Events in Janeiro 2023

  • Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus - Ano A

    Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus - Ano A


    1 de Janeiro, 2023

    ANO A

    SOLENIDADE DE SANTA MARIA, MÃE DE DEUS
    Dia Mundial da Paz

    Tema da Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus

    Neste dia, a liturgia coloca-nos diante de evocações diversas, ainda que todas importantes. Celebra-se, em primeiro lugar, a Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus: somos convidados a contemplar a figura de Maria, aquela mulher que, com o seu "sim" ao projecto de Deus, nos ofereceu Jesus, o nosso libertador. Celebra-se, em segundo lugar, o Dia Mundial da Paz: em 1968, o Papa Paulo VI propôs aos homens de boa vontade que, neste dia, se rezasse pela paz no mundo. Celebra-se, finalmente, o primeiro dia do ano civil: é o início de uma caminhada percorrida de mãos dadas com esse Deus que nos ama, que em cada dia nos cumula da sua bênção e nos oferece a vida em plenitude.
    As leituras que hoje nos são propostas exploram, portanto, estas diversas coordenadas. Elas evocam esta multiplicidade de temas e de celebrações.
    Na primeira leitura, sublinha-se a dimensão da presença contínua de Deus na nossa caminhada e recorda-se que a sua bênção nos proporciona a vida em plenitude.
    Na segunda leitura, a liturgia evoca, outra vez, o amor de Deus, que enviou o seu Filho ao encontro dos homens para os libertar da escravidão da Lei e para os tornar seus "filhos". É nessa situação privilegiada de "filhos" livres e amados que podemos dirigir-nos a Deus e chamar-Lhe "abbá" ("papá").
    O Evangelho mostra como a chegada do projecto libertador de Deus (que se tornou realidade plena no nosso mundo através de Jesus) provoca alegria e felicidade naqueles que não têm outra possibilidade de acesso à salvação: os pobres e os marginalizados. Convida-nos, também, a louvar a Deus pelo seu amor e a testemunhar o desígnio libertador de Deus no meio dos homens.
    Maria, a mulher que proporcionou o nosso encontro com Jesus, é o modelo do crente que é sensível aos projectos de Deus, que sabe ler os seus sinais na história, que aceita acolher a proposta de Deus no coração e que colabora com Deus na concretização do projecto divino de salvação para o mundo.
    LEITURA I - Num 6,22-27

    Leitura do Livro dos Números

    O Senhor disse a Moisés:
    «Fala a Aarão e aos seus filhos e diz-lhes:
    Assim abençoareis os filhos de Israel, dizendo:
    'O Senhor te abençoe e te proteja.
    O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face
    e te seja favorável.
    O Senhor volte para ti os seus olhos
    e te conceda a paz'.
    Assim invocarão o meu nome sobre os filhos de Israel
    e Eu os abençoarei».

    AMBIENTE

    O nosso texto situa-nos no Sinai, frente à montanha onde se celebrou a aliança entre Deus e o seu Povo... No contexto das últimas instruções de Jahwéh a Moisés, antes de Israel levantar o acampamento e iniciar a caminhada em direcção à Terra Prometida, é apresentada uma fórmula de bênção, que os "filhos de Aarão" (sacerdotes) deviam pronunciar sobre a comunidade.
    Provavelmente, trata-se de uma fórmula litúrgica utilizada no Templo de Jerusalém para abençoar a comunidade, no final das celebrações litúrgicas, antes de o Povo regressar a suas casas... Essa bênção é aqui apresentada como um dom de Deus, no Sinai.
    A "bênção" ("beraka") é concebida, no universo dos povos semitas, como uma comunicação de vida, real e eficaz, que atinge o "abençoado" e que lhe transmite vigor, força, êxito, felicidade. É um dom que, uma vez pronunciado, não pode ser retirado nem anulado. Aqui, essa comunicação de vida - fruto da generosidade e do amor de Deus - derrama-se sobre os membros da comunidade por intermédio dos sacerdotes (no Antigo Testamento, os intermediários entre o mundo de Jahwéh e a comunidade israelita).

    MENSAGEM

    Esta "bênção" apresenta-se numa tríplice fórmula, sempre em crescendo (no texto hebraico, a primeira afirmação tem três palavras; a segunda, cinco; a terceira, sete). Em cada uma das fórmulas, é pronunciado o nome de Jahwéh... Ora, pronunciar três vezes o nome do Deus da aliança é dar uma nova actualidade à aliança, às suas promessas e às suas exigências; é lembrar aos israelitas que é do Deus da aliança que recebem a vida nas suas múltiplas manifestações e que tudo é um dom de Deus.
    A cada uma das invocações, correspondem dois pedidos de bênção: "que Jahwéh te abençoe (isto é, que te comunique a sua vida) e te proteja"; "que Jahwéh faça brilhar sobre ti a sua face (hebraísmo que se pode traduzir como 'que te mostre um rosto sorridente e favorável') e te conceda a sua graça"; que Jahwéh dirija para ti o seu olhar (hebraísmo que significa 'olhar para ti com benevolência', 'acolher-te') e te conceda a paz" (em hebraico: 'shalom' - no sentido de bem-estar, harmonia, felicidade plena).
    Este texto lembra ao israelita que tudo é um dom do amor de Jahwéh e que o Deus da aliança está ao lado do seu Povo em cada dia do ano, oferecendo-lhe a vida plena e a felicidade em abundância.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pode fazer-se a partir dos seguintes dados:

    • Em primeiro lugar, somos convidados a tomar consciência da generosidade do nosso Deus, que nunca nos abandona, mas que continua a sua tarefa criadora derramando sobre nós, continuamente, a vida em plenitude.

    • É de Deus que tudo recebemos: vida, saúde, força, amor e aquelas mil e uma pequeninas coisas que enchem a nossa vida e que nos dão instantes plenos. Tendo consciência dessa presença contínua de Deus ao nosso lado, do seu amor e do seu cuidado, somos gratos por isso? No nosso diálogo com Ele, sentimos a necessidade de O louvar e de Lhe agradecer por tudo o que Ele nos oferece? Agradecemos todos os dons que Ele derramou sobre nós no ano que acaba de terminar
    ?

    • É preciso ter consciência de que a "bênção" de Deus não cai do céu como uma chuva mágica que nos molha, quer queiramos, quer não (magia e Deus não combinam); mas a vida de Deus, derramada sobre nós continuamente, tem de ser acolhida com amor e gratidão e, depois, transformada em gestos concretos de amor e de paz. É preciso que o nosso coração diga "sim", para que a vida de Deus nos atinja e nos transforme.
    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 66 (67)

    Refrão: Deus Se compadeça de nós e nos dê a sua bênção.

    Deus Se compadeça de nós e nos dê a sua bênção,
    resplandeça sobre nós a luz do seu rosto.
    Na terra se conhecerão os seus caminhos
    e entre os povos a sua salvação.

    Alegrem-se os céus e exultem as nações,
    porque julgais os povos com justiça
    e governais as nações sobre a terra.

    Os povos Vos louvem, ó Deus,
    todos os povos Vos louvem.
    Deus nos dê a sua bênção
    e chegue o seu temor aos confins da terra.
    LEITURA II - Gal 4,4-7

    Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Gálatas

    Irmãos:
    Quando chegou a plenitude dos tempos,
    Deus enviou o seu Filho,
    nascido de uma mulher e sujeito à Lei,
    para resgatar os que estavam sujeitos à Lei
    e nos tornar seus filhos adoptivos.
    E porque sois filhos,
    Deus enviou aos nossos corações
    o Espírito de seu Filho, que clama:
    «Abbá! Pai!».
    Assim, já não és escravo, mas filho.
    E, se és filho, também és herdeiro, por graça de Deus.

    AMBIENTE

    Entre as comunidades cristãs do norte da Galácia manifestou-se, pelos anos 55/56, uma grave crise... À região gálata chegaram pregadores cristãos de origem judaica, que punham em causa a validade e a legitimidade do Evangelho anunciado por Paulo. Este era acusado de pregar um Evangelho mutilado, distante do Evangelho pregado pelos apóstolos de Jerusalém... Para estes pregadores ("judaízantes"), a fé em Cristo devia ser complementada pelo cumprimento rigoroso da Lei de Moisés, nomeadamente pelo rito da circuncisão.
    Paulo foi avisado da situação quando estava em Éfeso. Não o preocupava que a sua pessoa fosse posta em causa; preocupava-o o dano que este tipo de discurso podia trazer às comunidades cristãs... Paulo estava convencido que o movimento religioso iniciado por Jesus de Nazaré não era uma religião formalista e ritual, uma religião de práticas exteriores, como o judaísmo farisaico do seu tempo, que se preocupava com questões formais e secundárias; além disso, estava convencido de que a salvação não tinha a ver com conquistas humanas (como se a salvação fosse conseguida à custa dos actos heróicos do homem), mas era um dom de Deus.
    Alarmado pela gravidade da situação, Paulo escreveu aos gálatas. Com alguma dureza (justificada pela gravidade do problema), Paulo diz aos gálatas que o cristianismo é liberdade e que a acção de Cristo libertou os homens da escravidão da Lei... Os gálatas devem, portanto, fazer a sua escolha: pela escravidão, ou pela liberdade; no entanto - não deixa de observar Paulo - é uma estupidez ter experimentado a liberdade e querer voltar à escravidão...
    No texto que nos é proposto, Paulo recorda aos gálatas a incarnação de Cristo e o objectivo da sua vinda ao mundo: fazer dos que a Ele aderem "filhos de Deus" livres.

    MENSAGEM

    Paulo recorda aqui aos gálatas algo de fundamental: Cristo veio a este mundo para libertá-los, definitivamente, do jugo da Lei; a consequência da acção redentora de Cristo é que os homens deixaram de ser escravos e passaram a ser "filhos" que partilham a vida de Deus.
    A palavra-chave é, aqui, a palavra "filho", aplicada tanto a Cristo como aos cristãos. Cristo, o "Filho", foi enviado ao mundo pelo Pai com uma missão concreta: libertar os homens de uma religião de ritos estéreis e inúteis, que não potenciava o encontro entre Deus e os homens; e Cristo, identificando os homens com Ele, levou-os a um novo tipo de relacionamento com Deus e fê-los "filhos" de Deus. Por acção de Cristo, os homens deixaram de ser escravos (que cumprem obrigatoriamente regras e leis) e passaram a relacionar-se com Deus como "filhos" livres e amados, herdeiros com Cristo da vida eterna. Depois desta "promoção", fará algum sentido querer voltar a ser escravo da religião das leis e dos ritos?
    A nova situação dos homens dá-lhes o direito de chamar a Deus "abbá" ("papá"). Paulo utiliza esta palavra aqui (bem como na Carta aos Romanos), apesar de os judeus nunca designarem Deus desta forma. Ela expressa uma relação muito próxima, muito íntima, do género daquela que uma criança tem com o seu pai: exprime a confiança absoluta, a entrega total, o amor sem limites. A insistência de Paulo nesta palavra deve ter a ver com o Jesus histórico: Jesus adoptou-a para expressar a sua confiança filial em Deus e a sua entrega total à sua causa. Ora, é este tipo de relação que os cristãos, identificados com Cristo, são convidados a estabelecer com Deus.
    Gal 4,4 é o único lugar em que Paulo se refere à mãe de Jesus ("Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher"); no entanto, Paulo não parece interessado, aqui, em falar de Nossa Senhora, mas em sublinhar a solidariedade de Cristo com o género humano.

    ACTUALIZAÇÃO

    Considerar, na reflexão, as seguintes questões:

    • A experiência cristã é, fundamentalmente, uma experiência de encontro com um Deus que é "abbá" - i
    sto é, que é um "papá" muito próximo, com quem nos identificamos, a quem amamos, a quem nos entregamos e em quem confiamos plenamente. É esta proximidade libertadora e confiante que temos com o nosso Deus?

    • A nossa experiência cristã leva-nos a sentirmo-nos "filhos" amados, ou ao cumprimento de regras e de obrigações? Na Igreja não se põe, às vezes, a ênfase em cumprir leis e ritos externos, esquecendo o essencial - a experiência de "filhos" livres e amados de Deus?

    • A importante constatação de que somos "filhos" de Deus leva-nos a uma descoberta fundamental: estamos unidos a todos os outros homens - "filhos" de Deus como nós - por laços fraternos. É a mesma vida de Deus que circula em todos nós... O que é que esta constatação implica, em termos concretos? A que é que ela nos obriga? Faz algum sentido marginalizar alguém por causa da sua raça ou estatuto social? Aquilo que acontece aos outros - de bom e de mau - não nos diz respeito?
    ALELUIA - Hebr 1,1-2

    Aleluia. Aleluia.

    Muitas vezes e de muitos modos
    falou Deus antigamente aos nossos pais pelos Profetas.
    Nestes dias, que são os últimos,
    Deus falou-nos por seu Filho.
    EVANGELHO - Lc 2,16-21

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas

    Naquele tempo,
    os pastores dirigiram-se apressadamente para Belém
    e encontraram Maria, José
    e o Menino deitado na manjedoura.
    Quando O viram, começaram a contar
    o que lhes tinham anunciado sobre aquele Menino.
    E todos os que ouviam
    admiravam-se do que os pastores diziam.
    Maria conservava todas estas palavras,
    meditando-as em seu coração.
    Os pastores regressaram, glorificando e louvando a Deus
    por tudo o que tinham ouvido e visto,
    como lhes tinha sido anunciado.
    Quando se completaram os oito dias
    para o Menino ser circuncidado,
    deram-Lhe o nome de Jesus,
    indicado pelo Anjo,
    antes de ter sido concebido no seio materno.

    AMBIENTE

    O texto do Evangelho de hoje é a continuação daquele que foi lido na noite de Natal: após o anúncio do "anjo do Senhor", os pastores (destinatários desse anúncio) dirigiram-se a Belém e encontraram o menino, deitado numa manjedoura de uma gruta de animais. Mais uma vez, Lucas não está interessado em fazer a reportagem do nascimento de Jesus, ou a crónica social das "visitas" que, então, o menino de Belém recebeu; mas está, sobretudo, interessado em apresentar uma catequese que dê a entender (aos cristãos a quem o texto se destina) quem é esse menino e qual a missão de que ele foi investido por Deus. Nesta catequese fica bem claro que Jesus é o Messias libertador, enviado a trazer a paz; e há, também, uma reflexão sobre a resposta que Deus espera do homem.

    MENSAGEM

    Como pano de fundo do nosso texto está, portanto, a ideia de que, com a chegada de Jesus, atingimos o centro do tempo salvífico... Em Jesus, a proposta libertadora que Deus tinha para nos oferecer veio ao nosso encontro e materializou-se no meio dos homens; o próprio nome ("Jesus" significa "Jahwéh salva") que foi dado ao menino, por indicação do anjo que anunciou o seu nascimento, aponta nesse sentido. Por outro lado, o facto de essa "boa notícia" ser dada, em primeiro lugar, aos pastores (classe marginalizada, considerada impura, pecadora e muito longe de Deus e da salvação) significa que a proposta de Jesus se destina, de forma especial, aos pobres e marginalizados, àqueles que a teologia oficial excluía e condenava. Diz-lhes que Deus os ama, que conta com eles e que os convoca para fazer parte da sua família.
    Definida a questão essencial, atentemos nas atitudes dos intervenientes e na forma como eles respondem à chegada de Jesus...
    Em primeiro lugar, repare-se como os pastores, depois de escutarem a "boa nova" do nascimento do libertador, se dirigem "apressadamente" ao encontro do menino. A palavra "apressadamente" sublinha a ânsia com que os pobres e os marginalizados esperam a acção libertadora de Deus em seu favor. Aqueles que vivem numa situação intolerável de sofrimento e de opressão reconhecem Jesus como o único salvador e apressam-se a ir ao seu encontro. É d'Ele e de mais ninguém que brota a libertação por que os oprimidos anseiam. A disponibilidade de coração para acolher a sua proposta é a primeira coisa que Deus pede.
    Em segundo lugar, repare-se como os pastores reagem ao encontro com Jesus... Começam por glorificar e louvar a Deus por tudo o que tinham visto e ouvido: é a alegria pela libertação que se converte em acção de graças ao Deus libertador. Depois, esse louvor torna-se testemunho: quem faz a experiência do encontro com Deus libertador tem, obrigatoriamente, de dar testemunho, a fim de que os outros homens possam participar da mesma experiência gratificante.
    Finalmente, atentemos na atitude de Maria: ela "conservava todas estas palavras, meditando-as no seu coração". É a atitude de quem é capaz de abismar-se com as acções do Deus libertador, com o amor que Ele manifesta nos seus gestos em favor dos homens. "Observar", "conservar" e "meditar" significa ter a sensibilidade para entender os sinais de Deus e ter a sabedoria da fé para saber lê-los à luz do plano de Deus. É precisamente isso que faziam os profetas.
    A atitude meditativa de Maria, que interioriza e aprofunda os acontecimentos, complementa a atitude "missionária" dos pastores, que proclamam a acção salvadora de Deus, manifestada no nascimento de Jesus. Estas duas atitudes definem duas coordenadas essenciais daquilo que deve ser a existência do crente.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pode partir dos seguintes elementos:

    • No Evangelho que, hoje, nos é proposto fica claro o fio condutor da história da salvação: Deus ama-nos, quer a nossa plena felicidade e, por isso,
    tem um projecto de salvação para levar-nos a superar a nossa fragilidade e debilidade; e esse projecto foi-nos apresentado na pessoa, nas palavras e nos gestos de Jesus. Temos consciência de que a verdadeira libertação está na proposta que Deus nos apresentou em Jesus e não nas ideologias, ou no poder do dinheiro, ou na posição que ocupamos na escala social? Porque é que tantos dos nossos irmãos vivem afogados no desespero e na frustração? Porque é que tanta gente procura "salvar-se" em programas de televisão que lhes dê uns minutos de fama, ou num consumismo alienante? Não será porque não fomos capazes de lhes apresentar a proposta libertadora de Jesus?

    • Diante da "boa nova" da libertação, reagimos - como os pastores - com o louvor e a acção de graças? Sabemos ser gratos ao nosso Deus pelo seu amor e pelo seu empenho em nos libertar da escravidão?

    • Os pastores, após terem tomado contacto com o projecto libertador de Deus, fizeram-se "testemunhas" desse projecto. Sentimos, também, o imperativo do testemunho? Temos consciência de que a experiência da libertação é para ser passada aos nossos irmãos que ainda a desconhecem?

    • Maria "conservava todas estas palavras e meditava-as no seu coração". Quer dizer: ela era capaz de perceber os sinais do Deus libertador no acontecer da vida. Temos, como ela, a sensibilidade de estar atentos à vida e de perceber a presença - discreta, mas significativa, actuante e transformadora - de Deus, nos acontecimentos mais ou menos banais do nosso dia a dia?

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador: P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

     

  • São Basílio Magno e São Gregório Nanzianzeno

    São Basílio Magno e São Gregório Nanzianzeno


    2 de Janeiro, 2023

    Basílio de Cesareia (329-379) nasceu duma família profundamente cristã, na Capadócia, região da atual Turquia. Com o seu irmão, Gregório de Nissa e o amigo Gregório de Nazianzo, forma o grupo dos chamados "Padres Capadócios", que tiveram importante papel na divulgação da doutrina do Concílio de Niceia sobre a Santíssima Trindade.

    Basílio e o seu irmão receberam esmerada educação. Durante a sua formação humanista, em Atenas, estabeleceram uma grande amizade com Gregório de Nazianzo. Juntos iniciaram uma nova forma de vida monástica, o chamado monaquismo basiliano, que continua a ser vivido sobretudo no Oriente.

    Basílio, ordenado sacerdote e bispo, distinguiu-se pelas suas obras caritativas e pelo esplendor que deu ao culto divino. Deixou-nos preciosas obras teológicas, espirituais e homiléticas.

    Gregório de Nazianzo (330-390) nasceu igualmente de uma família cristã piedosa. A sua mãe ofereceu-o ao Senhor, tendo-lhe proporcionado uma boa educação, que o levou a ser reitor e a ser proposto para altos cargos civis. Com os seus amigos, Basílio e Gregório de Nissa, abandonou o mundo para se tornar monge. Já sacerdote, foi nomeado bispo de Constantinopla (381), permanecendo sobretudo um místico, cantor apaixonado da SS. Trindade. Os seus escritos revelam a sua experiência e inteligência do mistério de Cristo. Foi chamado "o teólogo".

    Lectio

    Primeira leitura: 1 Coríntios 2, 10b-16

    Irmãos: o Espírito tudo penetra, até as profundidades de Deus. 11Quem, de entre os homens, conhece o que há no homem, senão o espírito do homem que nele habita? Assim também, as coisas que são de Deus, ninguém as conhece, a não ser o Espírito de Deus. 12Quanto a nós, não recebemos o espírito do mundo, mas o Espírito que vem de Deus, para podermos conhecer os dons da graça de Deus. 13E deles não falamos com palavras que a sabedoria humana ensina, mas com as que o Espírito inspira, falando de realidades espirituais em termos espirituais. 14O homem terreno não aceita o que vem do Espírito de Deus, pois é uma loucura para ele. Não o pode compreender, pois só de modo espiritual pode ser avaliado. 15Pelo contrário, o homem espiritual julga todas as coisas e a ele ninguém o pode julgar. 16Pois quem conheceu o pensamento do Senhor, para poder instruí-lo? Mas nós temos o pensamento de Cristo.
    Paulo justifica o seu ministério afirmando que recebeu o Espírito que vem de Deus (cf. v. 12). Só o Espírito de Deus nos torna "homens espirituais", capazes de conhecer os mistérios divinos e nos dá uma mentalidade conforme ao "pensamento do Senhor" (v. 16). O homem terreno, isto é, aquele que apenas possui o espírito do mundo e se deixa conduzir por ele, não pode compreender as coisas do Espírito e aceitar a "loucura" da mensagem evangélica, que culmina na Cruz. S. Basílio e S. Gregório, como todos os santos, deixaram-se fascinar por Cristo, assumiram o seu modo de pensar e viveram em conformidade com ele. Tornaram-se, assim, verdadeiros homens espirituais, capazes de julgar todas as coisas.

    Evangelho: Mateus 5, 13-16

    Naquele tempo, Jesus disse aos seus discípulos: «Vós sois o sal da terra. Ora, se o sal se corromper, com que se há-de salgar? Não serve para mais nada, senão para ser lançado fora e ser pisado pelos homens. 14Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade situada sobre um monte; 15nem se acende a candeia para a colocar debaixo do alqueire, mas sim em cima do candelabro, e assim alumia a todos os que estão em casa. 16Assim brilhe a vossa luz diante dos homens, de modo que, vendo as vossas boas obras, glorifiquem o vosso Pai, que está no Céu.»

    Depois de proclamar as Bem-aventuranças, Mateus apresenta dois provérbios em forma de parábola que definem a missão dos discípulos: ser sal e luz. Tal como o sal e a luz influem sobre os alimentos e sobre as realidades terrenas, assim os discípulos de Cristo devem influir sobre o mundo, ajudando-o a descobrir o sentido da vida, para que não seja enganado pelas suas tendências e aspirações rasteiras. Como o sal, os discípulos hão-de dar sabor à humanidade e preservá-la da corrupção. Como a luz, hão-de ser para o mundo um raio do esplendor da glória de Deus. Tudo isso acontece quando os discípulos vivem à maneira de Cristo, guiados pela fé e atuando a caridade. A vida cristã é um compromisso com Deus, que tem implicações sociais e universais. Por isso, não deve ser escondida, mas brilhar no mundo, para glória de Deus.

    Meditatio

    Basílio de Cesareia e Gregório de Nissa são exemplos de cristãos cujas vidas refletem o Evangelho, verdadeiros luminares da fidelidade e da beleza do ideal cristão.

    Basílio, dotado de forte personalidade, foi um homem de pensamento e de ação. Escreveu e pregou, especulou e socorreu. Gregório é o filósofo elegante, o poeta delicado, o contemplativo irrequieto. Ambos nos revelam o que significa tornar-se discípulos da verdadeira sabedoria e receber o dom do Espírito, que perscruta as profundezas de Deus. Estes dois amigos, que hoje celebramos foram génios e santos. Por isso, a Igreja os venera como santos e doutores. A caridade de Deus fê-los operadores de bem e servidores dos irmãos, como monges, como padres e como bispos. Ambos cantaram a beleza de Deus. Como amigos e companheiros, compreenderam que o seu ideal mais profundo era o amor da sabedoria. Movia-os a ânsia de saber. Escreve Gregório: "Uma só tarefa e um só objetivo havia para ambos: aspirar à virtude, viver para as esperanças futuras e comportar-nos de tal modo que, mesmo antes de ter partido desta vida, tivéssemos emigrado dela. Esse foi o ideal que nos propusemos, e assim tratávamos de orientar a nossa vida e as nossas ações, em atitude de docilidade aos mandamentos divinos, entusiasmando-nos mutuamente à prática do bem: e, se não parecer demasiada arrogância, direi que éramos um para o outro a norma e a regra para discernir o bem do mal".

    Oratio

    Vem Espírito Santo, eleva o meu coração, ampara a minha fraqueza, conduz-me à perfeição da caridade. Purifica-me de todo o mal e, pela união contigo, faz-me homem espiritual. Penetra-me e enche-me com a tua luz divina de modo que eu mesmo me torne luminoso e reflita ao meu redor a tua luz, a tua graça. Ámen.

    Contemplatio

    Jesus viera para operar a grande obra da reconciliação. Tudo estava preparado e, no entanto, leva uma longa vida de trinta anos, desconhecida, escondida, em aparência inativa e inútil. O Redentor tinha sido prometido ao género humano e anunciado pelos profetas. Os sinais da sua vinda estavam marcados. Era esperado pelos justos com um ardente desejo. Prodígios foram realizados na altura do seu nascimento. A própria natureza manifestou a sua alegria pela vinda do Criador. Uma estrela maravilhosa surpreendeu os sábios do Oriente e conduziu-os ao presépio. Mas logo a seguir, que silêncio! Tudo retorna à obscuridade e à calma. Os que acreditavam verdadeiramente que seguiam a atração da graça, a voz dos anjos e as inspirações do Espírito Santo conservavam no seu coração a recordação dos mistérios, que tinham tido um brilho tão curto. Adoravam no silêncio, na esperança e no abandono, os decretos da sabedoria, do amor e da misericórdia de Deus. E esta vida obscura, vida de submissão, de trabalho e da misericórdia de Deus vai durar trinta anos! Quem é que está em condição de aprofundar as vias da sabedoria, do amor e da bondade de Deus? Quem pode conceber e contar os atos de virtude destes anos de obscuridade? E então porquê tudo isto? Porquê esta viagem penosa e longa ao país pagão e idólatra? Porque Jesus era vítima, porque era libertador e redentor; porque isto correspondia aos desígnios de misericórdia que os homens não podiam compreender perfeitamente. (L. Dehon, OSP 3, p. 41).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:

    "Para nós o maior título de glória era sermos cristãos
    e como tal reconhecidos" (S. Gregório Nazianzeno).

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    S. Basílio Magno e s. Gregório Nanzianzeno (2 Janeiro)
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  • Solenidade da Epifania do Senhor - Ano A

    Solenidade da Epifania do Senhor - Ano A


    8 de Janeiro, 2023

    ANO A
    SOLENIDADE DA EPIFANIA DO SENHOR

    Tema do Domingo da Epifania

    A liturgia deste domingo celebra a manifestação de Jesus a todos os homens... Ele é uma "luz" que se acende na noite do mundo e atrai a si todos os povos da terra. Cumprindo o projecto libertador que o Pai nos queria oferecer, essa "luz" incarnou na nossa história, iluminou os caminhos dos homens, conduziu-os ao encontro da salvação, da vida definitiva.
    A primeira leitura anuncia a chegada da luz salvadora de Jahwéh, que transfigurará Jerusalém e que atrairá à cidade de Deus povos de todo o mundo.
    No Evangelho, vemos a concretização dessa promessa: ao encontro de Jesus vêm os "magos" do oriente, representantes de todos os povos da terra... Atentos aos sinais da chegada do Messias, procuram-n'O com esperança até O encontrar, reconhecem n'Ele a "salvação de Deus" e aceitam-n'O como "o Senhor". A salvação rejeitada pelos habitantes de Jerusalém torna-se agora um dom que Deus oferece a todos os homens, sem excepção.
    A segunda leitura apresenta o projecto salvador de Deus como uma realidade que vai atingir toda a humanidade, juntando judeus e pagãos numa mesma comunidade de irmãos - a comunidade de Jesus.

    LEITURA I - Is 60,1-6

    Leitura do Livro de Isaías

    Levanta-te e resplandece, Jerusalém,
    porque chegou a tua luz
    e brilha sobre ti a glória do Senhor.
    Vê como a noite cobre a terra
    e a escuridão os povos.
    Mas sobre ti levanta-Se o Senhor,
    e a sua glória te ilumina.
    As nações caminharão à tua luz
    e os reis ao esplendor da tua aurora.
    Olha ao redor e vê:
    todos se reúnem e vêm ao teu encontro;
    os teus filhos vão chegar de longe
    e as tuas filhas são trazidas nos braços.
    Quando o vires ficarás radiante,
    palpitará e dilatar-se-á o teu coração,
    pois a ti afluirão os tesouros do mar,
    a ti virão ter as riquezas das nações.
    Invadir-te-á uma multidão de camelos,
    de dromedários de Madiã e Efá.
    Virão todos os de Sabá;
    hão-de trazer ouro e incenso
    e proclamando as glórias do Senhor.

    AMBIENTE

    Aos capítulos 56-66 do Livro de Isaías, convencionou-se chamar "Trito-Isaías. Trata-se de um conjunto de textos cuja proveniência não é totalmente consensual... Para alguns, são textos de um profeta anónimo, pós-exílico, que exerceu o seu ministério em Jerusalém após o regresso dos exilados da Babilónia, nos anos 537/520 a.C.; para a maioria, trata-se de textos que provêm de diversos autores pós-exílicos e que foram redigidos ao longo de um arco de tempo relativamente longo (provavelmente, entre os sécs. VI e V a.C.). De qualquer forma, estamos na época a seguir ao Exílio e numa Jerusalém em reconstrução... As marcas do passado ainda se notam nas pedras calcinadas da cidade; os judeus que se estabeleceram na cidade são ainda poucos; a pobreza dos exilados faz com que a reconstrução seja lenta e muito modesta; os inimigos estão à espreita e a população está desanimada... Sonha-se, no entanto, com esse dia futuro em que vai chegar Deus para trazer a salvação definitiva ao seu Povo. Então, Jerusalém voltará a ser uma cidade bela e harmoniosa, o Templo será reconstruído e Deus habitará para sempre no meio do seu Povo.
    O texto que nos é proposto é uma glorificação de Jerusalém, a cidade da luz, a "cidade dos dois sóis" (o sol nascente e o sol poente: pela sua situação geográfica, a cidade é iluminada desde o nascer do dia até ao pôr do sol).

    MENSAGEM

    Inspirado, sem dúvida, pelo sol nascente que ilumina as belas pedras brancas das construções de Jerusalém e faz a cidade transfigurar-se pela manhã (e brilhar no meio das montanhas que a rodeiam), o profeta sonha com uma Jerusalém muito diferente daquela que os retornados do Exílio conhecem; essa nova Jerusalém levantar-se-á quando chegar a luz salvadora de Deus, que dará à cidade um novo rosto. Nesse dia, Jerusalém vai atrair os olhares de todos os que esperam a salvação. Como consequência, a cidade será abundantemente repovoada (com o regresso de muitos "filhos" e "filhas" que, até agora, assustados pelas condições de pobreza e de instabilidade, ainda não se decidiram a regressar); além disso, povos de toda a terra - atraídos pela promessa do encontro com a salvação de Deus - convergirão para Jerusalém, inundando-a de riquezas (nomeadamente incenso, para o serviço do Templo) e cantando os louvores de Deus.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pode fazer-se a partir das seguintes linhas:

    • Como pano de fundo deste texto (e da liturgia deste dia) está a afirmação da eterna preocupação de Deus com a vida e a felicidade desses homens e mulheres a quem Ele criou. Sejam quais forem as voltas que a história dá, Deus está lá, vivo e presente, acompanhando a caminhada do seu Povo e oferecendo-lhe a vida definitiva. Esta "fidelidade" de Deus aquece-nos o coração e renova-nos a esperança... Caminhamos pela vida de cabeça levantada, confiando no amor infinito de Deus e na sua vontade de salvar e libertar o homem.

    • É preciso, sem dúvida, ligar a chegada da "luz" salvadora de Deus a Jerusalém (anunciada pelo profeta) com o nascimento de Jesus. O projecto de libertação que Jesus veio apresentar aos homens será a luz que vence as trevas do pecado e da opressão e que dá ao mundo um rosto mais brilhante de vida e de esperança. Reconhecemos em Jesus a "luz" libertadora de Deus? Estamos dispostos a aceitar que essa "luz" nos liberte das trevas do egoísmo, do orgulho e do pecado? Será que, através de nós, essa "luz" atinge o mundo e o coração dos nossos irmãos e transforma tudo numa nova realidade?

    • Na catequese cristã dos primeiros tempos, esta Jerusalém nova, que já "não necessita de sol nem de lua para a iluminar, porque é iluminada pela glória de Deus", é a Igreja - a comunidade dos que aderiram a Jesus e acolheram a luz salvadora que Ele veio trazer (cf. Ap 21,10-14.23-25). Será que nas comunidades cristãs e nas comunidades religiosas brilha a luz libertadora de Jesus? Elas são, pelo seu brilho, uma luz que atrai os homens? As nossas desavenças e conflitos, a nossa falta de amor e de partilha, os nossos ciúmes e rivalidades, não contribuirão para embaciar o brilho dessa luz de Deus que devíamos reflectir?

    • Será que na nossa Igreja há espaço para todos os que buscam a luz libertadora de Deus? Os irmãos que têm a vida destroçada, ou que não se comportam de acordo com as regras da Igreja, são acolhidos, respeitado
    s e amados? As diferenças próprias da diversidade de culturas são vistas como uma riqueza que importa preservar, ou são rejeitadas porque ameaçam a uniformidade?

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 71 (72)

    Refrão: Virão adorar-Vos, Senhor, todos os povos da terra.

    Ó Deus, concedei ao rei o poder de julgar
    e a vossa justiça ao filho do rei.
    Ele governará o vosso povo com justiça
    e os vossos pobres com equidade.

    Florescerá a justiça nos seus dias
    e uma grande paz até ao fim dos tempos.
    Ele dominará de um ao outro mar,
    do grande rio até aos confins da terra.

    Os reis de Társis e das ilhas virão com presentes,
    os reis da Arábia e de Sabá trarão suas ofertas.
    Prostrar-se-ão diante dele todos os reis,
    todos os povos o hão-de servir.

    Socorrerá o pobre que pede auxílio
    e o miserável que não tem amparo.
    Terá compaixão dos fracos e dos pobres
    e defenderá a vida dos oprimidos.

    LEITURA II - Ef 3,2-3a.5-6

    Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Efésios

    Irmãos:
    Certamente já ouvistes falar
    da graça que Deus me confiou a vosso favor:
    por uma revelação,
    foi-me dado a conhecer o mistério de Cristo.
    Nas gerações passadas,
    ele não foi dado a conhecer aos filhos dos homens
    como agora foi revelado pelo Espírito Santo
    aos seus santos apóstolos e profetas:
    os gentios recebem a mesma herança que os judeus,
    pertencem ao mesmo corpo
    e participam da mesma promessa,
    em Cristo Jesus, por meio do Evangelho.

    AMBIENTE

    A Carta aos Efésios (cuja autoria paulina alguns discutem por questões de linguagem, de estilo e de teologia) apresenta-se como uma "carta de cativeiro", escrita por Paulo da prisão (os que aceitam a autoria paulina desta carta discutem qual o lugar onde Paulo está preso, nesta altura, embora a maioria ligue a carta ao cativeiro de Paulo em Roma entre 61/63).
    É, de qualquer forma, uma apresentação sólida de uma catequese bem elaborada e amadurecida. A carta (talvez uma "carta circular", enviada a várias comunidades cristãs da parte ocidental da Ásia Menor) parece apresentar uma espécie de síntese do pensamento paulino.
    O tema mais importante da Carta aos Efésios é aquilo que o autor chama "o mistério": trata-se do projecto salvador de Deus, definido e elaborado desde sempre, escondido durante séculos, revelado e concretizado plenamente em Jesus, comunicado aos apóstolos e, nos "últimos tempos", tornado presente no mundo pela Igreja.
    Na parte dogmática da carta (cf. Ef 1,3-3,19), Paulo apresenta a sua catequese sobre "o mistério": depois de um hino que põe em relevo a acção do Pai, do Filho e do Espírito Santo na obra da salvação (cf. Ef 1,3-14), o autor fala da soberania de Cristo sobre os poderes angélicos e do seu papel de cabeça da Igreja (cf. Ef 1,15-23); depois, reflecte sobre a situação universal do homem, mergulhado no pecado e afirma a iniciativa salvadora e gratuita de Deus em favor do homem (cf. Ef 2,1-10); expõe, ainda, como é que Cristo - realizando "o mistério" - levou a cabo a reconciliação de judeus e pagãos num só corpo, que é a Igreja (cf. 2,11-22)... O texto que nos é proposto vem nesta sequência: nele, Paulo apresenta-se como testemunha do "mistério" diante dos judeus e diante dos pagãos (cf. Ef 3,1-13).

    MENSAGEM

    A Paulo, apóstolo como os Doze, também foi revelado "o mistério". É esse "mistério" que Paulo aqui desvela aos crentes da Ásia Menor... Paulo insiste que, em Cristo, chegou a salvação definitiva para os homens; e essa salvação não se destina exclusivamente aos judeus, mas destina-se a todos os povos da terra, sem excepção. Paulo é, por chamamento divino, o arauto desta novidade... Percebemos, assim, porque é que Paulo se fez o grande arauto da "boa nova" de Jesus entre os pagãos...
    Agora, judeus e gentios são membros de um mesmo e único "corpo" (o "corpo de Cristo" ou Igreja), partilham o mesmo projecto salvador que os faz, em igualdade de circunstâncias com os judeus, "filhos de Deus" e todos participam da promessa feita por Deus a Abraão (cf. Gn 12,3) - promessa cuja realização Cristo levou a cabo.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pode fazer-se a partir dos seguintes elementos:

    • A perspectiva de que Deus tem um projecto de salvação para oferecer ao seu Povo - já enunciada na primeira leitura - tem aqui novos desenvolvimentos. A primeira novidade é que Cristo é a revelação e a realização plena desse projecto. A segunda novidade é que esse projecto não se destina apenas "a Jerusalém" (ao mundo judaico), mas é para ser oferecido a todos os povos, sem excepção.

    • A Igreja, "corpo de Cristo", é a comunidade daqueles que acolheram "o mistério". Nela, brancos e negros, pobres e ricos, ucranianos ou moldavos - beneficiários todos da acção salvadora e libertadora de Deus - têm lugar em igualdade de circunstâncias. Temos, verdadeiramente, consciência de que é nesta comunidade de crentes que se revela hoje no mundo o projecto salvador que Deus tem para oferecer a todos os homens? Na vida das nossas comunidades transparece, realmente, o amor de Deus? As nossas comunidades são verdadeiras comunidades fraternas, onde todos se amam sem distinção de raça, de cor ou de estatuto social?

    • Destinatários, todos, do mistério, somos "filhos de Deus" e irmãos uns dos outros. Essa fraternidade implica o amor sem limites, a partilha, a solidariedade... Sentimo-nos solidários com todos os irmãos que partilham connosco esta vasta casa que é o mundo? Sentimo-nos responsáveis pela sorte de todos os nossos irmãos, mesmo aqueles que estão separados de nós pela geografia, pela diversidade de culturas e de raças?

    ALELUIA - Mt 2,2

    Aleluia. Aleluia

    Vimos adorar a sua estrela no Oriente
    e viemos adorar o Senhor.

    EVANGELHO - Mt 2,1-12

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

    Tinha Jesus nascido em Belém da Judeia,
    nos dias do rei Herodes,
    quando chegaram a Jerusalém uns Magos vindos do Oriente.
    «Onde está - perguntaram eles –
    o rei dos judeus que acaba de nascer?
    Nós vimos a sua estrela no Oriente
    e viemos adorá-l'O».
    Ao ouvir tal notícia, o rei Herodes ficou perturbado
    e, com ele, toda a cidade de Jerusalém.
    Reuniu todos os príncipes dos sacerdotes e escribas do povo
    e perguntou-lhes onde devia nascer o Messias.
    Eles responderam:
    «Em Belém da Judeia,
    porque assim está escrito pelo profeta:
    'Tu, Belém, terra de Judá,
    n&atil
    de;o és de modo nenhum a menor
    entre as principais cidades de Judá,
    pois de ti sairá um chefe,
    que será o Pastor de Israel, meu povo'».
    Então Herodes mandou chamar secretamente os Magos
    e pediu-lhes informações precisas
    sobre o tempo em que lhes tinha aparecido a estrela.
    Depois enviou-os a Belém e disse-lhes:
    «Ide informar-vos cuidadosamente acerca do Menino;
    e, quando O encontrardes, avisai-me,
    para que também eu vá adorá-l'O».
    Ouvido o rei, puseram-se a caminho.
    E eis que a estrela que tinham visto no Oriente
    seguia à sua frente
    e parou sobre o lugar onde estava o Menino.
    Ao ver a estrela, sentiram grande alegria.
    Entraram na casa,
    viram o Menino com Maria, sua Mãe,
    e, caindo de joelhos,
    prostraram-se e adoraram-n'O.
    Depois, abrindo os seus tesouros, ofereceram-Lhe presentes:
    ouro, incenso e mirra.
    E, avisados em sonhos
    para não voltarem à presença de Herodes,
    regressaram à sua terra por outro caminho.

    AMBIENTE

    O episódio da visita dos magos ao menino de Belém é um episódio simpático e terno que, ao longo dos séculos, tem provocado um impacto considerável nos sonhos e nas fantasias dos cristãos... No entanto, convém recordar que estamos, ainda, no âmbito do "Evangelho da Infância"; e que os factos narrados nesta secção não são a descrição exacta de acontecimentos históricos, mas uma catequese sobre Jesus e a sua missão... Por outras palavras: Mateus não está, aqui, interessado em apresentar uma reportagem jornalística que conte a visita oficial de três chefes de estado estrangeiros à gruta de Belém; mas está interessado, recorrendo a símbolos e imagens bem expressivos para os primeiros cristãos, em apresentar Jesus como o enviado de Deus Pai, que vem oferecer a salvação de Deus aos homens de toda a terra.

    MENSAGEM

    A análise dos vários detalhes do relato confirma que a preocupação do autor (Mateus) não é de tipo histórico, mas catequético.
    Notemos, em primeiro lugar, a insistência de Mateus no facto de Jesus ter nascido em Belém de Judá (cf. vers. 1.5.6.7). Para entender esta insistência, temos de recordar que Belém era a terra natal do rei David e que era a Belém que estava ligada a família de David. Afirmar que Jesus nasceu em Belém é ligá-lo a esses anúncios proféticos que falavam do Messias como o descendente de David que havia de nascer em Belém (cf. Mi 5,1.3; 2 Sm 5,2) e restaurar o reino ideal de seu pai. Com esta nota, Mateus quer aquietar aqueles que pensavam que Jesus tinha nascido em Nazaré e que viam nisso um obstáculo para O reconhecerem como o Messias libertador.
    Notemos, em segundo lugar, a referência a uma estrela "especial" que apareceu no céu por esta altura e que conduziu os "magos" para Belém. A interpretação desta referência como histórica levou alguém a cálculos astronómicos complicados para concluir que, no ano 6 a.C., uma conjunção de planetas explicaria o fenómeno luminoso da estrela refulgente mencionada por Mateus; outros andaram à procura de um cometa que, por esta época, devia ter sulcado os céus do antigo Médio Oriente... Na realidade, é inútil procurar nos céus a estrela ou cometa em causa, pois Mateus não está a narrar factos históricos. Segundo a crença popular da época, o nascimento de um personagem importante era acompanhado da aparição de uma nova estrela. Também a tradição judaica anunciava o Messias como a estrela que surge de Jacob (cf. Nm 24,17). Ora, é com estes elementos que a imaginação de Mateus, posta ao serviço da catequese, vai inventar a "estrela". Mateus está, sobretudo, interessado em fornecer aos cristãos da sua comunidade argumentos seguros para rebater aqueles que negavam que Jesus era esse Messias esperado.
    Temos, ainda, as figuras dos "magos". A palavra grega "mágos" usada por Mateus abarca um vasto leque de significados e é aplicada a personagens muito diversas: mágicos, feiticeiros, charlatães, sacerdotes persas, propagandistas religiosos... Aqui, poderia designar astrólogos mesopotâmios, em contacto com o messianismo judaico. Seja como for, esses "magos" representam, na catequese de Mateus, esses povos estrangeiros de que falava a primeira leitura (cf. Is 60,1-6), que se põem a caminho de Jerusalém com as suas riquezas (ouro e incenso) para encontrar a luz salvadora de Deus que brilha sobre a cidade santa. Jesus é, na opinião de Mateus e da catequese da Igreja primitiva, essa "luz".
    Além de uma catequese sobre Jesus, este relato recolhe, de forma paradigmática, duas atitudes que se vão repetir ao longo de todo o Evangelho: o Povo de Israel rejeita Jesus, enquanto que os "magos" do oriente (que são pagãos) O adoram; Herodes e Jerusalém "ficam perturbados" diante da notícia do nascimento do menino e planeiam a sua morte, enquanto que os pagãos sentem uma grande alegria e reconhecem em Jesus o seu salvador.
    Mateus anuncia, desta forma, que Jesus vai ser rejeitado pelo seu Povo; mas vai ser acolhido pelos pagãos, que entrarão a fazer parte do novo Povo de Deus. O itinerário seguido pelos "magos" reflecte a caminhada que os pagãos percorreram para encontrar Jesus: estão atentos aos sinais (estrela), percebem que Jesus é a luz que traz a salvação, põem-se decididamente a caminho para o encontrar, perguntam aos judeus - que conhecem as Escrituras - o que fazer, encontram Jesus e adoram-n'O como "o Senhor". É muito possível que um grande número de pagano-cristãos da comunidade de Mateus descobrisse neste relato as etapas do seu próprio caminho em direcção a Jesus.

    ACTUALIZAÇÃO

    Considerar as seguintes questões:

    • Em primeiro lugar, meditemos nas atitudes das várias personagens que Mateus nos apresenta em confronto com Jesus: os "magos", Herodes, os príncipes dos sacerdotes e os escribas do povo... Diante de Jesus, o libertador enviado por Deus, estes distintos personagens assumem atitudes diversas, que vão desde a adoração (os "magos"), até à rejeição total (Herodes), passando pela indiferença (os sacerdotes e os escribas: nenhum deles se preocupou em ir ao encontro desse Messias que eles conheciam bem dos textos sagrados). Identificamo-nos com algum destes grupos? Não é fácil "conhecer as Escrituras", como profissionais da religião e, depois, deixar que as propostas e os valores de Jesus nos passem ao lado?

    • Os "magos" são apresentados como os "homens dos sinais", que sabem ver na "estrela" o sinal da chegada da libertação... Somos pessoas atentas aos "sinais" - isto é, somos capazes de ler os acontecimentos da nossa história e da nossa vida à luz de Deus? Procuramos perceber nos "sinais" que aparecem no nosso ca
    minho a vontade de Deus?

    • Impressiona também, no relato de Mateus, a "desinstalação" dos "magos": viram a "estrela", deixaram tudo, arriscaram tudo e vieram procurar Jesus. Somos capazes da mesma atitude de desinstalação, ou estamos demasiado agarrados ao nosso sofá, ao nosso colchão especial, à nossa televisão, à nossa aparelhagem? Somos capazes de deixar tudo para responder aos apelos que Jesus nos faz através dos irmãos?

    • Os "magos" representam os homens de todo o mundo que vão ao encontro de Cristo, que acolhem a proposta libertadora que Ele traz e que se prostram diante d'Ele. É a imagem da Igreja - essa família de irmãos, constituída por gente de muitas cores e raças, que aderem a Jesus e que O reconhecem como o seu Senhor.

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA A SOLENIDADE DA EPIFANIA DO SENHOR
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao Domingo da Solenidade da Epifania do Senhor, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa...

    2. HONRAR AS DIFERENTES CULTURAS.
    A Solenidade da Epifania tem a sua plena significação quando as comunidades honram as diferentes culturas que as compõem e dão lugar às expressões litúrgicas dos vários países: danças, cânticos, instrumentos de música, objectos, vestes... Uma proposta, entre outras: proclamar as leituras em diferentes línguas.

    3. BILHETE DE EVANGELHO.
    Nos passos dos Magos... Como os Magos, ponhamo-nos a caminho. Não sabemos exactamente o que será a aventura. Tenhamos confiança. Como eles, ergamos os olhos. A luz vem de Deus, deixemo-nos iluminar. Como eles, procuremos, não tenhamos demasiadas certezas. Tenhamos somente convicções, descubramos os sinais de uma presença. Como eles, ofereçamos presentes: o da oração, o do respeito de todo o homem. Procuremos agradar a Deus e aos irmãos. Como eles, aceitemos começar um novo caminho. Deixemo-nos interpelar por Deus e pelo seu Evangelho, pelos homens e mulheres deste tempo.

    4. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
    Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.

    No final da primeira leitura:
    Deus de luz, erguemos os nossos olhos para Ti, cheios de admiração; nós Te bendizemos, porque a tua glória ergueu-se sobre nós, arrancaste-nos das trevas e colocas-nos de pé, a caminho da nova Jerusalém.
    Nós Te pedimos por todos os povos da terra que ainda vivem nas trevas e pelas pessoas que conhecemos e que procuram o fim do túnel.

    No final da segunda leitura:
    Pai de todos os homens, nós Te bendizemos pela revelação do teu mistério, pela promessa que Tu destinas a todos os povos e pela herança à qual tanta desejas associá-los, na tua luz.
    Nós Te pedimos por todos os missionários que partiram para longe a anunciar esta Boa Nova pela palavra e pelos actos.

    No final do Evangelho:
    Nosso Pai, único rei digno deste nome, nós Te louvamos pelos sinais que nos guiam para Ti e, sobretudo, pelo teu Filho Jesus, estrela que está sempre presente, em todos os instantes das nossas vidas.
    Nós Te pedimos pela tua Casa, que é a tua Igreja, e por todas as suas comunidades: que o teu Filho Jesus nos guie, através da nova estrela que é o teu Espírito presente nas nossas vidas.

    5. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Pode-se escolher a Oração Eucarística IV.

    6. PALAVRA EXPLICADA 1: A CASA IGREJA.
    O Evangelho da Epifania precisa que os Magos entraram na casa. Esta palavra aparece muitas vezes nos Evangelhos. Jesus entrou em muitas casas. É na casa que Ele celebrou a Última Ceia (Mt 26,18), que Se manifestou aos discípulos e que partiu o pão, em Emaús. É ainda numa casa que os apóstolos receberam o Espírito Santo, no dia de Pentecostes. As primeiras comunidades cristãs reuniam-se nas casas para partir o pão, em Jerusalém, em Corinto, em Troas e noutros lugares (Act 1,3; 2,46; 20,7-12; 1Cor 11,19). Pelas saudações de Paulo, no final das suas cartas, sabemos que os cristãos punham as suas casas à disposição para reunir a Igreja de Deus: Gaio em Corinto (Rom 16,23); Áquila e Prisca em Éfeso (Rom 16,5; 1Cor 16,19). Durante os dois primeiros séculos, os cristãos não tinham outros locais para as suas assembleias dominicais senão as casas particulares. Consideravam-se, em cada localidade, como uma família.

    7. PALAVRA EXPLICADA 2: SÃO GREGÓRIO E O CANTO.
    O Papa São Gregório I (590-604) não interveio muito pela criação de instituições litúrgicas, porque tudo estava já organizado. Mas foi um pastor devotado, numa altura em que toda a Itália sofria duras provas. Nos séculos seguintes, o nome de Gregório serviu de referência para valorizar tudo o que vinha de Roma, em particular os livros litúrgicos. Quanto ao canto gregoriano, o seu qualificativo provém de legendas do século IX, que apresentavam o Papa Gregório como o autor dos cantos da missa, que teria composto por inspiração do Espírito Santo. Os pintores e os autores de miniaturas ilustraram a cena, apresentando o Papa na sua sala de trabalho, com a pomba do Espírito Santo perto da orelha. Esta ilustração contribuiu muito pouco para vulgarizar a atribuição do canto gregoriano ao Papa. De facto, no repertório gregoriano, os textos das orações provêm de livros compilados na época carolíngia. As anotações musicais só aparecem nestes livros a partir do século XI. Antes, as melodias eram transmitidas por tradição oral.

    8. PALAVRA PARA O CAMINHO.
    Audácia missionária. Assembleias dominicais cada vez mais diminutas... Vocações sacerdotais e religiosas cada vez mais raras... Não reduzamos a Missão aos nossos problemas! A Estrela que se levanta na escuridão brilha para todos os povos da terra e convida-nos à audácia missionária. Que iniciativa poderíamos tomar - em comunidade paroquial, em comunidade religiosa, em equipa litúrgica - para nos abrirmos para além de nós mesmos?

     

     

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador: P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • Festa do Baptismo do Senhor - Ano A

    Festa do Baptismo do Senhor - Ano A


    9 de Janeiro, 2023

    O Batismo de Jesus no rio Jordão assinala o termo da sua vida de silêncio e obscuridade e inaugura o seu ministério público, anunciando e preparando o seu Batismo "na morte" (Lc 12, 50; Mc 10, 38).

    Lectio

    Primeira leitura: Isaías 42,1-4.6-7

    Diz o Senhor: «Eis o meu servo, a quem Eu protejo, o meu eleito, enlevo da minha alma. Sobre ele fiz repousar o meu espírito, para que leve a justiça às nações. Não gritará, nem levantará a voz, nem se fará ouvir nas praças; não quebrará a cana fendida, nem apagará a torcida que ainda fumega: proclamará fielmente a justiça. Não desfalecerá nem desistirá, enquanto não estabelecer a justiça na terra, a doutrina que as ilhas longínquas esperam. Fui Eu, o Senhor, que te chamei segundo a justiça; tomei-te pela mão, formei-te e fiz de ti a aliança do povo e a luz das nações, para abrires os olhos aos cegos, tirares do cárcere os prisioneiros e da prisão os que habitam nas trevas».

    O texto que escutamos pertence ao "Livro da Consolação" do Deutero-Isaías (cf. Is 40-55) e consta de duas partes que falam da eleição do "Servo" e da sua missão. A "ordenação" do "Servo" realiza-se através do dom do Espírito. Animado por esse Espírito, o "Servo" irá levar "a justiça às nações". A figura misteriosa e enigmática do "Servo" apresenta evidentes pontos de contacto com a figura de Jesus... Os primeiros cristãos irão utilizar os cânticos do "Servo" para justificar o sofrimento e o aparente fracasso humano de Jesus. Ele é esse "eleito de Deus", que recebeu a plenitude do Espírito, que veio ao encontro dos homens com a missão de trazer a justiça e a paz definitivas, que sofreu e morreu para ser fiel a essa missão, que o Pai lhe confiou.
    Segunda leitura: Atos dos Apóstolos 10, 34-46

    Naqueles dias, Pedro tomou a palavra e disse: «Na verdade, eu reconheço que Deus não faz aceção de pessoas, mas, em qualquer nação, aquele que O teme e pratica a justiça é-Lhe agradável. Ele enviou a sua palavra aos filhos de Israel, anunciando a paz por Jesus Cristo, que é o Senhor de todos. Vós sabeis o que aconteceu em toda a Judeia, a começar pela Galileia, depois do batismo que João pregou: Deus ungiu com a força do Espírito Santo a Jesus de Nazaré, que passou fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos pelo Demónio, porque Deus estava com Ele».
    Os "Atos dos Apóstolos" são uma catequese sobre a "etapa da Igreja", isto é, sobre a forma como os discípulos assumiram o continuaram o projeto salvador do Pai e o levaram - após a partida de Jesus deste mundo - a todos os homens. O nosso texto de hoje está integrado na primeira parte dos "Atos", onde se apresenta a difusão do Evangelho dentro das fronteiras palestinianas, por ação de Pedro e dos Doze. Insere-se numa perícopa que descreve a atividade missionária de Pedro na planície junto da orla mediterrânica da Palestina. Em concreto, o texto propõe-nos o testemunho e a catequese de Pedro em Cesareia, em casa do centurião romano Cornélio. Convocado pelo Espírito (cf. At 10,19-20), Pedro entra em casa de Cornélio, expõe-lhe o essencial da fé e batiza-o, bem como a toda a sua família (cf. At 10,23b-48). O episódio é importante porque Cornélio é o primeiro pagão a cem por cento a ser admitido ao cristianismo por um dos Doze: significa que a vida nova, que nasce de Jesus, se destina a todos os homens. No seu discurso, Pedro começa por reconhecer que a proposta de salvação oferecida por Deus e trazida por Cristo é universal e se destina a todas as pessoas, sem distinção de qualquer tipo (vv. 34-36). Israel foi o primeiro recetor da Palavra de Deus; mas Cristo veio trazer a "boa nova da paz" (salvação) a todos os homens que aceitem a proposta e adiram a Jesus.
    Evangelho: Marcos 1, 7-11

    Naquele tempo, Jesus chegou da Galileia e veio ter com João Baptista ao Jordão, para ser batizado por ele. Mas João opunha-se, dizendo: «Eu é que preciso de ser batizado por Ti, e Tu vens ter comigo?». Jesus respondeu-lhe: «Deixa por agora; convém que assim cumpramos toda a justiça». João deixou então que Ele Se aproximasse. Logo que Jesus foi batizado, saiu da água. Então, abriram-se os céus e Jesus viu o Espírito de Deus descer como uma pomba e pousar sobre Ele. E uma voz vinda do Céu dizia: «Este é o meu Filho muito amado, no qual pus toda a minha complacência».

    A mensagem de João Baptista estava centrada na urgência da conversão e incluía um rito de purificação pela água. Na perspetival do Precursor, os homens deviam arrepender-se; e foi para os chamar ao arrependimento que ele batizou na água. Para João, recusar a conversão, significava ser destruído pela cólera de Deus. Que sentido faz Jesus apresentar-se a João para receber este "batismo" de purificação, de arrependimento e de perdão dos pecados? Para Mateus, o batismo é um momento privilegiado da manifestação de Jesus aos homens: antes de começar a sua atividade, Jesus define-Se e apresenta-Se... O diálogo entre João e Jesus (vv. 14-15) explica porque é que Jesus vem ao encontro de João para ser batizado... Pela resposta de Jesus, fica claro que o seu batismo é um passo necessário para que se cumpra o desígnio salvador de Deus, isto é, a sua vontade. Jesus apresenta-Se como "Filho", que cumpre rigorosa e absolutamente a vontade do Pai. Ao receber este batismo de penitência e de perdão dos pecados, do qual não precisava, porque Ele não conheceu o pecado, Jesus solidarizou-Se com o homem pecador, assumiu a sua condição, para percorrer com eles o caminho da libertação. Era esse o projeto do Pai, que Jesus cumpriu integralmente.
    Meditatio
    A liturgia da Festa do Batismo de Jesus tem como cenário de fundo o projeto salvador de Deus. No batismo de Jesus nas margens do Jordão, revela-se o Filho amado de Deus, que veio ao mundo enviado pelo Pai, com a missão de salvar e libertar os homens. Cumprindo o projeto do Pai, Ele fez-Se um de nós, partilhou a nossa fragilidade e humanidade, libertou-nos do egoísmo e do pecado e empenhou-Se em promover-nos, para que pudéssemos chegar à vida em plenitude. A primeira leitura anuncia um misterioso "Servo", escolhido por Deus e enviado aos homens para instaurar um mundo de justiça e de paz sem fim... Investido do Espírito de Deus, Ele concretizará essa missão com humildade e simplicidade, sem recorrer ao poder, à imposição, à prepotência, pois esses não são os esquemas de Deus. No Evangelho, aparece-nos a concretização da promessa profética: Jesus é o Filho/"Servo" enviado pelo Pai, sobre quem repousa o Espírito e cuja missão é realizar a libertação dos homens. Obedecendo ao Pai, Ele tornou-Se pessoa, identificou-Se com as fragilidades dos homens, caminhou ao lado deles, a fim de os promover e de os levar à reconciliação com Deus, à vida em plenitude. A segunda leitura reafirma que Jesus é o Filho amado que o Pai enviou ao mundo para concretizar um projeto de salvação; por isso, Ele "passou pelo mundo fazendo o bem" e libertando todos os que eram oprimidos. É este o testemunho que os discípulos devem dar, para que a salvação que Deus oferece chegue a todos os povos da terra.
    No episódio do batismo, Jesus aparece como o Filho amado, que o Pai enviou ao encontro dos homens para os libertar e para os inserir numa dinâmica de comunhão e de vida nova. Nessa cena revela-se, portanto, a preocupação de Deus e o imenso amor que Ele nos dedica... É bonita esta história de um Deus que envia o próprio Filho ao mundo, que pede a esse Filho que Se solidarize com as dores e limitações dos homens, e que, através da ação do Filho, reconcilia os homens consigo e fá-los chegar à vida em plenitude. O que nos é pedido é que correspondamos ao amor do Pai, acolhendo a sua oferta de salvação e seguindo Jesus no amor, na entrega, no dom da vida. Ora, no dia do nosso batismo, comprometemo-nos com esse projeto... Temos renovado diariamente o nosso compromisso e percorrido, com coerência, esse caminho que Jesus nos veio propor? A celebração do batismo do Senhor leva-nos até Jesus que assume plenamente a sua condição de "Filho" e que Se faz obediente ao Pai, cumprindo integralmente o projeto do Pai de dar vida ao homem. É esta mesma atitude de obediência radical, de entrega incondicional, de confiança absoluta que eu assumo na minha relação com Deus? O projeto de Deus é, para mim, mais importante de que os meus projetos pessoais ou do que os desafios que o mundo me faz? O episódio do batismo de Jesus coloca-nos frente a frente com um Deus que aceitou identificar-Se com o homem, partilhar a sua humanidade e fragilidade, a fim de oferecer ao homem um caminho de liberdade e de vida plena. Eu, filho deste Deus, aceito ir ao encontro dos meus irmãos mais desfavorecidos e estender-lhes a mão? Partilho a sorte dos pobres, dos sofredores, dos injustiçados, sofro na alma as suas dores, aceito identificar-me com eles e participar dos seus sofrimentos, a fim de melhor os ajudar a conquistar a liberdade e a vida plena? Não tenho medo de me sujar ao lado dos pecadores, dos marginalizados, se isso contribuir para os promover e para lhes dar mais dignidade e mais esperança? No batismo, Jesus tomou consciência da sua missão (essa missão que o Pai lhe confiou), recebeu o Espírito e partiu em viagem pelos caminhos poeirentos da Palestina, a testemunhar o projeto libertador do Pai. Eu, que no batismo aderi a Jesus e recebi o Espírito que me capacitou para a missão, tenho sido uma testemunha séria e comprometida desse programa em que Jesus Se empenhou e pelo qual Ele deu a vida?
    Oratio

    Pai santo, "nas águas do Jordão, realizastes prodígios admiráveis, para manifestar o mistério do novo Batismo: do céu fizestes ouvir uma voz para que o mundo acreditasse que o vosso Verbo estava no meio dos homens; pelo Espírito Santo, que desceu em figura de pomba, consagrastes Cristo vosso Servo com o óleo da alegria, para que os homens O reconhecessem como o Messias enviado a anunciar a boa nova aos pobres" Por isso, vos louvamos, bendizemos e damos graças e, com os Anjos e os Santos do Céu, proclamamos a vossa glória. Ámen. (cf. Prefácio da festa)
    Contemplatio

    O batismo do Salvador é o último ato da sua longa preparação de trinta anos. Já é publicamente oferecido ao seu Pai na Circuncisão e na Apresentação no Templo, vem ainda oferecer-se nas margens do Jordão. João Baptista, como profeta autorizado de Deus, chama os Israelitas para o batismo de penitência, para os preparar para o reino do Messias. Jesus não tem necessidade do batismo, tal como não tinha necessidade da Circuncisão nem da Apresentação nem do resgate no Templo. Mas vem como vítima e como reparador. Assume sobre si a responsabilidade dos nossos pecados. Quer cumprir toda a lei antiga, que era uma lei de purificação e de preparação. Recebeu o batismo, não para si, mas pelos homens seus irmãos. É mergulhado na água como símbolo de morte e de ressurreição. O seu batismo simboliza e anuncia a sua morte real e a sua ressurreição, enquanto que o nosso exprime somente uma morte espiritual para o pecado e a ressurreição para a vida sobrenatural. S. João queria opor-se ao batismo de Jesus, que nada tem a purificar, mas Jesus responde-lhe que deve cumprir toda a justiça, e entende com isto a justa expiação das nossas faltas. Que viva impressão de sofrimento, mas também de amor pelo seu Pai e por nós o Coração de Jesus deve ter sentido nesta morte simbólica! Que lição de penitência, de caridade, de dedicação! (Leão Dehon, OSP 3, p. 219).
    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Este é o meu Filho bem-amado: escutai-O!" (Mc 9, 6).
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  • 02º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    02º Domingo do Tempo Comum - Ano A


    15 de Janeiro, 2023

    ANO A
    2º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    Tema do 2º Domingo do Tempo Comum

    A liturgia deste domingo coloca a questão da vocação; e convida-nos a situá-la no contexto do projecto de Deus para os homens e para o mundo. Deus tem um projecto de vida plena para oferecer aos homens; e elege pessoas para serem testemunhas desse projecto na história e no tempo.
    A primeira leitura apresenta-nos uma personagem misteriosa - Servo de Jahwéh - a quem Deus elegeu desde o seio materno, para que fosse um sinal no mundo e levasse aos povos de toda a terra a Boa Nova do projecto libertador de Deus.
    A segunda leitura apresenta-nos um "chamado" (Paulo) a recordar aos cristãos da cidade grega de Corinto que todos eles são "chamados à santidade" - isto é, são chamados por Deus a viver realmente comprometidos com os valores do Reino.
    O Evangelho apresenta-nos Jesus, "o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo". Ele é o Deus que veio ao nosso encontro, investido de uma missão pelo Pai; e essa missão consiste em libertar os homens do "pecado" que oprime e não deixa ter acesso à vida plena.

    LEITURA I - Is 49,3.5-6

    Leitura do Livro de Isaías

    Disse-me o Senhor:
    «Tu és o meu servo, Israel,
    por quem manifestarei a minha glória».
    E agora o Senhor falou-me,
    Ele que me formou desde o seio materno,
    para fazer de mim o seu servo,
    a fim de lhe reconduzir Jacob e reunir Israel junto d'Ele.
    Eu tenho merecimento aos olhos do Senhor
    e Deus é a minha força.
    Ele disse-me então:
    «Não basta que sejas meu servo,
    para restaurares as tribos de Jacob
    e reconduzires os sobreviventes de Israel.
    Vou fazer de ti a luz das nações,
    para que a minha salvação chegue até aos confins da terra».

    AMBIENTE

    O Deutero-Isaías (o autor do texto que nos é hoje proposto e que mais uma vez nos aparece como veículo da Palavra de Deus) é um profeta da época do exílio, que desenvolveu o seu ministério na Babilónia, entre os exilados (como, aliás, já dissemos no passado domingo). A sua mensagem - de consolação e de esperança - aparece nos capítulos 40-55 do Livro de Isaías.
    Contudo, há nesses capítulos quatro textos (cf. Is 42,1-9; 49,1-13; 50,4-11; 52,13-53,12) que se distinguem - quer em termos literários, quer em termos temáticos - do resto da mensagem... São os quatro cânticos do Servo de Jahwéh. Apresentam um misterioso servo de Deus, a quem Jahwéh confiou uma missão. A missão do Servo cumpre-se no sofrimento e no meio das perseguições; mas do sofrimento do Servo resultará a redenção para o Povo. No fim, o Servo será recompensado por Jahwéh e será exaltado.
    A primeira leitura de hoje propõe-nos parte do segundo cântico do Servo de Jahwéh. Aqui, esse Servo é explicitamente identificado com Israel (embora alguns autores suponham que a determinação "Israel" não é original no texto e que foi aqui acrescentada como uma interpretação): seria a figura do Povo de Deus, chamado a ser testemunha de Jahwéh no meio dos outros povos.

    MENSAGEM

    O nosso texto apresenta-se como uma declaração solene do Servo (Israel) "às ilhas" e "às cidades longínquas" (vers. 1).
    Na sua declaração, o Servo manifesta, em primeiro lugar, a consciência da eleição: ele foi escolhido por Deus desde o seio materno (vers. 5a.b). A expressão põe em relevo a origem de toda a vocação profética: é Deus que escolhe, que chama, que envia. Referindo-se a Israel, a expressão faz alusão às origens do Povo, à eleição e à aliança: Israel existe porque Deus o escolheu entre todos os povos, revelou-lhe o seu rosto, constituiu-o como Povo, libertou-o da escravidão, conduziu-o através do deserto e estabeleceu com ele uma relação especial de comunhão e de aliança.
    A eleição e a aliança pressupõem, contudo, a missão e o testemunho. A missão deste Servo a quem Deus chamou é, em primeiro lugar, "reconduzir Jacob e reunir Israel" a Jahwéh (vers. 5c.d). Aqui faz-se referência, provavelmente, ao regresso do Povo à órbita da aliança (considerada rompida pelo pecado do Povo), à reunião de todos os exilados e ao regresso à Terra Prometida.
    A missão do Servo é, depois, ampliada "às nações" (vers. 6): Israel deve dar testemunho da salvação de Deus, de forma a que a proposta salvadora e libertadora chegue, por intermédio do Servo/Povo aos homens e mulheres de toda a terra. Não deixa de impressionar a grandiosidade da missão confiada, em contraste com a situação de opressão, de apagamento, de fragilidade em que vivem os exilados... Aqui afirma-se o jeito de Deus, que age no mundo, salva e liberta recorrendo a instrumentos frágeis e indignos.

    ACTUALIZAÇÃO

    Para a reflexão e partilha, podem ser considerados os seguintes elementos:

    • A leitura propõe à nossa reflexão esse tema sempre pessoal, mas sempre enigmático que é a vocação. Somos convidados, na sequência, a tomar consciência da vocação a que somos chamados e das suas implicações. Não se trata de uma questão que apenas atinge e empenha algumas pessoas especiais, com um lugar à parte na comunidade eclesial (os padres, as freiras...); mas trata-se de um desafio que Deus faz a cada um dos seus filhos, que a todos implica e que a todos empenha.

    • A figura do Servo de Jahwéh convida-nos, em primeiro lugar, a tomar consciência de que na origem da vocação está Deus: é Ele que elege, que chama e que confia a cada um uma missão. A nossa vocação é sempre algo que tem origem em Deus e que só se entende à luz de Deus. Temos consciência de que somos escolhidos por Deus desde o seio materno, isto é, desde o primeiro instante da nossa existência? Temos consciência de que é Deus que alimenta a nossa vocação e o nosso compromisso no mundo? Temos consciência de que só a partir de Deus a nossa vocação faz sentido e o nosso empenhamento se entende? Temos consciência de que a vocação implica uma relação de comunhão, de intimidade, de proximidade com Deus?

    • A vocação não se esgota, contudo, na aproximação do homem a Deus, mas é sempre em ordem a um testemunho e a uma intervenção no mundo (mesmo que se trate de uma vocação contemplativa). O homem chamado por Deus é sempre um homem que testemunha e que é um sinal vivo de Deus, dos seus valores e das suas propostas diante dos outros homens. Sinto que a minha vocação se realiza no testemunho da salvação e da libertação de Deus aos meus irmãos? A vocação a q
    ue Deus me chama leva-me a ser uma luz de esperança no mundo? A salvação de Deus atinge o mundo e torna-se uma realidade concreta no meu testemunho e no meu ministério?

    • Ao reflectirmos na lógica da vocação, é preciso estarmos cientes de que toda a vocação tem origem em Deus, é alimentada por Deus, e de que Deus se serve, muitas vezes, da nossa fragilidade, caducidade e indignidade para actuar no mundo. Aquilo que fazemos de bom e de bonito não resulta, portanto, das nossas forças ou das nossas qualidades, mas de Deus. O coração do profeta não tem, portanto, qualquer razão para se encher de orgulho, de vaidade e de auto-suficiência: convém ter consciência de que por detrás de tudo está Deus, e que só Deus é capaz de transformar o mundo, a partir dos nossos pobres gestos e das nossas frágeis forças.

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 39(40)

    Refrão: Eu venho, Senhor, para fazer a vossa vontade.

    Esperei no senhor com toda a confiança
    e Ele atendeu-me.
    Pôs em meus lábios um cântico novo,
    um hino de louvor ao nosso Deus.

    Não Vos agradaram sacrifícios nem oblações,
    mas abristes-me os ouvidos;
    não pedistes holocaustos nem expiações,
    então clamei: «Aqui estou».

    «De mim está escrito no livro da Lei
    que faça a vossa vontade.
    Assim o quero, ó meu Deus,
    a vossa lei está no meu coração».

    Proclamei a justiça na grande assembleia,
    não fechei os meus lábios, Senhor, bem o sabeis.
    Não escondi a vossa justiça no fundo do coração,
    proclamei a vossa fidelidade e salvação.

    LEITURA II - 1 Cor 1,1-3

    Início da primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios

    Irmãos:
    Paulo, por vontade de Deus
    escolhido para Apóstolo de Cristo Jesus
    e o irmão Sóstenes,
    à Igreja de Deus que está em Corinto,
    aos que foram santificados em Cristo Jesus,
    chamados à santidade,
    com todos os que invocam, em qualquer lugar,
    o nome de Nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor deles e nosso:
    A graça e a paz de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo
    estejam convosco.

    AMBIENTE

    Nos próximos seis domingos, a liturgia vai propor-nos a leitura da primeira carta de Paulo aos cristãos da comunidade de Corinto. Para entendermos cabalmente a mensagem, convém determo-nos um pouco sobre o ambiente em que o texto nos situa.
    No decurso da sua segunda viagem missionária, Paulo chegou a Corinto, depois de atravessar boa parte da Grécia, e ficou por lá cerca 18 meses (anos 50-52). De acordo com Act 18,2-4, Paulo começou a trabalhar em casa de Priscila e Áquila, um casal de judeo-cristãos. No sábado, usava da palavra na sinagoga. Com a chegada a Corinto de Silvano e Timóteo (2 Cor 1,19; Act 18,5), Paulo consagrou-se inteiramente ao anúncio do Evangelho. Mas não tardou a entrar em conflito com os judeus e foi expulso da sinagoga.
    Corinto era uma cidade nova e muito próspera. Servida por dois portos de mar, possuía as características típicas das cidades marítimas: população de todas as raças e de todas as religiões. Era a cidade do desregramento para todos os marinheiros que cruzavam o Mediterrâneo, ávidos de prazer, após meses de navegação. Na época de Paulo, a cidade comportava cerca de 500.000 pessoas, das quais dois terços eram escravos. A riqueza escandalosa de alguns contrastava com a miséria da maioria.
    Como resultado da pregação de Paulo, nasceu a comunidade cristã de Corinto. A maior parte dos membros da comunidade eram de origem grega, embora em geral, de condição humilde (cf. 1 Cor 11,26-29; 8,7; 10,14.20; 12,2); mas também havia elementos de origem hebraica (cf. Act 18,8; 1 Cor 1,22-24; 10,32; 12,13).
    De uma forma geral, a comunidade era viva e fervorosa; no entanto, estava exposta aos perigos de um ambiente corrupto: moral dissoluta (cf. 1 Cor 6,12-20; 5,1-2), querelas, disputas, lutas (cf. 1 Cor 1,11-12), sedução da sabedoria filosófica de origem pagã que se introduzia na Igreja revestida de um superficial verniz cristão (cf. 1 Cor 1,19-2,10).
    Tratava-se de uma comunidade forte e vigorosa, mas que mergulhava as suas raízes em terreno adverso. Na comunidade de Corinto, vemos as dificuldades da fé cristã em inserir-se num ambiente hostil, marcado por uma cultura pagã e por um conjunto de valores que estão em profunda contradição com a pureza da mensagem evangélica.

    MENSAGEM

    Paulo começa esta carta com a saudação e a acção de graças, típicas das cartas paulinas. Na saudação, carregada de conteúdo teológico, Paulo reivindica a sua condição de escolhido por Deus (de apóstolo), sugerindo que está revestido de autoridade para proclamar com plena garantia o Evangelho. Esta reivindicação sugere que, no contexto coríntio, havia quem punha em causa a sua autoridade apostólica e o seu testemunho. Os destinatários da carta são, evidentemente, os membros da comunidade cristã de Corinto; no entanto, a mensagem serve para os cristãos de todas as épocas e de todas as latitudes.
    Neste parágrafo inicial, o vocábulo chamado assume um lugar especial: Paulo foi chamado por Deus a ser apóstolo e os coríntios são uma comunidade de chamados à santidade. Transparece aqui, como na primeira leitura, a convicção de que Deus tem um projecto para os homens e para o mundo e que todos - quer Paulo, quer os cristãos de Corinto, são chamados a um compromisso efectivo com esse projecto.
    O que é que significa ser chamado à santidade? No contexto paulino, os santos são todos aqueles que acolheram a proposta libertadora de Jesus e aceitaram os valores do Evangelho. Os "santos" são os "separados": os coríntios são "santos" porque, ao aceitar a proposta de Jesus, escolheram viver "separados" do mundo. "Separados" não significa "alheados"; mas significa viver de acordo com valores e esquemas diferentes dos valores e esquemas consagrados pelo mundo.
    A palavra "klêtos" ("chamado"), aqui usada, supõe Deus como sujeito: foi Deus que chamou Paulo; é Deus que chama os coríntios. Mais uma vez fica claro que o chamamento provém da iniciativa divina e que só se compreende a partir de Deus e à luz da acção de Deus.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pode partir dos seguintes dados:

    • Deus chama os homens e as mulheres à santidade. Tenho consciência do apelo que Deus, nesta linha, me faz também a mim? Estou disponível e bem disposto para aceitar esse desafio?

    • Realizar a vocação à santidade não implica seguir caminhos impossíveis de ascese, de privação, de sacrifício; mas significa, sobretudo, acolher a proposta libertadora que Deus oferece em Jesus e viver d
    e acordo com os valores do Reino. É dessa forma que concretizo a minha vocação à santidade? Tenho a coragem de viver e de testemunhar, com radicalidade, os valores do Evangelho, mesmo quando a moda, o orgulho, a preguiça, os interesses financeiros, o "politicamente correcto", a opinião dominante me impõem outras perspectivas?

    • Convém ter sempre presente que a Igreja, a comunidade dos "chamados à santidade", é constituída por "todos os que invocam, em qualquer lugar, o nome de Nosso Senhor Jesus Cristo". É importante termos consciência de que, para além da cor da pele, das diferenças sociais, das distâncias sociais ou culturais, das perspectivas diferentes sobre as questões secundárias da vivência da religião, o essencial é aquilo que nos une e nos faz irmãos: Jesus Cristo e o reconhecimento de que Ele é o Senhor que nos conduz pela história e nos oferece a salvação.

    ALELUIA - Jo 1,14a.12a

    Aleluia. Aleluia.

    O Verbo fez-Se carne e habitou entre nós.
    Àqueles que O receberam
    deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus.

    EVANGELHO - Jo 1,29-34

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João

    Naquele tempo,
    João Baptista viu Jesus, que vinha ao seu encontro,
    e exclamou:
    «Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo.
    Era d'Ele que eu dizia:
    "Depois de mim virá um homem,
    que passou à minha frente, porque existia antes de mim".
    Eu não O conhecia,
    mas para Ele Se manifestar a Israel
    é que eu vim baptizar em água».
    João deu mais este testemunho:
    «Eu vi o Espírito Santo
    descer do Céu como uma pomba e repousar sobre Ele.
    Eu não O conhecia,
    mas quem me enviou a baptizar em água é que me disse:
    "Aquele sobre quem vires o Espírito Santo descer e repousar
    é que baptiza no Espírito Santo".
    Ora eu vi e dou testemunho de que Ele é o Filho de Deus».

    AMBIENTE

    A perícopa que nos é proposta integra a secção introdutória do Quarto Evangelho (cf. Jo 1,19-3,36). Aí o autor, com consumada mestria, procura responder à questão: "quem é Jesus?"
    João dispõe as peças num enquadramento cénico. As diversas personagens que vão entrando no palco procuram apresentar Jesus. Um a um, os actores chamados ao palco por João vão fazendo afirmações carregadas de significado teológico sobre Jesus. O quadro final que resulta destas diversas intervenções apresenta Jesus como o Messias, Filho de Deus, que possui o Espírito e que veio ao encontro dos homens para fazer aparecer o Homem Novo, nascido da água e do Espírito.
    João Baptista, o profeta/percursor do Messias, desempenha aqui um papel especial na apresentação de Jesus (o seu testemunho aparece no início e no fim da secção - cf. Jo 1,19-37; 3,22-36). Ele vai definir aquele que chega e apresentá-lo aos homens. Ao não assinalar-se o auditório, sugere-se que o testemunho de João é perene, dirigido aos homens de todos os tempos e com eco permanente na comunidade cristã.

    MENSAGEM

    João é, portanto, o apresentador oficial de Jesus. De que forma e em que termos o vai apresentar?
    A catequese sobre Jesus que aqui é feita expressa-se através de duas afirmações com um profundo impacto teológico: Jesus é o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo; e é o Filho de Deus que possui a plenitude do Espírito.
    A primeira afirmação ("o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo" - Jo 1,29) evoca, provavelmente, duas imagens tradicionais extremamente sugestivas. Por um lado, evoca a imagem do "servo sofredor", o cordeiro levado para o matadouro, que assume os pecados do seu Povo e realiza a expiação (cf. Is 52,13-53,12); por outro lado, evoca a imagem do cordeiro pascal, símbolo da acção libertadora de Deus em favor de Israel (cf. Ex 12,1-28). Qualquer uma destas imagens sugere que a pessoa de Jesus está ligada à libertação dos homens.
    A ideia é, aliás, explicitada pela definição da missão de Jesus: Ele veio para tirar ("eliminar") "o pecado do mundo". A palavra "pecado" aparece, aqui, no singular: não designa os "pecados" dos homens, mas um "pecado" único que oprime a humanidade inteira; esse "pecado" parece ter a ver, no contexto da catequese joânica, com a recusa da proposta de vida com que Deus, desde sempre, quis presentear a humanidade (é dessa recusa que resulta o pecado histórico, que desfeia o mundo e que oprime os homens). O "mundo" designa, neste contexto, a humanidade que resiste à salvação, reduzida à escravidão e que recusa a luz/vida que Jesus lhe pretende oferecer... Deus propôs-se tirar a humanidade da situação de escravidão em que esta se encontra; enviou ao mundo Jesus, com a missão de realizar um novo êxodo, que leve os homens da terra da escravidão para a terra da liberdade.
    A segunda afirmação (o "Filho de Deus" que possui a plenitude do Espírito Santo e que baptiza no Espírito - cf. Jo 1,32-34) completa a anterior. Há aqui vários elementos bem sugestivos: o "cordeiro" é o Filho de Deus; Ele recebeu a plenitude do Espírito; e tem por missão baptizar os homens no Espírito.
    Dizer que Jesus é o Filho de Deus é dizer que Ele é o Deus que se faz pessoa, que vem ao encontro dos homens, que monta a sua tenda no meio dos homens, a fim de lhes oferecer a plenitude da vida divina. A sua missão consiste em eliminar "o pecado" que torna o homem escravo e que o impede de abrir o coração a Deus.
    Dizer que o Espírito desce sobre Jesus e permanece sobre Ele sugere que Jesus possui definitivamente a plenitude da vida de Deus, toda a sua riqueza, todo o seu amor. Por outro lado, a descida do Espírito sobre Jesus é a sua investidura messiânica, a sua unção ("messias" = "ungido"). O quadro leva-nos aos textos do Deutero-Isaías, onde o "Servo" aparece como o eleito de Jahwéh, sobre quem Deus derramou o seu Espírito (cf. Is 42,1), a quem ungiu e a quem enviou para "anunciar a Boa Nova aos pobres, para curar os corações destroçados, para proclamar a libertação aos cativos, para anunciar aos prisioneiros a liberdade" (Is 61,1-2).
    Jesus é, finalmente, aquele que baptiza no Espírito Santo. O verbo "baptizar" aqui utilizado tem, em grego, duas traduções: "submergir" e "empapar (como a chuva empapa a terra)"; refere-se, em qualquer caso, a um contacto total entre a água e o sujeito. "Baptizar no Espírito" significa, portanto, um contacto total entre o Espírito e o homem, uma chuva de Espírito que cai sobre o homem e lhe empapa o coração. A missão de Jesus consiste, portanto, em derramar o Espírito sobre o
    homem; e o homem que adere a Jesus, "empapado" do Espírito e transformado por essa fonte de vida que é o Espírito, abandona a experiência da escuridão ("o pecado") e alcança o seu pleno desenvolvimento, a plenitude da vida.
    A declaração de João convida os homens de todas as épocas a voltarem-se para Jesus e a acolherem a proposta libertadora que, em nome de Deus, Ele faz: só a partir do encontro com Jesus será possível chegar à vida plena, à meta final do Homem Novo.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pessoal e comunitária pode tocar os seguintes pontos:

    • Em primeiro lugar, importa termos consciência de que Deus tem um projecto de salvação para o mundo e para os homens. A história humana não é, portanto, uma história de fracasso, de caminhada sem sentido para um beco sem saída; mas é uma história onde é preciso ver Deus a conduzir o homem pela mão e a apontar-lhe, em cada curva do caminho, a realidade feliz do novo céu e da nova terra. É verdade que, em certos momentos da história, parecem erguer-se muros intransponíveis que nos impedem de contemplar com esperança os horizontes finais da caminhada humana; mas a consciência da presença salvadora e amorosa de Deus na história deve animar-nos, dar-nos confiança e acender nos nossos olhos e no nosso coração a certeza da vida plena e da vitória final de Deus.

    • Jesus não foi mais um "homem bom", que coloriu a história com o sonho ingénuo de um mundo melhor e desapareceu do nosso horizonte (como os líderes do Maio de 68 ou os fazedores de revoluções políticas que a história absorveu e digeriu); mas Jesus é o Deus que Se fez pessoa, que assumiu a nossa humanidade, que trouxe até nós uma proposta objectiva e válida de salvação e que hoje continua presente e activo na nossa caminhada, concretizando o plano libertador do Pai e oferecendo-nos a vida plena e definitiva. Ele é, agora e sempre, a verdadeira fonte da vida e da liberdade. Onde é que eu mato a minha sede de liberdade e de vida plena: em Jesus e no projecto do Reino ou em pseudo-messias e miragens ilusórias de felicidade que só me afastam do essencial?

    • O Pai investiu Jesus de uma missão: eliminar o pecado do mundo. No entanto, o "pecado" continua a enegrecer o nosso horizonte diário, traduzido em guerras, vinganças, terrorismo, exploração, egoísmo, corrupção, injustiça... Jesus falhou? É o nosso testemunho que está a falhar? Deus propõe ao homem o seu projecto de salvação, mas não impõe nada e respeita absolutamente a liberdade das nossas opções. Ora, muitas vezes, os homens pretendem descobrir a felicidade em caminhos onde ela não está. De resto, é preciso termos consciência de que a nossa humanidade implica um quadro de fragilidade e de limitação e que, portanto, o pecado vai fazer sempre parte da nossa experiência histórica. A libertação plena e definitiva do "pecado" acontecerá só nesse novo céu e nova terra que nos espera para além da nossa caminhada terrena.

    • Isso não significa, no entanto, pactuar com o pecado, ou assumir uma atitude passiva diante do pecado. A nossa missão - na sequência da de Jesus - consiste em lutar objectivamente contra "o pecado" instalado no coração de cada um de nós e instalado em cada degrau da nossa vida colectiva. A missão dos seguidores de Jesus consiste em anunciar a vida plena e em lutar contra tudo aquilo que impede a sua concretização na história.

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 2º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 2º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa...

    2. DAR ATENÇÃO ÀS PROCISSÕES.
    Ao longo dos domingos que precedem o tempo da Quaresma, pode-se dar uma atenção particular ao desenrolar das procissões na missa. Por exemplo, a procissão de entrada, que não é apenas para o presidente da assembleia acompanhado de um ou outro acólito... Podem entrar nesta procissão: um leigo com a cruz, os acólitos ou leigos que vão servir ao altar (podem levar cada um uma vela), os que vão fazer a primeira e a segunda leitura (um deles leva o leccionário), assim como o leitor da oração dos fiéis. Para acolher a procissão, enquanto se canta, a assembleia dirige o olhar para o fundo da igreja e acompanha com o olhar o movimento da procissão. Chegados ao altar, depois da inclinação ou genuflexão, colocam o livro e as velas, tomando os seus lugares. A celebração continua...

    3. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
    Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.

    No final da primeira leitura:
    Deus, Pai do teu povo, nós Te bendizemos pelo envio de salvadores, os profetas, os juízes e os reis, mas sobretudo pelo envio do teu Filho, o teu eleito, em quem puseste toda a tua alegria, e que Se manifestou como a luz das nações.
    Nós Te confiamos as vítimas das inumeráveis angústias da nossa terra, todos os infelizes que aspiram a reencontrar a luz, a liberdade e a paz.

    No final da segunda leitura:
    Cristo Jesus, Tu que és o Senhor de todos e que revestiste a nossa condição humana, Tu que o Pai revelou como o Messias e encheu com a sua força, nós Te damos graças pela tua obra de salvação.
    Nós Te confiamos os nossos irmãos e irmãs que procuram a luz e a verdade, como fazia outrora o centurião Cornélio. Dá-nos a coragem de ir ao seu encontro, como outrora o apóstolo Pedro.

    No final do Evangelho:
    Pai de Jesus e nosso Pai, nós Te damos graças pelo baptismo de Jesus no Jordão, porque nele nos revelaste a nova humanidade, da qual Jesus é a cabeça. Faz de nós também teus filhos bem-amados e cumula-nos com o teu Espírito.
    Nós Te pedimos pelos novos baptizados, pelos padrinhos e madrinhas, pelos pais e pelas equipas que asseguram a preparação para o baptismo.

    4. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Pode-se escolher a Oração Eucarística II para as Missas da Reconciliação.

    5. PALAVRA PARA O CAMINHO.
    Testemunho... A palavra "Servidor" regressa hoje em força, em Isaías, enquanto João nos convida a contemplar o Cordeiro de Deus investido da Força do Espírito, ao qual dá testemunho. E nós? O nosso testemunho ficará limitado a estas palavras do Credo proclamado ao domingo? Ou leva-nos a empenharmo-nos em acções concretas no seguimento do Servidor?

     

     

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • Santo Antão, Abade

    Santo Antão, Abade


    17 de Janeiro, 2023

    S. Antão nasceu em 252, no Egipto Médio. Os seus pais eram ricos proprietários rurais. Quando tinha 20 anos, ao entrar numa igreja, ouviu proclamar Mt 10, 21: "Se queres ser perfeito, vai, vende o que tens..." Fulminado pelo convite de Jesus, vendeu os campos recebidos em herança, reservando uma parte deles para a sua irmã, e iniciou a vida ascética. Primeiro juntou-se a um velho monge, perto da sua aldeia. Depois, encerrou-se num sepulcro cerca de 13 anos. Submetido a fortes tentações do demónio, empenhou-se ainda mais na luta ascética, fixando-se num fortim abandonado, onde permaneceu vinte anos. Em 306, deixou o seu retiro aceitando receber discípulos. Para escapar aos malefícios da fama, que começava a rodeá-lo, refugiou-se no monte Kolzum. Aí morreu a 17 de Janeiro de 356, com a idade de cento e cinco anos, muitos dos quais passados a ensinar os anacoretas, a curar os enfermos, e a refutar os hereges. Embora rigorosamente não tenha sido o primeiro monge o seu ministério carismático e autorizado fez dele, para sempre, o pai dos monges. A sua vida, escrita pelo seu contemporâneo e amigo, S. Atanásio, tornou-se a "primeira regra" para quem optava pela vida ascética nos ermos.
    Primeira Leitura: Miqueias, 6, 6-8

    Com que me apresentarei ao Senhor, e me prostrarei diante do Deus excelso? Irei à sua presença com holocaustos, com novilhos de um ano? 7Porventura o Senhor receberá com agrado milhares de carneiros ou miríades de torrentes de azeite? Hei-de sacrificar-lhe o meu primogénito pelo meu crime, o fruto das minhas entranhas pelo meu próprio pecado? 8Já te foi revelado, ó homem, o que é bom, o que o Senhor requer de ti: nada mais do que praticares a justiça, amares a lealdade e andares humildemente diante do teu Deus.

    Recorrendo ao género literário chamado "requisitório judicial", o profeta procura levar o povo a ser fiel à Aliança. Tocado no seu íntimo, por reconhecer não ter correspondido ao amor do Senhor, o fiel pergunta: "Com que me apresentarei ao Senhor, e me prostrarei diante do Deus excelso?" (v. 6). O profeta recusa a oferta de sacrifícios exteriores, exigindo a conversão verdadeira, que leve a "praticar a justiça, amar a lealdade e andar humildemente diante do teu Deus" (cf. v. 8). É a essência da verdadeira religião interior, o compêndio da Lei e dos Profetas, o antecipado sumário religioso proposto por Jesus (cf. Mt 22,34-40). É a religião, não como objeto em si mesma, mas como veícolo de diálogo com Deus e com os homens. O amor como fundamento das relações humanas e divinas. E isto dito no século VIII a. C.
    Evangelho: Mateus 19, 16-21
    Naquele tempo, quando se punha a caminho, alguém correu para Jesus e ajoelhou-se, perguntando: «Bom Mestre, que devo fazer para alcançar a vida eterna?» 18Jesus disse: «Porque me chamas bom? Ninguém é bom senão um só: Deus. 19Sabes os mandamentos: Não mates, não cometas adultério, não roubes, não levantes falso testemunho, não defraudes, honra teu pai e tua mãe.» 20Ele respondeu: «Mestre, tenho cumprido tudo isso desde a minha juventude.» 21Jesus, fitando nele o olhar, sentiu afeição por ele e disse: «Falta-te apenas uma coisa: vai, vende tudo o que tens, dá o dinheiro aos pobres e terás um tesouro no Céu; depois, vem e segue-me.»

    O encontro de Jesus com o jovem rico é referido pelos três Sinópticos. Mas só Mateus fala de "um jovem", chamando a Jesus "Mestre". Marcos e Lucas acrescentam: "bom Mestre".
    Jesus propõe ao jovem as exigências do Reino, da "perfeição", isto é, a renúncia aos próprios bens em favor dos pobres e o seu seguimento incondicional. O jovem fica triste, porque punha a sua alegria exactamente nesses bens, e não queria deixá-los. Faltava-lhe, pois, a única coisa necessária: um coração livre e bem disposto para acolher aquela "vida eterna" que dizia desejar.
    Não se pode seguir Jesus sem estar dispostos a quebrar as amarras que impeçam a dociliddade e a obediência ao Mestre divino. Ele olha para todos com amor. Mas só se deixa atrair por aqueles que têm um coração humilde, pobre e livre.
    Meditatio

    Pensando em S. Antão, e no movimento monástico a que a sua vida e os seus ensinamentos deram um decisivo impulso, as leituras, que hoje escutamos, suscitam em nós uma verdadeira comoção. Antão escutou-as como Palavra do Senhor dirigida a ele. A sua resposta foi generosa, radical, iniciando um itinerário espiritual que nos pode inspirar. Antão desejava ardentemente agradar a Deus, e deixou-se conduzir pelo Espírito na busca do caminho adequado. A primeira resposta, quando se libertou os bens terrenos, abriu-o a um compromisso cada vez mais exigente e forte na busca humilde de Deus, longe dos olhares dos homens. Vencidas as paixões, Antão pôde servir serenamente os outros, tornando-se para todos um amigo, um irmão, um pai. Assim ensinou e cuidou daqueles que o procuraram como mestre de ascetismo, inventando, por assim dizer, um novo modelo de vida cristã, caracterizado pela liberdade, pela ascese, pela fidelidade à Palavra, pelo amor a Cristo e ao próximo. Reconhecido como "pai dos monges", S. Antão é, sobretudo, um modelo de vida cristã empenhada. Escreve S. Atanásio: "Antão trabalhava com as suas mãos, pois ouvira a palavra da Escritura: Quem não quiser trabalhar não coma". Do fruto do seu trabalho destinava parte para comprar o pão que comia; o resto distribui-o pelos pobres. Rezava constantemente, pois aprendera que é preciso rezar interiormente, sem cessar; era tão atento à leitura que nada lhe esquecia do que tinha lido na Escritura: tudo retinha de tal maneira que a sua memória acabou por substituir o livro".
    Oratio

    Senhor, dá-me ouvidos para escutar a tua Palavra e coração para a acolher. Que ela transforme a minha vida e me faça progredir decididamente pelo caminho que me chamas a percorrer e apoias com as tuas graças. Enche-me do teu Espírito, aquele grande Espírito de fogo que acendestes em S. Antão. Que esse mesmo Espírito me leve a viver no bulício do mundo, ou na paz da vida consagrada, aquela vida heroica que S. Antão viveu na solidão do deserto e, sobretudo, me leve a renunciar a mim mesmo para Te amar acima de todas as coisas. Ámen.
    Contemplatio

    Desde o sermão da montanha, Nosso Senhor tinha indicado os conselhos de perfeição: «Há, dizia, um caminho estreito, mas são raros os que o encontram». Propunha já a pobreza voluntária: «Não acumuleis tesouros sobre a terra, onde a traça e os vermes os corroem, onde os ladrões escavam e roubam. Vendei o que tendes e fazei esmolas. Preparai tesouros no céu... Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração» (Mt 6). Depois vem a aplicação. Um jovem de nobre família vem lançar-se aos pés de Jesus, perguntando-lhe qual é o melhor caminho a seguir. O Coração de Jesus é tocado, observa com afeto o jovem, ama-o, propõe-lhe os conselhos de perfeição. É uma vocação: «vai, diz-lhe, vende o que tens, dá-o aos pobres, e vem comigo. Que graça insigne! Ser chamado por Jesus a viver com ele, abandonando-se à sua providência! (L. Dehon, OSP 4, p. 105).
    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    «Quem quer vencer as tentações, não confie em si mas em Deus» (Pensamento de S. Antão, citado por S. Atanásio).

     

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    Santo Antão, Abade (17 Janeiro)

  • 03º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    03º Domingo do Tempo Comum - Ano A


    22 de Janeiro, 2023

    Ano A
    Tema do 3º Domingo do Tempo Comum

    A liturgia deste domingo apresenta-nos o projecto de salvação e de vida plena que Deus tem para oferecer ao mundo e aos homens: o projecto do "Reino".
    Na primeira leitura, o profeta/poeta Isaías anuncia uma luz que Deus irá fazer brilhar por cima das montanhas da Galileia e que porá fim às trevas que submergem todos aqueles que estão prisioneiros da morte, da injustiça, do sofrimento, do desespero.
    O Evangelho descreve a realização da promessa profética: Jesus é a luz que começa a brilhar na Galileia e propõe aos homens de toda a terra a Boa Nova da chegada do "Reino". Ao apelo de Jesus, respondem os discípulos: eles serão os primeiros destinatários da proposta e as testemunhas encarregadas de levar o "Reino" a toda a terra.
    A segunda leitura apresenta as vicissitudes de uma comunidade de discípulos, que esqueceram Jesus e a sua proposta. Paulo, o apóstolo, exorta-os veementemente a redescobrirem os fundamentos da sua fé e dos compromissos assumidos no baptismo.

    LEITURA I - Is 8,23b-9,3

    Leitura do Livro de Isaías

    Assim como no tempo passado
    foi humilhada a terra de Zabulão e de Neftali,
    também no futuro será coberto de glória
    o caminho do mar, o Além do Jordão, a Galileia dos gentios.
    O povo que andava nas trevas viu uma grande luz;
    para aqueles que habitavam nas sombras da morte
    uma luz se levantou.
    Multiplicastes a sua alegria,
    aumentastes o seu contentamento.
    Rejubilam na vossa presença,
    como os que se alegram no tempo da colheita,
    como exultam os que repartem despojos.
    Vós quebrastes, como no dia de Madiã,
    o jugo que pesava sobre o povo,
    o madeiro que ele tinha sobre os ombros
    e o bastão do opressor.

    AMBIENTE

    O Livro do profeta Isaías propõe-nos um conjunto de oráculos ditos "messiânicos", que alimentam a esperança do Povo nesse mundo de justiça e de paz que Deus, num futuro sem data marcada, vai oferecer aos seus. Há quem defenda, no entanto, que esses textos messiânicos não provêm de Isaías, mas são oráculos posteriores, enxertados no texto original do profeta pelo editor final da obra isaiana.
    O nosso texto pertence, provavelmente, à fase final da vida do profeta. Estamos no final do séc. VIII a.C.. Os assírios (que em 721 a.C. conquistaram Samaria, a antiga capital do reino de Israel) oprimem e humilham as tribos do Povo de Deus instaladas na região norte do país (Zabulão e Neftali); as trevas da desolação e da morte cobrem toda a região setentrional da Palestina.
    No sul, em Jerusalém, reina Ezequias. O rei, desdenhando as indicações do profeta (para quem as alianças políticas com os povos estrangeiros são sintoma de grave infidelidade para com Jahwéh, pois significam colocar a confiança e a esperança nos homens), envia embaixadas ao Egipto, à Fenícia e à Babilónia, procurando consolidar uma frente contra a maior e mais ameaçadora potência da época - a Assíria. A resposta de Senaquerib, rei da Assíria, não se faz esperar: tendo vencido sucessivamente os membros da coligação, volta-se contra Judá, devasta o país e põe cerco a Jerusalém (701 a.C.). Ezequias tem de submeter-se e fica a pagar um pesado tributo aos assírios.
    Por essa época, desiludido com os reis e com a política, o profeta teria começado a sonhar com uma intervenção de Deus para oferecer ao seu Povo um mundo novo, de liberdade e de paz sem fim. Este texto pode ser dessa época.

    MENSAGEM

    O nosso texto está construído sobre um jogo de oposições: "humilhar/cobrir de glória", "trevas/luz", "caminhar nas sombras da morte (desolação, desespero)/alegria e contentamento". Os conceitos negativos ("humilhar", "trevas", "caminhar nas sombras da morte") definem a situação actual; os conceitos positivos ("cobrir de glória", "luz", "alegria e contentamento") definem a situação futura.
    Como se passará da actual situação de opressão, de frustração, de desespero, à situação futura de alegria, de contentamento, de esperança?
    O profeta fala de "uma luz" que irá começar a brilhar por cima dos montes da Galileia e que irá iluminar toda a terra. Essa luz eliminará "as trevas" que mantinham o Povo oprimido e sem esperança e inaugurará o dia novo da alegria e da paz sem fim. O jugo da opressão que pesava sobre o Povo será, então, quebrado e a paz deixará de ser uma miragem para se tornar uma realidade. Para descrever a alegria que, nesse novo quadro, encherá o coração do Povo, o profeta utiliza duas imagens extremamente sugestivas: é como quando, no fim das colheitas, toda a gente dança feliz, celebrando a abundância dos alimentos; é como quando, após a caçada, os caçadores dividem a presa abundante.
    Qual a origem dessa luz libertadora e recriadora? O sujeito dos verbos do versículo 3 é, indubitavelmente, Deus: será Deus quem quebrará a vara do opressor, quem levantará o jugo que oprime o Povo de Deus, quem triturará o bastão de comando que gera escravidão e humilhação. O mundo novo de alegria e de paz sem fim é um dom de Deus.
    O nosso texto fica por aqui; mas, na sequência, o oráculo de Isaías ainda fala num "menino", enviado por Deus para restaurar o trono de David e para reinar no direito e na justiça (cf. Is 9,5-6). É a promessa messiânica em todo o seu esplendor.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão e a partilha da Palavra podem fazer-se a partir dos seguintes elementos:

    • É Jesus, a luz que ilumina o mundo com uma aurora de esperança, que dá sentido pleno a esta profecia messiânica de Isaías. Ele é "Aquele que veio de Deus" para vencer as trevas e as sombras da morte que ocultavam a esperança e instaurar o mundo novo da justiça, da paz, da felicidade. No entanto, a luz de Jesus é, hoje, uma realidade instituída, viva, actuante na história humana? Porquê?

    • Acolher Jesus é aceitar esse projecto de justiça e de paz que Ele veio propor aos homens. Esforçamo-nos por tornar realidade o "Reino de Deus"? Como lidamos com as situações de injustiça, de opressão, de conflito, de violência: com a indiferença de quem sente que não tem nada a ver com isso enquanto essas realidades não nos atingem directamente, ou com a inquietação de quem se sente responsável pela instauração do "Reino de Deus" entre os homens?

    • Em que, ou em quem, coloco eu a minha esperança e a minha segurança: nos políticos que me prometem tudo e se servem da minha ingenuidade para fins próprios? No dinheiro que se desvaloriza e que não
    serve para comprar a paz do meu coração? Na situação sólida da minha empresa, que pode desfazer-se diante das próximas convulsões sociais ou durante a próxima crise energética? Isaías sugere que só podemos confiar em Deus e na sua decisão de vir ao nosso encontro para nos apresentar uma proposta de vida e de paz.

    SALMO REPONSORIAL - Salmo 26 (27)

    Refrão 1: O Senhor é minha luz e salvação.

    Refrão 2: O Senhor me ilumina e me salva.

    O Senhor é minha luz e salvação:
    a quem hei-de temer?
    O Senhor é protector da minha vida:
    de quem hei-de ter medo?

    Uma coisa peço ao Senhor, por ela anseio:
    habitar na casa do Senhor todos os dias da minha vida,
    para gozar da suavidade do Senhor
    e visitar o seu santuário.

    Espero vir a contemplar a bondade do Senhor
    na terra dos vivos.
    Confia no Senhor, sê forte.
    Tem confiança e confia no Senhor.

    LEITURA II - 1 Cor 1,10-13.17

    Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios

    Irmãos:
    Rogo-vos, pelo nome de Nosso Senhor Jesus Cristo,
    que faleis todos a mesma linguagem
    e que não haja divisões entre vós,
    permanecendo bem unidos,
    no mesmo pensar e no mesmo agir.
    Eu soube, meus irmãos, pela gente de Cloé,
    que há divisões entre vós, que há entre vós quem diga:
    «Eu sou de Paulo», «eu de Apolo»,
    «eu de Pedro», «eu de Cristo».
    Estará Cristo dividido?
    Porventura Paulo foi crucificado por vós?
    Foi em nome de Paulo que recebestes o Baptismo?
    Na verdade, Cristo não me enviou para baptizar,
    mas para anunciar o Evangelho;
    não, porém, com sabedoria de palavras,
    a fim de não desvirtuar a cruz de Cristo.

    AMBIENTE

    Após ter abandonado a cidade de Corinto, Paulo continuou em contacto com a comunidade cristã. Mesmo distante, continuava a acompanhar a vida da comunidade e inteirava-se regularmente das dificuldades e problemas que os seus queridos filhos de Corinto tinham de enfrentar.
    Quando escreveu a primeira carta aos Coríntios, Paulo estava em Éfeso. De Corinto haviam chegado, entretanto, notícias alarmantes. Após a partida de Paulo, tinha aparecido na cidade um pregador cristão - um tal Apolo, judeu de Antioquia, convertido ao cristianismo. Era eloquente, versado nas Escrituras e foi de grande utilidade para a comunidade na polémica com os judeus. Era mais brilhante do que Paulo - conhecido pela sua falta de eloquência (cf. 2 Cor 10,10). Formaram-se partidos na comunidade (embora Apolo não favorecesse essa divisão, segundo parece): uns admiravam Paulo, outros Cefas (Pedro), outros Apolo (cf. 1 Cor 1,12). Formaram-se "partidos", à imagem do que acontecia nas escolas filosóficas da cidade, que tinham os seus mestres, à volta dos quais circulavam os adeptos ou simpatizantes: o cristianismo tornava-se, dessa forma, mais uma escola de sabedoria, na qual era possível optar por mestres distintos.
    A situação preocupou enormemente Paulo: além dos conflitos e rivalidades que a divisão provocava, estava em causa a essência da fé. O cristianismo corria, dessa forma, o perigo de se tornar mais uma escola de sabedoria, cuja validade dependia do brilho dos mestres que apresentavam a ideologia e do seu poder de convicção.

    MENSAGEM

    Para Paulo, contudo, o cristianismo não era a escolha de uma determinada filosofia de vida, defendida mais ou menos brilhantemente por um mestre qualquer; mas era a adesão a Jesus Cristo, o único e verdadeiro mestre.
    Paulo não mede as palavras: a Cristo e unicamente a Cristo os cristãos, todos, foram consagrados pelo baptismo. É Cristo e só Cristo a única fonte de salvação. Ser baptizado é entrar a fazer parte do corpo de Cristo e participar no acontecimento salvador do qual Cristo é o único mediador. Dizer que se é de Paulo, ou de Cefas, ou de Pedro é, portanto, desvirtuar gravemente a essência da fé cristã. Foi Paulo quem foi crucificado em benefício dos coríntios? O baptismo significou uma adesão à doutrina de Paulo, ou de outro qualquer mestre?
    Deve ficar bem claro que o importante não é quem baptizou ou quem anunciou o Evangelho: o importante é Cristo, do qual Paulo, Cefas e Apolo são simples e humanos instrumentos. Os coríntios são, portanto, intimados a não fixar a sua atenção em mestres humanos e a redescobrir Cristo, morto na cruz para dar vida a todos, como a essência da sua fé e do seu compromisso. Dessa forma, a comunidade será uma verdadeira família de irmãos, que recebe vida de Cristo, que vive em unidade e comunhão.

    ACTUALIZAÇÃO

    Para reflectir, considerar os seguintes dados:

    • O texto recorda que a experiência cristã é, fundamentalmente, um encontro com Cristo; é d'Ele e só d'Ele que brota a salvação. A vivência da nossa fé não pode, portanto, depender do carisma da pessoa tal, ou estar ligada à personalidade brilhante deste ou daquele indivíduo que preside à comunidade. Para além da forma mais ou menos brilhante, mais ou menos coerente como tal pessoa anuncia ou testemunha o Evangelho, tem de estar a nossa aposta em Cristo; é n'Ele e só n'Ele que bebemos a salvação; é a Ele e só a Ele que o nosso compromisso baptismal nos liga. Cristo é, de facto, a minha referência fundamental? É à volta d'Ele e da sua proposta de vida que a minha experiência de fé se constrói? Em concreto: que sentido é que faz, neste contexto, dizer que só se vai à missa se for tal padre a presidir? Que sentido é que faz afastar-se da comunidade porque não gostamos da atitude ou do jeito de ser deste ou daquele animador?

    • Neste contexto, ainda, que sentido fazem os ciúmes, os conflitos, os partidos, que existem, com frequência, nas nossas comunidades cristãs? Cristo pode estar dividido? Os conflitos e as divisões não serão um sinal claro de que, algures durante a caminhada, os membros da comunidade perderam Cristo? As guerras e rivalidades dentro de uma comunidade não serão um sinal evidente de que o que nos move não é Cristo, mas os nossos interesses, o nosso orgulho, o nosso egoísmo?

    • Há casos em que as pessoas com responsabilidade de animação nas comunidades cristãs favorecem, consciente ou inconscientemente, o culto da personalidade. Não se preocupam em levar as pessoas a descobrir Cristo, mas em conduzir o olhar e o coração dos fiéis para a sua própria e brilhante personalidade. Tornam-se imprescindíveis e inamovíveis, são incensadas e endeusadas e potenciam grupos de pressão que as admiram, que as apoiam e que as seguem de olhos fechados. Que sentido é que isto faz, à luz daquilo que Paulo nos diz, neste texto?

    ALELUIA - cf. Mt 4,23

    Aleluia. Aleluia.

    Jesus proclamava o Evangelho do reino
    e curava todas as doenças entre o povo.

    EVANGELHO - Mt 4,12-23

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

    Quando Jesus ouviu dizer
    que João Baptista fora preso,
    retirou-Se para a Galileia.
    Deixou Nazaré e foi habitar em Cafarnaum,
    terra à beira-mar, no território de Zabulão e Neftali.
    Assim se cumpria o que o profeta Isaías anunciara, ao dizer:
    «Terra de Zabulão e terra de Neftali,
    estrada do mar, além do Jordão, Galileia dos gentios:
    o povo que vivia nas trevas viu uma grande luz;
    para aqueles que habitavam na sombria região da morte,
    uma luz se levantou».
    Desde então, Jesus começou a pregar:
    «Arrependei-vos, porque o reino de Deus está próximo».
    Caminhando ao longo do mar da Galileia,
    viu dois irmãos:
    Simão, chamado Pedro, e seu irmão André,
    que lançavam as redes ao mar, pois eram pescadores.
    Disse-lhes Jesus: «Vinde e segui-Me
    e farei de vós pescadores de homens».
    Eles deixaram logo as redes e seguiram-n'O.
    Um pouco mais adiante, viu outros dois irmãos:
    Tiago, filho de Zebedeu, e seu irmão João,
    que estavam no barco, na companhia de seu pai Zebedeu,
    a consertar as redes.
    Jesus chamou-os
    e eles, deixando o barco e o pai, seguiram-n'O.
    Depois começou a percorrer toda a Galileia,
    ensinando nas sinagogas,
    proclamando o Evangelho do reino
    e curando todas as doenças e enfermidades entre o povo.

    AMBIENTE

    O texto que nos é proposto como Evangelho funciona um pouco como texto-charneira, que encerra a etapa da preparação de Jesus para a missão (cf. Mt 3,1-4,16) e que lança a etapa do anúncio do Reino.
    O texto situa-nos na Galileia, a região setentrional da Palestina, zona de população mesclada e ponto de encontro de muitos povos. Refere, ainda, a cidade de Cafarnaum: situada no limite do território de Zabulão e de Neftali, na margem noroeste do lago de Genezaré, no enfiamento do "caminho do mar" (que ligava o Egipto e a Mesopotâmia), era considerada a capital judaica da Galileia (Tiberíades, a capital política da região, por causa dos seus costumes gentílicos e por estar construída sobre um cemitério, era evitada pelos judeus). A sua situação geográfica abria-lhe, também, as portas dos territórios dos povos pagãos da margem oriental do lago.

    MENSAGEM

    Na primeira parte (cf. Mt 4,12-16), Mateus refere como Jesus abandona Nazaré, o seu lugar de residência habitual, e se transfere para Cafarnaum. Mateus descobre nesse facto um significado profundo, à luz de Is 8,23-9,1: a "luz" que havia de eliminar as trevas e as sombras da morte de que fala Isaías é, para Mateus, o próprio Jesus. Na terra humilhada de Zabulão e Neftali, vai começar a brilhar a luz da libertação; e essa libertação vai atingir, também, os pagãos que acolherem o anúncio do Reino (para Mateus, é bem significativo que o primeiro anúncio ecoe na Galileia, terra onde os gentios se misturam com os judeus e, concretamente, em Cafarnaum, a cidade que, pela sua situação geográfica, é uma ponte para as terras dos pagãos). O anúncio libertador de Jesus apresenta, desde logo, uma dimensão universal.
    Na segunda parte (cf. Mt 4,17-23), Mateus apresenta o lançamento da missão de Jesus: define-se o conteúdo básico da pregação que se inicia, mostra-se o "Reino" como realidade viva actuante, apresentam-se os primeiros discípulos que acolhem o apelo do "Reino" e que vão acompanhar Jesus na missão.
    Qual é, em primeiro lugar, o conteúdo do anúncio? O versículo 17 di-lo de forma clara: Jesus veio trazer "o Reino". A expressão "Reino de Deus" (ou "Reino dos céus", como prefere dizer Mateus) refere-se, no Antigo Testamento e na época de Jesus, ao exercício do poder soberano de Deus sobre os homens e sobre o mundo. Decepcionado com a forma como os reis humanos exerceram a realeza (no discurso profético aparecem, a par e passo, denúncias de injustiças cometidas pelos reis contra os pobres, de atropelos ao direito orquestrados pela classe dirigente, de responsabilidades dos líderes no abandono da aliança, de graves omissões no que diz respeito aos compromissos assumidos para com Jahwéh), o Povo de Deus começa a sonhar com um tempo novo, em que o próprio Deus vai reinar sobre o seu Povo; esse reinado será marcado - na perspectiva dos teólogos de Israel - pela justiça, pela misericórdia, pela preocupação de Deus em relação aos pobres e marginalizados, pela abundância e fecundidade, pela paz sem fim.
    Jesus tem consciência de que a chegada do "Reino" está ligada à sua pessoa. O seu primeiro anúncio resume-se, para Mateus, no seguinte slogan: "arrependei-os ('metanoeite') porque o Reino dos céus está a chegar".
    O convite à conversão ("metanoia") é um convite a uma mudança radical na mentalidade, nos valores, na postura vital. Corresponde, fundamentalmente, a um reorientar a vida para Deus, a um reequacionar a vida, de modo a que Deus e os seus valores passem a estar no centro da existência do homem; só quando o homem aceita que Deus ocupe o lugar que Lhe compete, está preparado para aceitar a realeza de Deus... Então, o "Reino" pode nascer e tornar-se realidade no mundo e nos corações.
    Na sequência, Mateus apresenta Jesus a construir activamente o "Reino" (vers. 23-24): as suas palavras anunciam essa nova realidade e os seus gestos (os milagres, as curas, as vitórias sobre tudo o que rouba a vida e a felicidade do homem) são sinais evidentes de que Deus começou já a reinar e a transformar a escravidão em vida e liberdade.
    Finalmente, Mateus descreve o chamamento dos primeiros discípulos (vers. 18-22). Não se trata, segundo parece (a comparação deste relato, que Mateus toma de Marcos, com os relatos paralelos de Lucas e João, mostra que estamos diante de um relato estilizado, cujo objectivo é pôr em relevo os passos fundamentais da vocação) de um relato jornalístico de acontecimentos, mas de uma catequese sobre o chamamento e a adesão ao projecto do "Reino". Através da resposta pronta de Pedro e André, Tiago e João, propõe-se um exemplo da conversão radical ao "Reino" e de adesão às suas exigências.
    O relato sublinha uma diferença fundamental entre os chamados por Jesus e os discípulos que se juntavam à volta dos mestres do judaísmo: não são os discípulos que escolhem o mestre e pedem para entrar no seu grupo, como acontecia com os discípulos dos "rabbis"; mas a iniciativa é de Jesus, que chama os discípulos que Ele próprio escolheu, que os convida a segui-l'O e lhes propõe uma missão.
    A resposta dos quatro discípulos ao chamamento é paradigmática: renunciam
    à família, ao seu trabalho, às seguranças instituídas e seguem Jesus sem condições. Esta ruptura (que significa não só uma ruptura afectiva com pessoas, mas também a ruptura com um quadro de referências sociais e de segurança económica) indicia uma opção radical pelo "Reino" e pelas suas exigências.
    Uma palavra para a missão que é proposta aos discípulos que aceitam o desafio do "Reino": eles serão pescadores de homens. O mar é, na cultura judaica, o lugar dos demónios, das forças da morte que se opõem à vida e à felicidade dos homens; a tarefa dos discípulos que aceitam integrar o "Reino" será, portanto, libertar os homens dessa realidade de morte e de escravidão em que eles estão mergulhados, conduzindo-os à liberdade e à realização plenas.
    Estes quatro discípulos representam todo o grupo dos discípulos, de todos os tempos e lugares... Eles devem responder positivamente ao chamamento, optar pelo "Reino" e pelas suas exigências e tornarem-se testemunhas da vida e da salvação de Deus no meio dos homens e do mundo.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão e a partilha da Palavra que nos é proposta podem partir dos seguintes dados:

    • Jesus é o Deus que vem ao nosso encontro para realizar os nossos sonhos de felicidade sem limites e de paz sem fim. N'Ele e através d'Ele (das suas palavras, dos seus gestos), o "Reino" aproximou-se dos homens e deixou de ser uma quimera, para se tornar numa realidade em construção no mundo. Contemplar o anúncio de Jesus é abismar-se na contemplação de uma incrível história de amor, protagonizada por um Deus que não cessa de nos oferecer oportunidades de realização e de vida plena. Sobretudo, o anúncio de Jesus toca e enche de júbilo o coração dos pobres e humilhados, daqueles cuja voz não chega ao trono dos poderosos, nem encontram lugar à mesa farta do consumismo, nem protagonizam as histórias balofas das colunas sociais. Para eles, ouvir dizer que "o Reino chegou" significa que Deus quer oferecer-lhes essa vida plena e feliz que os grandes e poderosos insistem em negar-lhes.

    • Para que o "Reino" seja possível, Jesus pede a "conversão". Ela é, antes de mais, um refazer a existência, de forma a que só Deus ocupe o primeiro lugar na vida do homem. Implica, portanto, despir-se do egoísmo que impede de estar atento às necessidades dos irmãos; implica a renúncia ao comodismo, que impede o compromisso com os valores do Evangelho; implica o sair do isolamento e da auto-suficiência, para estabelecer relação e para fazer da vida um dom e um serviço aos outros... O que é que nas estruturas da sociedade ainda impede a efectivação do "Reino"? O que é que na minha vida, nas minhas opções, nos meus comportamentos constitui um obstáculo à chegada do "Reino"?

    • A história do compromisso de Pedro e André, Tiago e João com Jesus e com o "Reino" é uma história que define os traços essenciais da caminhada de qualquer discípulo... Em primeiro lugar, é preciso ter consciência de que é Jesus que chama e que propõe o Reino; em segundo lugar, é preciso ter a coragem de aceitar o chamamento e fazer do "Reino" a prioridade essencial (o que pode implicar, até, deixar para segundo plano os afectos, as seguranças, os valores humanos); em terceiro lugar, é preciso acolher a missão que Jesus confia e comprometer-se corajosamente na construção do "Reino" no mundo. É este o caminho que eu tenho vindo a percorrer?

    • A missão dos que escutaram o apelo do "Reino" passa por testemunhar a salvação que Deus tem para oferecer a todos os homens, sem excepção. Nós, discípulos de Jesus, comprometidos com a construção do "Reino", somos testemunhas da libertação e levamos a Boa Nova da salvação aos homens de toda a terra? Aqueles que vivem condenados à marginalização (por causa do fraco poder económico, por causa da doença, por causa da solidão, por causa do seu inexistente poder de reivindicação), já receberam, através do nosso testemunho, a Boa Nova do "Reino"?

    • Em certos momentos da história, procura vender-se a ideia de que o mundo novo da justiça e da paz se constrói a golpes de poder militar, de mísseis, de armas sofisticadas, de instrumentos de morte... Atenção: a lógica do "Reino" não é uma lógica de violência, de vingança, de destruição; mas é uma lógica de amor, de doação da vida, de comunhão fraterna, de tolerância, de respeito pelos outros. A tentação da violência é uma tentação diabólica, que só gera sofrimento e escravidão: aí, o "Reino" não está.

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS
    PARA O 3º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao Domingo do 3º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa...

    2. ORAÇÃO PARA A UNIDADE DOS CRISTÃOS.
    Este domingo situa-se no centro da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos (18-25 de Janeiro). Pode-se associar a assembleia a esta intenção fundamental da Unidade. Pode ser proposta uma caminhada no momento do Credo: lamparinas ou pequenas velas são distribuídas aos fiéis à entrada da igreja e acesas para a profissão de fé; terminada esta, todos vão em procissão e colocam-nas junto a uma grande Cruz perto do altar. Antes da profissão de fé, uma introdução apresenta o gesto como o reconhecimento da luz da Cruz, única fonte de Unidade.

    3. BILHETE DE EVANGELHO: UNIDADE E PAZ...
    Estamos quase a terminar o mês de Janeiro, celebrando duas dimensões marcantes da caminhada neste mês: a Paz (Natal e primeiro dia do ano) e a Unidade (Semana de Oração que estamos a viver). Nestes dias, rezamos pela Unidade, em comunhão com todos os nossos irmãos cristãos que a história separou. Em Dezembro e início do ano, rezámos pela Paz, em comunhão com todos os crentes que erguem os olhos para Aquele que chamam Deus. Devemos desejar esta Unidade e esta Paz, porque sofremos todos da separação e dos conflitos de vária ordem. Mas se a Unidade e a Paz permanecem apenas como votos, quem os realizará? É preciso decidir e fazer a Unidade. Há palavras, gestos, caminhadas que unem, que congregam. Isso tem um nome: Reconciliação. É preciso decidir e fazer a Paz: há mãos estendidas, olhares benevolentes, escutas atentas, palavras apaziguadoras, julgamentos compreensíveis. Isso tem um nome: Perdão. A Unidade e a Paz: podemos desejá-las! A Reconciliação e o Perdão: devemos decidi-los!

    4. ATENÇÃO ÀS CRIANÇAS.
    A primeira leitura e o Evangelho mencionam nomes de lugares. Para os concretizar junto das crianças, pode-se preparar um mapa (foto, desenho ou projecção) da terra de Jesus. Nele podemos inscrever o nome dos lugares mencionados, mas também alguns pontos de referência: o Mediterrâneo, Jerusalém, Belém. O objectivo é ajudar as crianças a perceber que este país existe e que há, como no nosso país, cidades, aldeias, regiões, montanhas, lagos, etc. Este mapa pode ser apresentado durante a introdução às leituras. Os lugares de referência estão já são escritos anteriormente. Os que são mencionados nas leituras são colocados pelas crianças no momento em que são citados pelo leitor.

    5. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
    Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.

    No final da primeira leitura:
    Deus de luz e de glória, nós Te damos graças pela tua constante presença ao lado do teu povo. Depois da saída do Egipto até hoje, Tu nos visitas sempre que estamos nas trevas.
    Nós Te pedimos pelos nossos irmãos que habitam a terra das trevas, e por nós mesmos, que nos envias a levar-lhes a luz.

    No final da segunda leitura:
    Deus nosso Pai, nós Te bendizemos pelo Espírito de unidade que revelas às tuas Igrejas em todo o tempo e lugar, desde a época de São Paulo até aos nossos dias.
    Nós Te pedimos pelas comunidades e pelas famílias cristãs: que não haja divisão entre nós, que estejamos em perfeita harmonia, para tornar credível o anúncio do Evangelho e a salvação pela Cruz de Cristo.

    No final do Evangelho:
    Nosso Pai, nós Te louvamos pelo Reino dos céus, do qual manifestaste a presença no meio de nós, e pelo apelo que diriges a cada um de nós.
    Nós Te pedimos pelas tuas comunidades e por todos nós: Converte os nossos corações à tua presença nas nossas vidas. Tu nos envias como pescadores de homens. Fortalece a nossa fé em Ti, que ela seja irradiadora de luz.

    6. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Pode-se escolher a Oração Eucarística I, dizendo o nome dos apóstolos referidos no Evangelho...

    7. PALAVRA EXPLICADA: A ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    O Missal actual propõe, à escolha, uma dezena de orações eucarísticas, enquanto, antes do Concílio, as liturgias latinas só conheciam uma, o cânone romano, a actual Oração Eucarística I. Todas as dez orações eucarísticas têm os mesmos elementos, com importantes variantes, mas a organização do conjunto varia ligeiramente: na Oração Eucarística I, as intercessões pelos vivos são colocadas antes da narração da Última Ceia e, nas orações eucarísticas das assembleias com crianças, são mais numerosas que nas outras. Todas as orações eucarísticas começam pelo louvor a Deus e a recordação das suas obras, com uma evocação da liturgia celeste, à qual nos associamos pelo cântico do Três vezes Santo. O louvor converge para a narração da Última Ceia que é o culminar da obra da salvação. As palavras que envolvem e seguem esta narração exprimem a implicação que ela tem para a assembleia: expressão de oferenda, invocação do Espírito Santo, intercessões pela Igreja, pelos seus membros vivos e defuntos, e pelo mundo.

    8. PALAVRA PARA O CAMINHO.
    Irradiar a luz... Os textos bíblicos de hoje são atravessados de Luz para o nosso caminho de trevas. Quantos homens e mulheres andam à procura de sentido e procuram o seu caminho na noite... As nossas vidas de baptizados estão em coerência com Aquele de quem nos reclamamos como cristãos? A Luz do Ressuscitado é-nos confiada para nos juntarmos aos nossos irmãos... Somos focos que irradiam luz ou candeeiros opacos?

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador: P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

  • S. Francisco de Sales, Bispo e doutor da Igreja

    S. Francisco de Sales, Bispo e doutor da Igreja


    24 de Janeiro, 2023

    Nasceu em Thorans, pequena aldeia da Saboia francesa, em 1567. Tendo recebido uma boa educação na família, estudou num colégio de Jesuítas, em Paris e, depois, frequentou a universidade de Pádua, onde se formou em Direito. Contrariando as expetativas do pai, abraçou a vida eclesiástica e dedicou-se com sucesso à evangelização. Nomeado bispo de Genebra, desenvolveu grande atividade na reforma da diocese e exerceu profícuo apostolado entre os protestantes. Para além da sua iluminada atividade pastoral, dedicou-se à direção espiritual de muitas pessoas, escrevendo as preciosas obras de espiritualidade para todos, particularmente para os leigos, intituladas Filoteia, ou Introdução à vida devota, e Teotimo, ou tratado do amor de Deus. Com Santa Joana de Chantal, fundou a Visitação. Faleceu em 1622. É padroeiro da Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus, Dehonianos, e dos jornalistas católicos.
    Lectio
    Primeira leitura: Efésios 3, 8-12

    Irmãos, a mim, o menor de todos os santos, foi dada a graça de anunciar aos gentios a insondável riqueza de Cristo 9e a todos iluminar sobre a realização do mistério escondido desde séculos em Deus, o criador de todas as coisas 10para que agora, por meio da Igreja, seja dada a conhecer, aos Principados e às Autoridades no alto do Céu, a multiforme sabedoria de Deus, 11de acordo com o desígnio eterno que Ele realizou em Cristo Jesus Senhor nosso. 12Em Cristo, mediante a fé nele, temos a liberdade e coragem de nos aproximarmos de Deus com confiança.

    Paulo apresenta-se como ministro do mistério de Cristo, não por iniciativa própria, mas por vocação e graça. O seu trabalho de evangelizador dos pagãos é um dom recebido e uma missão a realizar. Deus tinha um desígnio arcano (mysterium), preparado longamente e agora revelado, na sua realização, a Paulo, de modo particular. Por meio dele, Deus quer revelá-lo a todos, especialmente aos pagãos. O conteúdo do mistério é o seguinte: todos são chamados a conhecer a extraordinária sabedoria de Deus, que também representa a extraordinária riqueza de Cristo.
    Evangelho: João 10, 11-18

    Naquele tempo, Jesus disse: "Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a sua vida pelas ovelhas. 12O mercenário, e o que não é pastor, a quem não pertencem as ovelhas, vê vir o lobo e abandona as ovelhas e foge e o lobo arrebata-as e espanta-as, 13porque é mercenário e não lhe importam as ovelhas. 14Eu sou o bom pastor; conheço as minhas ovelhas e as minhas ovelhas conhecem-me, 15assim como o Pai me conhece e Eu conheço o Pai; e ofereço a minha vida pelas ovelhas. 16Tenho ainda outras ovelhas que não são deste redil. Também estas Eu preciso de as trazer e hão-de ouvir a minha voz; e haverá um só rebanho e um só pastor. 17É por isto que meu Pai me tem amor: por Eu oferecer a minha vida, para a retomar depois. 18Ninguém ma tira, mas sou Eu que a ofereço livremente. Tenho poder de a oferecer e poder de a retomar. Tal é o encargo que recebi de meu Pai.»

    A figura do pastor é comum na tradição hebraica para indicar o rei de Israel e a relação do crente com Deus, o pastor por excelência. Jesus identifica-se com essa imagem, aprofundando-a e levando-a à sua plena realização. Ele é o pastor belo (kalós) e bom não só na aparência, mas também na qualidade. É o autêntico pastor. O termo "belo" ou "bom" significa suave e afável, mas, sobretudo, autêntico. Jesus é o novo David, chefe e guia conforme o coração de Deus. É pastor, não só de Israel, mas também de "outras ovelhas" como os samaritanos e os pagãos, que são filhos de Deus dispersos e devem ser reconduzidos ao redil e à salvação, conforme o desígnio do Pai.
    Meditatio

    S. Francisco de Sales foi o pastor belo e bom que tornou amável o rosto da Igreja num tempo de grandes contrastes e lutas. Como Cristo, entregou-se e consumiu a sua vida, não só pelas ovelhas do redil, mas também pelas que andavam perdidas. Foi esse dar a vida por todos que abriu os olhos a muitas ovelhas "perdidas". S. Francisco de Sales foi, nos séculos XVI e XVII, o pastor autêntico, preocupado exclusivamente em dar a própria vida, arriscando-a em situações por vezes muito difíceis para evangelizar, servir a sua diocese e restaurar a vida da Igreja nas dioceses de Genebra e Annecy. Em tudo se deixa conduzir pelo princípio do amor puro, como disponibilidade incondicional ao projeto de Deus. É isso que também ensina às pessoas sedentas de perfeição cristã.
    É um verdadeiro repouso para a alma contemplar este santo, ler os seus escritos, tal é a sua caridade, a paciência e o otimismo que exala. A fonte de tudo isto está na esperança em Deus, ao qual se entrega para servir sem reservas o seu povo.
    Francisco de Sales exultava de alegria ao pensar que toda a lei se resume no mandamento do amor e que não devemos ter medo de amar excessivamente.
    O P. Dehon aponta-o como um "santo do Coração de Jesus". E justifica: "A grande obra da sua piedade foi a fundação da Visitação donde saiu a devoção ao Sagrado Coração", uma evidente alusão a Santa Margarida Maria, visitandina, favorecida com extraordinárias revelações de Jesus e apóstola do seu Coração.
    Oratio

    Amável santo, vós sois um dos mestres da devoção ao Sagrado Coração. Haveis formado tão bem a Ordem da Visitação, que Nosso Senhor aí encontrou um campo bem preparado para lá semear esta bela devoção. Preparai também os nossos corações. Por vossa intercessão, purificai-nos e formai-nos ao apostolado do Coração de Jesus. (Leão Dehon, OSP 3, p. 103).
    Contemplatio

    S. Francisco de Sales é modelo de mansidão. É a característica da sua vida. Foi suave como o bom Mestre. Não o era por natureza, mas tornou-se pelos seus esforços e pela graça de Deus. Imagem perfeita do Bom Pastor, vai através de todas as fadigas procurar as ovelhas perdidas. Fala às pessoas pobres, aos pastores das montanhas com uma bondade que os enternece. Entra nas suas necessidades e nas suas mágoas e assiste-os com a sua bolsa e os seus bens. A sua reputação de mansidão é conhecida longe... A sua caridade sem limites punha em desespero o seu ecónomo, mas o caro santo mostrava-lhe o crucifixo e dizia-lhe: "Como é que hesitaremos em despojar-nos, quando vemos o que um Deus fez por nós". A doçura era a sua virtude dominante. Dizia um dia que tinha estado três anos a estudar na escola de Jesus Cristo e que não podia contentar-se lá em cima. Algumas pessoas tendo-o um dia censurado por causa da sua indulgência para com os pecadores, respondeu-lhes: "Se houvesse alguma coisa melhor que a mansidão, Deus no-la teria ensinado. Mas ele não nos recomenda senão duas coisas, ser mansos e humildes de coração. Quereis impedir-me de observar o mandamento de Deus e de imitar o mais que puder a virtude da qual nos deu o exemplo?" (Leão Dehon, OSP 3, p. 102).
    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "O bom pastor dá a sua vida pelas ovelhas" (Jo 10, 11b).
    ----

    S. Francisco de Sales, Bispo e doutor da Igreja (24 Janeiro)

  • Conversão de S. Paulo

    Conversão de S. Paulo


    25 de Janeiro, 2023

    Saulo, cidadão romano por privilégio da sua cidade natal, Tarso, era um judeu convicto, formado na escola de Gamaliel, em Jerusalém. Opôs-se decididamente à nova fé que começava a propagar-se na Palestina e arredores. Clamou pela morte de Estêvão, e tomou parte nela, guardando as capas dos que apedrejavam o protomártir. Perseguiu violentamente os crentes em Jesus Cristo. O seu nome causava terror nas comunidades cristãs. Ao dirigir-se para Damasco para prender os cristãos que lá encontrasse e conduzi-los a Jerusalém, encontrou Jesus ressuscitado. Esse encontro mudou-lhe para sempre a vida, com a sua forma de crer e de pensar. Jesus ressuscitado, que ele perseguia, tornou-se o centro da sua espiritualidade e da sua teologia. Em Antioquia, Saulo faz a sua primeira experiência de vida cristã. Tornado apóstolo do Evangelho, com o nome de Paulo, Antioquia será também o ponto de partida para as suas viagens missionárias. Funda diversas comunidades na Ásia e na Europa. Escreve-lhes cartas que testemunham o seu amor a Jesus Cristo e à Igreja, e nos dão elementos importantes da sua teologia. Como apóstolo verdadeiro e autêntico, Paulo tem sempre o cuidado de voltar a Jerusalém para se confrontar com os outros apóstolos e não correr em vão.

    Há muitos séculos que a festa da conversão de S. Paulo foi fixada no dia 25 de Janeiro, talvez por causa da data da transladação do seu corpo, que atualmente repousa na Basílica de S. Paulo Fora dos Muros, em Roma.
    Lectio

    Primeira Leitura: Act 22, 3-16

    Naqueles dias, Paulo disse ao povo: "Sou judeu, nascido em Tarso da Cilícia, mas fui educado nesta cidade, instruído aos pés de Gamaliel, em todo o rigor da Lei dos nossos pais e cheio de zelo pelas coisas de Deus, como todos vós sois agora. 4Persegui de morte esta «Via», algemando e entregando à prisão homens e mulheres, 5como o podem testemunhar o Sumo Sacerdote e todos os anciãos. Recebi até, da parte deles, cartas para os irmãos de Damasco, onde ia para prender os que lá se encontrassem e trazê-los agrilhoados a Jerusalém, a fim de serem castigados. 6Ia a caminho, e já próximo de Damasco, quando, por volta do meio dia, uma intensa luz, vinda do Céu, me rodeou com a sua claridade. 7Caí por terra e ouvi uma voz que me dizia: 'Saulo, Saulo, porque me persegues?' 8Respondi: 'Quem és Tu, Senhor?' Ele disse-me, então: 'Eu sou Jesus de Nazaré, a quem tu persegues.' 9Os meus companheiros viram a luz, mas não ouviram a voz de quem me falava. 10E prossegui: 'Que hei-de fazer, Senhor?' O Senhor respondeu-me: 'Ergue-te, vai a Damasco, e lá te dirão o que se determinou que fizesses.' 11Mas, como eu não via, devido ao brilho daquela luz, fui levado pela mão dos meus companheiros e cheguei a Damasco. 12Ora um certo Ananias, homem piedoso e cumpridor da Lei, muito respeitado por todos os judeus da cidade, 13foi procurar-me e disse: 'Saulo, meu irmão, recupera a vista.' E, no mesmo instante, comecei a vê-lo. 14Ele prosseguiu: 'O Deus dos nossos pais predestinou-te para conheceres a sua vontade, para veres o Justo e para ouvires as palavras da sua boca, 15porque serás testemunha diante de todos os homens, acerca do que viste e ouviste. 16E agora, porque esperas? Levanta-te, recebe o batismo e purifica-te dos teus pecados, invocando o seu nome.

    Este é um dos três relatos com que Lucas enriquece a história da primitiva comunidade cristã. Sem se preocupar com o rigor histórico, - alguns pormenores são mesmo improváveis -, o autor do livros dos Atos pretende personificar em Paulo a justificação do cristianismo e a falta de razão do judaísmo.
    O evento de Damasco articula-se em três momentos: um diálogo de reconhecimento mútuo entre Jesus Ressuscitado e Saulo de Tarso; a conversão de Saulo revelada na pergunta: "Que hei de fazer, Senhor?"; a missão: quem conheceu a vontade de Deus e viu o Justo recebendo a palavra da sua boca, torna-se testemunha do que viu e ouviu. Doravante, para Paulo, a única forma de vida é ser missionário.
    Evangelho: Marcos 16, 15-18

    Naquele tempo, Jesus apareceu aos Onze e disse-lhes: «Ide pelo mundo inteiro, proclamai o Evangelho a toda a criatura. 16Quem acreditar e for batizado será salvo; mas, quem não acreditar será condenado. 17Estes sinais acompanharão aqueles que acreditarem: em meu nome expulsarão demónios, falarão línguas novas, 18apanharão serpentes com as mãos e, se beberem algum veneno mortal, não sofrerão nenhum mal; hão de impor as mãos aos doentes e eles ficarão curados.»

    Paulo não pertenceu ao grupo dos Doze. Mas a Liturgia aplica-lhe também as palavras de Jesus aos Doze, no momento em que subia ao céu: "Ide pelo mundo inteiro, proclamai o Evangelho a toda a criatura" (v. 15). Paulo, depois da sua experiência de fé e de comunidade, torna-se verdadeiro apóstolo de Jesus. Desde sempre a Igreja entendeu que o mandato missionário do Ressuscitado se dirigia também a ele. Paulo submete-se e obedece.
    Deus quer salvar a humanidade com a colaboração da própria humanidade. Jesus precisa de missionários-testemunhas. A salvação é fruto da pregação e realiza-se pelo ato de fé de quem a escuta: "Quem acreditar e for batizado será salvo" (v. 16). Deus, que nos criou sem nós, não nos salva sem a nossa colaboração.
    Os sinais e prodígios que acompanham a pregação dos apóstolos manifestam a presença consoladora de Deus no meio de nós.
    Meditatio

    Em S. Paulo revela-se verdadeiramente o poder de Deus. Inimigo acérrimo do nome de Cristo, Saulo encontra-se com o Senhor no caminho de Damasco, acolhe-o na fé e torna-se seu Apóstolo entusiasta, com uma fecundidade extraordinária, que ainda não terminou. O seu itinerário de fé é símbolo do nosso.
    Acreditar implica, antes de mais, encontrar pessoalmente Jesus de Nazaré, Deus feito homem. O cristão não se acredita numa doutrina, num sistema, mas numa pessoa, a pessoa humano-divina de Jesus. Ter fé é aderir vitalmente a Jesus, de tal modo que já não se pode viver sem Ele.
    Realizado o encontro, passa-se ao diálogo, uma vez que a fé é encontro e adesão entre pessoas inteligentes e livres. A quem se dispõe ao diálogo, Deus revela a Si mesmo, revela a sua vontade e os seus projetos. Este diálogo vital leva aqueles que o realizam a uma forma de vida cada vez mais elevada.
    Mas a fé cristã também é obediência, submissão, abandono total da criatura ao Criador. Obedecer não significa abdicar da própria liberdade ou dos próprios direitos. Significa, sim, perceber a imensa distância que existe entre si o interlocutor e, ao mesmo tempo, intuir que a adesão à vontade divina leva à total satisfação e realização de si mesmo.
    Finalmente, a fé cristã é também missão. Não se pode privatizar um bem que, por sua natureza, é comunitário. Quem recebeu de Cristo o dom da salvação em Cristo, sente-se intimamente obrigado a fazer dele um dom para os outros.
    O Apóstolo Paulo é nosso guia em tempos de aprofundamento espiritual e de renovação apostólica. Como ele, o apóstolo dos tempos novos deve procurar, em primeiro lugar, a inteligência do Mistério de Cristo num apego inquebrantável ao seu Amor (cf. Ef 3, 4; Rm 8, 35; Fl 3, 8-10). É apóstolo, em primeiro lugar, pelo testemunho da visão de Cristo (At 26, 1) e tornando-se no Espírito imagem viva do Salvador morto e ressuscitado. É a caridade do Senhor que vive nele e que o impele em direção aos homens para lhes anunciar o Evangelho de Deus, o Evangelho que todos podem ler na sua vida e nos seus escritos. Ensina-nos o serviço ardente e inteligente em favor do Reino. Vivendo de Cristo, a ponto de ser identificado com Ele pela graça (Gl 2, 20), lembra-nos que o serviço apostólico enraíza numa verdadeira consagração a Deus e dá à nossa oblação capacidade para se manifestar e aprofundar no trabalho generoso para que a humanidade se torne «uma oblação agradável santificada pelo Espírito Santo (XV Capítulo Geral, DOC VII, n. 167).
    Oratio

    Apóstolo S. Paulo, na tua juventude, deixaste-te levar por um zelo ardente mas errado em favor da unidade do povo de Deus. Por isso, perseguiste duramente os cristãos. Deus converteu-te e introduziu-te na Igreja, Corpo de Cristo, onde deve integrar-se quem quiser viver na verdadeira fé. Mas a tua adesão a Cristo e a tua integração na Igreja não te fizerem esquecer o teu povo, pelo qual sentias uma dor profunda e permanente. Que a minha alegria de estar em Cristo não me faça esquecer a situação do antigo Povo de Deus, nem a dos cristãos divididos, que tardam em chegar à unidade que Deus quer. Ámen.
    Contemplatio

    S. Paulo recolhe-se alguns dias, depois começa a pregar a divindade de Jesus Cristo. Será um dos mais poderosos apóstolos pela palavra e pelo sofrimento. «Escolhi-o, dizia Nosso Senhor, para levar o meu nome diante das nações e dos reis e dos filhos de Israel, e hei de mostrar-lhe quanto terá de sofrer pelo meu nome». A sua conversão e a sua vocação são devidas à misericórdia do Coração de Jesus. O Coração de Jesus ama as almas ardentes, zelosas, dedicadas. Mas a oração de Santo Estêvão contribuiu para estas grandes graças. Santo Estêvão rezava pelos seus perseguidores, entre os quais S. Paulo era o mais ardente. Se soubermos rezar e sofrer pelas almas, obteremos grandes graças, ilustres conversões, vocações poderosas. Ofereçamos as nossas orações, as nossas cruzes, os nossos sofrimentos ao Coração de Jesus para que envie à sua Igreja, nestes tempos difíceis, apóstolos poderosos em palavras e em obras (L. Dehon, OSP 3, p. 90s.).
    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Que hei de fazer, Senhor?" (At 22, 10).

     

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    Conversão de S. Paulo (25 Janeiro)

  • S. Timóteo e S. Tito, Bispos

    S. Timóteo e S. Tito, Bispos


    26 de Janeiro, 2023

    S. Timóteo nasceu em Listra. A sua mãe era hebreia e o seu pai era grego. Colaborou intimamente com S. Paulo na evangelização, mantendo por ele um afeto filial. O Apóstolo colocou-o à frente da Igreja de Éfeso.

    S. Tito, que parece vir do paganismo, tornou-se um cristão de fé sólida e um evangelizador ativo e fervoroso. Na carta que lhe é dirigida, aparece-nos como responsável pela Igreja de Creta.
    Lectio
    Primeira leitura: 2 Timóteo 1, 1-8

    Paulo, apóstolo de Jesus Cristo, por desígnio de Deus, segundo a promessa de vida que há em Cristo Jesus, 2a Timóteo, meu filho querido: graça, misericórdia e paz de Deus Pai e de Cristo Jesus, Nosso Senhor. 3Dou graças a Deus, a quem sirvo em consciência pura, como já o fizeram os meus antepassados, ao recordar-te constantemente nas minhas orações, noite e dia. 4Ao lembrar-me das tuas lágrimas, anseio ver-te, para completar a minha alegria, 5pois trago à memória a tua fé sem fingimento, que se encontrava já na tua avó Loide e na tua mãe Eunice e que, estou seguro, se encontra também em ti. 6Por isso recomendo-te que reacendas o dom de Deus que se encontra em ti, pela imposição das minhas mãos, 7pois Deus não nos concedeu um espírito de timidez, mas de fortaleza, de amor e de bom senso. 8Portanto, não te envergonhes de dar testemunho de Nosso Senhor, nem de mim, seu prisioneiro, mas compartilha o meu sofrimento pelo Evangelho, apoiado na força de Deus.

    A Segunda Carta a Timóteo é uma espécie de testamento espiritual do Apóstolo, na véspera do seu martírio. Trata-se de um escrito da escola paulina, de finais do século I. Entre expressões de afeto e de estima por Timóteo, Paulo afirma a sua condição de Apóstolo, vocação e missão a que foi chamado e às quais correspondeu generosamente. Paulo sublinha também a continuidade entre o seguimento de Jesus e a fidelidade à lei hebraica, que viveu e pregou. O mesmo sucede com Timóteo, filho de pai grego, mas iniciado ao cristianismo pela sua avó e pela sua mãe, ambas hebreias. O autor da carta acentua também o carisma de pastor de almas personificado em Timóteo, e transmitido pelo Apóstolo, através da imposição das mãos. Em todo o texto domina o testemunho dado a Cristo por Paulo nas diversas e difíceis provações por que passou, e que Timóteo deve continuar, com a graça de Deus.
    Evangelho: Lucas 10, 1-9

    Naquele tempo, designou o Senhor outros setenta e dois discípulos e enviou-os dois a dois, à sua frente, a todas as cidades e lugares aonde Ele havia de ir. 2Disse-lhes:«A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos. Rogai, portanto, ao dono da messe que mande trabalhadores para a sua messe. 3Ide! Envio-vos como cordeiros para o meio de lobos. 4Não leveis bolsa, nem alforge, nem sandálias; e não vos detenhais a saudar ninguém pelo caminho. 5Em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: 'A paz esteja nesta casa!' 6E, se lá houver um homem de paz, sobre ele repousará a vossa paz; se não, voltará para vós. 7Ficai nessa casa, comendo e bebendo do que lá houver, pois o trabalhador merece o seu salário. Não andeis de casa em casa. 8Em qualquer cidade em que entrardes e vos receberem, comei do que vos for servido, 9curai os doentes que nela houver e dizei-lhes: 'O Reino de Deus já está próximo de vós.'

    A obra de Jesus está internamente aberta e realiza-se através dos discípulos. Os Doze continuam a ser o fundamento de toda a missão da Igreja. Mas, juntamente com eles, e depois deles, Jesus escolheu muitos outros. A messe é grande e os trabalhadores acabam sempre por ser poucos. O nosso texto alude a setenta e dois, número de plenitude e sinal de todos os missionários posteriores que anunciam a mensagem do reino na nossa Igreja. Através desses discípulos, a missão de Jesus alcança todas as fronteiras da história, chegando à sua plenitude na grande meta da ceifa escatológica.
    Meditatio

    "Recomendo-te que reacendas o dom de Deus que se encontra em ti" (v. 6). Para nós, esse dom é a vocação cristã, primeiro anel de uma corrente de dons que Deus tem para nos dar. Podemos meditar nesse dom na perspetiva da fraternidade, sublinhando dois aspectos: a simplicidade fraterna e a fidelidade fraterna. Quanto à simplicidade fraterna, não havemos de nos julgar mais do que os outros, alimentar ambições, ser presumidos. Pelo contrário, há que fazer-nos pequenos com os outros, irmãos entre os irmãos: "Quem quiser ser grande entre vós, faça-se vosso servo" (Mc 10, 43). A fraternidade cristã apoia-se numa igualdade fundamental: diante de Deus, todos somos iguais; diante dos outros, todos somos carenciados. Por isso, ninguém pode pretender ser mais do que os outros. O nosso modelo é Jesus, que se fez nosso irmão. Poderia fazer sentir o seu poder, a sua autoridade; mas preferiu estar no meio de nós como quem serve! "Pois, quem é maior: o que está sentado à mesa, ou o que serve? Não é o que está sentado à mesa? Ora, Eu estou no meio de vós como aquele que serve." (Lc 22, 27).
    A fraternidade, a simplicidade fraterna manifestam-se também como afeto fraterno. Os sentimentos recíprocos entre Paulo e Timóteo manifestam essa igualdade de afeto solidário, e não meramente jurídica: "Ao lembrar-me das tuas lágrimas, anseio ver-te, para completar a minha alegria" (v. 4). Timóteo tinha chorado quando Paulo partiu. Paulo deseja estar com os irmãos que se amam. Por vezes chama a Timóteo "irmão", mas aqui chama-o "filho querido", porque o gerou para a graça de Cristo pela pregação e pelo Batismo.
    A fraternidade inclui outro aspeto ainda mais realista e exigente: a fidelidade fraterna. Trata-se da solidariedade uns para com os outros, especialmente em momentos de crise e de sofrimento: "Vós sois os que permaneceram sempre junto de mim nas minhas provações," (Lc 22, 28), diz Jesus aos seus discípulos. É isto que faz perdurar e crescer a fraternidade. Irmão é aquele que ajuda o seu irmão. Jesus fez-se nosso irmão para nos ajudar e ajudou, mesmo à custa de muito sofrimento. Ao fazer-se nosso irmão, também quis precisar da nossa ajuda e ser ajudado por nós. Por isso, congratula-se com os apóstolos que permaneceram junto d´Ele nas suas tribulações.
    Paulo pede a Timóteo que ponha em prática, na solidariedade fraterna, essa fidelidade: "Não te envergonhes de dar testemunho de Nosso Senhor, nem de mim, seu prisioneiro, mas compartilha o meu sofrimento pelo Evangelho, apoiado na força de Deus." (v. 8).
    Havemos de sentir esta solidariedade, de modo particular, para com aqueles que têm maiores responsabilidades na Igreja. Se Jesus se fez nosso irmão, é porque quis ensinar-nos a viver esse espírito de fraternidade, sem o não é possível caminhar no amor.
    Oratio

    Senhor, bem sabes que a nossa solidariedade para com os irmãos, muitas vezes, dá lugar ao desejo de sermos os primeiros. Mesmo nas atividades pastorais, em vez de partilharmos com simplicidade e alegria as responsabilidades, muitas vezes queremos impor as nossas decisões e os nossos pontos de vista. Dá-nos um coração manso e humilde como o teu. Ajuda-nos a pôr no centro o teu Evangelho, e não as nossas convicções. Põe ordem e clareza nas motivações do nosso agir, para vencermos o nosso orgulho, mesmo quando mascarado de "boas intenções". Dá-nos a alegria de nos reconhecermos pequenos. Sê a nossa única força, e nada nos meterá medo. Ámen.
    Contemplatio

    Ó Jesus, que nos dissestes para aprendermos do vosso coração a sermos mansos e humildes, tornai o nosso coração semelhante ao vosso! Como é manso e humilde o Menino divino de Belém e de Nazaré! É o seu carácter próprio, é o estilo da sua vida. Na sua vida pública, é manso e bom para com todos. Isaías tinha-o descrito (42, 1), e Jesus deleitava-se a reler este quadro na sinagoga: «Eis o meu Filho bem amado, que não gosta das querelas, dos gritos, do barulho das praças, não quebra a cana rachada e não extingue a mexa que ainda fumega...». Jeremias tinha-o apresentado como um cordeiro cheio de mansidão... S. João chama-o o Cordeiro que é sacrificado desde a origem do mundo. Quando entra em Jerusalém sobre a sua modesta montada, é o Rei de mansidão predito por Isaías e Zacarias (Mt 21). Na sua paixão, a sua mansidão traduz-se pelo seu silêncio e pela sua paciência. A mansidão, diz S. Paulo, é fruto do Espírito Santo, com as virtudes que se lhe assemelham: a paz, a benignidade, a bondade (Gal 5, 22). A caridade é mansa, benevolente, amável, S. Paulo repete a todas as Igrejas: aos Efésios, aos Gálatas, aos Coríntios. Recomenda a Timóteo para ser manso para com todos, paciente e modesto, como convém a um bom servidor de Deus (2Tim 2, 24). O homem manso será bem-aventurado, porque Deus o abençoará, mas também porque ganhará facilmente os corações e não terá inimigos. (L. Dehon, OSP 4, p. 36s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Reacende o dom de Deus que há em ti" (cf. 2 Tm 1, 6).

     

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    S. Timóteo e S. Tito, Bispos (26 Janeiro)

  • 04º Domingo do Tempo Comum - Ano A

    04º Domingo do Tempo Comum - Ano A


    29 de Janeiro, 2023

    Ano A
    04º Domingo do Tempo Comum

    Tema do 4º Domingo do Tempo Comum

    As leituras deste domingo propõem-nos uma reflexão sobre o "Reino" e a sua lógica. Mostram que o projecto de Deus - o projecto do "Reino" - roda em sentido contrário à lógica do mundo... Nos esquemas de Deus - ao contrário dos esquemas do mundo - são os pobres, os humildes, os que aceitaram despir-se do egoísmo, do orgulho, dos próprios interesses que são verdadeiramente felizes. O "Reino" é para eles.
    Na primeira leitura, o profeta Sofonias denuncia o orgulho e a auto-suficiência dos ricos e dos poderosos e convida o Povo de Deus a converter-se à pobreza. Os "pobres" são aqueles que se entregam nas mãos de Deus com humildade e confiança, que acolhem com amor as suas propostas e que são justos e solidários com os irmãos.
    Na segunda leitura, Paulo denuncia a atitude daqueles que colocam a sua esperança e a sua segurança em pessoas ou em esquemas humanos e que assumem atitudes de orgulho e de auto-suficiência; e convida os crentes a encontrar em Cristo crucificado a verdadeira sabedoria que conduz à salvação e à vida plena.
    O Evangelho apresenta a magna carta do "Reino". Proclama "bem-aventurados" os pobres, os mansos, os que choram, os que procuram cumprir fielmente a vontade de Deus, porque já vivem na lógica do "Reino"; e recomenda aos crentes a misericórdia, a sinceridade de coração, a luta pela paz, a perseverança diante das perseguições: essas são as atitudes que correspondem ao compromisso pelo "Reino".

    LEITURA I - Sof 2, 3; 3, 12-13

    Leitura da Profecia de Sofonias

    Procurai o Senhor, vós todos os humildes da terra,
    que obedeceis aos seus mandamentos.
    Procurai a justiça, procurai a humildade;
    talvez encontreis protecção no dia da ira do Senhor.
    Só deixarei ficar no meio de ti um povo pobre e humilde,
    que buscará refúgio no nome do Senhor.
    O resto de Israel não voltará a cometer injustiças,
    não tornará a dizer mentiras,
    nem mais se encontrará na sua boca uma língua enganadora.
    Por isso, terão pastagem e repouso,
    sem ninguém que os perturbe.

    AMBIENTE

    O profeta Sofonias pregou em Jerusalém na época do rei Josias (Josias reinou entre 639 e 609 a.C.). Os comentadores costumam situar a profecia de Sofonias durante o tempo de menoridade de Josias (que subiu ao trono aos oito anos); durante esse tempo, foi um Conselho real que presidiu aos destinos de Judá.
    Trata-se de uma época difícil para o Povo de Deus. Judá está - há cerca de um século - submetida aos assírios (desde que Acaz pediu ajuda a Tiglat-Pileser III contra Damasco e a Samaria, no ano 734 a.C.); a influência estrangeira sente-se em todos os degraus da vida nacional e a nação sofre as consequências da invasão de costumes estranhos e de práticas pagãs. Por outro lado, o país acaba de sair do reinado do ímpio Manassés (698-643 a.C.), que reconstruiu os lugares de culto aos deuses estrangeiros, levantou altares a Baal, ofereceu o próprio filho em holocausto, dedicou-se à adivinhação e à magia, colocou no Templo de Jerusalém a imagem de Astarte (cf. 2 Re 21,3-9).
    Aos pecados contra Jahwéh e contra a aliança, somam-se as injustiças que, todos os dias, atingem os mais pobres e desprotegidos. Os príncipes e ministros abusam da sua autoridade e cometem arbitrariedades, os juízes são corruptos e os comerciantes especulam com a miséria...
    Sofonias está consciente de que Jahwéh não pode continuar a pactuar com o pecado do seu Povo; vai chegar o dia do Senhor, isto é, o dia da intervenção de Deus em que os maus serão castigados e a injustiça será banida da terra. Da ira do Senhor escaparão, contudo, os humildes e os pobres, os que se mantiveram fiéis à aliança. O fim da pregação de Sofonias não é, contudo, anunciar o castigo; mas é provocar a conversão, passo fundamental para chegar à salvação.

    MENSAGEM

    O nosso texto começa com um apelo à conversão (cf. Sof 2,3). Para Sofonias, "conversão" significa, objectivamente, justiça e humildade. Os "humildes", no contexto de Sofonias, são aqueles se entregam confiadamente nas mãos de Deus, que seguem os caminhos de Deus, que aceitam as propostas de Deus e que não se colocam contra Ele; são, também, aqueles que praticam a justiça para com os irmãos, que respeitam os direitos dos mais débeis, que não cometem arbitrariedades... Equivalem aos "pobres" das bem-aventuranças: não são uma categoria sociológica, mas aqueles que estão numa certa atitude espiritual de abertura a Deus e aos irmãos. No lado oposto estão os orgulhosos e auto-suficientes, que ignoram as propostas de Deus, exploram, são injustos, corruptos e arbitrários. Só uma verdadeira conversão à humildade permitirá encontrar protecção no "dia da ira do Senhor" que se aproxima e que vai atingir os orgulhosos, os prepotentes e os injustos.
    Em seguida, Sofonias apresenta o resultado do "dia da ira do Senhor": o surgimento do "resto de Israel" (cf. Sof 3,12-13). Os orgulhosos, arrogantes e prepotentes serão banidos do meio do Povo de Deus (cf. Sof 3,11); ficará um "resto" humilde e pobre", que se entregará nas mãos do Senhor, não cometerá iniquidades nem dirá mentiras e será uma espécie de viveiro de reflorescimento da nação.
    A partir daqui, ser "pobre" não é uma categoria sociológica, mas uma atitude espiritual de quem tem o coração aberto às propostas de Deus e é justo na relação com os outros. Na boa tradição bíblica (que está presente neste texto), os pobres são, portanto, pessoas pacíficas, humildes, piedosas, simples, que confiam em Deus, que obedecem às suas propostas e que são justos e solidários com os irmãos.

    ACTUALIZAÇÃO

    Considerar, para a reflexão, os seguintes pontos:

    • O Deus que Se revela na palavra e na interpelação de Sofonias é o Deus que não pactua com os orgulhosos e prepotentes que dominam o mundo e que pretendem moldar a história com a sua lógica. A primeira indicação que a Palavra de Deus hoje nos fornece é esta: o nosso Deus não está onde se cultiva a violência e a lei da força, nem apoia a política dos dominadores do mundo - mesmo que eles pretendam defender os valores de Deus e da civilização cristã. Os valores de Deus não se defendem com uma lógica de imposição, de violência, de apelo à força. Atenção à história e aos acontecimentos: sempre que alguém se apresenta em nome de Deus a impor ao mundo um
    a determinada lógica, temos de desconfiar; Deus nunca esteve desse lado e esses nunca foram os métodos de Deus. Sofonias garante: para os prepotentes e orgulhosos, chegará o dia da ira de Deus; e, nesse dia, serão os humildes e os pobres que se sentarão à mesa com Deus.

    • A nossa civilização ocidental diz-se cristã, mas está ainda longe de assimilar a lógica de Deus. A lógica da nossa sociedade exalta os que têm poder, os que triunfam por todos os meios, os poderosos, os que vergam a história e os homens a golpes de poder, de esperteza e de força... Hoje, como ontem, a sociedade exalta os que triunfam e marginaliza e rejeita os pobres, os débeis, os simples, os pacíficos, os que não se fazem ouvir nos areópagos do poder e dos mass-media, aqueles que recusam impor-se e mandar nos outros, aqueles que estão à margem dos acontecimentos sociais que reúnem a fina-flor do jet-set, aqueles que não aparecem nas páginas das revistas da moda. Podemos deixar que a sociedade se construa na base destes pressupostos? Que podemos fazer para que o nosso mundo se construa de acordo com os valores de Deus?

    • O apelo à conversão significa objectivamente, na perspectiva de Sofonias, a renúncia ao orgulho, à prepotência, ao egoísmo e um regresso à comunhão com Deus e com os irmãos. Estamos dispostos, pessoalmente, a este caminho de conversão? Estamos dispostos a renunciar a uma lógica de imposição, de prepotência, de orgulho, de autoritarismo, de auto-suficiência, quer na nossa relação com Deus, quer na nossa relação com os outros homens?

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 145 (146), 7.8-9a.9bc-10

    Refrão 1: Bem-aventurados os pobres em espírito,
    porque deles é o reino dos Céus.

    Refrão 2: Aleluia.

    O Senhor faz justiça aos oprimidos,
    dá pão aos que têm fome
    e a liberdade aos cativos.

    O Senhor ilumina os olhos dos cegos,
    o Senhor levanta os abatidos,
    o Senhor ama os justos.

    O Senhor protege os peregrinos,
    ampara o órfão e a viúva
    e entrava o caminho aos pecadores.

    O Senhor reina eternamente.
    O teu Deus, ó Sião,
    é Rei por todas as gerações.

    LEITURA II - 1 Cor 1, 26-31

    Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios

    Irmãos:
    Vede quem sois vós, os que Deus chamou:
    não há muitos sábios, naturalmente falando,
    nem muitos influentes, nem muitos bem-nascidos.
    Mas Deus escolheu o que é louco aos olhos do mundo
    para confundir os sábios;
    escolheu o que é vil e desprezível,
    o que nada vale aos olhos do mundo,
    para reduzir a nada aquilo que vale,
    a fim de que nenhuma criatura se possa gloriar diante de Deus.
    É por Ele que vós estais em Cristo Jesus,
    o qual Se tornou para nós sabedoria de Deus,
    justiça, santidade e redenção.
    Deste modo, conforme está escrito,
    «quem se gloria deve gloriar-se no Senhor».

    AMBIENTE

    Vimos, na passada semana, que um dos graves problemas da comunidade cristã de Corinto era a identificação da experiência cristã com uma escola de sabedoria: os cristãos de Corinto - na linha do que acontecia nas várias escolas de filosofia que infestavam a cidade - viam várias figuras proeminentes do cristianismo primitivo como mestres de uma doutrina e aderiam a essas figuras, esperando encontrar nelas uma proposta filosófica credível, que os conduzisse à plenitude da sabedoria e da realização humana. É de crer que os vários adeptos desses vários mestres se confrontassem na comunidade, procurando demonstrar a excelência e a superior sabedoria do mestre escolhido. Ao saber isto, Paulo ficou muito alarmado: esta perspectiva punha em causa o essencial da fé. Paulo vai esforçar-se, então, por demonstrar aos coríntios que entre os cristãos não há senão um mestre, que é Jesus Cristo; e a experiência cristã não é a busca de uma filosofia coerente, brilhante, elegante, que conduza à sabedoria, entendida à maneira dos gregos. Aliás, Cristo não foi um mestre que se distinguiu pela elegância das suas palavras, pela sua arte oratória ou pela lógica do seu discurso filosófico... Ele foi o Deus que, por amor, veio ao encontro dos homens e lhes ofereceu a salvação, não pela lógica do poder ou pela elegância das palavras, mas através do dom da vida.
    O caminho cristão não é uma busca de sabedoria humana, mas uma adesão a Cristo crucificado - o Cristo do amor e do dom da vida. N'Ele manifesta-se, de forma humanamente desconcertante, mas plena e definitiva, a força salvadora de Deus. É aí e em mais nenhum lado que os coríntios devem procurar a verdadeira sabedoria que conduz à vida eterna.

    MENSAGEM

    É verdade, considera Paulo, que é difícil encontrar - do ponto de vista do raciocínio humano - num pobre galileu condenado a uma morte infamante ("escândalo para os judeus e loucura para os gentios" - 1 Cor 1,23) uma proposta credível de salvação. Mas a lógica de Deus não é exactamente igual à lógica dos homens. "O que é loucura de Deus é mais sábio que os homens; e o que é fraqueza de Deus é mais forte do que os homens" (1 Cor 1,25).
    Como exemplo da lógica de Deus, Paulo apresenta o caso da própria comunidade cristã de Corinto: entre os coríntios não abundavam os ricos, nem os poderosos, nem os de boas famílias, nem os intelectuais, nem os aristocratas; ao contrário, a maioria dos membros da comunidade eram escravos, trabalhadores, gente simples e pobre. Apesar disso, Deus escolheu-os e chamou-os; e a vida de Deus manifestou-se nessa comunidade de desclassificados. Para a consecução dos seus projectos, os homens escolhem normalmente os mais ricos, os mais fortes, os mais bem preparados intelectualmente, os que provêm de boas famílias, os que asseguram maiores hipóteses de êxito do ponto de vista humano... Mas Deus escolhe os pobres, os débeis, aqueles que aos olhos do mundo são ignorados ou desprezados e, através deles, manifesta o seu poder e intervém no mundo. Portanto, se esta é a lógica de Deus (como ficou provado pelo exemplo), não surpreende que o poder salvador de Deus se tenha manifestado na cruz de Cristo.
    Os coríntios são convidados a não colocar a sua esperança e a sua segurança em pessoas (por muito brilhantes e cheias de qualidades humanas que elas sejam) ou em esquemas humanos de sabedoria (por muito sedutores e fascinantes que eles possam parecer): a sabedoria humana é incapaz, por si só, de salvar; e, ao produzir orgulho e auto-suficiência, leva o homem a prescindir de Deus e a resvalar por caminhos que conduzem à morte e à desgraça... Em contrapartida, os coríntios são convidados a colocar a sua esperança e segurança em Jes
    us Cristo, que na cruz deu a vida por amor: é na "loucura da cruz" - isto é, na vida dada até às últimas consequências, que se manifesta a radicalidade do amor de Deus, a profundidade do seu desejo de ofertar ao homem a salvação. Para Paulo, a cruz manifesta a "sabedoria de Deus"; e é essa sabedoria que deve atrair o olhar e apaixonar o coração dos coríntios.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão e a partilha podem considerar as seguintes questões:

    • Uma percentagem significativa dos homens do nosso tempo está convencida de que o segredo da realização plena do homem está em factores humanos (preparação intelectual, êxito profissional, reconhecimento social, bem-estar económico, poder político, etc.); mas Paulo avisa que apostar tudo nesses elementos é jogar no "cavalo errado": o homem só encontra a realização plena, quando descobre Cristo crucificado e aprende com Ele o amor total e o dom da vida. Para mim, qual destas duas propostas faz mais sentido?

    • A teologia aqui apresentada por Paulo diz-nos que o Deus em quem acreditamos não é o Deus que só escolhe os ricos, os poderosos, os influentes, os de "sangue azul", para realizar a sua obra no mundo; mas que o nosso Deus é o Deus que não faz acepção de pessoas e que, quase sempre, se serve da fraqueza, da fragilidade, da finitude para levar avante o seu projecto de salvação e libertação.

    • Não se trata, aqui, de valorizar romanticamente a pobreza, ou de apresentar Deus como o chefe de um sindicato da classe operária, a reivindicar o poder para as classes desfavorecidas; trata-se de revelar o verdadeiro rosto de um Deus que Se solidariza com os pobres, com os humilhados, com os ofendidos, com os explorados de todos os tempos e a todos oferece, sem distinção, a salvação.

    ALELUIA - Mt 5, 12a

    Aleluia. Aleluia.

    Alegrai-vos e exultai,
    porque é grande nos Céus a vossa recompensa.

    EVANGELHO - Mt 5,1-12

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

    Naquele tempo,
    ao ver as multidões, Jesus subiu ao monte e sentou-Se.
    Rodearam-n'O os discípulos
    e Ele começou a ensiná-los, dizendo:
    «Bem-aventurados os pobres em espírito,
    porque deles é o reino dos Céus.
    Bem-aventurados os que choram,
    porque serão consolados.
    Bem-aventurados os humildes,
    porque possuirão a terra.
    Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça,
    porque serão saciados.
    Bem-aventurados os misericordiosos,
    porque alcançarão misericórdia.
    Bem-aventurados os puros de coração,
    porque verão a Deus.
    Bem-aventurados os que promovem a paz,
    porque serão chamados filhos de Deus.
    Bem-aventurados os que sofrem perseguição por amor da justiça,
    porque deles é o reino dos Céus.
    Bem-aventurados sereis, quando, por minha causa,
    vos insultarem, vos perseguirem
    e, mentindo, disserem todo o mal contra vós.
    Alegrai-vos e exultai,
    porque é grande nos Céus a vossa recompensa».

    AMBIENTE

    Depois de dizer quem é Jesus (Mt 1,1-2,23) e de definir a sua missão (cf. Mt 3,1-4,16), Mateus vai apresentar a concretização dessa missão: com palavras e com gestos, Jesus propõe aos discípulos e às multidões o "Reino". Neste enquadramento, Mateus propõe-nos hoje um discurso de Jesus sobre o "Reino" e a sua lógica.
    Uma característica importante do Evangelho segundo Mateus reside na importância dada pelo evangelista aos "ditos" de Jesus. Ao longo do Evangelho segundo Mateus aparecem cinco longos discursos (cf. Mt 5-7; 10; 13; 18; 24-25), nos quais Mateus junta "ditos" e ensinamentos provavelmente proferidos por Jesus em várias ocasiões e contextos. É provável que o autor do primeiro Evangelho visse nesses cinco discursos uma nova Lei, destinada a substituir a antiga Lei dada ao Povo por meio de Moisés e escrita nos cinco livros do Pentateuco.
    O primeiro discurso de Jesus - do qual o Evangelho que nos é hoje proposto é a primeira parte - é conhecido como o "sermão da montanha" (cf. Mt 5-7). Agrupa um conjunto de palavras de Jesus, que Mateus coleccionou com a evidente intenção de proporcionar à sua comunidade uma série de ensinamentos básicos para a vida cristã. O evangelista procurava, assim, oferecer à comunidade cristã um novo código ético, uma nova Lei, que superasse a antiga Lei que guiava o Povo de Deus.
    Mateus situa esta intervenção de Jesus no cimo de um monte. A indicação geográfica não é inocente: transporta-nos à montanha da Lei (Sinai), onde Deus Se revelou e deu ao seu Povo a antiga Lei. Agora é Jesus, que, numa montanha, oferece ao novo Povo de Deus a nova Lei que deve guiar todos os que estão interessados em aderir ao "Reino".
    As "bem-aventuranças" que, neste primeiro discurso, Mateus coloca na boca de Jesus, são consideravelmente diferentes das "bem-aventuranças" propostas por Lucas (cf. Lc 6,20-26). Mateus tem nove "bem-aventuranças", enquanto que Lucas só apresenta quatro; além disso, Lucas prossegue com quatro "maldições", que estão ausentes do texto mateano; outras notas características da versão de Mateus são a espiritualização (os "pobres" de Lucas são, para Mateus, os "pobres em espírito") e a aplicação dos "ditos" originais de Jesus à vida da comunidade e ao comportamento dos cristãos. É muito provável que o texto de Lucas seja mais fiel à tradição original e que o texto de Mateus tenha sido mais trabalhado.

    MENSAGEM

    As "bem-aventuranças" são fórmulas relativamente frequentes na tradição bíblica e judaica. Aparecem, quer nos anúncios proféticos de alegria futura (cf. Is 30,18; 32,20; Dn 12,12), quer nas acções de graças pela alegria presente (cf. Sl 32,1-2; 33,12; 84,5.6.13), quer nas exortações a uma vida sábia, reflectida e prudente (cf. Prov 3,13; 8,32.34; Sir 14,1-2.20; 25,8-9; Sl 1,1; 2,12; 34,9). Contudo, elas definem sempre uma alegria oferecida por Deus.
    As "bem-aventuranças" evangélicas devem ser entendidas no contexto da pregação sobre o "Reino". Jesus proclama "bem-aventurados" aqueles que estão numa situação de debilidade, de pobreza, porque Deus está a ponto de instaurar o "Reino" e a situação destes "pobres" vai mudar radicalmente; além disso, são "bem-aventurados" porque, na sua fragilidade, debilidade e dependência, estão de espírito aberto e coração disponível para acolher a proposta de salvação e libertação que Deus lhes oferece em Jesus (a proposta do "Reino").
    As quatro primeiras "bem-aventuranças" referidas por Mateus (vers. 3-6) estão relacionadas entre si. Dirigem-se aos "pobres" (as segunda, terceira e quarta "bem-aventuranças" são apenas desenvolvimentos da primeira, que proclama: "bem-aventurados os pobres em espírito"). Saúdam a felicidade daqueles que se entregam confiadamente nas mãos de Deus e procuram fazer sempre a sua vontade; daqueles que, de forma consciente, deixam de colocar a sua confiança e a sua esperança nos bens, no poder, no êxito, nos homens, para esperar e confiar em Deus; daqueles que aceitam renunciar ao egoísmo, que aceitam despojar-se de si próprios e estar disponíveis para Deus e para os outros.
    Os "pobres em espírito" são aqueles que aceitam renunciar, livremente, aos bens, ao próprio orgulho e auto-suficiência, para se colocarem, incondicionalmente, nas mãos de Deus, para servirem os irmãos e partilharem tudo com eles.
    Os "mansos" não são os fracos, os que suportam passivamente as injustiças, os que se conformam com as violências orquestradas pelos poderosos; mas são aqueles que recusam a violência, que são tolerantes e pacíficos, embora sejam, muitas vezes, vítimas dos abusos e prepotências dos injustos... A sua atitude pacífica e tolerante torná-los-á membros de pleno direito do "Reino".
    Os "que choram" são aqueles que vivem na aflição, na dor, no sofrimento provocados pela injustiça, pela miséria, pelo egoísmo; a chegada do "Reino" vai fazer com que a sua triste situação se mude em consolação e alegria...
    A quarta bem-aventurança proclama felizes "os que têm fome e sede de justiça". Provavelmente, a justiça deve entender-se, aqui, em sentido bíblico - isto é, no sentido da fidelidade total aos compromissos assumidos para com Deus e para com os irmãos. Jesus dá-lhes a esperança de verem essa sede de fidelidade saciada, no Reino que vai chegar.
    O segundo grupo de "bem-aventuranças" (vers. 7-11) está mais orientado para definir o comportamento cristão. Enquanto que no primeiro grupo se constatam situações, neste segundo grupo propõem-se atitudes que os discípulos devem assumir.
    Os "misericordiosos" são aqueles que têm um coração capaz de compadecer-se, de amar sem limites, que se deixam tocar pelos sofrimentos e alegrias dos outros homens e mulheres, que são capazes de ir ao encontro dos irmãos e estender-lhes a mão, mesmo quando eles falharam.
    Os "puros de coração" são aqueles que têm um coração honesto e leal, que não pactua com a duplicidade e o engano.
    Os "que constroem a paz" são aqueles que se recusam a aceitar que a violência e a lei do mais forte rejam as relações humanas; e são aqueles que procuram ser - às vezes com o risco da própria vida - instrumentos de reconciliação entre os homens.
    Os "que são perseguidos por causa da justiça" são aqueles que lutam pela instauração do "Reino" e são desautorizados, humilhados, agredidos, marginalizados por parte daqueles que praticam a injustiça, que fomentam a opressão, que constroem a morte... Jesus garante-lhes: o mal não vos poderá vencer; e, no final do caminho, espera-vos o triunfo, a vida plena.
    Na última "bem-aventurança" (vers. 11), o evangelista dirige-se, em jeito de exortação, aos membros da sua comunidade que têm a experiência de ser perseguidos por causa de Jesus e convida-os a resistir ao sofrimento e à adversidade. Esta última exortação é, na prática, uma aplicação concreta da oitava "bem-aventurança".
    No seu conjunto, as "bem-aventuranças" deixam uma mensagem de esperança e de alento para os pobres e débeis. Anunciam que Deus os ama e que está do lado deles; confirmam que a libertação está a chegar e que a sua situação vai mudar; asseguram que eles vivem já na dinâmica desse "Reino" onde vão encontrar a felicidade e a vida plena.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão e a partilha podem fazer-se à volta dos seguintes elementos:

    • Jesus diz: "felizes os pobres em espírito"; o mundo diz: "felizes vós os que tendes dinheiro - muito dinheiro - e sabeis usá-lo para comprar influências, comodidade, poder, segurança, bem-estar, pois é o dinheiro que faz andar o mundo e nos torna mais poderosos, mais livres e mais felizes". Quem é, realmente, feliz?

    • Jesus diz: "felizes os mansos"; o mundo diz: "felizes vós os que respondeis na mesma moeda quando vos provocam, que respondeis à violência com uma violência ainda maior, pois só a linguagem da força é eficaz para lidar com a violência e a injustiça". Quem tem razão?

    • Jesus diz: "felizes os que choram"; o mundo diz: "felizes vós os que não tendes motivos para chorar, porque a vossa vida é sempre uma festa, porque vos moveis nas altas esferas da sociedade e tendes tudo para serdes felizes: casa com piscina, carro com telefone e ar condicionado, amigos poderosos, uma conta bancária interessante e um bom emprego arranjado pelo vosso amigo ministro". Onde está a verdadeira felicidade?

    • Jesus diz: "felizes os que têm ânsia de cumprir a vontade de Deus"; o mundo diz: "felizes vós os que não dependeis de preconceitos ultrapassados e não acreditais num deus que vos diz o que deveis e não deveis fazer, porque assim sois mais livres". Onde está a verdadeira liberdade, que enche de felicidade o coração?

    • Jesus diz: "felizes os que tratam os outros com misericórdia"; o mundo diz: "felizes vós quando desempenhais o vosso papel sem vos deixardes comover pela miséria e pelo sofrimento dos outros, pois quem se comove e tem misericórdia acabará por nunca ser eficaz neste mundo tão competitivo". Qual é o verdadeiro fundamento de uma sociedade mais justa e mais fraterna?

    • Jesus diz: "felizes os sinceros de coração"; o mundo diz: "felizes vós quando sabeis mentir e fingir para levar a água ao vosso moinho, pois a verdade e a sinceridade destroem muitas carreiras e esperanças de sucesso". Onde está a verdade?

    • Jesus diz: "felizes os que procuram construir a paz entre os homens"; o mundo diz: "felizes vós os que não tendes medo da guerra, da competição, que sois duros e insensíveis, que não tendes medo de lutar contra os outros e sois capazes de os vencer, pois só assim podereis ser homens e mulheres de sucesso". O que é que torna o mundo melhor: a paz ou a guerra?

    • Jesus diz: "felizes os que são perseguidos por cumprirem a vontade de Deus"; o mundo diz: "felizes vós os que já entendestes como é mais seguro e mais fácil fazer o jogo dos poderosos e estar sempre de acordo com eles, pois só assim podeis subir na vida e ter êxito na vossa carreira". O que é que nos eleva à vida plena?

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS
    PARA O 4º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 4º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. PARA A PROCLAMAÇÃO DAS BEM-AVENTURANÇAS.
    Como criar, ao longo da liturgia da Palavra, uma progressão cujo ponto culminante seria a Boa Nova? Uma proposta muito simples: o leitor da primeira leitura avança acompanhado por alguém que leva uma luz (vela) e os dois, depois da leitura terminada, ficam junto do ambão; os mesmos gestos para o leitor (cantor) do salmo e para o leitor da segunda leitura; finalmente, o Livro dos Evangelhos é levado em procissão, também acompanhado por alguém com uma vela acesa, até ao ambão. Todos ficam à volta do ambão, formando um "povo de luz" e dando uma solenidade particular à proclamação das Bem-aventuranças de Mateus.

    3. BILHETE DE EVANGELHO.
    O "ofertório", um acto litúrgico... Quando vimos à missa, os nossos corações estão cheios da nossa vida e da vida dos nossos irmãos, com as alegrias, os sofrimentos, os projectos, as questões, as inquietudes, a esperança. Com o pão e o vinho, no momento do ofertório, é um pouco desta vida que oferecemos concretamente. O dinheiro é o que nós ganhamos; ele é feito para ser partilhado. O "ofertório" é, pois, um acto litúrgico. Querer que a comunidade cristã à qual pertencemos possa viver é uma obra de justiça. Quando beneficiamos dos serviços de uma associação, a ela aderimos financeiramente. Temos muitas ocasiões para aderir financeiramente à comunidade cristã - e os cristãos são generosos. Procuremos valorizar ou revalorizar o nosso "ofertório"...

    4. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
    Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.

    No final da primeira leitura:
    Deus, Pai e pastor do teu povo, nós Te bendizemos pela tua paciência e pela tua bondade. Quando Israel se afastava do caminho da justiça, Tu recordava-lo pelos teus profetas, para o converter e o conduzir para Ti.
    Nós procuramos o teu rosto e Te pedimos: purifica-nos da mentira e do engano, faz-nos procurar a justiça e a humildade.

    No final da segunda leitura:
    Deus de infinita sabedoria, nós Te damos graças, porque nos chamaste; escolhes aqueles que são fracos e desprezados, para lhes fazer descobrir a tua sabedoria, no teu Filho, desprezado no calvário, mas vitorioso na Páscoa.
    Pomos em Ti a nossa confiança e estendemos as mãos para o teu Filho: Ele é a nossa justiça, a nossa santificação e a nossa redenção.

    No final do Evangelho:
    Nosso Pai dos céus, bendito sejas, Tu que abres ao teu povo a terra prometida e o Reino dos céus, Tu que o sacias com a tua justiça, Tu que nos chamas teus filhos e descobres-nos o teu rosto.
    Faz-nos estar entre os pobres, os mansos, os aflitos, os misericordiosos, os famintos da tua justiça, os corações puros e as testemunhas do teu Reino.

    5. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Pode-se escolher a Oração Eucarística II para as Missas com Crianças.

    6. PALAVRA PARA O CAMINHO.
    Um pequeno resto... "Só deixarei ficar no meio de ti um povo pobre e humilde, que buscará refúgio no nome do Senhor..." Um pequeno "resto" de gente que procura Deus na verdade, numa Igreja minoritária no seio de uma sociedade que só crê na riqueza, no poder, nas performances. Gente que procura a justiça, a humildade, a doçura, a paz, o perdão... Este programa entra na minha vida?

     

     

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador: P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
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