Week of Jun 5th

  • X Semana - Segunda-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    X Semana - Segunda-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    6 de Junho, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares
    X Semana - Segunda-feira

    Lectio

    Primeira leitura: 1 Reis 17, 1-6

    Naqueles dias, 1Elias, o tisbita, habitante de Guilead, disse a Acab: «Pela vida do Senhor, Deus de Israel, a quem eu sirvo, não cairá orvalho nem chuva nestes anos senão à minha ordem.» 2A palavra do Senhor foi-lhe dirigida nestes termos: 3«Vai-te daqui, dirige-te para Oriente e esconde-te na torrente de Querit, que fica em frente do Jordão. 4Beberás da torrente, e Eu já ordenei aos corvos que te levem lá de comer.» 5Então ele partiu segundo a palavra do Senhor e foi morar junto à margem do Querit, em frente do Jordão. 6Os corvos traziam-lhe pão e carne, de manhã e de tarde, e ele bebia água da torrente.

    Retomamos hoje a leitura do Primeiro Livro dos Reis, iniciada na quarta semana do tempo comum. O reino de David, que atingira a sua máxima grandeza no tempo de Salomão, estava dividido pelo cisma político-religioso de 931 a. C. O reino do Norte, Israel, formado por dez tribos, tinha a capital em Samaria. O reino do Sul, Judá, tinha a capital em Jerusalém. Enquanto no reino do Norte se sucederam dez famílias reinantes, no reino do Sul, manteve-se sempre a dinastia de David.
    O nosso texto situa-nos no Norte, durante o reinado de Acab e Jezabel. O casamento do rei de Israel com essa princesa fenícia tinha sido fatal para a causa javista. Acab mandou construir um templo a Baal em Samaria, promoveu uma política favorável ao baalismo, e uma ofensiva feroz contra o javismo, matando os seus profetas. É então que surge Elias, proveniente de Guilead, na Transjordânia, onde perdurava um javismo vigoroso. Elias significa «Javé é o meu Deus», um nome que resume a sua vida. O profeta foi enviado a Acab (854-853) para denunciar o culto de Baal, deus de Tiro, propiciador da chuva (1 Re 18, 19). Elias, em nome de Javé, anuncia e garante uma seca, que revelará a fraqueza de Baal aos seus devotos, pois não conseguirá fazer que chova em Israel, contra a vontade do profeta. Acab, instigado pela mulher, persegue Elias. Mas Deus protege-o directamente, alimentando-o de modo miraculoso, junto da torrente de Querit, tal como tinha alimentado o povo no deserto.

    Evangelho: Mateus 5, 1-12

    Naquele tempo, 1ao ver a multidão, Jesus subiu a um monte. Depois de se ter sentado, os discípulos aproximaram-se dele. 2Então tomou a palavra e começou a ensiná-los, dizendo: 3«Felizes os pobres em espírito, porque deles é o Reino do Céu. 4Felizes os que choram, porque serão consolados. 5Felizes os mansos, porque possuirão a terra. 6Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados. 7Felizes os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. 8Felizes os puros de coração, porque verão a Deus. 9Felizes os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus. 10Felizes os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o Reino do Céu. 11Felizes sereis, quando vos insultarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o género de calúnias contra vós, por minha causa. 12Exultai e alegrai-vos, porque grande será a vossa recompensa no Céu; pois também assim perseguiram os profetas que vos precederam.»

    Começamos hoje a ler o primeiro dos cinco grandes discursos em que Mateus agrupou os ensinamentos de Jesus. Este primeiro discurso, o «Sermão da Montanha», ou a Magna Carta do Reino, como alguém já lhe chamou, vai prolongar-se pelos capítulos sexto e sétimo. Mateus, além das mais importantes exigências éticas de Jesus aos seus discípulos, narra dez milagres (cc. 8-9). Assim nos apresenta Cristo mestre, cuja palavra divina, não só é autorizada, mas também eficaz.
    Mateus apresenta Cristo como o novo Moisés, aquele que promulga a nova lei, sobre o monte das Bem-aventuranças, de que o Sinai fora antecipação. No discurso das Bem-aventuranças, o evangelista colecciona e sistematiza ensinamentos ministrados por Jesus em diversas ocasiões. Assim seria mais fácil e prático utilizá-los na pregação e no ensino da Igreja.
    A expressão «pobres em espírito», ainda que não se encontre no Antigo Testamento, reflecte um aspecto fundamental do mesmo: a expectativa do Reino por parte dos pequenos e humildes. Estes hão-de possuir a terra (cf. Sl 37, 11) e, portanto, o Reino, que começa já agora. Por isso, é que é «deles é o Reino do Céu» (v. 3).
    A consolação é apresentada como um traço característico de Deus e dom messiânico por excelência (Is 61, 2; cf. Lc 2, 25). O próprio Cristo se considera consolador e, a esse título, anuncia o dom do Espírito Santo (Jo 14, 26; 15, 26; 16, 7).
    O termo justiça indica o recto cumprimento da vontade divina, realizado com entusiasmo e determinação (fome e sede), conota o acesso à salvação, e será a razão de ser da incarnação do Verbo, cujo nome será «Senhor-nossa-Justiça» (Jr 23, 6).
    A expressão «coração puro» é recorrente na Sagrada Escritura e é sinónimo de «coração simples» (cf Sl 24, 3s; 51, 12; 73, 13; Pr 22, 11; Sab 1, 1: Ef 6, 5). O homem de coração puro verá a Deus, não nesta terra, mas nos céus, onde «O veremos tal qual é» (1 Jo 3, 2), «face a face» ( 1 Cor 13, 12).
    «Obreiro da paz» é o próprio Deus (Cl 1, 20), tantas vezes definido como «Deus da paz».
    A perseguição «por causa da justiça» não é outra coisa senão o preço a pagar pela coerência e pelo testemunho evangélico.

    Meditatio

    A primeira leitura apresenta-nos o exemplo de Elias, grande testemunha da santidade de Deus, num momento de decadência, em Israel, por causa da idolatria, que, por influência de Jezabel, e com a conivência de Acaz, ia ganhando terreno. Elias não suporta a situação e anuncia a punição de Deus. O rei não suporta a intervenção do profeta, e procura matá-lo. Mas Deus está com Elias e diz-lhe: «Vai-te daqui» (v. 3). O profeta refugia-se junto da torrente de Querit, onde Deus cuida do seu sustento.
    O Sermão da Montanha revela-nos o coração de Deus, que não só não abandona os seus profetas, mas ama a todos e a todos quer felizes: «Felizes... felizes ... felizes» é o termo mais repetido no evangelho que escutamos hoje. Deus quer a nossa felicidade, e ensina-nos o caminho para lá chegar. Esse caminho não passa pelas ilusões da riqueza, do poder, das alegrias fáceis, que não passam de becos sem saída, que nos afastam d´Ele e, por isso, também da felicidade.
    O caminho que Jesus nos indica para a felicidade é o seu próprio caminho. O mundo proclama as bem-aventuranças do egoísmo: felizes os ricos, os poderosos, os que mandam, os que, a qualquer custo, procuram satisfazer as suas reivindicações, os seus interesses. Jesus assume uma posição paradoxal, unindo termos em clara
    contraposição: «Felizes os pobres, os que choram...». É um convite a não nos determos à superfície das coisas, mas a olhá-las em profundidade, para vermos o que realmente conta, o que desde já nos dá alegria, ainda que em condições de sofrimento e de pobreza. É o caso da mansidão, da humildade, da misericórdia, que são premissas necessárias a um bem maior, como é a união com Cristo. Por isso, é particularmente paradoxal a última bem-aventurança: «Felizes sereis, quando vos insultarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o género de calúnias contra vós, por minha causa... porque grande será a vossa recompensa no Céu» (v. 11-12). Segundo Jesus, na injustiça, sofrida por causa d´Ele, havemos de encontrar a felicidade. E, aqui, encontramos a ligação com a primeira leitura: são felizes «os que têm fome e sede de justiça», isto é, de santidade, e que sofrem perseguições por causa disso. Elias, profeta perseguido e sofredor, já experimentou a felicidade que Jesus, nove séculos mais tarde, viria proclamar, para quantos tivessem de sofrer por sua causa.
    O verdadeiro discípulo, com efeito, alegra-se em participar nos sofrimentos do seu Senhor (1 Pe 4, 13). À imitação de Cristo, prefere a cruz à alegria imediata: «Em vista da alegria que Lhe era oferecida (Cristo) submeteu-Se à cruz» (Heb 12, 2). Considera «perfeita alegria» sofrer toda a espécie de provações (cf. Tg 1, 2). O laborioso ministério do Apóstolo é um exemplo típico de alegria nas tribulações (Cf. 2 Cor 6, 20; 7, 4; Fl 1, 17-18; 2, 17-18).
    A alegria nas provações é, desde já, posse e garantia da alegria do céu (cf. Apoc 18, 20; 19, 1-4.7-9). Então, será a perfeita alegria, desde já saboreada pelos filhos de Deus e suscitada pela comunhão com o Pai e com o Filho, no Espírito Santo (cf. 1 Jo 1, 1-4; 3, 1-2.2-4).
    O cristão e, sobretudo, o oblato-SCJ vive alegre em todas as situações, mesmo quando tiver de sofrer por causa de Cristo e do seu Reino, manifestando a misericórdia, a alegria e a bondade de Deus para com todos os homens, porque o Senhor está perto (cf. Fl 4, 4-5), e o esposo, logo que chegue, há-de introduzi-lo na alegre festa das núpcias (cf. Mt 25, 10), onde a bem-aventurança será eterna.

    Oratio

    Senhor Jesus, que no alto do monte proclamaste as bem-aventuranças, a nova Lei da nova Aliança, ajuda-me a recordá-la e a vivê-la em todas as circunstâncias da minha vida, para dar ao mundo aquele testemunho profético que me confias como cristão e como consagrado.
    A tua santidade é misericórdia e não dureza. Tu declaras felizes os que, à imitação do Pai, são misericordiosos. Que, a cada dureza e a cada injustiça, eu saiba sempre opor, com a ajuda da tua graça, a misericórdia. Foi assim que, Tu mesmo, reagiste às injustiças e aos sofrimentos a que foste submetido.
    Uma vez que me ensinaste os mais altos cumes das virtudes, infunde em mim o teu Espírito Santo, que venha em auxílio da minha fragilidade, para que possa alcançá-los e receber o prémio que me reservas. Amen.

    Contemplatio

    Feliz o justo que sofre pela justiça! É semelhante ao divino Mestre, que foi o Cordeiro imolado desde o começo, a vítima da salvação, da reparação, da redenção.
    Nosso Senhor predisse esta nossa semelhança com Ele: «O discípulo não está acima do Mestre, disse-nos. Como o mundo me persegue, perseguir-vos-á. Sereis como cordeiros entre os lobos. Arrastar-vos-ão diante dos tribunais. Encontrareis contradições até nas vossas famílias. Muitos vos odiarão por causa de Mim. Mas não sereis felizes por vos parecerdes com o vosso Mestre?» (Mt 10) ... Os discípulos não estão acima do mestre. Os apóstolos também foram perseguidos, porque anunciavam Cristo e pregavam a redenção, foram presos e flagelados; e voltando do tribunal, alegravam-se por terem tido a graça de sofrerem por Jesus Cristo (At 5, 4). Tiveram todos a heróica coragem de enfrentarem a morte pelo Salvador, e se S. João não morreu no seu suplício, foi por um milagre que não lhe tira o mérito do martírio.
    S. Paulo via com alegria a coragem dos seus discípulos na perseguição. Escrevia aos Tessalonicenses: «Gloriamo-nos em vós, nas Igrejas de Deus, por causa da vossa paciência e da vossa fidelidade, no meio das perseguições e das tribulações que tendes de suportar. É o sinal dos desígnios de Deus, o qual vos quer tornar dignos do seu Reino. É por isso que vós sofreis. Mas a seu tempo a todos nos tocará, quando Nosso Senhor descer do céu e aparecer com os anjos, ministros do seu poder» (2Tes 1, 4-7). (Leão Dehon, OSP4, p. 60s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra
    «Felizes sereis, quando vos insultarem e perseguirem por minha causa (cf. Mt 5, 11).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • X Semana - Terça-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    X Semana - Terça-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    7 de Junho, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares
    X Semana - Terça-feira

    Lectio

    Primeira leitura: 1 Reis 17, 7-17

    Naqueles dias, 7a torrente secou, pois não chovia sobre a terra. 8Então o Senhor disse-lhe: 9«Levanta-te, vai para Sarepta de Sídon e fica lá, pois ordenei a uma mulher viúva de lá que te alimente.» 10Ele levantou-se e foi para Sarepta; ao chegar à entrada da cidade, eis que havia lá uma mulher viúva que andava a apanhar lenha; chamou-a e disse-lhe: «Vai-me arranjar, te peço, um pouco de água numa vasilha, para eu beber.» 11Ela foi buscar a água e Elias chamou-a e disse-lhe: «Traz-me também um pedaço de pão nas tuas mãos.» 12Então ela respondeu: «Pela vida do Senhor, teu Deus, não tenho pão cozido; tenho apenas um punhado de farinha na panela e um pouco de azeite na ânfora; mal tenha reunido um pouco de lenha entrarei em casa para preparar esse resto para mim e para meu filho; vamos comê-lo e depois morreremos.» 13Elias disse-lhe: «Não tenhas medo; vai a casa e faz como disseste. Disso que tens faz-me um pãozinho e traz-mo; depois é que prepararás o resto para ti e para o teu filho. 14Porque assim fala o Senhor, Deus de Israel:'A panela da farinha não se esgotará, nem faltará o azeite na almotolia até ao dia em que o Senhor mandar chuva sobre a face da terra.'» 15Ela foi e fez como lhe dissera Elias: comeu ele, ela e a sua família, durante alguns dias. 16Nem a farinha se acabou na panela, nem o azeite faltou na almotolia, conforme dissera o Senhor pela boca de Elias.

    Na Palestina, a chuva e as boas colheitas estão em proporção directa (cf. Dt 11, 10-15). Jezabel tinha introduzido em Israel o culto de Baal, deus da chuva. E queria impô-lo a todos. Mas teve que haver-se com a oposição frontal de Elias. A multiplicação milagrosa da farinha e do azeite mostra que o verdadeiro Deus da fertilidade e das boas colheitas é Javé, e não Baal, incapaz de mandar chuva para interromper a seca proclamada por Elias. Ao fazer o milagre, em nome de Javé, Elias mostra que a poderosa rainha Jezabel, e todos os baalistas, não têm razão. Quem a tem é a pobre e indefesa viúva de Sarepta, que confia em Javé. O facto de ser uma estrangeira abre uma perspectiva universalista da salvação, que será completa no Novo Testamento. A viúva de Sarepta é tipo dos pagãos convidados para a mesa do Reino. Este episódio compreende-se plenamente à luz da citação que Cristo faz dele na sinagoga de Nazaré (Lc 4, 24-26): o profeta, que os seus recusam a escutar, é ouvido e acreditado entre os pagãos. Podemos também comparar a viúva de Sarepta com aquela de que nos fala o Evangelho (Mc 12, 41-44; Lc 21, 1-4), para sublinharmos a generosidade de ambas. Esta viúva, generosa com Elias, também se contrapõe a Jezabel e à sua avidez insaciável (cf. 1 Rs 21, 1ss.). O milagre de Sarepta, à semelhança do da torrente de Quarit (1 Rs 17, 1-6), manifesta a solicitude e a providência de Deus em favor dos profetas.

    Evangelho: Mateus 5, 13-16

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 13«Vós sois o sal da terra. Ora, se o sal se corromper, com que se há-de salgar? Não serve para mais nada, senão para ser lançado fora e ser pisado pelos homens. 14Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade situada sobre um monte; 15nem se acende a candeia para a colocar debaixo do alqueire, mas sim em cima do candelabro, e assim alumia a todos os que estão em casa. 16Assim brilhe a vossa luz diante dos homens, de modo que, vendo as vossas boas obras, glorifiquem o vosso Pai, que está no Céu.»

    Quem vive a nova lei das Bem-aventuranças, proclamada por Jesus Cristo, o novo Moisés, torna-se sal e luz do mundo. Os dois provérbios parabólicos, do sal e da luz, definem a vida e missão dos discípulos, em contraste com a dos fariseus e pagãos: «Vós sois o sal da terra ... Vós sois a luz do mundo». O sal dá sabor aos alimentos, e ainda é usado para evitar a sua corrupção. O sal também era usado na confecção dos sacrifícios (Lv 2, 13) e, portanto, assumia um papel «consacratório» e, se perdesse a capacidade de salgar, era «pisado pelos homens», num gesto dessacralizante. O sal, finalmente, também lembra a sabedoria (Mc 9, 50): devemos condimentar com ele o nosso falar (Cl 4, 6).
    Os discípulos são «luz do mundo», tal como Cristo, que é a fonte da luz (Jo 8, 12). Não se acende uma luz «para a colocar debaixo do alqueire» (cf. Mc 4, 21), caso contrário, apaga-se, como acontece quando se coloca o apagador sobre uma vela.
    «Sal da terra... luz do mundo: a missão dos discípulos tem um horizonte cósmico, planetário.

    Meditatio

    Jesus proclama os seus discípulos sal da terra e luz do mundo. Cada um o deve ser conforme os seus carismas, conforme a sua vocação. Por isso, há muitos modos de ser sal da terra e luz do mundo. Elias, de que nos fala a primeira leitura, é sal da terra com o seu zelo pela verdadeira fé. Mas também a viúva pobre é luz do mundo, pela sua fé, esperança e caridade. Apenas tinha «um punhado de farinha na panela e um pouco de azeite na ânfora», para ela e para o filho. Mais um pouco de tempo, e morreriam ambos de fome. E o homem de Deus, o profeta, em vez de vir trazer alguma coisa, pedia-lhe um pouco de água e um pedaço de pão. Parecia legítimo negar-lhe o pedido. Mas a mulher «foi e fez como lhe dissera Elias» (v. 15). Acreditou na promessa do profeta: «a panela da farinha não se esgotará, nem faltará o azeite na almotolia» (v. 14). Deu e, por isso, recebeu. Não será rica; mas também não lhe faltará o necessário.
    O homem «foi criado para fazer boas obras» (Ef 2, 10), irradiando a luz que Cristo derrama sobre ele (cf. Ef 5, 14). O Senhor, que é a luz que ilumina, transforma-nos em luz iluminada, em luz que se reflecte sobre nós, no dizer de S. Gregório Magno. A comunidade dos «iluminados» (Heb 6, 4; 10, 13) torna-se aquele candelabro de ouro, imagem da Igreja, onde Cristo establece a sua morada (Ap 1, 13). Na tradição hebraica, o candelabro de sete braços simboliza a totalidade do tempo - a primeira semana genesíaca - e a totalidade da pessoa, sintetisada nos sentidos superiores, com as suas sete aberturas: dois olhos, dois ouvidos, duas narinas e a boca. Será útil pensar: em que medida irradiam luz os meus sentidos, através dos quais interajo com a humanidade?
    A generosidade, a que somos chamados, é resposta à generosidade d´Aquele «que, sendo rico, Se fez pobre por vós, para (nos) enriquecer pela sua pobreza» (2 Cor 8,9). É permitir a Cristo continuar a viver e a realizar em nós a sua generosidade. Por isso, é um verdadeiro dom, uma «graça» ("karis"), tal como a pobreza de Cristo (2 Cor 8, 9). Com essas palavras, o Apóstolo pretende estimular os cristãos de Corinto, para que dêem, com generosidade, aos pobres da Igreja de Jerusalém:
    «Distingui-vos... nesta acção generosa» (2 Cor 8, 7). Esta «graça de Deus», já foi concedida às Igrejas da Macedónia (2 Cor 8, 1), as quais, apesar das tribulações e da «sua extrema pobreza», deram com «grande alegria... para além das suas posses, espontaneamente, pedindo-nos insistentemente a graça de tomarem parte neste serviço, a favor dos santos» (2 Cor 8, 2-4).
    Um ensinamento importante para todos os cristãos, particularmente para aqueles que fazem voto de pobreza.

    Oratio

    Senhor, que eu não encontre desculpa para não dar com genrosidade. Infunde no meu coração o teu Espírito Santo para saiba gastar o meu tempo, o que tenho e o que sou, em favor dos irmãos, particularmente dos mais fracos e carenciados. Que não olhe demasiadamente para os meus limites, e tenha sempre esperança. Dá-me a graça de dar o pouco que tenho, para que se possa prolongar em mim a tua generosidade. Assim serei realmente feliz, porque Tu mesmo disseste que há maior alegria em dar do que em receber. Amen.

    Contemplatio

    «Vós sois o sal da terra ... Vós sois a luz do mundo. Estas comparações aplicam-se em primeiro lugar e particularmente aos pastores das almas, mas também, de uma certa maneira, a todos os discípulos de Jesus Cristo, mesmo aos simples fiéis. Não têm todos alguns deveres de apostolado uns a respeito dos outros?
    Todos devem edificar o seu próximo pelo bom exemplo, pelas exortações, pelos bons avisos e por todos os meios que pode sugerir um zelo sábio e prudente.
    Este dever é mais complexo para aqueles que têm alguma autoridade familiar, patronal ou administrativa. Mas como é mais urgente o dever do apostolado para o padre! O apostolado é a sua missão, deve despender nele a sua inteligência, o seu coração, toda a sua actividade. «Despender-me-ei, diz S. Paulo, e despenderei tudo o que puder pela salvação das almas. O apóstolo não pode deixar de trabalhar pela salvação das almas sem se perder a si mesmo.
    – Todos os cristãos devem ser a luz do mundo pelas suas virtudes. O padre deve sê-lo particularmente. Tem como missão edificar e evangelizar.
    Uma lâmpada não é feita para estar escondida debaixo alqueire, mas para ser vista, para luzir e para iluminar.
    – Se uma lâmpada vem a extinguir-se, tudo recai na obscuridade; o apóstolo deve ser também uma lâmpada ardente, uma lareira de calor. Este calor é o zelo, é o amor de Deus e das almas. O apóstolo vai buscar facilmente este calor ao Coração de Jesus, que é uma fornalha ardente de caridade. O apóstolo fervoroso arde de amor por Deus e testemunha-lhe este amor por todos os actos da vida interior, pelos actos de amor e de reparação sobretudo, e aí será facilmente levado se contemplar o Coração de Jesus, o Coração amante e sofredor do Salvador, que nos pede o amor recíproco, a consolação e a reparação. Arde também de amor pelo próximo e alimentá-lo-á aproximando-se da mesma lareira, o Coração vítima do Redentor (Leão Dehon, OSP4, pp. 48-50, passim).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Vós sois o sal da terra;vós sois a luz do mundo» (cf. Mt 5, 13-14).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • X Semana - Quinta-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    X Semana - Quinta-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    9 de Junho, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares
    X Semana - Quinta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: 1 Reis 18, 41-46

    Naqueles dias, 41o profeta Elias disse a Acab: «Vai, come e bebe, pois já oiço o rumor de uma forte chuvada!» 42Acab foi comer e beber; Elias subiu ao cimo do monte Carmelo, prostrou-se por terra, colocando a cabeça entre os joelhos; 43e disse ao seu servo: «Sobe e observa para os lados do mar.» Ele subiu e observou, dizendo: «Não vejo nada!» Por sete vezes Elias lhe repetiu: «Volta e torna a observar.» 44À sétima vez, o servo respondeu: «Eis que sobe do mar uma pequena nuvem como a palma da mão!» Disse-lhe então Elias: «Vai dizer a Acab que prepare o seu carro e desça quanto antes, para que a chuva não o detenha aqui.» 45Nesse momento, cobriu-se o céu de nuvens negras, o vento soprou e a chuva começou a cair torrencialmente. Acab subiu para o seu carro e partiu para Jezrael. 46A mão do Senhor esteve sobre Elias que, de rins cingidos, ultrapassou Acab e chegou a Jezrael.

    O profeta Elias anuncia a Acab o fim da seca, e o fim do jejum ordenado para obter a chuva: «Vai, come e bebe, pois já oiço o rumor de uma forte chuvada» (v. 41). O alimento pode também simbolizar a reconciliação entre Acab, Elias e Javé, depois da triunfal vitória do javismo sobre o baalismo. Em seguida, Elias sobe ao Carmelo e entra provavelmente na gruta onde costumava recolher-se em oração. A posição, que assume, prostrando-se e colocando a cabeça entre os joelhos, indica profunda concentração, mas também o despertar de energias interiores capazes de influenciar os próprios elementos naturais, como atestam antigas tradições egípcias e mesopotâmicas. Tiago faz essa releitura, quando recorda o episódio e escreve: «A oração fervorosa do justo tem muito poder (em grego: energuménê). Elias...rezou com fervor para que não chovesse, e durante três anos e seis meses não choveu sobre a terra. Depois voltou a rezar, e o céu deu chuva, e a terra produziu o seu fruto» (Tg 5, 16-18). A formação progressiva das nuvens e a chuva, depois de sete súplicas insistentes, muito ao estilo semita, ajusta-se à topografia e à meteorologia da Palestina. Do alto do Carmelo, consegue ver-se o horizonte longínquo do Mar Mediterrâneo, único manancial de nuvens e de chuva sobre a franja sírio-palestiniana.

    Evangelho: Mateus 5, 20-26

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 20Se a vossa justiça não superar a dos doutores da Lei e dos fariseus, não entrareis no Reino do Céu.» 21«Ouvistes o que foi dito aos antigos: Não matarás. Aquele que matar terá de responder em juízo. 22Eu, porém, digo-vos: Quem se irritar contra o seu irmão será réu perante o tribunal; quem lhe chamar 'imbecil' será réu diante do Conselho; e quem lhe chamar 'louco' será réu da Geena do fogo. 23Se fores, portanto, apresentar uma oferta sobre o altar e ali te recordares de que o teu irmão tem alguma coisa contra ti, 24deixa lá a tua oferta diante do altar, e vai primeiro reconciliar-te com o teu irmão; depois, volta para apresentar a tua oferta. 25Com o teu adversário mostra-te conciliador, enquanto caminhardes juntos, para não acontecer que ele te entregue ao juiz e este à guarda e te mandem para a prisão. 26Em verdade te digo: Não sairás de lá até que pagues o último centavo.»

    Jesus afirmou aos seus discípulos que não vinha ab-rogar a Lei, mas aperfeiçoá-la. Como vontade de Deus, devia ser aceite na sua totalidade sem a reduzir a árdua casuística, como faziam os doutores e os fariseus, tergiversando e defraudando a própria Lei. Formulado o princípio, Jesus deu seis exemplos concretos, começando sempre por «Ouvistes o que foi dito aos antigos ... Eu, porém, digo-vos». A frase alude a alguma prescrição do Antigo Testamento, preparando o leitor para a nova interpretação.
    A primeira antítese refere-se ao quinto mandamento (Ex 20, 13; Dt 5, 17). Jesus compara o homicídio intencional ao material. O homicídio intencional pode conhecer diversas modalidades: a ira, o desprezo (chamar rhaká, isto é, imbecil) são ofensas para as quais está previsto o «juízo» do tribunal local, a sentença do sinédrio (o supremo tribunal sedeado em Jerusalém) e, finalmente, o fogo da Geena, a proverbial depressão a sudoeste da Cidade santa considerada, a partir do Novo Testamento, lugar de maldição.
    Quando alguém se deixa dominar pela ira e pelo desprezo dos outros, não está em condições para oferecer sacrifícios de acção de graças ou de expiação. Se, por qualquer razão tiverem sido iniciados nessas condições, apesar da sacralidade do culto, devem ser interrompidos para recompor a ordem social. Jesus equipara uma situação de índole moral simplesmente interior, a uma grave impureza legal, que implicava a suspensão do rito, segundo o ensinamento profético: «Quero misericórdia, e não sacrifício» (cf. Mt 9, 13; 12, 7). E nem vale a pena presumir o perdão de Deus, se não perdoarmos aos irmãos (cf. Mt 6, 12). Caso nos atrevamos a apresentar-nos diante do Senhor, a pedir misericórdia, sem antes a termos usados com os outros, teremos de pagar até ao último «cêntimo».

    Meditatio

    Elias anuncia a Acab o fim da seca, que tinha anunciado como castigo da impiedade geral, e o fim do jejum, que o rei tinha ordenado, para obter a clemência divina. Deste modo, o profeta demonstra que é Deus que actua em Acab, e em Israel, no castigo e no perdão. O castigo de Deus tem sempre uma finalidade pedagógica: levar o pecador a reconhecer os seus erros e a regressar a Deus, à vivência da Aliança, a dar-Lhe o lugar que Lhe é devido. E assim, voltará a experimentar a fidelidade e a misericórdia divinas.
    O evangelho leva-nos a reflectir sobre o mandamento do amor a Deus e ao próximo, que são um só amor. Os fariseus quase que só se preocupavam com o amor a Deus, negando uma justa relação com o próximo. Jesus, pelo contrário, considerava o amor fraterno uma exigência rigorosa. Por isso, diz aos discípulos: «Se a vossa justiça não superar a dos doutores da Lei e dos fariseus, não entrareis no Reino do Céu» (v. 20). Chegou mesmo a colocar o amor ao próximo acima das ofertas a Deus: «Se fores, portanto, apresentar uma oferta sobre o altar e ali te recordares de que o teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa lá a tua oferta diante do altar, e vai primeiro reconciliar-te com o teu irmão; depois, volta para apresentar a tua oferta» (v. 23-24). O dom mais agradável a Deus é exactamente a caridade fraterna. Se ela faltar, tudo o resto fica sem valor. Uma explicação simples para isto, pode ser a seguinte: como Jesus vive em nós, pede-nos uma caridade perfeita, que não sufoque a sua vida em nós, com preconceitos, atitudes, palavras agressivas e maldosas.
    A nossa oferta sobre
    o altar significa a nossa vida posta à sua disposição. É-lhe agradável se lhe permitir viver em nós a sua vida. Caso contrário, pode dizer-nos: «A tua oferta não é sinal de amorosa disponibilidade para com o teu irmão; por isso, vai primeiro reconciliar-te com ele; depois, vem fazer a tua oferta».
    Não podemos separar o amor de Deus do amor aos irmãos, porque Jesus está na charneira dos dois amores: Ele ama os irmãos porque ama o Pai, e ama o Pai amando os irmãos.
    A nossa capacidade de amar o Pai e de amar os irmãos, não vem de nós, mas de «mais além do que nós mesmos» (A. Carminatti). Vem de Deus caridade: «Caríssimos - escreve S. João - amemo-nos uns aos outros, porque o amor vem de Deus... Nisto consiste o amor: não fomos nós a amar a Deus por primeiro, mas foi Ele que nos amou...» (1 Jo 4, 7.10). Por isso, «enviou o Seu Filho como vítima de expiação pelos nossos pecados» (1 Jo 4, 10) e «nos deu o Espírito» (1 Jo 4, 13), o Espírito de amor. É o Espírito de amor que nos leva a amar a Deus, mas também aos irmãos. Por isso, o amor aos irmãos é possível, mesmo em situações muito difíceis. A única condição é permanecermos no amor de Jesus Cristo: «Dou-vos um mandamento novo: que vos ameis uns aos outros; como Eu vos amei, assim também deveis amar-vos uns aos outros» (Jo 13, 34). «Permanecei em Mim e Eu permanecerei em vós... Permanecei no Meu amor» (Jo 15, 4.9; cf. Jo 17, 21.23).

    Oratio

    Senhor, Tu ensinas-me a apresentar-me diante de Ti, livre de qualquer rancor, e sem culpa por ter omitido ajuda aos irmãos, que estão em situações difíceis. Mas, - quantas vezes! -, realizo o meu «serviço sacerdotal», apresentando-te sacrifícios espirituais sobre o altar de um coração não reconciliado. Esqueço que afastas o olhar daqueles que estão separados dos irmãos. Por isso, ainda antes de me levantar para ir ao encontro dos irmãos, hei-de pôr-me em estado de benevolência e começarei a «falhar-lhes ao coração» (Jz 19, 3) para lhes oferecer estima, reconciliação e paz.
    Envia sobre mim o teu Espírito Santo, que ilumine as minhas relações com os outros, para que, se for necessário, as reformule à luz dos teus ensinamentos. Amen.

    Contemplatio

    Nada de injúrias, diz Nosso Senhor; aquele que profere injúrias contra o seu irmão deve reparar a sua falta (Mt 5, 22). Nada de julgamentos injustos, inspirados pela inveja, pela indiscrição, pela ligeireza, pelo amor-próprio. «Não julgueis e não sereis julgados; não condeneis e não sereis condenados» (Lc 6, 37).
    S. Pedro, conformando-se ao espírito de Nosso Senhor, diz-nos: «Não deis mal por mal, nem maldição por maldição; mas, ao contrário, abençoai os vossos irmãos (porque foi para isso que fostes chamados), para possuirdes vós mesmos a bênção como herança. - Se alguém quer ser abençoado nesta vida e ver dias felizes, que guarde a sua língua do mal e que os seus lábios se abstenham da mentira, que se desvie do mal e que faça o bem; que procure e que persiga a paz; porque o olhar do Senhor se detém sobre os justos e os seus ouvidos escutam as suas orações» (1Pd 3, 9).
    «Não cedais ao demónio, diz S. Paulo: que todo o azedume, toda a cólera, toda a irritação, toda a querela, toda a maledicência e toda a malícia seja banida do vosso meio. Sede bons uns para com os outros, sede misericordiosos, perdoando-vos mutuamente, como Deus vos perdoou em Cristo» (Ef 4, 27).
    «Como se faz, diz ainda S. Paulo, que se veja entre vós erguerem-se diferendos que são levados diante dos tribunais seculares? Porque os santos julgarão um dia o mundo, poderão muito bem julgar os vossos pequenos diferendos. Os membros mais humildes da Igreja deveriam bastar para isso, mas em caso de necessidade tomai de entre vós um homem sábio para julgar os vossos processos, e mesmo para maior perfeição, sofrei que procedam para convosco injustamente» (1Cor 6, 1) (Leão Dehon, OSP4, p.66s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Vai primeiro reconciliar-te com o teu irmão » (Mt 5, 24).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • X Semana - Sexta-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    X Semana - Sexta-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    10 de Junho, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares
    X Semana - Sexta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: 1 Reis 19.9ª.11-16

    Naqueles dias, 9o profeta Elias chegou ao monte Horeb, Elias passou a noite numa caverna, onde lhe foi dirigida a palavra do Senhor: «Que fazes aí, Elias?» 11O Senhor disse-lhe então: «Sai e mantém-te neste monte, na presença do Senhor; eis que o Senhor vai passar.» Nesse momento, passou diante do Senhor um vento impetuoso e violento, que fendia as montanhas e quebrava os rochedos diante do Senhor; mas o Senhor não se encontrava no vento. Depois do vento, tremeu a terra. 12Passou o tremor de terra e ateou-se um fogo; mas nem no fogo se encontrava o Senhor. Depois do fogo, ouviu-se o murmúrio de uma brisa suave. 13Ao ouvi-lo, Elias cobriu o rosto com um manto, saiu e pôs-se à entrada da caverna. Disse-lhe, então, uma voz: «Que fazes aqui, Elias?» 14Ele respondeu: «Ardo em zelo pelo Senhor, Deus do universo, porque os filhos de Israel abandonaram a tua aliança, derrubaram os teus altares e mataram os teus profetas. Só eu escapei; mas agora também me querem matar a mim.» 15O Senhor disse-lhe: «Vai e volta pelo caminho do deserto, em direcção a Damasco e, chegando lá, hás-de ungir Hazael como rei da Síria. 16Jeú, filho de Nimechi, como rei de Israel, e Eliseu, filho de Chafat, de Abel-Meolá, como profeta em teu lugar.

    Acab e Jezabel tinham sido testemunhas dos prodígios realizados por Elias. Mas, enquanto Acab se converteu ao javismo, Jezabel ameaçava de morte o profeta. A corrida de Acab no seu carro, e de Elias nas asas do espírito, até Jezrael, o bastião mais forte do baalismo, e donde partira a campanha anti-javista, talvez tivesse a ver com uma tentativa de conquistar a rainha para a causa do javismo. Mas Jezabel não cedeu e o profeta teve de fugir para o Sul, refugiando-se no deserto de Judá. E, completamente esgotado, pediu a Deus a morte. Mas o Senhor faz-lhe encontrar, por duas vezes, pães cozidos sob a cinza e uma bilha de água, convidando-o a comer e a prosseguir viagem. Assim, chegou ao Horeb, isto é, ao Sinai, lugar tradicional das revelações divinas. E entrou na gruta para passar a noite.
    Aí, Elias manifesta-se angustiado por causa da perversão do seu povo. Só ele ficara a defender a religião dos pais. Mas Deus confirma-lhe a vocação, numa teofania bem diferente das clássicas. Não há trovões nem tremores de terra, mas apenas «o murmúrio de uma brisa suave» (v. 12), «o murmúrio do silêncio», numa tradução mais próxima do hebraico. Elias é reconduzido à sua interioridade, para encontrar, na gruta do coração, o Senhor que lhe dará força para prosseguir a caminhada. O profeta retoma a missão e repara que, afinal, não está só, pois o esperam «sete mil homens», que não dobraram o joelho diante de Baal (v. 18). E o Senhor indica-lhe algumas importantes tarefas a realizar (vv. 15-16).

    Evangelho: Mateus 5, 27-32

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 27«Ouvistes o que foi dito: Não cometerás adultério. 28Eu, porém, digo-vos que todo aquele que olhar para uma mulher, desejando-a, já cometeu adultério com ela no seu coração. 29Portanto, se a tua vista direita for para ti origem de pecado, arranca-a e lança-a fora, pois é melhor perder-se um dos teus órgãos do que todo o teu corpo ser lançado à Geena. 30E se a tua mão direita for para ti origem de pecado, corta-a e lança-a fora, porque é melhor perder-se um só dos teus membros do que todo o teu corpo ser lançado à Geena.»
    31«Também foi dito: Aquele que se divorciar da sua mulher, dê-lhe documento de divórcio. 32Eu, porém, digo-vos: Aquele que se divorciar da sua mulher - excepto em caso de união ilegal - expõe-na a adultério, e quem casar com a divorciada comete adultério.»

    Mateus apresenta-nos hoje mais uma antítese usada por Jesus, neste caso, visando o adultério. Mais uma vez, o Senhor acaba com a distinção, própria dos fariseus, entre a intenção e a acção, e declara o princípio da unidade: adultérios do coração, dos olhos, das mãos, são igualmente proibidos. São mencionados os olhos e as mãos pela participação que têm nos desejos do coração. Relativamente à certidão de repúdio, Jesus admite uma única excepção: o caso de união ilegal. Será só uma excepção, ou deverá entender-se que o divórcio, neste caso, não só é permitido, mas exigido pela lei judaica? Ainda não há uma resposta satisfatória. Mas notemos a posição de Cristo em defesa das categorias mais fracas e no restabelecimento da ordem social. Jesus tomará esta mesma atitude quando se referir às crianças (Mt 18, 1-10).

    Meditatio

    Deus não se revela no vento impetuoso e violento, nem no terramoto, nem no fogo, mas no «murmúrio de uma brisa suave» (v. 12). Esta revelação «suave» contrasta com as anteriores intervenções de Elias, e com a sua história. Deus quer consolar o seu profeta, que aparentemente lutou em vão, e agora está desalentado, no limite das suas forças, e já não entende o modo de agir do Deus dos exércitos: «Ardo em zelo pelo Senhor, Deus do universo ... Só eu escapei; mas agora também me querem matar a mim» (v. 14). Deus não lhe dá explicações, mas recoloca-o na sua missão: «Vai... hás-de ungir ... Jeú como rei de Israel, e Eliseu como profeta» (cf. vv. 15-16). A presença misteriosa de Deus repôs força e paz no coração de Elias. Quantas vezes experimentamos algo de semelhante, depois de uma intensa e esgotante actividade apostólica, de que não vemos os frutos esperados, ou depois de uma absorvente e pesada obra em favor dos irmãos, que nos traz incompreensões, calúnias e más vontades. Mas, também para nós, o Senhor está presente, para nos confortar e reconfirmar na missão.
    O evangelho diz-nos que a luta espiritual não admite compromissos. Não podemos pretender a alegria espiritual e os prazeres da vida, a alegria espiritual e a possibilidade de satisfazer as nossas tendências naturais. As palavras de Jesus não nos dão hipótese para escapar. O preço da felicidade é amputar, eliminar o que, em nós, é ocasião de mal, de pecado. Não é que Deus nos queira fisicamente deficientes. Mas exige a «circuncisão do coração» (Jr 4, 4), isto é, a quebra da esclerose do coração - «foi por causa da dureza dos vossos corações» (Mt 19, 8), que desfaz o vínculo sagrado do amor.
    Sendo assim, impõe-se, a cada um de nós, uma verdadeira ecografia do coração, à luz do implacável diagnóstico proposto por Cristo: «É do interior do coração dos homens que saem os maus pensamentos, as prostituições, roubos, ass
    assínios, adultérios, ambições, perversidade, má fé, devassidão, inveja, maledicência, orgulho, desvarios.» (Mc 7, 21-22).
    A história de Elias, bem como o evangelho, mostram-nos que, para o reconhecimento de Deus, e do seu lugar nas sociedades, bem como para a verdadeira libertação do homem, não adianta mudar as estruturas sócio-políticas, se não se mudar o coração do homem; pelo contrário, quando mais as estruturas forem perfeitas, melhor servem ao homem poderoso, para satisfazer os seus interesses, os seus objectivos egoístas.
    Só a presença suave, mas transformadora, do Espírito no coração dos homens é capaz de nos configurar à oblação d´Aquele que, por amor, Se entregou totalmente ao Pai e aos homens. Só a presença suave, mas transformadora, do Espírito nos nossos corações, nos torna atentos aos apelos de Deus e dos irmãos, nos acontecimentos pequenos e grandes, nas expectativas e realizações humanas (cf. Cst 35).

    Oratio

    Senhor, ainda que a minha consciência não me acuse de adultério do corpo, reconheço-me adúltero do olhar, da imaginação, do sentimento, do pensamento. E mesmo que de nada disso me acuse o coração, não posso considerar-me imune do adultério espiritual, que cometo todas as vezes que não Te coloco em primeiro lugar, na hierarquia dos meus afectos, dos meus interesses, do meu desejo de amor.
    Confesso diante de Ti, Senhor, que, enquanto cuido da integridade do corpo, estando atento para que nenhum dos membros sofra, não cuido igualmente da integridade do espírito, mas o abandono às paixões e aos instintos.
    Purifica, Senhor o meu coração, e todo o meu interior, para que, de modo nenhum caia em adultério, mas sempre Te glorifique nos pensamentos, nas palavras e nas obras. Amen.

    Contemplatio

    Nosso Senhor restabeleceu em toda a sua integridade a regra da castidade: «Sabeis, diz, o que foi dito aos antigos: Não cometereis adultério». - Eu, porém, digo-vos: Quem olhar para uma mulher com concupiscência já cometeu adultério no seu coração (Mt 5, 27).
    Nosso Senhor não admite nenhuma desculpa nem nenhum acomodamento. A lei é formal e inflexível. Desde que estejamos envolvidos numa ocasião próxima de pecado, o sacrifício impõe-se, por grande que seja. O nosso olho direito, a nossa mão direita, isto é, o que temos de mais caro e de mais precioso deve ser imolado sem demora, senão é o inferno.
    Não sabeis que os vossos corpos são membros de Cristo, diz S. Paulo. Irei então tomar os membros de Cristo para fazer deles os membros de uma prostituta? Que Deus não permita!... Aquele que permanece unido ao Senhor é um mesmo espírito com Ele. Fugi da fornicação ... O vosso corpo é o templo do Espírito Santo, que reside em vós e que recebestes de Deus; e já não sois de vós mesmos, porque fostes comprados por um grande preço. Glorificai a Deus e levai-o no vosso corpo (1Cor 6,15). (Leão Dehon, OSP4, p. 75s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Vai e volta pelo caminho do deserto» (1 Rs 19, 15).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • X Semana - Sábado - Tempo Comum - Anos Pares

    X Semana - Sábado - Tempo Comum - Anos Pares


    11 de Junho, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares
    X Semana - Sábado

    Lectio

    Primeira leitura: 1 Reis 19, 19-21

    Naqueles dias, 19o profeta Elias partiu dali e encontrou Eliseu, filho de Chafat, que andava a lavrar com doze juntas de bois diante dele; ele próprio conduzia a duodécima junta. Elias aproximou-se e lançou o seu manto sobre ele. 20Eliseu deixou logo os seus bois, correu atrás de Elias e disse-lhe: «Deixa-me ir beijar meu pai e minha mãe, que depois te seguirei.» Elias disse: «Vai, mas volta, pois sabes o que te fiz.» 21Eliseu, deixando Elias, tomou uma junta de bois e imolou-os. Com a lenha do arado cozeu as carnes, dando-as depois a comer à sua gente. Em seguida, pôs-se a caminho e seguiu Elias para o servir.

    Eliseu é chamado a ser profeta, quando se encontra a trabalhar no campo. Deus chama profetas de todas as origens e condições sociais. A sua vocação é sancionada por um gesto exterior, que funciona como uma espécie de sinal sacramental. Assim foi também com Eliseu, quando Elias lançou sobre ele o seu manto. E assim começa o chamado Ciclo de Eliseu.
    Eliseu dá testemunho de uma opção radical por Deus, quando larga os bois e o arado, o trabalho e a família, para seguir Elias. Cristo será ainda mais exigente quando se der conta de que alguém que pretendia segui-lo, queria despedir-se da família: «Quem olha para trás, depois de deitar a mão ao arado, não é apto para o Reino de Deus» (Lc 9, 62). Poderá haver alguma margem de hipérbole; mas as exigências de Jesus eram, de facto, mais urgentes e radicais.

    Evangelho: Mateus 5, 33-37

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 33«Do mesmo modo, ouvistes o que foi dito aos antigos: Não perjurarás, mas cumprirás diante do Senhor os teus juramentos. 34Eu, porém, digo-vos: Não jureis de maneira nenhuma: nem pelo Céu, que é o trono de Deus, 35nem pela Terra, que é o estrado dos seus pés, nem por Jerusalém, que é a cidade do grande Rei. 36Não jures pela tua cabeça, porque não tens poder de tornar um só dos teus cabelos branco ou preto. 37Seja este o vosso modo de falar: Sim, sim; não, não. Tudo o que for além disto procede do espírito do mal.»

    A quarta antítese refere-se ao segundo e ao oitavo mandamento (Ex 20, 7.16; Nm 30, 3ss.; Dt 23, 22-24). Na sociedade judaica abusava-se do juramento (Mt 23, 16-22). Porque não se podia pronunciar o nome divino, contornava-se o obstáculo referindo-se ao céu, à terra, a Jerusalém, à própria cabeça. Mas, mais uma vez, Jesus elimina a casuística ao afirmar: «Seja este o vosso modo de falar: Sim, sim; não, não. Tudo o que for além disto procede do espírito do mal» (v. 37).
    Num mundo onde predomina a mentira, seria necessário invocar Deus como testemunha do que afirmamos. Mas o cristão sabe que Deus está sempre presente, que não é preciso chamá-lo como testemunha. «Sim, sim», «não, não», proferidos na presença de Deus, equivalem a um juramento. A Carta de Tiago faz eco deste ensinamento de Cristo, quando diz: «Meus irmãos, não jureis, nem pelo Céu, nem pela Terra, nem façais qualquer outro juramento. Que o vosso «sim» seja sim e que o vosso "não" seja não, para não incorrerdes em condenação» (5, 12).

    Meditatio

    Eliseu realizou um gesto radical ao desfazer-se dos bois e do arado, e ao deixar a família e a profissão. Mas Jesus será ainda mais exigente com aqueles que chama para O seguirem. Um desses diz-lhe: «Senhor, deixa-me ir primeiro sepultar o meu pai.» Mas Jesus respondeu-lhe: «Segue-me e deixa os mortos sepultar os seus mortos» (cf. Mt 8, 21-22). «Disse-lhe ainda outro: «Eu vou seguir-te, Senhor, mas primeiro permite que me despeça da minha família.» Jesus respondeu-lhe: «Quem olha para trás, depois de deitar a mão ao arado, não é apto para o Reino de Deus.» (Lc 9, 61-62). Quais são os apegos que impedem ou dificultam o meu seguimento de Jesus?
    Jesus mostra-se contrário ao perjúrio, que é contrário ao respeito devido a Deus. Mas também se mostra contra toda a espécie de juramento, em que se pretende envolver Deus para sufragar uma afirmação. O juramento é falta de respeito por Deus, que se invoca como testemunha, talvez de palavras não verdadeiras, instrumentalizando-O aos nossos interesses egoístas. E também é falta de respeito pelas criaturas de Deus, quando são elas as invocadas: «Não jureis de maneira nenhuma ... Seja este o vosso modo de falar: Sim, sim; não, não» (cf. vv. 34-37).
    Geralmente recorre ao juramento quem não é sincero; temendo não ser acreditado, procura apoio para as suas palavras na autoridade de Deus, que, pelo contrário, quer sinceridade e simplicidade.
    Pode ser útil um bom diagnóstico às patologias da minha oralidade, uma vez que «é no falar que o homem se dá a conhecer» (Sir 27, 7). Por isso, convém perguntar: são as minhas palavras vazias, ociosas, insignificantes, mentirosas, inexpressivas, estultas, expeditas, vulgares? A assimilação da Sagrada Escritura permitir-me-à «falar com as palavras de Deus» (1 Pe 4, 11), «falar com graça» (Cl 4, 6), isto é, falar sob a inspiração do Espírito Santo: «Não sereis vós a falar, mas o Espírito do vosso Pai é que falará por vós» (Mt 10, 20).
    Como cristãos, e como dehonianos, conhecemos e acreditamos, aderimos àquele que é a Verdade, Jesus Cristo. Por isso, há que ser verdadeiros. Na Igreja recebemos o dom da fé, que orienta a nossa vida e nos inspira a deixar tudo para seguir a Cristo (cf. Cst 9).

    Oratio

    Virgem Maria, Mãe de Jesus e minha mãe, ajuda-me a ser verdadeiro. O teu «Sim», tão simples, empenhou toda a tua vida, no respeito profundo por Deus e por todas as criaturas. Por isso, todos recorrem a Ti e te invocam como Espelho da santidade divina, Virgem fiel, Mãe do bom conselho.
    Ajuda-me, Senhora, a viver sempre na simplicidade, na sinceridade, no respeito, e ser generoso no seguimento do teu Filho Jesus. Amen.

    Contemplatio

    Pilatos não tem desculpa. Sabe que os Judeus são levados pela inveja e pelo ódio: «Que tendes a reprovar neste homem?», diz-lhes. Custa-lhe condenar um inocente, mas falta-lhe coragem. Portanto, acabará por ceder aos Judeus.
    Por outro lado, a santidade e a majestade de Jesus impõem-se-lhe: «És tu verdadeiramente o rei dos Judeus? - pergunta-lhe: «Sim, diz-lhe Jesus, sou, mas o meu reino não é um reino temporal. É o reino da verdade. Vim à terra para dar testemunho da verdade, para a fazer reinar e triunfar. Os que amam a verdade escutam a minha voz». Pilatos podia compreender. Foi informado muitas vezes da santidade de Jesus e dos seus milagres. Devia inclinar-se diante da autoridade moral de Jesus, se tivesse o cuidado da verdade. Mas é céptico. O que quer é viver à vontade entre as honras, os gozos e os prazeres mun
    danos. Responde com ligeireza: «O que é a verdade?», e não espera mesmo que Jesus lhe diga. Não quer ser convencido.
    Vaidade, ligeireza, descuido, cobardia, eis o carácter de Pilatos.
    Infelizmente não estou isento destes defeitos... Sim, ligeireza e falta de cuidado, tal foi o mais das vezes a característica da minha conduta ... Depois de tantas graças e de luzes que recebi, ofendia gravemente o Coração de Jesus com a minha indiferença a seu respeito. (Leão Dehon, OSP3, p. 316s).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Seja este o vosso modo de falar: Sim, sim; não, não.» (Mt 5, 37).

    | Fernando Fonseca, scj |

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