Eventos Julho 2025

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XIII Semana - Terça-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XIII Semana - Terça-feira

    1 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 19, 15-29

    Naqueles dias, ao amanhecer, os mensageiros insistiram com Lot, dizendo-lhe: «Ergue-te, foge com a tua mulher e as tuas duas filhas que estão aqui, a fim de não morreres também tu no castigo da cidade.» 16E como ele se demorava, os homens agarraram-no pela mão, a ele, à mulher e às duas filhas, porque o Senhor queria poupá-los, e conduziram-nos para fora da cidade. 17Depois de os terem conduzido para fora, um dos mensageiros disse-lhe: «Escapa-te, se quiseres conservar a tua vida. Não olhes para trás nem te detenhas em parte alguma do vale. Foge para o monte, de contrário morrerás.» 18Lot disse-lhe: «Não, Senhor, peço-te 19Este teu servo mereceu a tua benevolência, pois demonstraste a tua imensa generosidade para comigo, conservando-me a vida, mas não poderei fugir até ao monte, pois a destruição atingir-me-ia antes e eu morreria. 20Há aqui perto uma cidade, na qual obterei refúgio. É muito pequena; permiti que eu vá para lá. É tão pequena! E salvarei a minha vida.» 21Ele disse-lhe: «Concedo-te ainda o favor de não destruir a cidade a que te referes. 22Apressa-te, porém, a refugiar-te nela, pois nada posso fazer antes de lá chegares.» Por isso, deram àquela cidade o nome de Soar. 23Erguia-se o sol sobre a terra, quando Lot entrou em Soar. 24Então, o Senhor fez cair do céu, sobre Sodoma e Gomorra, uma chuva de enxofre e de fogo, enviada pelo Senhor. 25Destruiu estas cidades, todo o vale e todos os habitantes das cidades e até a vegetação da terra. 26A mulher de Lot olhou para trás e ficou transformada numa estátua de sal. 27Abraão levantou-se de manhã cedo e foi ao lugar onde tinha estado na presença do Senhor. 28Voltando os olhos para o lado de Sodoma e Gomorra e para a extensão do vale, viu elevar-se da terra um fumo semelhante ao fumo de uma fornalha. 29Ao destruir as cidades do vale, porém, Deus recordou-se de Abraão e salvou Lot do cataclismo com que arrasou as cidades onde habitava Lot.

    A imaginação, apoiada em vagas orientações bíblicas, situa Sodoma na zona sul da margem ocidental do rio Jordão. Ainda hoje aí se podem ver blocos salinos de formas caprichosas, que causam forte impressão a quem os observa. Mas não há vestígios materiais que permitam identificar a cidade. Os seus eternos vestígios consistem em ser símbolo de um mundo corrompido e paradigma da justiça e do juízo de Deus. É essa a perspectiva do autor sagrado. Sodoma, e a sua terrível destruição, realçam o contraste entre a hospitalidade de Abraão e a falta de hospitalidade dos seus habitantes. Lot, que escolheu a melhor parte, perde tudo: terra, bens, mulher. A sua posteridade nascerá de incesto com as filhas. Abraão, pelo contrário, tendo confiado na promessa de Deus, terá uma descendência numerosa e possuirá a terra. O nosso texto começa com uma dramática tensão entre a solicitude dos mensageiros e a demora de Lot. Só o parentesco com Abraão o salva. Graças a esse parentesco, Deus usa de «uma grande misericórdia» para com ele, permitindo-lhe refugiar-se em Soar.
    A narrativa termina com Abraão a olhar, do alto de um monte, a desgraça das cidades pecadoras. Não se trata do olhar curioso de Sara, que ficou petrificada, mas do olhar de quem se sente objecto da "memória" de Deus que salva.

    Evangelho: Mateus 8, 23-27

    Naquele tempo, 23Jesus subiu para o barco e os discípulos seguiram-no. 24Levantou-se, então, no mar, uma tempestade tão violenta, que as ondas cobriam o barco; entretanto, Jesus dormia. 25Aproximando-se dele, os discípulos despertaram-no, dizendo-lhe: «Senhor, salva-nos, que perecemos!» 26Disse-lhes Ele: «Porque temeis, homens de pouca fé?» Então, levantando-se, falou imperiosamente aos ventos e ao mar, e sobreveio uma grande calma. 27Os homens, admirados, diziam: «Quem é este, a quem até o vento e o mar obedecem?»

    De modo muito estilizado, Mateus refere o episódio da tempestade acalmada. O propósito de Mateus não é tratar o acontecimento em si, mas indicar o seu significado. A Igreja é uma barca em tormenta, onde está Jesus e os discípulos. «Os discípulos seguiram-no», diz-nos o texto (v. 23). Esta palavra traduz, para Mateus, o aspecto essencial do discipulado: «seguir» Jesus. De facto, o verbo «seguir» é utilizado unicamente quando se trata de Jesus. Indica a união do discípulo com o Jesus da história, a participação na sua vida, a entrada no Reino através da pertença a Cristo pela obediência e pela confiança. Dizer a Jesus: «Desperta, Senhor, porque dormes?» (Sl 44, 24) e «Senhor, salva-nos, que perecemos!», significa reencontrar-se como crentes, como fiéis, como discípulos, e encontrar Jesus como Senhor e Cristo. Na sua presença não há tempestade, não há paixão, não há morte que resistam. A sua autoridade e o seu poder restauram a ordem da graça. Os discípulos nem sempre correspondem com fé e confiança ao senhorio de Jesus. O sono de Jesus representa o drama da morte do Filho do homem, que desafia a Igreja à fé e à serena confiança no Pai como Aquele que «se fez obediente até à morte e morte de cruz» (Fl 2, 8).

    Meditatio

    A leitura do livro do Génesis apresenta-nos o cuidado de Deus em salvar Lot da catástrofe das cidades pecadoras. Impressiona-nos tal cuidado. O texto insiste em sublinhá-lo: «Ao amanhecer, os mensageiros insistiram com Lot, dizendo-lhe: «Ergue-te, foge com a tua mulher e as tuas duas filhas que estão aqui, a fim de não morreres também tu no castigo da cidade» (v. 15). Lot não revelava pressa, adiava a decisão de partir, queria permanecer na sua casa, no seu ambiente. Talvez esperasse para ver e, se o perigo se tornasse iminente, então, partir. Mas os mensageiros tomam-no pela mão e conduzem-no para fora da cidade. Depois insistem, mais uma vez: «Escapa-te, se quiseres conservar a tua vida. Não olhes para trás nem te detenhas em parte alguma do vale. Foge para o monte, de contrário morrerás» (v. 17). Mas Lot continua a protelar a partida, e atreve-se a pedir para não ir para muito longe: «Há aqui perto uma cidade, na qual obterei refúgio. É muito pequena; permiti que eu vá para lá» (v. 20).
    O Senhor faz tudo para nos salvar. Mas nós, muitas vezes, somos reticentes, desinteressados. Não nos damos conta dos perigos que corremos. Teimamos em permanecer nos nossos hábitos e rotinas. Estamos apegados aos nossos bens, às circunstâncias comuns da nossa vida. Deus convida-nos a tomar caminhos seguros, honestos, e nós preferimos atalhos obscuros, ambíguos. Não queremos renunciar decididamente às situações perigosas. Mas Deus é perseverante e insiste. Temos sorte com um Pai tão cuidadoso, que conhece os perigos muito melhor do que nós e nos convida a escutá-l´O, a avançar, para atingirmos a vida em plenitude.
    O evangelho apresenta-nos uma situa&cced
    il;ão diferente. Os Apóstolos estão em alto mar, na barca com Jesus. «Levantou-se, então, no mar, uma tempestade tão violenta» (v. 24). Quando se está numa barca e se levanta uma tempestade, não há alternativas. Há que enfrentar decididamente o perigo, pois não é possível fugir. Os Apóstolos não encontraram outra solução senão rezar. Jesus dormia. Por isso, «aproximando-se dele, os discípulos despertaram-no, dizendo-lhe: «Senhor, salva-nos, que perecemos!» (v. 25). Jesus, «levantando-se, falou imperiosamente aos ventos e ao mar, e sobreveio uma grande calma» (v. 26). A oração dos Apóstolos, mais do que fé, manifestava medo. Por isso, Jesus repreende-os: «Porque temeis, homens de pouca fé?» (v. 26).
    Quem embarcou com Jesus não deve ter medo. O mais importante é mesmo ter embarcado com Ele. Ainda que o Senhor pareça dormir, não nos abandona. Isso não significa que tenhamos sempre uma vida tranquila, sem problemas, sem dificuldades. Mas estamos certos da sua ajuda e da sua vitória final.
    Tanto a primeira leitura, como o evangelho, nos garantem que o mais importante é estarmos unidos a Deus no amor. Essa união pressupõe o desapego de muitas coisas secundárias. Só os que são capazes de se desapegar do que é secundário podem salvar-se, podem chegar à vitória: «Em tudo isso - escreve Paulo - saímos mais do que vencedores,graças àquele que nos amou» ( Rm 8, 37). E continua o Apóstolo: «Estou convencido de que nem a morte nem a vida, nem os anjos nem os principados, nem o presente nem o futuro, nem as potestades, nem a altura, nem o abismo, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus que está em Cristo Jesus, Senhor nosso» (vv. 38-39).

    Oratio

    Senhor, meu Deus, como és grande, como és benevolente! Os céus não podem conter-Te. Mas, ao vires à terra, fizeste-Te pobre e completamente disponível. Fizeste-Te nosso pão de cada dia. Queres saciar-nos de vida e de amor. Dá-nos um coração agradecido, um coração generoso e alegre. Dá-nos um coração que nos permita testemunhar a tua benevolência, a tua amizade por todos os homens. Torna-nos intercessores audazes, para que a nenhum dos homens e mulheres deste mundo falte a alegria de saber-se pensado, escolhido e amado por Ti, desde toda a eternidade. Amen.

    Contemplatio

    Se a alma for fiel a estas primeiras sugestões da graça, Nosso Senhor reduplica a solicitude, porque o bom acolhimento feito a uma graça leva-o a conceder outra. Se o pecador for surdo a estas sugestões sem ser desprovido de generosidade, Nosso Senhor far-lhe-á a graça de lhe enviar uma provação que provoque o regresso a si mesmo. Durante esta prova, fala mais amigavelmente ao seu coração; faz-lhe sentir vivamente toda a torpeza do seu estado, todo o perigo da sua situação. Procura promover nele um sentimento de humildade. Se o pecador for fiel às sugestões da graça, se não recuar diante do esforço a fazer para tomar consciência da miséria na qual caiu, para ver a porcaria de que se sujou, a lepra de que se cobriu, Nosso Senhor recompensa este primeiro sentimento tornando-o mais vivo. O coração penetrado de um desprezo profundo por si mesmo abre-se à acção divina. Um toque poderoso parte então este coração humilhado e ele confessa a sua falta. Geme pela sua miséria, que lhe aparece então em toda a sua torpeza. Compara o seu estado ao dos servos fiéis que vivem numa doce paz de alma sob os olhares benevolentes de Nosso Senhor. O sentimento da sua indignidade é então tão vivo, que ele exclama como o filho da parábola: «Meu Deus, não sou digno de ser vosso filho, mas tende piedade de um pobre coração contrito e humilhado». Levanta-se então resolutamente para entrar de novo em graça com Deus. O Coração de Jesus, emocionado de compaixão, facilita a esta querida alma a penosa caminhada à qual finalmente se resolveu. Nosso Senhor acolhe de braços abertos o infeliz que desde este instante se torna de novo seu filho bem-amado. (Leão Dehon, OSP 4, p. 123s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Senhor, salva-nos, que perecemos!» (Mt 8, 25).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XIII Semana - Quarta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XIII Semana - Quarta-feira

    2 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 21, 5.8-20

    Abraão tinha cem anos quando nasceu Isaac, seu filho. O filho cresceu até à idade em que deixou de mamar, e nesse dia Abraão ofereceu um grande banquete. 9Sara viu que o filho que a egípcia Agar dera a Abraão estava a brincar. 10E ela disse a Abraão: «Expulsa esta escrava e o filho, porque o filho desta escrava não herdará com o meu filho Isaac.» 11Esta frase desgostou profundamente Abraão, por causa de Ismael, seu filho. 12Mas Deus disse-lhe: «Não te preocupes com a criança e com a tua escrava. Faz tudo quanto Sara te pedir, pois de Isaac há-de nascer a descendência que usará o teu nome. 13Contudo, farei sair também uma nação do filho da escrava, porque também ele é teu filho.» 14No dia seguinte de manhã, Abraão tomou pão e um odre de água, deu-o a Agar e pô-lo sobre os ombros dela; depois, mandou-a embora com o seu filho. Ela partiu e, embrenhando-se no deserto de Bercheba, por lá andou ao acaso. 15Tendo-se acabado a água do odre, deixou o filho debaixo de um arbusto 16e foi sentar-se do lado oposto, à distância de um tiro de arco, porque dizia: «Não quero ver o meu filho morrer.» Sentou-se, pois, do lado oposto e começou a chorar. 17Deus escutou a voz do menino, e o mensageiro de Deus chamou do céu Agar e disse-lhe: «Que tens tu, Agar? Nada temas, porque Deus ouviu a voz do menino, do lugar em que está. 18Ergue-te, vai buscar outra vez o teu filho, toma-o pela mão, pois farei nascer dele um grande povo.» 19Deus abriu-lhe os olhos e ela viu um poço onde foi encher o odre e deu de beber ao filho. 20Deus protegeu o menino. Ele cresceu, residiu no deserto e tornou-se um hábil arqueiro.

    A narrativa do nosso texto deve ser lida em paralelo com o capítulo 16, pois provavelmente se trata de uma variante da mesma tradição. O objectivo desta narrativa é o mesmo. Quer mostrar que o projecto de Deus avança, apesar da mesquinhez humana. Além disso, mais uma vez se dá uma explicação popular dos nomes de Isaac (v. 9) e de Ismael (v. 17).
    O banquete que assinala o desmame do filho da promessa oferece a ocasião para confrontar os dois filhos de Abraão. Esta narrativa, ao contrário da de Gn 16, apresenta Ismael quase da mesma idade que Isaac que brinca com ele. É o suficiente para suscitar os ciúmes de Sara, que pressiona Abraão para que afaste o filho de Sara (. 10). A reacção de Deus, que apoia a posição de Sara, não seria de esperar (cf. v. 12). Mas, mais uma vez, vemos como os caminhos de Deus são diferentes dos nossos. O Senhor convida Abraão a não afastar o filho Ismael, porque também ele será pai de numerosa descendência. É um momento carregado de emoções, bem apresentado pelo autor sagrado. Deus é sempre aquele que escuta o grito do pobre e do oprimido que, neste caso, são Agar e o filho destinado a morrer. O «mensageiro de Deus» abriu os olhos a Agar que viu um poço perto dela e deu de beber ao filho. A intervenção divina deu coragem a Agar e perspectivou um futuro feliz para Ismael. Assim se vão delineando os destinos de dois povos irmãos, os ismaelitas e os israelitas, ainda hoje unidos por um destino de hostilidades e de partilhas.

    Evangelho: Mateus 8, 28-34

    Naquele tempo, 28quando Jesus chegou à outra margem, à região dos gadarenos, vieram ao seu encontro dois possessos, que habitavam nos sepulcros. Eram tão ferozes que ninguém podia passar por aquele caminho. 29Vendo-o, disseram em alta voz: «Que tens a ver connosco, Filho de Deus? Vieste aqui atormentar-nos antes do tempo?» 30Ora, andava a pouca distância dali, a pastar, uma grande vara de porcos. 31E os demónios pediram-lhe: «Se nos expulsas, manda-nos para a vara de porcos.» 32Disse-lhes Jesus: «Ide!» Então, eles, saindo, entraram nos porcos, que se despenharam por um precipício, no mar, e morreram nas águas. 33Os guardas fugiram e, indo à cidade, contaram tudo o que se tinha passado com os possessos. 34Toda a cidade saiu ao encontro de Jesus e, vendo-o, rogaram-lhe que se retirasse daquela região.

    Mais uma vez, Mateus retoma uma história do Evangelho de Marcos (Mc 5, 1-20), contando-a de modo mais sintético. Por exemplo, ao falar dos porcos, refere uma grande vara, e não de cerca de dois mil porcos, como diz Marcos (5, 2ss.). Mas também amplia pormenores. Por exemplo, em vez de um possesso, como faz Marcos, fala de dois.
    Fundamentalmente, a cena pretende descrever um encontro de Jesus com os pagãos, dominados pelas forças do mal, como já aconteceu no episódio do centurião (Mt 8, 1-17). Mas, enquanto o centurião acreditou e aceitou Jesus, os habitantes de Gádara não crêem e rejeitam-no.
    A imagem dos «sepulcros», a força de Jesus diante dos demónios e a sua «fraqueza» diante dos homens faz desta cena o claro reflexo de uma meditação sobre a paixão, incluindo a rejeição pelos homens, bem expressa no pedido dos gadarenos para que Jesus se retire da sua cidade. A expressão «antes do tempo» (v. 29) também indica a relação desta cena com a paixão, quando Jesus, ainda que expulso da cidade santa, irá vencer sobre a força negativa da morte, da dispersão da Igreja, abrindo passagem para que fosse possível «passar por aquele caminho» (v. 28). O poder de Jesus só se revela no mistério insondável da cruz.

    Meditatio

    Comove-nos ler a história de Agar, perdida no deserto com o seu menino, e profundamente desesperada porque o vê condenado a morrer de sede. «Não quero ver o meu filho morrer!», exclamou (v. 16). Agar nem se lembra de rezar. Mas Deus escuta o choro da criança, «e o mensageiro de Deus chamou do céu Agar e disse-lhe: «Que tens tu, Agar? Nada temas, porque Deus ouviu a voz do menino... Ergue-te, vai buscar outra vez o teu filho, toma-o pela mão» (vv. 17-18). A escrava encontrava-se, com o seu filho, numa situação desesperada. Mas Deus é fiel e intervém. E escutamos as palavras que havemos de acolher com muita atenção: «Deus abriu-lhe os olhos e ela viu um poço onde foi encher o odre e deu de beber ao filho» (v. 19). O poço já lá estava. Mas Agar estava como que cega, por causa do seu desespero, e não o via. A intervenção de Deus faz-lhe ver a salvação. Quando Deus nos ilumina, conseguimos ver a realidade das coisas e encontrar soluções para a nossa perplexidade e incerteza. Há que pedir a Deus a sua luz, a luz do seu Espírito, na oração. Há que pedi-la também para os que governam este mundo. Ser-lhes-á mais fácil encontrar soluções justas para tantos conflitos, que cobrem de sangue a terra, para tantas injustiças, que causam imensos sofrimentos a tantos dos nossos contemporâneos. Iluminados pelo Senhor, saberão encontrar leis justas e respeitosas da dignidade das pessoas. Tantas vezes estamos próximos do Salvador, e não O vemos. Tantas vezes fazemos como os habitantes de Gádara que, depois do milagre, pediram a Jesus que se afastasse: «Toda a cidade saiu ao encontro de Jesus e, vendo-o, rogaram-lhe que se retirasse daquela região» (v. 34). Estava a prejudicar os seus negócios mesquinhos? O seu egoísmo cegava-os. Por isso, não conseguiram ver n´Ele o libertador poderoso contra o demónio!
    Não é fácil entrarmos no cumprimento de onda do Senhor, sintonizar com o seu pensamento. Há momentos em que isso se torna particularmente difícil, porque Deus vai mais longe que o nosso humano bom senso. É o que nos ensinam as leituras de hoje. Deus pede a Abraão que apoie a repúdio de Sara. Abraão consente, obedece à palavra, e o Senhor abençoará o bebé, aparentemente condenado a morrer. Para libertar os endemoninhados de Gádara, prejudica a economia dos criadores de porcos... Deus, por vezes, propõe-nos caminhos que não são os nossos, que são exigentes. Mas não exerce violência sobre a nossa liberdade. Deixa-nos sempre livres para optar num sentido ou noutro. Uma coisa é certa: quando a sua palavra nos incomoda, nunca é em vista da morte, mas da vida.

    Oratio

    Senhor, só Tu tens palavras de vida eterna! A quem iremos pedir ajuda e salvação? Quero agradecer-Te porque, cada dia, a tua palavra ecoa no meu coração, sempre viva, sempre nova, sempre exigente, sempre provocante. Que jamais me esconda atrás dos meus cálculos mesquinhos. Que eu Te siga pelos caminhos da liberdade e do amor, porque sempre lanças os meus pecados para o fundo do mar, e me dás possibilidade de ressuscitar como nova criatura, amada por Deus Pai. Amen.

    Contemplatio

    Jesus viera para operar a grande obra da reconciliação. Tudo estava preparado e, no entanto, leva uma longa vida de trinta anos, desconhecida, escondida, em aparência inactiva e inútil. O Redentor tinha sido prometido ao género humano e anunciado pelos profetas. Os sinais da sua vinda estavam marcados. Era esperado pelos justos com um ardente desejo. Prodígios foram realizados na altura do seu nascimento. A própria natureza manifestou a sua alegria pela vinda do Criador. Uma estrela maravilhosa surpreendeu os sábios do Oriente e conduziu-os ao presépio. Mas logo a seguir, que silêncio! Tudo retorna à obscuridade e à calma. Os que acreditavam verdadeiramente, os que seguiam a atracção da graça, a voz dos anjos e as inspirações do Espírito Santo, conservavam no seu coração a recordação dos mistérios que tinham tido um brilho tão curto. Adoravam no silêncio, na esperança e no abandono, os decretos da sabedoria, do amor e da misericórdia de Deus. E esta vida obscura, vida de submissão, de trabalho e da misericórdia de Deus vai durar trinta anos! Quem é que está em condição de aprofundar as vias da sabedoria, do amor e da bondade de Deus? Quem pode conceber e contar os actos de virtude destes anos de obscuridade? E então porquê tudo isto? Porquê esta viagem penosa e longa ao país pagão e idólatra? Porque Jesus era vítima, porque era libertador e redentor; porque isto correspondia aos desígnios de misericórdia que os homens não podiam compreender perfeitamente. (Leão Dehon, OSP 3, p. 41s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito» (Lc 23, 46).

  • S. Tomé, Apóstolo

    S. Tomé, Apóstolo


    3 de Julho, 2025

    O martirológio jeronimiano do século VI coloca no dia 3 de Julho a transladação do corpo de S. Tomé para Edessa, na atual Turquia. Este apóstolo, também chamado Dídimo, é-nos dado a conhecer sobretudo por S. João evangelista. É Tomé que convida os outros apóstolos a acompanharem Jesus para a Judeia, para morrerem com Ele (Jo 11, 16). É a pergunta de Tomé que leva Jesus a definir-se: "

    Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida." (Jo 14, 5s.). Finalmente, Tome, com a sua incredulidade, ajuda-nos a fortalecer a nossa adesão a Jesus, por meio de uma profissão de fé muito clara: "Meu Senhor e meu Deus!" (Jo 20, 24-29).Como escreve S. Gregório Magno, "A incredulidade de Tomé foi mais útil à nossa fé do que a fé dos discípulos crentes". Após o Pentecostes, partiu em missão. Mas não temos dados precisos acerca do seu apostolado.

    Lectio

    Primeira leitura: Efésios 2, 19-22

    Irmãos: Já não sois estrangeiros nem imigrantes, mas sois concidadãos dos santos e membros da casa de Deus, 20edificados sobre o alicerce dos Apóstolos e dos Profetas, tendo por pedra angular o próprio Cristo Jesus. 21É nele que toda a construção, bem ajustada, cresce para formar um templo santo, no Senhor. 22É nele que também vós sois integrados na construção, para formardes uma habitação de Deus, pelo Espírito.

    Para Paulo, Cristo é a nossa paz. Por isso, na Igreja, não fazem sentido as divisões, as discriminações, as discórdias. Em Cristo, fomos todos reconciliados e unidos, seja que tenhamos vindo de longe, como os pagãos, seja que tenhamos vindo de mais perto, como os judeus. Já não existem dois povos, mas um só povo. Tudo isto é dom de Deus Pai, por meio de Cristo Senhor, no Espírito Santo. A Igreja é como que um grande edifício, um templo santo, onde habita Deus. Os Apóstolos e os Profetas são fundamento desse edifício onde todos estamos e vivemos como "concidadãos dos santos e membros da casa de Deus" (v. 19), e que tem Cristo como "pedra angular".

    Evangelho: João 20, 24-29

    Naquele tempo, Tomé, um dos Doze, a quem chamavam o Gémeo, não estava com eles quando Jesus veio.25Diziam-lhe os outros discípulos: «Vimos o Senhor!» Mas ele respondeu-lhes: «Se eu não vir o sinal dos pregos nas suas mãos e não meter o meu dedo nesse sinal dos pregos e a minha mão no seu peito, não acredito.» 26Oito dias depois, estavam os discípulos outra vez dentro de casa e Tomé com eles. Estando as portas fechadas, Jesus veio, pôs-se no meio deles e disse: «A paz seja convosco!» 27Depois, disse a Tomé: «Olha as minhas mãos: chega cá o teu dedo! Estende a tua mão e põe-na no meu peito. E não sejas incrédulo, mas fiel.» 28Tomé respondeu-lhe: «Meu Senhor e meu Deus!» 29Disse-lhe Jesus: «Porque me viste, acreditaste. Felizes os que crêem sem terem visto!»

    A incredulidade de Tomé, como referimos na introdução a esta festa, citando S. Gregório Magno, foi "mais útil à nossa fé do que a fé dos discípulos crentes". Aproveitando o episódio, João abre diante de nós uma pista nova para chegarmos à libertadora experiência da fé em Jesus ressuscitado. Na aparição seguinte aos seus discípulos, Jesus convida Tomé a percorrer o caminho de busca, que os seus colegas já tinham feito. Tomé, disponível e dócil à ordem de Jesus, chega a um ato de fé claro e convicto: "Meu Senhor e meu Deus!" (v. 28). A bem-aventurança, que Jesus proclama em seguida, dirige-se a nós que, percorrendo um itinerário de fé, em atitude de completo abandono, chegamos a Jesus morto e ressuscitado.

    Meditatio

    No episódio narrado no evangelho, Tomé não é, certamente, um modelo para nós. Jesus di-lo claramente: "Porque me viste, acreditaste. Felizes os que crêem sem terem visto!" (v. 29). Mas, como já referimos, a sua incredulidade foi útil para nós.
    O que mais impressiona é que Tomé acompanhara Jesus, tal como os outros apóstolos. Conhecia bem o seu rosto e as suas palavras. Mas, agora, para acreditar, quer ver os sinais da Paixão: "Se eu não vir o sinal dos pregos nas suas mãos e não meter o meu dedo nesse sinal dos pregos e a minha mão no seu peito, não acredito." (v. 25). Mas, exatamente nisto, Tomé torna-se modelo para nós, pois sabe discernir o que carateriza Jesus. Depois da Paixão, Jesus é caraterizado pelas suas chagas. Esses sinais do seu amor são suficientes para O reconhecermos. Por isso, as conserva na sua carne gloriosa: "Olha as minhas mãos: chega cá o teu dedo! Estende a tua mão e põe-na no meu peito. E não sejas incrédulo, mas fiel." (v. 27). Tomé, podemos dizê-lo, foi o primeiro devoto do Coração de Jesus. Quis contatar, também fisicamente, com esse Coração trespassado por nosso amor. Quantos cristãos contemplaram o Lado aberto e o Coração trespassado de Jesus. O P. Dehon compara-o ao livro escrito por fora e por dentro, referido no Apocalipse, e que nos fala só de amor.
    A contemplação do Lado aberto e do Coração de Jesus levou Tomé à sua fortíssima expressão de fé: "Meu Senhor e meu Deus!" (v. 28). Que essa mesma contemplação do mais expressivo sinal do amor do nosso Salvador nos leve a uma fé clara, decidida, forte, apostólica.

    Oratio

    Meu Senhor e meu Deus! Quero tirar das vossas chagas a bebida da salvação. Sede condescendente comigo como fostes com S. Tomé. Emprestai-me as vossas mãos e os vossos pés para que aí cole os meus lábios. Tenho tanta necessidade de forças. Ousarei mesmo aproximar-me do vosso Coração para dele tirar o arrependimento e o fervor. Perdoai-me! (Leão Dehon, OSP 3, p. 297).

    Contemplatio

    S. Tomé exprimiu a sua fé: «Meu Senhor e meu Deus!». Meu Senhor, é o Filho do homem, é o Cristo, é o Messias. Meu Deus, é o Filho de Deus, é o Verbo incarnado. A fé é completa e explícita. «Tu és feliz, Tomé, diz-lhe Nosso Senhor, viste e acreditaste; mas mais felizes, isto é, mais meritórios, serão os que acreditarem sem terem visto». Eu devia ser destes, Senhor. Não vi as chagas, mas tenho tantos motivos de fé: o testemunho do Evangelho, a Igreja e as suas graças, os santos, a ação sobrenatural sempre viva na Igreja. E não toquei, por assim dizer, com o dedo a vossa ação e a vossa graça, em mil circunstâncias da minha vida, seja em mim mesmo seja nas almas com as quais estive em contacto? Não seria mais culpado do que Tomé, se não tivesse uma fé viva? E porque é que a minha fé é ainda tão fraca, tão inerte e quase morta? Creio, mas vivo como se não tivesse fé. Quero hoje pedir o milagre da minha conversão às cinco chagas. Contemplo-as em espírito. Aproximo delas os meus lábios. Queria beber nestas fontes de água vivificante de que fala S. João. (Leão Dehon, OSP 3, p. 296s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Meu Senhor e meu Deus!" (Jo 20, 28).

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    S. Tomé, Apóstolo (03 Julho)

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XIII Semana - Quinta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XIII Semana - Quinta-feira

    3 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 22, 1-19

    Naqueles dias, 1após estas ocorrências, Deus pôs Abraão à prova e chamou-o: «Abraão!» Ele respondeu: «Aqui estou.» 2Deus disse: «Pega no teu filho, no teu único filho, a quem tanto amas, Isaac, e vai à região de Moriá, onde o oferecerás em holocausto, num dos montes que Eu te indicar.» 3No dia seguinte de manhã, Abraão aparelhou o jumento, tomou consigo dois servos e o seu filho Isaac, partiu lenha para o holocausto e pôs-se a caminho para o lugar que Deus lhe tinha indicado. 4Ao terceiro dia, erguendo os olhos, viu à distância aquele lugar. 5Disse então aos servos: «Ficai aqui com o jumento; eu e o menino vamos até além, para adorarmos; depois, voltaremos para junto de vós.» 6Abraão apanhou a lenha destinada ao holocausto, entregou-a ao seu filho Isaac e, levando na mão o fogo e o cutelo, seguiram os dois juntos. 7Isaac disse a Abraão, seu pai: «Meu pai!» E ele respondeu: «Que queres, meu filho?» Isaac prosseguiu: «Levamos fogo e lenha, mas onde está a vítima para o holocausto?» 8Abraão respondeu: «Deus proverá quanto à vítima para o holocausto, meu filho.» E os dois prosseguiram juntos. 9Chegados ao sítio que Deus indicara, Abraão construiu um altar, dispôs a lenha, atou Isaac, seu filho, e colocou-o sobre o altar, por cima da lenha. 10Depois, estendendo a mão, agarrou no cutelo, para degolar o filho. 11Mas o mensageiro do Senhor gritou-lhe do céu: «Abraão! Abraão!» Ele respondeu: «Aqui estou.» 12O mensageiro disse: «Não levantes a tua mão sobre o menino e não lhe faças mal algum, porque sei agora que, na verdade, temes a Deus, visto não me teres recusado o teu único filho.» 13Erguendo Abraão os olhos, viu então um carneiro preso pelos chifres a um silvado. Foi buscá-lo e ofereceu-o em holocausto, em substituição do seu filho. l 14Abraão chamou a este lugar: «O Senhor providenciará»; e dele ainda hoje se diz: «Na montanha, o Senhor providenciará.» 15O mensageiro do Senhor chamou Abraão do céu, pela segunda vez, 16e disse-lhe: «Juro por mim mesmo, declara o Senhor, que, por teres procedido dessa forma e por não me teres recusado o teu filho, o teu único filho, 17abençoar-te-ei e multiplicarei a tua descendência como as estrelas do céu e como a areia das praias do mar. Os teus descendentes apoderar-se-ão das cidades dos seus inimigos. 18E todas as nações da Terra se sentirão abençoadas na tua descendência, porque obedeceste à minha voz.» 19Abraão voltou para junto dos servos, e regressaram juntos a Bercheba, onde Abraão fixou residência.

    O relato do sacrifício de Isaac, uma obra-prima da arte narrativa da Bíblia, engloba diversos pontos fortes, amplamente sobrepostos: prova da fé de Abraão, rejeição do sacrifício humano, promessa de descendência, terra e bênção, fio condutor das tradições patriarcais. Para além de tudo isso, estamos diante de uma página sempre viva, actual e envolvente. Antes de mais, é preciso dar-nos conta de que estamos perante uma provação pela qual Deus experimenta a fé e a obediência de Abraão, que prontamente responde «Aqui estou!» e toma o filho muito amado para cumprir a paradoxal exigência de Deus. O autor sagrado manifesta grande habilidade ao descrever, com poucas pinceladas, uma cena altamente dramática, sem falar directamente dos sentimentos dos intervenientes. Abraão caminha durante três dias; a sua obediência foi demoradamente experimentada. A tradição judaica sublinha o «atamento» de Isaac, que voluntariamente se dispõe para o sacrifício. A tradição cristã sempre viu, na imolação de Isaac, a figura do sacrifício de Cristo na cruz. Tem particular importância nos versículos 13s. o verbo "ver", que nos permite concluir que Deus "se faz ver" quando "vê" o coração do homem que O procura, depois da noite escura da fé, e chega à conclusão de que Deus sempre "pró-vê". A intervenção do anjo, que evita a consumação do sacrifício, confirma Isaac como filho da fé, que abre à descendência da promessa.

    Evangelho: Mateus 9, 1-8

    Naquele tempo, 1Jesus subiu para um barco, atravessou o mar e foi para a sua cidade. 2Apresentaram-lhe um paralítico, deitado num catre. Vendo Jesus a fé deles, disse ao paralítico: «Filho, tem confiança, os teus pecados estão perdoados.» 3Alguns doutores da Lei disseram consigo: «Este homem blasfema.» 4Jesus, conhecendo os seus pensamentos, disse-lhes: «Porque alimentais esses maus pensamentos nos vossos corações? 5Que é mais fácil dizer: 'Os teus pecados te são perdoados', ou: 'Levanta-te e anda'? 6Pois bem, para que saibais que o Filho do Homem tem, na terra, poder para perdoar pecados - disse Ele ao paralítico: 'Levanta-te, toma o teu catre e vai para tua casa.» 7E ele, levantando-se, foi para sua casa. 8Ao ver isto, a multidão ficou dominada pelo temor e glorificou a Deus, por ter dado tal poder aos homens.

    A cura do paralítico é-nos contada pelos três Sinópticos. Como em outros casos, também aqui Marcos está por detrás dos relatos de Mateus e de Lucas. Mateus, mais uma vez, estiliza a cena, reduzindo-a ao essencial. A chave para descobrirmos a intenção do evangelista está nas palavras: «Vendo Jesus a fé deles, disse ao paralítico: «Filho, tem confiança, os teus pecados estão perdoados» (v. 2). Jesus tem poder para perdoar os pecados. A cura do paralítico prova-o. Mas Jesus dá outra prova desse poder: sabe o que os escribas estavam a pensar, sem que ninguém lho tivesse dito. Por conseguinte, Jesus tem um poder sobre-humano, sobrenatural, concedido pelo Espírito. E assim se revela a sua dignidade única e se justifica o seu poder único, que Lhe permite perdoar pecados. A multidão compreende e dá glória a Deus «por ter dado tal poder aos homens» (v. 8).
    O poder Jesus para perdoar pecados foi comunicado à Igreja e, dentro da Igreja, aos homens escolhidos por Ele para desempenharem directamente a missão do perdão. O poder de perdoar os pecados é inseparável da pessoa de Jesus e da sua Igreja.

    Meditatio

    A primeira leitura é uma das páginas mais impressionantes da Bíblia. Fala-nos do sacrifício de Abraão. Deus pede-lhe uma coisa terrível: «Pega no teu filho, no teu único filho, a quem tanto amas, Isaac, e vai... oferecê-lo em holocausto» (v. 3). Abraão obedece. Não recusa o pedido de Deus, não tenta negociar. Dispõe-se a imolar Isaac no alto do Moriá. Sabe que o sacrifício é um acto de união com Deus, e sabe que esse acto é mais de Deus que do homem, porque só Deus pode santificar. O que é oferecido em sacrifício é santificado. Por isso, parte. Não sabe o que
    o espera, que solução terá Deus para cumprir as suas promessas. Mas parte, abandonando-se aos desígnios do Altíssimo. «Caminha na fé», como dirá o autor da Carta aos Hebreus (Heb 11, 19). Um sacrifício é sempre ressurreição, porque é acção divina. Se fosse apenas acção do homem, seria destruição. Mas é acção de Deus!
    O diálogo entre Abraão e Isaac é muito belo e comovente: «Isaac disse a Abraão, seu pai: «Meu pai!» E ele respondeu: «Que queres, meu filho?» Isaac prosseguiu: «Levamos fogo e lenha, mas onde está a vítima para o holocausto? v. 7). A narrativa diz que o cordeiro é ele. Mas Isaac não sabe disso. Por isso, pergunta ao pai pelo cordeiro. Abraão responde: «Deus proverá quanto à vítima para o holocausto, meu filho» (v. 8. Abraão não está a fugir à questão porque, na verdade, nem ele sabe onde está o cordeiro. Faz o que julga dever fazer para cumprir a ordem de Deus. Mas intui que Deus irá fazer alguma coisa para que apareça o cordeiro para o sacrifício. A fé e a confiança de Abraão são recompensadas. No momento supremo, Deus grita: «Abraão! Abraão!» ... «Não levantes a tua mão sobre o menino e não lhe faças mal algum, porque sei agora que, na verdade, temes a Deus, visto não me teres recusado o teu único filho» (vv. 11-12). Isaac é poupado e, em seu lugar, é imolado «um carneiro preso pelos chifres a um silvado» (v. 13). Depois disto: «O mensageiro do Senhor chamou Abraão do céu, pela segunda vez, e disse-lhe: ...por teres procedido dessa forma e por não me teres recusado o teu filho, o teu único filho, abençoar-te-ei... E todas as nações da Terra se sentirão abençoadas na tua descendência, porque obedeceste à minha voz» (vv. 15-17).
    Sabemos, agora, que esta página é profecia do sacrifício de Jesus, que, na verdade, Deus proveu o cordeiro para o holocausto. O cordeiro não é Isaac, nem o carneiro, é o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo e de que fala o Evangelho. Em Isaac, carregado com a lenha para o sacrifício, vemos Cristo carregando a sua Cruz para o Calvário, onde vai ser oferecido em sacrifico pelo próprio Pai: «Deus não poupou o seu próprio Filho, mas entregou-o por todos nós», escreve Paulo aos Romanos (Rm 8, 32). O único sacrifício agradável ao Pai é o de Jesus, o grande dom do mesmo Pai aos homens. Para estarmos em comunhão com Deus, havemos de unir-nos ao sacrifício de Cristo, pela oblação de tudo o que somos, vivemos e fazemos.

    Oratio

    Pai santo, nós Te bendizemos, porque, em Cristo, nos chamas à comunhão contigo e nos tornas participantes na obra da salvação. Nós Te oferecemos a nossa vida para que, no teu Filho, se torne sacrifício que purifique o mundo do pecado. Nós Te apresentamos a nossa pobreza, para que, unida à dos irmãos, nos obtenha a plenitude da tua misericórdia. Transforma-nos pela força do Espírito e torna-nos homens de justiça e de paz, a fim de que todos creiam no teu amor e cheguem à plenitude do Reino. Amen.

    Contemplatio

    Jesus substituiu-se a todas as vítimas da Antiga Lei e a todas as intenções das almas cristãs até ao fim do mundo, para adorar e agradecer ao seu Pai. Fazia do mesmo modo com todas as reparações e com todas as orações. Oferecia-as no seu Coração, mudava a sua matéria grosseira em ouro puro. Dir-se-ia em linguagem comercial que valorizou todos os nossos sacrifícios de adoração, de acção de graças, de reparação e de orações. Com um simbolismo tocante, Deus, que tinha pedido o sacrifício de Isaac, aceitou depois um carneiro em troca; Deus que tinha pedido o sacrifício de todos os primogénitos, aceitou em troca um cordeiro ou duas pombas. No que se refere a Jesus, aceita apenas somente o resgate temporário e aparente, e a vítima começa a imolar-se na humildade, na obediência e no trabalho, aguardando os grandes dias da sua paixão e da sua morte. Ó Jesus, que emoção deve ter sido a do vosso coração de criança lá no Templo junto dos diversos altares, sobre a pedra tradicional do sacrifício de Abraão no lugar onde tantos milhões de cordeiros figurativos foram feridos no coração pela espada! Santa vítima, fazei de mim um verdadeiro oblato do vosso Coração, uma vítima de reparação e de amor no cumprimento quotidiano da minha regra e da vossa vontade. (Leão Dehon, OSP 3, p. 125s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Aqui estou!» (Gn 22, 1).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XIII Semana - Sexta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XIII Semana - Sexta-feira

    4 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 23, 1-4.19.1-8.62-67

    Sara viveu cento e vinte e sete anos. Foi esta a duração da sua vida. 2Morreu em Quiriat-Arbá, a actual Hebron, na terra de Canaã. Abraão foi lá para fazer o funeral de Sara e para a chorar. 3Retirando-se da presença da sua morta, Abraão falou assim aos hititas: 4«Sou estrangeiro e hóspede entre vós; permiti que eu adquira, como propriedade minha, um sepulcro na vossa terra, para que eu possa tirar a minha morta de diante de mim e sepultá-la.» 1Abraão estava velho, tinha uma idade já avançada, e o Senhor abençoara-o em tudo. 2Abraão disse ao mais antigo servo da casa, aquele que administrava todos os seus bens: «Coloca a tua mão sob a minha coxa. 3Quero que jures pelo Senhor, Deus do céu e da terra, que não escolherás para o meu filho uma mulher entre as filhas dos cananeus, no meio dos quais resido; 4mas irás à minha terra, à minha família, e nela escolherás mulher para o meu filho Isaac.» 5O servo respondeu: «E se a mulher não quiser vir comigo para esta terra, levarei então o teu filho para a terra de onde ela é natural?» 6Abraão disse-lhe: «Livra-te de levar para lá o meu filho! 7O Senhor, Deus do céu, que me tirou da casa de meu pai e da minha pátria, falou-me e jurou-me que daria esta terra à minha descendência; Ele enviará o seu mensageiro diante de ti, e trarás de lá uma mulher para o meu filho. 8Se ela não quiser seguir-te, ficarás desligado do juramento que te impus, mas de modo algum voltarás com meu filho, outra vez, para lá.» 62Ao cair da tarde, Isaac regressara do poço de Lahai-Roí; ele residia então no Négueb. 63Nessa tarde, em que saíra a dar uma volta pelos campos, ergueu os olhos e viu camelos a aproximarem-se. 64Também Rebeca, erguendo os olhos, o viu e desceu do camelo. 65Ela disse ao servo: «Quem é o homem que vem ao nosso encontro, pelo campo?» O servo respondeu: «É o meu amo.» Imediatamente Rebeca cobriu-se com o véu. 66O servo narrou a Isaac tudo quanto fizera. 67Depois, Isaac conduziu Rebeca para a tenda de Sara, sua mãe, recebeu-a por esposa, e amou-a. Assim, ficou Isaac reconfortado da morte de sua mãe.

    Abraão é hóspede em Canaã, e não possui um pedaço de terra para sepultar a esposa defunta. Por isso, entra em negociações com o Conselho da cidade de Hebron a fim de adquirir uma propriedade onde construir o túmulo para Sara. A posse do terreno tornava-o cidadão do lugar. Com a ajuda de Deus, acaba por comprar a gruta de Macpela e aí sepulta Sara. Essa sepultura torna-se penhor da promessa da posse de toda a terra. Mais uma vez, o Patriarca é chamado a viver de fé, na esperança dos bens futuros que lhe são dados apenas como arras (cf. Heb 11, 13-16).
    A longa narrativa do capítulo 24, que tem o sabor de uma novela, é-nos oferecida, hoje, no texto que escutamos, apenas nos seus versículos iniciais e finais. Mostra-nos que Deus leva por diante a sua acção de escolha e de bênção em relação a Abraão. Este, tendo chegado ao termo da sua vida, confia ao seu servo mais velho o encargo de procurar mulher para Isaac entre os familiares do Patriarca. Eliézer concluiu felizmente a sua missão porque Deus realiza as suas promessas de uma terra e de uma descendência para Abraão. Rebeca acolhe o projecto de Deus e torna-se mãe de Israel, instrumento de perpetuação das bênçãos divinas. Isaac perdera a mãe mas, agora, tem na sua esposa uma nova mãe de Israel.

    Evangelho: Mateus 9, 9-13

    Naquele tempo, 9Jesus viu um homem chamado Mateus, sentado no posto de cobrança, e disse-lhe: «Segue-me!» E ele levantou-se e seguiu-o. 10Encontrando-se Jesus à mesa em sua casa, numerosos cobradores de impostos e outros pecadores vieram e sentaram-se com Ele e seus discípulos. 11Os fariseus, vendo isto, diziam aos discípulos: «Porque é que o vosso Mestre come com os cobradores de impostos e os pecadores?» 12Jesus ouviu-os e respondeu-lhes: «Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os doentes. 13Ide aprender o que significa: Prefiro a misericórdia ao sacrifício. Porque Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores.»

    O autor do primeiro evangelho apresenta-nos uma catequese sobre o pecado e sobre a reconciliação, unificando duas narrativas originariamente diferentes: uma sobre a vocação de Mateus e outra sobre a discussão suscitada pelo comportamento de Jesus, que andava na companhia de pecadores e de publicanos. A vocação de Mateus é apresentada em duas pinceladas que resumem o essencial: Mateus estava sentado à mesa dos impostos, pelo que ficamos a saber que era publicano; e, depois, a sua obediência imediata à palavra de Jesus, que o manda segui-Lo. O centro de interesse do evangelista está na palavra exigente de Jesus: «Segue-me». O chamamento feito por Jesus tem o mesmo tom imperativo, que Javé usara no Antigo Testamento. Por isso, era indiscutível e irrecusável. Mateus responde generosamente com plena liberdade e obediência. A obediência da fé.
    A pergunta dos fariseus aos discípulos traduzia o escândalo e o descrédito que as «más companhias» de Jesus suscitavam nos bem-pensantes. A resposta de Jesus é desconcertante. A partir dela poderíamos raciocinar assim: Já que Deus se preocupa mais com o pecador do que com o justo, sejamos pecadores. Paulo refere que havia quem assim pensasse (cf. Rm 6, 1). Mas Jesus não glorifica o pecado nem o pecador. Apenas o quer libertar, perdoar, e não considerá-lo inimigo, como faziam os teólogos da época. Quer reintegrá-lo na comunidade dos homens e na amizade de Deus.

    Meditatio

    A primeira leitura apresenta-nos Abraão como pai na fé, que continua a acreditar na Palavra de Deus, para além de toda a evidência sensível. Acolhe o projecto de Deus, esperando contra toda a esperança. A sua adesão a Deus torna-se, com o passar do tempo, cada vez mais convicta, mais audaz, mais animada por uma certeza que não vacila.
    No evangelho, Jesus convida a segui-l´O um homem que provém do círculo dos publicanos, odiados e desprezados pelos fariseus, que consideram indiscutível, para quem quer ser "justo", a separação dos pecadores. Mas o escândalo aumenta quando Jesus não o afasta da chusma dos seus colegas, e até ousa sentar-se com eles à mesa «numerosos cobradores de impostos e outros pecadores vieram e sentaram-se com Ele e seus discípulos», informa Mateus (v. 10). Os fariseus atrevem-se a perguntar aos discípulos: «Porque é que o vosso Mestre come com os cobradores de impostos e os pecadores?» (v. 11). Jesus intervém para responder com decisão: «Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os doentes. Ide aprender o que significa: Prefiro a misericórdia ao sacrifício. Porque Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores.» (vv. 12-13).
    Reconhecer-se pecador é o primeiro degrau para a santidade, pois só q
    uem se coloca entre os pecadores alcança misericórdia. Também a verdadeira reparação consiste, em primeiro lugar, em reconhecer-nos pecadores e em abrir-nos à acção purificadora, renovadora, reparadora do Espírito de Deus. Lemos nas nossas Constituições: «Implicados no pecado, mas participantes na graça redentora, pela realização de todas as nossas tarefas, queremos unir-nos a Cristo presente na vida do mundo e, em solidariedade com Ele e com toda a humanidade e a criação inteira, oferecer-nos ao Pai como oblação viva, santa e agradável (cf. Rm 12,1) (Cst 22). O texto prossegue, citando Paulo: "Caminhai no amor segundo o exemplo de Cristo que nos amou e Se entregou por nós a Deus, como oferenda e sacrifício de agradável odor" (Ef 5,2)». Quem reconhece o seu pecado e se abre ao acolhimento da misericórdia de Deus, pode caminhar no amor e oferecer-se com Cristo e como Cristo, tornando-se oblação santa e agradável para alegria de Deus e salvação da Humanidade.

    Oratio

    Pai misericordioso, conscientes da nossa condição de pecadores, mas também da nossa participação na graça redentora, em união com Cristo e solidários com Ele, queremos oferecer-nos a Ti como oblação viva, santa e agradável. Converte-nos e converte todos os nossos irmãos, para que, buscando o teu rosto como o único bem necessário, nos consagremos inteiramente ao louvor da tua glória. Amen.

    Contemplatio

    O sangue de Jesus estava substancialmente unido à divindade. Que preço não tinha ele? Uma só gota podia resgatar todos os homens, uma só gota podia abrir-nos todos os tesouros das bênçãos divinas. Oh! Como somos ricos por este sangue! O ouro e a prata, ao lado dele, nada mais são do que lixo, como diz S. Paulo. O mundo actual está desolado pela incredulidade, pela impiedade, pela corrupção, mas o sangue do Redentor está lá. Ofereçamo-lo a Deus sem nos cansarmos e sem perdermos a coragem. Ele grita por misericórdia melhor que o sangue de Abel. «A fonte, diz Zacarias, está aberta para a casa de David e para os habitantes de Jerusalém, para lavar todos os pecados» (Zac 13,1). A fonte está aberta, levemos lá os pecadores pelas nossas orações, esperando que aí os possamos conduzir pelo nosso apostolado. A fonte está aberta, apresentemos-lhe também os justos, para que eles se justifiquem ainda mais. Vamos lá nós também, com os pecadores para nos purificarmos, com os justos para nos tornarmos mais fortes e mais actuantes, para nos inebriarmos da virtude do apostolado. Oh! Como temos necessidade desta bebida de vida! Estamos tão inertes e tão fracos, tanto na oração como na acção! Vamos ao Coração de Jesus, o seu sangue brota lá como uma torrente impetuosa. Como a fonte misteriosa do Éden, regará todo o paraíso das almas e o fecundará. Todas as noites, em recordação da abertura desta fonte sagrada no calvário, oferecerei a Deus este sangue precioso pelo mundo e pela minha alma. (Leão Dehon, OSP 3, p. 322s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores» (Mt 9, 13).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XIII Semana - Sábado

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XIII Semana - Sábado

    5 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 27, 1-5.15-29

    Isaac estava velho e os seus olhos enfraqueceram-se tanto que já não via. Chamou Esaú, seu primogénito, e disse-lhe: «Meu filho!» Ele respondeu: «Aqui estou.» 2Isaac disse: «Como vês, estou velho e desconheço qual será o dia da minha morte. 3Peço-te que tomes as tuas armas, a aljava e o arco, vás para o campo e, quando tiveres caçado alguma coisa, 4faz-me um guisado suculento como eu gosto e traz-mo para eu comer, a fim de te abençoar antes de morrer.» 5Ora, Rebeca estava à escuta e ouviu o que Isaac dizia a Esaú, seu filho. E Esaú foi para o campo caçar alguma coisa, para depois trazer ao pai. 15E Rebeca escolheu as mais belas roupas de Esaú, seu filho mais velho, as mais belas que tinha em casa, e vestiu-as a Jacob, seu filho mais novo. 16Depois, cobriu-lhe as mãos e o pescoço, que não tinham pêlos, com a pele dos cabritos, 17e colocou nas mãos de Jacob, seu filho, o guisado suculento e o pão, que ela preparara. 18Jacob foi ter com o pai e disse-lhe: «Meu Pai.» Isaac respondeu: «Estou aqui.» «Mas quem és tu, meu filho?» 19Jacob respondeu a seu pai: «Sou Esaú, teu primogénito; fiz o que me pediste. Peço-te, pois, que te levantes, que te sentes e comas da minha caça, a fim de me abençoares.» 20Isaac disse: «Como pudeste encontrar caça tão depressa, meu filho?» E Jacob respondeu: «Porque o Senhor, teu Deus, trouxe-a para diante de mim.» 21Isaac disse a Jacob: «Anda, aproxima-te para eu te tocar, meu filho, e ver se és realmente o meu filho Esaú ou não.» 22Jacob aproximou-se de Isaac, seu pai, que o tocou e disse: «A voz é a voz de Jacob, mas as mãos são as de Esaú.» 23Ele não o reconheceu por estarem as suas mãos peludas como as do seu irmão Esaú. Dispôs-se a abençoá-lo, 24mas ainda voltou a perguntar-lhe: «És, na verdade, o meu filho Esaú?» Jacob respondeu: «Sim.» 25Isaac disse: «Serve-me a tua caça, para que eu coma e te abençoe.» Jacob serviu-o e ele comeu; levou-lhe também vinho e ele bebeu. 26Então, Isaac, seu pai, disse-lhe: «Aproxima-te, meu filho, e dá-me um beijo.» 27Jacob aproximou-se e beijou-o. E, ao sentir a fragrância das suas roupas, Isaac abençoou-o, dizendo: «Sim! O odor do meu filho é como odor de um campo abençoado pelo Senhor. 28Que Deus te conceda o orvalho do céu e a fertilidade da terra, trigo e mosto em abundância! 29Que os povos te sirvam e as nações se prostrem na tua presença! Sê o senhor dos teus irmãos; diante de ti se curvem os filhos da tua mãe! Maldito seja quem te amaldiçoar, e bendito seja quem te abençoar.»

    Jacob não é uma figura exemplar, como Abraão, o primeiro dos Patriarcas. Se o seu povo colocou em Abraão os traços que considerou ideais na relação com Deus e com os homens, em Jacob colocou, sobretudo, a outra face de si mesmo, a egoísta, ambiciosa e titânica diante de Deus e dos homens. Desse modo se confessou a si mesmo pecador e necessitado de salvação. A História da Salvação é feita da humanidade real, que tem essas duas faces.
    O Capítulo 27 do Génesis é outra obra-prima de arte narrativa e dramática, capaz de envolver profundamente o leitor, seduzido pelos traços de humor e de piedade, de astúcia e mesquinhez, aspectos que chocam a nossa sensibilidade moral, mas que também oferecem o tecido em que transparece o desígnio de Deus. Isaac na narrativa bíblica é uma figura de transição entre as duas grandes personagens que são Abraão e Jacob.
    Rebeca, mãe de Jacob torna-se injusta para com o filho mais velho, Esaú. Mas esse facto faz emergir ainda mais claramente a «justiça de Deus». Deus ama a todos, mas não do mesmo modo. Quando os homens entram em jogos desonestos na relação uns com os outros, Deus faz apenas o jogo puríssimo da graça, cuja economia não está ligada nem condicionada pela natureza. A graça é gratuita e não pode ser merecida pelo homem. Está ligada às opções de Deus, e não às nossas. Jacob ficará conhecido como aquele que transgrediu e revirou o costume da precedência oriental do filho mais velho sobre o mais novo, roubando a bênção ao pai cego. Mente três vezes. E Deus serve-se dessas mentiras para levar por diante o seu projecto. Jacob irá sofrer as consequências de tal mentira, com 20 anos de afastamento e de servidão em casa de Labão.

    Evangelho: Mateus 9, 14-17

    Naquele tempo, foram ter com Ele os discípulos de João, dizendo: «Porque é que nós e os fariseus jejuamos e os teus discípulos não jejuam?» 15Jesus respondeu-lhes: «Porventura podem os convidados para as núpcias estar tristes, enquanto o esposo está com eles? Porém, hão-de vir dias em que lhes será tirado o esposo e, então, hão-de jejuar.» 16«Ninguém põe um remendo de pano novo em roupa velha, porque o remendo puxa parte do tecido e o rasgão torna-se maior. 17Nem se deita vinho novo em odres velhos; de contrário, rompem-se os odres, derrama-se o vinho e estragam-se os odres. Mas deita-se o vinho novo em odres novos; e, desta maneira, ambas as coisas se conservam.»

    Jesus apresenta-se como o Messias esperado. Na linguagem simbólica oriental, as bodas simbolizavam o tempo da salvação. A imagem de Deus-Esposo, e das bodas como tempo da salvação, é recorrente no Antigo Testamento, particularmente em Oseias e em Isaías. O que havia de realmente novo nas palavras de Jesus era que Ele se apresentasse, realizando na sua pessoa, o conteúdo de um símbolo utilizado por Deus para descrever a sua relação de amor com o povo eleito (cf. Os 2, 18-20; Is 54, 5-6). A esperança de que Deus se mostraria a Israel como esposo fiel, como verdadeiro marido, estava realizada em Jesus. O que agora importava era fazer parte dos amigos do noivo para se alegrarem nas suas bodas. O acto de comer já não podia ser conotado com renúncia, sacrifício, luto. Passara o que era velho. Chegara a plenitude dos tempos. Na presença de Jesus, o esposo ressuscitado da Igreja, o jejum, como sinal de luto, não é atitude conveniente. Se o cristão jejua, é para manifestar a sua espera confiante no regresso do Senhor. Aliás, a morte do Ressuscitado é celebrada, não no jejum, mas no comer o pão e beber o vinho, até que Ele volte!
    A novidade introduzida no mundo por Jesus é ainda significada pelas imagens do pano novo e do vinho novo. A sua mensagem só pode ser recebida por um mundo novo, por homens novos, isentos de preconceitos, que se deixem moldar pelo Espírito.
    Passou o que era antigo. Mas isso não queria dizer que tudo o que era antigo não tivesse valor. Por isso, Mateus acrescenta: «Desta maneira, ambas as coisas se conservam» (v. 17).

    Meditatio

    Podemos ficar desconcertados com a primeira leitura de hoje. Como é possível que Deus tolere a fraude orques
    trada por Rebeca? Mas Deus - Aquele que é verdadeiramente santo e fonte de toda a santidade - é capaz de "passar" por entre as intrigas e as baixezas humanas. Passa por elas deixando-se ferir profundamente, mas de modo soberano, como vencedor. Apesar de tanta miséria, brotará um Rebento, uma Fonte de água viva. Nascerá para nós um Salvador, um Deus connosco, um Deus em nós. Ele será para todos os homens a novidade, a juventude sem ocaso, a possibilidade de viver eternamente em Deus. Por isso, em vez de nos lamentarmos pelo dia de ontem, que acrescentou o seu peso ao fardo que já carregávamos, acolhamos com admiração o dia de hoje, o dom extraordinário que Deus nos oferece, o seu perdão que nos transfigura, que nos faz filhos de Deus.
    As leituras, que hoje escutamos, mostram-nos que o dom de Deus é uma coisa realmente nova, gratuita, desconcertante. Jesus repetiu esta mesma lição muitas vezes. Para a graça de Deus, não há direitos adquiridos, não há regras. Deus é livre e generoso. Cabe-nos aceitar essa generosidade estupenda e desconcertante, que, por assim dizer, se diverte a fazer o que ninguém ousaria esperar. Na verdade, Deus «derruba os poderosos dos seus tronos e exalta os humildes; enche de bens os famintos e despede os ricos de mãos vazias» (cf. Lc 1, 52-53). Quem pensava ter direito à graça divina, não a recebeu. Quem não reivindicava quaisquer direitos, foi dela repleto. Abandonemos, pois, as nossas categorias mentais sobre méritos e direitos. Abramo-nos com simplicidade e humildade às novidades da graça. Que a nossa alma libertada, alegre, pondo de parte toda a mesquinhez dos cálculos humanos, exulte e dance na liberdade. Assim daremos testemunho da generosidade do nosso Pai celeste.

    Oratio

    Senhor Jesus, a tua Encarnação trouxe novidade ao mundo. Vieste preparar um banquete nupcial para o qual convidas todos, sem excluir ninguém. Entramos nele com as nossas vidas mais ou menos atormentadas, mais ou menos marcadas por sinais de ambiguidade, e pelos compromissos com que tentamos afastar o tédio, a solidão, o medo da morte. Tu, Senhor da vida e Esposo da Humanidade, a todos convidas e para todos reservas um lugar de honra. Dá a todos os homens a graça de saborearem, de coração agradecido, a felicidade de estar contigo à mesa eucarística, onde partilhas o vinho novo do amor e da alegria, o cálice do teu sangue derramado para nossa salvação. Amen.

    Contemplatio

    O Coração de Jesus ensina-nos a humildade e dá-nos essa graça. Jesus é o doutor da humildade: «Aprendei de mim que sou doce e humilde de coração». Vamos receber as suas lições ao pé do tabernáculo. Ele está lá sem acção aparente e sem glória exterior. E eu, eu gosto do sucesso e dos louvores dos homens! Ele está lá paciente e doce, e eu sou susceptível, impaciente, irascível mesmo, quando deparo com a contradição e o insucesso. O Coração tão humilde e tão doce de Jesus não pode ser honrado senão por senão por corações humildes e doces. Ele não quer orgulhosos. Bem o mostrou por todas as suas palavras severas contra os Fariseus. Mas como é que eu hei-de adquirir esta humildade? Hei-de pedi-la ao Coração de Jesus mesmo. Ele é a sua fonte como é o seu modelo. É Ele que dá esta graça: «Vinde a Mim, vós todos que sofreis esta praga do orgulho, e Eu vos curarei». Sim, meu bom Mestre, «o discípulo não deve estar acima do Mestre». Hei-de imitar a vossa humildade. O servo deve estar ao serviço do senhor. Hei-de revestir-me de humildade e de doçura. Hei-de gostar de ser ignorado e de não servir para nada. Hei-de preferir o último lugar e deixar as honras para os meus irmãos. Hei-de meditar muitas vezes na vossa humildade. É uma ciência difícil, mas que posso aprender depressa e facilmente junto de um tão bom mestre. (Leão Dehon, OSP 4, p. 508).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Derruba os poderosos dos seus tronos e exalta os humildes» (Lc 1, 52).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XIV Semana - Segunda-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XIV Semana - Segunda-feira

    7 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 28, 10-22 a

    Naqueles dias, 10Jacob saiu de Bercheba e tomou o caminho de Haran. 11Chegou a determinado sítio e resolveu ali passar a noite, porque o sol já se tinha posto. Serviu-se de uma das pedras do lugar como travesseiro e deitou-se. 12Teve um sonho: viu uma escada apoiada na terra, cuja extremidade tocava o céu; e, ao longo desta escada, subiam e desciam mensageiros de Deus. 13Por cima dela estava o Senhor, que lhe disse: «Eu sou o Senhor, o Deus de Abraão, teu pai, e o Deus de Isaac. Esta terra, na qual te deitaste, dar-ta-ei, assim como à tua posteridade. 14A tua posteridade será tão numerosa como o pó da terra; estender-te-ás para o ocidente, para o oriente, para o norte e para o sul, e todas as famílias da Terra serão abençoadas em ti e na tua descendência. 15Estou contigo e proteger-te-ei para onde quer que vás e reconduzir-te-ei a esta terra, pois não te abandonarei antes de fazer o que te prometi.» 16Despertando do sono, Jacob exclamou: «O Senhor está realmente neste lugar e eu não o sabia!» 17Atemorizado, acrescentou: «Que terrível é este lugar! Aqui é a casa de Deus, aqui é a porta do céu.» 18No dia seguinte de manhã, Jacob agarrou na pedra que lhe servira de travesseiro e, depois de a erguer como um monumento, derramou óleo sobre ela. 19Chamou a este sítio Betel, quando, originariamente, a cidade se chamava Luz. 20Jacob fez, então, o seguinte voto: «Se Deus estiver comigo, se me proteger durante esta viagem, se me der pão para comer e roupa para vestir, 21e se eu regressar em paz à casa do meu pai, o Senhor será o meu Deus. 22E esta pedra, que eu erigi à maneira de monumento, será para mim casa de Deus.

    O conflito entre Jacob e Esaú, devido ao roubo da bênção paterna por parte do primeiro, provoca um movimento de fuga, que permite o encontro de dois ciclos da tradição: o que situa Jacob no clã de Isaac, em Bercheba, e o que o relaciona com Labão, na Mesopotâmia. Além da fuga, essa deslocação é motivada pela procura de uma esposa na Mesopotâmia, tal como fizera Abraão para o seu filho Isaac, Jacob passa por Betel. A visão nocturna que aí tem é um dos mais densos momentos de todas as tradições. Jacob recebe a promessa que o situa no seguimento da história iniciada em Abraão, numa teofania que lateralmente legitima o santuário de Betel. O compromisso solene de Deus torna a fuga de Jacob um caminho cujo sentido se acentua na presença penetrante de Deus, que realiza tudo quanto disse. De facto, Deus acompanhará e guardará Jacob mesmo no momento triste da fuga de Labão (31, 1-21) e revelar-se-á novamente, como presença amiga e garantia de bênção, no regresso a Betel (35, 1-15).
    Neste contexto, encontramos uma série de elementos de natureza cultual que formam o esqueleto da narrativa: "lugar" (maqôm), que não sugere a existência de um lugar sagrado, mas apenas um espaço para passar a noite. Como aconteceu com Moisés no episódio da sarça ardente (Ex 3, 5), também Jacob experimenta que a presença divina precede a consciência do homem: é Deus quem escolhe e consagra o espaço sagrado. Esse é também lugar onde se revela. O sonho, em que Jacob "vê" a escada que se apoiava na terra e tocava o céu, indica a consciência da fé na qual é possível "ver" o Deus transcendente, que se torna presente ao homem para repetir a sua bênção. Como a Abraão, Deus promete a Jacob a terra e descendência. A oração de Jacob é a única resposta possível ao homem de fé, que experimenta o "terror" de uma presença santa e terrível.

    Evangelho: Mateus 9, 18-26

    Naquele tempo, estava Jesus a falar aos seus discípulos, quando um chefe se prostrou diante dele e disse: «Minha filha acaba de morrer, mas vem impor-lhe a tua mão e viverá.» 19Jesus, levantando-se, seguiu-o com os discípulos. 20Então, uma mulher, que padecia de uma hemorragia há doze anos, aproximou-se dele por trás e tocou-lhe na orla do manto, 21pois pensava consigo: 'Se eu, ao menos, tocar nas suas vestes, ficarei curada.' 22Jesus voltou-se e, ao vê-la, disse-lhe: «Filha, tem confiança, a tua fé te salvou.» E, naquele mesmo instante, a mulher ficou curada. 23Quando chegou a casa do chefe, vendo os flautistas e a multidão em grande alarido, disse: 24«Retirai-vos, porque a menina não está morta: dorme.» Mas riam-se dele. 25Retirada a multidão, Jesus entrou, tomou a mão da menina e ela ergueu-se. 26A notícia espalhou-se logo por toda aquela terra.

    A ressurreição da filha de Jairo e a cura da mulher que sofria de um fluxo de sangue, dois episódios embutidos na página evangélica, que hoje escutamos, mostram-nos que Jesus tem poder sobre a morte, que é o vencedor da morte, que é a ressurreição e vida. Sendo o Messias, vem trazer o reino de Deus, onde a morte não tem a última palavra. O Reino de Deus é vida. A existência de Jesus é uma parábola em acção: caminha para a morte, para a vencer na ressurreição. A fé em Jesus faz passar da morte à vida.
    Jairo chega a casa de Mateus, onde Jesus fala de núpcias, de pano novo e de vinho novo (cf. 9, 16s.). As palavras do «chefe» da sinagoga (cf. Mc 5, 35; Lc 8, 41) introduzem o lamento pela morte da filha de 12 anos, e a súplica a Jesus para que lhe dê novamente a vida. Jesus levanta-se e vai a caminho da casa da defunta, quando uma mulher, que sofria de hemorragias, lhe toca na borla do manto. A sua fé dizia-lhe que isso bastava para ser curada. Efectivamente, Jesus diz-lhe: «Filha, tem confiança, a tua fé te salvou» (v. 22). Se perder sangue significa risco de morte, a cura da mulher preludia a vitória da Vida, em casa de Jairo: «a menina não está morta: dorme» (v. 24). Jesus é o vencedor da morte. É a Vida. Acreditar n´Ele, dar-Lhe espaço em nós, acolher a sua pessoa, é acolher a Vida, porque Jesus que, por nós experimentou a morte, a tragou pela sua ressurreição (cf. 1 Cor 15, 55). Para o crente, a morte corporal é como um simples sono e, deixar-se «tocar» por Jesus, é certeza de ressurreição. A vida, como caminho para a plenitude das núpcias de amor eterno, confiando em Jesus, tem nesta página uma exemplar interpretação. Viver é caminhar na fé, tocar e deixar-se tocar por Cristo vivo na Palavra, na eucaristia e no próximo.

    Meditatio

    As leituras de hoje levam-nos a rezar: Senhor, abre-nos os olhos e aumenta em nós a fé, para que possamos ver as coisas na sua verdadeira e profunda realidade.
    A primeira leitura fala-nos de Jacob que, na sua fuga, chega a certo lugar onde resolve passar a noite. Toma por travesseiro uma pedra. Deus revela-se presente nessa pedra, e Jacob reconhece-O: «O Senhor está realmente neste lugar» (v. 16). Jacob ignorava a possibilidade de uma relação entre o céu e a terra. Mas o Senhor revelou-lha: «viu uma escada apoiada na terra, cuja extr
    emidade tocava o céu; e, ao longo desta escada, subiam e desciam mensageiros de Deus» (v. 12). Aquela não era uma pedra qualquer. Era o lugar da presença de Deus.
    Quantas vezes, durante a nossa vida, apenas vemos "pedras", fixando-nos no aspecto imediato das realidades. Pode ser uma doença, uma contrariedade, um fracasso, uma desavença no trabalho ou na família. Tudo nos parece "pedras" no nosso caminho. Mas, se tivermos fé, descobriremos que essas "pedras" não são a realidade total. Para além das aparências, está presente o amor do Senhor, que nos oferece a possibilidade de uma relação viva com Ele, de uma transformação da realidade quotidiana em que nos situamos.
    O evangelho também nos mostra que a fé vê na realidade novas possibilidades, invisíveis para quem não tem fé. A mulher doente tocou em Jesus com fé: «Se eu, ao menos, tocar nas suas vestes, ficarei curada» (v. 21). Foi um contacto bem diferente dos das outras pessoas que rodeavam Jesus. Marcos diz-nos que, ao ser tocado pela mulher, se voltou e perguntou quem o tocara. Os discípulos não tiveram dúvidas em responder: «Vês que a multidão te comprime de todos os lados, e ainda perguntas: 'Quem me tocou?» (Mc 5, 31). Mas Jesus «continuava a olhar em volta, para ver aquela que tinha feito isso» (Mc 5, 32). Aquele fora um toque diferente, um toque com fé. O Senhor sabia-o. Por isso, afirma: «Filha, tem confiança, a tua fé te salvou» (v. 22). No episódio da filha de Jairo, Jesus expressa o que a fé vê, quando afirma: «a menina não está morta: dorme» (v. 24). Parece morta. Mas a fé vê que pode voltar à vida. Para quem não tem fé, são palavras sem sentido. Por isso é que o evangelho informa: «riam-se dele» (v. 24). Vêem a realidade concreta, e não enxergam as possibilidades que a fé oferece a quem crê. Por isso, afirmam: «É mais do que evidente que está morta. Não pode voltar à vida».
    Nós, os crentes, somos chamados a ver as novas possibilidades que a fé nos oferece, incluindo a transformação de realidades de morte em realidades de vida. É pela fé que os Sacramentos se tornam eficazes para nós. Não basta tocar o Senhor, ou ser por Ele tocados. Não basta, por exemplo, comungar para nos tornarmos santos. É preciso acolher o Senhor na fé.

    Oratio

    Senhor, meu Deus, Tu és Luz viva e fecunda. Nada em Ti é obscuro, nada em Ti é morte. Tu dás a vida a todas as criaturas, e ofereces o pão para toda a fome. Tu sacias toda a sede, e és paz para quem procura o teu rosto, e o contempla na nudez da própria carne. Bendito és Tu, Senhor! Bendito para sempre!
    Senhor, eu creio, mas aumenta a minha fé para que possa descobrir a tua presença amorosa e solícita em todas as situações, em todos os momentos da minha vida. Para Ti, não há pedras, por duras, opacas e informes que sejam, onde não Te possamos encontrar e ver o teu rosto. Senhor, Deus de Abraão, de Jacob, de Jesus Cristo, aumenta a minha fé para que possa reconhecer-Te em tudo e sempre. Amen.

    Contemplatio

    Sabemos que a misericórdia de Nosso Senhor aceita as nossas cruzes dignamente suportadas como um empréstimo que retribuirá com usura. Uma ligeira tribulação prepara-nos um peso imenso de glória, acima de toda a medida (2Cor 4, 17). Que troca vantajosa! Que trazemos nós da nossa parte? Um nada, um desprezo, uma humilhação, uma doença, uma privação, tudo sofrido com paciência, com confiança e com fé. E Nosso Senhor vem com a sua graça, com a sua consolação, com o seu amor, com o seu reino. A nossa resignação toca-o, atrai-o, Ele vem, leva a maior parte da nossa pena, ajuda-nos a levar a outra, enxuga as nossas lágrimas, santifica-nos e coroar-nos-á. Não vemos também que a humilhação é a nossa salvação? Escutemos o rei David: «Foi para meu bem, Senhor, que vós me humilhastes» (Sl 118). A prosperidade cega-nos. Desconhecemos as bondades de Deus e a nossa pobreza, não sabíamos que tudo devemos a Deus e já não pensávamos que temos necessidade dele. Se não nos tivesse entregado às vezes ao sofrimento, a delicadeza, a moleza e a cobardia teriam tomado um terrível ascendente sobre a nossa alma. As suas flechas levam consigo a luz: à luz das tuas setas (Hab 3, 11). Elas não penetram no coração senão para aí levarem o remédio à preguiça, à infidelidade e às inclinações para os prazeres sensuais. (Leão Dehon, OSP 4, p. 362).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra
    «Tem confiança, a tua fé te salvou» (Mt 9, 22).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XIV Semana - Terça-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XIV Semana - Terça-feira

    8 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 32, 22-32 (hebr 23-33)

    Naqueles dias, Jacob 23levantou-se de noite, tomou as suas duas mulheres, as duas escravas e os seus onze filhos, e passou o vau de Jaboc. 24Ajudou-os a atravessar a torrente, e passou tudo o que lhe pertencia. 25Jacob tendo ficado só, alguém lutou com ele até ao romper da aurora. 26Vendo que não podia vencer Jacob, bateu-lhe na coxa, e a coxa de Jacob deslocou-se, quando lutava com ele. 27E disse-lhe: «Deixa-me partir, porque já rompe a aurora.» Jacob respondeu: «Não te deixarei partir enquanto não me abençoares.» 28Perguntou-lhe então: «Qual é o teu nome?» Ao que ele respondeu: «Jacob.» 29E o outro continuou: «O teu nome não será mais Jacob, mas Israel; porque combateste contra Deus e contra os homens e conseguiste resistir.» 30Jacob interrogou-o, dizendo: «Peço-te que me digas o teu nome.» «Porque me perguntas o meu nome?» - respondeu ele. E então abençoou-o. 31Jacob chamou àquele lugar Penuel; «porque vi um ser divino, face a face, e conservei a vida» - disse ele. 32O sol principiara a levantar-se, quando Jacob deixou Penuel, coxeando por causa da sua coxa. 33É por isso que os filhos de Israel não comem, ainda hoje, o nervo ciático que está na cavidade da coxa - porque Jacob foi ferido no nervo ciático da coxa, que ficou paralisado.

    Jacob, homem astuto, egoísta e titânico, despojou o irmão da herança, e teve que fugir para a Mesopotâmia. Aí reuniu uma imensa fortuna à custa de Labão, criando novo conflito. Obtido um acordo (31, 43-54), estando já próximo da terra dos pais, enviou mensageiros ao irmão Esaú «para obter a sua benevolência» (32, 6). A resposta foi a notícia da próxima chegada de Esaú com quatrocentos homens (v. 7). Jacob assusta-se e enche-se de angústia, abrindo-se à oração: «Ó Deus... salva-me, por favor, da mão do meu irmão Esaú» (10-13). A palavra de promessa não serena Jacob, mas também não o fecha em si mesmo, pois pressente uma presença que o guarda e defende. O combate noturno, com o rsultado obtido, é sinal da vitória de Jacob sobre todos os seus inimigos, incluindo a angústia que o atormenta, e confirma que a sua esperança é certa. Deus não o abandona. O nome de Israel, que Jacob assume depois do combate nocturno, porque, como diz o Senhor, «combateste contra Deus e contra os homens e conseguiste resistir», evoca um passado de lutas e de vitórias sobre forças inimigas. Deus defendeu Jacob de Esaú e de Labão. Jacob-Israel tem consigo a bênção divina, tal como Abraão. Por isso, tem esperança!
    O combate nocturno é, para Jacob, a entrada no mistério de Deus: «vi um ser divino, face a face, e conservei a vida» (v. 31). Entra no mistério de Deus por meio de uma luta na qual suplica, reza e se entrega nas mãos do antagonista, pois se vê obrigado a revelar o nome, enquanto o "adversário" esconde a sua identidade. Apenas a sua palavra o revela! Jacob mede forças com um Deus presente, mas misterioso, obscuro. Mas a sua persitência na luta, reconhecendo serenamente a sua condição de criatura, "obriga" Deus a abençoá-lo, a acolher as suas preces e a fazer brilhar um novo dia de salvação para um "homem novo": «O teu nome não será mais Jacob, mas Israel; porque combateste contra Deus e contra os homens e conseguiste resistir» (v. 29). Israel significa «Deus é forte». Esse nome, dado a Jacob indica que Deus está com ele. Israel continuará a lutar por saber quem é Deus, embora o tenha no próprio nome.

    Evangelho: Mateus 9, 32-38

    Naquele tempo, apresentaram-lhe um mudo, possesso do demónio. 33Depois que o demónio foi expulso, o mudo falou; e a multidão, admirada, dizia: «Nunca se viu tal coisa em Israel.» 34Os fariseus, porém, diziam: «É pelo chefe dos demónios que Ele expulsa os demónios.» 35Jesus percorria as cidades e as aldeias, ensinando nas sinagogas, proclamando o Evangelho do Reino e curando todas as enfermidades e doenças. 36Contemplando a multidão, encheu-se de compaixão por ela, pois estava cansada e abatida, como ovelhas sem pastor. 37Disse, então, aos seus discípulos: «A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos. 38Rogai, portanto, ao Senhor da messe para que envie trabalhadores para a sua messe.»

    Ao narrar a cura de um mudo, e ao referir a reacção dos adversários de Jesus, Mateus antecipa a luta renhida que o Senhor irá travar com os seus inimigos, e que será amplamente abordada no capítulo 12, a fim de preparar, para ela, os seus leitores. Além desta razão pedagógica, Mateus tem uma razão teológica. Fora anunciado que o Messias, entre outros prodígios, faria ouvir os surdos e falar os mudos, situações atribuídas ao demónio, inimigo do homem. Se Jesus realiza tais maravilhas, libertadoras da escravidão e limitações humanas, quebra o poder de Satanás, e só pode ser o Messias. O povo, mais propenso a reconhecer as maravilhas de Deus, reage com admiração. Os fariseus atribuem tais maravilhas ao poder satânico, que, segundo eles, actua por meio de Jesus.
    Mateus, logo a seguir, introduz o tema da missão, apresentando a itinerância de Jesus. Ele não permanece num determinado lugar, à espera dos discípulos, como faziam os rabis, mas percorre a Galileia, e vai até à terra dos gentios, proclamando o evangelho e curando todas as doenças (cf. v. 35). Há, em tudo isto, um ar de universalidade.
    O centro do nosso texto é aquele em que o evangelista capta o coração de Cristo que se enche de compaixão pela multidão cansada e abatida, «como ovelhas sem pastor» (v. 36). Para compreender bem este «encher-se de compaixão», convém saber que essa expressão traduz o verbo grego splanknízomai reservado à expressão dos sentimentos de Jesus e do Pai. Esse verbo expressa o amor materno de Jesus para connosco. O nosso sofrimento toca-o até ao ponto de o fazer com-padecer-se, com-sofrer connosco, de carregar sobre si as nossas dores, no seu mistério de morte e ressurreição.
    Jesus convida os discípulos a rezar ao Pai para que suscite pessoas dispostas a segui-Lo na tarefa da evangelização, semelhante ao trabalho da ceifa, pela sua urgência.

    Meditatio

    Os Padres da Igreja leram o episódio referido na primeira leitura como uma provação espiritual imposta por Deus a Jacob. A luta começou ao anoitecer e prolongou-se durante toda a noite: «Jacob tendo ficado só, alguém lutou com ele até ao romper da aurora.» (v. 25). Foi uma luta na escuridão da noite, mas, sobretudo, da consciência: «Peço-te que me digas o teu nome» (v. 30). Jacob não sabia com quem lutava. Seguiu o caminho escolhido. Mas Deus chamou-o a uma mudança interior por meio de uma luta com ele, uma luta prolongada e dura. Lembrando-nos de Abraão, podemos dizer que, também Jacob, teve de
    subir o seu monte Moriá, onde, depois de uma agonia de sofrimento e de obediência, Deus lhe confirma a sua promessa e a sua bênção.
    Abraão, embora tendo que lutar, pressente que o adversário não tem intenções malévolas, e compreende confusamente que Deus está próximo dele. Por isso, pede a bênção: «Não te deixarei partir enquanto não me abençoares» (v. 27). Jacob recebe, então, a bênção e um nome novo. Depois de lutar com Deus, viu confirmada a sua vocação. Agora, é um homem novo, um homem de Deus.
    No caminho espiritual de cada um de nós, acontece algo de semelhante. Escolhido o caminho, e feita a opção, logo surgem dificuldades. As certezas iniciais parecem evaporar-se, e surge a tentação de abandonar tudo. Então, é preciso lutar para permanecer firme nas próprias opções tomadas depois de cuidadoso discernimento espiritual. A noite escura da fé, de que falam S. João da Cruz e tantos outros místicos, é uma dessas situações em que podemos vir a encontrar-nos, particularmente quando já avançámos no caminho da santidade. O caminho espiritual será sereno e tranquilo se estivermos dispostos a aceitar, com abandono e confiança, os momentos difíceis que Deus permite para nos purificar. Também nisto, Jesus é o nosso modelo. A sua vida não teve só momentos de intimidade com o Pai e de exultação pela sua presença e acção de graças amorosa. A vida cristã, e particularmente «a vida reparadora será, por vezes, vivida na oferta dos sofrimentos suportados com paciência e abandono, mesmo na noite escura e na solidão, como eminente e misteriosa comunhão com os sofrimentos e com a morte de Cristo pela redenção do mundo» (Cst 24). «Para Glória e Alegria de Deus» (Cst 25).

    Oratio

    Senhor Jesus Cristo, dá-nos a graça de compreender que a nossa cooperação na obra da redenção, além de se chamar apostolado, mais cedo ou mais tarde, também se há-de chamar sofrimento, solidão e noite escura, imolação e morte. Dá-nos o teu Espírito Santo para que a nossa vida, mesmo nessas circunstâncias, continue a ser reparadora na oferta, na paciência e no abandono, na disponibilidade e na imolação, em comunhão com a tua paixão e morte redentoras, em favor dos irmãos. Contemplando o teu Coração aberto, sentimo-nos animados a percorrer o caminho, onde sabemos que nos precedeste, para nossa salvação e redenção do mundo. Amen.

    Contemplatio

    S. João não apenas compadeceu no martírio de Jesus, ele mesmo foi mártir. Nosso Senhor tinha-lhe predito: «Bebereis o mesmo cálice que eu, tinha-lhe dito, e sereis baptizados no mesmo baptismo». S. João foi, como Jesus, preso, encadeado e condenado. Sofreu o suplício do azeite a ferver. Foi enviado em exílio para Patmos. Diz-nos no Apocalipse: «Eu, João, vosso irmão, participei nas tribulações dos mártires e na sua paciência; fui atirado para a ilha de Patmos para dar testemunho de Jesus Cristo, cujo Evangelho pregava» (Ap 1, 9). S. João é para nós o modelo da reparação e da imolação, como é o modelo do amor do Salvador. Amou a reparação e o sacrifício. Esteve no martírio com alegria. Tinha ouvido Jesus dizer aos apóstolos: «Devo ser baptizado com o baptismo do meu sangue e tenho pressa que isso aconteça». Tinha ouvido também o «Surgite eamus», - levantai-vos e vamos ao encontro do traidor». Como é que não teria desejado também as provações que deviam torná-lo semelhante ao seu bom Mestre? (Leão Dehon, OSP 3, p. 407).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Mandai, Senhor,trabalhadores para a vossa messe» (cf. Mt 9, 38).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XIV Semana - Quarta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XIV Semana - Quarta-feira

    9 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 41, 55-57; 42, 5-7ª.17-24a

    Naqueles dias, 55quando a fome começou a manifestar-se no Egipto, o povo clamou por pão ao faraó; mas o faraó respondeu aos egípcios: «Ide ter com José; fazei o que ele vos disser.» 56Estendendo-se a fome a toda a terra, José abriu todos os celeiros e vendeu trigo aos egípcios. Mas a fome persistiu no país do Egipto. 57De todos os países vinham ao Egipto para comprar trigo a José. 5E os filhos de Israel foram comprar trigo, juntamente com outros que iam, pois também havia fome no país de Canaã. 6Ora José era governador do país; era ele que mandava distribuir o trigo a todo o povo do país. Quando os irmãos de José chegaram, prostraram-se diante dele com o rosto por terra. 7Vendo os irmãos, José reconheceu-os; dissimulou, porém, diante deles e falou-lhes com dureza. 17E fechou-os na prisão durante três dias. 18No terceiro dia, José disse-lhes: «Fazei o seguinte e vivereis, porque temo o Senhor: 19se procedeis de boa fé, que só um de vós fique detido na prisão, enquanto ireis levar às vossas famílias com que lhes matar a fome. 20Depois, trazei-me o vosso irmão mais novo: assim, as vossas palavras serão justificadas, e não morrereis.» E eles concordaram. 21Disseram, então, uns aos outros: «Na verdade, nós estamos a ser castigados por causa do nosso irmão; vimos o seu desespero quando nos implorou compaixão, e não o escutámos. Por isso veio sobre nós esta desgraça.» 22Rúben respondeu-lhes nestes termos: «Eu bem vos dizia, então: 'Não pequeis contra o menino!' Mas não me escutastes. Agora respondemos pelo seu sangue.» 23Ora eles não sabiam que José os compreendia, porque lhes falava por meio de um intérprete. 24José afastou-se deles e chorou. Depois voltou para junto dos irmãos e falou-lhes.

    A figura de José predomina no último ciclo do Génesis (cc. 37-50). José encarna a imagem do sábio, tal como os egípcios a entendiam: um homem que pela sua sabedoria ascende a altos cargos e os desempenha com destreza. Sendo hebreu, a sua sabedoria apresenta matizes da sabedoria de Israel.
    Nesta secção delineia-se uma reflexão sobre a presença de Deus na história da humanidade, que não recorre a acções poderosas ou às teofanias. Deus revela-se no interior da história dos homens, nas opções dos homens e mulheres, no emaranhado da história de cada um de nós. José é imagem de todo o homem que, na fé, sabe que Deus não abandona os seus eleitos.
    É neste contexto que compreendemos a narrativa do primeiro encontro de José com os seus irmãos, depois de ter sido vendido aos ismaelitas. Tendo obtido o mais elevado sucesso, não aproveita para exercer qualquer vingança sobre os irmãos. O seu modo de agir tem por objectivo levar os irmãos a um profundo exame de consciência sobre o que tinham feito contra ele (42, 22), e a dar-se conta de que a vida não pode gastar-se na violência ou, pior ainda, na violência como critério em vista do "lucro" (cf. 37, 26): «Judá disse aos irmãos: «Que vantagem tiramos da morte de nosso irmão, ocultando o seu sangue?» (37, 26). Na tradição litúrgica, José tornou-se imagem de Cristo e do crente. Tornou-se figura d´Aquele que, anunciando a misericórdia do Pai, mostra que o lucro da própria existência consiste em fazer a vontade de Deus. Tornou-se imagem do crente, em Cristo, verdade do homem, procura e realiza a fraternidade.

    Evangelho: Mateus 10, 1-7

    Naquele tempo, Jesus chamou doze discípulos e deu-lhes poder de expulsar os espíritos malignos e de curar todas as enfermidades e doenças. 2São estes os nomes dos doze Apóstolos: primeiro, Simão, chamado Pedro, e André, seu irmão; Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão; 3Filipe e Bartolomeu; Tomé e Mateus, o cobrador de impostos; Tiago, filho de Alfeu, e Tadeu; 4Simão, o Zelota, e Judas Iscariotes, que o traiu. 5Jesus enviou estes doze, depois de lhes ter dado as seguintes instruções: «Não sigais pelo caminho dos gentios, nem entreis em cidade de samaritanos. 6Ide, primeiramente, às ovelhas perdidas da casa de Israel. 7Pelo caminho, proclamai que o Reino do Céu está perto».

    Mateus apresentou várias vezes Jesus como novo Moisés, que funda o novo povo de Deus. O antigo povo de Deus era formado por 12 tribos. O novo povo de Deus tem as características da universalidade, que o número 12 significa. Jesus, novo Moisés, funda o novo povo de Deus, a Igreja. Os Doze são chamados para «estarem» com o Senhor e «ser enviados» por Ele aos irmãos. Foram chamados pelo nome, isto é, dentro da própria identidade, desde sempre pensada por Deus que, por amor, começa por chamar à vida. Em Mateus, como em Lucas (9, 1), Jesus confere o seu mesmo «poder» que se manifesta na vitória sobre as forças demoníacas e na cura de males parciais (as doenças) como antecipação e sinal da libertação total do mal.
    Mateus apresenta a lista dos nomes dos apóstolos, seguindo a mesma ordem de Marcos ( 3, 16-19) e de Lucas (6, 14-16). Encabeça a lista «Simão, chamado Pedro» (v. 2). Seguem os outros nomes, dois a dois. Mateus não se envergonha de acrescentar ao seu nome próprio, o de ofício: publicano. Encerra a lista Judas Iscariotes, «que o traiu» (v. 4). Seguem-se algumas instruções de Jesus: começar a «missão» pelos israelitas, e anunciar o Reino de Deus. Assim se cumprirá a promessa feita a Abraão: «Na tua descendência serão abençoadas todas as famílias da Terra» (cf. Act 3, 25). A realização desta bênção, de que Israel, se se converter, será portador, é o «Reino de Deus», isto é, a presença de Deus-Amor que, em Jesus, liberta e salva.

    Meditatio

    Apesar de todas as aparências em contrário, Deus está presente na história da humanidade, e condu-la de acordo com o seu projecto de salvação. A sua presença pode ser discreta. Mas nem por isso deixa de ser eficaz. Talvez gostássemos que Deus se revelasse por acções poderosas. Mas Deus prefere revelar-se no interior da história dos homens, nas opções dos homens e mulheres, no emaranhado da história de cada um de nós. José é imagem de todo o homem que, na fé, sabe que Deus não abandona os seus eleitos. Vendido como escravo pelos irmãos, chega ao Egipto onde prospera e faz prosperar a casa do egípcio a quem serve. «O Senhor estava com José», afirma o narrador. O Senhor está connosco: «Estarei sempre convosco até ao fim dos tempos» (Mt 28, 29). É esta certeza que ampara a Igreja, e há-de amparar cada um de nós, nas tribulações da vida. Como Jesus, e como os Doze, somos enviados a evangelizar e a curar os nossos contemporâneos: «chamou doze discípulos e deu-lhes poder de exp
    ulsar os espíritos malignos e de curar todas as enfermidades e doenças» (v. 1). Evangelizar e curar. O Evangelho não é só lei, mas também salvação. É um dom de Deus que salva. Na nossa acção, devemos deixar claro que o Evangelho não é, em primeiro lugar, exigência, mas dom que salva. Jesus dá aos Apóstolos o poder de curar, como sinal da presença entre nós de Deus que salva. Antes de apresentar exigências morais, devemos testemunhar a bondade de Deus para com o homem. O Senhor inclinou-se com predilecção sobre os doentes. Não lhes pregou a necessidade de carregar a cruz. Isso é verdade e essencial para todos os discípulos. Mas, ao dirigir-se aos doentes, curava-os, usava para com eles da sua bondade infinita, servia-se do seu poder de cura e de consolação.
    A missão realiza-se pela simples presença e pelo testemunho vivo da vida cristã. (cf. EN 21). Mas há outros meios de evangelizar, como a vida litúrgica, a oração e a contemplação, o diálogo, em que os cristãos encontram os cristãos de outras tradições religiosas, para caminhar em conjunto para a verdade e colaborar em obras de interesse comum, o anúncio e a catequese. Mas há também o compromisso concreto no serviço aos homens e toda a actividade de promoção social e de luta contra a pobreza e as estruturas que a provocam. O âmbito da missão compreende tudo isto.

    Oratio

    Senhor, faz-me sentir a tua presença. Quanta fome na minha humanidade, quanta sede nos meus desejos, quanta ânsia de amor no meu coração. Sacia-me na minha fraqueza, mesmo nas provações e quando se sinto abandonado. Que, em todas as situações, eu encontre a força da memória e grite com as verdade das minhas fibras: Abbá, Pai! Então me escutarás, porque sempre estás comigo. Amen.

    Contemplatio

    Heliópolis. - Esta aldeola tem piedosas recordações. Foi lá que José, filho de Jacob, desposou Aseneth, filha de Putiphar. José, salvador do povo de Deus viveu lá. Os judeus piedosos sempre guardaram uma preferência por esta pequena cidade egípcia. A Sagrada Família retirou-se para lá para aí encontrar compatriotas, mas aí com certeza que não encontrou um melhor acolhimento que em Belém. Os judeus contemporâneos eram egoístas e duros.
    Foi para eles, José e Maria, a pobreza, por vezes a mendicidade, com um trabalho desigual e mal retribuído, com patrões rígidos e avaros. As lágrimas de Jesus eram-lhes censuradas pelos vizinhos. Participava em todos os vexames da família. E isto durou cinco ou seis anos! Na casa do pobre operário as privações sucediam às privações, e o pão devia faltar muitas vezes. José acabou por encontrar trabalho como carpinteiro, e Maria fiava a lã ou o algodão. Quantas graças prepararam aí para os trabalhadores e para os pobres! Não é que a lei evangélica seja contrária à prosperidade dos povos, ela é, pelo contrário, a condição mais favorável e a garantia, porque recomenda o trabalho, a justiça, a temperança, que são as condições de sucesso; mas ao lado da lei, há os conselhos, propostos às almas generosas. A Sagrada Família caminhou pela via dos conselhos, na obediência, na pobreza, nas privações. O coração de Jesus menino comprazia-se nestas cruzes pela nossa salvação, e as almas generosas seguem hoje o mesmo caminho, completando, como diz S. Paulo, o que falta à Paixão de Jesus, pela salvação do mundo. Até onde irá a minha generosidade? Qual é a minha vocação? Que sacrifícios farei pela salvação dos pecadores? (Leão Dehon, OSP 3, p. 136).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Ide, proclamai que o Reino do Céu está perto» (cf. Mt 10, 6-7).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XIV Semana - Quinta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XIV Semana - Quinta-feira

    10 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 44, 18-21.23b-29;45, 1-5

    Naqueles dias, 18Judá aproximou-se de José e disse-lhe: «Por favor, senhor, que o teu servo possa dizer uma palavra aos ouvidos do meu senhor, e que a tua cólera não se inflame contra o teu servo! Porque tu és igual ao faraó. 19Quando o meu senhor interrogou os seus servos, dizendo: 'Tendes ainda pai ou outro irmão?', 20nós respondemos ao meu senhor: 'Temos um pai idoso e um irmão jovem, filho da sua velhice. Seu irmão morreu, ficando ele só, dos filhos de sua mãe, e o pai está muito afeiçoado a ele.' 21Tu disseste então aos teus servos: 'Trazei-mo, para que eu o veja.' 'Se o vosso irmão mais novo não vos acompanhar, não torneis a aparecer diante de mim.' 24Ao voltarmos para junto do teu servo, nosso pai, repetimos-lhe as mesmas palavras do meu senhor. 25E o nosso pai disse-nos: 'Voltai, comprai-nos alguns víveres.' 26Respondemos-lhe: 'Não podemos partir. Se o nosso irmão mais novo não for connosco, não voltaremos; porque não podemos aparecer diante daquele homem, se o nosso irmão mais novo não estiver connosco.' 27O teu servo e meu pai, disse-nos: 'Sabeis que a minha mulher deu-me dois filhos. 28Um desapareceu de junto de mim e eu disse: Com certeza foi devorado! E não tornei a vê-lo, até hoje. 29Se me tirardes também este e se lhe acontecer algum mal, fareis descer os meus cabelos brancos ao túmulo, com o peso da dor.' 1José não pôde conter-se diante dos que o rodeavam e exclamou: «Mandai sair toda a gente daqui!» Por isso não ficou ninguém presente, quando José se deu a conhecer aos irmãos. 2Mas ele chorava tão alto que os egípcios ouviram-no, e a notícia chegou também ao palácio do faraó. 3José disse então aos irmãos: «Eu sou José; meu pai ainda é vivo?» Mas eles não puderam responder-lhe, porque ficaram perturbados diante dele. 4José disse aos irmãos: «Aproximai-vos de mim, peço-vos!» E eles aproximaram-se. José continuou: «Eu sou José, vosso irmão, que vendestes para o Egipto. 5Mas não vos entristeçais, nem vos irriteis contra vós próprios, por me terdes vendido para este país; porque foi para podermos conservar a vida que Deus me mandou para aqui à vossa frente.

    Na primeira parte do texto que escutamos, Judá, desconhecendo estar na presença do irmão José, tenta persuadi-lo a ficar com ele e não com Benjamim, por causa da promessa feita ao pai (44, 18-21.23.29). Na segunda parte (45, 1-5) narra o modo como José se deu a conhecer aos irmãos.
    A atitude e as palavras de Judá, assinalam uma verdadeira mudança, uma conversão. Ele, com os irmãos, não teve escrúpulos de vender José aos ismaelitas, mas, agora, não está disposto a deixar Benjamim longe do velho pai. O passado não deve determinar o presente nem o futuro. Diante dessa atitude, José acaba por revelar a sua identidade aos irmãos. Ao mesmo tempo revela uma inteligência da história que apela para a providência divina: «Não vos entristeçais, nem vos irriteis contra vós próprios, por me terdes vendido para este país; porque foi para podermos conservar a vida que Deus me mandou para aqui à vossa frente» (40, 5). O acto de crueldade, perpetrado pelos irmãos, é lido por José e interpretado no horizonte mais vasto que é a história da salvação. Deus é capaz de tirar o bem do próprio mal. A reconciliação de José com os irmãos apoia-se na confiança que tem em Deus: «Eu temo a Deus» (42, 18). É nesse horizonte que José coloca o encontro com os irmãos.

    Evangelho: Mateus 10, 7-15

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus Apóstolos: 7«Ide e proclamai que o Reino do Céu está perto. 8Curai os enfermos, ressuscitai os mortos, purificai os leprosos, expulsai os demónios. Recebestes de graça, dai de graça. 9Não possuais ouro, nem prata, nem cobre, em vossos cintos; 10nem alforge para o caminho, nem duas túnicas, nem sandálias, nem cajado; pois o trabalhador merece o seu sustento. 11Em qualquer cidade ou aldeia onde entrardes, procurai saber se há nela alguém que seja digno, e permanecei em sua casa até partirdes. 12Ao entrardes numa casa, saudai-a. 13Se essa casa for digna, a vossa paz desça sobre ela; se não for digna, volte para vós. 14Se alguém não vos receber nem escutar as vossas palavras, ao sair dessa casa ou dessa cidade, sacudi o pó dos vossos pés. 15Em verdade vos digo: No dia do juízo, haverá menos rigor para a terra de Sodoma e de Gomorra do que para aquela cidade.»

    Os discípulos devem anunciar a presença do Reino, tal como fizera João Baptista (cf. Mt 3, 2) e, sobretudo, Jesus (4, 17). Quem acreditar que o Reino é o Senhor, e viver como Ele, torna-se "sinal" da sua presença e pode realizar curas, ressuscitar mortos, curar leprosos, expulsar demónios (v. 8). O mais importante é estar conscientes das forças divinas que nos enchem, graças à paixão, morte e ressurreição de Cristo. Recebemos de graça. Podemos projectar a nossa vida pessoal e comunitária sobre a gratuidade.
    O conteúdo da pregação dos discípulos está expresso nas afirmações relativas à paz. Os judeus saudavam-se desejando-se mutuamente a paz. Mas, aqui, há algo mais. É atribuída à paz a mesma eficácia que tem a Palavra de Deus. Onde se deseja a paz, acontece a paz. Esta paz equivale ao reino de Deus, a Cristo, nossa paz (cf. Mc 5, 34; Rm 5, 1; Ef 2, 14). Anunciar a paz é anunciar a Cristo e tudo o que Ele significa para o homem.
    O missionário deve avançar "desarmado": «Não possuais ouro, nem prata, nem cobre, em vossos cintos; nem alforge para o caminho, nem duas túnicas, nem sandálias, nem cajado» (vv. 9-10). Sabe que tem direito ao sustento (v. 10; cf. Lc 10, 7), à recompensa. Mas contenta-se com o necessário. Permanecerá junto de quem for digno de acolhê-lo (v. 11). Levará consigo o sinal distintivo, que é a paz. Quem a acolhe, acolhe o reino de Deus e todas as suas promessas de bênção. Quem não a acolhe, exclui-se de tudo. Por isso, tem sentido «sacudir o pó dos pés» (cf. v. 14), gesto de quem, ao entrar em Israel, deixava para trás a terra dos infiéis. Tal como Sodoma e Gomorra, foram arrasadas por não terem acolhido os enviados de Deus (Gn 19, 24ss.), assim também acontecerá àqueles que não acolherem o irmão e, portanto, o reino.

    Meditatio

    Na história de José, encontramos sentimentos que, de algum modo, já anunciam os do Evangelho. Ao revelar a sua identidade aos irmãos, José afirma: «Eu sou José, vosso irmão, que vendestes para o Egipto» (45, 4). Atónitos e aterrados com a presença daquele que tinham tentado eliminar, os irmãos ficam sem palavras. Mas José tranquiliza-os: «Aproximai-vos de mi
    m, peço-vos!» E eles aproximaram-se. José continuou: «Eu sou José, vosso irmão, que vendestes para o Egipto. 5Mas não vos entristeçais, nem vos irriteis contra vós próprios, por me terdes vendido para este país; porque foi para podermos conservar a vida que Deus me mandou para aqui à vossa frente» (45, 4-5). José reconhece, na terrível situação, em que ele mesmo foi vítima, a intenção providente e misericordiosa de Deus. Não aproveitou a actual situação dos irmãos para se vingar, para humilhar, para castigar os irmãos. Não. José conseguiu ler, nas tristes circunstâncias por que passou, a intenção salvadora de Deus. «Vendeste-me» - afirmou. Essa era a realidade. Mas, oculta nessa realidade, estava a intenção positiva de Deus: «foi para podermos conservar a vida que Deus me mandou para aqui à vossa frente».
    Deus serve-se também do mal para tirar o bem. Nem sempre é fácil reconhecê-lo, sobretudo, quanto o mal é contra nós. Mais difícil ainda é ajudar quem nos fez mal, e compreender que Deus nos quer associar à sua infinita bondade dando-nos a possibilidade de perdoar e de fazer o bem àqueles que nos ofenderam. Isto é revelação divina.
    A história de José é já Evangelho, porque é prefiguração da história de Jesus, da sua paixão e glorificação. Como José foi praticamente condenado à morte por causa da inveja dos irmãos, assim também Jesus foi entregue à morte por inveja. A história de José, por vontade de Deus, terminou em glorificação. Assim Jesus, aceitando voluntariamente a morte, foi glorificado à direita do Pai. José podia ter punido severamente os irmãos, mas salvou-os. Jesus podia ter usado o seu poder divino para punir os pecadores, mas deu-lhes a ressurreição e a vida. A tremenda injustiça da morte de Jesus transformou-se em salvação e justificação para todos. José, quando da morte de Jacob, dirá aos seus irmãos, cheios de medo: «Não temais; estou eu no lugar de Deus? Premeditastes contra mim o mal. Mas Deus aproveitou-o para o bem, a fim de que acontecesse o que hoje aconteceu, e um povo numeroso foi salvo. Nada receeis, então! Eu cuidarei de vós e das vossas famílias» (50, 19-21). José adere de todo o coração à maravilhosa transformação realizada por Deus. Por isso, é figura do Senhor Jesus e um modelo para nós. Enviados a anunciar a Palavra da salvação, e a narrar que Deus em Cristo lança o seu olhar providente sobre a história dos homens, o discípulo em missão não deseja «ouro, nem prata, nem cobre» (v. 9), porque aprendeu que, «onde está o seu tesouro está também o seu coração» (Mt 6, 21). Pertencer ao Senhor, e participar na sua missão, são suficientes para encher o coração do discípulo, porque Ele é «o caminho, a verdade e a vida» (Jo 14, 6).

    Oratio

    Eu Te louvo, Senhor meu Deus, porque a todos manifestas a força e a grandeza da tua paternidade. Nesta terra de exílio, na escuridão do meu nada, observo os sinais da tua presença. No pó ou na lama dos caminhos descubro as pegadas que denunciam a tua companhia amorosa e solícita. Na minha própria carne contemplo as impressões do teu dedo poderoso. Nas trevas que me envolvem vejo brilhar a luz radiosa do teu Cristo, minha Esperança. Obrigado, Senhor! Amen.

    Contemplatio

    Jesus foi imolado desde o começo (Ap 13, 8). Em figura, vive em Abel morto por seu irmão, em Isaac conduzido ao lenho do sacrifício por seu pai, em José vendido aos estrangeiros; em David, traído por Absalão e abandonado pelos seus próprios oficiais, em João Baptista condenado à morte por causa da sua virtude. Jesus é sacrificado pelas recusas que encontra em Belém, pela perseguição de Herodes e a fuga para o Egipto; pela inveja dos habitantes de Nazaré que querem precipitá-lo do alto da sua colina, pelas intrigas dos fariseus que duram todo um ano e que culminam nos dias horríveis da paixão. Jesus sofria tudo isto com alegria, porque era para a glória do seu Pai e pela nossa salvação. (Leão Dehon, OSP 4, p. 60s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Ide e proclamai que o Reino do Céu está perto» (Mc 10, 7).

  • S. Bento, Abade, Padroeiro da Europa

    S. Bento, Abade, Padroeiro da Europa


    11 de Julho, 2025

    S. Bento, patriarca dos monges ocidentais, nasceu em Núrcia, no ano 480. Ainda muito jovem, seduzido e impelido pelo Espírito, abraçou um período de absoluta solidão numa gruta em Subiaco. A sua fama atraiu-lhe discípulos. Organizou para eles a vida cenobítica, inicialmente em doze pequenos mosteiros à volta de Subiaco e, depois, no célebre cenóbio de Monte Cassino. Escreveu uma Regra que resume sabiamente a tradição monástica oriental, adaptando-a ao mundo latino. Esta escola de "serviço ao Senhor" é construída à volta da Palavra de Deus (Lectio divina), da Liturgia de louvor realizada em coro, e do trabalho em ambiente de fraternidade, de humilde e obediente serviço. S. Bento faleceu com 67 anos de idade, em Monte Cassino, no ano 547.

    Lectio

    Primeira leitura: Provérbios 2, 1-9

    Meu filho, se receberes as minhas palavrase guardares cuidadosamente os meus mandamentos,2prestando o teu ouvido à sabedoria, e inclinando o teu coração ao entendimento; 3se invocares a inteligência e fizeres apelo ao entendimento, 4se a buscares como se procura a prata e a pesquisares como um tesouro escondido,5então, compreenderás o temor do Senhor e chegarás ao conhecimento de Deus. 6Porque o Senhor é quem dá a sabedoria e da sua boca procedem o saber e o entendimento. 7Ele reserva a salvação para os rectos e é um escudo para os que procedem honestamente. 8Protege os caminhos dos justos e dirige os passos dos seus fiéis. 9Então, compreenderás a justiça e a equidade, a rectidão e todos os caminhos que conduzem ao bem.

    Só a busca interessada da verdade permite estabelecer uma relação correta com Javé, que dá a sabedoria e protege o sábio. É o ensinamento preciso que um pai dá ao seu filho, segundo esta página do livro dos Provérbios.
    S. Bento utiliza o mesmo estilo literário ao introduzir a Regra que escreve para os seus monges: "Escuta, filho, os preceitos do Mestre, e inclina o ouvido do teu coração; recebe de boa vontade e executa eficazmente o conselho de um bom pai,..." Acolher a Palavra de Deus é o caminho seguro para nos conformarmos a Cristo, Sabedoria do Pai.

    Evangelho: Mateus 19, 27-29

    Naquele tempo, disse Pedro a Jesus: «Nós deixámos tudo e seguimos-te. Qual será a nossa recompensa?»28Jesus respondeu-lhes: «Em verdade vos digo: No dia da regeneração de todas as coisas, quando o Filho do Homem se sentar no seu trono de glória, vós, que me seguistes, haveis de sentar-vos em doze tronos para julgar as doze tribos de Israel. 29E todo aquele que tiver deixado casas, irmãos, irmãs, pai, mãe, filhos ou campos por causa do meu nome, receberá cem vezes mais e terá por herança a vida eterna

    Jesus responde a Pedro com a linguagem figurada do profeta Daniel (cf. Dn 7, 9-14), onde se fala de tronos e do Filho do homem. Jesus realça o aspeto judicial desta figura misteriosa. Os discípulos, a quem foi dado conhecer o mistério do Reino (13, 11), estão intimamente associados a Jesus. O prémio prometido por Jesus parece que terá lugar "no dia da regeneração de todas as coisas" (v. 28), isto é, no mundo renovado, que resultou da última intervenção de Deus na história, que já teve lugar, quando enviou o seu Filho. A "regeneração" é a nova vida do homem novo concedida pela ação de Deus. Indica, pois o tempo da Igreja e refere-se a todos os crentes, àqueles que se submetem à senhoria de Deus e participam dela. Os discípulos são "juízes", isto é, "dirigentes" do povo de Deus, que devem administrar e defender esse povo.

    Meditatio

    S. Bento, depois de longo tempo na presença de Deus, a escutar a sua Palavra, vivendo em total desapego do mundo, em completo silêncio e em austera solidão, tornou-se um homem, capaz de orientar outros, que buscavam a Deus. Só dá fruto quem acolhe no coração e medita a Palavra de Deus, quem se deixa transformar por ela. As comunidades criadas por S. Bento caraterizam-se pela busca apaixonada de Deus, pela escuta atenta da Palavra, meditada e guardada no coração. Assim descobrem Jesus Cristo como sabedoria do Pai, como o verdadeiro tesouro, ao qual nada se deve antepor. Permanecendo estavelmente unidos a Ele, os discípulos permitem ao Espírito produzir neles os seus frutos. Esses frutos são o melhor prémio para quem deixa tudo para estar com o Senhor e "permanecer" n´Ele.
    A união de S. Bento com Deus explica a sublimidade da sua Regra, exigente e equilibrada, e a sua influência perene na vida de perfeição da Igreja. Bossuet falou assim da Regra de S. Bento: "Suma do cristianismo, resumo douto e misterioso do Evangelho, das instituições dos Santos Padres, de todos os conselhos de perfeição, na qual atingem o seu mais alto apogeu a prudência e a simplicidade, a humildade e o valor, a severidade e a doçura, a liberdade e a dependência, na qual a correção encontra toda a firmeza, a condescendência todo o encanto, a voz de comando todo o vigor, a sujeição todo o repoiso, o silêncio a sua gravidade, a palavra a sua graça, a força o seu exercício e a debilidade o seu apoio".
    Chamado por Pio XII "Pai da Europa", S. Bento foi proclamado por Paulo VI patrono do mesmo continente, em 1964.

    Oratio

    Senhor, nosso Deus e nosso Pai, eis-nos aqui, como filhos que se sentem amados por ti. Os nossos ouvidos estão atentos à tua palavra. Queremos corresponder ao teu amor. Sabes como ainda somos instáveis na fé e frágeis na caridade. Faz-nos, uns para os outros, sinais e sacramentos da tua mansidão e da tua bondade. Que todos possam verificar como é bom amar-nos como filhos do mesmo Pai, que és Tu, e servir-nos e honrar-nos uns aos outros em teu santo Nome. Ámen.

    Contemplatio

    S. Bento teve também a graça de trabalhar pelas almas. Na sua solidão, catequizava os pastores da montanha. Mais tarde, aceitou fazer a educação de alguns jovens piedosos de Roma, que as suas famílias lhe confiavam em Subiaco. Foi entre eles que recrutou S. Mauro e S. Plácido, seus amáveis discípulos. Sabia falar corajosamente aos grandes e recordar-lhes os seus deveres. Repreendeu ao bárbaro Tótila as suas depredações e as suas crueldades. Ordenou-lhe que não abusasse das suas vitórias, especialmente na ocupação da cidade de Roma. Que variedade nas suas obras e na sua ação social! Os seus discípulos, ao longo dos séculos, dedicar-se-ão também ao apostolado em todas as suas formas, segundo os tempos e as necessidades da Igreja. É preciso tomar forças no recolhimento, especialmente em cada manhã, e dedicar-se depois às obras, segundo a nossa vocação, segundo a vontade de Deus que nos é conhecida. É um dever para nós hoje rezar pela conservação da vida regular e monástica através das dificuldades que o demónio lhe suscita. Senhor, não priveis a vossa Igreja dos asilos que lhe destes para pôr os seus filhos ao abrigo das tempestades do século; mas fazei que, ao renunciarem ao mundo, se entreguem verdadeiramente à perfeição no claustro. (Leão Dehon, OSP 3, p. 314s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "O Senhor é quem dá a sabedoria" (Prov 2, 6).

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    S. Bento, Abade, Padroeiro da Europa (11 Julho)

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XIV Semana - Sexta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XIV Semana - Sexta-feira

    11 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 46, 1-7.28-30

    Naqueles dias, 1Israel partiu com tudo o que lhe pertencia e chegou a Bercheba, onde imolou vítimas ao Deus de seu pai Isaac. 2Deus falou a Israel numa visão, durante a noite, e disse-lhe: «Jacob! Jacob!» Ele respondeu: «Eis-me aqui.» 3E Deus prosseguiu: «Eu sou o Deus de teu pai: não hesites em descer ao Egipto, porque tornar-te-ei ali uma grande nação. 4Eu mesmo descerei contigo ao Egipto; e Eu mesmo far-te-ei voltar de lá; e será José quem te fechará os olhos.» 5Jacob partiu de Bercheba. Os filhos de Israel fizeram subir Jacob, seu pai, assim como as suas mulheres e os seus filhos, para os carros enviados pelo faraó para os transportar. 6Tomaram os seus rebanhos e os bens que haviam adquirido no país de Canaã e foram para o Egipto, Jacob e toda a família. 7Os seus filhos e os seus netos, as suas filhas e as suas netas e toda a sua descendência acompanharam-no para o Egipto. 28Jacob mandara Judá adiante encontrar-se com José, para que este preparasse a sua entrada em Góchen. 29Quando chegaram ali, José mandou atrelar o seu carro e foi a Góchen, ao encontro de seu pai. Ao vê-lo, lançou-se-lhe ao pescoço e chorou longamente, entre os seus braços. 30E Israel disse a José: «Agora posso morrer, pois vi o teu rosto e ainda vives!»

    O reencontro de José com os seus irmãos e a reunificação da família de Jacob é o tema central da longa história do Génesis. O itinerário de Jacob, ligado ao de Abraão, torna-se uma última etapa decisiva na história da salvação de Israel. Se Abraão partiu de Ur para chegar à terra de Canaã, agora Jacob, da terra de Canaã, parte para o Egipto acompanhado, tal como Abraão, pela promessa: «tornar-te-ei ali uma grande nação» (v. 3). É uma caminhada que aguarda a sua realização no regresso à terra de Canaã. Essa nova etapa será aberta pelo livro do Êxodo.
    A etapa da descida ao Egipto é diferente da descrita no capítulo 28, porque Jacob, agora, conhece o seu interlocutor: «Eu sou o Deus de teu pai» (v. 3). Esta, como outras vicissitudes da sua vida, faz parte da história da salvação, que o próprio Deus guarda e orienta: « não hesites em descer ao Egipto... Eu mesmo descerei contigo...; e Eu mesmo far-te-ei voltar de lá » (vv. 3-4). A presença de Deus, mesmo em terra estrangeira, dá sentido a uma viagem que, de outro modo, seria incompreensível, pois afasta Jacob da terra prometida, à qual nem sequer regressará: «será José quem te fechará os olhos» (v. 4). A história de José representa a história de todos aqueles crentes que, fiados na Palavra de Deus, se abandonam aos seus desígnios.

    Evangelho: Mateus 10, 16-23

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus Apóstolos: 16«Envio-vos como ovelhas para o meio dos lobos; sede, pois, prudentes como as serpentes e simples como as pombas. 17Tende cuidado com os homens: hão-de entregar-vos aos tribunais e açoitar-vos nas suas sinagogas; 18sereis levados perante governadores e reis, por minha causa, para dar testemunho diante deles e dos pagãos. 19Mas, quando vos entregarem, não vos preocupeis nem como haveis de falar nem com o que haveis de dizer; nessa altura, vos será inspirado o que tiverdes de dizer. 20Não sereis vós a falar, mas o Espírito do vosso Pai é que falará por vós. 21O irmão entregará o seu irmão à morte, e o pai, o seu filho; os filhos hão-de erguer-se contra os pais e hão-de causar-lhes a morte. 22E vós sereis odiados por todos, por causa do meu nome. Mas aquele que se mantiver firme até ao fim será salvo. 23Quando vos perseguirem numa cidade, fugi para outra. Em verdade vos digo: Não acabareis de percorrer as cidades de Israel, antes de vir o Filho do Homem.»

    O nosso texto reflecte a profecia de Jesus sobre a sorte dos seus discípulos, mas também a experiência posterior da Igreja, que descobriu todo o sentido das palavras do seu Senhor e Mestre. Quando Mateus escreveu, já muitos discípulos tinham sido presos, levados aos tribunais e executados por causa do «nome» de Jesus. O judaísmo oficial, pelo ano 70, declarou excomungados da Sinagoga todos aqueles que confessassem que Jesus é o Messias. E surgiu, ou acentuou-se a divisão e o ódio nas famílias: uns a favor de Jesus e outros contra. Os discípulos, particularmente os missionários, são comparados ao Cordeiro «que tira o pecado do mundo» (Jo 1, 29), Aquele que carregou sobre si os nossos pecados e os nossos sofrimentos (cf. Is 59, 11), para realizar o projecto de Deus, que quer salvar todos os homens (1 Tm 2, 4). A mansidão e a não-violência do missionário não são fraqueza nem masoquismo, mas vivência de duas virtudes aparentemente opostas: a prudência da serpente, como exercício de inteligência vigilante, realista e crítica, que evita o engano; a simplicidade da pomba, como exercício de um procedimento límpido e confiante, próprio de quem sabe estar nas mãos de Deus-Pai, poderoso e bom. Nos tribunais, há que confiar na presença e na acção do Espírito.
    O futuro do discípulo não é róseo. O mal gera o mal e abala as próprias relações familiares. Mas quem suportar ser odiado, não pelos seus crimes, mas por causa de Cristo, será salvo.

    Meditatio

    A história de José mostra como aqueles que se fiam de Deus acabam por sair vitoriosos e por se tornar benfeitores para os outros. O acolhimento da chamada a partilhar a missão de Jesus também pressupõe absoluta confiança n´Aquele que chama. A missão de Jesus passou pelo despojamento da sua condição divina para se fazer homem entre os homens, servo (Fl 2, 7), vivendo entre os seus «como aquele que serve» (Lc 22, 27). Esta conformidade a Cristo «servo» é dada pelo Espírito que permite ao discípulo juntar, numa existência renovada, o agir e o ser, e assim unificar o amor para com Deus e para com o próximo no serviço prestado na verdade (cf. Mt 9, 13). Missão e kénosis apelam-se mutuamente, revelando, com o aniquilamento de Deus em Cristo, o sinal histórico do serviço do discípulo que continua no tempo a acção salvífica do seu Senhor para com todos os homens.
    Em Cristo, a vida e a missão do discípulo são postas sob o signo da cruz gloriosa: «Aos que me batiam apresentei as espáduas,e a face aos que me arrancavam a barba; não desviei o meu rosto dos que me ultrajavam e cuspiam. Mas o Senhor Deus veio em meu auxílio; por isso não sentia os ultrajes. Endureci o meu rosto como uma pedra, pois sabia que não ficaria envergonhado» (Is 50, 6s.). Também no momento do abandono e do fracasso, do medo que leva a olhar para trás, a fixar-se no passado em que se julga encontrar protecção, o discípulo confia a sua história à memória de uma Palavra consoladora: «Sou Eu, sou Eu o vosso consolador. Quem és tu para teres medo de um simples mortal, de um
    homem que acabará como a erva? Esqueceste o Senhor, teu criador, que estendeu os céus e fundou a terra.» (Is 51, 12s.). Assim, o Evangelho é subtraído a critérios de avaliação mundanos e é definitivamente entregue ao discernimento da palavra do Senhor: «Irmãos, não sejais crianças, quanto à maneira de julgar; sede, sim, crianças na malícia; mas, quanto à maneira de julgar, sede homens adultos» (1 Cor 14, 20).

    Oratio

    Senhor, ajuda-me a ser fiel. Aumenta a minha fé e a minha esperança, para que me abandone alegremente à tua vontade, na certeza de que está sempre comigo, e me ajudarás muito mais e muito melhor de quanto posso esperar.
    Dá-me o entusiasmo e o zelo dos Apóstolos e dos santos Missionários. Que a plena confiança em Ti afaste todas as minhas preocupações pessoais sobre a minha sorte, sobre o meu futuro. Contigo, cantarei vitória, e poderei ajudar os irmãos que puseres nos meus caminhos ou confiares aos meus cuidados. Amen.

    Contemplatio

    Jesus entrou na vida como vítima. Ofereceu-se ao seu Pai desde a sua entrada neste mundo. Foi o primeiro grito do seu coração: «Meu Pai, disse, porque já não quereis vítimas ou holocaustos da Antiga Lei, eis-me aqui (para os substituir), abandono-me à vossa vontade» (Heb 10). Jesus era um holocausto vivo, uma hóstia perfeita de adoração, de reparação, de acção de graças e de amor. Consumia-se nestas disposições e tudo fazia nestas intenções santas e puras. Era o mediador de adoração e de amor entre as criaturas e o seu Pai. Era sobretudo o mediador de justiça, a vítima de reparação. Deus tinha colocado sobre os seus ombros e sobre o seu Coração o peso de todas as nossas iniquidades (Is 53). Era vítima no aniquilamento da sua Incarnação; vítima na pobreza, na obediência, no trabalho; vítima sobretudo nas perseguições, na agonia do Getsémani, na sua paixão dolorosa e na sua morte no Calvário. Como símbolo da sua vida, deixou-nos a sua cruz. Viveu no sacrifício, por mim, por nós, pelos meus pecados, pelos meus irmãos. Como é que o não amaria? Como é que não me uniria ao seu holocausto, ao seu sacrifício? (Leão Dehon, OSP 3, p. 229s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Não sereis vós a falar:
    o Espírito do vosso Pai é que falará por vós» (Mt 10, 20).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XIV Semana - Sábado

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XIV Semana - Sábado

    12 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Génesis 49, 29-32;50, 15-26a

    Naqueles dias, 29Jacob deu-lhes as suas ordens, dizendo: «Vou juntar-me ao meu povo. Sepultai-me junto dos meus pais, no jazigo que está no domínio de Efron, o hitita, 30no jazigo que está no território de Macpela, diante de Mambré, no país de Canaã, terra que Abraão comprou a Efron, o hitita, para propriedade sepulcral. 31Ali foram enterrados Abraão e Sara, sua esposa; foram lá enterrados também Isaac e Rebeca, sua esposa, e ali enterrei Lia. 32A compra dessa terra e do jazigo que ali se encontra foi feita no país dos hititas.» 15Ora os irmãos de José, depois da morte de seu pai, disseram uns aos outros: «E se José nos guarda rancor? Se vai vingar-se de todo o mal que lhe fizemos sofrer?» 16Mandaram então dizer a José o seguinte: «Teu pai ordenou-nos antes da sua morte: 17'Falai assim a José: Perdoa, por favor, a ofensa dos teus irmãos, a sua falta e o mal que te fizeram! Perdoa, pois, o seu erro, aos servos do Deus do teu pai!'» E José chorou quando lhe falaram assim. 18Depois os seus irmãos vieram e caíram aos seus pés, dizendo: «Estamos prontos a tornar-nos teus escravos.» 19José respondeu-lhes: «Não temais; estou eu no lugar de Deus? 20Premeditastes contra mim o mal. Mas Deus aproveitou-o para o bem, a fim de que acontecesse o que hoje aconteceu, e um povo numeroso foi salvo. 21Nada receeis, então! Eu cuidarei de vós e das vossas famílias.» E assim tranquilizou-os e falou-lhes ao coração. 22José residiu no Egipto, com a sua família e a de seu pai, e viveu cento e dez anos. 23Viu os filhos de Efraim até à terceira geração; e os filhos de Maquir, filho de Manassés, nasceram sobre os seus joelhos. 24José disse aos seus irmãos: «Vou morrer! Mas Deus visitar-vos-á, fazendo-vos regressar deste país ao país que prometeu por juramento a Abraão, a Isaac e a Jacob.» 25E José fez jurar aos filhos de Israel, dizendo: «Deus há-de visitar-vos e então levareis os meus ossos deste país.» 26José morreu com a idade de cento e dez anos.

    O epílogo da história de José reaviva o grande tema que a domina: a destruição e a reconstrução da família. Num plano mais geral, recorda a promessa de Deus a Abraão, fio condutor de todas as tradições patriarcais. Num plano ainda mais alargado suscita o tema da luta entre o bem e o mal, entre a bênção e a maldição, entre a salvação e a perdição, tema de toda a Bíblia.
    O nosso texto une o pedido de Jacob para ser sepultado no lugar onde estão os seus pais com a perícopa conclusiva do livro do Génesis, onde se contrapõem o medo dos irmãos por causa de possível represália de José, depois da morte do pai, e a reacção do mesmo José reafirmando o perdão, e revelando a consciência de que, sendo embora poderoso, jamais poderá assumir o lugar de Deus, o único a quem pertence julgar e dar ou tirar a vida.
    O regresso dos restos mortais de Jacob-Israel à terra dos pais preanuncia o regresso do povo de Israel, depois de anos de sofrimento no Egipto. Nas palavras de José, faz-se memória do compromisso, da aliança (berîth) que Deus estabeleceu com os pais, e que dá sentido à esperança do povo. Essa esperança irá concretizar-se numa nova fase que encherá de alegria a terra, quando o Filho de Deus vier fazer de todos os homens um só povo, e conduzi-lo à pátria dos seus desejos, Deus Pai.

    Evangelho: Mateus 10, 24-33

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus Apóstolos: 24«O discípulo não está acima do mestre, nem o servo acima do senhor. 25Basta ao discípulo ser como o mestre e ao servo ser como o senhor. Se ao dono da casa chamaram Belzebu, o que não chamarão eles aos familiares! 26Não os temais, portanto, pois não há nada encoberto que não venha a ser conhecido. 27O que vos digo às escuras, dizei-o à luz do dia; e o que escutais ao ouvido, proclamai-o sobre os terraços. 28Não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma. Temei antes aquele que pode fazer perecer na Geena o corpo e a alma. 29Não se vendem dois pássaros por uma pequena moeda? E nem um deles cairá por terra sem o consentimento do vosso Pai! 30Quanto a vós, até os cabelos da vossa cabeça estão todos contados! 31Não temais, pois valeis mais do que muitos pássaros.» 32«Todo aquele que se declarar por mim, diante dos homens, também me declararei por ele diante do meu Pai que está no Céu. 33Mas aquele que me negar diante dos homens, também o hei-de negar diante do meu Pai que está no Céu.

    As exigências da missão são extremas, podendo incluir a perseguição e a morte, como lemos ontem. Hoje, Jesus introduz no seu discurso a expressão «Não temais», que ocorre 366 vezes na Bíblia. O nosso texto está estruturado sobre a repetição, a modo de imperativo, do convite a não ter medo (vv. 26.28.31), seguido das razões pelas quais a confiança deve sempre vencer. A primeira razão é: ainda que o bem esteja, por agora, velado, e a astúcia e a virulência do mal pareçam escondê-lo, acontecerá uma reviravolta completa e veremos, no triunfo de Cristo, a vitória dos que escolheram praticar o bem. Eis a razão pela qual os discípulos de Jesus são encorajados à audácia do anúncio. O que recebemos é pequeno como uma luzinha nas trevas, como um sussurro ao ouvido, mas deve ser dado à plena luz do dia, gritado sobre os telhados. Inicialmente, o Evangelho era algo de oculto e misterioso, que era preciso manter em segredo, dado a conhecer a poucos e com as devidas precauções, para não desencadear a perseguição. Mas chegou o tempo de o dar a conhecer ao mundo inteiro! O pior que pode acontecer aos missionários do Reino é a morte do corpo. Mas seria muito pior a morte da alma, a perda da vida (alma significa vida). Ora, só Deus pode tirar a vida. Mas não o faz àqueles que O amam e O temem. Jesus conclui a sua argumentação com duas imagens muito ternas: a dos pássaros que, valendo pouco, são amados pelo Pai, e a dos cabelos da cabeça, contados por Ele. Não há, pois, que temer: «Ide: proclamai que o Reino do Céu está perto!» (Mt 10, 7).

    Meditatio

    Muita gente se escandaliza e interroga ao ver o mal que campeia no mundo. Como pode Deus permitir tantos acontecimentos trágicos, que enchem de sofrimento a vida de pessoas e de povos inteiros?
    A conclusão da história de José lança luz sobre o modo como havemos de encarar a questão do mal. Essencialmente, diz-nos que Deus respeita a liberdade das criaturas e permite o mal porque pode transformá-lo em bem. São respostas que é preciso aprofundar. Deus permitiu que os irmãos de José agissem maldosamente contra ele, e não os forçou a fazer o bem, porque os criou livres, respeita a liberdade e quer o nosso bem. Nunca é eficaz obrigar algu&eac
    ute;m a fazer o bem. Quem faz o bem obrigado, sofre uma dura opressão e, no mais íntimo de si mesmo, continua a desejar fazer o mal. Por isso, Deus, querendo a nossa felicidade, respeita a liberdade que nos deu para que possamos fazer o bem livremente, com amor e sem constrangimentos.
    Por outro lado, Deus permite o mal porque pode fazê-lo servir ao bem: «Premeditastes contra mim o mal. Mas Deus aproveitou-o para o bem» (v. 20), afirma José. É uma reflexão profunda. Deus é capaz de virar o sentido das acções humanas. Mas - há que tê-lo em consideração - Deus procura pessoas que acolham a sua acção. José acolheu o pensamento de Deus. Em vez de responder ao mal com o mal, consciente da bondade e da misericórdia de Deus, agiu como Ele: renunciou à vingança e perdoou.
    Quando nos debatemos com o problema do mal, devemos sempre interrogar-nos: «Aceito as intenções de Deus?» As intenções de Deus exigem conversão, que nos leva a responder ao mal com o bem.
    A história de José antecipa o mistério da Cruz. A cruz de Jesus é o exemplo mais flagrante da inversão do mal em bem. Mas isso só foi possível porque Jesus abriu o seu coração às intenções positivas de Deus. O segredo da redenção está na generosa abertura de Jesus ao acolhimento da vontade salvífica do Pai e em assumi-la.
    O evangelho diz-nos que o discípulo, chamado a anunciar o Evangelho, deve fazê-lo corajosa e coerentemente. O Senhor está com ele (cf. Mt 28, 19s.). Essa companhia liberta o discípulo do medo da morte, e leva-o a olhar para além dela. De facto, em Cristo a morte foi destruída e a vida triunfou. «É digna de fé esta palavra:Se com Ele morrermos, também com Ele viveremos. Se nos mantivermos firmes, reinaremos com Ele. Se o negarmos, também Ele nos negará. Se formos infiéis, Ele permanecerá fiel, pois não pode negar-se a si mesmo» (2 Tm 2, 11s.). É o novo começo da vida do crente, porque, Jesus Cristo, ao vencer a morte, constrói a história a partir do novo início da sua ressurreição. O discípulo constrói-se sobre Cristo (Cl 2, 7) e é «associado à sua plenitude» (Cl 2, 9), por ser «sepultado com Ele no Baptismo, também foi com Ele que foi ressuscitado, pela fé que tem no poder de Deus, que o ressuscitou dos mortos» (cf. Cl 2, 12). A missão do discípulo encontra neste acontecimento o seu "começo" e a certeza que é acompanhada pela presença providente do Pai, que guarda os seus fiéis.

    Oratio

    Bendito sejas, Senhor, porque completaste em mim a tua obra. Tu és um Deus que faz maravilhas. No teu amor, recordaste-te de mim, teu servo. Senhor, deste-me novamente a vida! Por isso, cantarei o teu nome entre os povos, tocarei nas cítaras as suaves vibrações do meu coração e sussurrarei ao teu ouvido o meu cântico de amor.
    Te, meu amigo, introduziste-me no espaço da tua intimidade, e imprimiste-me como uma tatuagem sobre o teu braço. Eu Te dou graças no meio do teu povo. Encheste-me de graça porque, no teu Espírito, me tornaste filho. Amen.

    Contemplatio

    Foi o cumprimento da vontade divina, e a docilidade a esta vontade, que fez santos os Magos. As suas maneiras de viver, a suas obras, os seus trabalhos, os seus sofrimentos, as suas lutas, os seus triunfos foram diferentes; tudo mais não foi então do que o cumprimento da divina vontade, a correspondência às graças recebidas. Tornaram-se maiores em santidade e em perfeição segundo a medida desta correspondência e da fidelidade às divinas inspirações. Cada um compreendia pela luz da graça e pela voz dos seus superiores o que Deus lhe pedia. A vocação, a missão era extraordinária, as graças e os meios para a cumprirem eram-no também: «A quem muito foi dado, muito será também pedido». Os seus actos de virtude, as suas obras heróicas, a inspiração não lhes vêm da própria natureza, nem do mundo, nem do demónio, mas do espírito de Deus. Foi a este impulso, a esta inspiração que eles prestaram a atenção do seu coração. Cumpriram a sua vocação e santificaram-se eles mesmos conformando-se fiel e docilmente à vontade divina. Nosso Senhor mesmo não terá outra regra de vida. A lei do seu Coração é de fazer a vontade do seu Pai. Eis o nosso modelo e a única via a seguir. Repitamos o Ecce venio do divino Coração de Jesus. (Leão Dehon, OSP 3, p. 30s).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Não temais» (Mt 10, 26.28.31).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XV Semana - Segunda-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XV Semana - Segunda-feira

    14 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 1, 8-14.22

    Naqueles dias, 8subiu ao trono do Egipto um novo rei que não conhecera José. 9E ele disse ao seu povo: «Eis que o povo dos filhos de Israel é mais numeroso e poderoso do que nós. 10Temos de proceder astuciosamente contra ele, a fim de impedirmos que se desenvolva ainda mais. Em caso de guerra, juntar-se-ia também aos nossos inimigos, lutaria contra nós, e sairia deste país.» 11Impuseram-lhe então chefes de trabalhos forçados para o oprimirem com carregamentos. E construiu para o faraó as cidades-armazém de Pitom e Ramessés. 12Todavia, quanto mais o oprimiam, mais ele se multiplicava e aumentava; e os egípcios estavam preocupados com os filhos de Israel, 13e reduziram-nos a uma dura servidão. 14Tornaram-lhes a vida amarga com uma pesada servidão: barro, tijolos, toda a espécie de trabalhos no campo, tudo uma dura servidão. 22E o faraó ordenou a todo o seu povo: «Atirai ao rio os meninos recém-nascidos; as meninas, porém, deixai-as viver todas.»

    O livro do êxodo abre com uma página que mostra a enorme mudança que ocorreu no Egipto, em desfavor de Israel, após o desaparecimento de José. O novo faraó, que «não conhecera José», mostra-se preocupado com o notável aumento da população hebraica e com o seu crescente poder. Por isso, toma uma série de medidas repressivas contra esse povo, que lhe parece constituir uma séria ameaça em caso de guerra, e que pode mesmo querer abandonar o país. Assim é preparada a narração da grande epopeia da salvação de Israel, com quem Deus fará aliança. O livro do Êxodo é um hino a Deus que salva, um poema ao Deus de Israel, que tendo escutado o grito do seu povo, «desce» para o libertar. O povo, uma vez libertado, irá servir, não ao faraó, mas a Deus (cf. Dt 4, 20).
    A leitura de hoje descreve a nova situação dos descendentes de Jacob-Israel, no Egipto. Os egípcios tornaram-lhes amarga a vida, obrigando-os a trabalhos forçados no fabrico de tijolos de barro. Mas, quanto maior era o peso dos vexames, mais os israelitas se multiplicavam. Então o faraó recorreu a uma outra medida, ainda mais desumana e cruel: a supressão dos meninos recém-nascidos (v. 22).
    Do ponto de vista histórico, estes acontecimentos devem provavelmente colocar-se no tempo do Império Novo do Egipto, no século XIII antes de Cristo. É no quadro destas injustiças e sofrimentos que se vai desenrolar a acção salvadora de Deus.

    Evangelho: Mateus 10, 34 - 11, 1

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus apóstolos: 34Não penseis que vim trazer a paz à terra; não vim trazer a paz, mas a espada. 35Porque vim separar o filho do seu pai, a filha da sua mãe e a nora da sua sogra; 36de tal modo que os inimigos do homem serão os seus familiares. 37Quem amar o pai ou a mãe mais do que a mim, não é digno de mim. Quem amar o filho ou filha mais do que a mim, não é digno de mim. 38Quem não tomar a sua cruz para me seguir, não é digno de mim. 39Aquele que conservar a vida para si, há-de perdê-la; aquele que perder a sua vida por causa de mim, há-de salvá-la.» 40«Quem vos recebe, a mim recebe; e quem me recebe, recebe aquele que me enviou. 41Quem recebe um profeta por ele ser profeta, receberá recompensa de profeta; e quem recebe um justo, por ele ser justo, receberá recompensa de justo. 42E quem der de beber a um destes pequeninos, ainda que seja somente um copo de água fresca, por ser meu discípulo, em verdade vos digo: não perderá a sua recompensa.» 1Quando Jesus acabou de dar estas instruções aos doze discípulos, partiu dali, a fim de ir ensinar e pregar nas suas cidades.

    «Não vim trazer a paz, mas a espada». Estas palavras contradizem as esperanças messiânicas do príncipe da paz (Is 9, 5), as esperanças de todos aqueles que trabalham e lutam pela paz, bem como as próprias palavras de Jesus, que declarou bem-aventurados os que trabalham pela paz (5, 9). Estamos diante de um paradoxo que não pode justificar a «guerra santa», certos apetites humanos ou determinadas intransigências religiosas. A luta não é dos discípulos contra os outros homens, mas dos outros homens contra os discípulos, nomeadamente contra os missionários do Reino. Mateus continua a tratar das exigências radicais da missão. Nada pode impedir o seguimento de Jesus, ainda que possa causar sofrimentos e provocar rupturas, mesmo dentro da própria família. A sorte do discípulo é semelhante à do seu Mestre. Jesus foi ignorado e não-acolhido pelos seus próprios familiares (cf. Mc 3, 21; Jo 1, 11). O amor à família é um valor. Mas o seguimento e o amor a Cristo devem sobrepor-se a tudo e a todos, devem ser vividos «com todo o teu coração, com toda a tua alma, com todo o teu entendimento e com todas as tuas forças» (Mc 12, 30). Para o cristão, isso é possível porque Ele nos amou primeiro, até ao ponto de dar a vida por nós.

    Meditatio

    Começamos, hoje, a escutar o livro do Êxodo, um dos grandes livros do Antigo Testamento, que narra a epopeia de Israel, arrancado à escravidão do Egipto, e chamado a uma aliança com Deus. Ao escutarmos o texto de hoje, e os que ouviremos nas próximas semanas, havemos de fazer nosso o cântico ao Deus que salva, o poema ao Deus de Israel, que tendo escutado o grito do seu povo, desceu para o libertar. De facto, também para cada um de nós, e para toda a humanidade, Deus continua a ser o Libertador, o Salvador. E são tantas as escravidões que tentam dominar-nos! Tentemos dar-nos conta delas, e elevar também o nosso grito ao Senhor...
    O povo de Israel, uma vez libertado, é destinado, não já ao serviço do faraó, mas ao serviço do Senhor: «O Senhor tomou-vos e tirou-vos da fornalha de ferro, do Egipto, para serdes para Ele o povo da sua herança, como acontece hoje» (Dt 4, 20). O mesmo sucede connosco. Libertados do pecado pelo Baptismo, somos chamados a servir a Deus e a colaborar com ele na obra da redenção. Efectivamente, faz parte da pedagogia de Deus envolver na obra da salvação aqueles que foram salvos, fazer seus cooperadores na libertação da humanidade aqueles que foram libertados.
    O evangelho lembra-nos que a graça de Deus nem sempre nos vem de modo suave, atraente, idílico. Por vezes, pode vir como fogo ardente, que queima, que faz doer, que incendeia tudo à nossa volta. O sofrimento pode ser uma graça dura, forte, penetrante como uma espada. Mas é uma graça a acolher e aproveitar. Quantas vidas mudaram para melhor, depois de um sofrimento. Que seria de Inácio de Loiola, sem a perna partida durante o cerco a Pamplona?
    Jesus afirma: Vim trazer a espada, a separação, a cruz, o «perder a vida»; vim trazer um amor semelhante ao meu, um amor crucificado: «Não penseis que vim trazer a paz à terra; não vim trazer a paz, mas a espada... Quem amar o pai ou a mãe mais do que a mim, não é digno de mim. Quem amar o filho ou filha mais do que a mim, não é
    digno de mim. Quem não tomar a sua cruz para me seguir, não é digno de mim.» (vv. 34.37-38). Mas a recompensa é infinitamente superior e abundante: quem acolher os seus discípulos, quem acolher «estes pequeninos que acreditam», e O acolher a Ele, acolhe o Pai: «viremos a ele e nele faremos morada» (Jo 14, 23). E nada do que fizermos e sofrermos por seu amor será perdido: até um copo de água, dado a quem precisa, terá recompensa.
    Peçamos ao Senhor Jesus que nos ajude a aceitar a cruz, pois é graça que pode unir-nos à sua gloriosa paixão. Que nos momentos de sofrimento saibamos imitar as disposições do Coração de Jesus. Que saibamos unir-nos a Ele em todas as provações e sofrimentos da vida, com paciência, generosidade e amor.

    Oratio

    Pai santo, animados pelo teu Espírito, oferecemo-nos a Ti, em união com o Sagrado Coração de Jesus, para vivermos a sua oblação como resposta ao teu amor. Consagramos-Te a nossa vida, orações e acções, alegrias e sofrimentos, como sacrifício de amor e reparação. Eis-nos aqui, ó Pai, para fazermos a tua vontade. Amen.

    Contemplatio

    As ocasiões de tristeza são frequentes neste mundo: O vosso coração ficará cheio de tristeza. Os justos ficam tristes pela ausência de Nosso Senhor; pela recordação dos seus pecados passados; pelas tentações e pelo perigo contínuo de recaírem; pelos escândalos que reinam no mundo; pelas penas e pelas provas desta vida. O Espírito Santo traz-nos alívio e doçura pela paz de uma boa consciência; pelo amor do Sagrado Coração; pelo total abandono na Providência; pelo pensamento da curta duração das penas deste mundo; mais um pouco e me vereis! Nós teremos as nossas tristezas também, mas elas serão mudadas em alegria: Vós estais tristes, mas a vossa tristeza transformar-se-á em alegria. As lágrimas dos pecadores são causadas pelas suas concupiscências; enchem a sua alma de amargura e de desespero. As lágrimas dos justos são causadas pela sua contrição e pelo seu amor por Deus. O Espírito Santo mistura-lhes a sua consolação e a sua paz, esperando que as mude em alegria. (Leão Dehon, OSP 3, p. 437).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Quem não tomar a sua cruz para me seguir,
    não é digno de mim» (Mt 10, 38).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XV Semana - Terça-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XV Semana - Terça-feira

    15 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 2, 1-15a

    Naqueles dias, 1um homem da casa de Levi tomou por esposa uma filha de Levi. 2A mulher concebeu e deu à luz um filho. Viu que era belo, e escondeu-o durante três meses. 3Não podendo mantê-lo escondido por mais tempo, arranjou-lhe uma cesta de papiro, calafetou-a com betume e pez, colocou nela o menino, e foi pô-la nos juncos da margem do rio. 4A irmã dele colocou-se a uma certa distância para saber o que lhe sucederia. 5Ora a filha do faraó desceu ao rio para tomar banho, enquanto as suas jovens acompanhantes caminhavam ao longo do rio. Viu a cesta no meio dos juncos e enviou a sua serva para a trazer. 6Abriu-a e viu a criança: era um menino que chorava. Compadeceu-se dele e disse: «Este é um dos filhos dos hebreus.» 7Então a irmã dele disse à filha do faraó: «Queres que te vá chamar uma ama entre as mulheres dos hebreus, para te amamentar o menino?» 8«Vai», disse-lhe a filha do faraó. E a jovem foi chamar a mãe do menino. 9A filha do faraó disse-lhe: «Leva este menino e amamenta-mo, e dar-te-ei o teu salário.» A mulher levou o menino e amamentou-o. 10O menino cresceu, e ela devolveu-o à filha do faraó. Foi para ela como um filho, e deu-lhe o nome de Moisés, dizendo: «Porque o tirei das águas.» 11Entretanto, Moisés cresceu, foi ao encontro dos seus irmãos e viu os seus carregamentos. Viu também um egípcio que açoitava um dos seus irmãos hebreus. 12Olhando para todos os lados e vendo que não havia ali ninguém, matou o egípcio e enterrou-o na areia. 13Saiu outra vez no dia seguinte e viu dois hebreus a brigar. Disse ao culpado: «Porque bates no teu companheiro?» 14Ao que ele replicou: «Quem te estabeleceu como chefe e juiz sobre nós? Acaso pensas matar-me como mataste o egípcio?» Moisés teve medo e disse para consigo: «Com certeza que o assunto já é conhecido.» 15O faraó ouviu falar deste assunto e procurou matar Moisés.

    Escutamos o relato do nascimento de Moisés, que será o mediador da libertação realizada por Deus em favor do seu povo atribulado e que, de algum modo a antecipa. Como mandara o faraó, todos os recém-nascidos eram afogados no rio Nilo. Mas Deus, que é Aquele que verdadeiramente dirige a história, está atento à sorte de um desses meninos, Moisés, que, de modo inesperado e surpreendente é salvo das águas. Este menino, salvo da morte, será o salvador do seu povo, e será figura de outro Menino que, desde os primeiros dias da sua existência, será ameaçado de morte por Herodes, rei da Judeia.
    Moisés é abandonado num cesto de papiro (v. 3s.), no lugar onde a filha do faraó costuma ir banhar-se. Ao ver o menino, enternece-se e decide adoptá-lo como filho. Entretanto, a irmã de Moisés, Maria, convence a filha do faraó a procurar uma mãe de leite entre as mulheres israelitas. Acaba por ser a verdadeira mãe a alimentar o pequeno Moisés. Depois do desmame, a princesa do Egipto a criança para a corte, fazendo dela um filho (v. 10), e dando-lhe o nome de Moisés. Provavelmente trata-se de um nome abreviado, faltando a primeira parte que continha o nome de uma das divindades do Nilo.
    Na segunda parte do nosso texto, Moisés, já adulto, dá-se conta da sorte dos seus irmãos Hebreus e toma a sua defesa. Uma acção de zelo, excessivamente impetuoso, põe em risco a sua vida. E resolve exilar-se nas terras de Madian, junto ao Mar Vermelho, onde começará uma nova forma de vida e se tornará pastor dos rebanhos de Jetro, seu sogro.

    Evangelho: Mateus 11, 20-24

    Naquele tempo, 20Jesus começou então a censurar as cidades onde tinha realizado a maior parte dos seus milagres, por não se terem convertido: 21«Ai de ti, Corozaim! Ai de ti, Betsaida! Porque, se os milagres realizados entre vós, tivessem sido feitos em Tiro e em Sídon, de há muito se teriam convertido, vestindo-se de saco e com cinza. 22Aliás, digo-vos Eu: No dia do juízo, haverá mais tolerância para Tiro e Sídon do que para vós. 23E tu, Cafarnaúm, julgas que serás exaltada até ao céu? Serás precipitada no abismo. Porque, se os milagres que em ti se realizaram tivessem sido feitos em Sodoma, ela ainda hoje existiria. 24Aliás, digo-vos Eu: No dia do juízo, haverá mais tolerância para os de Sodoma do que para ti.»

    «A quem muito foi dado, muito será exigido; e a quem muito foi confiado, muito será pedido» (Lc 12, 48). O texto que hoje escutamos ilustra bem esta afirmação de Jesus. Corazim, Betsaida e Cafarnaúm beneficiaram da primeira actividade taumatúrgica e missionária de Jesus (vv. 21.23). Mas não se converteram. Jesus aponta-as como protótipos da "geração caprichosa" , semelhante às crianças que, em vez de participarem no jogo que outras crianças organizam nas praças, ficam sentadas sem ligarem ao que se passa (cf. Mt 11, 16-19).
    Os milagres, que Jesus realizou nas cidades próximas do lago de Genesaré, levantavam o véu sobre a sua identidade. Eram prova da acção do Espírito, da vitória sobre Satanás, da misericórdia de Deus, que sempre convida o extraviado a regressar à casa paterna. Eram, por assim dizer, obras-palavra, acções pedagógicas, cuja finalidade era levar ao acolhimento de Jesus e da sua mensagem, na fé: «Convertei-vos e acreditai no evangelho» (Mc 1, 15b). Mas as cidades da Galileia não corresponderam ao dom recebido. Tal correspondência pressupõe uma disponibilidade que vem da consciência da necessidade de ser salvo, de ser libertado do mal. Por isso, as cidades pecadoras, tal como Tiro, Sídon e Sodoma, são potencialmente mais dispostas ao evangelho e à conversão.

    Meditatio

    A primeira leitura traz-nos uma mensagem de confiança e esperança em Deus, mesmo nos momentos de maior provação e sofrimento. Os Hebreus, já reduzidos a dura servidão no Egipto, vêem-se em perigo de extinção com o decreto da morte dos meninos. Tudo parece perdido! Um menino, que certa mãe já não pode esconder, é entregue às águas do Nilo, e parece destinado a morrer. Mas sobrevive, pois é descoberto pela filha do faraó, que o leva para a corte e o educa cuidadosamente. Ao crescer, Moisés torna-se defensor dos seus irmãos oprimidos. Parece raiar a esperança, Mas o jovem tem de fugir e refugiar-se em Madian. O Senhor parece ter abandonado o seu povo. Mas a verdade era outra: o nascimento de Moisés foi o começo da libertação. De momento, ninguém sabe nada sobre esse menino salvador. Mas, mais tarde, ele irá revelar-se o chefe e guia preparado por Deus para conduzir o seu povo à liberdade.
    Deus pede-nos que, em todas as circunstâncias, tenhamos fé e confiança firmes n´Ele, sempre presente e actuante no meio de nós. No momento oportuno, Deus sabe encontrar solução para as nossas dificuldades, uma solução positiva, porque preparada pelo seu amor. A cruz de Jesus foi o começo de uma vida nova. Em Cristo, tornámo-nos
    novas criaturas, filhos de Deus, no Filho muito amado. Uma imprevisível surpresa, que jamais ousaríamos esperar, na triste situação em que nos encontrávamos, mas que Deus preparou para nós.
    Mas Deus também vem ao nosso encontro quando tudo nos corre bem. É o que revela o evangelho. Jesus dirige-se às cidades «onde tinha realizado a maior parte dos seus milagres», onde, portanto, tinha resolvido muitos problemas e dificuldades, onde tinha levado imensa alegria com os sinais realizados. Mas essas cidades não se tinham convertido (v. 20). Quando tudo corre bem, com paz, com serenidade, sem contrariedades, havemos de perguntar-nos se estamos a fazer a nossa parte, se estamos a corresponder aos dons de Deus, se os aproveitamos para servir a sua glória, e para vantagem dos nossos irmãos. Fomos perdoados dos nossos pecados? Também nós havemos de perdoar! Fomos salvos por Cristo? Também devemos empenhar-nos na salvação dos nossos irmãos! A dignidade cristã, que provém da nossa inserção em Cristo Jesus, deve levar-nos a ser para os outros aquilo que Cristo foi para nós.

    Oratio

    Senhor, nosso Deus, nós vos louvamos e bendizemos, porque, em Cristo, nos chamaste a participar da vossa vida divina. Que jamais esqueçamos a nossa vocação, a nossa dignidade, o privilégio de termos sido inseridos na Santíssima Trindade. Que a consciência da nossa dignidade nos ajude a viver intensamente a realidade que a fé nos oferece, de modo que os outros, talvez menos privilegiados, possam receber influência do tesouro de graça com que fomos cumulados. Amen.

    Contemplatio

    O Salvador vem dar-nos a sua própria vida. O bom mestre faz-se nosso alimento. É por nós que se aniquila na Eucaristia. A sua dedicação é sem limites: Amou-nos até ao fim. É para isso que Ele está lá, para alimentar a nossa alma. Foi para isso que Ele desceu do céu: «Eu sou, diz, o pão da vida, que desceu do céu». «O desígnio do Filho de Deus, ao vir à terra, diz M. Olier, foi o de comunicar aos homens a sua vida divina, a fim de os tornar semelhantes a Ele. Começa esta transformação pelo baptismo; mas termina-a e aperfeiçoa-a pela santíssima Eucaristia, o alimento divino que nos dá realmente a sua própria vida e os seus sentimentos, que nos coloca em plena participação do seu interior adorável, e nos faz uma mesma coisa com Ele. Colocou-se no Santíssimo Sacramento para continuar assim a sua missão até ao fim do mundo, e ir, por este meio, a todos os cantos da terra, formar para o seu Pai adoradores em espírito e em verdade... É lá que Ele é fonte de vida divina, que é este vaso imenso e este oceano sem fundo, da plenitude do qual nós somos todos santificados». É por este alimento divino que nós somos de algum modo deificados, participantes da vida divina. (Leão Dehon, OSP 4, p. 244s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «A quem muito foi dado, muito será exigido» (Lc 12, 48).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XV Semana - Quarta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XV Semana - Quarta-feira

    16 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 3, 1-6.9-12

    Naqueles dias, 1Moisés estava a apascentar o rebanho de Jetro, seu sogro, sacerdote de Madian. Conduziu o rebanho para além do deserto, e chegou à montanha de Deus, ao Horeb. 2O anjo do Senhor apareceu-lhe numa chama de fogo, no meio da sarça. Ele olhou e viu, e eis que a sarça ardia no fogo mas não era devorada. 3Moisés disse: «Vou adentrar-me para ver esta grande visão: por que razão não se consome a sarça?» 4O Senhor viu que ele se adentrava para ver; e Deus chamou-o do meio da sarça: «Moisés! Moisés!» Ele disse: «Eis-me aqui!» 5Ele disse: «Não te aproximes daqui; tira as tuas sandálias dos pés, porque o lugar em que estás é uma terra santa.» 6E continuou: «Eu sou o Deus de teu pai, o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacob.» Moisés escondeu o seu rosto, porque tinha medo de olhar para Deus. 9E agora, eis que o clamor dos filhos de Israel chegou até mim, e vi também a tirania que os egípcios exercem sobre eles. 10E agora, vai; Eu te envio ao faraó, e faz sair do Egipto o meu povo, os filhos de Israel.» 11Moisés disse a Deus: «Quem sou eu para ir ter com o faraó e fazer sair os filhos de Israel do Egipto?» 12Ele disse: «Eu estarei contigo. Este é para ti o sinal de que Eu te enviei: quando tiveres feito sair o povo do Egipto, servireis a Deus sobre esta montanha.»

    Integrado na família de Jetro, que lhe deu a filha Séfora como esposa, Moisés adapta-se à nova forma de vida. Seguindo o rebanho, chega ao monte de Deus, o Horeb, no Sinai (v. 1). Será na solidão do Horeb que Deus há-de vir ao seu encontro numa visão que marca a sua vida e, sobretudo, a do seu povo, Israel, e a da Igreja de Cristo. Deus manda-o salvar os seus irmãos escravos no Egipto, figura da humanidade oprimida, que o Enviado de Deus, Jesus Cristo, há-de salvar.
    A visão do Horeb está na origem de uma das mais importantes páginas do Êxodo. Tudo começa com um acontecimento inaudito: uma sarça ardia sem ser devorada pelo fogo (v. 2). Atraído pelo extraordinário acontecimento, Moisés aproxima-se e é surpreendido pela palavra do Senhor, que se declara sensível ao sofrimento do seu povo oprimido no Egipto. O seu grito de aflição chegou aos ouvidos de Deus, que toma a iniciativa de salvar o seu povo. Mas quer salvá-lo com a mediação de homens escolhidos, dispostos a colaborar no seu plano de redenção: «agora, vai; Eu te envio ao faraó, e faz sair do Egipto o meu povo, os filhos de Israel» (v. 10). Diante da grandeza de um tal plano, Moisés sente-se pequeno e fraco, e expõe a Deus os seus limites. Mas o Senhor garante-lhe: «Eu estarei contigo» (v. 12).
    Quando Deus começa uma obra, leva-a até ao fim. A acção do homem insere-se na iniciativa divina, de que se torna simples colaborador. Deus quer realizar as suas obras com a colaboração do homem.

    Evangelho: Mateus 11, 25-27

    25Naquele tempo, Jesus tomou a palavra e disse: «Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos entendidos e as revelaste aos pequeninos. 26Sim, ó Pai, porque isso foi do teu agrado. 27Tudo me foi entregue por meu Pai; e ninguém conhece o Filho senão o Pai, como ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar.»

    O texto que hoje escutamos é como que um meteorito caído do céu joânico. Jesus louva e dá graças ao Pai por actuar de modo tão diferente da lógica humana que exalta o poder e a força em qualquer âmbito da existência. Jesus verifica que são os «pequeninos» que beneficiam da revelação do Pai (v. 25). A revelação da paternidade divina, de que Deus é Pai, sobretudo de Jesus e, por meio d´Ele, dos crentes, é o núcleo fundamental da pregação de Jesus. Na paternidade divina está resumido tudo quanto poderia dizer-se da relação de Deus com os homens. Na filiação divina está resumido tudo o que poderia dizer-se da relação dos homens com Deus. É, pois, o melhor resumo do evangelho.
    O evangelista aproveita a ocasião para declarar a consciência de Jesus e a fé da igreja no mistério das relações trinitárias. O Pai, por amor, dá tudo ao Filho que, por amor, tudo acolhe e tudo restitui ao Pai. O movimento eterno de dom recíproco entre o Pai e o Filho permanece incognoscível à criatura humana. Todavia, por obra do Espírito, efusão perene de amor, o Pai torna-se acessível no Filho e revela-se a si mesmo (v. 27). Tal manifestação é incompreensível à sabedoria humana. Só quem se torna «pequenino», disponível a entrar na lógica da gratuidade de Deus, pode compreendê-la.

    Meditatio

    Na primeira leitura, Deus revela-se como Deus vivo, Deus próximo, Deus que escuta o oprimido, Deus que salva, Deus que ama os homens, Deus que ama o seu povo. O episódio da vocação de Moisés tem enorme importância na história da salvação. Deus revela-se de dois modos complementares. Na sarça ardente, revela-se como força vital. Não é, pois, simplesmente, o «Primeiro Motor Imóvel» dos filósofos, mas uma «Chama viva», diferente de todas as outras, porque não consome, não precisa de ser alimentada. Deus interessa-se pelos homens: «Eu sou o Deus de teu pai, o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacob», diz o Senhor a Moisés (v. 6). Os pagãos representavam Deus como senhor das forças naturais: o Deus da fecundidade, o Deus da vegetação, o Deus que se revela no trovão. Mas Deus revela-se a si mesmo com Aquele que estabelece relações pessoais com pessoas concretas, a quem se manifestou e com quem firmou aliança. O nosso Deus é um Deus que se interessa pelas pessoas, que se faz próximo, que se interessa pelos homens. Isto não exclui que se manifeste através de forças naturais. Mas a sua identidade profunda é estar presente, fazer-se próximo, interessar-se pelas suas criaturas.
    As palavras de Jesus no evangelho de hoje correspondem totalmente a esta atenção divina: «Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque... revelaste estas coisas aos pequeninos» (v. 25). Deus não se deixa impressionar pela grandeza, pela inteligência, pela sabedoria humanas. Mas tem particular atenção para com os pequenos.
    Notemos também que Deus se revela como relação entre o Pai e o Filho: «ninguém conhece o Filho senão o Pai, como ninguém conhece o Pai senão o Filho» (v. 27). «Conhecer», na Bíblia, significa conhecimento de amor íntimo e profundo com alguém: Deus fez-se nosso próximo, revelou-se pessoalmente a nós, a cada um de nós. Deus é o Bom pastor que se dá a conhecer às suas ovelhas e as chama pelo nome. É um Deus ardente, um Deus de fogo, um Deus de amor, que se revela e comunica com amor a to
    do o homem que O procura de coração sincero. Deus é «Pai». Pai do Filho Unigénito, Pai de todos os que acolhem esse Filho. Pai em sentido verdadeiro, porque nos comunicou a sua própria vida e nos tornou herdeiros da sua glória.

    Oratio

    Eu Te bendigo, ó Pai, porque nos destes o teu Filho Jesus e, n´Ele, nos revelastes quanto nos amas. Porque decidiste manifestar-Te a nós, posso, agora, falar-Te com a confiança e o atrevimento de filho. Renova no meu coração a certeza da presença do Espírito, que me garanta que és Pai, que Jesus é o Senhor, que sou chamado à bem-aventurança da comunhão Contigo. Sei que sou uma criatura pequena e frágil. Mas também sei que me amas. Que o teu Espírito de sabedoria e de piedade acenda em mim o gosto pela minha pequenez e pela simplicidade, para que possa sempre acolher-Te, qualquer seja o modo com que decidas manifestar-Te. Amen.

    Contemplatio

    Escutemos os doces convites do Salvador. - «Tomai e comei, diz-nos o bom mestre, isto é o meu corpo; tomai e bebei, isto é o meu sangue». Profeticamente, a sabedoria divina dizia-nos no livro dos provérbios: «Comei o meu pão e bebei o vinho que preparei para vós». O esposo do cântico diz-nos: «Comei, meus amigos, bebei e inebriai-vos, meus bem-amados». Isaías disse: «Vós todos que tendes fome e sede, apressai-vos, vinde e comei gratuitamente; vinde e tomai o vinho e o leite» (55, 1). E no Apocalipse, o Espírito e a Esposa dizem: «Vinde. E quem tem sede venha, e que todos os que querem recebam gratuitamente o alimento da vida» (22, 17). Todos estes convites prementes podem entender-se da Eucaristia. «Vinde todos a mim, diz ainda o Salvador, sobretudo que sofreis e que estás em dificuldade, eu vos reconfortarei» (Mt 11, 28). Isto entende-se de toda a assistência divina, mas também da Eucaristia. Vamos ao pão da vida. Vamos receber espiritualmente e sobretudo sacramentalmente. Ele nos fortificará. Desenvolverá em nós a vida divina, a vida espiritual, a vida de Jesus, o espírito de Jesus, as suas virtudes, os seus sentimentos, as suas disposições e as suas obras. (Leão Dehon, OSP 4, p. 245.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Eu Te bendigo, ó Pai, porque revelaste estas coisas aos pequeninos» (Mt 11, 25).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XV Semana - Quinta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XV Semana - Quinta-feira

    17 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 3, 13-20

    Naqueles dias, 13Moisés disse a Deus: «Eis que eu vou ter com os filhos de Israel e lhes digo: 'O Deus dos vossos pais enviou-me a vós'. Eles dir-me-ão: 'Qual é o nome dele?' Que lhes direi eu?» 14Deus disse a Moisés: «Eu sou aquele que sou.» Ele disse: «Assim dirás aos filhos de Israel: 'Eu sou' enviou-me a vós!» 15Deus disse ainda a Moisés: «Assim dirás aos filhos de Israel: 'O Senhor, Deus dos vossos pais, Deus de Abraão, Deus de Isaac e Deus de Jacob, enviou-me a vós: este é o meu nome para sempre, o meu memorial de geração em geração'. 16Vai, reúne os anciãos de Israel e diz-lhes: 'O Senhor, Deus dos vossos pais, Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob, apareceu-me e disse: Observei-vos com atenção e vi o que vos tem sido feito no Egipto, 17e Eu disse para comigo: Far-vos-ei subir da opressão do Egipto para a terra do cananeu, do hitita, do amorreu, do perizeu, do heveu, do jebuseu, para a terra que mana leite e mel'. 18Eles escutarão a tua voz, e tu irás, tu e os anciãos de Israel, à presença do rei do Egipto, e dir-lhe-eis: 'O Senhor, Deus dos hebreus, saiu ao nosso encontro; e agora permite-nos fazer uma peregrinação de três dias pelo deserto, para oferecermos sacrifícios ao Senhor, nosso Deus.' 19Eu bem sei que o rei do Egipto não vos deixará partir senão obrigado por mão forte. 20Estenderei então a minha mão e ferirei o Egipto com todas as maravilhas que farei no meio dele.

    O capítulo terceiro do livro do Êxodo procura legitimar a vocação e a missão de Moisés. Ele será o mediador da salvação, que o próprio Deus irá realizar em favor do seu povo. No contexto dessa vocação e missão de Moisés, Deus revela o seu nome: Javé, «Eu sou aquele que sou» (v. 14). Com esse nome, Moisés tornará credível a sua missão, pois, no nome, acompanha-o a realidade do Deus nomeado. «Eu sou aquele que sou». Habituámo-nos a escutar este nome de Deus como se fosse uma definição metafísica, uma definição do ser eterno de Deus, "Aquele que existe" desde sempre por ser Deus. Mas os estudiosos da Bíblia dizem-nos actualmente que o verdadeiro significado do nome é: «Eu sou o Deus que está contigo para te salvar». Trata-se de um nome que nos revela a presença, a ajuda, o amor de Deus comprometido com a salvação do seu povo. É o mesmo Deus que apareceu a Abraão, a Isaac e Jacob, o Deus da promessa que, diante da escravidão do seu povo, quer actuar como salvador e que, por isso, adopta outro nome. Este Deus anuncia a Moisés tudo o que vai suceder: o povo vai escutá-lo, e o faraó vai opor resistência. Mas Deus actuará em favor do seu povo por meio de prodígios, as 10 pragas do Egipto, que acabarão por vergar a prepotência do faraó. O Deus de Israel é um Deus próximo e salvador.

    Evangelho: Mateus 11, 28-30

    Naquele tempo, Jesus exclamou: 28«Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, que Eu hei-de aliviar-vos. 29Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito. 30Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve.»

    Depois de ter dado graças ao Pai pela revelação recebida, e de ter anunciado o conteúdo dessa revelação (Mt 11, 25-27), Jesus dirige um convite-chamamento a todos «cansados e oprimidos» (v. 28). A imagem do «jugo» (v. 29) fazia parte, primeiramente, da relação «escravo-senhor». Depois foi aplicada à relação «discípulo-mestre». As alianças humanas, também com a divindade, exprimiam-se em categorias de submissão-obediência. A lei de Moisés, tal como a aplicavam os escribas (cf Mt 23, 4), era um «jugo» particularmente duro, um «jugo insuportável» (Heb 12, 10). Cada mestre tinha que impor um «jugo» aos seus discípulos. Os discípulos de Jesus são convidados a pôr-se ao lado d´Ele, a carregar o mesmo jugo, a levar o mesmo estilo de vida: o dos mansos e humildes, dos pobres e pequenos, que compreenderam o mandamento novo da obediência a Deus e do serviço aos irmãos. O jugo, em si mesmo, é pesado. Mas, levá-lo com Jesus, é causa de doçura. O amor exige pesada renúncia aos próprios instintos egoístas. Mas abre os horizontes da verdadeira vida.

    Meditatio

    «Eu sou aquele que sou» (Ex 3, 14). Há outras traduções da expressão hebraica «éheyé asher éheyé», por exemplo: «Eu sou quem sou». No nosso texto, Deus fala de si como «Eu-sou»: «'Eu sou' enviou-me a vós!» (v. 14). Os exegetas não se cansam de procurar o sentido exacto desta expressão. O nome de Deus é misterioso. Ele não pode revelar-se ao homem senão assim, em primeira pessoa: «Eu sou». É a mais profunda revelação de Deus. Ele não pode ser nomeado como um objecto. É Ele que deve «nomear-se» na nossa vida, é Ele que nos faz sentir a sua presença, é Ele que revela o seu ser: «Eu sou». Não se pode falar de Deus de outro modo. Só Ele pode falar de Si: «'Eu sou' enviou-me a vós!» (v. 14). Na nossa vida, diz-nos como disse a Moisés: «Eu sou». Esta expressão põe-no muito longe e muito perto de nós. Põe-no longe, porque a expressão «Eu sou» é o contrário do que podemos dizer de nós mesmos. Para falar de nós, criaturas limitadas e fracas, o melhor será dizer: «Eu não sou» ou «eu que não sou». Mas Deus pode verdadeiramente dizer de Si: «Eu sou». N´Ele não há limites. É, pois, muito diferente de nós. Mas também muito próximo, porque, ao dizer «Eu sou», afirma: «Eu estou aqui, Eu estou próximo de ti, Eu estou contigo». No nosso texto revela-se como «Deus dos vossos pais, Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob» (v. 16), como Aquele que quer libertar o seu povo. A presença de Deus é uma presença íntima, capaz de socorrer. O «Eu sou» ilimitado é, ao mesmo tempo, um «Eu estou contigo», como diz noutros textos.
    Jesus retomou esta misteriosa palavra para revelar paradoxalmente a sua divindade: «Quando tiverdes erguido ao alto o Filho do Homem, então ficareis a saber que Eu sou» (Jo 8, 28); «Se não crerdes que Eu sou o que sou, morrereis nos vossos pecados.» (Jo 8, 24). A adesão a esta revelação de Deus é indispensável para sairmos dos nossos pecados, dos nossos limites humanos. A expressão «Eu sou», no evangelho de João, deve ser interpretada como uma manifestação da divindade de Jesus: «Jesus, adiantou-se e disse-lhes: «Quem buscais?» Responderam-lhe: «Jesus, o Nazareno.»
    Disse-lhes Ele: «Sou Eu!» (vv. 4-5). Como acontece frequentemente no evangelho de João, estas palavras tem o seu sentido comum: «Eu sou Jesus de Nazaré». Mas, ao mesmo tempo, têm um significado muito mais profundo: «Eu estou em união com o Pai». Jesus revela-se, portanto, como o Nome do Pai. Revela-se paradoxalmente no momento em que, em certo sentido, se despojava da sua divindade para ser apenas um homem que sofre. Mas foi assim que realizou, de modo mais profundo, a presença de Deus no meio de nós. Ao morrer na cruz por nós e connosco, ao tomar sobre Si os nossos pecados, o «Eu sou», Jesus, trouxe a presença de Deus ao mais profundo da nossa condição, da nossa miséria. Em qualquer circunstância da nossa vida podemos, pois, escutar Jesus que nos diz: «Eu sou», «Eu estou aqui», «Eu estou contigo».

    Oratio

    Senhor Jesus, abre-nos os olhos para que, sempre, em toda a parte, em todas as circunstâncias da nossa vida e da vida do mundo, possamos descobrir a tua presença atenta, amorosa, solícita. Tu és verdadeiramente Aquele que está connosco, e a tua presença é um jugo suave e um fardo leve, sempre pronta a apoiar-nos a carregar os nossos pesos, a aliviar-nos do cansaço. Tu, que és manso e humilde de coração, torna o nosso coração semelhante ao teu. Faz-nos saborear a doçura da tua mansidão, a força da tua paciência, o poder da tua humildade. Dá-nos a graça de imitar-te, hoje e sempre. Amen.

    Contemplatio

    Jesus está connosco e não pensamos n' Ele: meio de vós alguém que não conheceis. Pela sua divindade, que enche o céu e a terra, Jesus está em nós com o seu Pai e o seu Espírito, e nós estamos n' Ele: Nele vivemos, nos movemos e existimos (Act 17). Deus está acima de nós para nos proteger; debaixo de nós para nos suster e nos levar; à volta de nós para nos guardar e valer-nos nas nossas necessidades; em nós para nos conservar e para nos mostrar o seu amor. E, no entanto, não o conhecemos como devíamos conhecê-lo, não pensamos n' Ele, não o temos suficientemente presente, nem na nossa memória, nem no nosso espírito, nem no nosso coração, quando a sua recordação e o seu amor deviam fazer as delícias da nossa alma. Esquecemo-nos de que devemos ao nosso Deus uma recordação frequente, uma atenção, uma tendência pelo menos habitual, um olhar respeitoso e terno do espírito e do coração, uma conversa espiritual, uma dependência total, uma completa abertura do coração para o consultar em tudo, para o escutar e agir sob os seus olhos. É neste sentido que é preciso entender diversas passagens do antigo Testamento. «Eu sou o teu Deus omnipotente, caminha diante de mim e sê perfeito» (Gn 17, 1). «Em todos os teus caminhos pensa no Senhor e Ele mesmo dirigirá os teus passos» (Prov 3, 6)... «Tenho sempre o meu olhar voltado para Deus» (Sl 24). «Via sempre Deus junto de mim» (Sl 15). (Leão Dehon, OSP 4, p. 573s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração» (Mt 11, 29).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XV Semana - Sexta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XV Semana - Sexta-feira

    18 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 11, 10-12, 14

    Naqueles dias, 10Moisés e Aarão fizeram todos estes prodígios diante do faraó, mas o Senhor endureceu o coração do faraó, e ele não deixou partir os filhos de Israel da sua terra. 1O Senhor disse a Moisés e a Aarão na terra do Egipto: 2«Este mês será para vós o primeiro dos meses; ele será para vós o primeiro dos meses do ano. 3Falai a toda a comunidade de Israel, dizendo que, aos dez deste mês, tomará cada um deles um animal do rebanho para a família, um animal do rebanho por casa. 4Se a família for pouco numerosa para um animal do rebanho, tomar-se-á com o vizinho mais próximo da casa, segundo o número das pessoas; calculareis o animal do rebanho conforme o que cada um puder comer. 5O animal do rebanho para vós será sem defeito, um macho, filho de um ano, e tomá-lo-eis de entre os cordeiros ou de entre os cabritos. 6Vós o tereis sob guarda até ao dia catorze deste mês, e toda a assembleia da comunidade de Israel o imolará ao crepúsculo. 7Tomar-se-á do sangue e colocar-se-á sobre as duas ombreiras e sobre o dintel da porta das casas em que ele se comerá. 8Comer-se-á a carne naquela noite; comer-se-á assada no fogo com pães sem fermento e ervas amargas. 9Não a comereis nem crua nem cozida na água, mas assada no fogo, a cabeça com as patas e as entranhas. 10Não deixareis dela nada até pela manhã; e o que restar dela pela manhã, queimá-lo-eis no fogo. 11Comê-la-eis desta maneira: os rins cingidos, as sandálias nos pés, e o cajado na mão. Comê-la-eis à pressa. É a Páscoa em honra do Senhor. 12E Eu atravessarei a terra do Egipto naquela noite, e ferirei todos os primogénitos na terra do Egipto, desde os homens até aos animais, e contra todos os deuses do Egipto farei justiça, Eu, o Senhor. 13E o sangue será para vós um sinal nas casas em que vós estais. Eu verei o sangue e passarei ao largo; e não haverá contra vós nenhuma praga de extermínio, quando Eu ferir a terra do Egipto. 14Aquele dia será para vós um memorial, e vós festejá-lo-eis como uma festa em honra do Senhor. Ao longo das vossas gerações, a deveis festejar como uma lei perpétua.

    O tema da Páscoa, no relato do êxodo, aparece entre o anúncio e o facto da morte dos primogénitos. Trata-se de um texto litúrgico, de origem sacerdotal (P). É a festa da libertação, mesmo no seio da opressão. O que Moisés prescreveu para essa noite é o que se cumpre, ainda hoje, no ritual tradicional da ceia pascal hebraica, com que se comemora a libertação dos Hebreus na noite da Páscoa. É também o rito subjacente à última ceia de Jesus com os Apóstolos, antes da sua morte e, portanto, também da nossa missa.
    No texto do Êxodo, dá-se grande importância ao cordeiro pascal: descrevem-se as suas qualidades, as condições, o rito do sacrifício, a refeição ritual e a eficácia do seu sangue colocado nas padieiras das portas. Graças a ele, o anjo exterminador passará adiante, e não sofrerão o flagelo da morte (12, 12ss.). O sangue do cordeiro é profecia do sangue de Jesus Cristo, «Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo» (Jo 1, 29), que a todos nos salvará.
    Os pormenores descritos na perícopa evocam uma realidade vivida pelo povo de Israel naquela noite, e que, agora, são revividos e celebrados. O memorial envolve todos os hebreus que, ao longo dos séculos, o celebram, transmitindo-lhes a força salvadora e transformadora que os seus antepassados receberam naquela noite.

    Evangelho: Mateus 12, 1-8

    Naquele Tempo, 1Jesus passava, num dia de sábado, através das searas. Os seus discípulos, que tinham fome, começaram a arrancar espigas e a comê-las. 2Ao verem isso, os fariseus disseram-lhe: «Aí estão os teus discípulos a fazer o que não é permitido ao sábado!» 3Mas Ele respondeu-lhes:«Não lestes o que fez David, quando sentiu fome, ele e os que estavam com ele? 4Como entrou na casa de Deus e comeu os pães da oferenda, que não lhe era permitido comer, nem aos que estavam com ele, mas unicamente aos sacerdotes? 5E nunca lestes na Lei que, ao sábado, no templo, os sacerdotes violam o sábado e ficam sem culpa? 6Ora, Eu digo-vos que aqui está quem é maior que o templo. 7E, se compreendêsseis o que significa: Prefiro a misericórdia ao sacrifício, não teríeis condenado estes que não têm culpa. Filho do Homem até do sábado é Senhor.»

    Mateus narra uma das numerosas controvérsias entre Jesus e os especialistas da Lei (os escribas), por um lado, e os leigos piedosos (os fariseus), por outro. Eram confrontos inevitáveis. A religião deve ser libertadora. Mas aqueles dirigentes tinham-me feito escravizante, tinham-na tornado aquele jugo insuportável de que falámos ontem.
    O repouso sabático, inicialmente, era uma lei humanitária, que visava proporcionar descanso a quem trabalhava, aos homens livres e aos escravos, e mesmo aos animais. O sábado era um dia de festa para todos, lembrando a libertação da escravidão do Egipto, e antecipando o repouso escatológico, quando a criatura participar no repouso de Deus (cf. Heb 4, 9-11). Mas essa lei ao serviço do homem, tinha sido transformada na mais sagrada das instituições divinas. Por isso, a afirmação de Jesus «o sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado» (Mc 2, 27), soou a verdadeira blasfémia.
    Hoje, encontramos outra grave declaração de Jesus sobre o sábado: «O Filho do Homem até do sábado é Senhor» (v. 8). Uma tal afirmação significa que a autoridade de Jesus é superior à de Moisés, em força da sua relação especial com aquele Deus a quem se pretende honrar com a observância do sábado. Ele, e só Ele, pode definir o que é lícito e o que o não é. Depois de revelar o amor do Pai, Jesus repõe o homem no centro do verdadeiro culto: prestar culto a Deus não pode ser algo de separado da atenção ao homem, que Deus criou e ama. Não pode haver conflito entre a lei religiosa e as exigências do amor ao próximo. A história de Israel confirma-o, uma vez que a sacralidade dos pães da oferenda não impediu David e os seus homens famintos de se alimentarem com eles (vv. 3s.).

    Meditatio

    As minúcias da primeira leitura parecem contradizer as palavras de Jesus no evangelho: «Prefiro a misericórdia ao sacrifício» (v. 7). Ao falar deste modo, Jesus manifesta o espírito do Antigo Testamento, todos símbolos. Por exemplo, se o sangue de um cordeiro não é capaz de salvar, também as minuciosas prescrições do sacrifício não são essenciais, mas definem o significado do símbolo. A carne do cordeiro - diz duas vezes o texto - deve ser comida «nem crua nem cozida na água, mas assada no fogo». Nestas palavras encontramos algo que relaciona &la
    quo;sacrifício» e «misericórdia». A morte de Jesus é total dom de si, supremo sacrifício, acto de misericórdia. Jesus, na sua paixão é transformado pelo Espírito Santo, que é verdadeiro fogo de caridade e de misericórdia. A carne «assada no fogo» sugere este verdadeiro sacrifício.
    A vida cristã não é feita de sacrifícios rituais, mas é união a Cristo. Quando participamos na Missa, estamos presentes a uma celebração, mas unimo-nos a Jesus, oferecendo a nossa vida na sua, para sermos consumidos pelo fogo do amor. Nós, Sacerdotes do Coração de Jesus, como todos os nossos irmãos cristãos, fomos "santificados" pelo nosso baptismo, que nos tornou participantes do sacerdócio e do sacrifício de Cristo. A nossa profissão religiosa confirmou-nos na participação no sacerdócio e no estado de vítima de Cristo; com efeito, dizem as nossas Constituições: «Radicada no Baptismo e na Confirmação, a nossa vocação religiosa é um dom particular em ordem à glória de Deus e para testemunhar o primado do Reino. Encontra o seu sentido na adesão total e alegre à Pessoa de Jesus», sacerdote e vítima (nn. 13-14). Assim, a nossa vida, como a do Pe. Dehon, torna-se "uma missa permanente" (Cst 5). Deste modo, celebramos, em cada momento do nosso dia, "o Memorial da morte e ressurreição do Senhor...momento privilegiado da nossa fé e da nossa vocação de Sacerdotes do Coração de Jesus" (Cst 80).
    «Prefiro a misericórdia ao sacrifício» (v. 7). Jesus reporta esta frase da Escritura no termo de uma controvérsia com os fariseus escandalizados com os discípulos que, em dia de sábado, colhiam espigas para matar a fome. Os fariseus estavam convencidos de que, cumprindo cuidadosamente os pormenores da Lei, cumpriam a vontade de Deus. Mas essa não é a sabedoria evangélica. Deus revelou-se como libertador, e quer que nos aproximemos dele como filhos obedientes mas livres, obedientes porque livres, capazes de ter em conta as situações, de julgar de decidir pelo bem. Deus quer que vivamos na caridade e que todos os preceitos estejam submetidos a essa virtude: «o sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado» (Mc 2, 27).

    Oratio

    Obrigado, Senhor, porque nos libertaste das cadeias que nos oprimiam, da cegueira que nos fazia viver nas trevas, do peso que nos esmagava. Obrigado por nos teres tornado o nosso espírito ágil, livre, cheio de confiança em Ti. Tu és, na verdade, o nosso Amigo, o nosso Salvador, o nosso Redentor. Que, animado pelo teu Espírito, eu me una generosa e alegremente à tua oblação, pela oferta da minha vida, de tudo o tenho, faço e sou, de tudo o que sofro. Assim serei uma eucaristia permanente, para louvor da tua glória e salvação do mundo. Amen.

    Contemplatio

    É pelo seu Coração que Jesus exerce principalmente o seu sacerdócio. - O salmo no-lo diz: Deus escreveu no Coração de Jesus a lei do sacrifício novo. S. Paulo repete-o: Pela oblação de si mesmo, Jesus santificou-nos (Heb 10, 14). É o amor do Coração de Jesus pelo seu Pai e por nós que inspira e dirige a sua oblação e a sua imolação. A Igreja no-lo recorda na santa liturgia: no hino do tempo pascal, Ad regias agni dapes, mostra-nos o amor-sacerdote, ou o Coração sacerdotal de Jesus oferecendo o sacrifício redentor: «É a caridade, é o amor-sacerdote, que derramou o sangue e imolou a carne do divino cordeiro sobre a cruz». «Como amava os seus, Jesus amou-os até ao fim» (Jo13). Depois de uma vida toda de sacrifício, entrega-se aos perseguidores e aos seus carrascos que o crucificam. «É, diz, para que o mundo seja testemunha do amor que tenho pelo meu Pai» (Jo 14). «Amou-me, diz S. Paulo, e entregou-se por mim» (Gal 2). (Leão Dehon, OSP 3, p. 668s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Prefiro a misericórdia ao sacrifício» (Mt 12, 7).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XV Semana - Sábado

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XV Semana - Sábado

    19 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 12, 37-42

    Naqueles dias, 37os filhos de Israel partiram de Ramessés para Sucot, cerca de seiscentos mil a pé, só os homens fortes, sem contar as crianças. 38Também uma turba numerosa partiu com eles, juntamente com ovelhas, bois e gado em grande quantidade. 39Eles cozeram a farinha amassada com que tinham saído do Egipto em bolos sem fermento, pois não tinha fermento. Tinham, na verdade, sido expulsos do Egipto, e não puderam demorar-se; nem sequer fizeram provisões para eles. 40A estadia dos filhos de Israel que residiram no Egipto foi de quatrocentos e trinta anos. 41No final dos quatrocentos e trinta anos, precisamente naquele dia, saíram todos os exércitos do Senhor da terra do Egipto. 42Aquela foi uma noite de vigília para o Senhor, quando Ele os fez sair da terra do Egipto. Esta noite do Senhor será de vigília para todos os filhos de Israel nas suas gerações.

    Com um relato breve e sem plasticidade, a leitura de hoje descreve a saída de Israel do Egipto. Na primeira etapa, «cerca de seiscentos mil a pé, só os homens fortes, sem contar as crianças» é a caminhada de Ramessés a Sucot (v. 37). É um número obviamente exagerado. Mas os orientais gostam de hipérboles. No nosso caso, o número elevado realça a importância do acontecimento.
    O v. 39 alude à «farinha amassado», ao pão ázimo, explicando a razão porque não foi levedado: a pressa com que a partida teve de ser realizada. O v. 40 refere o número de anos que os Hebreus passaram no Egipto: «quatrocentos e trinta anos». Como não se trata de um número simbólico, podemos dar-lhe crédito, o que nos permite adivinhar a cronologia da estadia e colocar a partida do Egipto no tempo do faraó Merneftá, em meados do século XIII a. C., com a chegada a Canaã por volta do ano 1.200 a. C. Mas, o que mais interessa ao autor não é a questão histórica, mas a teológica: o êxodo é, acima de tudo, acção de Deus em favor do seu povo: «Aquela foi uma noite de vigília para o Senhor, quando Ele os fez sair da terra do Egipto» (v. 42 a). Por isso, a noite da páscoa hebraica é uma noite de acção de graças e de louvor a Deus libertador: «Esta noite do Senhor será de vigília para todos os filhos de Israel nas suas gerações» (v. 42b)

    Evangelho: Mateus 12, 14-21

    Naquele tempo, 14os fariseus, saindo dali, reuniram-se em conselho contra Jesus, a fim de o matarem. - 15Quando soube disso, Jesus afastou-se dali. Muitos seguiram-no e Ele curou-os a todos, 16ordenando-lhes que o não dessem a conhecer. 17Assim se cumpriu o que fora anunciado pelo profeta Isaías: 18Aqui está o meu servo, que escolhi, o meu amado, em quem a minha alma se deleita. Derramarei sobre Ele o meu espírito, e Ele anunciará a minha vontade aos povos. 19Não discutirá nem bradará, e ninguém ouvirá nas praças a sua voz. 20Não há-de quebrar a cana fendida, nem apagar a mecha que fumega, até conduzir a minha vontade à vitória. 21E, no seu nome, hão-de esperar os povos!

    Jesus atreveu-se a pôr em causa o absoluto da lei sobre o repouso sabático. Isso só não Lhe custou a vida, porque, ao saber que os seus adversários tinham decidido matá-lo, saiu dali, continuando noutros lugares a sua actividade taumatúrgica e missionária. Os milagres narrados por Mateus, logo depois da cura, ao sábado, do homem que tinha a mão paralisada (Mt 12, 10ss.), provam a autenticidade do amor misericordioso de Deus, que Jesus veio anunciar, e que é o centro e o sentido do seu ministério. Mateus vê realizada em Jesus a profecia de Is 42, 1-4, onde é apresentada a figura do Servo de Javé. Escolhido e enviado por Deus, que o encheu do seu Espírito, o Servo realizará a missão de dar a conhecer a todos os povos a verdadeira relação entre Deus e os homens. O estilo do Servo, manso e humilde, alheio a conflitos e a barulhos, atento a valorizar toda a possibilidade de vida, realiza-se totalmente em Jesus «manso e humilde de coração» (Mt 11, 29), e que pede silêncio sobre as suas obras (cf. Mt 12, 16).
    Mateus, mais uma vez, acentua que, em Jesus se realizam as esperanças judaicas, ajuda a interpretar o evento-Jesus, a compreender-lhe o significado, e apresenta-O como modelo de obediência à palavra do Pai.

    Meditatio

    A Sagrada Escritura é extremamente rica e plena de doutrina. Essa riqueza e plenitude é síntese de tudo quanto foi escrito nos livros sagrados, síntese de profecia e de cumprimento, de passado e de futuro, de história e de vida, de fé e de Espírito Santo. A síntese perfeitamente realizada é Cristo Jesus, Aquele que incarna e resume, na sua vida e na sua mensagem, todo o ideal da Palavra de Deus e todas as realidades da história dos homens, com as suas esperanças mais profundas.
    Cristo, anunciado nas profecias, nas promessas e nas figuras do Antigo Testamento, completa toda a mensagem com a sua vinda e a sua missão: «Nele todas as promessas de Deus se tornaram «sim» e é por isso que, graças a Ele, nós podemos dizer o «ámen» para glória de Deus» (2 Cor 1, 20). «Cristo é o fim da Lei», escreve Paulo aos Romanos (10, 4).
    O evangelho apresenta-nos, hoje, Cristo como servo manso e humilde de coração. É o humilde Filho de Deus que, diante dos fariseus que tramam contra Ele, «a fim de o matarem» (v. 14), não entra em luta, mas se afasta. É o humilde Filho de Deus que a todos cura. Ele é, na verdade, o servo de Deus que não resiste com violência, mas com mansidão, o servo de quem Isaías disse: «O Espírito do Senhor está sobre mim,porque me ungiu para anunciar a Boa-Nova aos pobres; enviou-me a proclamar a libertação aos cativos e, aos cegos, a recuperação da vista; a mandar em liberdade os oprimidos, a proclamar um ano favorável da parte do Senhor». No texto evangélico que hoje escutamos, Isaías fala, duas vezes, de «povos», isto é, de pagãos, de todas as nações: «anunciará a minha vontade aos povos» (v. 18); «no seu nome, hão-de esperar os povos!» (v. 21). Nota-se claramente a intenção de Deus, que quer estender a todo o mundo a sua caridade, o seu amor forte e humilde. Assim se explica também a primeira leitura. Deus escolheu e formou um povo, depois de o libertar das mãos dos pagãos. Mas, todos os privilégios concedidos a esse povo, - «a adopção filial, a glória, as alianças, a lei, o culto, as promessas» (Rm 9, 4) - lhe foram dados para a salvação de todos os povos. Todos os dons, todas as graças que o Senhor nos concede são para utilidade comum: "Cada um viva segundo a graça recebida, pondo-a ao serviço dos outros" (1 Pe 4, 10). Os talentos são para fazer render para bem de todos. Os que não forem feitos render tornam-se títulos de condenação: «A esse servo inútil, lançai-o nas trevas exteriores; ali haverá choro e ranger de dentes» (Mt 25, 30
    ).

    Oratio

    Senhor Jesus, manso e humilde de coração, quero aprender Contigo a manter-me calmo e serenoem todas as situações. Não me pedes que Te imite no teu poder, na tua autoridade, nos teus milagres. Nem me pedes que Te imite na oração, na entrega total, no zelo pela salvação do mundo. Pedes, sim, que Te imite em algo mais fácil, mais íntimo, mais em confronto com as minhas poucas forças e com a minha experiência: a mansidão e a humildade de coração. Obrigado, Senhor. Torna-me manso e humilde de coração. Que sempre beba do teu coração, pela simplicidade da minha vida, pela humildade das minhas atitudes para Contigo e para com os irmãos. Amen.

    Contemplatio

    É mais fácil sentir a simplicidade do que explicá-la. A inocência e a rectidão de coração são muitas vezes louvadas pela Escritura. «Job não teve semelhante, porque era simples e recto (cf. Job 1). Um homem simples segundo o espírito do Evangelho, é um homem que só tem uma opinião, que só quer Deus e que o procura pela via mais direita. A simplicidade, diz Cassiano, é um hábito da alma que a torna incapaz de qualquer duplicidade. Uma alma simples não procura conciliar Deus e o mundo. Procura fazer o que Deus quer, e é tudo. Que importa que os outros a considerem singular! Tobias parecia singular quando evitava o contacto com os idólatras e ia sozinho a Jerusalém prestar as suas homenagens ao verdadeiro Deus (Tb 1,6). Daniel parecia singular quando no meio de uma corte idólatra, se voltava três vezes por dia para o lado da cidade santa para oferecer as suas orações ao Senhor (Dn 6,10). Todavia, fora das coisas de necessidade e de regra, a simplicidade evita o extraordinário na vida exterior. Faz consistir a verdadeira santidade sobretudo nas virtudes interiores: a doçura, a paciência, a mortificação. Parece que os maiores santos amaram menos a prudência da serpente do que a simplicidade da pomba. «Não sei, dizia S. Francisco de Sales, o que me fez esta virtude da prudência: tenho dificuldade em amá-la, e se a amo é apenas por força e por necessidade; sim, as pombas parecem-me mais amáveis, e daria cem serpentes por uma pomba». S. Francisco de Sales tinha eminentemente o espírito de infância tão recomendado por Nosso Senhor aos seus apóstolos. (Leão Dehon, OSP 3, p. 47s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «N´Ele, hão-de esperar os povos!» (Mt 12, 21).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XVI Semana - Segunda-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XVI Semana - Segunda-feira

    21 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 14, 5-18

    Naqueles dias, 5foram anunciar ao rei do Egipto que o povo fugira, e o coração do faraó e dos seus servos mudou para com o povo, e disseram: «Que fizemos, pois deixámos partir Israel do nosso serviço?» 6O faraó atrelou o seu carro de guerra e tomou o seu povo consigo. 7Tomou seiscentos carros de guerra escolhidos e todos os carros de guerra do Egipto com três combatentes em cada um. Senhor endureceu o coração do faraó, rei do Egipto, e ele perseguiu os filhos de Israel, e os filhos de Israel saíram de mão erguida. 9Os egípcios perseguiram-nos e alcançaram-nos quando acampavam junto do mar; todos os cavalos e carros de guerra do faraó, os seus cavaleiros e o seu exército estavam junto de Pi-Hairot, diante de Baal-Safon. 10Quando o faraó se aproximou, os filhos de Israel ergueram os olhos, e eis que os egípcios acampavam atrás deles, e os filhos de Israel tiveram muito medo e clamaram ao Senhor. 11Disseram a Moisés: «Foi por falta de túmulos no Egipto que nos trouxeste para morrermos no deserto? O que é isto que nos fizeste, fazendo-nos sair do Egipto? 12Não foi isto que te dissemos no Egipto, quando dizíamos: 'Deixa-nos! Queremos estar ao serviço do Egipto, porque é melhor para nós servir o Egipto do que morrer no deserto'?» 13Moisés disse ao povo: «Não tenhais medo. Permanecei firmes e vede a salvação que o Senhor fará para vós hoje. Pois vós vistes os egípcios hoje, mas nunca mais os tornareis a ver. 14O Senhor combaterá por vós. E vós ficai tranquilos!» 15O Senhor disse a Moisés: «Porque clamas por mim? Fala aos filhos de Israel e manda-os partir. 16E tu, levanta a tua vara e estende a mão sobre o mar e divide-o, e que os filhos de Israel entrem pelo meio do mar, por terra seca. 17E eis que Eu vou endurecer o coração dos egípcios para que venham atrás deles, e serei glorificado por meio do faraó e de todo o seu exército, dos seus carros de guerra e dos seus cavaleiros, 18e os egípcios saberão que Eu sou o Senhor, quando for glorificado por meio do faraó, dos seus carros de guerra e dos seus cavaleiros.»

    O relato da saída dos Hebreus do Egipto é rápido tal como foi a própria saída. Mas, agora que chegamos ao momento culminante do êxodo, a passagem do Mar Vermelho, os narradores detêm-se a referir pormenores. A travessia do Mar Vermelho é um salto geográfico, mas é, sobretudo, uma mudança de condição: os Hebreus passam da escravidão à liberdade. Por isso, este evento é proclamado no credo (Deus tirou o seu povo do Egipto); é celebrado na festa da Páscoa, é cantado na épica sagrada (Ex 15; Sl 106, 7-12; 136, 13-15) e é historiografado em Ex. 14.
    O texto que hoje escutamos oferece-nos uma outra descrição da saída do Egipto com elementos psicológicos, magistralmente orquestrados. De um lado, o lamento do faraó por ter deixado partir os israelitas. Ficava sem mão-de-obra barata para as construções que estava a realizar!... Por outro lado, a rápida decisão de os perseguir com um numeroso exército. O nosso texto acentua o facto de que «o Senhor tinha endurecido o coração do faraó» (v. 8). A antiga teologia de Israel pensava que tudo quanto acontecia neste mundo fosse disposto por Deus; portanto, também o propósito do rei do Egipto, contra os Hebreus, fazia parte do projecto de salvação, realçando o poder e a grandeza das obras divinas em favor do seu povo.
    O terror do povo, ao ver-se perseguido pelo faraó, e o medo de cair nas suas mãos, suscita murmurações contra Moisés. Esquecendo a servidão, Israel idealiza o tempo vivido no Egipto, deseja regressar e servir o faraó. Moisés tenta acalmar o povo, exortando-o à confiança em Deus, que já realizou tantas obras em seu favor: «Não tenhais medo. Permanecei firmes e vede a salvação que o Senhor fará para vós hoje». Finalmente, Deus entra em acção. Manda a Moisés levantar a vara e estender a mão sobre o mar que se abre em dois, e permite ao povo passá-lo a pé enxuto

    Evangelho: Mateus 12, 38-42

    Naquele tempo, 38 intervieram, então, alguns doutores da Lei e fariseus, que lhe disseram: «Mestre, queremos ver um sinal feito por ti.» 39Ele respondeu-lhes: «Geração má e adúltera! Reclama um sinal, mas não lhe será dado outro sinal, a não ser o do profeta Jonas. 40Assim como Jonas esteve no ventre do monstro marinho, três dias e três noites, assim o Filho do Homem estará no seio da terra, três dias e três noites. 41No dia do juízo, os habitantes de Nínive hão-de levantar-se contra esta geração para a condenar, porque fizeram penitência quando ouviram a pregação de Jonas. Ora, aqui está quem é maior do que Jonas! 42No dia do juízo, a rainha do Sul há-de levantar-se contra esta geração para a condenar, porque veio dos confins da terra para ouvir a sabedoria de Salomão. Ora, aqui está alguém que é maior do que Salomão!»

    A atitude dos doutores da lei e dos fariseus representa aquilo a que se poderia chamar "racionalismo religioso". É a atitude daqueles que, para crerem, exigem acontecimentos sensacionais extraordinários. Jesus indigna-se com essa posição. Ele e a sua palavra são "o sinal" a acolher por aqueles que querem conhecer os mistérios do reino de Deus (cf. Mt 11, 25-27). Por isso, em Marcos, recusa outros sinais (cf. 8, 11). Em Mateus faz o mesmo, ao lembrar o sinal Jonas. Os ninivitas pagãos souberam reconhecer em Jonas um sinal de Deus e converteram-se. Os doutores da lei e os fariseus nem o sinal da morte e da ressurreição do Filho do homem haviam de reconhecer. É que um sinal de Deus só se compreende a partir da fé! E a fé não resulta de uma evidência, de um cálculo lógico, mas da disponibilidade para acolher o dom de Deus, que é o próprio Jesus. Os doutores da lei e os fariseus não tinham essa disponibilidade. Como poderiam compreender o sinal de Jesus morto e ressuscitado? A rainha do Sul fez uma longa viagem para ouvir Salomão (1 Rs 10). Mas eles recusavam-se a escutar Jesus, que é muito mais do que Salomão, porque é a sabedoria e a Palavra de Deus em pessoa, o sinal definitivo de Deus para o mundo.

    Meditatio

    As leituras de hoje falam-nos da cegueira, do fechar do coração e da mente, diante das obras maravilhosas de Deus. Tanto no caso dos hebreus, como no dos escribas e fariseus, há um voluntário esquecimento, um fechar do coração diante daquilo que Deus e Jesus fizeram de extraordinário pelo povo. Trata-se de uma atitude de soberba, de auto-suficiência, de recusa do modo de agir de Deus, nem sempre em sintonia com as normas definidas pela mente humana. O homem é sempre tentado de aprisionar a Deus, de Lhe retirar a liberdade, e de apenas aceitar o que vê e sente.
    Os hebreus, encurralados entre o mar e o exército egípcio, entram em pânico e começam a dizer coisas tresl
    oucadas: «Foi por falta de túmulos no Egipto que nos trouxeste para morrermos no deserto?... Não foi isto que te dissemos no Egipto, quando dizíamos: 'Deixa-nos! Queremos estar ao serviço do Egipto, porque é melhor para nós servir o Egipto do que morrer no deserto'?» (vv. 11-13). Nas suas mentes não há solução para o terrível impasse em que se encontram. Mas Deus encontra essa solução: «O Senhor disse a Moisés: «Porque clamas por mim? Fala aos filhos de Israel e manda-os partir» (v. 15). A solução não está em voltar atrás, mas em avançar, em continuar a marcha, confiando em Deus.
    Também no nosso caminho encontramos obstáculos, dificuldades graves e, por vezes, somos tentados a render-nos, a voltar atrás. Mas não é esse o pensamento de Deus. «Quem olha para trás, depois de deitar a mão ao arado, não é apto para o Reino de Deus», diz Jesus (Lc 9, 62). A solução não está em voltar atrás, ao mais cómodo, ao menos arriscado, mas em pedir ao Senhor que nos faça encontrar a sua solução. Pode ser uma solução inesperada. Mas será sempre na direcção do caminho que, por obediência à sua vontade, iniciámos. E não devemos exigir «sinais», como fizeram os fariseus de que nos fala o evangelho. Deus deu aos Israelitas, no deserto, sinais estrepitosos. Também os pode dar no nosso tempo, se tal for do seu agrado. Mas não nos compete exigi-los. Pedir sinais é, muitas vezes, um alibi para a nossa preguiça, para a nossa pouca vontade de acolher e realizar o projecto de Deus.
    A liturgia da palavra dá-nos uma lição de coragem e de confiança. Deus é forte e fiel. Ele chama-nos a avançar com Ele, que é capaz de transformar as dificuldades em ocasiões para «mostrar a sua glória», a sua presença vitoriosa. «Eu sou o Senhor», diz Deus a Moisés. De nós, apenas pretende confiança total, abandono, tal como os pedia ao povo de Israel para lhe dar a Terra prometida. A soberba, e a dureza de coração, foram praga constante em Israel, foram a cruz carregada por todos os profetas, a começar por Moisés. Cristo é o último destes enviados de Deus. A sua palavra ultrapassa imensamente a de todos os profetas anteriores. Procuremos ouvi-la para fortalecermos a nossa fé, renovarmos a nossa confiança e alcançarmos a salvação.

    Oratio

    Senhor Jesus, também eu, quando me sinto cercado por dificuldades, caio no lamento fácil, que nada resolve, que não dá esperança, que Te ofende. Não repares nos meus lamentos, esquece as minhas ofensas e intervém pelo teu amor fiel. Grita Tu por mim! Não deixes de esperar pela minha resposta, de provocar a minha força, para que o teu nome santo seja proclamado. Amen.

    Contemplatio

    Por ocasião da ressurreição de Lázaro, Marta dá-nos um dos mais belos exemplos de fé e de confiança que há no Evangelho. Lázaro estava morto. Marta, sabendo que Jesus chega, corre ao seu encontro: «Mestre, diz-lhe, se estivésseis aqui, meu irmão não teria morrido. Mas agora que está morto, não desespero ainda, porque sei muito bem que tudo o que pedirdes a Deus, Ele vo-lo concederá». Este acto de fé e de confiança ganhou o Coração de Jesus. Nosso Senhor diz a Marta. «O vosso irmão ressuscitará». - «Sei bem, diz Marta, que ressuscitará na ressurreição geral no fim do mundo», e ela subentende: «Mas não é somente isso que eu peço». Jesus lê na sua alma. Quer ainda avivar a sua fé e dá-lhe uma resposta que se refere, ao mesmo tempo, à ressurreição última e à ressurreição próxima de Lázaro: «Eu sou, diz, a ressurreição e a vida: quem acredita em mim viverá, mesmo que esteja morto... Acreditais nisto?» Isto quer dizer: «Se alguém morreu na fé, viverá eternamente e pode mesmo ressuscitar temporalmente, se algum dos seus tiver bastante fé para obter este milagre». Marta compreendeu: «Sim, diz, creio que sois todo-poderoso, porque sois o Filho de Deus vivo, que veio a este mundo». E então Marta vai procurar Maria, que reza e chora em casa, depois todos se encaminham para o túmulo onde o milagre se realizará. Este milagre era o fruto da ternura do Coração de Jesus, da oração de Madalena, da fé e da confiança de Marta. (Leão Dehon, OSP 3, p. 102s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra
    «Aqui está alguém que é maior do que Salomão!» (Mt 12, 42).

  • S. Maria Madalena

    S. Maria Madalena


    22 de Julho, 2025

    Maria, presumivelmente nascida em Magdala, pequena povoação nas margens do lago de Tiberíade, é uma das mulheres que seguiram e serviram o Senhor durante a sua vida pública (cf. Mt 20, 55s.). Diz-se que, libertada por Jesus da opressão dos demónios, O seguiu fielmente até aos pés da cruz. Quando, no primeiro dia da semana, foi ao túmulo de Jesus, e o encontrou vazio, permaneceu junto dele a chorar e a perguntar pelo seu Mestre. Encontrou-O quando O ouviu chamar pelo seu nome: "Maria!". E tornou-se a primeira testemunha da Ressurreição, levando a Boa Notícia aos próprios Apóstolos.

    Lectio

    Primeira leitura: Cântico dos Cânticos 3, 1-4ª

    Eis o que diz a esposa: No meu leito, toda a noite, procurei aquele que o meu coração ama; procurei-o e não o encontrei. 2Vou levantar-me e dar voltas pela cidade: pelas praças e pelas ruas, procurarei aquele que o meu coração ama.Procurei-o e não o encontrei.3Encontraram-me os guardas que fazem ronda pela cidade: «Vistes aquele que o meu coração ama?» 4Mal me apartei deles, logo encontrei aquele que o meu coração ama.

    O livro do Cântico dos Cânticos, não só consagra o amor entre o homem e a mulher, mas é, sobretudo, a expressão simbólica do amor de Deus pelo seu povo. Também aquele e aquela que têm sede de Deus experimentam longas noites de silêncio, de incompreensível ausência, que lhes purificam os desejos, por vezes bastante redutivos. E, então, reacende-se o desejo de Deus, mais ardente, mais desinteressado, mais vital. É preciso perseverar na ânsia de encontrar a Deus, pedir ajuda e conselho a quem possa ajudar a encontrá-lo, sabendo que Ele é maior do que os nossos desejos e do que aqueles que nos ajudam a procurá-lo. Se não desistirmos de O procurar, Ele aparecerá quando e onde menos O esperarmos.

    Evangelho: João 20, 1.11-18

    No primeiro dia da semana, Maria Madalena foi ao túmulo logo de manhã, ainda escuro, e viu retirada a pedra que o tapava. 11E ficou junto ao túmulo, da parte de fora, a chorar. Sem parar de chorar, debruçou-se para dentro do túmulo, 12e contemplou dois anjos vestidos de branco, sentados onde tinha estado o corpo de Jesus, um à cabeceira e o outro aos pés. 13Perguntaram-lhe: «Mulher, porque choras?» E ela respondeu: «Porque levaram o meu Senhor e não sei onde o puseram.» 14Dito isto, voltou-se para trás e viu Jesus, de pé, mas não se dava conta que era Ele. 15E Jesus disse-lhe: «Mulher, porque choras? Quem procuras?» Ela, pensando que era o encarregado do horto, disse-lhe: «Senhor, se foste tu que o tiraste, diz-me onde o puseste, que eu vou buscá-lo.» 16Disse-lhe Jesus: «Maria!» Ela, aproximando-se, exclamou em hebraico: «Rabbuni!» - que quer dizer: «Mestre!» 17Jesus disse-lhe: «Não me detenhas, pois ainda não subi para o Pai; mas vai ter com os meus irmãos e diz-lhes: 'Subo para o meu Pai, que é vosso Pai, para o meu Deus, que é vosso Deus.'» 18Maria Madalena foi e anunciou aos discípulos: «Vi o Senhor!» E contou o que Ele lhe tinha dito.

    Maria de Magdala, com o seu ardente amor por Jesus, permanece fiel mesmo depois da tragédia do Calvário. Procura-o obstinadamente, e nem o sepulcro vazio a fazem desanimar. Esta mulher é símbolo da Igreja/Esposa, e de toda a alma que procura a Cristo, sabendo que não tem para Lhe oferecer senão lágrimas de amor. O Senhor Ressuscitado e Glorioso deixa-se encontrar por quem assim O procura. Mas só O reconheceremos quando Ele nos chamar pelo nome e nos der a perceber que nos conhece mais a fundo do que pensamos. O encontro encher-nos-á de alegria e far-nos-á viver uma vida nova transfigurada pelo Senhor.

    Meditatio

    Maria Madalena é, para nós, modelo de amor ardente, fiel, reverente, um amor que não sabe e não quer estar longe d´Aquele que ama e que O procura mesmo depois da morte.

    Há diversos tipos de investigação, de procura. A investigação científica, a investigação literária, a procura do sucesso. E todas dão algum sentido à vida. Mas a investigação mais adequada ao homem, mais digna dele é a procura de Deus por amor. Tal procura faz o homem sair de si mesmo em direção ao outro, ao amado, a Cristo, Deus feito homem. "Procurei-o e não o encontrei", diz a esposa dos Cantares. E teve que sair de casa e da cidade para o encontrar. Maria Madalena poderia dizer o mesmo, pois nem sequer encontrou o corpo do seu Senhor. Mas não desistiu de O encontrar, como, tantas vezes, fazemos nós, nos momentos de desolação. Ficou junto ao túmulo, a chorar, a fazer perguntas... E encontrou-O! Encontrou-O quando, Ele mesmo, se deu a conhecer, chamando-a pelo nome: "Maria!". Então, abriram-se-lhe os olhos da mente e do coração: "Rabuni!", exclamou. Os nossos esforços são precisos. Mas não são suficientes para encontrar Jesus. A fé é um dom, uma graça. Há que procurar persistentemente, tenazmente, na oração. Mais tarde ou mais cedo o Senhor revela-nos a sua grandeza e poderemos gritar: "Vi o Senhor!" e dar testemunho do Ressuscitado, como Madalena, os Apóstolos e tantos irmãos ao longo da história, e ainda nos nossos dias. Quem conheceu a longa noite da espera e do desejo tornou-se, muitas vezes, testemunha ardorosa e eficaz da Ressurreição do Senhor.

    Oratio

    Santa Maria Madalena, derramando lágrimas, e procurando Jesus, acabaste por encontrá-lo. Bebeste na fonte da misericórdia, e foste saciada. Tornaste-te a primeira testemunha da Ressurreição, e a evangelizadora dos próprios Apóstolos. Hoje, dirijo-me a ti, confiando na tua poderosa intercessão junto do Senhor Jesus. Também eu sou pecador. Também eu procuro o meu Senhor, no meio de muitas trevas. Alcança-me a graça da compunção, a graça da humildade, e o desejo da pátria celeste. Que lave os meus pecados nas lágrimas do arrependimento e seja saciado do amor e da misericórdia que brotam do Lado aberto e do Coração trespassado do meu Senhor. Ámen.

    Contemplatio

    Jesus pede o amor puro, o amor desinteressado. Quer que aceitemos a aridez, se ela se apresenta, e que mesmo procurando-o, saibamos prescindir da doçura da sua presença. Procuremos Jesus com um amor desvelado, como Madalena, com um amor verdadeiramente dedicado, com o desejo de lhe oferecer o perfume do nosso afeto e da nossa compaixão. Não podemos estar sempre junto de Jesus na oração, saibamos também servi-lo na pessoa dos seus irmãos. Jesus diz a Madalena: «Vai ter com os meus irmãos para lhes participares a minha ressurreição». Vamos ter com os seus irmãos para lhes sermos piedosamente úteis, edificando-os, falando-lhes d'Ele, realizando junto deles algum ato de apostolado. Procuremos Jesus fielmente e de todo nunca o abandonemos, nem por temor, nem por desânimo, nem por causa da nossa vida passada, nem por causa das tentações e das perseguições. Com que ardor Madalena procura o seu bem amado! Ela é a primeira junto do sepulcro no dia de Páscoa. Lá está antes do nascer do dia. Corre a informar-se junto de S. Pedro e de S. João. Volta, mantém-se lá à espera, chora. Dirige-se àquele que ela julga ser o jardineiro, e é Jesus mesmo que a recompensa com o seu afeto tão terno. Mas diz-lhe o «Não me toques!», para lhe recordar que o nosso amor deve ser absolutamente puro, sobrenatural e desinteressado. (Leão Dehon, OSP 4, p. 82s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:

    "Se alguém está em Cristo, é uma nova criatura" (2 Cor 5, 17)

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    S. Maria Madalena (22 Julho)

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XVI Semana - Terça-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XVI Semana - Terça-feira

    22 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 14, 21-15, 1

    Naqueles dias, 21Moisés estendeu a sua mão sobre o mar, e o Senhor fez recuar o mar com um vento forte de oriente toda a noite, e pôs o mar a seco. As águas dividiram-se, 22e os filhos de Israel entraram pelo meio do mar, por terra seca, e as águas eram para eles um muro à sua direita e à sua esquerda. 23Os egípcios perseguiram-nos, e todos os cavalos do faraó, os seus carros de guerra e os seus cavaleiros, entraram atrás deles para o meio do mar. 24E aconteceu que, na vigília da manhã, o Senhor olhou da coluna de fogo e de nuvem, para o acampamento dos egípcios, e lançou a confusão no acampamento dos egípcios. 25Ele desviou as rodas dos seus carros de guerra, e eles conduziam com dificuldade. Os egípcios disseram: «Fujamos diante de Israel, porque o Senhor combate por eles contra o Egipto.» 26O Senhor disse a Moisés: «Estende a tua mão sobre o mar, e que as águas voltem sobre os egípcios, sobre os seus carros de guerra e sobre os seus cavaleiros.» 27Moisés estendeu a sua mão sobre o mar, e o mar voltou ao seu leito normal, ao raiar da manhã, e os egípcios a fugir foram ao seu encontro. E o Senhor desfez-se dos egípcios no meio do mar. 28As águas voltaram e cobriram os carros de guerra e os cavaleiros; de todo o exército do faraó que entrou atrás deles no mar, não ficou nenhum. 29Os filhos de Israel caminharam em terra seca, pelo meio do mar, e as águas eram para eles um muro à sua direita e à sua esquerda. 30O Senhor salvou, naquele dia, Israel da mão do Egipto, e Israel viu os egípcios mortos à beira do mar. 31Israel viu a mão poderosa com que o Senhor actuou contra o Egipto, o povo temeu o Senhor e acreditou nele e em Moisés, seu servo. 1Então, Moisés cantou, e os filhos de Israel também, este cântico ao Senhor. Eles disseram: «Cantarei ao Senhor que é verdadeiramente grande: cavalo e cavaleiro lançou no mar.

    A travessia do Mar Vermelho, descrita em tons poéticos e gloriosos, assinala um dos momentos culminantes da história e da teologia de Israel. Foi uma experiência jamais esquecida pelo povo hebreu. Ao ver-se apertado entre o mar e o exército do faraó, sentiu-se perdido. E foi nessa situação humana de desespero que Deus interveio com a sua força salvadora. Os que pareciam vencer foram vencidos; os condenados à morte foram libertados. O terror transformou-se em admiração, em exultação. É claro que o facto histórico foi ornado de epopeia, tornando-se um evento prodigioso, uma acção divina que deu nas vistas. A teologia, a poesia, a sabedoria e os próprios historiadores de Israel descreveram a travessia do Mar dos Juncos com acentos de entusiasmo, a fim de realçar a acção de Deus, e para que ficasse indelevelmente marcada na memória do povo. O acontecimento histórico terá sido bem mais simples, com a ajuda de elementos naturais, como o vento, que ainda hoje afasta as águas salgadas dos lagos pouco profundos da região. Mas os Hebreus souberam ver nessas circunstâncias a mão providencial de Deus, que os salvou de morte segura: «O Senhor salvou, naquele dia, Israel da mão do Egipto» (v. 30) e «Israel viu a mão poderosa com que o Senhor actuou contra o Egipto» (v. 31). Estas palavras tornam-se um acto de fé fundamental no credo do povo hebreu.

    Evangelho: Mateus 12, 46-50

    Naquele tempo, 46estava Ele ainda a falar à multidão, quando apareceram sua mãe e seus irmãos, que, do lado de fora, procuravam falar-lhe. 47Disse-lhe alguém: «A tua mãe e os teus irmãos estão lá fora e querem falar-te.» 48Jesus respondeu ao que lhe falara: «Quem é a minha mãe e quem são os meus irmãos?» 49E, indicando com a mão os discípulos, acrescentou: «Aí estão minha mãe e meus irmãos; 50pois, todo aquele que fizer a vontade de meu Pai que está no Céu, esse é que é meu irmão, minha irmã e minha mãe.»

    Marcos informa que os familiares de Jesus não acreditavam nele. Até pensavam que tinha enlouquecido. Por isso, tentavam levá-lo para casa (Mc 3, 21). Mateus achou essas informações demasiado escandalosas para os seus leitores e, em vez delas, oferece-nos um tema que tem paralelo em Marcos (3, 31-35).
    Jesus está a falar à multidão, quando chegam os seus familiares e manifestam vontade de falar com Ele. Jesus, ao levantar a questão sobre quem são os seus parentes, declara que essa condição não é fruto da carne e do sangue, mas da escuta e actuação da sua palavra. Os fariseus e os escribas, que não acreditam n´Ele, fecham-se na busca de um sinal, sem se darem conta de que estavam diante da própria realidade, superior a qualquer sinal (cf. Mt 12, 38-42). Os discípulos, que escutam a sua palavra, abrem-se à comunhão com Ele, superior à que decorre dos laços de consanguinidade.
    Jesus é a Palavra. Quem a acolhe, torna-se, n´Ele, filho do Pai. O verdadeiro filho faz a vontade do Pai, tal como a fez Jesus, ao deixar-se enviar ao mundo (cf. Jo 6, 8). Com estas palavras, Jesus realça a grandeza de Maria, sua Mãe, que o gerou, segundo a carne, fazendo-se discípula, acolhendo a vontade do Pai: «Eis a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra» (Lc 1, 38).

    Meditatio

    A palavra de Deus apresenta-nos, hoje, duas páginas importantes: numa, faz-nos ver a acção maravilhosa de Deus; noutra, revela-nos a verdadeira família de Jesus.
    A impressionante página do Êxodo, que relata a passagem do Mar Vermelho, ajuda-nos a compreender as maravilhas realizadas por Deus para nos salvar. A libertação dos Hebreus, com mão forte e poderosa, apesar da força dos inimigos, é figura da nossa própria libertação do pecado. Fomos libertados do poder do maligno pela morte e pela ressurreição de Jesus Cristo. Por isso, devemos fazer nossos os sentimentos de Israel: «Israel viu a mão poderosa com que o Senhor actuou contra o Egipto, o povo temeu o Senhor e acreditou nele» (v. 31). O temor de Deus é sumo respeito, inteira obediência, completo amor.
    A passagem do Mar Vermelho, salvação para os Hebreus e morte para os Egípcios, mostra como a mesma realidade pode servir à vida e servir à morte, e tudo pode servir para o bem, se estivermos unidos a Cristo. Para os Israelitas, o mar foi caminho seguro, protecção maravilhosa, «um muro à sua direita e à sua esquerda» (v. 22); para os Egípcios, foi água de perdição. O mesmo sucederá durante a travessia do deserto: as serpentes serão instrumento de morte para os Hebreus; mas a serpente erguida num madeiro, torna-se instrumento de vida, etc. Tudo isto nos ajuda a tomar consciência do poder da fé. Tudo pode servir para o bem e para o mal. Mas o essencial é aderir a Deus. Pedro caminhará sobre a água, enquanto tiver confiança em Jesus. Quando hesitar, começará a afundar-se...
    Jesus transformou a água amarga da sua paixão em água viva para nossa salva
    ção. A morte e a vida cruzam-se: a morte do Filho Unigénito dará vida aos filhos adoptivos de Deus. Permaneçamos firmes na fé. A vitória que vence o mundo é a nossa fé.

    Oratio

    Senhor, dá-me ouvidos para escutar a tua palavra, coração e mente para acolhê-la. Senhor, aumenta a minha fé e a minha confiança. Que o teu Espírito me introduza na família gerada pela escuta da tua Palavra e pela fé, adesão a Ti, confiança em Ti. Dá-me um coração magnânimo, capaz de amar, de amar a todos e sempre, de perdoar, de não limitar os horizontes amplos que me ofereces. Pertencendo a Ti e à tua família, serei capaz de ver as obras maravilhosas que realizas, ainda hoje, como outrora realizaste em favor do teu povo peregrino da Terra Prometida. Senhor, aumenta a minha fé e a minha confiança. Amen.

    Contemplatio

    O nome de Jesus que o Salvador toma no dia da sua circuncisão, determina o seu destino para a morte pela salvação de todos os homens. Nós encontramos, neste único nome inscrito no alto da cruz, todo o motivo, toda a causa, a prisão e o processo que o condenam à morte. Como este nome nos deve ser precioso, porque resume toda a economia da nossa redenção! A salvação está nas nossas mãos, porque está escrito que quem invocar este nome será salvo: «Quem invocar o nome do Senhor, será salvo» (Jo 11). Este nome de salvação é ainda o do Salvador hoje como na Circuncisão. O Filho de Deus é sempre o nosso Jesus, o seu divino Coração é sempre o Coração do nosso Salvador. Tomemos, pois, confiança e recorramos a ele. Peçamos por este nome a graça de uma verdadeira renovação, a graça de já não voltarmos a cair neste ano nos pecados que entristeceram os anos precedentes e de fazermos deles uma penitência sincera e rigorosa. Peçamos luzes novas, novas forças, novas graças para respondermos à nossa bela vocação. Peçamos: Ele prometeu conceder o que pedíssemos em seu nome: «Se pedirdes alguma coisa em meu nome, recebê-lo-eis» (Jo 14). Não esqueçamos mais o poder deste nome, do qual o conselho da augusta Trindade concebeu o projecto, e que a história do povo de Deus simbolizou pela condução por Josué para a entrada na terra prometida. Os profetas anunciaram-no, os anjos trouxeram-no do céu, os apóstolos publicaram-no por toda a terra, os mártires glorificaram-no pela efusão do seu sangue. Acalmou as tempestades, deteve os incêndios, curou os doentes, expulsou os demónios, ressuscitou os mortos. Alegra o céu e faz tremer o inferno, sustém os fortes, reanima os fracos e inspira os heróis da religião. (Leão Dehon, OSP 3, p. 18s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Quem fizer a vontade de meu Pai, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe»
    (Mt 12, 50).

  • S. Brígida, Religiosa, Padroeira da Europa

    S. Brígida, Religiosa, Padroeira da Europa


    23 de Julho, 2025

    Santa Brígida nasceu na Suécia em 1303. Casou muito jovem e teve oito filhos. Já membro da Ordem terceira de S. Francisco, depois da morte do marido, iniciou uma vida de grande austeridade e penitência, continuando a viver na família. Acabou por fundar uma Ordem Religiosa e, partindo para Roma, foi para todos exemplo de grande virtude. Fez diversas peregrinações e escreveu muitas obras em que narra as suas experiências místicas. Morreu em Roma em 1373. É a santa mais famosa dos países escandinavos. Com S. Catarina de Sena e S. Teresa Benedita da Cruz, é padroeira da Europa.

    Lectio

    Primeira leitura: Gálatas 2, 19-20

    Irmãos: Eu pela Lei morri para a Lei, a fim de viver para Deus. Estou crucificado com Cristo. 20Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim. E a vida que agora tenho na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus que me amou e a si mesmo se entregou por mim.

    Paulo diz, "pela Lei morri para a Lei, a fim de viver para Deus" (v. 19). Ele era um daqueles judeus que afirmavam que a aceitação da Lei produzia por si mesma (ex opere operato) a vinculação a Deus. Ao converter-se, morreu para essa conceção pelagiana do religioso: considerar que, nas relações do homem com Deus, é o homem que tem a iniciativa. Pelo contrário, a vida religiosa está, por assim dizer, acima do "eu": "Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim." (v. 20). Não se trata de nenhuma substituição. Paulo não está a fazer antropologia, mas a expor a sua experiência religiosa. Se a presença de Deus no homem fosse o resultado de um esforço puramente humano, "a graça de Deus" seria como que "inútil". A fé é sempre um dom gratuito. Não há mecanismo catequético ou evangelizador que, por si só, produza a graça nos crentes. A "graça" é mesmo gratuidade de Deus. Compete-nos "apenas" acolhê-la e corresponder-lhe.

    Evangelho: João 15, 1-8

    Naquele tempo, Jesus disse aos seus discípulos: "Eu sou a videira verdadeira e o meu Pai é o agricultor. 2Ele corta todo o ramo que não dá fruto em mim e poda o que dá fruto, para que dê mais fruto ainda. 3Vós já estais purificados pela palavra que vos tenho anunciado. 4Permanecei em mim, que Eu permaneço em vós. Tal como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, mas só permanecendo na videira, assim também acontecerá convosco, se não permanecerdes em mim. 5Eu sou a videira; vós, os ramos. Quem permanece em mim e Eu nele, esse dá muito fruto, pois, sem mim, nada podeis fazer. 6Se alguém não permanece em mim, é lançado fora, como um ramo, e seca. Esses são apanhados e lançados ao fogo, e ardem. 7Se permanecerdes em mim e as minhas palavras permanecerem em vós, pedi o que quiserdes, e assim vos acontecerá. 8Nisto se manifesta a glória do meu Pai: em que deis muito fruto e vos comporteis como meus discípulos."

    A alegoria da videira e dos ramos garante-nos que a promessa da presença de Jesus no meio de nós está cumprida. Há que "permanecer" n´Ele para produzir os frutos que Deus espera de nós, ou melhor, permitir ao Espírito, a "seiva" divina, que produza em nós os seus frutos. Por nós mesmos, não podemos produzi-los. A obra de Jesus, que culminou na sua morte, "limpou-nos". No nosso texto é a Palavra que aparece como meio de purificação. Esta Palavra é a comunicação de Jesus aos seus discípulos através da sua vida, da sua morte, da sua pessoa. Há que permanecer n´Ele.

    Meditatio

    Santa Brígida deixou-se purificar pela Palavra. Na capela do SS. Sacramento, na Basílica de S. Paulo, em Roma, há uma estátua de mármore da santa em atitude de quem escuta a voz de Jesus Cristo, que lhe fala da cruz. Aos pés da estátua há uma legenda que diz: "Com o ouvido atento recebe as palavras do seu Deus Crucificado; recebe o Verbo de Deus no seu coração". Efetivamente, uma caraterística de S. Brígida foi a sua intimidade constante com Jesus, a sua familiaridade, as suas íntimas comunicações, e a sua docilidade infantil. O que mais nos espanta nela é a união extraordinária da vida interior e exterior. É uma santa mística que vivia no céu e também uma santa peregrina, em constante movimento de fundações e visitas a santuários.
    Casada com o príncipe Merício, descendente dos reis da Suécia, levou, com o marido, uma vida feliz, no cumprimento fiel dos seus deveres de esposos e de pais. Deus, todavia, tinha um outro projeto de vida para ela. O marido morreu muito mais cedo do que ambos imaginavam. Então, Brígida repartiu equitativamente os bens pelos filhos e consagrou-se inteiramente a Deus, numa vida austera de oração e penitência. Em 1349, Brígida seguiu para Roma com uma filha, a futura S. Catarina da Suécia. Praticou uma vida de grande pobreza, chegando a pedir esmolas. A quem a repreendia, por causa da sua condição nobre, respondeu: "Como Jesus se abaixou sem pedir o vosso consentimento, porque não havia eu de prescindir dele quando me esforço por imitá-lo?".
    Uns dez anos antes de morrer, fundou a ordem de S. Salvador, que ainda hoje existe em diversos países. Depois de peregrinar à Terra Santa, com a filha Catarina e outros dois filhos, regressou a Roma, onde faleceu a 23 de Julho de 1373. Da peregrinação à Terra Santa, dizia: "Foram os mais belos quinze meses da minha vida". Foi na Terra Santa que "se cumpriu o mistério da nossa redenção e donde a Palavra de Deus se difundiu até aos confins do mundo... As pedras sobre as quais caminhou o nosso Redentor permanecem para nós carregadas de recordações e continuam a "gritar" a Boa Nova". É uma espécie de "quinto evangelho". (Exortação Apostólica pós-sinodal Verbum Dei, 89). Como tantos outros cristãos, ao longo dos séculos, S. Brígida, fez essa experiência, no século XIV.

    Oratio

    "Bendito sejais, meu Senhor Jesus Cristo, que, para nossa salvação, permitistes que o vosso Lado e o vosso Coração fossem trespassados pela lança e fizestes brotar abundantemente do vosso peito sangue e água para nossa redenção... Honra sempiterna vos seja dada, meu Senhor Jesus Cristo, que ao terceiro dia ressuscitastes dos mortos e Vos manifestastes vivo àqueles que escolhestes... Louvor e glória eterna a Vós, Senhor Jesus Cristo, que enviastes o Espírito Santo aos corações dos discípulos e comunicastes às almas o vosso imenso amor. Louvor e glória eterna a Vós, Senhor Jesus Cristo". Ámen. (S. Brígida).

    Contemplatio

    Permaneçamos unidos à videira. O agricultor corta da videira os ramos mortos e aqueles que não dão frutos. Limpa os sarmentos que dão frutos, para que produzam ainda mais. «É assim que fará o Pai celeste, diz-nos Nosso Senhor: todo o ramo que não der fruto em mim, cortá-lo-á; atirá-lo-á para longe de mim, será privado da seiva que é a graça e cairá na morte espiritual. Mas os que prometem fruto, podá-los-á, purificá-los-á através de alguma prova e curá-los-á das suas inclinações depravadas, para que deem ainda mais frutos». «Quanto a vós, dizia ainda Nosso Senhor, estais todos podados e purificados pelas instruções que vos dei; mas para que esta purificação se conserve e complete, para que a vossa fecundidade em obras de salvação se desenvolva, uni-vos sempre mais intimamente a mim, permanecei em mim e eu, por minha parte, permanecerei em vós. Como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, se não permanecer na vinha, se não está aderente à cepa donde tira a seiva vivificante, assim não podeis produzir nada, se não permanecerdes em mim». Sim, Senhor, quero permanecer em vós. Sinto que é a condição da vida, da fecundidade e da felicidade. Quero permanecer em vós pela fidelidade da minha recordação, da minha ternura e da minha dedicação, pela conformidade dos meus pensamentos aos vossos pensamentos, dos meus sentimentos aos vossos sentimentos, das minhas alegrias às vossas alegrias, das minhas tristezas às vossas tristezas, do meu querer à vossa vontade. Só quero ter convosco uma existência, um fim, uma felicidade: a glória de Deus, o reino do Sagrado Coração e a salvação das almas. (Leão Dehon, OSP 3, p. 457s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Permanecei em mim, que Eu permaneço em vós" (Jo 15, 4).

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    S. Brígida, Religiosa, Padroeira da Europa (23 Julho)

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XVI Semana - Quinta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XVI Semana - Quinta-feira

    24 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 19, 1-2.9-11.16-20

    Na terceira Lua-nova depois da saída dos filhos de Israel da terra do Egipto, naquele mesmo dia, chegaram ao deserto do Sinai. 2Partiram de Refidim e chegaram ao deserto do Sinai e acamparam no deserto. Israel acampou lá, diante da montanha. 9O Senhor disse a Moisés: «Eis que Eu venho ter contigo no coração da nuvem, para que o povo oiça quando Eu falar contigo e também acredite em ti para sempre.» E Moisés transmitiu ao Senhor as palavras do povo. 10O Senhor disse a Moisés: «Vai ter com o povo, e fá-los santificar hoje e amanhã; que eles lavem as suas roupas. 11Que estejam prontos para o terceiro dia, porque no terceiro dia o Senhor descerá aos olhos de todo o povo sobre a montanha do Sinai. 16E eis que, no terceiro dia, ao amanhecer, houve trovões e relâmpagos e uma nuvem pesada sobre a montanha, e um som muito forte de trombeta, e todo o povo que estava no acampamento tremia. 17Moisés fez sair o povo do acampamento ao encontro de Deus, e colocaram-se no sopé da montanha. 18A montanha do Sinai estava toda coberta de fumo, porque o Senhor tinha descido sobre ela no fogo; e o seu fumo subia como o fumo de um forno, e toda a montanha tremia muito. 19O som da trombeta era cada vez mais forte. Moisés falava, e Deus respondia-lhe no trovão. 20O Senhor desceu sobre a montanha do Sinai, no cimo da montanha. O Senhor chamou Moisés ao cimo da montanha, e Moisés subiu.

    O texto que hoje escutamos prepara a grande teofania em que será concluída a aliança do Sinai. Esta aliança é um pacto de confiança recíproca entre Deus e Israel, que supõe uma ligação especial, com obrigações mútuas, que caracterizarão esse povo e essa fé. O acontecimento é preparado com abundância de pormenores, que servem para realçar a majestade de Deus, a sua absoluta soberania, o respeito que inspira, a atitude de temor e de reverência que suscita no povo.
    O Deus do Sinai é ainda um Deus que infunde temor: é preciso permanecer longe d´Ele, não se Lhe pode ver o rosto, está rodeado por trovões, relâmpagos e fogos. Todas estas imagens sublinham a transcendência de Deus, um Ser que permanece sempre para além e acima de nós, das nossas concepções e imaginações. Moisés conseguiu resistir na presença de Deus, solitário, no cimo do Sinai, depois de quarenta dias e quarenta noites de jejum.
    Quão diferente é o Deus do Novo Testamento! É um Deus que revela outros aspectos da sua divindade, tais como a bondade, a graça, o perdão, a paternidade divina manifestada em Jesus.

    Evangelho: Mateus 13, 10-17

    Naquele tempo, 10aproximando-se de Jesus, os discípulos disseram-lhe: «Porque lhes falas em parábolas?» 11Respondendo, disse-lhes:«A vós é dado conhecer os mistérios do Reino do Céu, mas a eles não lhes é dado. 12Pois, àquele que tem, ser-lhe-á dado e terá em abundância; mas àquele que não tem, mesmo o que tem lhe será tirado. 13É por isso que lhes falo em parábolas: pois vêem, sem ver, e ouvem, sem ouvir nem compreender. 14Cumpre-se neles a profecia de Isaías, que diz: Ouvindo, ouvireis, mas não compreendereis; e, vendo, vereis, mas não percebereis. 15Porque o coração deste povo tornou-se duro, e duros também os seus ouvidos; fecharam os olhos, não fossem ver com os olhos, ouvir com os ouvidos, compreender com o coração, e converter-se, para Eu os curar. 16Quanto a vós, ditosos os vossos olhos, porque vêem, e os vossos ouvidos, porque ouvem. 17Em verdade vos digo: Muitos profetas e justos desejaram ver o que estais a ver, e não viram, e ouvir o que estais a ouvir, e não ouviram.»

    Que pretendia Jesus, ao servir-se de parábolas que os seus ouvintes não podiam entender? Esta questão preocupava os cristãos das primeiras comunidades, que sentiam a necessidade de explicar e interpretar essa forma de anúncio inacessível de modo imediato e, por outro lado, enfrentavam a oposição e o escândalo do povo eleito que, em grande parte, não tinha acolhido o Messias. A resposta já foi apontada na parábola do semeador: há quem esteja disponível e há quem resista à palavra de Jesus. Essa atitude interior faz toda a diferença. Há quem se converta e atinja a bem-aventurança, e há quem não se converta, ouvindo sem compreender e vendo sem perceber. Deus anunciara a Isaías (6, 9s.) as dificuldades que o profeta havia de encontrar na sua missão. Tudo isso se verificou na vida do profeta, mas, sobretudo, na vida de Jesus e, depois d´Ele, na vida da Igreja. A Bíblia aponta a Deus como causa primeira dos eventos, mas não é Ele que determina a docilidade ou a dureza do coração do homem. Isso depende do próprio homem, chamado a assumir, em primeira pessoa, a responsabilidade pelas suas opções diante da palavra que lhe é dirigida.

    Meditatio

    As leituras Deus de hoje mostram-nos que Deus tem vários modos de Se revelar e de manifestar a sua vontade. No Sinai, manifesta-se na fúria da natureza, em «trovões e relâmpagos e uma nuvem pesada sobre a montanha, e um som muito forte de trombeta» (v. 16). Era neste cenário que «Moisés falava, e Deus respondia» (v. 19).
    No evangelho, Jesus fala de modo muito simples e humano, uma vezes explicitamente e outras em parábolas, conforme os ouvintes. Verdadeiramente, como diz o autor da Carta aos Hebreus, «muitas vezes e de muitos modos, falou Deus aos nossos pais, nos tempos antigos, por meio dos profetas. Nestes dias, que são os últimos, Deus falou-nos por meio do Filho» (Heb 1, 1-2). Mas, como quer que a voz de Deus se faça ouvir, é fundamental estar atentos, e acolher a Palavra com docilidade: a esses «é dado conhecer os mistérios do Reino do Céu» (v. 11). Mas, os que fechas os ouvidos à Palavra, os que lhe resistem, estão condenados, porque «fecharam os olhos, não fossem ver com os olhos, ouvir com os ouvidos, compreender com o coração, e converter-se, para Eu os curar», diz o Senhor. É fácil fazer ouvidos surdos ao Senhor, quando outras vozes nos agradam mais. Mas não passam de vozes, de ar em movimento!
    A essência de Deus e da manifestação da sua vontade pertencem ao mundo divino, sobrenatural. Com as nossas forças, com a nossa razão, não podemos compreender ou ter uma ideia sobre a realidade divina. Precisamos da iluminação de Deus, que nos permite ver mais além do que a nossa razão humana. Vem em nossa ajuda a fé, a capacidade dada por Deus ao homem, que lhe permite acolher com humildade e reconhecimento tudo quanto Deus lhe queira revelar.

    Oratio

    Senhor, dai-nos a graça de sabermos ouvir e seguir a tua voz, de reconhecer a tua luz, para que possamos usufruir da bem-aventurança prometida: «Felizes os olhos que vêem o que estais a ver. Porque muitos profetas e reis quiseram ver o que vedes e não o viram, ouvir o que ouvis e não o ouviram!» (Lc 10, 23). Quão grande é, Senhor, o dom que nos concedes na tua palavra escrita e na tua Palavra viva,
    Jesus, o Verbo do Pai! Obrigado, Senhor! Obrigado! Amen.

    Contemplatio

    Os Magos dão-nos uma grande lição de docilidade e de conformidade à vontade divina. A sua docilidade mostra primeiro que estavam habitualmente recolhidos, calmos, interiores. Estavam atentos às luzes e às graças divinas. A estrela maravilhosa foi vista por um grande número de pessoas, no entanto somente os três reis Magos, que merecem verdadeiramente o nome de sábios, é que seguiram a sua direcção. Recordaram-se da predição de Balaão: uma estrela surge de Jacob (Num 24,17). As almas agitadas, distraídas, não compreendem os conselhos divinos. Numa água tranquila e clara, o sol pode reflectir-se com toda a sua grandeza, beleza e brilho, pode aí fazer penetrar os seus raios benfazejos, do mesmo modo que toda a ligeira brisa aí é sentida. Não é assim com as águas turvas, agitadas pelo furacão, revoltas em ondas de espuma: estas águas representam as almas agitadas pelo pecado, pelas paixões e pelos maus hábitos. Os Magos seguem atrás de uma estrela, sem saberem aonde é que ela os conduz; mas uma luz interior os esclarece e seguem-na docilmente. Imitemos a sua fidelidade em seguirem as inspirações da graça. Eles acreditam no que Deus lhes revelou, por mais misterioso e obscuro que isso lhes pareça. Empreendem uma longa e difícil viagem. Submetem-se a grandes sacrifícios e a grandes fadigas para irem adorar o Menino Salvador. Deus não tem necessidade das nossas oferendas, mas ama um coração generoso e dedicado. Assim eles serão recompensados encontrando o Menino divino e sua Mãe. (Leão Dehon, OSP 3, p. 29s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Muitos profetas e justos desejaram ver o que estais a ver, e ouvir o que estais a ouvir» (Mt 13, 17).

  • S. Tiago, Apóstolo

    S. Tiago, Apóstolo


    25 de Julho, 2025

    S. Tiago, chamado "o Maior", para se distinguir de outro apóstolo do mesmo nome, era filho de Zebedeu e de Salomé, e irmão de S. João Evangelista (cf. Mc 15, 40; Mt 27, 56). Com ele, e com Pedro, fez parte do grupo dos primeiros três discípulos de Jesus, o grupo mais íntimo, que acompanhou o Senhor na Transfiguração e na Agonia. Figura proeminente da igreja, Tiago foi preso em Jerusalém, por ordem de Herodes Agripa, sendo o primeiro apóstolo a derramar o seu sangue, em testemunho da sua fé, nos dias da Páscoa (cf. At 12, 1-3), por volta do ano 44. O seu culto desenvolveu-se notavelmente em Compostela que, desde a Idade Média, se tornou um dos centros de peregrinação mais concorridos, em todo o mundo.

    Lectio

    Primeira leitura: Segunda Coríntios 4, 7-15

    Irmãos: Nós trazemos este tesouro em vasos de barro, para que se veja que este extraordinário poder é de Deus e não é nosso. 8Em tudo somos atribulados, mas não esmagados; confundidos, mas não desesperados; 9perseguidos, mas não abandonados; abatidos, mas não aniquilados. 10Trazemos sempre no nosso corpo a morte de Jesus, para que também a vida de Jesus seja manifesta no nosso corpo. 11Estando ainda vivos, estamos continuamente expostos à morte por causa de Jesus, para que a vida de Jesus seja manifesta também na nossa carne mortal. 12Assim, em nós opera a morte, e em vós a vida. 13Animados do mesmo espírito de fé, conforme o que está escrito: Acreditei e por isso falei, também nós acreditamos e por isso falamos, 14sabendo que aquele que ressuscitou o Senhor Jesus, também nos há-de ressuscitar com Jesus, e nos fará comparecer diante dele junto de vós. 15E tudo isto faço por vós, para que a graça, multiplicando-se na comunidade, faça aumentar a acção de graças, para a glória de Deus.

    A liturgia aplica literalmente ao apóstolo Tiago o que Paulo diz a partir da sua própria experiência: "Trazemos sempre no nosso corpo a morte de Jesus" (10ª). Há uma mensagem que começa em Jesus, passa de Jesus a Paulo, de Paulo a Tiago e assim sucessivamente, ao longo da história, formando uma corrente de testemunhas, ou melhor, de "mártires" no sentido próprio do termo. Quem recebe a graça de derramar o sangue por amor de Cristo e dos irmãos, pode dizer, com verdade, que leva em si a morte de Cristo. Mas também o pode dizer quem vive serenamente a radicalidade evangélica no seu dia-a-dia. A Palavra do "mártir" é significativa e eficaz porque, à eloquência da palavra, junta a do sangue derramado.

    Evangelho: Mateus 20, 20-28

    Naquele tempo, aproximou-se de Jesus a mãe dos filhos de Zebedeu, com os seus filhos, e prostrou-se diante dele para lhe fazer um pedido. 21«Que queres?» - perguntou-lhe Ele. Ela respondeu: «Ordena que estes meus dois filhos se sentem um à tua direita e o outro à tua esquerda, no teu Reino.» 22Jesus retorquiu: «Não sabeis o que pedis. Podeis beber o cálice que Eu estou para beber?» Eles responderam: «Podemos.»23Jesus replicou-lhes: «Na verdade, bebereis o meu cálice; mas, o sentar-se à minha direita ou à minha esquerda não me pertence a mim concedê-lo: é para quem meu Pai o tem reservado.» 24Ouvindo isto, os outros dez ficaram indignados com os dois irmãos. 25Jesus chamou-os e disse-lhes: «Sabeis que os chefes das nações as governam como seus senhores, e que os grandes exercem sobre elas o seu poder. 26Não seja assim entre vós. Pelo contrário, quem entre vós quiser fazer-se grande, seja o vosso servo; e 27quem no meio de vós quiser ser o primeiro, seja vosso servo. 28Também o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida para resgatar a multidão.»

    Mateus parece usar de uma fina ironia ao narrar o episódio que hoje escutamos. Facilmente desculpamos a mãe, que, como tal, quere o melhor para os filhos. Mas já não somos tão compreensivos para com os dois irmãos que, sem pensar muito, se declaram prontos a beber o cálice com Jesus. Mas Jesus, muito ao seu jeito, transformando a hipótese em profecia, prediz, efetivamente, a morte que Tiago irá padecer por causa da sua radical fidelidade ao Mestre e ao Evangelho. Ao mesmo tempo, aproveita para dar uma lição de humildade útil a todos, também outros apóstolos irritados e desdenhosos.

    Meditatio

    Partimos, hoje, de uma afirmação de Jesus que nos permite penetrar no seu coração, conhecer as suas disposições mais profundas: "o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida para resgatar a multidão" (v. 28). Jesus tem consciência de ser o Filho imolado por amor, para redenção dos irmãos. Vive conscientemente e decididamente a espiritualidade do Servo de Javé, a espiritualidade do Cordeiro imolado. E não fica por belas palavras ou ideais meramente românticos. A sua espiritualidade "vitimal" ou, se preferirmos, "oblativa" até à imolação concretiza-se no "serviço" vivido no total despojamento de si mesmo e em plena confiança no Pai. É o Servo de Deus, mas também o servo "de muitos", isto é, de todos aqueles que o Pai lhe confiou como irmãos, oprimidos pelo pecado mas abertos ao dom da libertação. Recebeu das mãos do Pai o cálice da paixão, e bebeu-o até à última gota, até à morte de cruz, entregando-se confiadamente nas mãos do Pai.
    Os Apóstolos também "beberam o cálice do Senhor, e tornaram-se amigos de Deus", como diz a antífona da comunhão da festa de S. Tiago inspirada em Mt 20, 22-23. Foi esta a glória dos Apóstolos, e concretamente a de Tiago, que esperava outra bem diferente, quando decidiu seguir Jesus. Quem está com Jesus só pode aspirar a uma glória semelhante à d´Ele: a de participar na sua cruz, nos seus sofrimentos, em profunda união com Ele, em favor de muitos.

    Oratio

    Senhor Jesus, tu és o Filho de Deus Pai que vives e manifestas a tua submissão numa total disponibilidade. Tu és a Palavra que ilumina o nosso caminho: o que dizes vale para ti e vale para nós, e para todos os que livremente te escolheram como Senhor e Mestre. Viveste o teu martírio em todos os momentos da tua vida na terra. Quem te conhece sabe que, para ti, ser servo significa viver tudo por Deus e tudo pelos irmãos. É a "lei real", de que fala na sua carta, o teu apóstolo Tiago. Enche-me do teu Espírito, para toda a minha vida se torne uma oblação santa e agradável ao Pai, pelos homens. Ámen.

    Contemplatio

    Tiago e João, Pedro e André eram muito afetuosos, muito amigos para com Nosso senhor, sobretudo os três primeiros. Eram os discípulos do Sagrado Coração, os amigos de Jesus. Por isso, Nosso Senhor os tinha sempre junto de si. Eram os seus íntimos, os seus confidentes. Muitas vezes os tomava à parte e lhes dava uma confiança que não dava aos outros. Para a ressurreição da filha de Jairo, a exclusão dos outros é fortemente assinalada no Evangelho. S. Marcos diz: «Jesus não permitiu a nenhum dos seus discípulos que o seguisse, exceto Pedro, Tiago e João, irmão de Tiago». S. Lucas diz: «Não permitiu a ninguém entrar na casa com os pais, exceto Pedro, Tiago e João» (8, 51). Para a transfiguração, S. Mateus (17, 2) e S. Marcos (9, 1) dizem-nos: Jesus tomou à parte Pedro, Tiago e João, sozinhos consigo, e levou-os à montanha para rezar. O privilégio é ainda acentuado. No repouso do Monte das Oliveiras, diante de Jerusalém, da qual Nosso Senhor predisse a destruição, tem alguns privilegiados sentados junto de si. E era sem dúvida normalmente assim. Estes tinham os seus segredos. Interrogavam-no em segredo, secretamente, diz S. Mateus (24, 4) à parte, separadamente, diz S. Marcos (13, 3); mas quem eram estes quatro privilegiados? S. Marcos dá-nos os seus nomes. Era Pedro, Tiago, João e André. Na Ceia, Pedro, João e Tiago estavam sentados junto de Jesus. Se eu pudesse pelo meu amor e pela minha fidelidade merecer ser um verdadeiro discípulo do Sagrado Coração! Para o Getsémani, S. Mateus (26, 36) e S. Marcos (14, 33) dizem-nos: «Jesus deixou os seus discípulos à entrada do jardim, mas tomou consigo Pedro, Tiago e João». Os outros não estavam suficientemente formados para suportarem sem escândalo o espetáculo da agonia, mas estes três fizeram um melhor noviciado, foram tão dóceis e tão afetuosos! (L. Dehon, OSP 3, p. 311-312).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Beberam o cálice do Senhor, e tornaram-se amigos de Deus"
    (antífona da comunhão da festa de S. Tiago).
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    S. Tiago, Apóstolo (25 Julho)

     

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XVI Semana - Sexta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XVI Semana - Sexta-feira

    25 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 20, 1-17

    Naqueles dias, 1Deus pronunciou todas estas palavras, dizendo: 2«Eu sou o Senhor, teu Deus, que te fiz sair da terra do Egipto, da casa da servidão. 3Não haverá para ti outros deuses na minha presença. 4Não farás para ti imagem esculpida nem representação alguma do que está em cima, nos céus, do que está em baixo, na terra, e do que está debaixo da terra, nas águas. 5Não te prostrarás diante dessas coisas e não as servirás, porque Eu, o Senhor, teu Deus, sou um Deus zeloso, que castigo o pecado dos pais nos filhos até à terceira e à quarta geração, para aqueles que me odeiam, 6mas que trato com bondade até à milésima geração aqueles que amam e guardam os meus mandamentos. 7Não usarás o nome do Senhor, teu Deus, em vão, porque o Senhor não deixa impune aquele que usa o seu nome em vão. 8Recorda-te do dia de sábado, para o santificar. 9Trabalharás durante seis dias e farás todo o teu trabalho. 10Mas o sétimo dia é o sábado consagrado ao Senhor, teu Deus. Não farás trabalho algum, tu, o teu filho e a tua filha, o teu servo e a tua serva, os teus animais, o estrangeiro que está dentro das tuas portas. 11Porque em seis dias o Senhor fez os céus e a terra, o mar e tudo o que está neles, mas descansou no sétimo dia. Por isso, o Senhor abençoou o dia de sábado e santificou-o. 12Honra o teu pai e a tua mãe, para que se prolonguem os teus dias sobre a terra que o Senhor, teu Deus, te dá. 13Não matarás. 14Não cometerás adultério. 15Não roubarás. 16Não responderás contra o teu próximo como testemunha mentirosa. 17Não desejarás a casa do teu próximo. Não desejarás a mulher do teu próximo, o seu servo, a sua serva, o seu boi, o seu burro, e tudo o que é do teu próximo.»

    Ainda em contexto de aliança, a leitura de hoje apresenta-nos a primeira formulação do Decálogo, a norma pela qual o povo de Deus se guia, o meio pelo qual responde à incumbência de ser o que é ou de se tornar naquilo que deve ser.
    Encontramos, no Antigo Testamento, diversas formulações do Decálogo, conforme as diferentes escolas de teologia que as redigiram. A presente versão é de redacção sacerdotal, como se nota pelo desenvolvimento dado aos mandamentos sobre o culto e sobre o dia de sábado, consagrado ao Senhor.
    Os dez mandamentos fazem parte da bagagem moral inserida no coração de todos os homens pelo Criador. Exprimem a chamada "lei natural", sentida e admitida por todas as morais. Foi Deus quem pôs no coração humano estes princípios, estas tendências e este sentido de bem e de mal, no que se refere às nossas relações com Deus e com o próximo. Por isso, são comuns às diversas culturas do Médio Oriente. E não só! Israel teve o privilégio de os receber directamente de Deus, na teofania do Sinai. Foi um acto de predilecção de Deus para com o seu povo, que também pressupõe maior responsabilidade e fidelidade no seu cumprimento.

    Evangelho: Mateus 13, 18-23

    Naqueles dias, disse Jesus aos seus discípulos: 18«Escutai, pois, a parábola do semeador. 19Quando um homem ouve a palavra do Reino e não compreende, chega o maligno e apodera-se do que foi semeado no seu coração. Este é o que recebeu a semente à beira do caminho. 20Aquele que recebeu a semente em sítios pedregosos é o que ouve a palavra e a acolhe, de momento, com alegria; 21mas não tem raiz em si mesmo, é inconstante: se vier a tribulação ou a perseguição, por causa da palavra, sucumbe logo. 22Aquele que recebeu a semente entre espinhos é o que ouve a palavra, mas os cuidados deste mundo e a sedução da riqueza sufocam a palavra que, por isso, não produz fruto. 23E aquele que recebeu a semente em boa terra é o que ouve a palavra e a compreende: esse dá fruto e produz ora cem, ora sessenta, ora trinta.»

    Ao explicar a parábola do semeador, Jesus desvia a atenção do semeador que lança a semente para as causas da sua diferente recepção. Explicitando a comparação, passa-se da verificação do êxito, combatido mas surpreendente, da pregação do reino de Deus por Jesus e pelos continuadores da sua obra, para a consideração dos motivos que levam os ouvintes e fechar-se ou a abrir-se ao anúncio e, portanto, à conversão.
    O evangelista faz uma releitura da parábola, fazendo realçar como a dureza de coração seja obra do maligno, que peca desde a origem (cf. 1 Jo 2, 22; 3, 8). O homem secunda a obra do maligno quando, deixando-se absorver pelos sofrimentos, pelas incompreensões, pelas riquezas, não permite à palavra de Jesus lançar raízes na sua existência. Pelo contrário, quem é dócil à palavra de Jesus, produz abundantes frutos e entra a fazer parte daqueles «bem-aventurados» e «pequeninos» aos quais são revelados os mistérios do Reino (cf. Mt 13, 16).

    Meditatio

    Na primeira leitura escutamos os dez mandamentos dados por Deus ao seu povo no Sinai. É uma página de grande utilidade também para nós, homens do século XXI, pois nos lembra o que devemos fazer e as prioridades com que havemos de agir. Os três primeiros mandamentos são os mais expostos à crítica e aos ataques de muitos homens do nosso tempo. É fácil menosprezá-los, esquecê-los, talvez até para sublinhar uma presumida maior importância de outros.
    Dar o primeiro lugar a Deus, voltar-se para Ele, em atitude de fé e de oração, buscando a sua intimidade é algo de muito necessário e urgente. O mundo paganizado em que vivemos esquece Deus e o seu serviço. Precisamos de reviver estas grandes verdades da nossa fé. Podem ajudar-nos alguns pensamentos do Papa João Paulo II, expressos na alocução que pronunciou no mosteiro de Santa Catarina do Sinai, a 26 de Fevereiro de 2000. Dizia o Papa: «Os Dez Mandamentos não são imposição arbitrária de um Senhor tirânico. Eles foram escritos na pedra, mas, antes, foram escritos no coração do homem como lei moral universal, válida em todo o tempo e em todo o lugar. Hoje, como sempre, as Dez Palavras da Lei oferecem a única base autêntica para a vida dos indivíduos, das sociedades e das nações. Hoje como sempre, elas são o único futuro da família humana. Salvam o homem da força destrutiva do egoísmo, do ódio e da mentira. Evidenciam todas as falsas divindades que o reduzem à escravidão: o amor de si mesmo até à exclusão de Deus, a avidez do poder e do prazer que subverte a ordem da justiça e degrada a nossa dignidade humana e a do nosso próximo... Observar os Mandamentos significa ser fiéis a Deus, mas significa também ser fiéis a nós mesmos, à nossa autêntica natureza e às nossas mais profundas aspirações. O vento que ainda hoje sopra
    no Sinai recorda-nos que Deus deseja ser honrado nas suas criaturas e no seu crescimento: a glória de Deus é o homem vivo...».
    O evangelho apresenta-nos um texto muito conhecido, o que pode gerar em nós a ideia de que se trata de coisa repetida e sabida, com a sensação de algum aborrecimento. É uma verdadeira tentação contra a Palavra de Deus, que havemos de afastar. A Palavra de Deus não é objecto de curiosidade, mas palavra de vida. É uma semente, disse Jesus. Mas não podemos acolhê-la com a atitude de um naturalista que a observa, secciona, examina ao microscópio e que, satisfeita a sua curiosidade, a deita fora. A semente da Palavra tem por objectivo suscitar vida.
    Também os Mandamentos não são palavra para estudar, simples leis morais, mas semente de vida, de vida de relação e de comunhão com Deus, vida de relação harmoniosa com os outros homens, nossos irmãos.
    Acolher a Palavra de Deus é viver unidos a Ele, é tomar a sério a vida, oferecendo com simplicidade a nossa vida para que seja fecunda para todos.

    Oratio

    Senhor, nosso Deus, no Sinai revelaste-nos o teu nome e deste-nos a tua lei como luz para os nossos passos. Escuta, hoje, a nossa oração e faz que nós, como Moisés e como o teu povo de Israel, reunidos à tua volta, acolhamos a tua palavra eterna, que hoje está centrada nos dez mandamentos, lei de vida, de liberdade e de respeito para com todos os homens. Que o teu Espírito Santo a faça frutificar em nós, para vivermos em íntima comunhão contigo e em fraterna harmonia com todos os homens. Amen.

    Contemplatio

    «Se alguém me ama e guarda a minha palavra, diz ainda Nosso Senhor, meu Pai amá-lo-á e faremos nele a nossa morada... Aquele que me ama e que o prova observando os meus mandamentos, será amado por meu Pai, e eu amá-lo-ei e manifestar-me-ei a ele... E então compreendereis que estou em meu Pai, e sentireis que estou em vós e vós em mim». Ó admirável união! «Estareis unidos a mim, diz Nosso Senhor, pela vida da graça, pelos sentimentos do coração e pelo acordo das vontades... Estarei unido a vós pela influência das minhas luzes e das minhas direcções, pela consolação da minha presença sensível e do meu amor». Posso, portanto, viver no Coração de Jesus e Jesus quer viver no meu coração: «Vós em mim e eu em vós», diz-nos. Ó divino Coração de Jesus, sede daqui em diante a minha morada. Em vós rezarei eficazmente, em vós pedirei conselho sem medo de me enganar, em vós contemplarei o modelo de todas as virtudes. Sei o meio de habitar em vós, é conformar-me à minha regra e a todas as vossas vontades. Agora, posso dizer com David: «Como são amáveis os vossos tabernáculos, ó meu Deus!... Um dia de repouso e de vida sobrenatural na vossa casa, isto é, no vosso Coração, vale mais que mil anos passados entre os pecadores». (Leão Dehon, OSP 3, p. 452).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «O que recebeu a semente em boa terra dá fruto» (Mt 13, 23).

  • S. Joaquim e S. Ana, Pais de Nossa Senhora

    S. Joaquim e S. Ana, Pais de Nossa Senhora


    26 de Julho, 2025

    O evangelho de S. Tiago, escrito apócrifo do século II, reconstrói, decalcando a história de Ana, mãe de Samuel (cf. 1 Sam 1, 1-28), a história da Virgem Maria. Joaquim, idoso sacerdote do templo de Jerusalém, era casado com Ana, mulher estéril. Depois de uma aparição angélica, concebem a futura Mãe do Redentor, que oferecerão a Deus no templo (cf. 21 de Novembro). Mas não há qualquer referência a estes santos nos evangelhos canónicos. Na tradição da Igreja, Joaquim e Ana são protótipos dos esposos cristãos. De há uns anos para cá, a sua festa é também celebrada como "Dia dos Avós".

    Lectio

    Primeira leitura: Ben Sirá 44, 1.10-15

    Louvemos os homens ilustres, nossos antepassados,segundo as suas gerações.10Foram homens de misericórdia, cujas obras de piedade não foram esquecidas. 11Na sua descendência permanecem os seus bens, e a sua herança passa à sua posteridade. 12Os seus descendentes mantiveram-se fiéis à Aliança, os seus filhos também, graças a eles. 13A sua posteridade permanecerá para sempre, e a sua glória não terá fim. 14Os seus corpos foram sepultados em paz, e o seu nome vive de geração em geração; 15Os povos proclamarão a sua sabedoria, e a assembleia cantará os seus louvores.

    Ben Sirá evoca figuras ilustres que marcaram o passado da história de Israel, em ordem a infiltrar, com o seu exemplo, nova vida no presente e a projetar a esperança do povo na direção do futuro. O bem paticado é um capital precioso e fecundo, que permanece, e de que se pode dispor. Quando é praticado em e por homens virtuosos, tece a verdadeira trama da história da salvação. Deus intervém nessa história, para redimir o homem, mas servindo-se do próprio homem. A fidelidade do Senhor tem o seu fundamento no céu, mas radica na terra, graças aos que permanecem fiéis às suas promessas.

    Evangelho: Mateus 13, 16-17

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: "Ditosos os vossos olhos, porque vêem, e os vossos ouvidos, porque ouvem.17Em verdade vos digo: Muitos profetas e justos desejaram ver o que estais a ver, e não viram, e ouvir o que estais a ouvir, e não ouviram.»

    Os discípulos de Jesus têm a sorte de ver a realização das promessas. Gerações de profetas e justos construíram, degrau a degrau, uma história de confiança, de espera e de esperança. Esses profetas e justos são ditosos porque, ainda que não tenham visto nem ouvido o que os discípulos veem e ouvem, acreditaram e apostaram a sua vida baseando-se na Palavra da aliança. Os discípulos são ditosos porque veem e ouvem a Palavra feita carne, Jesus Cristo nossa Vida e Salvação. Eles são o último elo da geração herdeira das promessas e o primeiro da que deve transmitir o testemunho da sua realização.

    Meditatio

    Sabemos muito pouco sobre os pais de Maria. Também eles estão sob a lei do silêncio e do escondimento que Deus aplicou à vida de Maria e à maior parte da vida histórica de Jesus.
    Os evangelhos apócrifos falam das suas dificuldades. Um texto da igreja arménia do século XIII diz-nos que Joaquim e Ana eram justos e puros, levavam uma vida piedosa e um comportamento inocente e imune à calúnia. Eram zelosos na oração, no jejum e na abstinência. Eram uma família assídua ao templo, cheia de caridade, incansável no trabalho e, em consequência, rica de bens. Dividiam o rendimento anual em três partes: uma para o Templo e sustento dos sacerdotes; outra para os pobres, e a terceira para eles mesmos. É lógico pensar que Deus os tenha chamado a participar no mistério de Jesus, cuja chegada prepararam. Permanece a glória de terem sido os pais de Nossa Senhora.
    S. Joaquim e S. Ana encorajam a nossa confiança: Deus é bom e na história da humanidade, história de pecado e de misericórdia, o que fica é a glória, é o positivo que construiu em nós.
    Joaquim e Ana foram escolhidos entre o povo eleito, mas de dura cerviz, para que, entre esse povo, florescesse Maria e, dela, Jesus. É a maior manifestação do amor misericordioso de Deus.
    Agradeçamos ao Senhor. Nós somos os ditosos, nós que vemos e ouvimos, o que muitos profetas e justos apenas entreviram na fé e na esperança.
    Lembremos os nossos avós. Um provérbio africano afirma: "Das panelas velhas, tira-se a melhor sopa". Os "avós" são verdadeiras preciosidades. Há que rodeá-los de cuidados e carinhos, e não desperdiçar o muito que têm para nos dizer e ensinar, particularmente a sua fé e a sua esperança.

    Oratio

    Pai Santo, hoje, "invocarei com confiança S. Joaquim e Santa Ana, que Jesus, teu Filho, honra como seus avós. Eles são poderosos sobre o seu Coração. Dai-me a graça de imitar a sua humildade, a sua confiança, o seu espírito de sacrifício. Lembrando-me de Nazaré, levá-los-ei em espírito até junto de Jesus e de Maria. Ámen. (cf. Leão Dehon, OSP 4, p. 95).

    Contemplatio

    S. Joaquim e Santa Ana tinham chegado a uma idade avançada sem terem filhos como a santa mãe de Samuel. Resignados à vontade de Deus, suplicavam, no entanto, ao mesmo Deus que realizasse os seus desejos dando-lhes um fruto da sua união, que consagrariam ao serviço do templo. Ana sobretudo multiplicava as orações e as boas obras para obter este favor. Um dia em que Joaquim rezava sobre uma colina, onde pastava o seu rebanho, e Ana no seu jardim onde ela tinha feito para si uma solidão, um anjo veio anunciar-lhes que o céu tinha atendido os seus pedidos e que eles iam ser consolados com uma criança de bênção. A oração perseverante é a fonte das maiores graças. No dia 8 de Setembro, Ana deu ao mundo uma filha que, segundo a ordem do Senhor, ela chamou Maria. Com que cuidado educou esta criança abençoada! É representada tendo diante de si a sua filha privilegiada e ensinando-a a ler as divinas Escrituras. Quando Maria atingiu a idade de três anos, Ana e Joaquim, lembrando-se da promessa que tinham feito, levaram-na ao templo de Jerusalém para a oferecerem ao Senhor. Segundo a tradição, Sant'Ana vivia ainda nos primeiros anos de Nosso Senhor. Ela pôde, portanto, levá-lo nos seus braços e sentá-lo nos seus joelhos. Contemplou os seus traços infantis tão belos. Teve conhecimento dos milagres do seu nascimento. Oh! As doces emoções que ela sentiu! A recordação destes felizes momentos faz a sua alegria no céu, bem como a contemplação do seu neto, que reina nos céus eternamente. Invejamos a sua sorte, mas não esquecemos que na comunhão nós levamos também Nosso Senhor no nosso coração. (Leão Dehon, OSP 4, p. 93s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "O fruto do justo é uma árvore de Vida" (Prov 11, 30).

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    S. Joaquim e S. Ana, Pais de Nossa Senhora (26 Julho)

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XVI Semana - Sábado

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XVI Semana - Sábado

    26 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 24, 3-8

    Naqueles dias, 3Moisés veio e relatou ao povo todas as palavras do Senhor e todas as normas, e todo o povo respondeu a uma só voz, e disse: «Poremos em prática todas as palavras que o Senhor pronunciou.» 4Moisés escreveu todas as palavras do Senhor. Levantou-se de manhã cedo e construiu um altar no sopé da montanha, e doze estelas pelas doze tribos de Israel. 5E enviou os jovens dos filhos de Israel, e ofereceram holocaustos e sacrificaram ao Senhor novilhos como sacrifícios de comunhão. 6Moisés tomou metade do sangue e colocou-o em bacias, e metade do sangue espalhou-o sobre o altar. 7Tomou o Livro da Aliança e leu-o na presença do povo, que disse: «Tudo o que o Senhor disse, nós o faremos e obedeceremos.» 8Moisés tomou o sangue e aspergiu com ele o povo, dizendo: «Eis o sangue da aliança que o Senhor concluiu convosco, mediante todas estas palavras.»

    O texto do Êxodo, que hoje escutamos, reflecte um momento chave na tradição sinaítica: a conclusão da aliança, preparada pela legitimação do mediador e pela teofania. O povo mostra-se bem disposto para escutar a palavra de Deus. As alianças antigas incluíam uma série de ritos simbólicos que manifestavam a intenção do coração e a promessa de fidelidade ao pacto estabelecido. Mas, depois, era preciso afirmar expressamente a vontade de guardar a aliança.
    Na nossa perícopa, Moisés refere ao povo a vontade de Deus e a resposta unânime e afirmativa de Israel que manifestava a decisão de escutar a voz de Deus, e cumprir os seus mandamentos. Conscientes da fragilidade humana, os antigos quiseram uma ratificação externa, simbólica, que foi a aspersão de sangue derramado em partes iguais sobre o altar e sobre o povo. Com este rito, Moisés quis unir a Deus o seu povo. Este gesto manifestou o compromisso da recíproca fidelidade das partes, sancionada pelo sangue da mesma vítima, que as une. A infidelidade de uma das partes supõe a rotura da aliança.

    Evangelho: Mateus 13, 24-30

    Naquele tempo, 24Jesus propôs-lhes outra parábola: «O Reino do Céu é comparável a um homem que semeou boa semente no seu campo. 25Ora, enquanto os seus homens dormiam, veio o inimigo, semeou joio no meio do trigo e afastou-se. 26Quando a haste cresceu e deu fruto, apareceu também o joio. 27Os servos do dono da casa foram ter com ele e disseram-lhe: 'Senhor, não semeaste boa semente no teu campo? Donde vem, pois, o joio?' 28'Foi algum inimigo meu que fez isto' - respondeu ele. Disseram-lhe os servos: 'Queres que vamos arrancá-lo?' 29Ele respondeu: 'Não, para que não suceda que, ao apanhardes o joio, arranqueis o trigo ao mesmo tempo. 30Deixai um e outro crescer juntos, até à ceifa; e, na altura da ceifa, direi aos ceifeiros: Apanhai primeiro o joio e atai-o em feixes para ser queimado; e recolhei o trigo no meu celeiro.'»

    Jesus apresenta mais uma parábola, desta vez, com dois semeadores. O primeiro lança à terra boa semente de trigo; o segundo lança à terra sementes de joio, erva daninha que irá prejudicar a sementeira. Este campo semeado de bom trigo e de joio é a Igreja, que está nos seus inícios, mas também toda a humanidade. Numa e noutra crescem lado a lado o trigo e o joio. Os servos querem eliminar a erva daninha. Mas o dono do campo tem outra lógica: «Deixai um e outro crescer juntos, até à ceifa» (v. 30). Deste modo, Jesus revela-nos o coração do Pai, que deixa crescer os bons e os maus. Só na altura da ceifa os separará e lhes dará diferente destino. Deus não intervém para arrancar o mal presente na Igreja e no mundo, presente no coração do homem. Só no momento do juízo ficará patente quem praticou o bem e quem praticou o mal. Ao excesso de zelo de quem pretende a todo o custo e imediatamente eliminar o mal, e quem o faz, contrapõe-se a tolerância de Deus, que não é um qualquer pacifista, mas conhece os tempos de crescimento do coração humano. Era o que já verificava, com grande espanto, o autor do livro da Sabedoria: «Tu tens compaixão de todos, pois tudo podes e desvias os olhos dos pecados dos homens, a fim de os levar à conversão» (Sb 11,23).

    Meditatio

    No momento solene da conclusão da Aliança, é revelada a intenção de Deus em estabelecer comunhão com o seu povo. Os Israelitas, por seu lado, manifestam intenção de ser dóceis à iniciativa de Deus: «Tudo o que o Senhor disse, nós o faremos e obedeceremos» (v. 7). Depois desta afirmação, Moisés aspergiu o povo com o sangue dos holocaustos, símbolo do dom total, dizendo: «Eis o sangue da aliança que o Senhor concluiu convosco» (v. 8).
    Jesus irá retomar estas palavras na Última Ceia: «Este é o meu sangue, sangue da Aliança, que vai ser derramado por muitos, para perdão dos pecados» (Mt 26, 28). É o sangue de quem está para se entregar, de quem aceitou a morte para haja comunhão definitiva entre Deus e o homem. Jesus concluirá na cruz a «nova» aliança, de que a sinaítica era apenas figura. Também esta aliança inclui o mandamento novo, o mandamento do amor: «Dou-vos um novo mandamento: que vos ameis uns aos outros; que vos ameis uns aos outros assim como Eu vos amei» (Jo 13, 34)
    A palavra de Deus, em síntese, lembra-nos hoje importantes atitudes para a nossa vida e para o nosso comportamento de crentes. Em primeiro lugar, mostra-nos a importância de acolher a vontade de Deus. Essa vontade revela-se, não só nos mandamentos, mas em todas as outras disposições divinas, que dizem respeito ao nosso bem, tal como o seu projecto sobre nós, a nossa vocação e missão pessoais, correspondidas com obediência fiel a tudo quanto o Senhor dispõe sobre nós. Outra atitude é a de aliança, a de nos sentirmos unidos a Deus por laços de afecto e de amizade, ter um sentido de pertença e de devoção que torne espontânea, natural e confiante a nossa relação com Deus.
    O evangelho também sugere uma atitude importante para a nossa vida de cristãos: a tolerância, o saber esperar, para não condenarmos sumariamente ninguém. Se havemos de defender-nos do mal, temos que habituar-nos a conviver com ele, mesmo correndo o risco de também cairmos nele. Só a Deus pertence julgar o mal. Para nós, o mal deverá ser como o cadinho onde deixamos purificar a nossa fé, a nossa esperança e a nossa caridade. A pressa, a impaciência, o puritanismo, trouxeram muitos e grandes males à Igreja e aos fiéis.

    Oratio

    Senhor, dá-nos um coração que acolha a tua graça, os teus desígnios, as tuas disposições sobre nós, com a consciência de que, tudo quanto nos pedes, é para nosso bem. Dá-nos um sentido de aliança Contigo, dessa aliança que brotou do teu coração de Pai, para que possamos corresponder com crescente fidelidade ao pacto da tua amizade e da tua redenção. Que a palavra do teu
    Filho seja para nós orientação e guia, que crie em nós as atitudes fundamentais da nossa fé, para que possamos, depois de vivermos no amor e na confiança em Ti, participar da recompensa que nos reservas na eternidade da tua glória. Amen.

    Contemplatio

    Ecce Venio, Ecce Ancilla Domini. Estas palavras traçam a regra da nossa vida. - Nestas palavras encontra-se toda a vocação das almas consagradas ao Sagrado Coração, com o seu fim, os seus deveres, as suas promessas. Este sentimento, esta disposição, estas palavras ditas e sentidas bastam em todas as situações, em todos os acontecimentos, para o presente e para o futuro. Eis que venho, ó meu Deus, para fazer a vossa vontade. Estou aqui, pronto para fazer ou para sofrer, a empreender ou a sacrificar tudo o que pedirdes de mim. A vontade de Deus faz-se conhecer em todo o instante; e se em algum /330 momento a obscuridade e a incerteza preenchem o coração e o espírito, perseveremos com paciência e confiança neste estado, até que agrade à sabedoria e à bondade divinas deixar luzir de novo a sua luz. Uma alma oferecida, uma vítima, sabe que nada tem a escolher nem a decidir por si, a sua escolha está feita, a sua sorte fixada. Quando, como, em que circunstâncias há-de cumprir-se o seu sacrifício, tudo isto está à livre escolha daquele ao qual ela pertence inteiramente. Assim, portanto, pratiquemos o abandono total, o deixar fazer, olhando para aquele que caminhou à frente no mesmo caminho, que o tornou praticável, que deixou atrás de si os rastos sangrentos dos seus passos. Os cabelos da nossa cabeça estão contados. Deus vela mesmo pelas necessidades dos pássaros, não nos esquecerá. Terá cuidado de nós por todas as nossas necessidades em tempo conveniente. Se nos dermos a Ele, dar-se-á também a nós e então o que é que nos há-de poder faltar? Quando Maria se deu pelo Ecce ancilla, recebeu a sua graça suprema: O Verbo fez-se carne e habitou no seu seio. (Leão Dehon, OSP 3, p. 329s).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Eis que venho para fazer a tua vontade» (Heb 10, 9).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XVII Semana - Segunda-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XVII Semana - Segunda-feira

    28 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 32, 15-24.30-34

    Naqueles dias, 15Moisés desceu do monte, trazendo nas mãos as duas tábuas do testemunho, escritas nos dois lados, numa e noutra face. 16As tábuas eram obra de Deus e o que estava gravado nas tábuas fora escrito por Deus. 17Ao ouvir o barulho que o povo fazia, gritando, Josué disse a Moisés: «Há no acampamento alaridos de batalha.» 18Moisés respondeu: «Não são nem gritos de vitória, nem gritos de derrota. O que oiço são vozes de gente a cantar.» 19Ao chegar junto do acampamento, viu o bezerro e as danças. Acendeu-se a sua cólera, atirou com as tábuas e partiu-as ao pé do monte. 20Depois, agarrando no bezerro que tinham feito, queimou-o e reduziu-o a pó fino que espalhou na água. E deu-a a beber aos filhos de Israel. 21Moisés disse a Aarão: «Que te fez este povo para o deixares cometer um tão grande pecado?» 22Aarão respondeu: «Que o meu senhor não se irrite. Tu próprio sabes como este povo é inclinado para o mal. 23Disseram-me: 'Faz-nos um deus que caminhe à nossa frente, pois a Moisés, esse homem que nos fez sair do Egipto, não sabemos o que lhe terá acontecido.' 24Eu disse-lhes: 'Quem tem ouro?' Despojaram-se dele e entregaram-mo; lancei-o ao fogo e saiu este bezerro.» 30No dia seguinte, Moisés disse ao povo: «Cometestes um enorme pecado. No entanto, vou subir para junto do Senhor. Talvez alcance o perdão para o vosso pecado.» 31Moisés voltou para junto do Senhor e disse: «Ah, este povo cometeu um grande pecado. Fizeram para si um deus de ouro. 32Apesar disso, perdoa-lhes este pecado, ou então apaga-me do livro que escreveste.» 33O Senhor disse a Moisés: «Apagarei do meu livro aquele que pecou contra mim. 34Vai agora, e conduz o povo para onde te disser. O meu anjo caminhará diante de ti. Mas no dia da prestação de contas, puni-los-ei pelo seu pecado.»

    Esta página do Êxodo deve ser lida no contexto dos capítulos 32-34, que acusa o «pecado original» contra a aliança e refere a renovação da mesma para reparar a sua ruptura. O episódio do culto idolátrico do bezerro de ouro liga-se ao da conclusão da aliança (Ex 24). Os capítulos intermédios são os da "lei sacerdotal". O conjunto referido é composto pela fusão de diversas fontes, primeiro a eloísta e depois a javista (Ex 34), com elementos deuteronomistas.
    Moisés demora-se no monte, em diálogo com Deus (vv. 7-16). Ao descer, depara-se com o bezerro de ouro e as danças cultuais do povo em honra dele. A sua reacção é violenta: despedaça as tábuas da lei, funde o bezerro de ouro, redu-lo a pó, que espalha na água e dá a beber aos filhos de Israel. Depois, pede contas a Aarão, que atira as culpas para o povo. Moisés faz, então, com que o povo tome consciência do seu pecado, se volte para Deus e peça perdão. Deus responde com a habitual atitude de misericórdia, garantindo a prossecução do seu projecto salvador, mas também anunciando o castigo dos culpados.
    Esta narrativa, composta entre o IX e o VIII século a. C., reflecte, não só a apostasia no tempo do êxodo, mas também a decadência moral e religiosa do tempo dos reis de Israel.
    Aarão faz triste figura, não sabendo reagir adequadamente ao mal do povo e consentindo na apostasia. Moisés, pelo contrário, revela-se um verdadeiro profeta, um homem de Deus, que, com força e fidelidade, testemunha e exige fidelidade a Deus. É como que uma consciência que fala, denuncia o pecado e chama à conversão. Mas também se apresenta como intercessor solitário e audaz diante de Deus, em favor do seu povo.

    Evangelho: Mateus 13, 31-35

    Naquele tempo, 31Jesus propôs-lhes outra parábola: «O Reino do Céu é semelhante a um grão de mostarda que um homem tomou e semeou no seu campo. 32É a mais pequena de todas as sementes; mas, depois de crescer, torna-se a maior planta do horto e transforma-se numa árvore, a ponto de virem as aves do céu abrigar-se nos seus ramos.»
    33Jesus disse-lhes outra parábola: «O Reino do Céu é semelhante ao fermento que uma mulher toma e mistura em três medidas de farinha, até que tudo fique fermentado.»
    34Tudo isto disse Jesus, em parábolas, à multidão, e nada lhes dizia sem ser em parábolas. 35Deste modo cumpria-se o que fora anunciado pelo profeta: Abrirei a minha boca em parábolas e proclamarei coisas ocultas desde a criação do mundo.

    As parábolas do grão de mostarda e do fermento, vêm na continuidade das anteriores, que ilustram as características do Reino, acrescentando mais uma: a desproporção entre os seus começos, quase imperceptíveis, e o seu desenvolvimento extraordinário. A Palavra de Deus geralmente é muito discreta. Se não estivermos atentos, quase não se damos por ela. Mas, quando a acolhemos, tem uma tal eficácia interna, que lança raiz e produz efeitos e frutos surpreendentes. É o que acontece com a pequeníssima semente de mostarda: se germina e ganha raiz, pode atingir a altura de três ou quatro metros. Um pouco de fermento faz levedar uma grande quantidade de farinha, capaz de alimentar multidões. A força interior e exterior do Reino de Deus é tal que chega a transformar toda a vida do homem.

    Meditatio

    Para nosso ensinamento, é interessante notarmos o contraste de atitudes e comportamentos de Aarão e de Moisés. Aarão torna-se cúmplice da idolatria do povo. É ele mesmo que organiza as coisas e torna possível a realização do bezerro de ouro e o seu culto. Mas, quando Moisés lhe pergunta: «Que te fez este povo para o deixares cometer um tão grande pecado?» (v. 21), Aarão desculpa-se e atira as culpas para o povo: «Tu próprio sabes como este povo é inclinado para o mal. Disseram-me: 'Faz-nos um deus`» (vv. 22-23). Moisés, que, pelo contrário, não só não participou no pecado de idolatria, mas até se irritou fortemente ao ver o bezerro de ouro e o povo em festa, vai interceder diante de Deus, para que perdoe o pecado do mesmo povo. Chega ao ponto de pedir a Deus que o apague do seu livro, caso não perdoe ao povo: «Ah, este povo cometeu um grande pecado. Fizeram para si um deus de ouro. Apesar disso, perdoa-lhes este pecado, ou então apaga-me do livro que escreveste» (vv. 31-32). Moisés, inocente, está disposto a sofrer o castigo dos pecadores, a ser rejeitado por Deus: «apaga-me do livro que escreveste» (v. 32). É uma grande lição para nós, sempre dispostos a declarar que nada temos a ver com o pecado dos outros. Ainda que não nos sintamos completamente inocentes, recusamos ser castigados com os outros pecadores. Como aqueles para os quais Jesus contou as parábolas da dracma perdida, da ovelha perdida e do filho pródigo (Lc 16), julgamo-nos bons e justos, agradáveis ao Senhor. Mas agradam ao Senhor aqueles que se sentem solidários com os pecadores, que estão dispostos a carregar sobre si o castigo que pende
    sobre eles. Foi essa a atitude de Moisés. Foi essa, sobretudo, a atitude de Jesus: Ele, o Inocente, carregou sobre Si o pecado de todos nós. Como afirma Paulo tornou-se «maldição» para nos livrar da maldição do pecado (cf. Gl 3, 13).
    É difícil aceitar sofrer o castigo merecido por outros. Tantos cristãos se revoltam quando sofrem, não se sentindo culpados de nada: «Que fiz eu a Deus para sofrer isto?» É mais correcto voltar-se para o Crucificado e, contemplando-O, rezar como Moisés: «Ah, perdoa-lhes este pecado, ou então apaga-me do livro que escreveste» (cf. vv. 31-32)». A contemplação do Senhor crucificado transforma-nos. Faz levedar os nossos pensamentos, projectos, atitudes, esperanças, aspirações, relações. Leva-nos a dar-nos conta de que também nós fabricamos alguns bezerros de ouro a quem prestamos culto. A contemplação do Senhor Crucificado transforma também a nossa convivência colectiva, para vivermos e testemunharmos integralmente o Evangelho. Arrancando tudo o que, nas nossas relações a todos os níveis, não está na direcção da «vida em abundância» que Jesus veio trazer ao mundo (cf. Jo 10, 10), faz crescer tudo o que contribui para essa vida.
    O tema da solidariedade para com os pecadores é acentuado nas nossas Constituições, que falam de Cristo solidário com os pecadores, convidando-nos à mesma solidariedade (cf. Cst 19). Vivendo esta solidariedade, aproximamo-nos do mistério redentor de Cristo, em harmonia com a «experiência de fé do P. Dehon», com a tradição da congregação, para prestar a Cristo "o culto de amor e de reparação que o seu Coração deseja (cf. NQ XXV, 5) (n. 7).

    Oratio

    Pai, o que Te agrada não é a morte do pecador, mas que se converta e viva. Implicados no pecado, mas participantes na graça redentora, queremos, hoje, oferecer-nos a Ti como oblação viva, santa e agradável. Converte-nos a Ti e converte os nossos irmãos para que buscando-Te como único bem necessário, nos consagremos inteiramente ao louvor da tua glória, e sejamos no mundo fermento do Reino. Amen

    Contemplatio

    Jesus rezava: Meu Pai, se é possível, que este cálice se afaste de mim! No entanto, que a vossa vontade se faça e não a minha! Não cede à fadiga, ao desgosto, ao desânimo. Reza com mais insistência. Reza com tanto respeito, com muita humildade, de joelhos, com o rosto por terra. Reza com perseverança: Foi de novo, dizendo as mesmas palavras... Foi ainda, repetindo o seu pedido por uma terceira vez. Reza com resignação: Que a vossa vontade se faça, ó meu Pai, e não a minha! Reza com a disposição de se abandonar inteiramente à vontade do seu Pai e de se entregar por nós até onde for necessário: se este cálice não pode passar sem que eu o beba, que a vossa vontade seja feita! Reza pelos seus apóstolos que dormem e que não rezam ao aproximar-se a tentação. Poderá dizer a Pedro: «Rezei para que a tua fé não desfaleça». Reza por todos durante esta longa oração de três horas. Reza por nós, reza por mim. Acumula graças para os séculos futuros. Antes de morrer, cumpre a sua grande missão de oração. Obtém a graça e a misericórdia pelos pecadores, força e coragem por aqueles que são experimentados e tentados. O seu divino Coração pensou em todos. Eu também estava lá com os meus pecados, com a minha pobreza infinita, com as minhas resistências à graça e à vontade divina. Estava lá com o meu coração duro e frio. Nada o fez desanimar, nem as minhas recaídas, nem a minha ingratidão. Ó Jesus, aplicai-me hoje o fruto das vossas orações. Piedade! Piedade! (Leão Dehon, OSP 3, p. 138s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra
    «Perdoa ao teu povo, Senhor» (cf. Ex 32, 32).

  • SS. Marta, Maria e Lázaro, Hospedeiros do Senhor

    SS. Marta, Maria e Lázaro, Hospedeiros do Senhor


    29 de Julho, 2025

    (Próprio da Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus - Dehonianos)

    Marta é irmã de Maria e de Lázaro de Betânia. No evangelho aparece em apenas três episódios (Lc 10, 38-42; Jo 11, 1-44; Jo 12, 1-11). É uma mulher dinâmica, que acolhe desveladamente Jesus. Maria, também aparece apenas três vezes em cena, nos evangelhos, (Lc 10; Jo 11; Mt 26). É a mulher atenta e contemplativa, que dá mais atenção ao Senhor do que às "coisas do Senhor". De Lázaro sabemos apenas o que dele se diz no evangelho de João (11, 1-14; 12, 1-2). Os três são amigos e hospedeiros do Senhor.

    Lectio

    Primeira leitura: 1 João 4,7-16

    Caríssimos, amemo-nos uns aos outros, porque o amor vem de Deus, e todo aquele que ama nasceu de Deus e chega ao conhecimento de Deus. 8Aquele que não ama não chegou a conhecer a Deus, pois Deus é amor. 9E o amor de Deus manifestou-se desta forma no meio de nós: Deus enviou ao mundo o seu Filho Unigénito, para que, por Ele, tenhamos a vida. 10É nisto que está o amor: não fomos nós que amámos a Deus, mas foi Ele mesmo que nos amou e enviou o seu Filho como vítima de expiação pelos nossos pecados. 11Caríssimos, se Deus nos amou assim, também nós devemos amar-nos uns aos outros. 12A Deus nunca ninguém o viu; se nos amarmos uns aos outros, Deus permanece em nós e o seu amor chegou à perfeição em nós. 13Damos conta de que permanecemos nele, e Ele em nós, por nos ter feito participar do seu Espírito. 14Nós o contemplámos e damos testemunho de que o Pai enviou o seu Filho como Salvador do mundo. 15Quem confessar que Jesus Cristo é o Filho de Deus, Deus permanece nele e ele em Deus. 16Nós conhecemos o amor que Deus nos tem, pois cremos nele. Deus é amor, e quem permanece no amor permanece em Deus, e Deus nele.

    "Amor com amor se paga", diz o nosso povo. "Deus é amor" e amou-nos por primeiro; "Amemo-nos uns aos outros". São os pensamentos centrais deste texto. No capítulo III da sua carta, João abordou o tema do amor do ponto de vista negativo: quem não ama, comete pecado, e o pecador não pode ver a Deus. Agora expõe o mesmo pensamento, mas do ponto de vista positivo: o amor é necessário porque Deus é amor, "porque o amor vem de Deus".
    O nosso amor a Deus é sempre resposta ao seu amor por nós. O amor de Deus manifestou-se, historicamente, em Cristo. A família de Lázaro de Betânia experimentou esse amor, e correspondeu-lhe acolhendo Jesus com delicadeza e generosidade.

    Evangelho: Lucas 10,38-42

    Naquele tempo, Jesus, continuando o seu caminho, entrou numa aldeia. E uma mulher, de nomeMarta, recebeu-o em sua casa.39Tinha ela uma irmã, chamada Maria, a qual, sentada aos pés do Senhor, escutava a sua palavra. 40Marta, porém, andava atarefada com muitos serviços; e, aproximando-se, disse: «Senhor, não te preocupa que a minha irmã me deixe sozinha a servir? Diz-lhe, pois, que me venha ajudar.» 41O Senhor respondeu-lhe: «Marta, Marta, andas inquieta e perturbada com muitas coisas; 42mas uma só é necessária. Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada.»

    Amar o próximo, como Jesus ensinou na parábola do bom samaritano (Lc 10, 25-37), é necessário. Mas não basta, como verificamos logo a seguir, em Lc 10, 38-42. Jesus entra em casa de Marta e Maria. Marta entrega-se ao trabalho por Jesus; Maria, sentada aos pés do Senhor, escuta-O. Marta protesta, e Jesus diz-lhe: "Marta, Marta, andas inquieta e perturbada com muitas coisas; mas uma só é necessária. Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada." (v. 41s.). Não se trata de opor ação e contemplação. Marta apenas representa aqueles cuja ação não se baseia na palavra de Jesus; Maria, pelo contrário, representa os que dão atenção à palavra, que necessariamente deve traduzir-se em serviço amoroso a Deus e ao próximo.

    Meditatio

    Santa Marta é a mulher eficiente e segura de si mesma. Por isso, se deixa levar excessivamente pelo que deve fazer, perdendo de vista a motivação do seu trabalho. No confronto com Jesus, percebe que a eficiência não é o valor mais alto, e que só é importante na medida em que for equilibrado pelo acolhimento, pela atenção ao outro e pelo "temor de Deus", isto é, movido pelo amor. Se assim não for, a ação pode tornar-se ativismo, que descuida o essencial e se torna fonte de ansiedade e de fragmentação.
    O episódio que hoje escutamos levou Santa Marta, não só a fazer coisas pelo Senhor, mas, sobretudo, a colocar-se diante d´Ele em verdade e diálogo. Dessa atitude resultou aquela fé segura com que, ainda que chorosa e desiludida com a morte do irmão Lázaro, se dirigiu ao Senhor: "Senhor, se Tu cá estivesses, o meu irmão não teria morrido. Mas, ainda agora, eu sei que tudo o que pedires a Deus, Ele to concederá." (Jo 11, 21s.). Marta deixou-se conduzir por Jesus no caminho do sofrimento que a levou a conhecer melhor a Jesus e a si mesma.
    Maria é exemplo do discípulo que descobre a Palavra de Deus em Jesus Cristo e a acolhe com atenção. Ela não é um místico que se eleva até Deus, mas um crente que está atento à palavra concreta que Deus lhe dirige, e a procura pôr em prática.
    Lázaro é o chefe de família que acolhe Jesus, Palavra de Deus feita carne, e se deixa transformar por ela. O amor de Jesus fê-lo regressar da morte à vida. E Lázaro, com as suas irmãs, souberam corresponder ao amor de Jesus, acolhendo com entusiasmo, delicadeza e generosidade em sua casa: "Seis dias antes da Páscoa, Jesus foi a Betânia, onde vivia Lázaro, que Ele tinha ressuscitado dos mortos. Ofereceram-lhe lá um jantar. Marta servia e Lázaro era um dos que estavam com Ele à mesa. Então, Maria ungiu os pés de Jesus com uma libra de perfume de nardo puro, de alto preço, e enxugou-lhos com os seus cabelos. A casa encheu-se com a fragrância do perfume." (Jo 12, 1-3).

    Oratio

    Pai santo, que na casa de Betânia, fizeste experimentar ao teu Filho muito amado a alegria da amizade, a solicitude do serviço e a escuta atenta da sua palavra, concede, também a nós, a graça de aderirmos a Ele, nosso único Mestre, pelo ardor da meditação e das obras de caridade, para que, tornando-nos agradáveis aos seus olhos, sejamos acolhidos na alegria eterna. Ámen. (uma das coletas propostas para esta festa).

    Contemplatio

    Marta e Maria têm cuidados assíduos por Nosso Senhor e pelos apóstolos. Assistem-nos nas suas necessidades. Recebem-nos e cuidam deles em Betânia. Nosso Senhor encontra lá o seu repouso, a sua consolação. Volta para lá à noite, depois das suas pregações no templo e é envolvido de cuidados. Marta e Maria são fiéis a Jesus nas suas provações. São vítimas com Ele. Seguem-no até ao Calvário, partilham as suas dores. São humilhadas e insultadas com Ele e por Ele. Madalena não conhece temor nem hesitação. Está ao pé da cruz com a santa Virgem e S. João. É regada com o sangue de Jesus. Recolhe este sangue precioso. Sepulta Jesus. Leva o sudário e os perfumes. O grande sábado mantém-na afastada do sepulcro, mas volta lá na primeira hora depois do sábado. Procura o seu Jesus crucificado. Madalena e as santas mulheres são os nossos modelos para procurarmos Jesus. Procuremo-lo sempre, procuremo-lo por toda a parte. Procuremo-lo, não para fruirmos já, para dele recebermos graças gratuitas e extraordinárias, mas para compreendermos o seu amor, para imitarmos o seu exemplo, para nos imolarmos com ele. O anjo diz às santas mulheres: «Não temais, procurais Jesus crucificado». Nós também já nada temos a temer, se procurarmos Jesus crucificado. Não nos podemos enganar, se seguirmos Jesus até ao Calvário, na humildade e na imolação. Podemos encontrar a ilusão nas consolações espirituais, não temos que a temer na obediência e no sacrifício, no humilde serviço de Jesus e na fidelidade à nossa regra de vida. Vemos em todas as circunstâncias Santa Madalena, aos pés de Jesus, era assim que ela exprimia a sua humildade e a sua fidelidade. Imitemo-la. (Leão Dehon, OSP 4, p. 81s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Eu estou à porta e bato: se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta,
    Eu entrarei na sua casa e cearei com ele e ele comigo" (Ap 3, 20).

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    SS. Marta, Maria E Lázaro, Hospedeiros do Senhor (29 Julho)

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XVII Semana - Terça-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XVII Semana - Terça-feira

    29 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 33, 7-11; 34, 5b-9.28

    Naqueles dias, 7Moisés pegou na tenda e foi colocá-la a certa distância do acampamento. Deu-lhe o nome de tenda da reunião. E todos aqueles que desejavam consultar o Senhor iam à tenda da reunião, fora do acampamento. 8Quando Moisés se dirigia para a tenda, todo o povo se levantava, permanecendo cada um à entrada da própria tenda, para o seguir com os olhos, até Moisés entrar na tenda. 9Logo que Moisés entrava na tenda, a coluna de nuvem descia e mantinha-se à entrada, e o Senhor falava com Moisés. 10E, ao ver a coluna de nuvem que permanecia à entrada da tenda, todo o povo se levantava e se prostrava, cada um à entrada da sua tenda. 11O Senhor falava com Moisés, frente a frente, como um homem fala com o seu amigo. Moisés voltava, em seguida, para o acampamento; mas Josué, filho de Nun, o seu servidor, homem ainda novo, não se afastava do interior da tenda. Moisés, passando junto dele, pronunciou o nome do Senhor. 6O Senhor passou em frente dele e exclamou: «Senhor! Senhor! Deus misericordioso e clemente, vagaroso na ira, cheio de bondade e de fidelidade, 7que mantém a sua graça até à milésima geração, que perdoa a iniquidade, a rebeldia e o pecado, mas não declara inocente o culpado e pune o crime dos pais nos filhos, e nos filhos dos seus filhos até à terceira e à quarta geração.» 8Moisés curvou-se imediatamente até ao chão e prostrou-se em adoração, 9dizendo: «Se, entretanto, alcancei graça aos teus olhos, ó Senhor, vem, por favor, caminhar no meio de nós, pois este é um povo de cerviz dura. Mas perdoa-nos as nossas iniquidades e os nossos pecados e aceita-nos como propriedade tua.» 28Moisés permaneceu junto do Senhor quarenta dias e quarenta noites, sem comer pão nem beber água. E escreveu nas tábuas as palavras da aliança, os dez mandamentos.

    A leitura que hoje escutamos é composta por dois pequenos textos, o primeiro eloísta e o segundo javista, que nos referem a renovada aliança pelo Senhor, mediante um acto de renovação permanente do culto. O Senhor, apesar do pecado do povo, pela sua misericórdia e pelo seu amor, permanece junto do povo, graças a Moisés. Este, pegou «na tenda da reunião», isto é, no lugar do culto, e «foi colocá-la a certa distância do acampamento» (v. 7), como que a indicar que Deus não pode conviver harmoniosamente com homens pecadores, apesar de estar sempre disponível a perdoar-lhes. Todos os que reconheciam o seu pecado podiam dirigir-se à tenda e falar com Deus, tal como o intercessor Moisés, quando falava com o Senhor face a face, como amigo a amigo, e como Josué, que «não se afastava do interior da tenda» (v. 11). Em resumo, Deus, que se revela a Moisés como misericordioso, quer ensinar ao seu povo que o verdadeiro lugar da aliança não é o monte Sinai ou um qualquer outro lugar material, mas o reconhecer-se pecador e o estar disposto a acolher a sua misericórdia, que se manifesta nas situações concretas e por meio de homens e pessoas santas e amigas de Deus.

    Evangelho: Mateus 13, 36-43

    Naquele tempo, 36afastando-se das multidões, Jesus foi para casa. E os seus discípulos, aproximando-se dele, disseram-lhe: «Explica-nos a parábola do joio no campo.» 37Ele, respondendo, disse-lhes: «Aquele que semeia a boa semente é o Filho do Homem; 38o campo é o mundo; a boa semente são os filhos do Reino; o joio são os filhos do maligno; 39o inimigo que a semeou é o diabo; a ceifa é o fim do mundo e os ceifeiros são os anjos. 40Assim, pois, como o joio é colhido e queimado no fogo, assim será no fim do mundo: 41o Filho do Homem enviará os seus anjos, que hão-de tirar do seu Reino todos os escandalosos e todos quantos praticam a iniquidade, 42e lançá-los na fornalha ardente; ali haverá choro e ranger de dentes. 43Então os justos resplandecerão como o Sol, no Reino de seu Pai. Aquele que tem ouvidos, oiça!»

    O Evangelho oferece-nos várias parábolas para nos ensinar como é que Deus faz chegar a sua Palavra aos homens. A parábola do joio no campo alerta-nos para a existência de outro semeador: o semeador do mal. Onde Deus semeia, também Satanás semeia. A acção do semeador do mal caracteriza-se por acontecer durante a noite, enquanto os criados dormem. Durante o dia, não seria possível uma tal acção. A separação entre o que é bom e o que é mau só terá lugar no momento da ceifa, isto é, no dia do juízo final (cf. Mt 9, 37; Mc 4, 29; Jo 4, 35). Quando chega o tempo da ceifa - não antes, para não arrancar também o trigo - o dono dirá aos ceifeiros que cortem o trigo e o joio, e que os separem: o joio vai para queimar e o trigo é guardado no celeiro. Esta parábola parece querer que responder a uma questão surgida nas primeiras comunidades: porque existem bons e maus cristãos na Igreja? A resposta é: tanto Deus como Satanás semeiam a sua semente. Deus tolera essa sementeira, e o crescimento e a maturação de ambas as sementes, para dar aos maus oportunidade de conversão.

    Meditatio

    O texto do Êxodo, que hoje escutamos, já nos faz antever o projecto de Deus de habitar no meio do seu povo, e de ter com cada um de nós uma relação pessoal profunda. Esta intenção divina começa a concretizar-se quando Moisés ergue a tenda e a chama «tenda da reunião». A tenda é o lugar do encontro. O texto sagrado diz que Moisés «foi colocá-la a certa distância do acampamento» (v. 7). Deus não podia habitar no meio do seu povo, porque esse povo tinha pecado, tinha-se afastado dele, tinha caído na idolatria. Portanto, a tenda estava distante. Mas era acessível: «todos aqueles que desejavam consultar o Senhor iam à tenda da reunião» (v. 7). Mesmo fora do acampamento, a tenda era o lugar do encontro de Deus com os homens e dos homens com Deus. Mas esse encontro será permanente quando, como nos diz João, no seu evangelho, o Verbo se fizer carne e habitar entre nós: «O Verbo fez-se homem e veio habitar connosco» (Jo 1, 14). Na Incarnação, o Verbo de Deus, o Filho de Deus, ergueu a sua tenda no meio das nossas tendas, tornou-se nosso vizinho e companheiro. Podemos, agora, falar com Ele, não apenas como um homem fala a outro homem, mas como um amigo fala ao seu amigo: «Já não vos chamo servos, ... mas chamei-vos amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi ao meu Pai» (Jo 15, 15).
    Na nova aliança, cada homem, cada um de nós, é chamado a esta relação pessoal, profunda com Deus, uma relação, não só face a face, mas coração a coração. É um privilégio que havemos de acolher com respeito, admiração, reconhecimento. A Eucaristia oferece-nos a inaudita possibilidade de receber Jesus, o Filho de Deus feito nosso irmão, nosso amigo, não só no meio de nós, mas dentro de nós, para falarmos com Ele, escutá-l´O, deixar que guie to
    da a nossa vida e a encha do seu amor. Pela Incarnação, pela Eucaristia, o Filho do homem, semeou e semeia em nós essa «boa semente». Há que impedir que o joio a sufoque. Há que deixá-la germinar, crescer, frutificar.

    Oratio

    Senhor Jesus, Tu viveste uma intensíssima intimidade com Deus, a Quem chamavas "Abbá", com a confiança familiar que esse nome comporta. Mas quiseste viver também em grande intimidade connosco. Pela Incarnação, tornaste-Te nosso vizinho, amigo, irmão. Pela Eucaristia, quiseste permanecer connosco até ao fim dos tempos. Assim continuas a partilhar a nossa vida e a nossa sorte. Assim queres ser nosso companheiro, nosso alimento de caminhada, nossa luz e nossa força. Obrigado, Senhor! Obrigado! Amen.

    Contemplatio

    A comunhão é uma extensão da Incarnação. Em que consiste propriamente este mistério inefável (da Incarnação)? É que o homem se torna Deus pela união hipostática da natureza divina à natureza humana. Ora, não convinha que o Verbo se incarnasse em cada um de nós. E todavia o Coração de Jesus, tão ávido de se dar, dizia para Si mesmo: Entre todos os meus tesouros, há um, o mais precioso de todos, a minha divindade, que se torna inacessível aos meus irmãos e aos meus amigos; não gozam como Eu da união hipostática. Ora bem! Eis o que farei; dar-lhes-ei a minha carne que é a vida do mundo, inebriá-los-ei com o meu sangue, no seu coração colocarei o meu Coração e então a minha divindade unir-se-á a eles de um modo muito especial, embora não hipostático, dado que não o é por natureza. É assim que a divina Eucaristia, por meio da santa comunhão, nos faz entrar no próprio mistério da Incarnação, e estende-o a todos os filhos de Adão que quiserem pôr-se em estado de dele aproveitar. Que há de maior? Que há de mais belo? Que há de mais terno e de mais generoso! Associar-nos à divindade unindo-nos à humanidade santa de Jesus, ao seu Coração divino; tal é então o fim da santa Comunhão, e é assim que este Coração amante não se contenta com a qualidade de irmão, de amigo, ou de pai, mas torna-se o esposo das nossas almas e do nosso coração mesmo. «A minha carne, diz, é verdadeiramente uma comida, e o meu sangue verdadeiramente uma bebida». Comer Deus, saciar-se de Deus, incorporar-se em Jesus Cristo, não fazer senão uma só coisa com Ele, oh! Que glorioso privilégio! E quanto a incarnação eucarística é um complemento maravilhoso da primeira Incarnação. Todos os autores místicos descrevem muito longamente os efeitos maravilhosos da santa Comunhão. Faltar-nos-ia o tempo para os analisar, mas nós encontramos tudo e muito mais nesta magnífica síntese: A divina Eucaristia não é outra coisa senão a Incarnação aplicada a cada um de nós (Leão Dehon, OSP 2, p. 421s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «O Verbo fez-se homem e veio habitar connosco» (Jo 1, 14).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XVII Semana - Quarta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XVII Semana - Quarta-feira

    30 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 34, 29-35

    Naqueles dias, 29Moisés desceu do monte Sinai, trazendo na mão as duas tábuas do testemunho. Não sabia, enquanto descia o monte, que a pele do seu rosto resplandecia, depois de ter falado com Deus. 30Quando Aarão e todos os filhos de Israel o viram, notaram que a pele do seu rosto se tornara resplandecente e não se atreveram a aproximar-se dele. 31Moisés, porém, chamou-os; Aarão e todos os chefes da assembleia foram ter com ele, e ele falou-lhes. 32Em seguida, aproximaram-se todos os filhos de Israel, aos quais transmitiu todas as ordens que tinha recebido do Senhor, no monte Sinai. 33Depois de ter acabado de falar com eles, Moisés cobriu o rosto com um véu. 34Ao entrar para estar na presença do Senhor e falar com Ele, Moisés retirava o véu até sair. Então, depois de sair, comunicava aos filhos de Israel as ordens recebidas. 35Os filhos de Israel viam resplandecer a face de Moisés que, em seguida, tornava a colocar o véu sobre o rosto, até entrar novamente para falar com Deus.

    O tema predominante em Ex 32-34 é a distância e a proximidade de Deus. Foca particularmente e remodela o tema da tenda da reunião (Ex 33, 7-11), o lugar onde Deus vem para se comunicar com Moisés e com o povo. Essa tenda é agora como que posta de lado, para sobressair a figura de Moisés como lugar privilegiado da revelação de Deus aos homens. Trata-se de uma adição pós-exílica (séculos VI-V a. C.) pertencente ao documento sacerdotal. Moisés desce do Sinai, com o rosto radiante, e trazendo nas mãos as tábuas da lei. O povo não ousa aproximar-se dele, pois se sente tomado por um temor sagrado e por respeito (cf. v. 30). Moisés chama, então, Aarão e os representantes do povo para lhes transmitir as ordens de Deus. Enquanto se encontra entre o seu povo, cobre o rosto com um véu. Pelo contrário, quando entra na tenda para dialogar com Deus retira o véu (cf. Sir 45, 2.7s.; 50, 5-13). Moisés, o grande chefe, é aqui o revelador de Deus, através do resplendor do seu rosto e das tábuas da lei, que contêm a palavra de Deus. Aproximar-se de Moisés, e escutar os seus ensinamentos, é fazer experiência do divino (vv. 31-34), e entrar no mistério de Deus. Como figura carismática, Moisés encarna todas as mediações da revelação divina: a ele se atribui a promulgação da lei e a autoridade da palavra de Deus. Neste texto, entrevemos a figura de Cristo glorioso na transfiguração, verdadeira manifestação do Salvador dos homens e imagem viva e luminosa de Deus invisível (cf. Mc 9, 2-8; 2 Cor 4, 6; Heb 1, 3; Cl 1, 15).

    Evangelho: Mateus 13, 44-46

    Naquele tempo, disse Jesus à multidão: 44«O Reino do Céu é semelhante a um tesouro escondido num campo, que um homem encontra. Volta a escondê-lo e, cheio de alegria, vai, vende tudo o que possui e compra o campo. 45O Reino do Céu é também semelhante a um negociante que busca boas pérolas. 46Tendo encontrado uma pérola de grande valor, vende tudo quanto possui e compra a pérola.»

    As parábolas do tesouro casualmente encontrado no campo, e da pérola desejada e finalmente comprada, acentuam a alegria daquele que compreendeu o valor do reino de Deus. Ambos os protagonistas vendem tudo o que têm para adquirirem o tesouro e a pérola, respectivamente. Mas o ensinamento fundamental não é o da entrega incondicional que o Reino exige, com as respectivas renúncias. A palavra fundamental é «cheio de alegria» (v. 44), referida ao homem comovido diante do excepcional achado num campo, e da pérola de grande valor encontrada. Perante essas descobertas, tudo o resto perde valor. Daí que nenhum esforço, nenhuma renúncia, pareçam excessivos para obter tais bens.

    Meditatio

    A nossa meditação pode partir, hoje, de um pormenor que lemos logo no primeiro versículo da primeira leitura: «Moisés, enquanto descia o monte, não sabia, que a pele do seu rosto resplandecia, depois de ter falado com Deus (v. 29). A leitura de ontem dava a entender que todo o povo de Deus podia fazer uma experiência semelhante à de Moisés, frequentando a «tenda da reunião», que era acessível a: «todos aqueles que desejavam consultar o Senhor» (v. 7). E o encontro, a oração, o diálogo com Deus, pode produzir em todos efeitos semelhantes aos que produziu em Moisés. Mas pode dizer-se mais: a contemplação, tal como a santidade, não é privilégio de alguns, mas é vocação comum de todos os cristãos. Contemplar é fixar-nos intuitivamente sobre a realidade divina, que pode ser o próprio Deus, um seu atributo, ou um mistério da vida de Cristo. É fruir da sua presença, deixar-nos iluminar por Ele, tornar-nos resplandecentes. Para os cristãos, e para nós dehonianos, em particular, a Eucaristia, que celebramos e comungamos, é um excelente "objecto" de contemplação. Contemplar a Eucaristia é fixar-nos intuitivamente sobre aquilo que ela é para nós: presença do Senhor Ressuscitado, e fruir dessa presença. De facto, enquanto na meditação prevalece a busca da verdade, na contemplação prevalece o gozo da Verdade encontrada. A contemplação eucarística, feita na adoração, permite-nos ter em nós «os sentimentos que estavam em Cristo Jesus» (Fl 2, 5), permite-nos «pensar segundo Deus, e não segundo os homens» (cf. Mt 16, 23, e torna «puro» o nosso coração. O que, de facto, nos torna impuros é a busca de nós mesmos, da nossa glória. Mas o homem que contempla a Deus, volta as costas a si mesmo, esquece-se de si. Quem contempla, não se contempla.
    Assiste-se ao renascimento da adoração eucarística. Os cristãos voltam a gostar de estar diante de Jesus, como Maria de Betânia (Lc 10, 39). É à volta do "Corpo real", que é a Eucaristia, que redescobrimos e aprofundamos a realidade do Corpo Místico, que é a Igreja.
    Estando silenciosos e calmos diante do Senhor, presente na Eucaristia, percebemos os seus desejos a nosso respeito, depomos a seus pés os nossos projectos e aceitamos os d'Ele. A sua luz penetra o nosso coração e cura-o. As almas eucarísticas, contemplando o "sol da Justiça", Cristo Nosso Senhor, fixam o seu Espírito e transmitem-no a toda a grande árvore que é a Igreja, tornam-se servidores do Reino do «amor e da justiça» entre os homens, como foi Leão Dehon, e nos recomendou que fôssemos. Por isso é que a adoração eucarística, tempo de encontro, de presença e de contemplação, é a primeira opção apostólica da Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus. É o grande apostolado que todos podem fazer, mesmo quando lhes faltarem as forças para outros serviços apostólicos, mesmo quando estiverem limitados pela doença ou pela idade. É o apostolado que todo o cristão pode fazer, mesmo sem grande preparação teológica e pastoral. &Ea
    cute; o apostolado que se pode fazer mesmo quando é mais prudente estar calado que falar...
    A contemplação eucarística é realização da profecia «Hão-de olhar para aquele que trespassaram» ou «n´Aquele que trespassaram» (Videbunt in quem transfixerunt) (Jo 19, 37). Mas é, por sua vez, profecia daquilo que, um dia faremos no Céu, quando nos juntarmos à grande liturgia celebrada pelos redimidos à volta do trono do Cordeiro, como nos descreve o Apocalipse (cf. Apoc 5).
    Quando descia do monte Sinai, Moisés trazia o rosto radiante de luz, porque tinha conversado com Deus, como com um amigo, frente a frente, "boca a boca" segundo a expressão do livro do Êxodo (cf. Ex 33, 11). Moisés não se dava conta desse brilho. Mas ele era real... Também nós, depois da adoração, talvez não nos demos conta, mas voltamos para junto dos irmãos com o rosto tornado brilhante, porque contemplámos o Senhor. E será esse o mais belo testemunho que podemos dar ao nosso mundo materialista e consumista, mas com uma enorme ânsia de encontrar a Deus.

    Oratio

    Senhor, obrigado por queres habitar no meio de nós, por quereres ficar connosco na Eucaristia. Na verdade, Tu és um Deus próximo, um Deus amigo. Ninguém tem tão próximo de si o seu deus, como nós temos próximo de nós o nosso Deus. Que a tua Presença nos torne presentes a Ti, para Te ouvirmos, Te falarmos, para sermos iluminados. Assim poderemos tornar-nos significativos para a Igreja e para o mundo, que precisam de pessoas competentes em diversas áreas do saber e da técnica, mas precisam principalmente de profetas em cujos rostos resplandeça a tua glória. Tu estás connosco! Que estejamos contigo, e sejamos iluminados! Amen.

    Contemplatio

    A adoração do Sagrado Coração de Jesus no seu Sacramento exposto é também um dos principais exercícios de reparação. No nosso tempo, o Espírito Santo impele com uma força toda divina a Igreja a tomar frequentemente como objecto de contemplação o Santíssimo Sacramento exposto sobre os nossos tabernáculos. As exposições do Santo Sacramento multiplicaram-se ao infinito. Vários institutos religiosos têm o Santíssimo Sacramento exposto todos os dias; outros, todas as semanas. A divina vítima é o objecto das suas contemplações mais frequentes. Os amigos do Sagrado Coração de Jesus, não se esquecem de O contemplar sobretudo na humanidade santa do Salvador, a fonte e o fundamento de todo o resto, o amor, o Coração mesmo de Jesus. Não há, depois da santa Missa, exercício que supere em mérito e em eficácia a adoração eucarística. No Santíssimo Sacramento, a oração do Coração de Jesus, esta oração que é toda amor, reparação, acção de graças, dura sempre, ardente, abrasadora, toda-poderosa, capaz de tudo reparar. Saibamos portanto unir-nos a ela, tomá-la, colocá-la no nosso coração, para que viva desta vida de amor e de imolação, e que nela se consuma como a lâmpada do santuário. Tais são os sentimentos que nos devem inspirar, quando nos apresentamos à adoração do Sagrado Coração de Jesus no Santíssimo Sacramento. A nossa adoração não reclama sempre muitas palavras; há também momentos de silêncio que são eloquentes por si mesmos. Nada de mais belo e de mais tocante do que a união a este Coração sempre silencioso e sempre actuante por nós. Santo Afonso de Ligório diz que esta oração do divino Sacramento produz às vezes graças sensíveis como própria sagrada Comunhão. Nesta adoração, é o amigo que fala ao seu amigo sobre os interesses do seu amor e da sua glória. Enfim, não nos podemos esquecer que esta devoção ao Sagrado Coração de Jesus nasceu no meio de uma adoração ao Santíssimo Sacramento. É por meio deste exercício que ela se espalhará, se fortificará e se tornará o órgão todo-poderoso do amor, da reparação e da acção de graças (Leão Dehon, Eucaristia, OSP 2, p. 487s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Hão-de olhar para aquele que trespassaram» (Jo 19, 37).

  • Tempo Comum - Anos Ímpares - XVII Semana - Quinta-feira

    Tempo Comum - Anos Ímpares - XVII Semana - Quinta-feira

    31 de Julho, 2025

    Lectio

    Primeira leitura: Êxodo 40, 16-21.34-38

    16Moisés obedeceu; fez tudo quanto o Senhor lhe ordenara. 17No primeiro dia do primeiro mês do segundo ano, foi erigido o santuário. 18Moisés erigiu o santuário: assentou as bases, as pranchas, as travessas e ergueu as colunas; 19estendeu a tenda sobre o santuário e, por cima, a cobertura da tenda, como o Senhor lhe tinha ordenado. 20Tomou o testemunho e depositou-o na Arca; meteu os varais na Arca, sobre a qual colocou o propiciatório. 21Transportou a Arca para o santuário, fixando o véu de protecção, para vedar o acesso à Arca do testemunho, como o Senhor lhe tinha ordenado. 34Então, a nuvem cobriu a tenda da reunião, e a majestade do Senhor encheu o santuário. 35Moisés já não pôde entrar na tenda da reunião, porque a nuvem pairava sobre ela, e a glória do Senhor enchia o santuário. 36Quando a nuvem se retirava de cima do santuário, os filhos de Israel partiam de viagem, 37e quando a nuvem não se retirava, não partiam, até ao instante em que ela se elevava. 38Porque uma nuvem do Senhor cobria o santuário durante o dia, e um fogo brilhava ali durante a noite, aos olhos de toda a casa de Israel, em todas as suas caminhadas.

    O nosso texto é claramente pós-exílico (séculos VI-V a. C.). Ele projecta sobre o santuário do deserto, objecto portátil, que tinha por função representar a condução divina do povo na marcha para a terra, a imagem do templo de Jerusalém. Assim procura o documento sacerdotal justificar o ordenamento do culto da comunidade do segundo templo. Moisés, em obediência a Deus, constrói a tenda, a "Morada" do Senhor (vv. 16-21, e Deus vem estabelecer-se no meio do seu povo escolhido (vv. 34-38). Depois do Sinai, é a tenda que constitui a comunidade da revelação de Deus com os homens. Ela é o lugar ideal onde cada homem pode entrar em contacto com o Senhor e dialogar com Ele. Deus opta por estabelecer morada no meio do seu povo e comunicar com Moisés, mediador carismático. O sinal visível do Deus invisível era a «nuvem», que regulava as etapas do caminho do povo no deserto rumo à terra prometida. A presença de Deus, que enchia a tenda do santuário, era chamada, pela tradição sacerdotal, «glória», manifestação do amor salvífico de Deus no seu poder e santidade. No judaísmo sucessivo, essa «presença» de Deus será chamada shekhînah, «a Presença» por excelência. Para João, a humanidade de Cristo será a nova tenda, o novo templo onde reside toda a plenitude de sabedoria, graça e verdade, em que se manifesta a presença perfeita do Emanuel, o Deus-connosco.

    Evangelho: Mateus 13, 47-53

    Naquele tempo, disse Jesus à multidão: 47«O Reino do Céu é ainda semelhante a uma rede que, lançada ao mar, apanha toda a espécie de peixes. 48Logo que ela se enche, os pescadores puxam-na para a praia, sentam-se e escolhem os bons para as canastras, e os ruins, deitam-nos fora. 49Assim será no fim do mundo: sairão os anjos e separarão os maus do meio dos justos, 50para os lançarem na fornalha ardente: ali haverá choro e ranger de dentes.» 51«Compreendestes tudo isto?» «Sim» - responderam eles. 52Jesus disse-lhes, então: «Por isso, todo o doutor da Lei instruído acerca do Reino do Céu é semelhante a um pai de família, que tira coisas novas e velhas do seu tesouro.» 53Depois de terminar estas parábolas, Jesus partiu dali.

    A parábola da rede que, lançada ao mar, «apanha toda a espécie de peixes» (v. 47), aprofunda o significado da parábola do trigo e do joio. É uma parábola eminentemente escatológica, pois se refere a realidades que terão lugar nos últimos dias, no último dia. Como na rede se encontram peixes bons e peixes ruins, assim também na Igreja há quem viva e acolha a palavra de Jesus, e há quem a recuse ou permaneça indiferente. A separação, de uns e de outros, acontecerá no fim dos tempos, e pertence a Deus fazê-la (vv. 47-50). Entretanto, como na parábola do trigo e do joio, bons e maus têm de conviver ou coexistir até ao fim. Só então se manifestará clara e definitivamente quem é bom e quem é mau, quem confessou Cristo com o coração e os lábios e quem o confessou só por palavras, quem pertence à comunidade dos filhos de Deus e quem não pertence. Estes últimos terão a sorte dos peixes ruins e do joio.

    Meditatio

    Quanto nos conforta saber que Deus mora no meio do seu povo e que a sua presença enche essa morada. Há uma presença geral de Deus em todas as coisas. Mas também há uma presença pessoal, que permite dialogar com Ele. Deus quis estar assim presente no meio de nós. A morada, de que nos fala a primeira leitura, é lugar de encontro e de segurança, antecipação e prelúdio de uma outra tenda, a do Verbo de Deus. De facto, a verdadeira morada de Deus no meio dos homens é Cristo. A Virgem Maria também se tornou morada de Deus na Incarnação, quando a sombra do Espírito a cobriu e ficou cheia da glória do Senhor. Agora, a verdadeira morada, onde havemos de permanecer, é Jesus. Nos "discursos de adeus", que lemos no evangelho de João, volta esta palavra como consolação, convite e promessa: «viremos a ele e nele faremos morada» (Jo 15, 23), «permanecei em mim, e eu permanecerei em vós» (15, 4) e ainda: «permanecei no meu amor» (15, 9).
    É esta a esperança, o desejo profundo de todos quantos O amam: permanecer n´Ele e ser sua morada, numa intimidade misteriosa mas muito real com Ele, com o Pai e com o Espírito. Esta realidade realiza-se, sobretudo, na Eucaristia. No sacrário, torna-se presente a nós «o Verbo feito carne» porque, de facto «habita entre nós» (cf. Jo 1, 14). No Antigo Testamento, Deus manifestava-se na nuvem que vinha e ia, sem se poder tocar. Na plenitude dos tempos, manifestou-se em carne visível, palpável, estável entre nós. Por isso, os apóstolos poderão dizer: «O que vimos, ouvimos, contemplámos, relativamente ao Verbo da vida, isso vos anunciamos...» (cf. 1Jo 1, 1-4). Depois da Ceia pascal, podiam acrescentar: «comemos»: De facto, Jesus diz-lhes: «Tomai e comei...»; «Quem come a minha carne e bebe o meu sangue...». Na Eucaristia, a presença de Deus torna-se pessoal, real, concreta, plenamente adaptada à nossa condição de seres incarnados. Como os antigos hebreus, podemos dizer: «Que grande nação tem a sua divindade tão próxima de si, como o Senhor está próximo de nós?» (Dt. 4, 7). Verdadeiramente, diante do sacrário, podemos exclamar, como João no Apocalipse: «Eis a morada de Deus entre os homens!» (Apoc 21, 3). A presença eucarística possibilita a dupla imanência de que acima falámos: Jesus em nós e nós n´Ele: «viremos a ele e nele faremos morada» (Jo 15, 23), «permanecei em mim, e eu
    permanecerei em vós» (15, 4), diz o Senhor. Tudo isto se realiza de modo muito concreto na comunhão eucarística, em que Cristo vem a nós e nos une a Ele, ao Pai e ao Espírito Santo.

    Oratio

    Senhor, Tu quiseste habitar no meio de nós. São muitos os modos como habitas. Hoje quero agradecer-Te, particularmente, pela tua presença na Eucaristia, verdadeira morada de Deus entre os homens. Aí podemos encontrar-Te de modo muito particular, de modo sacramental. Aí podemos falar Contigo, como falava o Francisco de Fátima, e como falam todos os que reconhecem a tua presença, escondida mas real, nas espécies eucarísticas. Aí podemos receber-Te para que, não só habites no meio de nós, mas habites em nós. Contigo, assim o cremos, recebemos o Pai e o Espírito Santo. Que maravilhosa é a Eucaristia. É, na verdade, o dom do teu Coração. Obrigado, Senhor! Amen.

    Contemplatio

    O Coração de Jesus soube tudo arranjar, e a fim de permanecer sempre connosco, inventou o sacramento do amor. Não vemos Jesus, mas Ele está lá; só as fracas aparências eucarísticas nos separam d'Ele, e temos a fé para as penetrar, e temos um coração que voa para o Coração de Jesus, tornado mais do que nunca o Coração do nosso irmão e do nosso amigo. É assim que o Coração de Jesus cumpre a sua promessa: «Não vos deixarei órfãos». É assim que a Eucaristia continua o mistério da Incarnação e multiplica por toda a parte Belém e Nazaré. A Eucaristia torna mesmo Nosso Senhor mais perto de nós do que o mistério da Incarnação, e quando reflectimos bem nisto vemos que Ele não se afastou do homem pela Ascensão senão para estar mais perto dele pela Eucaristia, porque as condições da vida mortal não permitiam ao Salvador tornar-se presente em todos os pontos do espaço, em todo o coração que o amasse e que desejasse a sua visita, mas a sua vida gloriosa permite-lhe a omnipresença do amor; o seu Coração está em toda a parte, encontramo-lo em todos os santuários, e se a nossa ligeireza e a nossa indiferença não impedissem as efusões deste amor insaciável no dom de si mesmo, ser-nos-ia permitido como aos primeiros crentes de o guardar nas nossas casas e de o levar sempre no nosso coração. Tal teria sido a condescendência deste Coração generoso, se a Igreja não tivesse tomado, de algum modo contra Ele mesmo, o cuidado do respeito que Lhe é devido. Mas se este privilégio não nos é concedido, nós podemos sem grande fadiga, e quando queremos, a toda a hora do dia e da noite, aproximar-nos do Coração eucarístico, falar-lhe, abrir-lhe todo o nosso coração, atraí-lo a nós e fazer d'Ele tudo o que quisermos... Pela santa Eucaristia, a Incarnação multiplica-se sobre todos os pontos da terra habitável; em toda a parte aonde nos é dado dirigir os nossos passos, encontramos o Coração do nosso irmão e do nosso amigo, sempre pronto a nos receber, sempre pronto a nos consolar, sempre pronto a nos cumular de graças, a nos iluminar, a nos levantar e a nos perdoar. Assim, nesta Incarnação nova, é sobretudo o Coração de Jesus que está presente; Ele esconde todo o resto, a sua divindade, a sua humanidade, a fim de melhor deixar ver o seu Coração; e se os olhos do corpo não podem ver, como o vêem os olhos do coração e como sabem penetrar os véus que o envolvem! Ah! Porque não nos é dado multiplicar também o nosso coração para o dar a este Coração que se multiplica por nós! Pelo menos, arranquemos os nossos pensamentos, as nossas afeições ao mundo, a nós mesmos, para os dar todos ao único Coração que nos ama, e se não podemos superá-lo nem mesmo igualá-lo em amor, ao menos que todo o nosso amor lhe pertença, todo, absolutamente todo; e ainda, depois disto, digamos que não somos senão servos inúteis (Pe. Dehon, Eucaristia, OSP 2, p. 4 e19s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Viremos a ele e nele faremos morada» (Jo 15, 23),