado. 27Tudo me foi entregue por meu Pai; e ninguém conhece o Filho senão o Pai, como ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar.»

    O texto que hoje escutamos é como que um meteorito caído do céu joânico. Jesus louva e dá graças ao Pai por actuar de modo tão diferente da lógica humana que exalta o poder e a força em qualquer âmbito da existência. Jesus verifica que são os «pequeninos» que beneficiam da revelação do Pai (v. 25). A revelação da paternidade divina, de que Deus é Pai, sobretudo de Jesus e, por meio d´Ele, dos crentes, é o núcleo fundamental da pregação de Jesus. Na paternidade divina está resumido tudo quanto poderia dizer-se da relação de Deus com os homens. Na filiação divina está resumido tudo o que poderia dizer-se da relação dos homens com Deus. É, pois, o melhor resumo do evangelho.
    O evangelista aproveita a ocasião para declarar a consciência de Jesus e a fé da igreja no mistério das relações trinitárias. O Pai, por amor, dá tudo ao Filho que, por amor, tudo acolhe e tudo restitui ao Pai. O movimento eterno de dom recíproco entre o Pai e o Filho permanece incognoscível à criatura humana. Todavia, por obra do Espírito, efusão perene de amor, o Pai torna-se acessível no Filho e revela-se a si mesmo (v. 27). Tal manifestação é incompreensível à sabedoria humana. Só quem se torna «pequenino», disponível a entrar na lógica da gratuidade de Deus, pode compreendê-la.

    Meditatio

    O homem que recusa a Deus, fecha-se no gueto dos seus instintos, dos seus pontos de vista, de uma inteligência que, por muito que possa percorrer os espaços siderais ou penetrar nas mais pequenas partículas da matéria, não encontra o caminho da alegria, da paz, da plenitude interior. Do mesmo modo, o homem que se sente senhor do mundo, da sua existência e da existência dos outros, não atinge o âmago do que é viver, o seu significado último, que, só por si, lhe dá consistência. Pelo contrário, é isso que é revelado a quem aceita a realidade de ser criatura, pequena diante do Criador, mas tão preciosa para Ele, que a chama a participar da sua vida.
    A primeira leitura apresenta-nos um «entendido» que erra completamente: «Foi pela força da minha mão que fiz isto, com a minha sabedoria, porque sou inteligente. Mudei as fronteiras dos povos, saqueei os seus tesouros... derrubei toda aquela gente» (v. 13). Julga-se inteligente, e não se dá conta de que é um simples instrumento nas mãos de Deus: «Ai da Assíria, vara da minha cólera, o bastão das suas mãos é o bastão do meu furor!... Um bastão não pode comandar um homem, é o homem que faz mover o bastão» (vv. 5.15b).
    Ao contrário do «sábio e entendido» da primeira leitura, os «pequeninos» do evangelho, sobre os quais se inclina o olhar comprazido de Deus, entendem os mistérios do Reino: «Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos entendidos e as revelaste aos pequeninos» (v. 25).
    É preciso ser «pequeninos» para acolher o dom de reconhecer o mistério de Jesus, para entrar no conhecimento do Pai e do Filho, no segredo da sua vida, conforme é da vontade de Deus. Jesus bendiz o Pai por esta sua vontade, Ele que se fez «pequenino», humilde, manso, completamente disponível a realizar a sua vontade.
    O verdadeiro poder do homem, não depende do que tem, dos meios de que dispõe, mas dos dons do Pai, que os dá a quem é suficientemente pobre para os receber: «Eu Te bendigo, ó Pai, porque revelaste estas coisas aos pobres...» (Mt 11, 25ss). A pobreza cristã, e mesmo a pobreza dos religiosos, não é algo de simplesmente negativo. É bem-aventurança: «Bem-aventurados os pobres» (Lc 6, 20). Bem-aventurados porque lhes é oferecido um encontro de conhecimento e de amor com Jesus e, por meio d
    e Jesus, com o Pai. Bem-aventurados porque, nesse encontro-conhecimento, experimentam a alegria, a paz, o amor, que é Jesus, bem-aventurança de todas as bem-aventuranças.

    Oratio

    Eu Te bendigo, ó Pai, porque nos destes o teu Filho Jesus e, n´Ele, nos revelastes quanto nos amas. Porque decidiste manifestar-Te a nós, posso, agora, falar-Te com a confiança e o atrevimento de um filho.
    Renova no meu coração a certeza da presença do Espírito, que me garanta que és Pai, que Jesus é o Senhor, que sou chamado à bem-aventurança da comunhão Contigo. Sei que sou uma criatura pequena e frágil. Mas também sei que me amas. Que o teu Espírito de sabedoria e de piedade acenda em mim o gosto pela minha pequenez e pela simplicidade, para que possa sempre acolher-Te, qualquer seja o modo com que decidas manifestar-Te. Amen.

    Contemplatio

    São os pobres que Nosso Senhor convida para o festim do reino dos céus (Lc 14, 21). Toda a sua simpatia vai para o pobre Lázaro, abandonado pelo mau rico, e atribui-lhe uma compensação eterna no céu (Lc 16, 19).O único estremecimento de alegria que manifesta na sua vida, vem do facto de que o Pai se digna revelar aos simples e aos pequenos, os mistérios que esconde aos sábios e aos prudentes; e exprime então nitidamente a sua preferência: «O meu Pai colocou tudo nas minhas mãos, diz, chamo quem eu quero ao seu conhecimento, vinde portanto a mim vós que penais e sofreis e vos consolarei» (Mt 11, 25). O Coração de Jesus tem os seus preferidos, amigos que escolheu e que se prendem a ele na vida religiosa, mas é sob a condição de que abracem a pobreza como ele e se façam os amigos dos pobres (Leão Dehon, OSP 4, p. 136s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Eu Te bendigo, ó Pai, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos entendidos e as revelaste aos pequeninos» (Mt 11, 25).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • XV Semana - Quinta-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    XV Semana - Quinta-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    14 de Julho, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares
    XV Semana - Quinta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Isaías 26, 7-9.12.16-19

    7O caminho do justo é recto; é o Senhor quem prepara o caminho do justo. 8Seguindo os caminhos dos teus desejos, Senhor, esperamos em ti. E com que ansiedade pronunciamos o teu nome e nos lembramos de ti! 9A minha alma suspira por ti de noite, e do mais profundo do meu espírito, eu te procuro pela manhã, porque quando exerces sobre a terra os teus julgamentos, os habitantes do mundo aprendem a justiça. 12Senhor, dá-nos a paz, porque és Tu que realizas todos os nossos empreendimentos. 16Senhor, na tribulação, nós recorríamos a ti, quando a força do teu castigo nos abatia.
    17Como a mulher grávida, prestes a dar à luz, se torce e grita nas suas dores, assim éramos nós na tua presença, Senhor. 18Nós concebemos, sofremos dores de parto, e o que demos à luz foi vento. Não demos a salvação ao nosso país, nem nasceram novos habitantes na terra. 19Os teus mortos reviverão, os seus cadáveres ressuscitarão. Despertai e rejubilai vós que jazeis no sepulcro! Pois o teu orvalho é um orvalho de luz, que fará renascer os que não passavam de sombras

    Este texto integra-se num bloco de capítulos (24-27) do livro de Isaías. São versículos extraídos de uma oração (Is 26, 7-19), que faz parte do chamado «Apocalipse de Isaías». O profeta começa com um grito de rectidão e justiça legal, que é todo um programa de vida: «O caminho do justo é recto; é o Senhor quem prepara o caminho do justo» (v. 7). A comunidade reunida em solene liturgia responde, afirmando a sua confiança na justiça de Javé. Isaías serve-se provavelmente de algum salmo popular, retocando-o e incorporando-o no cântico triunfal dos versículos anteriores. Os justos buscam o nome de Javé, isto é, o próprio Deus, na medida em que é possível à limitação humana conhecê-lo, compreendê-lo, amá-lo. Nada poderá desviá-los desse centro de gravidade. Deus realiza as suas obras no meio dos povos, para que todos possam conhecê-lo e viver de acordo com a sua vontade. Sem Deus, todo o empreendimento humano é abortivo. Só na comunhão com Deus podemos alcançar todos os bens e ter sucesso nas nossas iniciativas: «és Tu que realizas todos os nossos empreendimentos» (v. 12). A intervenção de Deus dará novamente a vida a um povo de «mortos», para uma nova e alegre existência (v. 19). O orante proclama uma esperança segura, expressão de fé n´Aquele a quem tudo pertence.

    Evangelho: Mateus 11, 28-30

    Naquele tempo, Jesus exclamou: 28«Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, que Eu hei-de aliviar-vos. 29Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito. 30Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve.»

    Depois de ter dado graças ao Pai pela revelação recebida, e de ter anunciado o conteúdo dessa revelação (Mt 11, 25-27), Jesus dirige um convite-chamamento a todos «cansados e oprimidos» (v. 28). A imagem do «jugo» (v. 29) fazia parte, primeiramente, da relação «escravo-senhor». Depois foi aplicada à relação «discípulo-mestre». As alianças humanas, também com a divindade, exprimiam-se em categorias de submissão-obediência. A lei de Moisés, tal como a aplicavam os escribas (cf Mt 23, 4), era um «jugo» particularmente duro, um «jugo insuportável» (Heb 12, 10). Cada mestre tinha que impor um «jugo» aos seus discípulos. Os discípulos de Jesus são convidados a pôr-se ao lado d´Ele, a carregar o mesmo jugo, a levar o mesmo estilo de vida: o dos mansos e humildes, dos pobres e pequenos, que compreenderam o mandamento novo da obediência a Deus e do serviço aos irmãos. O jugo, em si mesmo, é pesado. Mas, levá-lo com Jesus, é causa de doçura. O amor exige pesada renúncia aos próprios instintos egoístas. Mas abre os horizontes da verdadeira vida.

    Meditatio

    Isaías convida os seus ouvintes à confiança no Senhor, sempre fiel às suas promessas, atento aos pobres e oprimidos. Do mesmo modo que Deus devasta as cidades pagãs, tornando impraticáveis os seus caminhos, assim também aplana a estrada daqueles que conformam a vida aos seus preceitos. Os que esperam no Senhor, e desejam ardentemente estar em comunhão com Ele, serão saciados de todos os bens, simbolizados na paz.
    O que os homens do Antigo Testamento desejavam e esperavam, foi-nos dado em Jesus Cristo: «Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos ... e encontrareis descanso para o vosso espírito». Jesus experimentou os nossos cansaços. Por isso, nos compreende, como compreendeu os Apóstolos, quando, depois de um dia de missão, lhes disse: «Vinde e descansai um pouco» (Mc 6, 31). Ser compreendido já alivia o sofrimento.
    Hoje muitos de nós experimentamos o cansaço e a opressão de uma vida intensa e exigente, muitas vezes marcada por duras tribulações. O Senhor permite-as para que O busquemos: «Senhor, na tribulação, nós recorríamos a ti» (v. 16). É este recurso ao Senhor que nos permite suportar os sofrimentos da vida e torná-los úteis e fecundos, para nós, para o mundo, para a Igreja. E melhor será, se soubermos escutar o convite do Senhor: «Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito» (v. 29). Parece uma contradição: carregar um jugo para descansar! Mas o jugo de Jesus é um jugo de amor. Estando sós, os nossos esforços são vãos, e o sofrimento aproxima-se do desespero, porque não vemos o sentido das nossas fadigas. Mas se aceitarmos o jugo de Jesus, e caminharmos com Ele, tudo ganha sentido, tudo se torna fecundo, e temos a certeza de caminhar para a luz e para a vida.
    «Aprendei de Mim que sou manso e humilde de coração e encontrareis repouso para as vossas almas. O Meu jugo é suave e a minha carga é leve» (Mt 11, 29-30). Jesus não engana ninguém, e muito menos nos engana a nós, chamados a percorrer o seu próprio caminho. As exigências do amor evangélico são um "jugo", uma "carga". Podem, por vezes, exigir-nos heroísmo, como no caso do amor pelos inimigos, no fazer o bem a quem nos faz mal, no rezar pelos nossos perseguidores; mas o "jugo" de Jesus é "suave", a sua "carga leve", porque Ele o carregou antes de nós e agora o leva connosco. Faz-se presente a nós, particularmente no dom dos sacramentos, e na efusão do Espírito Santo, para ser o nosso amparo e guia no caminho das virtudes, possibilitando-nos exercê-las até de modo heróico, irradiando os Seus saborosos frutos na vida comunitária e no apostolado. Assim, podemos transmitir alegria e paz àqueles que encontramos. Assim, como Jes
    us, podemos vencer o mal praticando o bem. Assim, podemos semear esperança, e gritar aos nossos contemporâneos: «Despertai e rejubilai...! O teu orvalho é um orvalho de luz, que fará renascer os que não passavam de sombras» (v. 19).

    Oratio

    Senhor, venho ao teu encontro carregando o peso do meu dia, com o peso dos sofrimentos que oprimem os que me são próximos. Mas dou Contigo a carregar a tua cruz e as cruzes de todos os homens, de quem Te fizeste solidário, irmão. Obrigado Senhor! Como poderia levar sozinho a minha cruz, se nem posso comigo? Obrigado pelo teu convite: «Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, que Eu hei-de aliviar-vos». Apoiado por Ti, e em Ti, quero ajudar e levar alívio a tantos irmãos e irmãs, que sofrem muito mais do que eu. No amor, estou certo, todo o peso se torna leve. Amen.

    Contemplatio

    Adoremos Nosso Senhor contemplando no seu Coração sagrado a virtude de humildade e de doçura... Meditamos sobre a virtude de humildade e de doçura. Pode aplicar-se o mesmo método às outras virtudes do divino Coração de Jesus, à sua obediência, à sua pureza, à sua paciência, à sua misericórdia, à sua caridade.
    Consideremos com atenção como Nosso Senhor praticou esta virtude no seu interior e no seu exterior, em Nazaré, na sua vida pública e na sua Paixão.
    Pelo exercício desta virtude, prestou uma glória infinita ao seu Pai; - reparou plenamente as ofensas que lhe tínhamos feito pelos pecados contrários a esta mesma virtude; - libertou-nos das penas eternas que podíamos ter merecido por estes pecados; - ensinou-nos pelo seu exemplo o modo de praticar esta virtude; - finalmente mereceu-nos a graça necessária e conveniente para o fazer.
    Demos-lhe graças por todos estes favores; - ofereçamo-nos a ele para efectuarmos os desejos mais ardentes que ele tem de nos ver ornados com esta virtude; - rezemos-lhe para que nos dê todas as graças de que temos necessidade para cumprirmos em nós os santos desejos do seu Coração (Leão Dehon, OSP 3, p. 535).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração» (Mt 11, 29).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • XV Semana - Sexta-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    XV Semana - Sexta-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    15 de Julho, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares
    XV Semana - Sexta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Isaías 38, 1-6.21-22.7-8

    1Naqueles dias, o rei de Judá adoeceu de uma enfermidade mortal. O profeta Isaías, filho de Amós, veio visitá-lo e disse-lhe: «Eis o que diz o Senhor: Faz o testamento, porque vais morrer muito brevemente.» 2Ezequias voltou o rosto para a parede e fez ao Senhor esta oração: 3«Senhor, lembra-te que tenho andado fielmente diante de ti, com um coração sincero e íntegro, pois fiz sempre a tua vontade.» E começou a chorar, derramando lágrimas abundantes. 4Então, a palavra do Senhor foi dirigida a Isaías nestes termos: 5«Vai e diz a Ezequias: 'Eis o que diz o Senhor, o Deus de teu pai David: Ouvi a tua oração e vi as tuas lágrimas; vou acrescentar à tua vida mais quinze anos. 6Hei-de livrar-te, a ti e a esta cidade, das mãos do rei da Assíria e protegê-la-ei.'» 21Depois, Isaías deu esta ordem: «Tragam um emplastro de figos e apliquem-no na parte doente e ficará curado.» 22E Ezequias perguntou: «Qual é o sinal que me garanta que ainda poderei ir ao templo do Senhor?» 7Tomarão até alguns dos teus próprios filhos, para fazerem deles eunucos no palácio do rei da Babilónia.» 8Ezequias respondeu a Isaías: «A palavra do Senhor, que acabas de proferir, é favorável.» E dizia para consigo: «Ao menos assim haverá paz e segurança durante a minha vida.»

    Os capítulos 36 a 39 do livro atribuído a Isaías, donde foi extraída a perícopa com que terminamos a leitura litúrgica do profeta, são obra de um redactor pós-exílico. Os acontecimentos narrados remontam aos últimos anos do século VIII a. C., durante o reinado de Ezequias, estando documentados em 2 Reis e em textos assírios. Estamos antes do assédio posto a Jerusalém, pelo rei assírio Senaquerib, e quinze anos antes da morte de Ezequias. Isaías confirma os seus vaticínios com sinais e milagres. Ezequias adoece gravemente, e o profeta garante que a situação é sem esperança: «vais morrer muito brevemente» (v. 2). O rei, que interpreta a doença como castigo divino, não perde todavia a confiança em Deus e no seu profeta. Reage com uma oração ao estilo dos salmos de súplica, invocando a misericórdia divina. Apresenta a Deus a rectidão da sua vida, cheia de boas obras. Segundo o princípio da retribuição, Deus terá de usar de misericórdia para com ele. Como pode o justo morrer na flor da vida? Javé escuta Ezequias, e acrescenta quinze anos à sua vida de rei. E, não só o rei será curado, mas também Jerusalém, será libertada do rei da Assíria. Afinal estava em causa, não só a vida do rei, mas também a do seu povo.

    Evangelho: Mateus 12, 1-8

    Naquele Tempo, 1Jesus passava, num dia de sábado, através das searas. Os seus discípulos, que tinham fome, começaram a arrancar espigas e a comê-las. 2Ao verem isso, os fariseus disseram-lhe: «Aí estão os teus discípulos a fazer o que não é permitido ao sábado!» 3Mas Ele respondeu-lhes:«Não lestes o que fez David, quando sentiu fome, ele e os que estavam com ele?
    4Como entrou na casa de Deus e comeu os pães da oferenda, que não lhe era permitido comer, nem aos que estavam com ele, mas unicamente aos sacerdotes? 5E nunca lestes na Lei que, ao sábado, no templo, os sacerdotes violam o sábado e ficam sem culpa? 6Ora, Eu digo-vos que aqui está quem é maior que o templo. 7E, se compreendêsseis o que significa: Prefiro a misericórdia ao sacrifício, não teríeis condenado estes que não têm culpa. O Filho do Homem até do sábado é Senhor.»

    Mateus narra uma das numerosas controvérsias entre Jesus e os especialistas da Lei (os escribas), por um lado, e os leigos piedosos (os fariseus), por outro. Eram confrontos inevitáveis. A religião deve ser libertadora. Mas aqueles dirigentes tinham-me feito escravizante, tinham-na tornado aquele jugo insuportável de que falámos ontem.
    O repouso sabático, inicialmente, era uma lei humanitária, que visava proporcionar descanso a quem trabalhava, aos homens livres e aos escravos, e mesmo aos animais. O sábado era um dia de festa para todos, lembrando a libertação da escravidão do Egipto, e antecipando o repouso escatológico, quando a criatura participar no repouso de Deus (cf. Heb 4, 9-11). Mas essa lei ao serviço do homem, tinha sido transformada na mais sagrada das instituições divinas. Por isso, a afirmação de Jesus «o sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado» (Mc 2, 27), soou a verdadeira blasfémia.
    Hoje, encontramos outra grave declaração de Jesus sobre o sábado: «O Filho do Homem até do sábado é Senhor» (v. 8). Uma tal afirmação significa que a autoridade de Jesus é superior à de Moisés, em força da sua relação especial com aquele Deus a quem se pretende honrar com a observância do sábado. Ele, e só Ele, pode definir o que é lícito e o que o não é. Depois de revelar o amor do Pai, Jesus repõe o homem no centro do verdadeiro culto: prestar culto a Deus não pode ser algo de separado da atenção ao homem, que Deus criou e ama. Não pode haver conflito entre a lei religiosa e as exigências do amor ao próximo. A história de Israel confirma-o, uma vez que a sacralidade dos pães da oferenda não impediu David e os seus homens famintos de se alimentarem com eles (vv. 3s.).

    Meditatio

    Deus é o Absoluto, o Infinito, o Imutável. Mas não é rígido, estático e duro como uma pedra. O Deus da Bíblia é vivo, respeitoso das suas criaturas, pronto a acolher as súplicas dos homens, e até a mudar os seus desígnios. As leituras que hoje escutamos apontam nesse sentido.
    Na primeira leitura, Isaías comunica a Ezequias a palavra do Senhor: «Faz o testamento, porque vais morrer muito brevemente» (v. 1). Parece uma decisão irrevogável. Mas Ezequias, amargurado, volta o rosto para a parede, suplica, derrama abundantes lágrimas. Deus deixa-se sensibilizar, e muda a sua decisão: «Vai e diz a Ezequias: 'Eis o que diz o Senhor, o Deus de teu pai David: Ouvi a tua oração e vi as tuas lágrimas; vou acrescentar à tua vida mais quinze anos» (v. 5).
    O evangelho revela-nos algo de semelhante. Os fariseus imaginavam um Deus rígido, inflexível, absolutamente cioso da observância da lei do sábado. Mas Deus, em Jesus, revela-se mais interessado no bem-estar do homem, do que na observância da lei sacralizada do repouso sabático. A lei é para ser observada, com certeza. Mas, mais do que o sacrifício, Deus, bom e compassivo, prefere a misericórdia. Só o amor é absolutamente prioritário. E o amor sabe adaptar-se às circunstâncias, torna-nos versáteis e misericordiosos. Uma religião do amor é mais exigente do que uma religi&atil
    de;o que reduz tudo à observância de leis imutáveis e inflexíveis. A observância desse tipo de leis pode dar segurança, paz de consciência, e até oferecer um critério imediato de juízo do que é justo e do que o não é. Como no tempo de Jesus, é uma operação que continua a ter sucesso, também hoje, quando sentimos necessidade de pontos seguros de referência, verificáveis, mas nem sempre estamos dispostos a formar uma consciência iluminada, capaz de discernimento, para aprendermos a acolher cada pessoa na sua inconfundível unicidade.
    Jesus continua a recordar aos fariseus, de ontem e de hoje, que Deus é misericórdia, e que tudo o que é feito em seu nome, ou apresenta os sinais característicos da misericórdia, ou é falso. Por isso, será bom interrogar-nos: Como é a minha religião? Jesus é, de facto, o meu Senhor e Mestre? Não será a minha religião uma construção minha, aparentemente devota, mas pagã? Se nos comportamos como patrões de Deus e da sua graça, se a nossa relação com Ele fica sempre pelo mínimo, pela lei, pelo dever, excluímo-l´O da nossa vida, julgando-nos senhores de nós mesmos e dos outros. Sirva-nos de exemplo o grito de Ezequias. Deus não se deixa vencer em generosidade, a sua misericórdia derrama-se sobre os que n´Ele confiam, e estão dispostos a alargar o coração à medida do seu Coração.

    Oratio

    Senhor, meu Deus, Tu és amor e revelaste-Te para nos ajudar a viver no amor e não numa passiva sujeição. Quão difícil é viver o teu dom! A liberdade do amor assusta-me e, muitas vezes, prefiro refugiar-me nos meandros da lei sem coração. A partir daí, entrincheirado nas minhas seguranças, disparo sentenças mortíferas como balas. Tu, meu Deus, sempre fiel e misericordioso, ensina-me o engano de uma justiça cega e impiedosa. Faz-me semelhante a Ti, de modo que, para os meus irmãos e irmãs, seja sempre sacramento da tua misericórdia infinita. Amen.

    Contemplatio

    «A terceira virtude que é preciso honrar no Sagrado Coração, diz ainda o P. Cláudio de la Colombière, é a sua compaixão muito sensível pelas nossas misérias, o seu amor imenso por nós apesar destas mesmas misérias, e, apesar destes movimentos e impressões, a sua igualdade inalterável causada por uma conformidade tão perfeita à vontade de Deus, que não podia ser perturbada por nenhum acontecimento».
    Não foi na misericórdia do seu Coração que ele nos visitou: Per viscera misericordiae in quibus visitavit nos (Lc 1, 78). Quando Jesus encontra doentes, mortos, o seu Coração não pode resistir às lágrimas daqueles que os rodeiam. Emudecido de piedade, cura-os, dá-lhes a vida: misericordia motus (Lc 7, 13). Vendo a multidão sem provisões para a sua refeição, tem compaixão dela: misereor super turbam (Lc 10, 33).
    «Este Coração está ainda, quanto isso ainda possa ser, nos mesmos sentimentos, observa o P. Cláudio de la Colombière, está sempre ardente de amor pelos homens, sempre aberto para espalhar todas as espécies de graças e de bênçãos, sempre tocado pelos nossos males, sempre pressionado pelo desejo de nos dar a participar nos seus tesouros e a dar-se a si mesmo a nós, sempre disposto a nos receber, e a nos servir de asilo, de morada e de paraíso, desde esta vida». Mantendo-me unido ao Coração de Jesus e meditando nos seus mistérios, participarei cada vez mais nas suas virtudes (Leão Dehon, OSP 3, p. 668s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Prefiro a misericórdia ao sacrifício» (Mt 12, 7).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • XV Semana - Sábado - Tempo Comum - Anos Pares

    XV Semana - Sábado - Tempo Comum - Anos Pares


    16 de Julho, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares
    XV Semana - Sábado

    Lectio

    Primeira leitura: Miqueias 2, 1-5

    1Ai dos que planeiam a iniquidade, dos que maquinam o mal em seus leitos, e o executam logo ao amanhecer do dia, porque têm o poder na sua mão! 2Cobiçam as terras e apoderam-se delas, cobiçam as casas e roubam-nas; fazem violência ao homem e à sua família, ao dono e à sua herança. 3Por isso, assim fala o Senhor: «Tenho planeado um mal contra esta raça, do qual não livrareis o pescoço. Não andareis mais com a cabeça erguida, porque será tempo calamitoso. 4Naquele dia será composta sobre vós uma sátira, e cantar-se-á uma elegia: 'Estamos perdidos completamente, a parte do meu povo passa a outros. Ninguém a restituirá. Roubam e distribuem os nossos campos.' 5Por isso, não terás ninguém que meça com cordel as porções, na assembleia do Senhor.»

    No contexto social e religioso da segunda metade do século VIII a. C., tal como Isaías, o profeta Miqueias denuncia os pecados sociais, cometidos pelos chefes, nomeadamente a casa real, os sacerdotes e os profetas, que acabam por arrastar para os mesmos crimes todo o povo. O profeta não faz uma lista exaustiva desses pecados, mas aponta alguns, que ilustram bem a malícia imperdoável da opressão dos fracos. O justo juízo de Deus é inevitável e não tardará. Infelizmente, as situações denunciadas por Ezequias, continuam actuais no mundo em que vivemos. O profeta usa expressões muito duras contra aqueles que praticam tais actos, ameaçando inclusivamente com o exílio, simbolizado pelo jugo ignominioso anunciado ao seu povo: «Tenho planeado um mal contra esta raça, do qual não livrareis o pescoço». «Nesse dia», o dia concreto que não tardará a tornar-se escatológico, a desgraça converter-se-á em motivo de sátiras e lamentações. Será a completa humilhação. Os grandes e poderosos roubaram terras e haveres aos pobres, e perderão a Terra Prometida, com todos os bens. O castigo será feito da mesma matéria que o pecado do homem. Mas, um pequeno «resto» conservou íntegra a fé. Por causa deles, Deus voltará a ter compaixão do seu povo, dar-lhe-á uma nova fecundidade, que lhe garantirá a subsistência.

    Evangelho: Mateus 12, 14-21

    Naquele tempo, 14os fariseus, saindo dali, reuniram-se em conselho contra Jesus, a fim de o matarem. - 15Quando soube disso, Jesus afastou-se dali. Muitos seguiram-no e Ele curou-os a todos, 16ordenando-lhes que o não dessem a conhecer. 17Assim se cumpriu o que fora anunciado pelo profeta Isaías: 18Aqui está o meu servo, que escolhi, o meu amado, em quem a minha alma se deleita. Derramarei sobre Ele o meu espírito, e Ele anunciará a minha vontade aos povos. 19Não discutirá nem bradará, e ninguém ouvirá nas praças a sua voz. 20Não há-de quebrar a cana fendida, nem apagar a mecha que fumega, até conduzir a minha vontade à vitória. 21E, no seu nome, hão-de esperar os povos!

    Jesus atreveu-se a pôr em causa o absoluto da lei sobre o repouso sabático. Isso só não Lhe custou a vida, porque, ao saber que os seus adversários tinham decidido matá-lo, saiu dali, continuando noutros lugares a sua actividade taumatúrgica e missionária. Os milagres narrados por Mateus, logo depois da cura, ao sábado, do homem que tinha a mão paralisada (Mt 12, 10ss.), provam a autenticidade do amor misericordioso de Deus, que Jesus veio anunciar, e que é o centro e o sentido do seu ministério. Mateus vê realizada em Jesus a profecia de Is 42, 1-4, onde é apresentada a figura do Servo de Javé. Escolhido e enviado por Deus, que o encheu do seu Espírito, o Servo realizará a missão de dar a conhecer a todos os povos a verdadeira relação entre Deus e os homens. O estilo do Servo, manso e humilde, alheio a conflitos e a barulhos, atento a valorizar toda a possibilidade de vida, realiza-se totalmente em Jesus «manso e humilde de coração» (Mt 11, 29), e que pede silêncio sobre as suas obras (cf. Mt 12, 16).
    Mateus, mais uma vez, acentua que, em Jesus se realizam as esperanças judaicas, ajuda a interpretar o evento-Jesus, a compreender-lhe o significado, e apresenta-O como modelo de obediência à palavra do Pai.

    Meditatio

    Os profetas do Antigo Testamento com muita frequência se atiram contra as prepotências dos ricos em relação aos pobres, por sensibilidade social, com certeza, mas, sobretudo, por sensibilidade teológica: as injustiças entre os homens quebram a relação com Deus. O mal que se faz ao homem é mal feito a Deus.
    O império da lei da prepotência, dos que são economicamente mais poderosos, continua tragicamente actual. As tragédias que a ganância de poucos provocam, com indizíveis sofrimentos para muitos, repetem-se diariamente, por toda a face da terra. O dinheiro revela-se uma arma mais letal do que as ogivas nucleares, quando usado unicamente em vista dos interesses de alguns. Quando o dinheiro se torna o objectivo da vida, não admite rivais. Quem se entrega ao dinheiro, não consegue ver mais ninguém senão a si mesmo. É por isso que Jesus disse que, ou se serve a Deus, ou se serve ao dinheiro. Não há compromisso possível.
    Mas, um dos sinais do nosso tempo, é também um crescente movimento contra as injustiças. Como cristãos, não podemos deixar de participar nele, com todos os homens de boa vontade. Mas o nosso verdadeiro modelo é Jesus. Ora o Senhor sabe juntar a força e a mansidão, que não levanta contendas e não grita, que não faz gestos espectaculares, mas também não volta atrás e que, se se afasta dos adversários, é para ajudar quem precisa: «Muitos seguiram-no e Ele curou-os a todos» (v. 15).
    É esta a luta que Jesus leva por diante com mansidão e amor para com todos, sabendo que isso O levará à morte.
    Como cristãos e como dehonianos, devemos ser contrários a toda a forma de luta violenta, mas também agir energicamente com todas as iniciativas não violentas, para afirmar a justiça, o respeito pelos direitos humanos e a caridade no mundo, como sugere o Segundo Sínodo dos Bispos sobre a Justiça no mundo, tendo presente os ensinamentos da História acerca da conquista não violenta da liberdade e da independência política em várias nações, desde a Índia de Gandhi, à Polónia, aos povos do Leste europeu.

    Oratio

    Senhor, livra-me de cometer a injustiça, de aceitá-la contra os outros, mas também de a querer combater por meios violentos. Tu, manso e humilde de coração, ensina-me a não-violência, porque a violência é já injustiça, mãe de outras violências e injustiças piores. Tu, que quiseste ser pobre por meu amor, faz-me compreender que não posso enriquecer de qualquer modo e a qualquer custo, mesmo à custa do respeito e dos direitos dos meus irmãos. Tu, que estás atento a todos, ajuda-me a esquecer-me de mim, e a cu
    idar carinhosamente de todos os irmãos, particularmente dos mais frágeis e carenciados. Amen.

    Contemplatio

    O Coração sacerdotal de Jesus foi particularmente dedicado às classes populares. Era necessário renovar o mundo. Em Roma, a escravatura era como um animal de carga. Dez milhões de cidadãos eram servidos por cem milhões de escravos. Na Palestina, os fariseus eram arrogantes e sem coração. Só um Deus podia dizer aos homens: «Vós sois todos irmãos» (Mt 23). «Amai-vos uns aos outros» (Jo 15). É a missão de Jesus, foi sob este aspecto que os profetas no-lo apresentaram: «Será totalmente penetrado pelo Espírito de Deus, trará a boa nova aos pequenos e aos humildes, remediará todos os infortúnios, pregará o grande jubileu, com o perdão das dívidas e a reabilitação dos pobres» (Is 61).
    Toda a reforma económica e social está em germe nos princípios que coloca: a paternidade divina e a fraternidade de todos os homens. Dá o exemplo da simplicidade e do trabalho. Escolheu a oficina para sua morada, os pastores para os seus primeiros adoradores. É operário e filho de operário. Vede-o em Nazaré com a mesa e os utensílios do carpinteiro. Despreza a riqueza, o luxo e as honras. Reclama para os operários a justiça, o respeito, a afeição fraterna. 1º A justiça. - «O trabalhador tem direito ao seu salário, ao seu pão, ao que exige a sua vida quotidiana: Dignus est operarius mercede sua, cibo suo» (Mt 10; Lc 10). S. Tiago desenvolve este preceito: «Ricos avarentos, exclama, os vossos tesouros atrairão a cólera de Deus sobre vós. Os vossos trabalhadores sofreram nos vossos campos e só lhes destes um salário tardio e insuficiente» (Tg 5). 2º Respeito. - «Bem-aventurados os que são mansos, pacíficos e misericordiosos» (Mt 5). - «Aquele que não tem cuidado com os seus servos é mais desprezível do que um pagão» (1 Tim 5). 3º A afeição fraterna. «Vós sois todos irmãos» (Jo 15). «Não deve haver entre vós distinção entre escravos e homens livres. Non est servus neque liber» (Gal 3). «Amai e praticai a fraternidade» (1 e 2Pd; Tes 4). (Leão Dehon, O Coração sacerdotal de Jesus, 26ª meditação, p. 603s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «N´Ele, hão-de esperar os povos!» (Mt 12, 21).

    | Fernando Fonseca, scj |

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