Events in Novembro 2023

  • Comemoração de Todos os fiéis Defuntos

    Comemoração de Todos os fiéis Defuntos


    2 de Novembro, 2023

    A Igreja, acolhendo uma tradição monástica que vem do século XI, dedica o dia 2 de Novembro à memória dos fiéis defuntos. Depois de ter celebrado a glória e a felicidade dos Santos, no dia 1 de Novembro, a Igreja dedica o dia 2 à oração de sufrágio pelos "irmãos que adormeceram na esperança da ressurreição". Assim fica perfeita a comunhão de todos os crentes em Cristo.
    Lectio
    Primeira leitura: Job 19, 1.23-27ª

    Job respondeu, dizendo: 2«Até quando afligireis a minha alma e me atormentareis com vãs palavras? 23Quem me dera que as minhas palavras se escrevessem e se consignassem num livro, 24ou gravadas em chumbo com estilete de ferro, ou se esculpissem na pedra para sempre! 25Eu sei que o meu redentor vive e prevalecerá, por fim, sobre o pó da terra; 26e depois de a minha pele se desprender da carne, na minha própria carne verei a Deus. 27Eu mesmo o verei, os meus olhos e não outros o hão-de contemplar! As minhas entranhas consomem-se dentro de mim.

    Os amigos de Job tentam consolá-lo, recorrendo a uma sabedoria superficial, expressa em frases feitas e lugares comuns. É o que tantas vezes acontece quando pretendemos confortar alguém que sofre. As palavras de Job são muito diferentes. No meio do sofrimento, vendo-se às portas da morte e trespassado pela solidão, compreende que Deus é o seu redentor, aquele parente próximo que, segundo os costumes hebreus, deve comprometer-se a resgatar, à sua própria custa, ou a vingar, o seu familiar em caso de escravidão, de pobreza, de assassínio. Job sente Deus como o seu último e definitivo defensor, como alguém que está vivo e se compromete em favor do homem que morre, porque entre Deus e o homem há uma espécie de parentesco, um vínculo indissolúvel. Job afirma-o com vigor: os seus olhos contemplarão a Deus com a familiaridade de quem não é estranho à sua vida.
    Segunda leitura: Romanos 5, 5-11

    Irmãos: A esperança não engana, porque o amor de Deus foi derramado nos nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado. 6De facto, quando ainda éramos fracos é que Cristo morreu pelos ímpios. 7Dificilmente alguém morrerá por um justo; por uma pessoa boa talvez alguém se atreva a morrer. 8Mas é assim que Deus demonstra o seu amor para connosco: quando ainda éramos pecadores é que Cristo morreu por nós. 9E agora que fomos justificados pelo seu sangue, com muito mais razão havemos de ser salvos da ira, por meio dele. 10Se, de facto, quando éramos inimigos de Deus, fomos reconciliados com Ele pela morte de seu Filho, com muito mais razão, uma vez reconciliados, havemos de ser salvos pela sua vida. 11Mais ainda, também nos gloriamos em Deus, por Nosso Senhor Jesus Cristo, por quem agora recebemos a reconciliação.

    O homem pode ter esperança diante da morte. Como intuiu Job, Deus é, de verdade, o nosso Redentor, porque nos ama. Empenhou-se em resgatar-nos da escravidão do pecado e da morte com o preço do sangue do seu Filho (vv. 6-9) e de modo absolutamente gratuito. De facto, nós éramos pecadores, ímpios, inimigos; mas o Senhor reconheceu-nos como "seus", e morreu por nós arrancando-nos à morte eterna. Acolhemos esta graça por meio do batismo, participando no mistério pascal de Cristo. A sua morte reconciliou-nos com o Pai, e a sua ressurreição permite-nos viver como salvos. Quebrando os laços do pecado, e deixando-nos guiar pelo Espírito derramado em nossos corações, atualizamos cada dia a graça do nosso novo nascimento.
    Evangelho: João 6, 37-40

    Naquele tempo, Jesus disse à multidão: Todos os que o Pai me dá virão a mim; e quem vier a mim Eu não o rejeitarei, 38porque desci do Céu não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou. 39E a vontade daquele que me enviou é esta: que Eu não perca nenhum daqueles que Ele me deu, mas o ressuscite no último dia. 40Esta é, pois, a vontade do meu Pai: que todo aquele que vê o Filho e nele crê tenha a vida eterna; e Eu o ressuscitarei no último dia.»

    O centro desta perícopa é a vontade de Deus, para a qual está totalmente voltada a missão de Jesus (v. 38). Essa vontade é um desígnio de vida e de salvação oferecido a todos os homens, pela mediação de Cristo, para que nenhum se perda (v. 39). O desígnio de Deus manifesta, pois, a sua ilimitada gratuidade e, ao mesmo tempo, a sua caridade atenta e cuidadosa por cada um de nós. Para acolhê-la, é preciso o livre consentimento da fé: que acredita no Filho tem, desde já, a vida eterna, porque adere Àquele que é a ressurreição e a vida, o único que pode levar-nos para além do intransponível limite da morte.
    Meditatio

    O silêncio é a melhor atitude perante a morte. Introduzindo-nos no diálogo da eternidade e revelando-nos a linguagem do amor, põe-nos em comunhão profunda com esse mistério imperscrutável. Há um laço muito forte entre os que deixaram de viver no espaço e no tempo e aqueles que ainda vivem neles. É verdade que o desaparecimento físico dos nossos entes queridos nos causa grande sofrimento, devido à intransponível distância que se estabelece entre eles e nós. Mas, pela fé e pela oração, podemos experimentar uma íntima comunhão com eles. Quando parece que nos deixam, é o momento em que se instalam mais solidamente na nossa vida, permanecem presentes, fazem parte da nossa interioridade. Encontramo-los na pátria que já levamos no coração, lá onde habita a Santíssima Trindade. Escreveu o Pe. Dehon: "Vivo muito com os meus mortos: os meus pais, amigos, antigos diretores, antigos alunos. Uma centena dos meus religiosos já partiu para junto do Bom Deus, entre eles, homens que muito trabalharam e rezaram... Saúdo-os todas as manhãs e todas as noites, com os meus padroeiros celestes" (NQT XLIV, 139).
    Paulo encoraja-nos a vivermos positivamente o mistério da morte, confrontando-nos com ela todos os dias, aceitando-a como lei de natureza e de graça, para sermos progressivamente despojados do que deve perecer até nos vermos milagrosamente transformados no que devemos ser. Deste modo, a "morte quotidiana" revela-se um nascimento: o lento declínio e o pôr-do-sol tornam-se aurora luminosa. Todos os sofrimentos, canseiras e tribulações da vida fazem parte desta "morte quotidiana" que nos levará à vida imortal. Havemos de viver fixando os olhos na bem-aventurada esperança, confiando na fidelidade do Senhor, que nos prometeu a eternidade. Vivendo assim, quando chegar ao termo desta vida, não veremos descer as trevas da noite, mas veremos erguer-se a aurora da eternidade, onde teremos a alegria de nos sentir uma só coisa com o Senhor. Depois de muitas tribulações, seremos completamente seus, e essa pertença será plena bem-aventurança na visão do seu rosto.
    Para o cristão, o sofrimento é um tempo de "disponibilidade pura", de "pura oblação" e, ao mesmo tempo, uma forma eminente de apostolado, em união a Cristo vítima, na comunhão dos santos, para salvação do mundo. Vivendo assim, prepara-se, assim, para o supremo ato de oblação, para o último apostolado, o da morte: configurados "a Cristo na morte" (Fil 3, 10) (Cf. Cst n. 69).Se a morte de Cristo na Cruz é o ato de apostolado mais eficaz, que remiu o mundo, o mesmo se pode dizer da morte do cristão em união com a morte de Cristo. Não se quer com isto dizer que, sob o ponto de vista humano, a morte do cristão deva ser uma "morte bonita", tal como não foi bonita, com certeza, a morte de Cristo aos olhos dos homens. Foi, pelo contrário, uma "liturgia esquálida", de abandono e de desolação. O importante é que seja uma morte "para Cristo e em Cristo" (S. Inácio de Antioquia, SC 10, 132). Imolados com Ele, com Ele ressuscitaremos.
    Se, na humildade do dia a dia, vivemos a nossa oblação-imolação com Cristo, oblato e imolado pela salvação do mundo, estamos preparados para o último apostolado da nossa vida: a oblação-imolação da nossa morte, o extremo sacrifício, consumado pelo fogo do Espírito, como aconteceu na morte de Cristo na cruz: "Por um Espírito eterno ofereceu a Si mesmo sem mancha, a Deus" (Heb 9, 14). A morte é, então, a nossa última oferta, o momento da suprema, pura oblação: "Se morrermos com Ele, com Ele viveremos" (2 Tm 2, 11).
    Oratio

    Senhor, quero hoje rezar-te por aqueles que desapareceram no mistério da morte. Dá o descanso àqueles que expiam, luz aos que esperam, paz aos que anseiam pelo teu infinito amor. Descansem em paz: na paz do porto seguro, na paz da meta alcançada, na tua paz, Senhor. Vivam no teu amor aqueles que amaste, aqueles que me amaram. Não esqueças o bem que me fizeram, o bem que fizeram a outros. Esquece tudo o mal que praticaram, risca-o do teu livro. Aos que passaram pela dor, àqueles que parecem ter sido imolados por um iníquo destino, revela, com o teu rosto, os segredos da tua justiça, os mistérios do teu amor. Concede-me aquela vida interior que permite comunicar com o mundo invisível em que se encontram os nossos defuntos: esse mundo fora do tempo e do espaço, esse mundo que não é lugar, mas estado, e mundo que não está longe de mim, mas à minha volta, esse mundo que não é de mortos, mas de vivos. Ámen.
    Contemplatio

    O amor ultrapassa o temor e a esperança. O amor não destrói o temor nem a esperança, mas retira-lhes o que o amor-próprio lhe pode misturar de visões mercenárias. O amor não conhece habitualmente outro temor senão o temor filiar, isto é, o medo de desagradar a um Pai bem-amado. Sendo filho do amor, este temor é de uma atenção e delicadeza totalmente diferentes do medo da justiça divina e dos seus castigos. Leva a evitar as mínimas faltas, as mais pequenas imperfeições voluntárias. Em vez de comprimir e de gelar o coração, alarga-o e aquece-o. Não causa nenhuma perturbação, nenhum alarme; e mesmo quando escapa alguma falta, reconduz docemente a alma ao seu Deus através de um arrependimento tranquilo e sincero. Procura acalmar-se e reparar abundantemente da mágoa que se lhe pôde causar. De resto, não se inquieta nem perde a confiança. O amor tira também à esperança o que ela tem de demasiado pessoal. Aquele que ama não sabe outra coisa senão contar com Deus, nem fazer boas obras principalmente com o objetivo de acumular méritos; e por este nobre desinteresse, merece incomparavelmente mais. Esquecendo tudo o que fez por Deus, não pensa noutra coisa senão em fazer ainda mais. Não se apoia sobre si mesmo; visa a recompensa celeste menos sob o título de recompensa do que como uma garantia de amar o seu Deus com todas as suas forças e de ser por Ele amado durante a eternidade. Sem excluir a esperança, que lhe é natural, considera a felicidade mais do lado do bom agrado do seu Deus e da sua glória que lhe pertence do que do lado do seu próprio interesse. E quando o amor está no seu ponto mais elevado de perfeição, estaria disposto a sacrificar a sua felicidade própria à vontade divina, se exigisse dele este sacrifício. Coloca a sua felicidade no cumprimento desta vontade. O coração dos Santos atingiu mesmo sobre a terra este grau de pureza. É a disposição dos bem-aventurados no céu. É preciso, portanto, que o amor seja purificado a este grau neste mundo, ou no outro pelas penas do purgatório. Há, portanto, que deliberar sobre esta escolha? E quando a via do amor não tivesse outra vantagem senão a de nos isentar do purgatório ou de lhe abreviar consideravelmente a duração, poderíeis hesitar em abraçá-la? (Leão Dehon, OSP 2, p. 16s.).

    Actio

    Repete frequentemente e vive a palavra:
    «Dai-lhes, Senhor, o eterno descanso,
    entres os esplendores da luz perpétua.
    Fazei que descansem em paz.
    Ámen»

     

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    Comemoração de Todos os fiéis Defuntos (2 de Novembro)

  • 31º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    31º Domingo do Tempo Comum - Ano A


    5 de Novembro, 2023

    Ano A
    31º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    Tema do 31º Domingo do Tempo Comum

    A liturgia do 31º Domingo do Tempo Comum convida-nos a uma reflexão séria sobre a seriedade, a verdade e a coerência do nosso compromisso com Deus e com o Reino. De forma especial, as leituras deste domingo interpelam os animadores das comunidades cristãs acerca da verdade do seu testemunho, da pureza dos seus motivos, do seu real empenho na construção de comunidades comprometidas com os valores do Evangelho.
    O Evangelho apresenta-nos o grupo dos "fariseus". Critica violentamente a sua pretensão à posse exclusiva da verdade, a sua incoerência, o seu exibicionismo, a sua insensibilidade ao amor e à misericórdia. Mais do que informação histórica, é um convite aos crentes no sentido de não deixarem que atitudes semelhantes se introduzam na família cristã e destruam a fraternidade, fundamento da comunidade.
    Na primeira leitura um "mensageiro de Jahwéh" interpela os sacerdotes de Israel. Convocados por Deus para serem "mensageiros do Senhor do universo", para ensinar a Lei e para conduzir o Povo para Deus, eles deixaram-se dominar por interesses egoístas, negligenciaram os seus deveres, desvirtuaram a Lei. Eles são, por isso, os grandes responsáveis pelo divórcio entre Israel e o seu Deus. Jahwéh anuncia que não pode tolerar esse comportamento e que vai desautorizá-los e desmascará-los.
    A segunda leitura apresenta-nos, em contraste com a primeira, o exemplo de Paulo, Silvano e Timóteo - os evangelizadores da comunidade cristã de Tessalónica. Do esforço missionário feito com amor, com humildade, com simplicidade, com gratuidade, nasceu uma comunidade viva e fervorosa, que acolheu o Evangelho como um dom de Deus, que se comprometeu com ele e que o testemunha com verdade e coerência.

    LEITURA I - Mal 1,14b-2,2b.8-10

    Leitura da Profecia de Malaquias

    Eu sou um grande Rei, diz o Senhor do Universo,
    e o meu nome é temível entre as nações.
    Agora, este aviso é para vós, sacerdotes:
    Se não Me ouvirdes,
    se não vos empenhardes em dar glória ao meu nome,
    diz o Senhor do Universo,
    mandarei sobre vós a maldição.
    Vós desviastes-vos do caminho,
    fizestes tropeçar muitos na lei
    e destruístes a aliança de Levi,
    diz o Senhor do Universo.
    Por isso, como não seguis os meus caminhos
    e fazeis acepção de pessoas perante a lei,
    também Eu vos tornarei desprezíveis e abjectos
    aos olhos de todo o povo.
    Não temos todos nós um só Pai?
    Não foi o mesmo Deus que nos criou?
    Então porque somos desleais uns para com os outros,
    profanando a aliança dos nossos pais?

    AMBIENTE

    O nome "malaquias" não é um nome próprio. Significa "o meu mensageiro". É o título tomado por um profeta anónimo, sobre o qual praticamente nada sabemos e que se apresenta como "mensageiro" de Jahwéh.
    Trata-se, em qualquer caso, de um profeta que actua em Jerusalém, no período pós-exílico. Ele é um aguerrido defensor dos valores judaicos, fervoroso pregador de reformas, zeloso defensor do culto autêntico, favorável ao Templo, à pureza dos sacerdotes e dos levitas, defensor dos sacrifícios e contrário aos matrimónios mistos (entre judeus e não judeus).
    Na sua época, o Templo já havia sido reconstruído (cf. Mal 1,10) e o culto já funcionava - ainda que mal (cf. Mal 1,7-9. 12-13). No entanto, o entusiasmo pela reconstrução estava apagado. Desanimado ao ver que as antigas promessas de Deus (veiculadas por Ezequiel e pelo Deutero-Isaías) não se tinham cumprido, o Povo tinha caído na apatia religiosa e na absoluta falta de confiança em Deus... Duvidava do amor de Deus, da sua justiça, do seu interesse por Judá. Todo este cepticismo tinha repercussões no culto (cada vez mais desleixado) e na ética (multiplicavam-se as falhas, as injustiças, as arbitrariedades). Este quadro, posterior à restauração do Templo, situa-nos na primeira metade do séc. V a.C. (entre 480 e 450 a.C.), muito próximo da época de Esdras e Neemias.
    Este "mensageiro de Deus" reage vigorosamente contra a situação em que o Povo de Judá está a cair. Coloca cada um diante das suas responsabilidades para com Jahwéh e para com o próximo, exige a conversão do Povo e a reforma da vida cultual. A sua lógica é a lógica deuteronomista; se o Povo se obstinar em percorrer caminhos de infidelidade à Aliança, voltará a conhecer a morte e a infelicidade; mas se o Povo se voltar para Jahwéh e cumprir os mandamentos, voltará a gozar da vida e da felicidade que Deus oferece àqueles que seguem os seus caminhos.
    O texto de Malaquias que hoje nos é oferecido faz parte de uma longa perícopa na qual o profeta se queixa pela falta de respeito e pelo desprezo que a comunidade judaica sente pelo nome de Jahwéh (cf. Mal 1,6-2,9). Os culpados da situação são, sobretudo, os sacerdotes... Eles deviam ser os primeiros a potenciar a relação entre o Povo e Deus; mas, preocupados com os seus interesses pessoais e animados pelo espírito de lucro, oferecem sobre o altar alimentos impuros (cf. Mal 1,7), sacrificam animais cegos, coxos ou doentes (cf. Mal 1,8), fazendo com que os actos cultuais sejam a expressão, não do amor, mas da indiferença e da falta de respeito do Povo por Jahwéh.
    Culpados da perversão do culto, os sacerdotes são culpados de outra coisa ainda mais grave: eles falsificam gravemente a Palavra de Deus. É a esta questão que a nossa leitura de hoje se refere.

    MENSAGEM

    Malaquias tem consciência de que Jahwéh fez "uma Aliança com Levi" (cf. Mal 2,4-5), na qual os sacerdotes receberam como missão ensinar a Lei a Israel e apresentar os sacrifícios no altar de Deus (cf. Dt 33,8-10). Constituídos "mensageiros do Senhor do Universo" (Mal 2,7), os sacerdotes deviam rejeitar a iniquidade, conhecer a Lei de Deus e apresentá-la fielmente ao Povo, caminhar com Jahwéh na paz e na rectidão, afastar o Povo do mal (Mal 2,6).
    Na verdade - considera Malaquias - não é isso que acontece. Os sacerdotes não só se desviaram do caminho da Lei e dos mandamentos, como também fizeram o Povo vacilar, ensinando a Lei de forma deturpada. Em vez de orientar o Povo nos caminhos da Aliança, desviam-no para longe de Deus... Mais ainda, não consideram todos iguais e fazem acepção de pessoas (possivelmente, o profeta refere-se a tratamento desigual concedido pelos sacerdotes a ricos e a pobres, a poderosos e a humildes).
    Deus pode pactuar com estas atitudes e comportamentos? É evidente que não... Portanto, Jahwéh vai desautorizar e desqualificar estes sacerdotes indignos, tornando-os desprezíveis e abjectos aos olhos de todo o Povo. Todos verão que eles já não têm a confiança de Deus e que lhes foi retirada a autoridade para serem testemunhas de Deus.

    ACTUALIZAÇÃO

    Considerar, na
    reflexão, os seguintes desenvolvimentos:

    • Por detrás da denúncia que a primeira leitura de hoje nos apresenta, está uma comunidade instalada no desânimo, no cepticismo e na apatia. Estes sentimentos negativos vão conduzir ao laxismo, à indiferença, ao desrespeito pelos compromissos; e, continuando a escorregar pelo mesmo plano inclinado, a comunidade irá, inevitavelmente, cair em atitudes concretas de falta de respeito e de desprezo para com Deus, de injustiça e de violência para com os irmãos. Nenhuma das nossas comunidades cristãs ou religiosas está isenta desta "doença" e pode garantir que não percorrerá um caminho semelhante... Só uma comunidade que aceita pôr-se em contínuo processo de conversão pode evitar um processo deste tipo, ao redescobrir, em cada instante, os fundamentos da sua fé e da sua esperança e ao revitalizar os seus compromissos com Deus e com os irmãos.

    • Aos animadores das comunidades foi confiada por Deus e pela Igreja a missão fundamental de interpelar a comunidade, de revitalizar o seu ânimo, de recordar a cada crente os seus compromissos, de testemunhar a todos o amor de Deus... Aqueles que, de alguma forma, têm responsabilidades na animação das comunidades, desempenham este serviço com dedicação e entusiasmo, conscientes da grave responsabilidade que assumiram diante de Deus e da Igreja, ou instalam-se no comodismo e na indiferença, deixando que a sua comunidade caminhe à deriva e sem objectivos? Os animadores das nossas comunidades cristãs são apenas funcionários que asseguram o expediente das "nove às cinco", com intervalo sagrado para almoço e sesta, ou são cristãos responsáveis que, fiéis à missão que lhes foi confiada, põem a vida ao serviço de Deus e dos irmãos?

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 130 (131)

    Refrão 1: Guardai-me junto de Vós, na vossa paz, Senhor.

    Refrão 2: Guardai-me na vossa paz, Senhor.

    Senhor, não se eleva soberbo o meu coração,
    nem se levantam altivos os meus olhos.
    Não ambiciono riquezas,
    nem coisas superiores a mim.

    Antes fico sossegado e tranquilo,
    como criança ao colo da mãe.
    Espera, Israel, no Senhor,
    agora e para sempre.

    LEITURA II - 1 Tes 2,7b-9.13

    Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Tessalonicenses

    Irmãos:
    Fizemo-nos pequenos no meio de vós.
    Como a mãe que acalenta os filhos que anda a criar,
    assim nós também, pela viva afeição que vos dedicamos,
    desejaríamos partilhar convosco,
    não só o Evangelho de Deus, mas ainda própria vida,
    tão caros vos tínheis tornado para nós.
    Bem vos lembrais, irmãos, dos nossos trabalhos e canseiras.
    Foi a trabalhar noite e dia,
    para não sermos pesados a nenhum de vós,
    que vos pregámos o Evangelho de Deus.
    Por isso, também nós damos graças a Deus sem cessar,
    porque, depois de terdes ouvido a palavra de Deus
    por nós pregada,
    vós a acolhestes, não como palavra humana,
    mas como ela é realmente, palavra de Deus,
    que permanece activa em vós, os crentes.

    AMBIENTE

    Quando escreve a Primeira Carta aos Tessalonicenses, Paulo está em Corinto. De Tessalónica chegaram, por Timóteo, notícias animadoras: os tessalonicenses continuam empenhados em viver, com fidelidade, o Evangelho que Paulo lhes anunciou. Nem as dificuldades do dia a dia, nem a deficiente formação doutrinal, nem a hostilidade das autoridades de Tessalónica conseguiram arrefecer o entusiasmo dos membros da comunidade. Eles são, verdadeiramente, um modelo para as comunidades cristãs de toda a Grécia. Paulo escreve, então, animando-os a prosseguir no caminho da fidelidade a Jesus e ao Evangelho. Aproveita também para esclarecer algumas questões de carácter doutrinal e para corrigir alguns aspectos da vida da comunidade. Estamos na primeira metade do ano 50 ou 51.
    Nos três primeiros capítulos da carta, Paulo agradece a Deus pela sua acção em favor da comunidade (cf. 1 Tes 1,1-3,13). A comunidade nasceu e consolidou-se de forma tão prodigiosa e em tão pouco tempo, que é preciso ver em tudo isso a intervenção de Deus. O coração de Paulo de Paulo transborda, pois, de alegria e de agradecimento...
    Depois de uma clássica oração de louvor a Deus Pai e ao Senhor Jesus Cristo, que tornaram possível em Tessalónica o milagre do Evangelho (cf. 1 Tes 1,2-10), Paulo evoca emocionadamente, sempre em clima de acção de graças, os inícios dessa jovem mas entusiasta comunidade cristã (cf. 1 Tes 2,1-12).

    MENSAGEM

    Na leitura que hoje nos é proposta, Paulo recorda, sobretudo, o comportamento dos missionários que evangelizaram Tessalónica.
    O apóstolo começa por descrever o amor e o afecto de Paulo, Silvano e Timóteo pelos crentes tessalonicenses, recorrendo à sugestiva imagem da mãe... Os missionários foram "como a mãe que acalenta os filhos que anda a criar" (vers. 7b) e manifestaram aos tessalonicenses, em todos os momentos e situações, o seu amor, a sua ternura e o seu afecto. Fizeram-se pequenos, humildes e simples, e nunca trataram ninguém com aspereza ou sobranceria; manifestaram a todos a sua afeição, amaram todos com um amor serviçal e desinteressado; colocaram-se ao serviço da comunidade de forma total e incondicional e aguentaram todos os trabalhos e canseiras sem lamentos nem queixumes; partilharam com os membros da comunidade cristã, não só o Evangelho, mas a própria vida (vers. 8).
    Depois, Paulo faz referência à gratuidade com que os missionários actuaram... Além de pregarem o Evangelho, trabalharam "noite e dia" para não serem pesados para ninguém da comunidade (vers. 9). No que a Paulo diz respeito, é possível que este "trabalho" se refira ao ofício de tecedor de tendas de campanha, que ele provavelmente aprendeu na sua meninice, em Tarso, junto do seu pai. Esse ofício irá ajudá-lo a ganhar o seu sustento (nomeadamente em Corinto, quando Paulo esteve em casa de Priscila e Áquila - cf. Act 18,3) e fá-lo-á sentir-se identificado com todos os outros homens.
    O que interessa, no entanto, é isto: Paulo e os seus companheiros não pregaram o Evangelho por interesse pessoal, em vista de qualquer remuneração material. O que os moveu foi apenas o interesse do Evangelho e da salvação de todos os homens e mulheres.
    O nosso texto termina com uma referência à forma como os tessalonicenses acolheram a Palavra anunciada por Paulo e pelos seus companheiros de missão: receberam-na "não como Palavra humana, mas como ela é realmente, Palavra de Deus", que permanece activa no coração dos crentes e que os transforma (vers. 13).
    A comunidade cristã não é só fruto da Palavra proclamada, mas também da Palavra escutada, acolhida e vivida. Os tessalonicenses tiveram, desde logo, a percepção essencial de que a P
    alavra que lhes foi anunciada era Palavra de Deus e não a palavra de Paulo ou de qualquer outro pregador cristão. No processo de anúncio, de acolhimento e de transmissão do Evangelho, todos devemos ter a consciência de que o importante não é o instrumento humano que anuncia a Palavra (por mais que ele seja atraente e brilhante), mas a proposta que, através desse instrumento humano, Deus nos faz.

    ACTUALIZAÇÃO

    Na reflexão, ter em conta as seguintes linhas:

    • Esta página diz-nos, em primeiro lugar, que os anunciadores do Evangelho não podem ser simples funcionários, frios e distantes, que cumprem pontual e burocraticamente a tarefa que lhes foi confiada; mas que têm de ser como uma mãe cheia de amor, que ama com ternura os seus filhos, que partilha tudo com eles, que se sacrifica alegremente por eles e que entrega totalmente a sua própria vida para que os filhos tenham mais vida. O anúncio do Evangelho tem de ser, antes de mais, um serviço de amor. É assim que nós - aqueles a quem foi confiada a missão de anunciar o Evangelho - agimos? O nosso trabalho é feito com amor e com entrega total, ou com o espírito de funcionário cansado que despacha o expediente para se ver livre de uma tarefa monótona e fastidiosa? Aqueles que contactam connosco encontram em nós testemunhas vivas e entusiastas do amor de Deus, ou pessoas amargas, egoístas, agressivas cansadas e desanimadas?

    • Esta página diz-nos, em segundo lugar, que os anunciadores do Evangelho devem dar-se à missão de forma absolutamente gratuita. O Evangelho não pode, nunca, ser o pretexto para a satisfação de interesses pessoais (enriquecimento material, busca de protagonismo, promoção pessoal...), mas deve ser um serviço que se faz com total gratuidade, generosidade e amor. O Evangelho não é um negócio, nem um meio de enriquecimento rápido, nem uma forma de viver uma vida sem grandes preocupações materiais; mas é salvação que, de forma totalmente gratuita, Deus oferece a todos os homens.

    • Convém estarmos conscientes de que não basta que a Palavra seja proclamada: é preciso que ela seja, também, escutada e acolhida. Escutar não significa apenas "ouvir com os ouvidos", mas também acolher no coração as propostas que nos são feitas por Deus. Estamos sempre disponíveis para nos deixarmos interpelar e transformar pela Palavra que nos é anunciada, ou o nosso coração é como essa terra dura que recebe a semente e a deixa secar?

    • No processo de escuta e de acolhimento da Palavra, é preciso não esquecer que os anunciadores não são o essencial: o essencial é a Palavra de Deus. Os homens podem apresentar a Palavra de forma mais ou menos brilhante, mais ou menos sedutora, mais ou menos interpelativa; mas é preciso sabermos discernir a beleza das palavras da força da Palavra de Deus e não deixarmos que o essencial seja ofuscado pelo brilho do acessório.

    ALELUIA - Mt 23,9b.10b

    Aleluia. Aleluia.

    Um só é o vosso pai, o Pai celeste;
    um só é o vosso mestre, Jesus Cristo.

    EVANGELHO - Mt 23,1-12

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

    Naquele tempo,
    Jesus falou à multidão e aos discípulos, dizendo:
    «Na cadeira de Moisés sentaram-se os escribas e os fariseus.
    Fazei e observai tudo quanto vos disserem,
    mas não imiteis as suas obras,
    porque eles dizem e não fazem.
    Atam fardos pesados e põem-nos aos ombros dos homens,
    mas eles nem com o dedo os querem mover.
    Tudo o que fazem é para serem vistos pelos homens:
    alargam os filactérios e ampliam as borlas;
    gostam do primeiro lugar nos banquetes
    e dos primeiros assentos nas sinagogas,
    das saudações nas praças públicas
    e que os tratem por 'Mestres'.
    Vós, porém, não vos deixeis tratar por 'Mestres',
    porque um só é o vosso Mestre e vós sois todos irmãos.
    Na terra não chameis a ninguém vosso 'Pai',
    porque um só é o vosso pai, o Pai celeste.
    Nem vos deixeis tratar por 'Doutores',
    porque um só é o vosso doutor, o Messias.
    Aquele que for o maior entre vós será o vosso servo.
    Quem se exalta será humilhado
    e quem se humilha será exaltado».

    AMBIENTE

    O Evangelho deste domingo coloca-nos, mais uma vez, em Jerusalém, nos últimos dias antes da paixão e morte de Jesus. É nesses dias que se desenrola o confronto final entre Jesus e o judaísmo. Os líderes da nação judaica, escudados nas suas certezas, convicções e preconceitos, continuam a recusar a proposta do Reino e a preparar o processo contra Jesus.
    A passagem que hoje nos é proposta é a introdução a um extenso discurso de condenação, que Jesus pronuncia contra os líderes religiosos de Israel (cf. Mt 23,13-36). É neste discurso que aparecem os sete famosos "ai de vós, escribas e fariseus...". Para Mateus, o discurso é a resposta de Jesus à intransigência dos judeus em acolher as propostas de Deus.
    Ao longo do discurso, Mateus põe na boca de Jesus uma apreciação extremamente negativa dos escribas (especialistas da Escritura, muitos dos quais eram fariseus) e dos fariseus. É preciso dizer, no entanto, que este retracto dos fariseus não é totalmente justo... No geral, os fariseus eram crentes entusiastas, que procuravam conhecer e se esforçavam por cumprir escrupulosamente a Lei de Moisés. Estavam presentes em todos os passos da vida religiosa dos israelitas e procuravam instilar no Povo o respeito pela Lei, a fim de que Israel fosse, cada vez mais, um Povo santo, dedicado a Jahwéh e vivendo na órbita de Jahwéh. Tratava-se de um grupo sério, bem intencionado, verdadeiramente empenhado na santificação da comunidade israelita. No entanto, o seu fundamentalismo em relação à Lei foi, algumas vezes, criticado por Jesus. Ao afirmarem a superioridade da Lei, desprezavam muitas vezes o Homem e criavam no Povo um sentimento de pecado e de indignidade que oprimia as consciências... Dando demasiado relevo à Lei, esqueciam o essencial - o amor e a misericórdia. E ao considerarem-se a si próprios os "puros" que viviam de acordo com a Lei, desprezavam o "'am aretz" (o "povo do país") que, por causa da ignorância e da dura vida que levava, não podia cumprir integralmente os preceitos da Lei.
    A opinião que Jesus fazia dos fariseus seria tão dura como a que este texto nos apresenta? Provavelmente não. É preciso recordar que o Evangelho segundo Mateus apareceu na parte final do séc. I (década de 80), quando os fariseus eram a corrente dominante no judaísmo e apareciam como o rosto polémico desse adversário judaico com que os cristãos todos os dias se confrontavam. Este texto deve estar marcado por essa perspectiva. Talvez mais do que transmitir a opinião de Jesus sobre os fariseus, apresenta a imagem que os cristãos dos finais do primeiro século tinham do judaísm
    o e dos seus líderes.

    MENSAGEM

    O nosso texto divide-se em duas partes. Na primeira, Jesus traça um retracto dos fariseus (vers. 1-7); na segunda, Jesus deixa alguns conselhos aos discípulos para que não se transformem também em "fariseus" (vers. 8-12).
    Como são, então, os fariseus?
    Deles diz-se, em primeiro lugar, que se sentam na cadeira de Moisés (vers. 2). A expressão refere-se à autoridade exclusiva que os fariseus a si próprios se atribuíam para interpretar a Lei de Moisés (é preciso dizer, no entanto, que a acusação quadra melhor com os fariseus da época de Mateus, do que com os fariseus da época de Jesus: na época de Mateus - no judaísmo pós-destruição de Jerusalém - os fariseus já eram a corrente dominante e funcionavam como a autoridade exclusiva na interpretação e na aplicação da Lei, facto que não acontecia na época de Jesus). Eles são acusados aqui de se terem apropriado da Palavra de Deus e de a terem desvirtuado com regras, normas, obrigações interpretações legalistas e casuísticas que, em lugar de favorecerem o encontro do homem com Deus, só serviram para afastar cada vez mais os dois parceiros da Aliança.
    Deles diz-se, em segundo lugar, que são incoerentes (vers. 3). "Dizem e não fazem". O seu comportamento não é coerente com as suas palavras e os seus ensinamentos. Os cristãos são convidados a escutar os seus ensinamentos - coisa que muitos cristãos de origem judaica faziam - mas a não imitar o seu exemplo.
    Deles diz-se, em terceiro lugar, que carregam os homens com fardos pesados e insuportáveis (vers. 4). Na verdade, as exigências dos fariseus tornavam impossível a vida dos crentes, tantas eram as leis, as obrigações, as proibições que eles faziam derivar da Lei. A impossibilidade de conhecer e de cumprir todo esse imenso arsenal legal, criava nos crentes uma consciência de impureza e de pecado que oprimia as consciências e que matava a alegria. Era uma autêntica escravatura da Lei.
    Deles diz-se, finalmente, que gostam de fazer da sua fé e da sua piedade um espectáculo e uma exibição. Fazem as coisas para que todos percebam a sua grandeza e superioridade, e não se esquecem nunca de publicitar a sua fé e a sua piedade. Por vaidade, alargam as filactérias (caixinhas de couro contendo trechos da Torah, que os israelitas usam, a partir dos 13 anos, durante as orações matinais) e as borlas (franjas colocadas nas quatro extremidades do manto - tallît - que o judeu piedoso colocava aos ombros durante a oração). O que lhes interessa é a imagem que dão, o reconhecimento dos homens e os títulos de honra.
    E os cristãos, como devem viver? Que cuidados é preciso ter para que o farisaísmo não se perpetue na Igreja de Jesus?
    Fundamentalmente, é preciso que a comunidade cristã seja uma verdadeira fraternidade (vers. 8: "vós sois todos irmãos"). A Igreja não é constituída por "superiores" e "súbditos", "mestres" e "discípulos", "pais" e "filhos", "doutores" e "alunos", mas por irmãos iguais, que têm um Pai comum (vers. 9: "um só é o vosso Pai, aquele que está no céu") e que seguem o mesmo Cristo (vers. 10: "um só é o vosso doutor, Cristo"). Na Igreja de Jesus não pode haver quem queira mandar nos outros, ou quem se considere a si próprio mais importante, mais digno, mais honrado, mais preparado do que os outros... Na Igreja de Jesus não pode existir, à imagem da estrutura hierárquica judaica, um esquema complicado de graus, de acordo com a diferente dignidade dos membros da comunidade. Na Igreja de Jesus os títulos de honra, os lugares reservados, a luta pelos primeiros lugares, não fazem qualquer sentido. Na comunidade de Jesus, só o amor e o serviço devem ter o primeiro lugar (vers. 11: "o maior de entre vós, será o vosso servo").
    A comunidade cristã deve anunciar profeticamente o Reino de Deus... Ora, nesse Reino proposto aos homens por Deus e inaugurado por Jesus, só o Pai (Deus) e o Filho (Jesus) ocupam um lugar de honra. Os crentes, iguais em dignidade, são irmãos; entre si, devem amar-se e fazer-se servidores uns dos outros.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão e a partilha podem fazer-se tendo em conta os seguintes dados:

    • O Evangelho do 31º Domingo do Tempo Comum dá conta de uma das mais profundas divergências entre a proposta de Jesus e a cultura contemporânea... Os valores que governam o nosso mundo garantem-nos que a realização plena e a felicidade do homem dependem da posição a que ele conseguir elevar-se na estrutura hierárquica da comunidade em que está inserido (social, religiosa, profissional...) e do poder, da importância, do reconhecimento que ele souber granjear, da sua capacidade de obter sucesso; Jesus garante-nos que a realização plena do homem depende da sua capacidade de amar e de servir... Em jogo estão duas visões antagónicas da finalidade da vida do homem e dos caminhos que cada pessoa deve percorrer para atingir a sua realização plena... De acordo com a nossa sensibilidade e a nossa experiência de todos os dias, quem tem razão?

    • A Igreja, testemunha do Reino e dos valores propostos por Jesus, tem de ser uma comunidade de irmãos que vivem no amor. Nela, não podem ser determinantes os títulos, os lugares de honra, os privilégios, a importância hierárquica... Na comunidade cristã, a única coisa determinante é o serviço simples e humilde que se presta aos irmãos. Na prática, é assim que as coisas se passam? Que valor tem, na Igreja, os títulos, as posições hierárquicas, a visibilidade, os cargos, os privilégios, os lugares de honra? Tudo isso não poderá contribuir decisivamente para criar divisões que afectam a fraternidade e que negam os princípios sobre os quais se constrói o Reino? Quando a vida das nossas comunidades cristãs é marcada por lutas pelo poder, conflitos, ciúmes, a comunidade está a avançar em direcção à fraternidade e ao amor?

    • Mateus, ao apresentar-nos essa poderosa invectiva contra os "fariseus", está a avisar os crentes contra a perpetuação de um "farisaísmo" que destrói a comunidade. Está a sugerir que quando alguém se arroga o direito divino de se instalar na cadeira do poder e se constitui como único e decisivo critério de verdade, pode facilmente substituir o Evangelho pelas suas próprias normas, pelas suas próprias leis, pelos seus próprios esquemas e visões de Deus e do mundo.

    • Mateus, ao escalpelizar a incoerência dos "fariseus", está a avisar-nos contra a tentação de mostrarmos o que não somos, de vendermos uma imagem "corrigida e aumentada" de nós próprios para obtermos o aplauso e admiração dos outros, de vivermos para as aparências e não para o compromisso simples e humilde com o Evangelho... É que a mentira e a incoerência destroem a paz do nosso coração, roubam-nos a alegria e a serenidade, comprometem o nosso testemunho, minam a comunidade e põem em causa os fundamentos do Reino.

    • Mateus, ao denunciar a tendência dos "fariseus" para impor aos outros pesos insuportáveis, está a avisar-nos contra a tentação de inventar exigências e obrigações, mandamentos e leis que criam escravidão, que oprimem as consciências, que metem medo, que impedem os filhos de Deus de viverem livres e felizes. Isso acontece na Igreja de que fazemos parte? As cargas com que, às vezes, carregamos os homens e mulheres nossos irmãos, serão sempre consequência da radicalidade do Evangelho?
    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 31º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A LITURGIA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 31º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa...

    2. DURANTE A CELEBRAÇÃO.
    Para se pôr em realce as relações novas às quais Cristo convida os cristãos, procure-se dar testemunho delas, onde puderem ser vividas. Por exemplo, pode-se suscitar um ou outro testemunho da parte de um grupo da paróquia onde se vivem boas relações fraternas, ao serviço de uma causa caritativa, por exemplo. Além disso, procure-se cuidar hoje de modo particular da oração do Pai Nosso: oração daquelas e daqueles que se sabem irmãs e irmãos em Jesus Cristo.

    3. PALAVRA DE VIDA.
    «Um pouco de coerência», parece dizer Jesus aos seus discípulos, pondo-os de sobreaviso em relação àqueles que «dizem e não fazem». Jesus pode falar porque Ele é todo coerência: tudo o que disse, fez. Mão se limitando a belos discursos, isto é, bons conselhos, Ele próprio experimenta o que pede aos seus discípulos. Nisso Jesus é credível ou, como se diz, pode-se confiar n'Ele. Não é isso a fé: ter confiança n'Aquele que faz o que diz? Ao ressuscitá-l'O, Deus seu Pai autentificará a mensagem de Jesus e o seu testemunho em plena unidade.

    4. UM PONTO DE ATENÇÃO.
    A oração universal... A oração de intercessão, que chamamos mais habitualmente de oração universal, tem a ver com o sacerdócio dos baptizados. Por isso, é bom, de vez em quando, que se lhe dê mais importância e solenidade: mais importância, acrescentando outras intenções locais da diocese ou da comunidade; mais solenidade, pela proclamação das várias intenções (cantadas) e uma resposta/refrão (cantado).

    5. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE...
    Rezar todos os dias o Pai Nosso. Durante a semana, procurar fazer o ponto da situação sobre as nossas relações, sobre a nossa maneira de viver em comunidade cristã. Procurar rezar todos os dias o Pai Nosso de maneira menos formal, tendo mais consciência das suas implicações de fraternidade.

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • S. Nuno de Santa Maria, Religioso

    S. Nuno de Santa Maria, Religioso


    6 de Novembro, 2023

    Nuno Álvares Pereira nasceu a 24 de Junho de 1360. Aos treze anos tornou-se pajem da rainha D. Leonor, sendo, pouco depois, armado cavaleiro. Por vontade de seu pai, casou-se aos 16 anos. Dos três filhos do seu matrimónio, dois faleceram ainda crianças, ficando apenas uma filha, Beatriz, que veio a casar com o filho do rei D. João I, D. Afonso, primeiro duque de Bragança. Quando, a 22 de Outubro de 1383, faleceu rei D. Fernando I, não deixou filhos varões, mas apenas uma filha casada com o rei de Castela, que pretendeu apoderar-se da coroa de Portugal. Opôs-se-lhe D. João, Mestre de Avis, irmão de D. Fernando, com o apoio de D. Nuno Alvares Pereira. Este, nomeado Condestável, conduziu o exército português a várias vitórias contra os castelhanos, até à vitória final, em Aljubarrota, a 14 de Agosto de 1385. O Condestável, aos dotes militares, aliava uma espiritualidade sincera e profunda, caraterizada pelo amor à Eucaristia e à Virgem Maria. Com a morte da sua esposa, em 1387, D. Nuno recusa contrair segundas núpcias e, quando a paz é definitivamente estabelecida, distribui grande parte dos bens pelos seus companheiros, antigos combatentes, e faz-se carmelita, com o nome de frei Nuno de Santa Maria. Logo após a sua morte, no dia 1 de Abril de 1431, Fre Nuno começou a ser chamado "santo" pelo povo. Beatificado por Bento XV beatificou-o, em 1918 e Bento XVI canonizou-o, em 2009.
    Lectio
    Primeira leitura: Ben Sirá 44, 1-3ab.4.6-7.10.13-14

    Louvemos os homens ilustres, nossos antepassados,segundo as suas gerações. 2O Senhor deu-lhes grande glória e magnificência, desde o princípio do mundo. 3Eles governaram nos seus reinos, homens famosos pelo seu poder, conselheiros pela sua inteligência. 4Guias do povo, pelos seus conselhos, chefes do povo, pela sagacidade, sábios narradores, pelo seu ensino, 6Homens ricos, dotados de poder, vivendo em paz nas suas casas. 7Todos eles alcançaram glória entre os seus contemporâneos e foram honrados no seu tempo. 10Foram homens de misericórdia, cujas obras de piedade não foram esquecidas. 13A sua posteridade permanecerá para sempre, e a sua glória não terá fim. 14Os seus corpos foram sepultados em paz, e o seu nome vive de geração em geração.

    Ben Sirá evoca as figuras ilustres que marcaram o passado da história de Israel para, com o seu exemplo, infiltrar vida nova no presente e projetar a esperança do povo na direção do futuro. Se estes homens baseavam a sua esperança na perpetuidade da sua memória, nas homenagens que lhes prestariam as gerações futuras, uma vez que ainda não lhes era muita clara a vida para além da morte, a nossa esperança de cristãos baseia-se em motivações bem mais sólidas: Cristo morto e ressuscitado, nossa esperança. S. Nuno de Santa Maria, grande pelo heroísmo e generosidade com que serviu o povo e pelas benemerências que lhe prestou, é ainda maior pela sua fé, pela sua esperança e pela sua caridade. Animado por essas virtudes, serviu a Pátria e, sobretudo, serviu a Deus.
    Evangelho: Lucas 14, 25-33

    Naquele tempo, seguia Jesus uma grande multidão. Jesus voltou-se e disse-lhes: 26«Se alguém vem ter comigo e não me tem mais amor que ao seu pai, à sua mãe, à sua esposa, aos seus filhos, aos seus irmãos, às suas irmãs e até à própria vida, não pode ser meu discípulo. 27Quem não tomar a sua cruz para me seguir não pode ser meu discípulo. 28Quem dentre vós, querendo construir uma torre, não se senta primeiro para calcular a despesa e ver se tem com que a concluir? 29Não suceda que, depois de assentar os alicerces, não a podendo acabar, todos os que virem comecem a troçar dele, 30dizendo: 'Este homem começou a construir e não pôde acabar.' 31Ou qual é o rei que parte para a guerra contra outro rei e não se senta primeiro para examinar se lhe é possível com dez mil homens opor-se àquele que vem contra ele com vinte mil? 32Se não pode, estando o outro ainda longe, manda-lhe embaixadores a pedir a paz. 33Assim, qualquer de vós, que não renunciar a tudo o que possui, não pode ser meu discípulo.

    O seguimento de Jesus é exigente. Não se pode ser cristã a meias. É o que nos ensinam as duas parábolas (vv. 27-30 e 31-32) e as três sentenças (vv. 26.27.32) que escutamos no evangelho da memória de S. Nuno de Santa Maria. Se os projetos deste mundo impõem custos, planos, sacrifícios, o seguimento de Jesus não é menos exigente. Por isso, se alguém quer ser discípulo de Jesus, deve tomar a cruz para segui-lo (cf. v. 26). A nossa lei é Cristo, com a sua entrega aos pequenos, a sua mensagem de esperança, de perdão e o seu caminho de verdade/fidelidade até à morte. S. Nuno foi discípulo verdadeiro e fiel, como cristão leigo, como militar, como religioso.
    Meditatio

    "Sabei que o Senhor me fez maravilhas. Ele me ouve, quando eu o chamo" (Sl 4, 4). Estas palavras do Salmo Responsorial exprimem o segredo da vida do bem-aventurado Nuno de Santa Maria, herói e santo de Portugal. Os setenta anos da sua vida situam-se na segunda metade do século XIV e primeira do século XV, que viram aquela nação consolidar a sua independência de Castela e estender-se depois pelos Oceanos - não sem um desígnio particular de Deus - abrindo novas rotas que haviam de propiciar a chegada do Evangelho de Cristo até aos confins da terra. São Nuno sente-se instrumento deste desígnio superior e alistado na militia Christi, ou seja, no serviço de testemunho que cada cristão é chamado a dar no mundo. Características dele são uma intensa vida de oração e absoluta confiança no auxílio divino. Embora fosse um ótimo militar e um grande chefe, nunca deixou os dotes pessoais sobreporem-se à ação suprema que vem de Deus. São Nuno esforçava-se por não pôr obstáculos à ação de Deus na sua vida, imitando Nossa Senhora, de Quem era devotíssimo e a Quem atribuía publicamente as suas vitórias. No ocaso da sua vida, retirou-se para o Convento do Carmo por ele mandado construir. Sinto-me feliz por apontar à Igreja inteira esta figura exemplar nomeadamente pela presença duma vida de fé e oração em contextos aparentemente pouco favoráveis à mesma, sendo a prova de que em qualquer situação, mesmo de carácter militar e bélico, é possível atuar e realizar os valores e princípios da vida cristã, sobretudo se esta é colocada ao serviço do bem comum e da glória de Deus. (Bento XVI, Homilia da Canonização de S. Nuno de Santa Maria).
    Oratio

    Senhor nosso Deus, que destes a S. Nuno de Santa Maria a graça de combater o bom combate e o tornastes exímio vencedor de si mesmo, concedei aos vossos servos que, dominando como ele as sedições do mundo, com ele vivam para sempre na pátria celeste. Ámen.
    Contemplatio

    "A devoção a Maria, diz Santo Efrém, é "um salvo-conduto para o céu". "Maria é uma advogada que não perde as suas causas", diz S. Bernardo. Temos disso a prova no milagre de Caná. "Ela não se cansa de nos defender", diz S. Germano... Santo Anselmo aplica-lhe o que é dito da Sabedoria nos santos livros: "Ela antecipa-se às nossas orações para nos vir socorrer" (Sab 6, 14). O mesmo Sto. Anselmo vai até ao ponto de dizer que o socorro vem às vezes mais depressa pela invocação de Maria, enquanto Jesus é Mestre e Juiz. "Como Maria é terrível para o demónio", diz S. Boaventura! E o Santo doutor aplica a Maria o que Job diz da Aurora que faz fugir os ladrões: "O diabo tal como os ladrões atravessa as muralhas de noite, mas se a aurora aparece, foge como os ladrões"... Guardemos a castidade segundo a nossa própria condição... Recitemos o pequeno ofício ou a liturgia das horas". (Leão Dehon, OSP 4, p. 64s.).
    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "A suas obras de piedade não foram esquecidas" (Ben Sirá, 44, 12).

     

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    S. Nuno de Santa Maria, Religioso (6 de Novembro)

  • Dedicação da Basílica de Latrão

    Dedicação da Basílica de Latrão


    9 de Novembro, 2023

    A Basílica do Santíssimo Salvador, ou de S. João de Latrão, foi fundada pelo Papa Melquíades (311-314) sobre a colina de Latrão. Aí se celebraram sessões de cinco Concílios Ecuménicos. Aí o Papa celebra a Missa da Ceia do Senhor, em quinta-feira santa. Aí multidões de presbíteros e bispos foram ordenados ao longo dos séculos. Daí partiram muitos missionários para os cinco continentes. Uma vez que o Bispo de Roma, Sucessor de Pedro, tem a sua sede na Basílica de Latrão, essa igreja é justamente chamada "mãe e cabeça de todas as igrejas", como se lê no seu frontispício. O aniversário da sua Dedicação é celebrado como festa litúrgica, desde o século XII.

     

    Lectio
    Primeira leitura: Ezequiel 47, 1-2.8-9.12

    Naqueles dias, o Anjo conduziu-me para a entrada do templo, e eis que saía água da sua parte subterrânea, em direcção ao oriente, porque o templo estava voltado para oriente. A água brotava da parte de baixo do lado direito do templo, a sul do altar. 2Fez-me sair pelo pórtico setentrional e contornar o templo por fora, até ao pórtico exterior oriental; vi rebentar a água do lado direito. 8Ele disse-me: «Esta água corre para o território oriental, desce para a Arabá e dirige-se para o mar; quando chegar ao mar, as suas águas tornar-se-ão salubres. 9Por onde quer que a torrente passar, todo o ser vivo que se move viverá. O peixe será muito abundante, porque aonde quer que esta água chegar, tornar-se-á salubre; e a vida desenvolver-se-á por toda a parte aonde ela chegar. 12Ao longo da torrente, nas suas margens, crescerá toda a sorte de árvores frutíferas, cuja folhagem não murchará e cujos frutos nunca cessam: produzirão todos os meses frutos novos, porque esta água vem do santuário. Os frutos servirão de alimento e as folhas, de remédio.

    O tema da manifestação da Glória de Javé na terra de Israel, no meio do seu povo, no templo, como centro vivificante, atinge, a sua máxima expressão no texto de Ezequiel, que hoje escutamos. A presença da Glória de Deus no meio de Israel provocará transformações, que trarão ao povo as mesmas condições de vida do início, da criação. Os quatro rios paradisíacos são agora uma única torrente que irrompe da entrada do templo e desce até Arabá pelo lado direito do mesmo templo. Começando por ser um simples arroio, vai crescendo até se tornar uma torrente intransponível, que fertiliza os campos até ao Mar Morto. O próprio Mar Morto volta a encher-se de vida, porque as suas águas salgadas se tornam salubres. Na nova Jerusalém dos tempos escatológicos, a presença de Javé será uma bênção manifestada em poder vivificante e criador. Este simbolismo da água é retomado pelo Novo Testamento: do Lado aberto de Cristo, templo de Deus no meio dos homens, brotará o Espírito que tudo renova e recria, verdadeira fonte de águas vivas que jorram para a vida eterna.
    Segunda leitura: 1 Coríntios 3, 9c-11.16-17

    Irmãos: Vós sois o edifício de Deus. 10Segundo a graça de Deus que me foi dada, eu, como sábio arquitecto, assentei o alicerce, mas outro edifica sobre ele. Mas veja cada um como edifica, 11pois ninguém pode pôr um alicerce diferente do que já foi posto: Jesus Cristo. 16Não sabeis que sois templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós? 17Se alguém destrói o templo de Deus, Deus o destruirá. Pois o templo de Deus é santo, e esse templo sois vós.

    A construção da Igreja é realizada por impulso da misteriosa dinâmica divina, sob o alicerce que é Jesus Cristo. O contributo humano necessário, por vontade de Deus, será avaliado, não segundo a dignidade da tarefa encomendada, mas segundo o esforço voluntário de cada um. Tanto faz ser arquiteto como pedreiro! Mas o templo de Deus é a própria comunidade humana. É aí que Deus quer habitar. Os outros templos, mais ou menos grandiosos, hão-de ajudar a que, todos e cada um, se tornem templo do Deus vivo.
    Evangelho: João 12, 13-22

    Estava próxima a Páscoa dos judeus, e Jesus subiu a Jerusalém. 14Encontrou no templo os vendedores de bois, ovelhas e pombas, e os cambistas nos seus postos. 15Então, fazendo um chicote de cordas, expulsou-os a todos do templo com as ovelhas e os bois; espalhou as moedas dos cambistas pelo chão e derrubou-lhes as mesas; 16e aos que vendiam pombas, disse-lhes: «Tirai isso daqui. Não façais da Casa de meu Pai uma feira.» 17Os seus discípulos lembraram-se do que está escrito: O zelo da tua casa me devora. 18Então os judeus intervieram e perguntaram-lhe: «Que sinal nos dás de poderes fazer isto?» 19Declarou-lhes Jesus, em resposta: «Destruí este templo, e em três dias Eu o levantarei!» 20Replicaram então os judeus: «Quarenta e seis anos levou este templo a construir, e Tu vais levantá-lo em três dias?» 21Ele, porém, falava do templo que é o seu corpo. 22Por isso, quando Jesus ressuscitou dos mortos, os seus discípulos recordaram-se de que Ele o tinha dito e creram na Escritura e nas palavras que tinha proferido.

    Jesus entrara em Jerusalém como vencedor da morte e senhor da vida - ressuscitara Lázaro; entrara no ambiente próprio de um rei triunfante, como indicavam os ramos de palmeira associados ao triunfo dos Macabeus (cf. 1 Mac 13, 50-52; 2 Mac 10, 1-9). Mas é ele próprio que encontra um jumento e monta nele. Não é, pois, o Messias no sentido que o povo esperava, mas o Messias anunciado por Zacarias (cf. Zc 9, 9). Só a partir da sua morte e ressurreição, graças à presença do Espírito, é que tudo isto é entendido pelos próprios apóstolos. Ao contrário do que se pensava, não é o povo que dá autoridade a Jesus, mas o Pai. O seu reino também não é deste mundo. Por isso, os judeus nada tinham a temer, quando verificaram: "toda a gente vai atrás d´Ele."
    Meditatio

    Hoje a Igreja-Mãe chama-nos para Roma a fim de, ao menos em espírito, celebrarmos com ela o aniversário da Dedicação da Sé Catedral do Papa, que não é, como muitos julgam, a Basílica de S. Pedro do Vaticano, mas é exatamente a Basílica de S. João de Latrão.
    A liturgia hodierna sublinha claramente o significado da igreja-edifício, como sinal visível do único verdadeiro templo que é o corpo pessoal de Cristo e o seu corpo místico, que é a Igreja, que celebra num determinado lugar o culto em espírito e em verdade (cf. Jo 4, 23; At 2, 46s.). Para além da sacralização do espírito material, somos estimulados a colher em Cristo homem-Deus a verdadeira sacralidade que, a partir dele, se comunica a todo o povo santo e sacerdotal, batizado e crismado no Espírito, unido ao sumo e eterno sacerdote na única oblação (Heb 10, 14).
    A casa do povo de Deus, no que diz respeito à estrutura, ao decoro e à funcionalidade, deve ser tida a peito por todos os crentes, que nela renascem para a vida divina, e que nela serão abençoados para o último êxodo pascal, rumo à pátria. É casa de todos e, como tal, deve ser cuidada e guardada com amor também no seu aspeto exterior, que é sinal da nossa pureza interior" (CEI, Rito da Dedicação de uma igreja, Orientações Pastorais, Roma 1981, 12-14).
    Na festa da Dedicação da Catedral de Roma, sigamos um conselho do P. Dehon: "Renovemos a nossa devoção e a nossa confiança para com a Igreja romana. Sejamos dóceis a todos os seus ensinamentos, a todas as suas orientações. Amemo-la, veneremo-la tanto mais quanto mais ela for atacada e combatida. Rezemos pelo Soberano Pontífice e pela Igreja". (Leão Dehon, OSP 3, p. 70).
    Oratio

    Senhor, Pai santo, nós vos damos graças. Nesta casa visível, que nos destes a graça de construir, incessantemente concedeis os vossos favores à vossa família, que, neste lugar, peregrina para Vós. Aqui nos dais o sinal admirável da vossa comunhão connosco e nos fazeis participar no mistério da vossa aliança: aqui edificais o vosso templo, que somos nós, e fazeis crescer a Igreja, presente em toda a terra, na unidade do Corpo do Senhor, que, um dia, tornareis perfeita na visão da paz da celeste Jerusalém. Com os Anjos e os Santos, nós Vos louvamos, no templo da vossa glória. Ámen. (cf. Prefácio da Missa).
    Contemplatio
    As grandes ordenações em S. João de Latrão são realmente emocionantes. A cerimónia é feita no coro da Basílica, ao pé da mesa da Ceia, testemunha da primeira ordenação no Cenáculo, junto das sagradas cabeças de S. Pedro e de S. Paulo, que depois de Jesus, são a nascente do sacerdócio, e nesta igreja que é a cabeça e a mãe de todas as igrejas. Sobre estas lajes prostraram-se, depois de S. Silvestre e de Constantino, muitos milhares de padres que vinham receber a unção sacerdotal ou a consagração episcopal. Daí partiram os apóstolos de tantas nações. Aí renova-se cada ano a nascente do apostolado pelas ordenações de clérigos de todas as nações. Experimentei aí as mais profundas e as melhores emoções da minha vida. (Leão Dehon, Memórias (NHV), 65-66).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "O templo de Deus é santo, e esse templo sois vós" (1 Cor 3, 17).

     

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    Dedicação Da Basílica De Latrão (9 de Novembro)

  • S. Martinho de Tours, Bispo

    S. Martinho de Tours, Bispo


    11 de Novembro, 2023

    S. Martinho nasceu na Panónia, na atual Hungria, no ano 316. O pai orientou-o para a carreira militar. Ainda catecúmeno, deu prova de coerência e de amor cristão para com os pobres. Recebido o batismo, orientado por S. Hilário de Poitiers, deixou as armas e consagrou-se a Deus na vida monástica. Começou por viver como eremita. Depois, sempre aconselhado por S. Hilário, fundou em Ligugè o primeiro mosteiro cristão do Ocidente. Em 373 foi escolhido para bispo de Tours. Até à morte, ocorrida em 397, dedicou-se com incansável solicitude à formação do clero, à pacificação entre os povos e à evangelização. Foi um dos primeiros santos, não mártires, a ser honrado pela liturgia da Igreja.
    Lectio
    Primeira leitura: Da féria ou do Comum
    Evangelho: Mateus 25, 31-40

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: "Quando o Filho do Homem vier na sua glória, acompanhado por todos os seus anjos, há-de sentar-se no seu trono de glória. 32Perante Ele, vão reunir-se todos os povos e Ele separará as pessoas umas das outras, como o pastor separa as ovelhas dos cabritos. 33À sua direita porá as ovelhas e à sua esquerda, os cabritos. 34O Rei dirá, então, aos da sua direita: 'Vinde, benditos de meu Pai! Recebei em herança o Reino que vos está preparado desde a criação do mundo. 35Porque tive fome e destes-me de comer, tive sede e destes-me de beber, era peregrino e recolhestes-me, 36estava nu e destes-me que vestir, adoeci e visitastes-me, estive na prisão e fostes ter comigo.' 37Então, os justos vão responder-lhe: 'Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos de comer, ou com sede e te demos de beber? 38Quando te vimos peregrino e te recolhemos, ou nu e te vestimos? 39E quando te vimos doente ou na prisão, e fomos visitar-te?' 40E o Rei vai dizer-lhes, em resposta: 'Em verdade vos digo: Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes".

    O discurso sobre o "juizo final", é o ponto final e culminante do ministério público de Jesus, segundo Mateus. Retomando o capítulo 7 de Daniel, Jesus fala do Filho do homem como juiz glorioso que introduz no reino de Deus. Todos passam por um discernimento inevitável (vv. 32s.), cujo critério surpreende. Nesse momento, de fato, fica-se a compreender que o Filho do homem vindo na glória "com todos os seus anjos" (v. 31), estava desde sempre presente em todos os pobres e fracos. O Filho do homem, agora sentado no trono de glória, identifica-se com todos os "irmãos mais pequeninos" (v. 40). Felizes o que neste mundo tiverem partilhado a sua porção dealegria com os aflitos. Com surpresa, irão herdar o reino para eles preparado pelo Pai "desde a criação do mundo" (v. 34).
    Meditatio

    Deus, misericordioso para com todos, particularmente para com os pobres, os famintos, os aflitos, revela o seu poder e a sua bem-aventurança realizando generosamente as obras de misericórdia. Os que, ensinados por Cristo, e com a graça do Espírito Santo, imitam a Deus Pai na sua misericórdia, são verdadeiramente bem-aventurados. S. Martinho de Tours é um desses bem-aventurados, porque sobre partilhar a sua capa, e tudo quanto era e quanto possuía, com os mais pobres e aflitos. O povo cristão admirou a sua generosidade e reconheceu a sua bem-aventurança, venerando-o, celebrando-o e criando sugestivas tradições ligadas à sua memória. A sua vida, escrita por Sulpício Severo, chegou bem depressa a todo o Império romano. Durante a Idade Média fizeram-se peregrinações ao seu sepulcro, quase tantas como aos sepulcros dos Apóstolos, em Roma. A sua fama de taumaturgo transportava toda a espécie de enfermos e necessitados, com a esperança de alcançarem cura das suas doenças e males.
    Nascido de pais pagãos, Martinho converteu-se ao cristianismo, recebendo o batismo. Cheio de Espírito Santo, amou a todos com o coração de Cristo, dando o que tinha recebido, sem fazer cálculos. A sua caridade era intuitiva e preveniente. Começou por dar a todos o que tinha de mais precioso: a vida da graça. Como monge, deu a sua oração perene de louvor, de ação de graças e de intercessão. Como bispo, prodigalizou-se em favor dos doentes e pobres, que o aguardavam à porta da igreja, esperando a cura, e a generosidade das suas esmolas. Chegou a dar a sua própria roupa, logo depois de endossar os paramentos litúrgicos. Descobriu a Cristo nos pobres quando ainda era militar e catecúmeno e, desde então, a sua vida tornou-se milícia em prol do evangelho.
    "É na disponibilidade e no amor para com todos, especialmente para com os pequenos e os que sofrem, que viveremos a nossa união a Cristo. Como poderíamos, efetivamente, compreender o amor que Cristo nos tem, senão amando como Ele em obras e em verdade? Neste amor de Cristo encontramos a certeza de alcançar a fraternidade humana e a força de lutar por ela." (Cst 18). S. Martinho, amando como Cristo, compreendeu e experimentou o seu amor.
    Oratio

    S. Martinho, a piedade, o amor por Nosso Senhor, o zelo pela perfeição, a caridade para com o próximo são uma bela regra de vida. Todas estas virtudes estão interligadas. O desapego e a austeridade são a sua condição, mas é o amor que dá asas à alma para avançar rapidamente pela via da santidade. Grande santo, fazei-me participar no vosso grande amor por Nosso Senhor. Amén. (cf. Leão Dehon, OSP 4, p. 448s.).
    Contemplatio

    A caridade é a virtude caraterística de S. Martinho. É apresentado dando metade do seu manto a um pobre. Foi este grande ato de caridade que lhe ganhou o Coração de Nosso Senhor e que lhe preparou todas as suas graças. Foi um apóstolo infatigável. Percorreu a Gália, convertendo os pagãos pelas suas pregações e pelos seus milagres. Destruía os templos e mandava construir igrejas para os substituir. Na sua bondade, solicitava junto dos príncipes, em Tréveris, o perdão dos criminosos, a liberdade dos cativos, o regresso dos exilados ou o alívio dos pobres e dos infelizes. Sabia persuadir o imperador de que todas estas obras serviam para a sua glória. Ao cair doente, está pronto para retardar a alegria da sua recompensa, se Nosso Senhor ainda o quiser utilizar na terra. Quando os seus discípulos em lágrimas lhe suplicam que os não deixe, dirige a Nosso Senhor esta oração tão conhecida: «Senhor, se sou ainda necessário ao vosso povo, não me recuso a trabalhar. Seja feita a vossa vontade!» Este era o segredo dos seus sucessos apostólicos e dos seus progressos incessantes na virtude: a conformidade à vontade divina em todas as coisas. Esta admirável vida convida-nos ao louvor de Deus, ao reconhecimento e à imitação das virtudes deste amável santo. (Leão Dehon, OSP 4, p. 449).
    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Senhor, se ainda sou necessário ao vosso povo, não me recuso a trabalhar. Seja feita a vossa vontade!" (S. Martinho de Tours).

     

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    S. Martinho de Tours, bispo (11 de Novembro)

  • 32º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    32º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    12 de Novembro, 2023

    Ano A
    32º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    Tema do 32º Domingo do Tempo Comum

    A liturgia do 32º Domingo do Tempo Comum convida-nos à vigilância. Recorda-nos que a segunda vinda do Senhor Jesus está no horizonte final da história humana; devemos, portanto, caminhar pela vida sempre atentos ao Senhor que vem e com o coração preparado para o acolher.
    Na segunda leitura, Paulo garante aos cristãos de Tessalónica que Cristo virá de novo para concluir a história humana e para inaugurar a realidade do mundo definitivo; todo aquele que tiver aderido a Jesus e se tiver identificado com Ele irá ao encontro do Senhor e permanecerá com Ele para sempre.
    O Evangelho lembra-nos que "estar preparado" para acolher o Senhor que vem significa viver dia a dia na fidelidade aos ensinamentos de Jesus e comprometidos com os valores do Reino. Com o exemplo das cinco jovens "insensatas" que não levaram azeite suficiente para manter as suas lâmpadas acesas enquanto esperavam a chegada do noivo, avisa-nos que só os valores do Evangelho nos asseguram a participação no banquete do Reino.
    A primeira leitura apresenta-nos a "sabedoria", dom gratuito e incondicional de Deus para o homem. É um caso paradigmático da forma como Deus se preocupa com a felicidade do homem e põe à disposição dos seus filhos a fonte de onde jorra a vida definitiva. Ao homem resta estar atento, vigilante e disponível para acolher, em cada instante, a vida e a salvação que Deus lhe oferece.

    LEITURA I - Sab 6,12-16

    Leitura do Livro da Sabedoria

    A Sabedoria é luminosa e o seu brilho é inalterável;
    deixa-se ver facilmente àqueles que a amam
    e faz-se encontrar aos que a procuram.
    Antecipa-se e dá-se a conhecer aos que a desejam.
    Quem a busca desde a aurora não se fatigará,
    porque há-de encontrá-la já sentada à sua porta.
    Meditar sobre ela é prudência consumada,
    e quem lhe consagra as vigílias depressa ficará sem cuidados.
    Procura por toda a parte os que são dignos dela:
    aparece-lhes nos caminhos, cheia de benevolência,
    e vem ao seu encontro em todos os seus pensamentos.

    AMBIENTE

    O "Livro da Sabedoria" é o mais recente de todos os livros do Antigo Testamento (aparece durante a primeira metade do séc. I a.C.). O seu autor - um judeu de língua grega, provavelmente nascido e educado na Diáspora (Alexandria?) - exprimindo-se em termos e concepções do mundo helénico, faz o elogio da "sabedoria" israelita, traça o quadro da sorte que espera o justo e o ímpio no mais-além e descreve (com exemplos tirados da história do Êxodo) as sortes diversas que tiveram os pagãos (idólatras) e os hebreus (fiéis a Jahwéh). O seu objectivo é duplo: dirigindo-se aos seus compatriotas judeus (mergulhados no paganismo, na idolatria, na imoralidade), convida-os a redescobrirem a fé dos pais e os valores judaicos; dirigindo-se aos pagãos, convida-os a constatar o absurdo da idolatria e a aderir a Jahwéh, o verdadeiro e único Deus... Para uns e para outros, só Jahwéh garante a verdadeira "sabedoria" e a verdadeira felicidade.
    O texto que nos é proposto pertence à segunda parte do livro (cf. Sab 6,1-9,18). Aí, o autor do livro coloca na boca do rei Salomão (embora o nome do rei nunca seja referido explicitamente) o "elogio da sabedoria". Dirigindo-se aos outros reis, Salomão convida-os a acolher a "sabedoria" (cf. Sab 6,11), pois ela é bela, inalterável e garante a imortalidade e o reinado eterno.
    O que é esta "sabedoria" de que aqui se fala? A "sabedoria" é a arte de bem viver, de ser feliz. Consta de um conjunto de princípios práticos, de normas de comportamento deduzidas da reflexão e da experiência, destinadas a orientar o homem sobre a forma de conduzir-se na vida do dia a dia. O objectivo dessas normas é proporcionar ao homem uma vida harmoniosa, equilibrada, ordenada, cheia de êxitos.
    No entanto, a reflexão israelita acabou por identificar a "sabedoria" com a Torah (Lei de Deus). Ser "sábio" é - para a reflexão judaica da época em que o "Livro da Sabedoria" apareceu - cumprir integralmente os mandamentos da Lei. Na "sabedoria"/Torah, revelada por Jahwéh, está o caminho para ter êxito, para ultrapassar os obstáculos que a vida traz e para ser feliz.
    É neste contexto que devemos entender este convite à "sabedoria".

    MENSAGEM

    A "sabedoria" não é, na perspectiva do autor do texto, algo de misterioso, e de oculto, que o homem tem dificuldade em encontrar... Ela brilha com brilho inalterável e atraente, que prende o olhar de quem a procura. Não é preciso correr atrás dela, com cuidado e fadiga, trilhando caminhos difíceis ou procurando em lugares recônditos e sombrios... Basta sentir interesse por ela, amá-la, desejá-la, que ela imediatamente se fará presente, oferecendo a vida e a felicidade a todos os que anseiam por ela. Quem ama a "sabedoria" facilmente "tropeça" nela, nas circunstâncias mais comuns da vida do dia a dia: à porta da casa, nos caminhos e até na intimidade dos próprios pensamentos... Para que a "sabedoria" ilumine a vida do homem, só é preciso disponibilidade para a acolher.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pode partir dos seguintes dados:

    • A "sabedoria" de que o autor da primeira leitura fala é um dom de Deus para que o homem saiba conduzir a sua vida ao encontro da verdadeira vida e da verdadeira felicidade. Deus não é um adversário do homem, com ciúmes do homem, preocupado em impedir a felicidade e a realização do homem; mas é um Deus cheio de amor, preocupado em proporcionar ao homem todas as possibilidades de ser feliz e de se realizar plenamente. A nossa leitura convida-nos a ver em Deus esse Pai cheio de amor, preocupado com a felicidade dos seus filhos, sempre disposto a oferecer-lhes os seus dons e a conduzi-los para a vida e para a salvação; e convida-nos a uma atenção contínua, a fim de detectarmos e acolhermos esses dons que, a cada instante, Deus nos oferece.

    • O que é decisivo para que o homem tenha acesso pleno aos dons de Deus é a sua disponibilidade para acolher e para aceitar esses dons... Deus coloca os seus dons à disposição do homem, de forma gratuita e incondicional; ao homem é pedido apenas que não se feche no seu egoísmo e na sua auto-suficiência, mas abra o seu coração à graça que Deus lhe oferece.

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 62 (63)

    Refrão: A minha alma tem sede de Vós, meu Deus.

    Senhor, sós o meu Deus: desde a aurora Vos procuro.
    A minha alma tem sede de Vós.
    Por Vós suspiro,
    como terra árida, sequiosa, sem água.

    Quero contemplar-Vos no santuário,
    para ver o vosso poder e a vossa glória.
    A vossa graça vale mais que a vida;
    por isso, os meus lábios
    hão-de cantar-Vos louvores.

    Assim Vos bendirei toda a minha vida
    e em vosso louvor levantarei as mãos.
    Serei saciado com saborosos manjares
    e com vozes de júbilo Vos louvarei.

    Quando no leito Vos recordo,
    passo a noite a pensar em Vós.
    Porque Vos tornastes o meu refúgio,
    exulto à sombra das vossas asas.

    LEITURA II - 1 Tes 4,13-18

    Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Tessalonicenses

    Não queremos, irmãos, deixar-vos na ignorância
    a respeito dos defuntos,
    para não vos contristardes como os outros,
    que não têm esperança.
    Se acreditamos que Jesus morreu e ressuscitou,
    do mesmo modo, Deus levará com Jesus
    os que em Jesus tiverem morrido.
    Eis o que temos para vos dizer,
    segundo a palavra do Senhor:
    Nós, os vivos, os que ficarmos para a vinda do Senhor,
    não precederemos os que tiverem morrido.
    Ao sinal dado, à voz do Arcanjo e ao som da trombeta divina,
    o próprio Senhor descerá do Céu,
    e os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro.
    Em seguida, nós, os vivos, os que tivermos ficado,
    seremos arrebatados juntamente com eles sobre as nuvens,
    para irmos ao encontro do Senhor nos ares,
    e assim estaremos sempre com o Senhor.
    Consolai-vos uns aos outros com estas palavras.

    AMBIENTE

    De acordo com os "Actos dos Apóstolos", Paulo não teve muito tempo para evangelizar os tessalonicenses. Depois de poucas semanas de pregação, um motim habilmente preparado pelos judeus da cidade obrigou-o a deixar precipitadamente Tessalónica, deixando atrás de si uma comunidade cristã fervorosa e entusiasta, mas insuficientemente preparada do ponto de vista catequético (cf. Act 17,1-10). Paulo foi para Bereia, depois para Atenas e Corinto. De Corinto, Paulo enviou Timóteo ao encontro dos tessalonicenses, para verificar como é que a comunidade se estava a aguentar face à hostilidade dos judeus. No regresso a Corinto, Timóteo deu conta a Paulo da situação da comunidade: os tessalonicenses continuavam a viver com entusiasmo a sua fé, embora sentissem algumas dúvidas em questões de fé e de doutrina.
    Um dos problemas teológicos que mais preocupava os tessalonicenses era a questão da parusia (regresso de Jesus, no final dos tempos)... Paulo e as primeiras gerações cristãs acreditavam que esse dia surgiria num espaço de tempo muito curto e que assistiriam ao triunfo final de Jesus. A este propósito os tessalonicenses punham, no entanto, um problema muito prático: qual será a sorte dos cristãos que morrerem antes da segunda vinda de Cristo? Como poderão sair ao encontro de Cristo vitorioso e entrar com ele no Reino de Deus se já estão mortos?
    É então que Paulo escreve aos tessalonicenses, encorajando-os na fé e respondendo às suas dúvidas. Estamos no ano 50 ou 51. O texto que nos é proposto é parte desse esclarecimento sobre a parusia que Paulo incluiu na carta.

    MENSAGEM

    Antes de mais, Paulo confirma aquilo que, provavelmente, já antes havia ensinado aos tessalonicenses: que Cristo virá para concluir a história humana; e que todo aquele que tiver aderido a Cristo e se tiver identificado com Ele, esteja morto ou esteja vivo, encontrará a salvação (vers. 14). Se Cristo recebeu do Pai a vida que não acaba, quem se identifica com Cristo está destinado a uma vida semelhante; a morte não tem poder sobre Ele... Isto deve encher de esperança o cristão, mantendo-o alegre, sereno e cheio de ânimo.
    Como é que se concretizará isso? Como é que aqueles que já morreram assistirão ao triunfo final de Cristo?
    Paulo não é demasiado explícito, pois está consciente que se trata de uma realidade misteriosa, que foge à lógica e à linguagem humanas. De qualquer forma, para descrever a passagem do homem velho para a realidade do homem novo que vive para sempre junto de Deus, Paulo vai recorrer ao género literário "apocalipse", um género literário que utiliza preferentemente a imagem e o símbolo (afinal, a linguagem mais adaptada para expressar uma realidade que nos ultrapassa e que não conseguimos definir e explicar nos seus detalhes). O quadro que Paulo traça é o seguinte: aqueles crentes que entretanto morreram ressuscitarão primeiro ("à voz do arcanjo", "ao som da trombeta de Deus" - elementos típicos da escatologia judaica); depois, em companhia de "nós, os vivos", irão ao encontro do Senhor que vem na sua glória e permanecerão com Ele para sempre.
    Em qualquer caso, o que está aqui em causa não é a definição do quadro fotográfico da última vinda do Senhor... O que Paulo aqui pretende é tranquilizar os tessalonicenses, assegurando-lhes que não haverá qualquer diferença ou discriminação entre os que morreram antes da segunda vinda de Jesus e aqueles que permanecerem vivos até esse instante: uns e outros encontrar-se-ão com o Senhor Jesus, partilharão o seu triunfo e entrarão com ele na glória.

    ACTUALIZAÇÃO

    Na reflexão e partilha, considerar as seguintes questões:

    • A certeza da ressurreição garante-nos que Deus tem um projecto de salvação e de vida para cada homem; e que esse projecto está a realizar-se continuamente em nós, até à sua concretização plena, quando nos encontrarmos definitivamente com Deus.

    • A nossa vida presente não é, pois, um drama absurdo, sem sentido e sem finalidade; é uma caminhada tranquila, confiante - ainda quando feita no sofrimento e na dor - em direcção a esse desabrochar pleno, a essa vida total em que se revelará o Homem Novo.

    • Isso não quer dizer que devamos ignorar as coisas boas deste mundo, vivendo apenas à espera da recompensa futura, no céu; quer dizer que a nossa existência deve ser - já neste mundo - uma busca da vida e da felicidade; isso implicará uma não conformação com tudo aquilo que nos rouba a vida e que nos impede de alcançar a felicidade plena, a perfeição última (a nós e a todos os homens nossos irmãos).

    • Não é possível viver com medo, depois desta descoberta: podemos comprometer-nos na luta pela justiça e pela paz, com a certeza de que a injustiça e a opressão não podem pôr fim à vida que nos anima; e é na medida em que nos comprometemos com esse mundo novo e o construímos com gestos concretos, que estamos a anunciar a ressurreição plena do mundo, dos homens e das coisas.

    ALELUIA - Mt 24,42a.44

    Aleluia. Aleluia.

    Vigiai e estai preparados,
    porque, na hora em que não pensais,
    virá o Filho do homem.

    EVANGELHO - Mt 25,1-13

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

    Naquele tempo,
    Disse Jesus aos seus discípulos a seguinte parábola:
    «O reino dos Céus pode comparar-se a dez virgens,
    que, tomando as suas lâmpadas, foram a
    o encontro do esposo.
    Cinco eram insensatas e cinco eram prudentes.
    As insensatas, ao tomarem as suas lâmpadas,
    não levaram azeite consigo,
    enquanto as prudentes,
    com as lâmpadas, levaram azeite nas almotolias.
    Como o esposo se demorava,
    começaram todas a dormitar e adormeceram.
    No meio da noite ouviu-se um brado:
    'Aí vem o esposo; ide ao seu encontro'.
    Então, as virgens levantaram-se todas
    e começaram a preparar as lâmpadas.
    As insensatas disseram às prudentes:
    'Dai-nos do vosso azeite,
    que as nossas lâmpadas estão a apagar-se'.
    Mas as prudentes responderam:
    'Talvez não chegue para nós e para vós.
    Ide antes comprá-lo aos vendedores'.
    Mas, enquanto foram comprá-lo, chegou o esposo.
    As que estavam preparadas
    entraram com ele para o banquete nupcial;
    e a porta fechou-se.
    Mais tarde, chegaram também as outras virgens e disseram:
    'Senhor, senhor, abre-nos a porta'.
    Mas ele respondeu:
    'Em verdade vos digo: Não vos conheço'.
    Portanto, vigiai, porque não sabeis o dia nem a hora.

    AMBIENTE

    Nos capítulos 24 e 25 do seu Evangelho, Mateus apresenta um quinto e último discurso de Jesus. Para compô-lo, Mateus reelaborou o chamado "discurso escatológico" de Marcos (cf. Mc 13) e ampliou-o com três parábolas e uma impressionante descrição do juízo final.
    Enquanto em Marcos, o "discurso escatológico" se refere, especialmente, aos sinais que precederão a destruição do Templo de Jerusalém, em Mateus o mesmo discurso aborda, sobretudo, o tema da segunda vinda de Jesus e a atitude com que os discípulos devem preparar essa vinda. Esta mudança de perspectiva tem a ver com as necessidades da comunidade de Mateus...
    Estamos nos finais do séc. I (década de 80)... Já tinha passado a "febre escatológica" e os cristãos já não esperavam a vinda iminente de Jesus. Passado o entusiasmo inicial, a vida de fé dos crentes tinha arrefecido e a comunidade tinha-se instalado na rotina, no comodismo, na facilidade... Era preciso algo que abanasse os discípulos e os despertasse de novo para o compromisso com o Evangelho.
    Neste contexto, Mateus descobre que as palavras do "discurso escatológico" de Jesus encerram uma poderosa interpelação; então compõe, com elas, uma exortação dirigida aos cristãos. Fundamentalmente, lembra-lhes que a segunda vinda do Senhor está no horizonte final da história humana; mas enquanto esse acontecimento não se realiza, os crentes são chamados a viver com coerência e entusiasmo a sua fé, fiéis aos ensinamentos de Jesus e comprometidos com a construção do Reino. A isto, a catequese primitiva chama "estar vigilantes, à espera do Senhor que vem".
    A parábola que hoje nos é proposta alude aos rituais típicos dos casamentos judaicos. De acordo com os costumes, a cerimónia do casamento começava com a ida do noivo a casa da noiva, para levá-la para a sua nova casa. Normalmente, o noivo chegava atrasado, pois devia, antes, discutir com os familiares da noiva os presentes que ofereceria à família da sua amada. As negociações entre as duas partes eram demoradas e tinham uma importante função social... Os parentes da noiva deviam mostrar-se exigentes, sugerindo dessa forma que a família perdia algo de muito precioso ao entregar a menina a outra família; por outro lado, o noivo e os seus familiares ficavam contentes com as exigências, pois dessa forma mostravam aos vizinhos e conhecidos o valor e a importância dessa mulher que entrava na sua família. Os que testemunhavam o acordo, estavam prontos para ir avisar a noiva de que as negociações estavam concluídas e o noivo ia chegar... Enquanto isso, a noiva, vestida a preceito, esperava em casa do seu pai que o noivo viesse ao seu encontro. As amigas da noiva esperavam também, com as lâmpadas acesas, para acompanhar a noiva, entre danças e cânticos, à sua nova casa. Era aí que tinha lugar a festa do casamento.
    É este pano de fundo que a nossa parábola supõe.

    MENSAGEM

    A "parábola das dez virgens", tal como saiu da boca de Jesus, era uma "parábola do Reino" (vers. 1: "o Reino dos céus pode comparar-se..."). O Reino de Deus é, aqui, comparado com uma das celebrações mais alegres e mais festivas que os israelitas conheciam: o banquete de casamento. As dez jovens, representam a totalidade do Povo de Deus, que espera ansiosamente a chegada do messias (o noivo)... Uma parte desse Povo (as jovens previdentes) está preparada e, quando o messias finalmente aparece, pode entrar a fazer parte da comunidade do Reino; outra parte (as jovens descuidadas) não está preparada e não pode entrar na comunidade do Reino.
    A parábola original constituía, pois, um apelo aos israelitas no sentido de não perderem a oportunidade de participar na grande festa do Reino.
    Algumas dezenas de anos depois, Mateus retomou a mesma parábola, adaptando-a às necessidades da comunidade. A parábola foi, então, convertida numa exortação a estar preparado para a vinda do Senhor, a qual pode acontecer no momento menos esperado. A festa é, neste novo contexto, a segunda vinda de Jesus. O noivo que está para chegar é Jesus. As dez jovens representam a Igreja que, experimentando na história as dificuldades e as perseguições, anseia pela chegada da libertação definitiva. Uma parte da Igreja (as jovens previdentes) está preparada, vigilante, atenta e, quando o "noivo" chega, pode entrar no banquete da vida eterna; a outra parte (as jovens descuidadas) não está preparada, porque apostou nos valores do mundo, guiou a sua vida por eles e esqueceu os valores do Reino.
    O que é que significa, na perspectiva de Mateus, "estar preparado para acolher a vinda do Senhor"? Significa, escutar as palavras de Jesus, acolhê-las no coração e viver de forma coerente com os valores do Evangelho... "Estar preparado" significa, fundamentalmente, viver na fidelidade aos projectos do Pai e amar os irmãos até ao dom da vida, em todos os instantes da nossa existência.
    A mensagem que Mateus pretende transmitir com esta parábola aos cristãos da sua comunidade (e, no fundo, aos cristãos de todas as comunidades cristãs de todos os tempos e lugares) é esta: nós os crentes, não podemos afrouxar a vigilância e enfraquecer o nosso compromisso com os valores do Reino. Com o passar do tempo, as nossas comunidades têm tendência para se instalar no comodismo, no adormecimento, no descuido, numa vida de fé que não compromete, numa religião de "meias tintas" e de facilidade, num testemunho pouco empenhado e pouco coerente... É preciso, no entanto, que o nosso compromisso com Jesus se renove cada dia. A certeza de que Ele vem outra vez, deve impulsionar-nos a um compromisso activo com os valores do Evangelho, na fidelidade aos ensinamentos de Jesus e ao compromisso com o Reino.

    ACTUALIZAÇÃO

    Considerar as seguintes questões:

    • Nós, os cristãos do séc. XXI, não somos significativamente diferentes dos cristãos que integravam a comunidade de Mateus... Também percorremos um caminho de altos e baixos, em que os momentos de entusiasmo e de compromisso alternam com os momentos de instalação, de comodismo, de adormecimento, de pouco empenho. As dificuldades da caminhada, os apelos do mundo, a monotonia, a nossa fragilidade levam-nos, frequentemente, a esquecer os valores do Reino e a correr atrás de valores efémeros, que parecem garantir-nos a felicidade e só nos arrastam para caminhos de escravidão e de frustração. O Evangelho deste domingo lembra-nos que a segunda vinda do Senhor deve estar sempre no horizonte final da nossa existência e que não podemos alienar os valores do Evangelho, pois só eles nos mantêm identificados com esse Senhor Jesus que há-de voltar para nos oferecer a vida plena e definitiva. Enquanto caminhamos nesta terra devemos, pois, manter-nos atentos e vigilantes, fiéis aos ensinamentos de Jesus e comprometidos com esse Reino que Ele nos mandou construir.

    • "Estar preparado" não significa, contudo, ter a "alminha" limpa e sem mancha, para que, quando nos encontrarmos com o Senhor, Ele não tenha nenhuma falta não confessada a apontar-nos e nos leve para o céu... Mas significa, sobretudo, vivermos dia a dia, de forma comprometida e entusiasta, o nosso compromisso baptismal. "Estar preparado" passa por descobrirmos dia a dia os projectos de Deus para nós e para o mundo e procurar concretizá-los, com alegria e entusiasmo; "estar preparado" passa por fazermos da nossa vida, em cada instante, um dom aos irmãos, no serviço, na partilha, no amor, ao jeito de Jesus.

    • Embora o nosso texto se refira, primordialmente, ao nosso encontro final com Jesus, todos nós temos consciência de que esse momento não será o nosso único encontro com o Senhor... Jesus vem ao nosso encontro todos os dias e reclama o nosso empenho e o nosso compromisso na construção de um mundo novo - o mundo do Reino. Ele faz ecoar o seu apelo na Palavra de Deus que nos questiona, na miséria de um pobre que nos interpela, no pedido de socorro de um homem escravizado, na solidão de um velho carente de amor e de afecto, no sofrimento de um doente terminal abandonado por todos, no grito aflito de quem sofre a injustiça e a violência, no olhar dolorido de um imigrante, no corpo esquelético de uma criança com fome, nas lágrimas do oprimido... O Evangelho deste domingo avisa-nos que não podemos instalar-nos no nosso egoísmo e na nossa auto-suficiência e recusar-nos a escutar os apelos do Senhor.

    • A história das jovens "insensatas" que se esqueceram do essencial faz-nos pensar na questão das prioridades... É fácil irmos "na onda", preocuparmo-nos com o imediato, o visível, o efémero (o dinheiro, o poder, a influência, a imagem, o êxito, a beleza, os triunfos humanos...) e negligenciarmos os valores autênticos. Mateus, com algum dramatismo, avisa-nos que só os valores do Evangelho nos asseguram a participação no banquete do Reino. O objectivo da catequese de Mateus não é dizer-nos que, se não nos portarmos bem, Deus nos castiga com o inferno; mas é alertar-nos para a seriedade com que devemos avaliar as nossas opções, de forma a não perdermos oportunidades para nos realizarmos e para chegarmos à felicidade plena e definitiva.

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 32º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A LITURGIA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 32º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa...

    2. DURANTE A CELEBRAÇÃO.
    É através do canto da anamnese, em particular, que a nossa espera do Senhor é cantada e proclamada. Hoje, este cântico deveria ser particularmente cuidado. Além disso, podemos realçar a dimensão da espera preparando uma faixa com as palavras: "Esperamos a vossa vinda na glória".

    3. PALAVRA DE VIDA.
    Acontece-nos sermos apanhados pelo sono, quando a noite se prolonga ou quando a fadiga se faz sentir. Quem pode recriminar-nos por isso? Assim, ninguém critica as jovens convidadas para o banquete por terem adormecido: o esposo tardava em chegar. Ao contrário, o que distingue estas jovens é que algumas eram insensatas, descuidadas, imprevidentes, e as outras, sensatas, previdentes, prudentes. Com efeito, é antes de adormecer que é preciso vigiar, prever, de maneira a estarmos prontos para o encontro, e não sermos apanhados desprevenidos, sem nada preparado, e sobretudo sem o essencial. Arriscamos faltar ao encontro...

    4. UM PONTO DE ATENÇÃO.
    Celebrar à volta do mesmo cântico... De vez em quando, é conveniente unificar a celebração à volta de um mesmo cântico. Os textos de hoje sublinham uma atitude de disponibilidade para com Deus, o desejo de encontrar Deus, a espera da sua vinda. Na primeira leitura, a Sabedoria é o próprio Deus que é preciso procurar desde a aurora, e quem vem à nossa frente. O salmo exprime o mesmo desejo em forma de oração. O Evangelho convida a guardar a lâmpada sempre acesa, etc. Podemos escolher um cântico relacionado com este tema, mesmo se não segue à letra a expressão do tema. Pode-se começar o cântico antes da primeira leitura, retomar outras estrofes depois do Evangelho, e outras ainda no momento de acção de graças.

    5. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE...
    Visitar alguém, encontrar-se... Comprometer-se a visitar uma pessoa que tenha necessidade de "reconforto" (chegada de novo, doente, só)... Aqueles que quiserem poderão encontrar-se para uma simples partilha sobre as suas dificuldades actuais...

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • S. Gertrudes, Virgem

    S. Gertrudes, Virgem


    16 de Novembro, 2023

    Santa Gertrudes nasceu no dia 6 de Janeiro de 1256, festa da Epifania, mas nada se sabe dos seus pais, nem do lugar do seu nascimento. Entrou no mosteiro com cinco anos, em 1261, como era costume naquela época, para a formação e o estudo. Ali transcorreu toda a sua existência. Adquiriu vasta cultura e entregou-se à vida contemplativa. Foi uma das maiores místicas da Idade Média. As suas obras estão na base da difusão do culto do Sagrado Coração de Jesus. É uma das padroeiras da Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus, Dehonianos.
    Lectio
    Primeira leitura: Efésios 3, 14-19

    Irmãos: Eu dobro os joelhos diante do Pai, 15do qual recebe o nome toda a família, nos céus e na terra: 16que Ele vos conceda, de acordo com a riqueza da sua glória, que sejais cheios de força, pelo seu Espírito, para que se robusteça em vós o homem interior; 17que Cristo, pela fé, habite nos vossos corações; que estejais enraizados e alicerçados no amor, 18para terdes a capacidade de apreender, com todos os santos, qual a largura, o comprimento, a altura e a profundidade... 19a capacidade de conhecer o amor de Cristo, que ultrapassa todo o conhecimento, para que sejais repletos, até receberdes toda a plenitude de Deus.

    Depois de ter anunciado as maravilhas de Deus, Paulo irrompe numa oração vibrante de amor. Ajoelha diante do Pai, origem de toda a paternidade no céu e na terra (v. 15), e pede-lhe que os Efésios sejam fortificados interiormente pelo Espírito Santo (v. 16). No fundo, pede para eles uma fé robusta, para que Cristo habite nos seus corações e, desse modo, cresça neles o sinal típico de pertença a Cristo: a caridade. O Apóstolo sabe que, só quando estiverem «enraizados e alicerçados no amor» (v. 17), em comunhão com os outros crentes, serão capazes de compreender «a largura, o comprimento, a altura e a profundidade» daquele amor que ultrapassa todas as categorias humanas (v. 18). Assim é porque é de Deus e só com a força de Deus podemos realizar a nossa vocação: receber «a plenitude de Deus» (v. 19). Com entusiasmo, Paulo louva a Deus porque é capaz de realizar maravilhas muito maiores do que possamos pensar e desejar. Sentimos em todo o texto que o conhecimento do mistério de Deus não é fruto do nosso esforço intelectual, mas de amor admirado, que brota de uma atitude profundamente interior e contemplativa.
    Evangelho: da féria ou do Comum
    Meditatio

    Santa Gertrudes, a Grande, é uma das místicas mais famosas... Com a sua vida e pensamento, ela incidiu de modo singular sobre a espiritualidade cristã. É uma mulher extraordinária, dotada de particulares talentos naturais e de excecionais dons de graça, de humildade profundíssima e de zelo ardente pela salvação do próximo, de íntima comunhão com Deus na contemplação e de prontidão no socorro aos necessitados...
    Entra no mosteiro com cinco anos, em 1261, como era costume naquela época, para a formação e o estudo. Ali transcorre toda a sua existência... Gertrudes é uma estudante extraordinária... Fascinada pelo saber, dedica-se ao estudo profano com fervor e tenacidade, alcançando êxitos escolares para além de qualquer expectativa... A literatura, a música, o canto e a arte da miniatura conquistam-na; tem uma índole forte, decidida, imediata e impulsiva; diz com frequência que é negligente; reconhece os seus defeitos e pede humildemente perdão pelos mesmos. Com humildade, pede conselhos e orações pela sua conversão. Há características do seu temperamento e defeitos que a acompanham até ao fim, a ponto de causar admiração a certas pessoas que se interrogam como o Senhor a prefere tanto. Como estudante, passa a consagrar-se totalmente a Deus na vida monástica e, durante vinte anos, não acontece nada de extraordinário: o estudo e a oração são a sua atividade principal... A 27 de Janeiro de 1281, poucos dias antes da festa da Purificação da Virgem, por volta da hora das Completas, à noite, o Senhor ilumina as suas densas trevas. Com suavidade e docilidade, acalma a inquietação que a angustia. Gertrudes vê nessa inquietação como que um dom do próprio Deus, «para abater aquela torre de vaidade e de curiosidade que, apesar do nome e do hábito de religiosa, eu ia erguendo com a minha soberba, para assim encontrares o modo para me mostrar a tua salvação» (Ibid., II, 1, p. 87). Gertrudes tem a visão de um jovem que a leva a superar o enredo de espinhos que oprime a sua alma, guiando-a pela mão. Naquela mão, «o traço precioso daquelas chagas que ab-rogaram todos os atos de acusação dos nossos inimigos» (Ibid., II, 1, p. 89), reconhece Aquele que, na Cruz, nos salvou com o seu sangue, Jesus.
    A partir daquele momento, a sua vida de íntima comunhão com o Senhor intensifica-se... mesmo quando, doente, não podia ir ao coro...A sua biógrafa indica dois rumos daquela que poderíamos definir uma sua particular «conversão»: nos estudos, com a passagem radical dos estudos humanísticos profanos para os teológicos e, na observância monástica, com a passagem da vida que ela define negligente para a vida de oração intensa e mística, com um ardor missionário extraordinário. O Senhor, que a tinha escolhido desde o seio materno e desde criança a tinha levado a participar no banquete da vida monástica, chama-a com a sua graça «das coisas externas para a vida interior e das ocupações terrenas para o amor das realidades espirituais». Gertrudes compreende que está distante dele, na região da dissemelhança, como ela diz com Santo Agostinho; que se tinha dedicado com demasiada avidez aos estudos liberais, à sabedoria humana, descuidando a ciência espiritual, privando-se do gosto da verdadeira sabedoria; agora é conduzida para o monte da contemplação, onde deixa o homem velho para se revestir do novo. Gertrudes transforma tudo isto em apostolado: dedica-se a escrever e divulgar a verdade de fé com clareza e simplicidade, graça e persuasão, servindo a Igreja com amor e fidelidade, a ponto de ser útil e agradável aos teólogos e às pessoas piedosas. Resta-nos pouco desta sua intensa atividade, também por causa das vicissitudes que levaram à destruição do mosteiro de Helfta. Além do Arauto do amor divino ou das Revelações, dispomos ainda dos Exercícios espirituais, uma joia rara da literatura mística espiritual... Orientada para a comunhão sem fim, conclui a sua vicissitude terrena no dia 17 de Novembro de 1301, ou 1302, com cerca de 46 anos. (Extratos da catequese do Santo Padre Bento XVI, na Praça de S. Pedro, a 6 de Outubro de 2010).

    Oratio

    Rezemos com Santa Gertrudes: "Ó Jesus, Tu que me és imensamente querido, está sempre comigo, para que o meu coração permaneça contigo e o teu amor persevere comigo, sem possibilidade de separação, e o meu trânsito seja abençoado por ti, de tal modo que o meu espírito, livre dos vínculos da carne, possa encontrar repouso imediatamente em ti. Amém! (Exercícios Espirituais).
    Contemplatio

    «Eu vos adoro, vos saúdo e vos bendigo, ó doce Senhor Jesus Cristo, agradecendo-vos pelo amor com o qual vós quisestes, para nos resgatar, vós o Criador de todas as coisas, ser agarrado pelos homens, ligado, arrastado, pisado aos pés, batido, coberto de escarros, flagelado, coroado de espinhos, condenado, carregado com a cruz, despojado, crucificado, para morrer da mais amarga das mortes e ser traspassado com a lança. E em união com este mesmo amor, ofereço-vos as minhas indignas orações, suplicando-vos pelos méritos da vossa santíssima paixão e da vossa morte, que vos digneis lavar inteiramente e apagar todos os meus pecados com os quais as almas pelas quais eu rezo se macularam, por pensamentos, por palavras ou por ações. Conjuro-vos a oferecer a Deus Pai, por todas as penas nas quais estas almas incorreram perante a vossa justiça, todas as penas e as dores, os méritos e as ações do vosso corpo coberto de feridas e da vossa alma abismada de dores. Assim seja». (Oração de Santa Gertrudes citada pelo Leão Dehon, in OSP 4, p. 425s.).
    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Cristo, pela fé, habite nos vossos corações" (Ef 3, 17).

     

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    S. Gertrudes, Virgem (16 de Novembro)

  • 33º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    33º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    19 de Novembro, 2023

    Ano A
    33º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    Tema do 33º Domingo do Tempo Comum

    A liturgia do 33º Domingo do Tempo Comum recorda a cada cristão a grave responsabilidade de ser, no tempo histórico em que vivemos, testemunha consciente, activa e comprometida desse projecto de salvação/libertação que Deus Pai tem para os homens.
    O Evangelho apresenta-nos dois exemplos opostos de como esperar e preparar a última vinda de Jesus. Louva o discípulo que se empenha em fazer frutificar os "bens" que Deus lhe confia; e condena o discípulo que se instala no medo e na apatia e não põe a render os "bens" que Deus lhe entrega (dessa forma, ele está a desperdiçar os dons de Deus e a privar os irmãos, a Igreja e o mundo dos frutos a que têm direito).
    Na segunda leitura, Paulo deixa claro que o importante não é saber quando virá o Senhor pela segunda vez; mas é estar atento e vigilante, vivendo de acordo com os ensinamentos de Jesus, testemunhando os seus projectos, empenhando-se activamente na construção do Reino.
    A primeira leitura apresenta, na figura da mulher virtuosa, alguns dos valores que asseguram a felicidade, o êxito, a realização. O "sábio" autor do texto propõe, sobretudo, os valores do trabalho, do compromisso, da generosidade, do "temor de Deus". Não são só valores da mulher virtuosa: são valores de que deve revestir-se o discípulo que quer viver na fidelidade aos projectos de Deus e corresponder à missão que Deus lhe confiou.

    LEITURA I - Prov 31,10-13.19-20.30-31

    Leitura do Livro dos Provérbios

    Quem poderá encontrar uma mulher virtuosa?
    O seu valor é maior que o das pérolas.
    Nela confia o coração do marido,
    e jamais lhe falta coisa alguma.
    Ela dá-lhe bem-estar e não desventura,
    em todos os dias da sua vida.
    Procura obter lã e linho
    e põe mãos ao trabalho alegremente.
    Toma a roca em suas mãos, seus dedos manejam o fuso.
    Abre as mãos ao pobre e estende os braços ao indigente.
    A graça é enganadora e vã a beleza;
    a mulher que teme o Senhor é que será louvada.
    Dai-lhe o fruto das suas mãos,
    e suas obras a louvem às portas da cidade.

    AMBIENTE

    O "Livro dos Provérbios" apresenta várias colecções de ditos, de sentenças, de máximas, de provérbios ("mashal") onde se cristaliza o resultado da reflexão e da experiência ("sabedoria") de várias gerações de "sábios" antigos (israelitas e alguns não israelitas). O objectivo desses provérbios é definir uma espécie de "ordem" do mundo e da sociedade que, uma vez apreendida e aceite pelo indivíduo, o levará a uma integração plena no meio em que está inserido. Dessa forma, o indivíduo poderá viver sem traumas nem sobressaltos que destruam a sua harmonia interior e o incapacitem para dar o seu contributo à comunidade. Ficará, assim, de posse da chave para viver em harmonia consigo mesmo e com os outros, e assegurará uma vida feliz, tranquila e próspera.
    O livro apresenta-se como tendo sido composto por Salomão (cf. Prov 1,1), o rei "sábio", conhecido pelos seus dotes de governação, pelos seus dons literários, por numerosas sentenças sábias (cf. 1 Re 3,16-28; 5,7; 10,1-9.23) e que se tornou uma espécie de "padrão" da tradição sapiencial... Na realidade, não podemos aceitar, de forma acrítica, essa indicação: a leitura atenta do livro revela que estamos diante de colecções de proveniência diversa, compostas em épocas diversas. Alguns dos materiais apresentados no livro podem ser do séc. X a.C. (época de Salomão; no entanto, isso não implica que venham do próprio Salomão); outros, no entanto, são bem mais recentes.
    O texto que nos é hoje proposto aparece no final do Livro dos Provérbios. Apresenta-se literariamente como um "poema alfabético" (poema em que a primeira letra de cada verso segue a ordem das letras do alfabeto: a primeira palavra do primeiro verso começa com a letra "alef", a primeira palavra do segundo verso começa com a letra "bet" e assim sucessivamente). Tema do poema: a mulher virtuosa.
    Provavelmente, o Livro dos Provérbios foi usado como manual para a formação de jovens que frequentavam as escolas de "sabedoria". Este poema, situado no final do livro, poderia ser a "instrução final": antes de abandonar a escola e depois de haver assimilado os ensinamentos dos "sábios", o aluno era instruído acerca da eleição da esposa.

    MENSAGEM

    Quais são então, na perspectiva dos "sábios" de Israel, as características da mulher virtuosa?
    Antes de mais, é a mulher que gere bem a casa e não deixa que nada falte. Ao constatar a boa ordem em que tudo caminha, por acção da esposa, o coração do marido descansa e confia (vers. 11-12).
    Depois, é a mulher diligente, que trabalha a lã e o linho para que os seus familiares tenham agasalhos suficientes e que se encarrega de todos os trabalhos domésticos (vers. 13 e 19).
    É, ainda, a mulher de coração generoso, que tem piedade do infeliz e que partilha generosamente o fruto do seu trabalho com o pobre que pede auxílio (vers. 20).
    É, finalmente, a mulher que não se preocupa com a sua aparência, mas se preocupa em viver no temor do Senhor. Viver no "temor do Senhor" significa respeitar os mandamentos, obedecer a Jahwéh, aceitar com humildade e confiança a sua vontade, os seus planos e os seus projectos (vers. 30-31).
    O retrato da mulher aqui esboçado está muito longe da noiva/esposa do Cântico dos Cânticos, que oferece ao amado a sua presença, o seu corpo e o seu amor. O ideal de mulher aqui apresentado é o da mãe de família que dirige com eficiência, com dedicação e com empenho a sua casa rural e que é co-responsável com o marido na administração da casa, dos bens e da propriedade.

    ACTUALIZAÇÃO

    Considerar as seguintes questões:

    • Mais do que uma mulher virtuosa ideal, o "sábio" autor do texto que nos é proposto exalta todos aqueles - mulheres e homens - que conduzem a sua vida de acordo com os valores do trabalho, do empenho, do compromisso, da generosidade, do "temor de Deus". São estes valores, na opinião do autor, que nos asseguram uma vida feliz, tranquila e próspera. Numa época em que a cultura do "deixa andar", da desresponsabilização, do egoísmo se afirma cada vez mais, este texto constitui uma poderosa interpelação... Na verdade, por que caminhos é que chegamos à vida e à felicidade?

    • O nosso texto sugere também uma reflexão sobre as nossas prioridades... Da mulher virtuosa diz-se que não se preocupa com os valores efémeros (a aparência), mas que se
    preocupa com os valores eternos (o "temor de Deus"). Quais são as prioridades da nossa vida? Quais são os valores em que apostamos a nossa existência? Os nossos valores fundamentais são valores que nos trazem felicidade duradoura?

    • A referência à generosidade para com o pobre e o necessitado é questionante... Como é que consideramos e tratamos aqueles irmãos que nos batem à porta, a pedir um pedaço de pão, um pouco de atenção, ou ajuda para deslindar um qualquer problema burocrático? Temos o coração aberto aos irmãos e pronto para ajudar, ou fechamo-nos à caridade, à partilha, ao dom?

    • A referência ao "temor de Deus" como valor primordial na vida da mulher ou do homem "sábio" e virtuoso também merece a nossa consideração. No Antigo Testamento, o "temor de Deus" é a qualidade do homem ou da mulher que ama Deus, que procura conhecer os seus planos e projectos e que cumpre - com obediência radical e com total confiança - a vontade de Deus. Esta dependência de Deus - diz-nos um "sábio" de Israel - não diminui a nossa liberdade, nem atenta contra a nossa realização; pelo contrário, é condição essencial para a realização plena do homem.

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 127

    Refrão: Ditoso o que segue o caminho do Senhor.

    Feliz de ti que temes o Senhor
    e andas nos seus caminhos.
    Comerás do trabalho das tuas mãos,
    serás feliz e tudo te correrá bem.

    Tua esposa será como videira fecunda,
    no íntimo do teu lar;
    teus filhos serão como ramos de oliveira,
    ao redor da tua mesa.

    Assim será abençoado o homem que teme o Senhor.
    De Sião te abençoe o Senhor:
    vejas a prosperidade de Jerusalém,
    todos os dias da tua vida.

    LEITURA II - 1 Tes 5,1-6

    Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Tessalonicenses

    Irmãos:
    Sobre o tempo e a ocasião, não precisais que vos escreva,
    pois vós próprios sabeis perfeitamente
    que o dia do Senhor vem como um ladrão nocturno.
    E quando disserem: «Paz e segurança»,
    é então que subitamente cairá sobre eles a ruína,
    como as dores da mulher que está para ser mãe,
    e não poderão escapar.
    Mas vós, irmãos, não andeis nas trevas,
    de modo que esse dia vos surpreenda como um ladrão,
    porque todos vós sois filhos da luz e filhos do dia:
    nós não somos da noite nem das trevas.
    Por isso, não durmamos como os outros,
    mas permaneçamos vigilantes e sóbrios.

    AMBIENTE

    Já vimos, no passado domingo, que um dos problemas fundamentais para os tessalonicenses residia na compreensão dos acontecimentos ligados à parusia (regresso de Jesus, no final dos tempos).
    Paulo e as primeiras gerações cristãs acreditavam que o "dia do Senhor" (o dia da intervenção definitiva de Deus na história, para derrotar os maus e para conduzir os bons à vida plena e definitiva) surgiria num espaço de tempo muito curto e que os membros da comunidade ainda assistiriam ao triunfo final de Jesus. No entanto, os dias foram passando e, provavelmente, faleceu algum membro da comunidade. Por isso, os tessalonicenses perguntavam: qual será a sorte dos cristãos que morreram antes da segunda vinda de Cristo? Como poderão eles sair ao encontro de Cristo vitorioso e entrar com Ele no Reino de Deus se já estão mortos?
    A estas questões Paulo respondeu já no texto que nos foi proposto no passado domingo... Mas, no texto de hoje, Paulo continua a sua reflexão sobre o "dia em que o Senhor virá" e sobre a forma como os cristãos o devem preparar.

    MENSAGEM

    A primeira questão que o nosso texto põe é a da eventual data do "dia do Senhor". Paulo tem alguma indicação concreta acerca disso? É possível prever uma data?
    Não. Paulo está convicto de que esse acontecimento se dará proximamente; no entanto, a data exacta continua desconhecida e imprevista.
    Por isso, os crentes devem estar atentos para não serem surpreendidos. Para descrever a "surpresa de Deus", Paulo utiliza duas imagens bem significativas: Deus surpreende-nos como um ladrão que chega de noite, quando ninguém está à espera (vers. 2); e Deus é como as dores de parto que surgem de repente (vers. 3). Em consequência, a vida cristã deve estar marcada por uma atitude de preparação e de vigilância.
    Para além da questão da data, o que é importante é que os cristãos vivam de forma coerente com a opção que fizeram no dia do seu Baptismo. Os crentes têm de viver de maneira diferente dos não crentes, pois os horizontes de uns e de outros são diferentes... Os não crentes vivem mergulhados na noite e nas trevas, estão adormecidos, atordoam-se com a bebida; vivem no presente, absolutamente despreocupados em relação ao futuro, de olhos postos no horizonte terreno. Os crentes são filhos da luz e do dia, estão vigilantes, mantêm-se sóbrios; vivem de olhos postos no futuro, à espera que chegue a vida verdadeira, plena, definitiva que Deus lhes vai oferecer.
    Na verdade, a vida dos crentes é mais bela e significativa, porque está cheia de esperança. No entanto, é preciso dar corpo à esperança esperando, fiéis e vigilantes a chegada do Senhor.

    ACTUALIZAÇÃO

    Na reflexão, ter em conta os seguintes dados:

    • A questão fundamental que os cristãos devem pôr, a propósito da segunda vinda do Senhor, não é a questão da data, mas é a questão de como esperar e preparar esse momento. Paulo deixa claro que o que é preciso é estar vigilante. "Estar vigilante" não significa ficar a olhar para o céu à espera do Senhor, esquecendo e negligenciando as questões do mundo e os problemas dos homens; mas significa viver, no dia a dia, de acordo com os ensinamentos de Jesus, empenhando-se na transformação do mundo e na construção do Reino.

    • A certeza da segunda vinda do Senhor dá aos crentes uma perspectiva diferente da vida, do seu sentido e da sua finalidade... Para os não crentes, a vida encerra-se dentro dos limites estreitos deste mundo e, por isso, só interessam os valores deste mundo; para os crentes, a verdadeira vida, a vida em plenitude, está para além dos horizontes da história e, por isso, é preciso viver de acordo com os valores eternos, os valores de Deus. Assim, na perspectiva dos crentes, não são os valores efémeros, os valores deste mundo (o dinheiro, o poder, os êxitos humanos) que devem constituir a prioridade e que devem dominar a existência, mas sim os valores de Deus. Quais são os valores que eu considero prioritários e que condicionam as minhas opções?

    • A certeza da segunda vinda do Senhor aponta também no sentido da esperança. Os cristãos esperam, em s
    erena expectativa, a salvação que já receberam antecipadamente com a morte de Cristo, mas que irá consumar-se no "dia do Senhor". Os crentes são, pois, homens e mulheres de esperança, abertos ao futuro - um futuro a conquistar, já nesta terra, com fé e com amor, mas sobretudo um futuro a esperar, como dom de Deus.

    ALELUIA - Jo 15,4a.5b

    Aleluia. Aleluia.

    Permanecei em Mim e Eu permanecerei em vós, diz o Senhor.
    Quem permanece em Mim dá fruto abundante.

    EVANGELHO - Mt 25,14-30

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

    Naquele tempo,
    Disse Jesus aos seus discípulos a seguinte parábola:
    «Um homem, ao partir de viagem,
    chamou os seus servos e confiou-lhes os seus bens.
    A um entregou cinco talentos, a outro dois e a outro um,
    conforme a capacidade de cada qual; e depois partiu.
    O que tinha recebido cinco talentos
    fê-los render e ganhou outros cinco.
    Do mesmo modo,
    o que recebera dois talentos ganhou outros dois.
    Mas, o que recebera dois talentos ganhou outros dois.
    Mas, o que recebera um só talento
    foi escavar na terra e escondeu o dinheiro do seu senhor.
    Muito tempo depois, chegou o senhor daqueles servos
    e foi ajustar contas com eles.
    O que recebera cinco talentos aproximou-se
    e apresentou outros cinco, dizendo:
    'Senhor, confiaste-me cinco talentos:
    aqui estão outros cinco que eu ganhei'.
    Respondeu-lhe o senhor: 'Muito bem, servo bom e fiel.
    Porque foste fiel em coisas pequenas, confiar-te-ei as grandes.
    Vem tomar parte na alegria do teu senhor'.
    Aproximou-se também o que recebera dois talentos e disse:
    'Senhor, confiaste-me dois talentos:
    aqui estão outros dois que eu ganhei'.
    Respondeu-lhe o senhor: 'Muito bem, servo bom e fiel.
    Porque foste fiel em coisas pequenas, confiar-te-ei as grandes.
    Vem tomar parte na alegria do teu senhor'.
    Aproximou-se também o que recebera um só talento e disse:
    'Senhor, eu sabia que és um homem severo,
    que colhes onde não semeaste e recolhes onde nada lançaste.
    Por isso, tive medo e escondi o teu talento na terra.
    Aqui tens o que te pertence'.
    O senhor respondeu-lhe: 'Servo mau e preguiçoso,
    sabias que ceifo onde não semeei e recolho onde nada lancei;
    devias, portanto, depositar no banco o meu dinheiro
    e eu teria, ao voltar, recebido com juro o que era meu.
    Tirai-lhe então o talento e dai-o àquele que tem dez.
    Porque, a todo aquele que tem,
    dar-se-á mais e terá em abundância;
    mas, àquele que não tem, até o pouco que tem lhe será tirado.
    Quanto ao servo inútil, lançai-o às trevas exteriores.
    Aí haverá choro e ranger de dentes'».

    AMBIENTE

    Mais uma vez, o Evangelho apresenta-nos um extracto do "discurso escatológico" (cf. Mt 24-25), onde Mateus aborda o tema da segunda vinda de Jesus e define a atitude com que os discípulos devem esperar e preparar essa vinda.
    A catequese que Mateus apresenta neste discurso tem em conta as necessidades da sua comunidade cristã. Estamos no final do séc. I (década de 80). Os cristãos, fartos de esperar a segunda vinda de Jesus, esqueceram o seu entusiasmo inicial... Instalaram-se na mediocridade, na rotina, no comodismo, na facilidade. As perseguições que se adivinham provocam o desânimo e a deserção... Era preciso reaquecer o entusiasmo dos crentes, redespertar a fé, renovar o compromisso cristão com Jesus e com a construção do Reino.
    É para responder a este contexto que Mateus reelabora o "discurso escatológico" de Marcos (cf. Mc 13) e compõe, com ele, uma exortação dirigida aos cristãos. Lembra-lhes que a segunda vinda do Senhor está no horizonte final da história humana; e que, até lá, os crentes devem "pôr a render os seus talentos", vivendo na fidelidade aos ensinamentos de Jesus e comprometidos com a construção do Reino.
    A parábola que hoje nos é proposta fala de "talentos" que um senhor distribuiu pelos servos. Um "talento" significa uma quantia muito considerável... Corresponde a cerca de 36 quilos de prata e ao salário de aproximadamente 3.000 dias de trabalho de um operário não qualificado.

    MENSAGEM

    A "parábola dos talentos" conta que um "senhor" partiu em viagem e deixou a sua fortuna nas mãos dos seus servos. A um, deixou cinco talentos, a outro dois e a outro um. Quando voltou, chamou os servos e pediu-lhes contas da sua gestão. Os dois primeiros tinham duplicado a soma recebida; mas o terceiro tinha escondido cuidadosamente o talento que lhe fora confiado, pois conhecia a exigência do "senhor" e tinha medo. Os dois primeiros servos foram louvados pelo "senhor", ao passo que o terceiro foi severamente criticado e condenado.
    Provavelmente a parábola, tal como saiu da boca de Jesus, era uma "parábola do Reino". O amo exigente seria Deus, que reclama para Si uma lealdade a toda a prova e que não aceita meias tintas e situações de acomodação e de preguiça. Os servos a quem Ele confia os valores do Reino devem acolher os seus dons e pô-los a render, a fim de que o Reino seja uma realidade. No Reino, ou se está completamente comprometido, ou não se está.
    Depois, Mateus pegou na mesma parábola e situou-a num outro contexto: o da vinda do Senhor Jesus, no final dos tempos... A vinda do Senhor é uma certeza; e, quando Ele voltar, julgará os homens conforme o comportamento que tiverem assumido na sua ausência.
    Nesta versão da parábola, o "senhor" é Jesus que, antes de deixar este mundo, entregou bens consideráveis aos seus "servos" (os discípulos). Os "bens" são os dons que Deus, através de Jesus, ofereceu aos homens - a Palavra de Deus, os valores do Evangelho, o amor que se faz serviço aos irmãos e que se dá até à morte, a partilha e o serviço, a misericórdia e a fraternidade, os carismas e ministérios que ajudam a construir a comunidade do Reino... Os discípulos de Jesus são os depositários desses "bens". A questão é, portanto, esta: como devem ser utilizados estes "bens"? Eles devem dar frutos, ou devem ser conservados cuidadosamente enterrados? Os discípulos de Jesus podem - por medo, por comodismo, por desinteresse - deixar que esses "bens" fiquem infrutíferos?
    Na perspectiva da nossa parábola, os "bens" que Jesus deixou aos seus discípulos têm de dar frutos. A parábola apresenta como modelos os dois servos que mexeram com os "bens", que demonstraram interesse, que se preocuparam em não deixar parados os dons do "senhor", que fizeram investimentos, que não se acomodaram nem se deixaram paralisar pela preguiça, pela rotina, ou pelo medo.
    Por outro lado, a parábola condena veementemente o servo que entregou intactos os bens que recebeu. Ele teve medo e, por isso, não correu riscos; mas não só não tirou desses bens qualquer fruto, co
    mo também impediu que os bens do "senhor" fossem criadores de vida nova.
    Através desta parábola, Mateus exorta a sua comunidade no sentido de estar alerta e vigilante, sem se deixar vencer pelo comodismo e pela rotina. Esquecer os compromissos assumidos com Jesus e com o Reino, demitir-se das suas responsabilidades, deixar na gaveta os dons de Deus, aceitar passivamente que o mundo se construa de acordo com valores que não são os de Jesus, instalar-se na passividade e no comodismo, é privar os irmãos, a Igreja e o mundo dos frutos a que têm direito.
    O discípulo de Jesus não pode esperar o Senhor de mãos erguidas e de olhos postos no céu, alheado dos problemas do mundo e preocupado em não se contaminar com as questões do mundo... O discípulo de Jesus espera o Senhor profundamente envolvido e empenhado no mundo, ocupado em distribuir a todos os homens seus irmãos os "bens" de Deus e em construir o Reino.

    ACTUALIZAÇÃO

    Na reflexão, considerar os seguintes dados:

    • Antes de mais, é preciso ter presente que nós, os cristãos, somos agora no mundo as testemunhas de Cristo e do projecto de salvação/libertação que o Pai tem para os homens. É com o nosso coração que Jesus continua a amar os publicanos e os pecadores do nosso tempo; é com as nossas palavras que Jesus continua a consolar os que estão tristes e desanimados; é com os nossos braços abertos que Jesus continua a acolher os imigrantes que fogem da miséria e da degradação; é com as nossas mãos que Jesus continua a quebrar as cadeias que prendem os escravizados e oprimidos; é com os nossos pés que Jesus continua a ir ao encontro de cada irmão que está sozinho e abandonado; é com a nossa solidariedade que Jesus continua a alimentar as multidões famintas do mundo e a dar medicamentos e cultura àqueles que nada têm... Nós, cristãos, membros do "corpo de Cristo", que nos identificamos com Cristo, temos a grave responsabilidade de O testemunhar e de deixar que, através de nós, Ele continue a amar os homens e as mulheres que caminham ao nosso lado pelos caminhos do mundo.

    • Os dois "servos" da parábola que, talvez correndo riscos, fizeram frutificar os "bens" que o "senhor" lhes deixou, mostram como devemos proceder, enquanto caminhamos pelo mundo à espera da segunda vinda de Jesus. Eles tiveram a ousadia de não se contentar com o que já tinham; não se deixaram dominar pelo comodismo e pela apatia... Lutaram, esforçaram-se, arriscaram, ganharam. Todos os dias, há cristãos que têm a coragem de arriscar. Não aceitam a injustiça e lutam contra ela; não pactuam com o egoísmo, o orgulho, a prepotência e propõem, em troca, os valores do Evangelho; não aceitam que os grandes e poderosos decidam os destinos do mundo e têm a coragem de lutar objectivamente contra os projectos desumanos que desfeiam esta terra; não aceitam que a Igreja se identifique com a riqueza, com o poder, com os grandes e esforçam-se por torná-la mais pobre, mais simples, mais humana, mais evangélica; não aceitam que a liturgia tenha de ser sempre tão solene que assuste os mais simples, nem tão etérea que não tenha nada a ver com a vida do dia a dia... Muitas vezes, são perseguidos, condenados, desautorizados, reduzidos ao silêncio, incompreendidos; muitas vezes, no seu excesso de zelo, cometem erros de avaliação, fazem opções erradas... Apesar de tudo, Jesus diz-lhes: "muito bem, servo bom e fiel. Porque foste fiel em coisas pequenas, confiar-te-ei as grandes. Vem tomar parte na alegria do teu Senhor".

    • O servo que escondeu os "bens" que o Senhor lhe confiou mostra como não devemos proceder, enquanto caminhamos pelo mundo à espera da segunda vinda de Jesus. Esse servo contentou-se com o que já tinha e não teve a ousadia de querer mais; entregou-se sem luta, deixou-se dominar pelo comodismo e pela apatia... Não lutou, não se esforçou, não arriscou, não ganhou. Todos os dias há cristãos que desistem por medo e cobardia e se demitem do seu papel na construção de um mundo melhor. Limitam-se a cumprir as regras, ou a refugiar-se no seu cantinho cómodo, sem força, sem vontade, sem coragem de ir mais além. Não falham, não cometem "pecados graves", não fazem mal a ninguém, não correm riscos; limitam-se a repetir sempre os mesmos gestos, sem inovar, sem purificar, sem nada transformar; não fazem, nem deixam fazer e limitam-se a criticar asperamente aqueles que se esforçam por mudar as coisas... Não põem a render os "bens" que Deus lhes confiou e deixam-nos secar sem dar frutos. Jesus diz-lhes: "servo mau e preguiçoso, sabias que ceifo onde não semeei e recolho onde não lancei; devias, portanto, depositar o meu dinheiro no banco e eu teria, ao voltar, recebido com juro o que era meu".

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 33º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 33º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. DURANTE A CELEBRAÇÃO.
    Aquilo que terá sido pensado e rezado em termos de "balanço de competência" ou de balanço dos talentos recebidos pode tornar-se oferenda. Aqueles que quiserem poderão escrever em pequenos papéis, oferecidos no momento da apresentação dos dons, duas palavras: uma, dizendo um "talento" recebido ou uma competência (habilidade, tempo livre...); outra, dizendo a maneira como ele "frutifica" (equipa de decoração da paróquia, visita aos doentes...).

    3. PALAVRA DE VIDA.
    Quantos homens, mulheres e crianças, em todo o mundo, mas também perto de nós, lançam SOS para que a sua vida seja salva, e que eles possam viver de pé, dignamente, humanamente! Jesus ouviu os seus gritos, escutou-os, respondeu-lhes com uma palavra, um olhar, um gesto, e era sempre para transmitir dignidade, confiança, saúde, paz. Fechamos hoje os nossos ouvidos? Agarramo-nos às nossas riquezas? E se fizéssemos um desvio no nosso caminho para nos aproximarmos, para nos fazermos próximo de todos aqueles que caíram na beira do caminho?

    4. UM PONTO DE ATENÇÃO.
    A oração do Pai Nosso... O Pai Nosso é muitas vezes uma oração mecânica, maquinal, rotineira. À força de tanto o recitar, não damos a devida atenção ao que dizemos. É preciso aproveitar uma celebração dominical para fazer reencontrar todo o seu valor: é a oração que Jesus formulou e ensinou aos seus discípulos. Cantado ou recitado, pode-se fazer uma breve introdução e deixar um breve tempo de silêncio antes de rezar o Pai Nosso. Recitação bem pausada, com as mãos erguidas ou unidas a quem está ao nosso lado...

    5. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE...
    Fazer o ponto da situação sobre os nossos talentos... E se aproveitássemos a parábola de hoje para fazer o ponto da situação sobre os "talentos" que recebemos e aqueles que ganhámos? Discernir em conjunto pode ajudar a perceber estes frutos em Igreja e a dar graças por eles.

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • Apresentação da Virgem Santa Maria

    Apresentação da Virgem Santa Maria


    21 de Novembro, 2023

    A Apresentação de Maria ao templo de Jerusalém é descrita apenas nos evangelhos apócrifos. O imperador Justiniano mandou construir junto desse templo uma basílica, Santa Maria a Nova, que foi dedicada no dia 21 de Novembro de 543. A memória litúrgica da Apresentação de Maria começou a ser celebrada em Constantinopla, no século VIII, espalhando-se pouco a pouco no Oriente. No Ocidente, esta festa também se desenvolveu lentamente. Em 1472 foi alargada a algumas igrejas latinas, parecendo no Missal Romano apenas em 1505. É uma daquelas festas que, no dizer de Paulo VI, «para além do dado apócrifo, propõem conteúdos de alto valor exemplar e dão continuidade a veneráveis tradições» (Marialis cultus 8).
    Lectio
    Primeira leitura: Zacarias 2, 14-17

    Rejubila e alegra-te, filha de Sião, porque eis que Eu venho para morar no meio de ti - oráculo do Senhor. 15Naqueles dias, muitas nações se unirão ao Senhor e serão meu povo; habitarei no meio de ti, e saberás que o Senhor do universo me enviou a ti. 16O Senhor possuirá Judá como sua porção na Terra Santa e escolherá ainda Jerusalém. 17Cale-se toda a criatura diante do Senhor, porque Ele se eleva da sua morada santa.

    Este oráculo é provavelmente data da época da reconstrução do Templo de Jerusalém, quando alguns israelitas ainda estão longe da pátria e surgem fortes esperanças de renascimento.
    Os três versículos que escutamos são tirados da terceira das oito visões em que Zacarias escuta os oráculos do Senhor. Neles ecoa a convicção forte dos israelitas: Deus vive no meio do seu povo, a sua casa é o Templo de Jerusalém.
    O texto de Zacarias confirma a fé, dá esperança robustece a atitude, porque o Senhor está no Templo, garante nele a sua morada, e anuncia a sua disponibilidade para acolher todos, israelitas e gentios. Esta presença, que provoca júbilo, há-de levar também à contemplação silenciosa do mistério.

    Evangelho: Marcos 3, 31-35

    Naquele tempo, chegam sua mãe e seus irmãos que, ficando do lado de fora, o mandam chamar. 32A multidão estava sentada em volta dele, quando lhe disseram: «Estão lá fora a tua mãe e os teus irmãos que te procuram.» 33Ele respondeu: «Quem são minha mãe e meus irmãos?» 34E, percorrendo com o olhar os que estavam sentados à volta dele, disse: «Aí estão minha mãe e meus irmãos. 35Aquele que fizer a vontade de Deus, esse é que é meu irmão, minha irmã e minha mãe.»

    Jesus ultrapassa a crise aberta com os seus familiares, particularmente com a Mãe e os irmãos, alargando os limites da familiaridade com Ele a quem quer que que cumpra a vontade de Deus. Os verdadeiros familiares do Senhor são aqueles que «fazem» a vontade de Deus: «Aquele que fizer a vontade de Deus, esse é que é meu irmão, minha irmã e minha mãe» (v. 35). Na perspetiva de Jesus, a vontade de Deus não há-de feita com a atitude de um escravo que executa ordens do dono, mas com o dinamismo e a criatividade de alguém que sabe escutar e ser coerente com a Palavra escutada.
    Jesus é um verdadeiro mestre na arte de «fazer» a vontade do Pai. Maria é sua discípula fiel. Escuta, acredita e cumpre o que escuta e acredita «Feliz Aquela que acreditou».
    Meditatio

    A Apresentação de Maria ao Templo não tem qualquer fundamento bíblico. São os evangelhos apócrifos que falam desse presumível acontecimento. Mas é claramente improvável que uma rapariga tenha sido confiada ao clero de Jerusalém, num Templo inacessível a mulheres. Lemos no protoevangelho de Tiago: «Quando a menina completou três anos, Joaquim disse: «Chamai as meninas dos hebreus que não tenham qualquer mancha e tome cada uma delas uma lâmpada, uma lâmpada que não se apague. A menina não deverá voltar atrás e o seu coração não permanecerá fora do Templo do Senhor». Elas obedeceram àquela ordem e foram juntas ao Templo do Senhor. E o sacerdote acolheu a menina, tomou-a nos braços e abençoou-a dizendo: «O Senhor glorificou o teu nome em todas as gerações. Em ti, nos últimos dias, revelará a redenção que concede aos filhos de Israel». E mandou sentar a menina no terceiro degrau do altar. E o Senhor encheu-a de graça e ela dançou e tornou-se querida por toda a casa de Israel. Os seus pais deixaram o Templo cheios de admiração, louvando a Deus: a menina não procurou voltar atrás. E permaneceu no Templo do Senhor, semelhante a uma pomba, e a mão de um anjo oferecia-lhe o alimento» (Protoevangelho de Tiago 7, 2-8,1). É tudo muito bonito, mas é tudo muito «sobrenatural», bem pouco em sintonia com o realismo do mistério da Encarnação.
    A Santa Sé admitiu a festa somente em 1372, a pedido do embaixador do rei de Chipre "e de Jerusalém". Mas ela só aparece no Missal Romano a partir de 1505.
    O Lecionário litúrgico oferece-nos uma proposta unitária para tornar verosímil a interpretação do acontecimento: a tipologia da presença. As duas leituras detêm-se nessa modalidade relacional. O oráculo de Zacarias proclama a presença de Deus no Templo e transmite a palavra do próprio Deus que se apresenta, como que a explicar o sentido e o significado dessa decisão divina, que enche de alegria o povo e há-de levá-lo à contemplação. Se o mistério da presença de Deus no meio do seu povo era uma realidade no Antigo Testamento, mais o é no Novo Testamento. A Santíssima Humanidade de Cristo é o novo Templo, o novo ´lugar´ da Presença de Deus no meio de nós. Em Jesus, Deus torna-se presente ao homem, e o homem tem o caminho para se tornar presente a Deus. A primeira criatura que beneficiou dessa presença, e se apresentou a Deus, foi a Virgem Maria. Nela se realizou, como em ninguém jamais, a mútua presença e imanência: Deus apresentou-Se a Ela e Ela apresentou-se a Deus; Deus permaneceu nela, e Ela permaneceu em Deus. O evangelho refere a presença de Maria junto do seu Filho. Esta presença como que torna visível o mistério profundo que meditamos. As palavras de Jesus, sobre a identidade daqueles que Ele julga seus parentes, deixam clara a mensagem: o Senhor está presente junto da pessoa humana; sendo assim, a pessoa humana tem a porta aberta para se apresentar diante do Senhor. Se o Templo torna visível o encontro entre Deus e o homem, a Santíssima Humanidade de Cristo torna-o ainda mais visível.
    Tendo como pano de fundo o delicado símbolo da presença de uma menina na solenidade do Templo, isto é, a chamada «apresentação de Maria ao Templo», a liturgia hodierna leva-nos a meditar no sentido de uma apresentação de nós mesmos diante do Senhor. A própria presença diante do Senhor torna-se apresentação todas as vezes que é iluminada, explicada, motivada, cultivada pela consciência. O símbolo da apresentação de Maria ao Templo equivale, portanto, à consciência da identidade de Maria e da sua função junto do Messias, cada vez mais importante, primeiro por parte dos seus familiares e, depois, por parte da própria Virgem Maria e, finalmente, por parte dos outros crentes. O sentido fundamental é este: Maria está sempre na presença do Senhor, integralmente dedicada ao seu serviço, crescendo na consciência de si e da sua missão.
    Quando Deus se torna presente a nós em Jesus e na sua palavra, e nós nos tornamos presentes a Deus, em Jesus, e guardamos a sua palavra, também nos tornamos felizes, bem-aventurados, como Aquela que recebeu no seu ventre, transportou e deu à luz Jesus Cristo, nossa Bem-aventurança.
    Oratio

    Salve santa Maria, filha de Israel e guarda do Evangelho. Tu deste-te inteiramente ao Senhor. Para viveres na sua presença, escolheste uma vida de oração, de trabalho e de silêncio. A tua vida tornou-se um templo em que Deus veio habitar. A tua alegria e a tua felicidade eram servi-l´O dia e noite, vivendo na sua presença. «Bem-aventurados os que habitam na vossa casa, Senhor! Bem-aventurados os que só do Senhor esperam o seu apoio e o seu socorro. Os seus corações elevar-se-ão de grau em grau e avançarão sem cessar na virtude», diz o Salmo. Santa Maria, apresentada ao Templo, tu és para nós modelo da vida no Espírito, modelo do dom de nós mesmos a Deus. Faz-me compreender bem a vida de abandono e entrega ao Senhor. Por isso, me consagro a vós e ao Coração Jesus. Ámen.
    Contemplatio

    Maria não tinha senão três anos, mas já tinha a razão desenvolvida e estava avançada em graça. Unia-se à recitação e ao canto dos belos salmos que os seus pais Ana e Joaquim diziam com tanto fervor. E a graça divina falava ao mesmo tempo ao seu coração. Podemos pensar que impressão fazia sobre esta alma cândida o salmo 83: «Como são amáveis os vossos tabernáculos. Deus das virtudes! A minha alma suspira e desfalece para ir até aos átrios do Senhor... Bem-aventurados os que habitam na vossa casa, ó meu Deus...». - E enquanto ela recitava e saboreava estas aspirações, a graça solicitava a sua alma. O Verbo divino dizia-lhe como no salmo 44: «Escuta, minha filha, vê, presta atenção ao meu apelo: esquece o teu povo e a casa de teu pai...». E acrescentava baixinho: «O rei está encantado com a tua beleza e quer ter-te na sua casa e na sua intimidade». A santa criança escutava e compreendia o apelo divino. Nada a pode reter. Diz aos seus pais bem amados: «Tenho sede de habitar no templo para me consagrar inteiramente à oração e ao serviço de Deus». Ana e Joaquim acederam ao seu desejo, como outrora a mãe de Samuel. Foi uma explosão de alegria no coração da santa criança: «Alegrei-me quando me disseram que irei para a casa do Senhor». (Sl 121) (Leão Dehon, OSP 4, p. 477).
    Actio

    Repete hoje estas palavras:
    «Feliz aquele que faz a vontade do Senhor» (cf. Mc 3, 25).

     

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    Apresentação da Virgem Santa Maria (21 de Novembro)

  • Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo - Ano A

    Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo - Ano A

    26 de Novembro, 2023

    Ano A
    34º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    NOSSO SENHOR JESUS CRISTO, REI DO UNIVERSO

    Tema do 34º Domingo do Tempo Comum

    No 34º Domingo do Tempo Comum, celebramos a Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo. As leituras deste domingo falam-nos do Reino de Deus (esse Reino de que Jesus é rei). Apresentam-no como uma realidade que Jesus semeou, que os discípulos são chamados a edificar na história (através do amor) e que terá o seu tempo definitivo no mundo que há-de vir.
    A primeira leitura utiliza a imagem do Bom Pastor para apresentar Deus e para definir a sua relação com os homens. A imagem sublinha, por um lado, a autoridade de Deus e o seu papel na condução do seu Povo pelos caminhos da história; e sublinha, por outro lado, a preocupação, o carinho, o cuidado, o amor de Deus pelo seu Povo.
    O Evangelho apresenta-nos, num quadro dramático, o "rei" Jesus a interpelar os seus discípulo acerca do amor que partilharam com os irmãos, sobretudo com os pobres, os débeis, os desprotegidos. A questão é esta: o egoísmo, o fechamento em si próprio, a indiferença para com o irmão que sofre, não têm lugar no Reino de Deus. Quem insistir em conduzir a sua vida por esses critérios ficará à margem do Reino.
    Na segunda leitura, Paulo lembra aos cristãos que o fim último da caminhada do crente é a participação nesse "Reino de Deus" de vida plena, para o qual Cristo nos conduz. Nesse Reino definitivo, Deus manifestar-Se-á em tudo e actuará como Senhor de todas as coisas (vers. 28).

    LEITURA I - Ez 34,11-12.15-17

    Leitura da Profecia de Ezequiel

    Eis o que diz o Senhor Deus:
    «Eu próprio irei em busca das minhas ovelhas
    e hei-de encontrá-las.
    Como o pastor vigia o seu rebanho,
    Quando estiver no meio das ovelhas que andavam tresmalhadas,
    para as tirar de todos os sítios em que se desgarraram
    num dia de nevoeiro e de trevas.
    Eu apascentarei as minhas ovelhas,
    Eu as levarei a repousar, diz o Senhor.
    Hei-de procurar a que anda tresmalhada.
    Tratarei a que estiver ferida,
    darei vigor à que andar enfraquecida
    E velarei pela gorda e vigorosa.
    Hei-de apascentá-las com justiça.
    Quanto a vós, meu rebanho,
    assim fala o Senhor Deus:
    Hei-de fazer justiça entre ovelhas e ovelhas,
    entre carneiros e cabritos».

    AMBIENTE

    Ezequiel é conhecido como "o profeta da esperança". Desterrado na Babilónia desde 597 a.C. (no reinado de Joaquin, quando Nabucodonosor conquista Jerusalém pela primeira vez e deporta para a Babilónia a classe dirigente do país), Ezequiel exerce aí a sua missão profética entre os exilados judeus.
    A primeira fase do ministério de Ezequiel decorre entre 593 a.C. (data do seu chamamento) e 586 a.C. (data em que Jerusalém é arrasada pelas tropas de Nabucodonosor e uma segunda leva de exilados é encaminhada para a Babilónia). Nesta fase, Ezequiel procura destruir falsas esperanças e anuncia que, ao contrário do que pensam os exilados, o cativeiro está para durar... Eles não só não vão regressar a Jerusalém, mas os que ficaram em Jerusalém (e que continuam a multiplicar os pecados e as infidelidades) vão fazer companhia aos que já estão desterrados na Babilónia.
    A segunda fase do ministério de Ezequiel desenrola-se a partir de 586 a.C. e prolonga-se até cerca de 570 a.C. Instalados numa terra estrangeira, privados de Templo, de sacerdócio e de culto, os exilados estão desesperados e duvidam da bondade e do amor de Deus. Nessa fase, Ezequiel procura alimentar a esperança dos exilados e transmitir ao Povo a certeza de que o Deus salvador e libertador - esse Deus que Israel descobriu na sua história - não os abandonou nem esqueceu.
    O texto que nos é hoje proposto pertence, provavelmente, à segunda fase do ministério de Ezequiel. Depois de denunciar os "maus pastores" que exploraram e abusaram do Povo e o conduziram por caminhos de morte e de desgraça, até à catástrofe final de Jerusalém e ao Exílio (cf. Ez 34,1-9), o profeta anuncia a chegada de um tempo novo em que o próprio Deus vai conduzir o seu Povo e apascentar as suas ovelhas. É um oráculo de esperança, que abre uma nova história e propõe um novo futuro ao Povo de Deus.

    MENSAGEM

    No Antigo Médio Oriente, o título de "pastor" é atribuído, frequentemente, aos deuses e aos reis. É um título bastante expressivo em civilizações que viviam da agricultura e do pastoreio. A metáfora expressa admiravelmente dois aspectos, aparentemente contrários e com frequência separados, da autoridade exercida sobre os homens: o pastor é, ao mesmo tempo, um chefe que dirige o seu rebanho e um companheiro que acompanha as ovelhas na sua caminhada para as pastagens onde há vida.
    Além disso, o pastor é um homem forte, capaz de defender o seu rebanho contra os animais selvagens; e é também delicado para as suas ovelhas. Conhece o estado e as necessidades de cada uma, leva nos braços as mais frágeis e débeis, ama-as e trata-as com carinho. A sua autoridade não se discute: está fundada na entrega e no amor.
    É sobre este fundo que Ezequiel vai colocar as relações que unem Deus e Israel.
    A este Povo a quem os pastores humanos (os reis, os sacerdotes, a classe dirigente) trataram tão mal, o profeta anuncia a chegada desse tempo novo em que Jahwéh vai assumir a sua função de pastor do seu Povo. Como é que Deus desempenhará essa função?
    Deus vai cuidar das suas ovelhas e interessar-se por elas. Neste momento, as ovelhas estão dispersas numa terra estrangeira, depois dos acontecimentos dramáticos que trouxeram ao rebanho morte e desolação; mas Deus, o Bom Pastor, vai reuni-las, reconduzi-las à sua própria terra e apascentá-las em pastagens férteis e tranquilas (vers. 11-12).
    Mais: Deus, o Bom Pastor, irá procurar cada ovelha perdida e tresmalhada, cuidar da que está ferida e doente, vigiar a que está gorda e forte (vers. 16); além disso, julgará pessoalmente os conflitos entre as mais poderosas e as mais débeis, a fim de que o direito das fracas não seja pisado (vers. 17).

    ACTUALIZAÇÃO

    Considerar os seguintes desenvolvimentos:

    • A imagem bíblica do Bom Pastor é uma imagem privilegiada para apresentar Deus e para definir a sua relação com os homens. Sublinha a sua autoridade e o seu papel na condução do seu Povo pelos caminhos da história; mas, sobretudo, sublinha a preocupação, o carinho, o cuidado, o amor de Deus pelo seu Povo. Na nossa cultura urbana, já nem todos entendem a figura do "pastor"; mas todos são convidados a entregar-se nas mãos de Deus, a confiar totalmente n'Ele, a deixar-se conduzir por Ele, a fazer a experiência do seu amor e da sua bondade. É uma experiência tranquilizante e libertadora, que nos traz serenidade e paz.

    • Também aqui, a questão não é se Deus é ou não "pastor" (Ele é sempre "pastor"!); mas é se estamos ou não dispostos a segui-l'O, a deixar-nos conduzir por Ele, a confiar n'Ele para atravessar vales sombrios, a deixar-nos levar ao colo por Ele para que os nossos pés não se firam nas pedras do caminho. Uma certa cultura contemporânea assegura-nos que só nos realizaremos se nos libertarmos de Deus e formos os guias de nós próprios. O que escolhemos para nos conduzir à felicidade e à vida plena: Deus ou o nosso orgulho e auto-suficiência?

    • Às vezes, fugindo de Deus, agarramo-nos a outros "pastores" e fazemos deles a nossa referência, o nosso líder, o nosso ídolo. O que é que nos conduz e condiciona as nossas opções: a riqueza e o poder? Os valores ditados por aqueles que têm a pretensão de saber tudo? O política e socialmente correcto? A opinião pública? O presidente do partido? O comodismo e a instalação? A preservação dos nossos esquemas egoístas e dos nossos privilégios? O êxito e o triunfo a qualquer custo? O herói mais giro da telenovela? O programa de maior audiência da estação televisiva de maior audiência?

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 22 (23)

    Refrão: O Senhor é meu pastor: nada me faltará.

    O Senhor é meu pastor: nada me falta.
    Leva-me a descansar em verdes prados,
    conduz-me às águas refrescantes
    e reconforta a minha alma.

    Ele me guia por sendas direitas,
    por amor do seu nome.
    Ainda que tenha de andar por vales tenebrosos
    não temerei nenhum mal, porque Vós estais comigo.

    Para mim preparais a mesa
    à vista dos meus adversários;
    com óleo me perfumais a cabeça
    e o meu cálice transborda.

    A bondade e a graça hão-de acompanhar-me
    todos os dias da minha vida,
    e habitarei na casa do Senhor
    para todo o sempre.

    LEITURA II - 1 Cor 15,20-26.28

    Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios

    Irmãos:
    Cristo ressuscitou dos mortos,
    como primícias dos que morreram.
    Uma vez que a morte veio por um homem,
    também por um homem veio a ressurreição dos mortos;
    porque, do mesmo modo que em Adão todos morreram,
    assim também em Cristo serão todos restituídos à vida.
    Cada qual, porém, na sua ordem:
    primeiro, Cristo, como primícias;
    a seguir, os que pertencem a Cristo, por ocasião da sua vinda.
    Depois será o fim,
    quando Cristo entregar o reino a Deus seu Pai.
    É necessário que Ele reine,
    até que tenha posto todos os inimigos debaixo dos seus pés.
    E o último inimigo a ser aniquilado é a morte,
    porque Deus «tudo submeteu debaixo dos seus pés».
    Quando todas as coisas Lhe forem submetidas,
    então também o próprio Filho Se há-de submeter
    àquele que Lhe submeteu todas as coisas,
    para que Deus seja tudo em todos.

    AMBIENTE

    No decurso da sua segunda viagem missionária, Paulo chegou a Corinto, vindo de Atenas, e ficou por lá cerca 18 meses (anos 50-52). De acordo com Act 18,2-4, Paulo começou a trabalhar em casa de Priscila e Áquila, um casal de judeo-cristãos. No sábado, usava da palavra na sinagoga. Com a chegada a Corinto de Silvano e Timóteo (2 Cor 1,19; Act 18,5), Paulo consagrou-se inteiramente ao anúncio do Evangelho. Mas não tardou a entrar em conflito com os judeus e foi expulso da sinagoga.
    Como resultado da pregação de Paulo nasceu, contudo, a comunidade cristã de Corinto. A maior parte dos membros da comunidade eram de origem grega, embora, em geral, de condição humilde (cf. 1 Cor 11,26-29; 8,7; 10,14.20; 12,2); mas também havia elementos de origem hebraica (cf. Act 18,8; 1 Cor 1,22-24; 10,32; 12,13).
    De uma forma geral, a comunidade era viva e fervorosa; no entanto, estava exposta aos perigos do ambiente corrupto que se respirava na cidade e não podia deixar de ser influenciada por esse ambiente. É neste contexto que podemos entender alguns dos problemas sentidos na comunidade e apontados na Primeira Carta aos Coríntios: moral dissoluta (cf. 1 Cor 6,12-20; 5,1-2), querelas, disputas, lutas (cf. 1 Cor 1,11-12), sedução da sabedoria filosófica de origem pagã que se introduzia na Igreja revestida de um superficial verniz cristão (cf. 1 Cor 1,19-2,10)... Na comunidade de Corinto, vemos as dificuldades da fé cristã em inserir-se num ambiente hostil, marcado por uma cultura pagã e por um conjunto de valores que estão em contradição com a pureza da mensagem evangélica.
    Um dos pontos onde havia uma notória dificuldade em conciliar os dados da fé cristã com os valores do mundo grego era na questão da ressurreição. Enquanto que a ressurreição dos mortos era relativamente bem aceite no judaísmo (habituado a ver o homem na sua unidade), constituía um problema muito sério para a mentalidade grega. A cultura grega estava fortemente influenciada por filosofias dualistas, que viam no corpo uma realidade negativa e na alma uma realidade nobre e ideal. Aceitar que a alma viveria sempre não era difícil para a mentalidade grega... O problema era aceitar a ressurreição do homem total: sendo o homem (de acordo com a mentalidade grega) constituído por alma e corpo, como podemos falar da ressurreição do homem?

    MENSAGEM

    Frente às objecções e dúvidas dos coríntios, Paulo parte da ressurreição de Cristo (cf. 1 Cor 15,1-11), para concluir que todos aqueles que se identificarem com Cristo ressuscitarão também (cf. 1 Cor 15,12-34).
    O nosso texto começa precisamente com a afirmação de que "Cristo ressuscitou dos mortos, como primícias dos que morreram" (vers. 20). A sua ressurreição não foi um caso único e excepcional, mas o primeiro caso. "Primeiro" deve ser entendido aqui, não apenas em sentido cronológico, mas sobretudo no sentido do princípio activo da ressurreição de todos os outros homens e mulheres. Cristo foi constituído por Deus princípio de uma nova humanidade; a sua ressurreição arrasta atrás de si toda a sua "descendência" - isto é, todos aqueles que se identificam com Ele, que acolheram a sua proposta de vida e o seguiram - ao encontro da vida plena e eterna (vers. 21-23).
    O destino dessa nova humanidade é o Reino de Deus. O Reino de Deus será uma realidade onde o egoísmo, a injustiça, a miséria, o sofrimento, o medo, o pecado, e até a morte (isto é, todos os inimigos da vida e do homem) estarão definitivamente ausentes, pois terão sido vencidos por Cristo (vers. 24-26). Nesse Reino definitivo, Deus manifestar-Se-á em tudo e actuará como Senhor de todas as coisas (vers. 28).
    A reflexão de Paulo lembra aos cristãos que o fim último da caminhada do crente é a participação nesse "Reino de Deus" de vida plena e definitiva, para o qual Cristo nos conduz.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pode fazer-se a partir dos seguintes dados:

    • O nosso texto garante-nos que a meta final da nossa caminhada é o Reino de Deus - isto é, uma realidade de vida plena e definitiva, de onde a doença, a tristeza, o sofrimento, a injustiça, a prepotência, a morte estarão ausentes. Convém ter sempre presente esta realidade, ao longo da nossa peregrinação pela terra... A nossa vida presente não é um drama absurdo, sem sentido e sem finalidade; é uma caminhada tranquila, confiante - ainda quando feita no sofrimento e na dor - em direcção a esse desabrochar pleno, a essa vida total que Deus nos reserva.

    • Como é que aí chegamos? Paulo responde: identificando-nos com Cristo. A ressurreição de Cristo é o "selo de garantia" de Deus para uma vida oferecida ao projecto do Reino... Demonstra que uma vida vivida na escuta atenta dos projectos do Pai e no amor e no serviço aos homens conduz à vida plena; demonstra que uma vida gasta na luta contra o egoísmo, a opressão e o pecado conduz à vida definitiva; demonstra que uma vida gasta ao serviço da construção do Reino conduz à vida verdadeira... Se a nossa vida for gasta do mesmo jeito, seguiremos Cristo na ressurreição, atingiremos a vida nova do Homem Novo e estaremos para sempre com Ele nesse Reino livre do sofrimento, do pecado e da morte que Deus reserva para os seus filhos.

    • Descobrir que o Reino da vida definitiva é a nossa meta final significa eliminar definitivamente o medo que nos impede de actuar e de assumir um papel de protagonismo na construção de um mundo novo. Quem tem no horizonte final da sua vida o Reino de Deus, pode comprometer-se na luta pela justiça e pela paz, com a certeza de que a injustiça, a opressão, a oposição dos poderosos, a morte não podem pôr fim à vida que o anima. Ter como meta final o Reino significa libertarmo-nos do medo que nos paralisa e encontrarmos razões para um compromisso mais consequente com Deus, com o mundo e com os homens.

    ALELUIA - Mc 11,9.10

    Aleluia. Aleluia.

    Bendito O que vem em nome do Senhor!
    Bendito o reino do nosso pai David!

    EVANGELHO - Mt 25,31-46

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

    Naquele tempo,
    disse Jesus aos seus discípulos:
    «Quando o Filho do homem vier na sua glória
    com todos os seus Anjos,
    sentar-Se-á no seu trono glorioso.
    Todas as nações se reunirão na sua presença
    e Ele separará uns dos outros,
    como o pastor separa as ovelhas dos cabritos;
    e colocará as ovelhas à sua direita e os cabritos à sua esquerda.
    Então o Rei dirá aos que estiverem à sua direita:
    'Vinde, bem ditos de meu Pai;
    recebei como herança o reino
    que vos está preparado desde a criação do mundo.
    Porque tive fome e destes-Me de comer;
    tive sede e destes-me de beber;
    era peregrino e Me recolhestes;
    não tinha roupa e Me vestistes;
    estive doente e viestes visitar-Me;
    estava na prisão e fostes ver-Me'.
    Então os justos Lhe dirão:
    'Senhor, quando é que Te vimos com fome
    e Te demos de comer,
    ou com sede e Te demos de beber?
    Quando é que Te vimos peregrino e te recolhemos,
    ou sem roupa e Te vestimos?
    Quando é que Te vimos doente ou na prisão e Te fomos ver?'
    E o Rei lhes responderá:
    'Em verdade vos digo: Quantas vezes o fizestes
    a um dos meus irmãos mais pequeninos,
    a Mim o fizestes'.
    Dirá então aos que estiverem à sua esquerda:
    'Afastai-vos de Mim, malditos, para o fogo eterno,
    preparado para o demónio e os seus anjos.
    Porque tive fome e não Me destes de comer;
    tive sede e não Me destes de beber;
    era peregrino e não Me recolhestes;
    estava sem roupa e não Me vestistes;
    estive doente e na prisão e não Me fostes visitar'.
    Então também eles Lhe hão-de perguntar:
    'Senhor, quando é que Te vimos com fome ou com sede,
    peregrino ou sem roupa, doente ou na prisão,
    e não Te prestámos assistência?'
    E Ele lhes responderá:
    'Em verdade vos digo: Quantas vezes o deixastes de fazer
    a um dos meus irmãos mais pequeninos,
    também a Mim o deixastes de fazer'.
    Estes irão para o suplício eterno
    e os justos para a vida eterna».

    AMBIENTE

    Esta impressionante descrição do juízo final é a conclusão das três parábolas precedentes (a "parábola do mordomo fiel e do mordomo infiel" - cf. Mt 24,45-51; a "parábola das jovens previdentes e das jovens descuidadas" - cf. Mt 25,1-13; a "parábola dos talentos" - cf. Mt 25,14-30). Tanto no texto que nos é proposto como nessas três parábolas aparecem dois grupos de pessoas que tiveram comportamentos diversos enquanto esperavam a vinda do Senhor Jesus. O autor do texto mostra agora qual será o "fim" daqueles que se mantiveram e daqueles que não se mantiveram vigilantes e preparados para a vinda do Senhor.
    Mais uma vez, para percebermos a catequese que Mateus aqui desenvolve, temos de recordar o contexto da comunidade cristã a quem ela se destina. Estamos nos últimos decénios do séc. I (década de 80). Já passou o entusiasmo inicial pela vinda iminente de Jesus para instaurar o Reino definitivo. Os cristãos que constituem a comunidade de Mateus estão desinteressados, instalados, acomodados; vivem a fé de forma rotineira, morna, pouco exigente e pouco comprometida; alguns, diante das dificuldades, deixam a comunidade e renunciam ao Evangelho...
    Mateus, preocupado com a situação, procura revitalizar a fé, reacender o entusiasmo, entusiasmar ao compromisso. Vai fazê-lo através de uma catequese que convida à vigilância, enquanto se espera o encontro final com Cristo.
    No texto que nos é proposto, Mateus mostra aos crentes da sua comunidade - com a linguagem veemente dos pregadores da época - o que espera, no final da caminhada, quer aqueles que se mantiveram vigilantes e viveram de acordo com os ensinamentos de Jesus, quer aqueles que se esqueceram dos valores do Evangelho e que conduziram a vida de acordo com outros interesses e preocupações.

    MENSAGEM

    A parábola do juízo final começa com uma introdução (vers. 31-33) que apresenta o quadro: o "Filho do Homem" sentado no seu trono, a separar as pessoas umas das outras "como o pastor separa as ovelhas dos cabritos".
    Vêm, depois, dois diálogos. Um, entre "o rei" e "as ovelhas" que estão à sua direita (vers. 34-40); outro, entre "o rei" e os "cabritos" que estão à sua esquerda (vers. 41-46). No primeiro diálogo, o "rei" acolhe as "ovelhas" e convida-as a tomar posse da herança do "Reino"; no segundo diálogo, o "rei" afasta os "cabritos" e impede-os de tomar posse da herança do Reino. Porquê? Qual é o critério que "o rei" utiliza para acolher uns e rejeitar outros?
    A questão decisiva parece ser, na perspectiva de Mateus, a atitude de amor ou de indiferença para com os irmãos mais pequenos de Jesus, que se encontram em situações dramáticas de necessidade - os que têm fome, os que têm sede, os peregrinos, os que não têm que vestir, os que estão doentes, os que estão na prisão... Jesus identifica-Se com os pequenos, os pobres, os débeis, os marginalizados; manifestar amor e solidariedade para com o pobre é fazê-lo ao próprio Jesus e manifestar egoísmo e indiferença para com o pobre é fazê-lo ao próprio Jesus.
    A cena pode interpretar-se de duas maneiras, dependendo de como entendemos a palavra "irmão". Entendida em sentido genérico, a palavra "irmão" designaria qualquer homem; neste caso, a exortação de Jesus convida os que querem entrar no Reino a ir ao encontro de qualquer homem que tenha fome, que tenha sede, que seja peregrino, que esteja nu, esteja doente ou que esteja na prisão, para lhe manifestar amor e solidariedade. Entendida num sentido mais restrito, a palavra "irmão" designaria os membros da comunidade cristã... De qualquer forma, os dois sentidos não se excluem; e é possível que Mateus se refira às duas realidades.
    A exortação que Mateus lança à sua comunidade cristã (e às comunidades cristãs de todos os tempos e lugares) nas parábolas precedentes ganha, assim, uma força impressionante à luz desta cena final. Com os dados que este Evangelho nos apresenta, fica perfeitamente evidente que "estar vigilantes e preparados" (que é o grande tema do "discurso escatológico" dos capítulos 24 e 25) consiste, principalmente, em viver o amor e a solidariedade para com os pobres, os pequenos, os desprotegidos, os marginalizados. Em última análise, é esse o critério que decide a entrada ou a não entrada no Reino de Deus.
    Esta exortação dirige-se a uma comunidade que negligencia o amor aos irmãos, que vive na indiferença ao sofrimento dos mais débeis, que é insensível ao drama dos pobres e que não cuida dos pequenos e dos desprotegidos. Como essas são atitudes que não se coadunam com a lógica do Reino, quem vive desse jeito não poderá fazer parte do Reino.
    A cena do juízo final será uma descrição exacta e fotográfica do que vai acontecer no final dos tempos?
    É claro que não. Mateus não é um repórter, mas um catequista a instruir a sua comunidade sobre os critérios e as lógicas de Deus. O objectivo do catequista Mateus é deixar bem claro que Deus não aprova uma vida conduzida por critérios de egoísmo, onde não há lugar para o amor a todos os irmãos, particularmente aos mais pobres e débeis. Um dos pormenores mais sugestivos é a identificação de Cristo com os famintos, os abandonados, os pequenos, os desprotegidos: todos eles são membros de Cristo e não os amar é não amar Cristo. Dizer que se ama Cristo e não viver do jeito de Cristo, no amor a todos os homens, é uma mentira e uma incoerência.
    Deus condena os maus ("os cabritos") ao inferno? Não. Deus não condena ninguém. Quem se condena ou não é o homem, na medida em que não aceita ou aceita a vida que Deus lhe oferece. E haverá alguém que, tendo consciência plena do que está em jogo, rejeite o amor e escolha, em definitivo, o egoísmo, o orgulho, a auto-suficiência - isto é, o afastamento definitivo de Deus e do Reino? Haverá alguém que, percebendo o sem sentido dessas opções, se obstine nelas por toda a eternidade?
    Então, porque é que Mateus põe Deus a dizer aos "cabritos": "afastai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e para os seus anjos"? Porque Mateus é um pregador veemente, que usa a técnica dos pregadores da época e gosta de recorrer a imagens fortes que toquem o auditório e que o levem a sentir-se interpelado. Para além dos exageros de linguagem, a mensagem é esta: o egoísmo e a indiferença para com o irmão não têm lugar no Reino de Deus.

    ACTUALIZAÇÃO

    Considerar os seguintes pontos:

    • Quem é que a nossa sociedade considera uma "pessoa de sucesso"? Qual o perfil do homem "importante"? Quais são os padrões usados pela nossa cultura para aferir a realização ou a não realização de alguém? No geral, o "homem de sucesso", que todos reconhecem como importante e realizado, é aquele que tem dinheiro suficiente para concretizar todos os sonhos e fantasias, que tem poder suficiente para ser temido, que tem êxito suficiente para juntar à sua volta multidões de aduladores, que tem fama suficiente para ser invejado, que tem talento suficiente para ser admirado, que tem a pouca vergonha suficiente para dizer ou fazer o que lhe apetece, que tem a vaidade suficiente para se apresentar aos outros como modelo de vida... No entanto, de acordo com a parábola que o Evangelho propõe, o critério fundamental usado por Jesus para definir quem é uma "pessoa de sucesso" é a capacidade de amar o irmão, sobretudo o mais pobre e desprotegido. Para mim, o que é que faz mais sentido: o critério do mundo ou o critério de Deus? Na minha perspectiva, qual é mais útil e necessário: o "homem de sucesso" do mundo ou o "homem de sucesso" de Deus?

    • O amor ao irmão é, portanto, uma condição essencial para fazer parte do Reino. Nós cristãos, cidadãos do Reino, temos consciência disso e sentimo-nos responsáveis por todos os irmãos que sofrem? Os que não têm trabalho, nem pão, nem casa, podem contar com a nossa solidariedade activa? Os imigrantes, perdidos numa realidade cultural e social estranha, vítimas de injustiças e violências, condenados a um trabalho escravo e que, tantas vezes, não respeita a sua dignidade, podem contar com a nossa solidariedade activa? Os pobres, vítimas de injustiças, que nem sequer têm a possibilidade de recorrer aos tribunais para que lhes seja feita justiça, podem contar com a nossa solidariedade activa? Os que sobrevivem com pensões de miséria, sem possibilidades de comprar os medicamentos necessários para aliviar os seus padecimentos, podem contar com a nossa solidariedade activa? Os que estão sozinhos, abandonados por todos, sem amor nem amizade, podem contar com a nossa solidariedade activa? Os que estão presos a um leito de hospital ou a uma cela de prisão, marginalizados e condenados em vida, podem contar com a nossa solidariedade activa?

    • O Reino de Deus - isto é, esse mundo novo onde reinam os critérios de Deus e que se constrói de acordo com os valores de Deus - é uma semente que Jesus semeou, que os discípulos são chamados a edificar na história (através do amor) e que terá o seu tempo definitivo no mundo que há-de vir. Não esqueçamos, no entanto, este facto essencial: o Reino de Deus está no meio de nós; a nossa missão é fazer com que ele seja uma realidade bem viva e bem presente no nosso mundo. Depende de nós fazer com que o Reino deixe de ser uma miragem, para passar a ser uma realidade a crescer e a transformar o mundo e a vida dos homens.

    • Alguém acusou a religião cristã de ser o "ópio do povo", por pôr as pessoas a sonhar com o mundo que há-de vir, em lugar de as levar a um compromisso efectivo com a transformação do mundo, aqui e agora. Na verdade, nós os cristãos caminhamos ao encontro do mundo que há-de vir, mas de pés bem assentes na terra, atentos à realidade que nos rodeia e preocupados em construir, desde já, um mundo de justiça, de fraternidade, de liberdade e de paz. A experiência religiosa não pode, nunca, servir-nos de pretexto para a evasão, para a fuga às responsabilidades, para a demissão das nossas obrigações para com o mundo e para com os irmãos.

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 34º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 34º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. DURANTE A CELEBRAÇÃO.
    Porque se trata da "Parusia", da vinda de Cristo na glória, no fim dos tempos, procurar-se-á visualizar, se possível com um poster, um símbolo que signifique a glória de Cristo que vem sobre o mundo. Além disso, procure-se, ao longo da celebração, pôr em realce as diversas aclamações a Cristo, particularmente festejado hoje.

    3. PALAVRA DE VIDA.
    A sua coroa será feita de espinhos... O seu trono será uma cruz... O seu poder diferente do poder do mundo... O seu mandamento será o do Amor... O seu exército será composto por homens desarmados... A sua Lei são as bem-aventuranças... O seu Reino será um mundo de paz... Decididamente, este rei não é como os outros, porque o seu Reino não é deste mundo. Contudo, nós somos os seus sujeitos convidados a segui-l'O, e mesmo a fazer com que se realize este Reino. Fazemo-lo sempre que somos artífices da paz e nos amamos como Ele nos ama. Nada mais... mas nada menos!

    4. UM PONTO DE ATENÇÃO.
    Valorizar as aclamações... Pôr em realce, hoje, as aclamações habituais. Um belo ícone de Cristo em majestade pode ser colocado em destaque, no princípio da celebração, durante o cântico de entrada. Depois das palavras de introdução, canta-se o Glória a Deus, cuja maior parte é um hino a Cristo. O Aleluia será a ocasião de uma aclamação solene, mais desenvolvida hoje, enquanto o Evangeliário é apresentado à assembleia. No final da celebração, alguém pega no ícone e apresenta-o à assembleia, que canta um cântico de glória a Cristo. O cântico que serve de anamnese na Eucaristia pode ser retomado aqui em forma de aclamação.

    5. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE...
    Dar ternura e reconforto aos "pequenos"... Pessoalmente e em comunidade cristã, empenhemo-nos nesta semana em dar, em nome do Senhor, ternura e reconforto aos "pequenos" até aqui ignorados e tão próximos (no nosso prédio, bairro, cidade... e, quem sabe, até na nossa casa, comunidade cristã, comunidade religiosa...).

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.pt

  • S. André, Apóstolo

    S. André, Apóstolo


    30 de Novembro, 2023

    André era discípulo de João Batista, e companheiro de João Evangelista. Quando o Precursor apontou Jesus que passava, dizendo: "Eis o cordeiro de Deus" (cf. Jo 1, 35-40) tornou-se imediatamente discípulo do Senhor. Logo a seguir, comunicou a Pedro, seu irmão a descoberta do Messias (cf. Jo 1, 41s.). Jesus chamou a ambos para se tornarem "pescadores de homens" (Mt 4, 18s.). É André que, na multiplicação dos pães indica a Jesus o rapaz que tem cinco pães e dois peixes (Jo 6, 8s.). Com Filipe, André refere a Jesus que alguns gregos O querem ver (Jo 12, 20s.). A tradição reconhece em Santo André o evangelizador da Acaia (Grécia) e em Patras o lugar onde morreu após dois dias de suplício na Cruz, donde anunciou Cristo até ao último momento.
    Lectio
    Primeira leitura: Romanos 10,9-18

    Irmãos: Se confessares com a tua boca: «Jesus é o Senhor», e acreditares no teu coração que Deus o ressuscitou de entre os mortos, serás salvo. 10É que acreditar de coração leva a obter a justiça, e confessar com a boca leva a obter a salvação. 11É a Escritura que o diz: Todo o que nele acreditar não ficará frustrado. 12Assim, não há diferença entre judeu e grego, pois todos têm o mesmo Senhor, rico para com todos os que o invocam. 13De facto, todo o que invocar o nome do Senhor será salvo. 14Ora, como hão-de invocar aquele em quem não acreditaram? E como hão-de acreditar naquele de quem não ouviram falar? E como hão-de ouvir falar, sem alguém que o anuncie? 15E como hão-de anunciar, se não forem enviados? Por isso está escrito: Que bem-vindos são os pés dos que anunciam as boas-novas! 16Porém, nem todos obedeceram à Boa-Nova. É Isaías quem o diz: Senhor, quem acreditou na nossa pregação? 17Portanto, a fé surge da pregação, e a pregação surge pela palavra de Cristo. 18Mas, pergunto eu, será que não a ouviram? Pelo contrário: A voz deles ressoou por toda a terra e até aos confins do mundo as suas palavras.

    A fé leva à salvação quando nos abandonamos a Deus, reconhecendo-O como único Salvador. Mas a fé pressupõe a escuta da Palavra, pela pregação dos missionários. A pregação e a fé têm o mesmo objeto: o mistério de Jesus-Senhor, morto e ressuscitado pelo poder de Deus Pai. Por isso, quando alguém acredita, expropria-se de si mesmo e torna-se propriedade de Deus, garante e fundamento de toda a confiança dos homens n´Ele. Mas também a pregação pressupõe um evento histórico absolutamente necessário: ter sido enviado. Por outras palavras, a pregação pressupõe a missão. A mensagem evangélica, destinada a todos os povos, passa pela escolha que Jesus faz das suas testemunha e pelo seu envio em missão: "Ide pelo mundo inteiro, proclamai o Evangelho a toda a criatura." (Mc 16, 15).
    Evangelho: Mateus 4, 18-22

    Caminhando ao longo do mar da Galileia, Jesus viu dois irmãos: Simão, chamado Pedro, e seu irmão André, que lançavam as redes ao mar, pois eram pescadores. 19Disse-lhes: «Vinde comigo e Eu farei de vós pescadores de homens.» 20E eles deixaram as redes imediatamente e seguiram-no. 21Um pouco mais adiante, viu outros dois irmãos: Tiago, filho de Zebedeu, e seu irmão João, os quais, com seu pai, Zebedeu, consertavam as redes, dentro do barco. Chamou-os, e 22eles, deixando no mesmo instante o barco e o pai, seguiram-no.

    Jesus reúne à sua volta alguns discípulos aos quais dirige um especial ensinamento, porque os quer como discípulos e como testemunhas. Depois da Ressurreição, enviá-los-á ao mundo inteiro. Os Doze, de pescadores de peixes, tornam-se pescadores de homens. É o que Jesus lhes garante: "farei de vós pescadores de homens" (v. 19). André, com o seu irmão Simão, é um dos primeiros a ouvir o chamamento de Jesus e a segui-l´O. Mateus realça a prontidão com que o fizeram: "E eles deixaram as redes imediatamente e seguiram-no." (v. 20). O seguimento de Jesus não admite hesitações ou demoras. Exige radicalidade!
    Meditatio

    A adesão pronta de André, e dos outros apóstolos, ao seguimento de Jesus e à missão que lhes confiava, permitiram-lhes levar a "Boa Notícia" da salvação aos confins da terra. A fé, adesão a Cristo e ao projeto de salvação que nos propõe, vem da escuta da Palavra, isto é, de Cristo, Palavra definitiva de Deus aos homens. Pregar essa Palavra, para que todos possam conhecê-la e aderir-lhe é, ainda hoje, a missão da Igreja.
    Somos, pois, convidados a escutar a Palavra, a acolhê-la no coração. É, sem dúvida, uma palavra exigente. Mas é Palavra salutar. Por isso, não podemos cair na tentação de lhe fechar os nossos ouvidos. Tal como certos remédios, a Palavra pode fazer-nos momentaneamente sofrer. Mas é a nossa salvação.
    A palavra é também alimento. Os profetas dizem que Deus promoverá no mundo uma fome, não de pão, mas da sua Palavra. Precisamos de experimentar essa fome, sabendo que a Palavra de Deus nos pode saciar para além de todas as realidades terrestres, e muito mais do que podemos imaginar.
    A palavra de Deus é exigência. Jesus fala de uma semente que deve crescer e espalhar-se por todo o lado. É a Palavra que torna fecundo o apostolado. Não pregamos palavras nossas, mas a Palavra que escutamos e acolhemos, e nos impele a proclamá-la, para pôr os homens em comunhão com Deus.
    S. João ensina-nos que não é fácil escutar a palavra, porque não é fácil ser dóceis a Deus. Mas só quem dócil ao Pai, escuta a sua Palavra: "Todo aquele que escutou o ensinamento que vem do Pai e o entendeu vem a mim" (Jo 6, 45).
    A Palavra é a nossa felicidade. A palavra, meio de comunicação humana por excelência, permite-nos comunicar com Deus. Para entrar em comunicação e em comunhão com Deus, havemos de acolher a sua Palavra em nós.
    Que Santo André nos ensine a escutar e a acolher a Palavra de Deus, para estarmos em comunhão com Ele e uns com os outros.
    Oratio

    Senhor, abre-nos os ouvidos e o coração à tua Palavra para que estejamos dispostos a seguir-te em radicalidade evangélica e a ser tuas testemunhas onde e como dispuseres. Que a tua Palavra ecoe, hoje, mais eficazmente do que nunca. Que nos demos conta da tua presença e a reconheçamos, hoje, mais do que nunca, sobretudo os que somos jovens. Abandonados à tua solicitude de pastor, não faltarão vocações à tua Igreja. Ámen.
    Contemplatio

    Santo André foi um dos apóstolos que melhor compreendeu e saboreou o mistério da cruz. O seu bom coração foi penetrado pela graça do Calvário. Pregou a cruz na Cítia, no Ponto e noutras regiões. Desejava morrer sobre a cruz, para dar a Nosso Senhor amor por amor. Teve esta graça em Patras. Censurava ao juiz as suas perseguições contra a verdade. O juiz irritado ordenou-lhe que sacrificasse aos deuses. - «É ao Deus todo-poderoso, o único e verdadeiro, respondeu André, que imolo todos os dias, não a carne dos animais, mas o Cordeiro sem mancha, inteiro e cheio de vida sobre o altar, depois de ter sido imolado e dado em alimento aos cristãos». Mostrava assim sobretudo o seu amor pela Eucaristia. Contam que, vendo de longe a cruz sobre a qual devia ser ligado, exclamou: «Eu vos amo, cruz preciosa, que fostes consagrada pelo corpo do meu Deus, e ornada com os seus membros como com ricas pedrarias... Aproximo-me de vós com alegria, recebei-me nos vossos braços... Há muito tempo que vos desejo e que vos procuro. Os meus votos cumpriram-se. Que aquele, que de vós se serviu para me resgatar, se digne receber-me apresentado por vós». Na prática, unamos todas as nossas cruzes quotidianas à cruz de Jesus Cristo. Elas unir-nos-ão aos seus méritos. (Leão Dehon, OSP 4, p.505s.).
    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Deixaram as redes imediatamente e seguiram-no." (Jo 3, 20)."

     

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    S. André, Apóstolo (30 de Novembro)

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