Tempo Comum – Anos Ímpares – VIII Semana – Quarta-feira

31 de Maio, 2023

Tempo Comum – Anos Ímpares – VIII Semana – Quarta-feira

Lectio

Primeira leitura: Ben Sirá 36, 1.4-5.10-17

Tem piedade de nós, ó Senhor, Deus de todas as coisas; olha para nós e espalha o teu temor sobre todas as nações. 4Que reconheçam, como também nós reconhecemos, que fora de ti, Senhor, não há outro Deus. 5Renova os teus prodígios, faz novos milagres. 10Reúne todas as tribos de Jacob, toma-as como tua herança, como no princípio. 11Tem piedade, Senhor, do teu povo, que foi chamado pelo teu nome, e de Israel, que trataste como filho primogénito. 12Tem piedade da cidade do teu santuário, de Jerusalém, lugar do teu repouso. 13Enche Sião do louvor das tuas maravilhas, e o teu povo com a tua glória. 14Dá testemunho a favor daqueles que, desde o princípio, são tuas criaturas, leva a efeito as profecias, em teu nome proferidas. 15Recompensa os que pacientemente esperam em ti, a fim de que os teus profetas sejam acreditados. 16Ouve, Senhor, a súplica dos teus servos, segundo a bênção de Aarão sobre o teu povo, 17e todos sobre a terra reconhecerão que Tu és Senhor, o Deus dos séculos.
O autor sagrado eleva uma bela oração a Deus em favor do seu povo, Israel. O povo escolhido tem necessidade de ser libertado e de reencontrar a sua missão de ser amostra das promessas de Deus, farol da fidelidade e do amor de Deus por todos os povos. Israel foi, muitas vezes, fiel à sua missão. Mas, tantas outras, foi infiel, quebrando a Aliança. Assim perdia o canal de ligação à fonte da sua própria vida. A dramática experiência do exílio, que deitou por terra as suas esperanças, comprometendo a sua missão histórico-teológica entre os povos. A partir daqui, encontramos dois importantes pontos da leitura. O primeiro é o que nos fala da consciência de culpa, que leva a pedir o perdão de Deus, baseados apenas na Sua misericórdia: «Tem piedade…» é o refrão dirigido a Deus em favor do «povo», de «Israel», de «Sião», de «Jerusalém». A insistência no pronome possessivo «teu» recorda a Deus o compromisso que assumiu para com o povo; mas também recorda ao povo que continua a ser pertença de Deus, apesar dos seus pecados.
Outro ponto importante é a referência à globalidade, inserindo Israel no contexto dos povos. Israel não é apenas o povo escolhido para ser o povo de Deus; é também o povo por meio do qual Deus há-de ser conhecido e amado por todos os povos. É a consciência missionária e universalista de Israel que começa a desenvolver-se.

Evangelho: Marcos 10, 32-45

Naquele tempo, Jesus e os discípulos iam a caminho, subindo para Jerusalém, e Jesus seguia à frente deles. Estavam espantados, e os que seguiam estavam cheios de medo. Tomando de novo os Doze consigo, começou a dizer-lhes o que lhe ia acontecer: 33«Eis que subimos a Jerusalém e o Filho do Homem vai ser entregue aos sumos sacerdotes e aos doutores da Lei, e eles vão condená-lo à morte e entregá-lo aos gentios. 34E hão-de escarnecê-lo, cuspir sobre Ele, açoitá-lo e matá-lo. Mas, três dias depois, ressuscitará.» 35Tiago e João, filhos de Zebedeu, aproximaram-se dele e disseram: «Mestre, queremos que nos faças o que te pedimos.» 36Disse-lhes: «Que quereis que vos faça?» 37Eles disseram: «Concede-nos que, na tua glória, nos sentemos um à tua direita e outro à tua esquerda.» 38Jesus respondeu: «Não sabeis o que pedis. Podeis beber o cálice que Eu bebo e receber o baptismo com que Eu sou baptizado?» 39Eles disseram: «Podemos, sim.» Jesus disse-lhes: «Bebereis o cálice que Eu bebo e sereis baptizados com o baptismo com que Eu sou baptizado; 40mas o sentar-se à minha direita ou à minha esquerda não pertence a mim concedê-lo: é daqueles para quem está reservado.» 41Os outros dez, tendo ouvido isto, começaram a indignar-se contra Tiago e João. 42Jesus chamou-os e disse-lhes: «Sabeis como aqueles que são considerados governantes das nações fazem sentir a sua autoridade sobre elas, e como os grandes exercem o seu poder. 43Não deve ser assim entre vós. Quem quiser ser grande entre vós, faça-se vosso servo 44e quem quiser ser o primeiro entre vós, faça-se o servo de todos. 45Pois também o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por todos.»

O texto evangélico que escutámos refere diversos episódios ocorridos durante a caminhada de Jesus para Jerusalém. Jesus avança rodeado de discípulos apavorados e de pessoas cheias de medo. Pela terceira vez, fala da paixão, que se aproxima. Fá-lo com muitos pormenores (vv. 33ss.). Mas os discípulos parecem nada compreender. Os filhos de Zebedeu continuam interessados em alcançar uma boa posição no Reino: um quer ficar à direita de Jesus e outro à esquerda (v. 37). Em Mateus, é a mãe que pede esses lugares para os filhos (cf. Mt 20, 20). Os outros discípulos estão preocupados com assuntos que nada têm a ver com os do Senhor. Mas Jesus revela aspectos centrais relativos ao discipulado: o essencial é a docilidade a Deus e ao seu projecto. Ele próprio decidirá a posição de cada um no Reino. Em Mateus será o Pai a tomar tal decisão (cf. Mt 20, 23).
Ser discípulo de Jesus é ser, como Ele, dócil ao Pai, partilhar a missão que o Pai Lhe confiou: beber o mesmo cálice, mergulhar no mesmo baptismo. É seguir o caminho do servo sofredor (Is 52, 13-53, 12), servir a todos até ao dom da própria vida em resgate de muitos… O resgate (lýtron) é o preço a pagar por um prisioneiro de guerra, por um escravo. Este resgate é pago, não a Deus, mas ao príncipe deste mundo (Jo 12,31; 1 Jo 5, 19), ao deus deste mundo (2 Cor 4, 4), que mantém escrava a humanidade. E Jesus resgata a humanidade, não para se tornar Ele mesmo um «rei» opressor, mas paradoxalmente um «rei» servo. Também os cristãos não podem contrapor ao «poder demoníaco» um «poder cristão», mas colocar-se de modo amoroso e humilde ao serviço da humanidade.

Meditatio

O povo de Israel, escolhido para ser luz das nações, atraiçoou a Aliança, envolvendo-se em aventuras pecaminosas que o levaram ao exílio. Desse modo, não realizou a sua vocação nem ajudou os outros povos. Na primeira leitura, pela boca de Ben Sirá, o povo reconhece as suas culpas, mostra o seu arrependimento e pede perdão, sem alegar desculpas, pois está consciente das responsabilidades que tem na sua própria falência. Reconhece que a misericórdia de Deus é a sua única tábua de salvação. Por isso, clama repetidamente: «Tem piedade de nós,Senhor» (v. 3ª). A salvação de Israel irá acontecer com a dos outros povos que o Sábio cita na sua oração. Brilha no horizonte um raio de esperança.
O evangelho mostra-se a triste figura dos Apóstolos.
Havia tempo que andavam com o Senhor. Mas pareciam não ter aprendido nada, pois andavam empenhados na divisão do poder. Tudo começa com a atitude arrogante dos filhos de Zebedeu, Tiago e João. Mas, se estes erram, também os outros se mostram pecadores, porque se deixam levar por sentimentos de hostilidade contra os dois irmãos: «Os outros dez, tendo ouvido isto, começaram a indignar-se contra Tiago e João» (v. 41). E Jesus tem que intervir. Recomenda aos dois irmãos que se ponham nas mãos de Deus, que tudo dispõem como acha melhor. Ensina a todas que a autoridade não é um posto de afirmação pessoal, de busca dos próprios interesses, mas um serviço a exercer com humildade e generosidade. Se for necessário, aquele que preside deve estar disposto a dar a própria vida no exercício da missão que lhe foi confiada. Assim faz o próprio Jesus. No princípio do evangelho, lemos: «o Filho do Homem vai ser entregue» (v. 33). Os verbos seguintes explicam em que consiste essa entrega: ser condenado, escarnecido, flagelado, morto. Depois de todos esses verbos, vêm outros na voz activa: «o Filho do Homem veio para servir e dar a sua vida em resgate por todos» (v. 45). O Filho do homem veio para ser entregue; o Filho do homem veio para servir e dar a vida. Não basta ser passivos, sofrer os acontecimentos, as situações. Há que ser activo: servir, dar a vida. É realmente admirável quando um cristão aceita um evento negativo, como a cruz, e o torna positivo, fazendo dele um dom de amor. É o caso de Jesus que dá a vida em resgate de todos.
As nossas antigas Constituições (1956) afirmavam que «o fim especial» dos religiosos do Instituto era «professar» uma particular devoção ao sacratíssimo Coração de Jesus (I, 2, parágrafo 2). Ora, «professar» é testemunhar e, na qualidade de testemunhas, “servir” evangelicamente, tal como fez Cristo, testemunha do Pai, «que não veio para ser servido mas para servir e dar a vida por muitos» (Mt 20, 28), caso contrário, a nossa “especial devoção” ao Coração de Jesus torna-se intimismo, devocionismo.

Oratio

Pai santo, só Tu podes transformar o sofrimento em dom generoso de vida. Foi o que fez o teu Filho, quando decidiu dar-nos o seu Corpo e o seu Sangue, na Eucaristia. Transformaste o evento doloroso em dom, para, depois, no-lo dares em sacramento. O sacramento, por sua vez, torna-nos capazes de transformar os nossos próprios eventos, isto é, de acolher todos os acontecimentos da vida, mesmo quando são difíceis, e transformá-los em sacrifício generoso de união a Cristo, morto e ressuscitado. Graças à Eucaristia, essa força está em nós e o espírito de Cristo move-nos a usá-la permanentemente na generosidade e na fidelidade. Que a nossa vida se torna eucaristia, bom generoso e gratuito, para tua glória e bem dos irmãos, particularmente dos mais carenciados. Amen.

Contemplatio

Ecce venio. Eis-me aqui, Senhor, ofereço-me, dou-me convosco, em união com os sentimentos do vosso divino Coração. Recebei a minha alma e o meu corpo; a minha memória, a minha inteligência, a minha vontade; os meus olhos, as minhas orelhas, a minha língua e todos os meus sentidos. Dou-me a vós. Acolhei-me e não permitais que me retome. (Leão Dehon, OSP3, p. 120).

Actio

Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
«O Filho do Homem veio para servir e dar a sua vida em resgate por todos» (Mc 10, 45).

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Subsídio litúrgico a cargo de Fernando Fonseca, scj

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