Week of Nov 8th

  • 32º Domingo do Tempo Comum - Ano C

    32º Domingo do Tempo Comum - Ano C


    6 de Novembro, 2022

    ANO C
    32º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    Tema do 32º Domingo do Tempo Comum

    A liturgia deste domingo propõe-nos uma reflexão sobre os horizontes últimos do homem e garante-nos a vida que não acaba.
    Na primeira leitura, temos o testemunho de sete irmãos que deram a vida pela sua fé, durante a perseguição movida contra os judeus por Antíoco IV Epifanes. Aquilo que motivou os sete irmãos mártires, que lhes deu força para enfrentar a tortura e a morte foi, precisamente, a certeza de que Deus reserva a vida eterna àqueles que, neste mundo, percorrem, com fidelidade, os seus caminhos.
    No Evangelho, Jesus garante que a ressurreição é a realidade que nos espera. No entanto, não vale a pena estar a julgar e a imaginar essa realidade à luz das categorias que marcam a nossa existência finita e limitada neste mundo; a nossa existência de ressuscitados será uma existência plena, total, nova. A forma como isso acontecerá é um mistério; mas a ressurreição é uma certeza absoluta no horizonte do crente.
    Na segunda leitura temos um convite a manter o diálogo e a comunhão com Deus, enquanto esperamos que chegue a segunda vinda de Cristo e a vida nova que Deus nos reserva. Só com a oração será possível mantermo-nos fiéis ao Evangelho e ter a coragem de anunciar a todos os homens a Boa Nova da salvação.

    LEITURA I - 2 Mac 7,1-2.9-14

    Leitura do Segundo Livro de Macabeus

    Naqueles dias,
    foram presos sete irmãos, juntamente com a mãe,
    e o rei da Síria quis obrigá-los,
    à força de golpes de azorrague e de nervos de boi,
    a comer carne de porco proibida pela Lei judaica.
    Um deles tomou a palavra em nome de todos
    e falou assim ao rei:
    «Que pretendes perguntar e saber de nós?
    Estamos prontos para morrer,
    antes que violar a lei de nossos pais».
    Prestes a soltar o último suspiro,
    o segundo irmão disse:
    «Tu, malvado, pretendes arrancar-nos a vida presente,
    mas o Rei do universo ressuscitar-nos-á para a vida eterna,
    se morrermos fiéis às suas leis».
    Depois deste começaram a torturar o terceiro.
    Intimado a pôr fora a língua,
    apresentou-a sem demora
    e estendeu as mãos resolutamente,
    dizendo com nobre coragem:
    «Do Céu recebi estes membros
    e é por causa das suas leis que os desprezo,
    pois do Céu espero recebê-los de novo».
    O próprio rei e quantos o acompanhavam
    estavam admirados com a força de ânimo do jovem,
    que não fazia nenhum caso das torturas.
    Depois de executado este último,
    sujeitaram o quarto ao mesmo suplício.
    Quando estava para morrer, falou assim:
    «Vale a pena morrermos às mãos dos homens,
    quando temos a esperança em Deus
    de que Ele nos ressuscitará;
    mas tu, ó rei, não ressuscitarás para a vida».

    AMBIENTE

    Em 323 a.C., Alexandre, o Grande, morreu e o império foi dividido pelos seus generais ("diadocos"). A Palestina (desde 333 a.C., integrada no império de Alexandre) ficou, inicialmente, nas mãos dos Ptolomeus (que dominavam ainda o Egipto e a Fenícia). No entanto, a partir do ano 200 (batalha das "fontes do Jordão"), a Palestina passou para as mãos dos Selêucidas (outra família de generais de Alexandre, que já dominava a Síria e a Mesopotâmia).
    Os Ptolomeus tiveram uma atitude relativamente tolerante para com o judaísmo e respeitaram, no geral, as tradições e a fé do Povo de Deus; mas, sob a autoridade dos Selêucidas, sobreveio uma fase em que a cultura helénica se tornou mais agressiva, ameaçando pôr em causa a sobrevivência do judaísmo. Foi, sobretudo, no reinado de Antíoco IV Epifanes (175-164 a.C.) que o helenismo foi imposto - inclusive pela força - ao Povo de Deus. Muitos judeus - apostados em manter vivas as suas tradições - foram perseguidos e mortos.
    O texto que nos é proposto coloca-nos neste ambiente. Conta-nos o martírio de uma mãe e dos seus sete filhos, que se recusaram a violar a fé e as tradições judaicas e foram mortos por isso. Trata-se, provavelmente, de uma tradição popular (embora com um substrato histórico), transmitida oralmente durante algum tempo, antes de ser integrada no segundo livro dos Macabeus. O autor não dá qualquer indicação acerca do lugar do martírio, nem do nome dos sete irmãos.

    MENSAGEM

    A história apresenta-nos, portanto, uma família de sete irmãos e da sua mãe, que o rei pretendia coagir (através da tortura) a abandonar a fé e a comer carne de porco (proibida pela Lei, por ser carne de um animal "impuro"). O nosso trecho apresenta as respostas corajosas de alguns destes irmãos, preocupados mais com a fidelidade aos valores judaicos e à fé dos pais, do que com as ameaças do rei.
    O que é que "faz correr" estes jovens? O que é que lhes dá a coragem para enfrentar as exigências dos seus algozes? De acordo com as explicações que o autor coloca na boca dos nossos heróis, é a fé na ressurreição ou, literalmente, na revivificação eterna de vida (vers. 9) que os motiva. Os sete irmãos tiveram a coragem de defender a sua fé até à morte, porque acreditavam que Deus lhes devolveria outra vez a vida, uma vida semelhante àquela que lhes ia ser tirada. O Deus criador tem, de acordo com a catequese aqui feita, o poder de ressuscitar os mártires para a vida eterna...
    Não é, ainda, a noção neo-testamentária de ressurreição (uma vida nova, uma vida plena, uma vida transformada e elevada à máxima potencialidade) que aqui aparece; é apenas a ideia de uma revivificação, de um readquirir no outro mundo uma vida semelhante àquela que aqui foi roubada ao homem (embora se admitisse que, nesse mundo de Deus, já não haveria pranto, nem sofrimento, nem morte). De qualquer forma, é a ideia de imortalidade que aqui é formulada. Repare-se, no entanto, que o nosso texto ainda não ensina a revivificação de todos os homens, mas apenas dos justos (vers. 14).
    É a primeira vez que a doutrina da ressurreição é explicitamente apresentada na Bíblia. A partir daqui, esta ideia vai desenvolver-se cada vez mais, até ser completamente iluminada pelo exemplo de Jesus.

    ACTUALIZAÇÃO

    Reflectir a partir das seguintes linhas:

    • Como é que termina a nossa vida? Os sonhos que procuramos concretizar, as nossas realizações mais queridas, que é que valem se nos espera um dia, inevitavelmente, a morte? Estamos condenados a deixar e a perder tudo aquilo que amamos? A nossa morte é uma viagem fatal em direcção ao nada? Estas perguntas são eternas; e, há cerca de 2100 anos, um catequista de Israel já as colocava... A sua fé ditou-lhe, no entanto, a certeza de que a vida continua para além desta terra. É essa certeza que ele nos deixa, neste texto; e é essa experiência de fé que ele nos convida a fazer.

    • Quem acredita na ressurreição não pode deixar-se paralisar pelo medo (muitas vezes é o medo que limita a nossa existência e nos impede de defender os valores em que acreditamos)... Pode comprometer-se na luta pela justiça e pela verdade, na certeza de que as forças da morte não o podem vencer ou destruir. É essa certeza que animou o testemunho de tantos mártires de ontem e de hoje... É essa certeza que anima a minha luta e que dá força ao meu compromisso?

    • É, sem dúvida, inspiradora a "teimosia" com que estes irmãos defendem os valores em que acreditam. Num mundo em que o que é verdade de manhã, deixou de ser verdade à tarde, em que o partido dos oportunistas tem cada vez mais simpatizantes e em que todos os meios são legítimos para alcançar certos fins, o testemunho destes mártires é uma poderosa interpelação... Somos capazes de defender, com verdade e verticalidade aquilo em que acreditamos? Somos capazes de lutar, ainda que contra a corrente, pelos valores que nos parecem mais significativos e duradouros?

    SALMO RESPONSORIAL - Salmo 16 (17)

    Refrão: Senhor, ficarei saciado, quando surgir a vossa glória.

    Ouvi, Senhor, uma causa justa,
    atendei a minha súplica.
    Escutai a minha oração,
    feita com sinceridade.

    Firmai os meus passos nas vossas veredas,
    para que não vacilem os meus pés.
    Eu Vos invoco, ó Deus, respondei-me,
    ouvi e escutai as minhas palavras.

    Protegei-me à sombra das vossas asas,
    longe dos ímpios que me fazem violência.
    Senhor, mereça eu contemplar a vossa face
    e ao despertar saciar-me com a vossa imagem.

    LEITURA II - 2 Tes 2,16-3,5

    Leitura da Segunda Epístola do apóstolo São Paulo aos Tessalonicenses

    Irmãos:
    Jesus Cristo, nosso Senhor,
    e Deus, nosso Pai,
    que nos amou e nos deu, pela sua graça,
    eterna consolação e feliz esperança,
    confortem os vossos corações
    e os tornem firmes em toda a espécie de boas obras e palavras.
    Entretanto, irmãos, orai por nós,
    para que a palavra do Senhor
    se propague rapidamente e seja glorificada,
    como acontece no meio de vós.
    Orai também,
    para que sejamos livres dos homens perversos e maus,
    pois nem todos têm fé.
    Mas o Senhor é fiel:
    Ele vos dará firmeza e vos guardará do Maligno.
    Quanto a vós, confiamos inteiramente no Senhor
    que cumpris e cumprireis o que vos mandamos.
    O Senhor dirija os vossos corações,
    para que amem a Deus
    e aguardem a Cristo com perseverança.

    AMBIENTE

    Já vimos no passado domingo que a Segunda Carta aos Tessalonicenses (que alguns admitem não ser de Paulo) nos coloca frente a uma comunidade cristã fervorosa, que vive com empenho e generosidade o seu compromisso cristão apesar das provações, constituindo mesmo um modelo para as comunidades vizinhas (cf. 1 Tes 1,7-8); no entanto, a comunidade a que esta carta se destina é, também, uma comunidade com algumas dúvidas e inquietações em questões de doutrina - nomeadamente no que diz respeito ao "dia do Senhor" (isto é, à segunda vinda de Jesus). De resto, Paulo aproveita a ocasião para corrigir comportamentos, fazer alguns pedidos e exortar a uma fidelidade cada vez maior ao Evangelho de Jesus.

    MENSAGEM

    Depois de apresentar a doutrina sobre a segunda vinda do Senhor (2,1-12), o autor da carta convida os tessalonicenses a assumir a atitude correcta, enquanto esperam essa vinda. Em concreto, o autor da carta pede aos cristãos de Tessalónica que guardem as tradições recebidas de Paulo, "de viva voz ou por carta", isto é, pede-lhes que se mantenham fiéis ao Evangelho de Jesus que o apóstolo lhes transmitiu (2,13-15).
    O texto que hoje nos é proposto como segunda leitura começa precisamente neste ponto... O convite a permanecer fiéis às tradições recebidas vai acompanhado de uma súplica a Deus Pai e a Jesus Cristo, para que tornem possível essa fidelidade (2,16-17). Mais uma vez fica claro que, no processo de salvação do homem, há dois planos: o dom de Deus e o esforço de fidelidade do homem. É preciso, no entanto, deixar claro que, sem a graça de Deus, o esforço do homem seria inútil.
    Na segunda parte do nosso texto (3,1-5), temos um pedido de oração pelo apóstolo e pelo seu ministério. À súplica do autor em favor dos destinatários da carta (2,16-17), deve responder a súplica dos destinatários da carta em favor do apóstolo. A oração de uns pelos outros é uma forma preciosa de solidariedade cristã.
    De resto, os crentes que já receberam a Palavra transformadora e libertadora de Jesus devem solicitar a ajuda divina para que a proposta de salvação que Cristo veio trazer, e que a Igreja ficou encarregada de testemunhar, chegue a todos os homens; ainda mais se, como parece insinuar-se no presente caso, as circunstâncias são decididamente adversas à proclamação e vivência do Evangelho. Repare-se como, também aqui, o papel de Deus é central: o autor da carta sabe que, sem a ajuda de Deus, será impossível ao apóstolo dar testemunho.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão da Palavra pode fazer-se a partir dos seguintes elementos:

    • Este texto obriga-me a tomar consciência de que é com a ajuda de Deus que o crente consegue viver na fidelidade ao Evangelho, enquanto espera a vinda do Senhor. Tenho consciência de que é d'Ele que brota a minha fidelidade ao Evangelho, ou considero que as minhas vitórias e conquistas, neste campo, se devem apenas a mim, aos meus méritos e qualidades?

    • É com a ajuda de Deus que o missionário tem a coragem de anunciar fielmente o Evangelho e de vencer as dificuldades, as injustiças, as incompreensões, as oposições que são obstáculo ao seu trabalho e ao seu testemunho. Tenho consciência de que é na oração - minha e dos meus irmãos - que encontro a força de Deus? Quando, como apóstolo, tenho de enfrentar a oposição e a incompreensão do mundo, confio em Deus, peço-Lhe ajuda, ou deixo que o medo e o desânimo tomem conta do meu coração e me levem a desistir da missão que Deus me confiou?

    • O pedido de rezar "uns pelos outros" convida-nos a tomar consciência da solidariedade que deve marcar a experiência comunitária. O cristão nunca é uma pessoa isolada, mas o membro de uma família de irmãos, chamados a viver no amor, na partilha, na entrega da vida, como membros de um único corpo - o corpo de Cristo. É preciso tomar consciência dos laços que nos unem, sentirmo-nos responsáveis pelos nossos irmãos, partilhar as suas dores e alegrias, fazer nossos os seus problemas e, no nosso diálogo com Deus, ter presente as necessidades de todos.

    ALELUIA - Ap 1,5a.6b

    Aleluia. Aleluia.

    Jesus Cristo é o Primogénito dos mortos.
    A Ele a glória e o poder pelos séculos dos séculos.

    EVANGELHO - Lc 20,27-38

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas

    Naquele tempo,
    aproximaram-se de Jesus alguns saduceus
    – que negam a ressurreição –
    e fizeram-Lhe a seguinte pergunta:
    «Mestre, Moisés deixou-nos escrito:
    'Se morrer a alguém um irmão,
    que deixe mulher, mas sem filhos,
    esse homem deve casar com a viúva,
    para dar descendência a seu irmão'.
    Ora havia sete irmãos.
    O primeiro casou-se e morreu sem filhos.
    O segundo e depois o terceiro desposaram a viúva;
    e o mesmo sucedeu aos sete,
    que morreram e não deixaram filhos.
    Por fim, morreu também a mulher.
    De qual destes será ela esposa na ressurreição,
    uma vez que os sete a tiveram por mulher?»
    Disse-lhes Jesus:
    «Os filhos deste mundo
    casam-se e dão-se em casamento.
    Mas aqueles que forem dignos
    de tomar parte na vida futura e na ressurreição dos mortos,
    nem se casam nem se dão em casamento.
    Na verdade, já nem podem morrer,
    pois são como os Anjos,
    e, porque nasceram da ressurreição, são filhos de Deus.
    E que os mortos ressuscitam,
    até Moisés o deu a entender no episódio da sarça ardente,
    quando chama ao Senhor
    'o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacob'.
    Não é um Deus de mortos, mas de vivos,
    porque para Ele todos estão vivos».

    AMBIENTE

    Este texto situa-nos já em Jerusalém, nos últimos dias antes da morte de Jesus. É a altura das grandes controvérsias com os líderes judaicos (essas controvérsias representam, para Lucas, a última oportunidade que Deus dá ao seu Povo, no sentido de acolher a salvação). Discussão após discussão, torna-se claro que os líderes judaicos rejeitam a proposta de Jesus: prepara-se, assim, o quadro da paixão e da morte na cruz.
    Os adversários de Jesus são, no contexto em que o Evangelho deste domingo nos coloca, os saduceus. No tempo de Jesus, os saduceus formavam um grupo aristocrático, recrutado sobretudo entre os sacerdotes da classe superior. Exerciam a sua autoridade à volta do Templo e dominavam o Sinédrio (no entanto, a sua autoridade nessa instituição não era absoluta desde que os fariseus aí haviam chegado). A sua importância política era real, ainda que muito limitada pela presença do procurador romano. Politicamente, eram conservadores e entendiam-se bem com o opressor romano... Pretendiam manter a situação, para não ver comprometidos os benefícios políticos, sociais e económicos de que desfrutavam.
    Para os saduceus, apenas interessava a Lei escrita - a "Torah". Negavam que a Lei oral (que era essencial para os fariseus) tivesse qualquer valor. Este apego conservador à Lei escrita explica que negassem algumas crenças e doutrinas admitidas nos ambientes populares frequentados pelos fariseus. Por isso, não aceitavam a ressurreição dos mortos: nenhum versículo da "Torah" apoiava essa crença.
    No seu conflito com os fariseus, estava em jogo uma certa visão da sociedade e do poder. Os fariseus não viam com agrado a "democratização" da Lei promovida pelos fariseus e pelos seus escribas. Esta "democratização" apresentava o inconveniente de fazer os sacerdotes perder a sua autoridade como intérpretes da Lei. Diante do povo, os saduceus mostravam-se distantes, severos, intocáveis.

    MENSAGEM

    A questão central do nosso texto gira à volta da ressurreição, um tema que não significava nada para os saduceus. Percebendo que, quanto a essa questão, a perspectiva de Jesus estava próxima da dos fariseus, os saduceus apresentaram uma hipótese académica, com o objectivo de ridicularizar a crença na ressurreição: uma mulher casou, sucessivamente, com sete irmãos, cumprindo a lei do levirato (segundo a qual, o irmão de um defunto que morreu sem filhos devia casar com a viúva, a fim de dar descendência ao falecido e impedir que os bens da família fossem parar a mãos estranhas, cf. Dt 25,5-10). Quando ressuscitarem, ela será mulher de qual dos irmãos?
    A primeira parte da resposta de Jesus (vers. 27-36) afirma que a ressurreição não é (como pensavam os fariseus do tempo) uma simples continuação da vida que vivemos neste mundo (na linha de uma revivificação - ideia apresentada na primeira leitura), mas uma vida nova e distinta, uma vida de plenitude que dificilmente podemos entender a partir das nossas realidades quotidianas. A questão do casamento não se porá, então (a expressão "são semelhantes aos anjos" do vers. 30 não é uma expressão de depreciação do matrimónio, mas a afirmação de que, nessa vida nova, a única preocupação será servir e louvar a Deus). O poder de Deus, que chama os homens da morte à vida, transforma e assume a totalidade do ser humano, de forma que nascemos para uma vida totalmente nova e em que as nossas potencialidades serão elevadas à plenitude. A nossa capacidade de compreensão deste mistério é limitada, pois estamos a contemplar as coisas e a classificá-las à luz das nossas realidades terrenas; no entanto, a ressurreição que nos espera ultrapassa totalmente a nossa realidade terrena.
    A segunda parte da resposta de Jesus (vers. 37-38) é uma afirmação da certeza da ressurreição. Como não podia apoiar-se nos textos recentes da Escritura (como Dn 12,2-3), que sugeriam a fé na ressurreição (pois esses textos não tinham qualquer valor para os saduceus), Jesus cita-lhes a "Torah" (cf. Ex 3,6): no episódio da sarça-ardente, Jahwéh revelou-Se a Moisés como "o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob"... Ora, se Deus Se apresenta dessa forma - muitos anos depois de Abraão, Isaac e Jacob terem desaparecido deste mundo - isso quer dizer que os patriarcas não estão mortos (um homem "morto" - ou seja, um homem reduzido ao estado de uma sombra inconsciente e privada de vida no "sheol", segundo a ideia semita corrente - tinha perdido a protecção de Deus, pois já não existia como homem vivo e consciente). Na perspectiva de Jesus, portanto, os patriarcas não estão reduzidos ao estado de sombras na obscuridade absoluta do "sheol", mas vivem actualmente em Deus. Conclusão: se Abraão, Isaac e Jacob estão vivos, podemos falar em ressurreição.

    ACTUALIZAÇÃO

    A reflexão pode fazer-se a partir dos seguintes elementos:

    • A questão da ressurreição não é uma questão pacífica e clara para a maioria dos homens do nosso tempo. Há quem veja na esperança da ressurreição apenas um "ópio do povo", destinado a adormecer a justa vontade de lutar pela construção de um mundo mais justo; há quem veja na ressurreição uma forma de evasão, face aos problemas que a vida apresenta; há quem veja na ressurreição uma ilusão onde o homem projecta os seus desejos insatisfeitos... Convencidos de que a vida se resume aos 70/80 anos que vivemos neste mundo, muitos dos nossos contemporâneos constroem a sua existência tendo apenas em conta os valores deste mundo, sem quaisquer horizontes futuros. Que sentido é que isto faz, na perspectiva da nossa fé?

    • A ressurreição é, no entanto, a esperança que dá sentido a toda a caminhada do cristão. A fé cristã torna a esperança da ressurreição uma certeza absoluta, pois Cristo ressuscitou e quem se identifica com Cristo nascerá com Ele para a vida nova e definitiva. A nossa vida presente deve ser, pois, uma caminhada tranquila, confiante, alegre - ainda quando feita no sofrimento e na dor - em direcção a essa nova realidade.

    • A ressurreição não é a revivificação dos nossos corpos e a continuação da vida que vivemos neste mundo; mas é a passagem para uma vida nova onde, sem deixarmos de ser nós próprios, seremos totalmente outros... É a plenitudização de todas as nossas capacidades, a meta final do nosso crescimento, a realização da utopia da vida plena. Sendo assim, há alguma razão para temermos a morte ou para vermos nela algo que nos priva de alguma coisa importante (nomeadamente a relação com aqueles que amamos)?

    • A certeza da ressurreição não deve ser, apenas, uma realidade que esperamos; mas deve ser uma realidade que influencia, desde já, a nossa existência terrena. É o horizonte da ressurreição que deve influenciar as nossas opções, os nossos valores, as nossas atitudes; é a certeza da ressurreição que nos dá a coragem de enfrentar as forças da morte que dominam o mundo, de forma a que o novo céu e a nova terra que nos esperam comecem a desenhar-se desde já.

    • Temos de ter muito cuidado com a forma como falamos da ressurreição aos homens do nosso tempo, pois podemos pensá-la, explicá-la e projectá-la à luz da nossa vida actual e corremos sérios riscos de nos tornarmos ridículos. O que podemos fazer é afirmar a nossa certeza na ressurreição; depois, temos de confessar a nossa incapacidade de conceber e de explicar esse mundo novo que nos espera (como a criança no seio da mãe não compreende nem sabe explicar a vida que a espera no mundo exterior).

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 32º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 32º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. PALAVRA CELEBRADA NA EUCARISTIA.
    A Palavra de Deus não se limita ao tempo da proclamação e da escuta da Palavra. Na preparação da celebração, procurar que algumas expressões da liturgia da Palavra estejam presentes no momento penitencial, nalguma intenção da oração dos fiéis, num momento de acção de graças...

    3. BILHETE DE EVANGELHO.
    Os saduceus, que não acreditam na ressurreição, procuram ridicularizar Jesus, que a defende. A mensagem de Jesus é uma mensagem de esperança. Ele quer ajudar os seus ouvintes a erguer os olhos, isto é, a não ficarem agarrados aos bens materiais e unicamente a esta vida na terra. Ele veio anunciar um Reino no qual a única filiação real e eterna é aquela que nos liga a Deus. Ele apresenta Deus como um ser de relação: relação do Pai com o Filho na comunhão realizada pelo Espírito. Mas relação também de Deus com a humanidade: o nosso Deus é sempre o Deus de alguém, Deus de Abraão, Deus de Isaac e Deus de Jacob. E é numa relação de Aliança que Deus Se situa. A relação com Deus não conhece a morte: se o homem é chamado a ressuscitar, é porque Deus quer selar uma aliança eterna à qual Ele é sempre fiel.

    4. À ESCUTA DA PALAVRA.
    Não nos riamos desta história ridícula, inventada pelos saduceus. É verdade que uma prescrição da Lei de Moisés dizia que uma mulher que não tinha tido filhos e que se tornara viúva devia casar com o irmão do defunto para ter um filho que seria considerado como o filho deste defunto. A história dos saduceus é rocambolesca. Mas estes últimos, contrariamente aos fariseus, não acreditavam na ressurreição, com o pretexto de que Jesus não lhes havia dito nada sobre isso. Então, querem apanhar Jesus em falta, Ele que acreditava na ressurreição. Com a sua história, eles ridicularizam Jesus e a crença na ressurreição. Ora, esta ideia da ressurreição não é hoje mais evidente do que há dois mil anos. Os gregos reencontrados por São Paulo não acreditavam nisso. E hoje, os cristãos, mesmo muito "praticantes", são cada vez mais numerosos a aderir à teoria da reincarnação. É verdade que nunca se viu ninguém voltar do além da morte, enquanto se fornecem quantidades de testemunhos de pessoas que dizem ter recordações de uma vida anterior. No fundo, os saduceus são seriam estranhos entre nós hoje! Reconheçamos que a ressurreição é uma realidade muito misteriosa para nós. Quando Jesus ressuscitado apareceu aos seus discípulos, teve que usar muita pedagogia, persuasão e repreensões para os convencer de que era verdadeiramente Ele. Eles não acreditaram imediatamente! Hoje, o cerne do ensinamento de Jesus é a sua palavra: "E que os mortos ressuscitam, até Moisés o deu a entender no episódio da sarça-ardente, quando chama ao Senhor 'o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacob'. Não é um Deus de mortos, mas de vivos, porque para Ele todos estão vivos". Deus, o Criador, está para além do tempo. Se Ele ressuscita cada ser humano, é por um acto infinito e eterno de amor criador. Ele dá um nome único, pessoal a cada homem. Ele nunca poderá retomar nem suprimir este acto. Cada ser humano que vem ao mundo é verdadeiramente um "pedaço de eternidade". Cada ser humano será para sempre "ele" e não um outro. Cada ser humano viverá para sempre, enraizado no amor eterno de Deus. Pela sua ressurreição, Jesus abriu-nos o caminho da nossa própria vida em plenitude em Deus.

    5. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Sugere-se a escolha da Oração Eucarística III.

    6. PALAVRA PARA O CAMINHO DA VIDA...
     Levar a Palavra de Deus como luz para mais uma semana de trabalho, de estudo... Ao longo dos dias da semana que se segue, procurar rezar e meditar algumas frases da Palavra de Deus: "Temos a esperança em Deus de que Ele nos ressuscitará"...; "Escutai, Senhor, a minha oração, feita com sinceridade"...; "O Senhor dirija os vossos corações, para que amem a Deus e aguardem a Cristo com perseverança"...; "Deus não é um Deus de mortos, mas de vivos, porque para Ele todos estão vivos"... Procurar transformar as palavras de Deus em atitudes e em gestos de verdadeiro encontro com Deus e com os próximos que formos encontrando nos caminhos percorridos da vida...
     Feitos para a vida... Anunciar que o nosso Deus não é o Deus dos mortos, mas dos vivos (Evangelho) não está reservado para os momentos dos funerais! Esta bela afirmação da nossa fé merece estar mais presente no nosso testemunho... Perguntemo-nos se já tivemos ocasião de o dizer... E se não, porquê?

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
    Tel. 218540900 - Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org

    S. Nuno de Santa Maria, Religioso

    S. Nuno de Santa Maria, Religioso


    6 de Novembro, 2022

    Nuno Álvares Pereira nasceu a 24 de Junho de 1360. Aos treze anos tornou-se pajem da rainha D. Leonor, sendo, pouco depois, armado cavaleiro. Por vontade de seu pai, casou-se aos 16 anos. Dos três filhos do seu matrimónio, dois faleceram ainda crianças, ficando apenas uma filha, Beatriz, que veio a casar com o filho do rei D. João I, D. Afonso, primeiro duque de Bragança. Quando, a 22 de Outubro de 1383, faleceu rei D. Fernando I, não deixou filhos varões, mas apenas uma filha casada com o rei de Castela, que pretendeu apoderar-se da coroa de Portugal. Opôs-se-lhe D. João, Mestre de Avis, irmão de D. Fernando, com o apoio de D. Nuno Alvares Pereira. Este, nomeado Condestável, conduziu o exército português a várias vitórias contra os castelhanos, até à vitória final, em Aljubarrota, a 14 de Agosto de 1385. O Condestável, aos dotes militares, aliava uma espiritualidade sincera e profunda, caraterizada pelo amor à Eucaristia e à Virgem Maria. Com a morte da sua esposa, em 1387, D. Nuno recusa contrair segundas núpcias e, quando a paz é definitivamente estabelecida, distribui grande parte dos bens pelos seus companheiros, antigos combatentes, e faz-se carmelita, com o nome de frei Nuno de Santa Maria. Logo após a sua morte, no dia 1 de Abril de 1431, Fre Nuno começou a ser chamado "santo" pelo povo. Beatificado por Bento XV beatificou-o, em 1918 e Bento XVI canonizou-o, em 2009.
    Lectio
    Primeira leitura: Ben Sirá 44, 1-3ab.4.6-7.10.13-14

    Louvemos os homens ilustres, nossos antepassados,segundo as suas gerações. 2O Senhor deu-lhes grande glória e magnificência, desde o princípio do mundo. 3Eles governaram nos seus reinos, homens famosos pelo seu poder, conselheiros pela sua inteligência. 4Guias do povo, pelos seus conselhos, chefes do povo, pela sagacidade, sábios narradores, pelo seu ensino, 6Homens ricos, dotados de poder, vivendo em paz nas suas casas. 7Todos eles alcançaram glória entre os seus contemporâneos e foram honrados no seu tempo. 10Foram homens de misericórdia, cujas obras de piedade não foram esquecidas. 13A sua posteridade permanecerá para sempre, e a sua glória não terá fim. 14Os seus corpos foram sepultados em paz, e o seu nome vive de geração em geração.

    Ben Sirá evoca as figuras ilustres que marcaram o passado da história de Israel para, com o seu exemplo, infiltrar vida nova no presente e projetar a esperança do povo na direção do futuro. Se estes homens baseavam a sua esperança na perpetuidade da sua memória, nas homenagens que lhes prestariam as gerações futuras, uma vez que ainda não lhes era muita clara a vida para além da morte, a nossa esperança de cristãos baseia-se em motivações bem mais sólidas: Cristo morto e ressuscitado, nossa esperança. S. Nuno de Santa Maria, grande pelo heroísmo e generosidade com que serviu o povo e pelas benemerências que lhe prestou, é ainda maior pela sua fé, pela sua esperança e pela sua caridade. Animado por essas virtudes, serviu a Pátria e, sobretudo, serviu a Deus.
    Evangelho: Lucas 14, 25-33

    Naquele tempo, seguia Jesus uma grande multidão. Jesus voltou-se e disse-lhes: 26«Se alguém vem ter comigo e não me tem mais amor que ao seu pai, à sua mãe, à sua esposa, aos seus filhos, aos seus irmãos, às suas irmãs e até à própria vida, não pode ser meu discípulo. 27Quem não tomar a sua cruz para me seguir não pode ser meu discípulo. 28Quem dentre vós, querendo construir uma torre, não se senta primeiro para calcular a despesa e ver se tem com que a concluir? 29Não suceda que, depois de assentar os alicerces, não a podendo acabar, todos os que virem comecem a troçar dele, 30dizendo: 'Este homem começou a construir e não pôde acabar.' 31Ou qual é o rei que parte para a guerra contra outro rei e não se senta primeiro para examinar se lhe é possível com dez mil homens opor-se àquele que vem contra ele com vinte mil? 32Se não pode, estando o outro ainda longe, manda-lhe embaixadores a pedir a paz. 33Assim, qualquer de vós, que não renunciar a tudo o que possui, não pode ser meu discípulo.

    O seguimento de Jesus é exigente. Não se pode ser cristã a meias. É o que nos ensinam as duas parábolas (vv. 27-30 e 31-32) e as três sentenças (vv. 26.27.32) que escutamos no evangelho da memória de S. Nuno de Santa Maria. Se os projetos deste mundo impõem custos, planos, sacrifícios, o seguimento de Jesus não é menos exigente. Por isso, se alguém quer ser discípulo de Jesus, deve tomar a cruz para segui-lo (cf. v. 26). A nossa lei é Cristo, com a sua entrega aos pequenos, a sua mensagem de esperança, de perdão e o seu caminho de verdade/fidelidade até à morte. S. Nuno foi discípulo verdadeiro e fiel, como cristão leigo, como militar, como religioso.
    Meditatio

    "Sabei que o Senhor me fez maravilhas. Ele me ouve, quando eu o chamo" (Sl 4, 4). Estas palavras do Salmo Responsorial exprimem o segredo da vida do bem-aventurado Nuno de Santa Maria, herói e santo de Portugal. Os setenta anos da sua vida situam-se na segunda metade do século XIV e primeira do século XV, que viram aquela nação consolidar a sua independência de Castela e estender-se depois pelos Oceanos - não sem um desígnio particular de Deus - abrindo novas rotas que haviam de propiciar a chegada do Evangelho de Cristo até aos confins da terra. São Nuno sente-se instrumento deste desígnio superior e alistado na militia Christi, ou seja, no serviço de testemunho que cada cristão é chamado a dar no mundo. Características dele são uma intensa vida de oração e absoluta confiança no auxílio divino. Embora fosse um ótimo militar e um grande chefe, nunca deixou os dotes pessoais sobreporem-se à ação suprema que vem de Deus. São Nuno esforçava-se por não pôr obstáculos à ação de Deus na sua vida, imitando Nossa Senhora, de Quem era devotíssimo e a Quem atribuía publicamente as suas vitórias. No ocaso da sua vida, retirou-se para o Convento do Carmo por ele mandado construir. Sinto-me feliz por apontar à Igreja inteira esta figura exemplar nomeadamente pela presença duma vida de fé e oração em contextos aparentemente pouco favoráveis à mesma, sendo a prova de que em qualquer situação, mesmo de carácter militar e bélico, é possível atuar e realizar os valores e princípios da vida cristã, sobretudo se esta é colocada ao serviço do bem comum e da glória de Deus. (Bento XVI, Homilia da Canonização de S. Nuno de Santa Maria).
    Oratio

    Senhor nosso Deus, que destes a S. Nuno de Santa Maria a graça de combater o bom combate e o tornastes exímio vencedor de si mesmo, concedei aos vossos servos que, dominando como ele as sedições do mundo, com ele vivam para sempre na pátria celeste. Ámen.
    Contemplatio

    "A devoção a Maria, diz Santo Efrém, é "um salvo-conduto para o céu". "Maria é uma advogada que não perde as suas causas", diz S. Bernardo. Temos disso a prova no milagre de Caná. "Ela não se cansa de nos defender", diz S. Germano... Santo Anselmo aplica-lhe o que é dito da Sabedoria nos santos livros: "Ela antecipa-se às nossas orações para nos vir socorrer" (Sab 6, 14). O mesmo Sto. Anselmo vai até ao ponto de dizer que o socorro vem às vezes mais depressa pela invocação de Maria, enquanto Jesus é Mestre e Juiz. "Como Maria é terrível para o demónio", diz S. Boaventura! E o Santo doutor aplica a Maria o que Job diz da Aurora que faz fugir os ladrões: "O diabo tal como os ladrões atravessa as muralhas de noite, mas se a aurora aparece, foge como os ladrões"... Guardemos a castidade segundo a nossa própria condição... Recitemos o pequeno ofício ou a liturgia das horas". (Leão Dehon, OSP 4, p. 64s.).
    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "A suas obras de piedade não foram esquecidas" (Ben Sirá, 44, 12).

     

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    S. Nuno de Santa Maria, Religioso (6 de Novembro)

  • XXXII Semana - Segunda-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    XXXII Semana - Segunda-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    7 de Novembro, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares

    XXXII Semana - Segunda-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Tito 1, 1-9
    Paulo, servo de Deus e apóstolo de Jesus Cristo, em ordem à fé dos eleitos de Deus e ao conhecimento da verdade, que conduz à piedade, 2na esperança da vida eterna, prometida desde os tempos antigos pelo Deus que não mente 3e que, no devido tempo, manifestou a sua palavra, pela pregação que me foi confiada por mandato de Deus, nosso Salvador: 4a Tito, meu verdadeiro filho, pela fé comum, a graça e a paz da parte de Deus Pai e de Cristo Jesus, nosso Salvador. 5Deixei-te em Creta, para acabares de organizar o que ainda falta e para colocares presbíteros em cada cidade, de acordo com as minhas instruções. 6Cada um deles deve ser irrepreensível, marido de uma só mulher, com filhos crentes, e não acusados de vida leviana ou de insubordinação. 7Porque é preciso que o bispo, como administrador de Deus, seja irrepreensível, não arrogante, nem colérico, nem dado ao vinho, à violência ou ao lucro desonesto; 8mas, antes, hospitaleiro, amigo do bem, prudente, justo, piedoso, continente, 9firmemente enraizado na doutrina da palavra digna de fé, de modo que seja capaz de exortar com sãos ensinamentos e de refutar os contraditores.
    A carta a Tito é uma das chamadas «cartas pastorais». Tito é um dos colaboradores do Apóstolo. Ao confiar-lhe uma comunidade, faz-lhe algumas recomendações baseadas no evento de Jesus Morto e Ressuscitado. Fala-lhe «da verdade, que conduz à piedade» (v. 1) e da «esperança da vida eterna» (v. 2).
    A tarefa de Tito será formar os crentes para que se enamorem da verdade revelada e pregada e, desse modo, fortaleçam o vínculo da fé e do amor que os liga na comunidade e a Cristo. É nisso que consiste a administração que Deus pede aos seus servidores. O serviço da Palavra, a pregação apostólica, é o fundamental serviço à comunidade. Sem esse serviço não nascem novas comunidades cristãs. O responsável pela comunidade deve ter excepcionais qualidades quanto ao estilo de vida e de acção; deve ser fiel à doutrina e generoso no serviço. Pastor e fiéis hão-de estar à escuta, submetidos à doutrina-verdade contida nas Escrituras, tanto no Antigo como no Novo Testamento.

    Evangelho: Lucas 17, 1-6
    Naquele tempo: 1Disse, depois, aos discípulos: «É inevitável que haja escândalos; mas ai daquele que os causa! 2Melhor seria para ele que lhe atassem ao pescoço uma pedra de moinho e o lançassem ao mar, do que escandalizar um só destes pequeninos. 3Tende cuidado convosco!Se o teu irmão te ofender, repreende-o; e, se ele se arrepender, perdoa-lhe. 4Se te ofender sete vezes ao dia e sete vezes te vier dizer: 'Arrependo-me', perdoa-lhe.» 5Os Apóstolos disseram ao Senhor: «Aumenta a nossa fé.» 6O Senhor respondeu: «Se tivésseis fé como um grão de mostarda, diríeis a essa amoreira: 'Arranca-te daí e planta-te no mar', e ela havia de obedecer-vos.»
    Lucas apresenta-nos três temas da pregação de Jesus: o escândalo, o perdão, a fé. É preciso considerá-los de modo unitário.
    O discípulo deve ter a preocupação de não provocar escândalo, que leve alguém a afastar-se do caminho iniciado. Trata-se do caminho evangélico. Por isso, Jesus lança um dos seus «ai». O Mestre não pode aceitar o comportamento de quem põe em risco a sua salvação e compromete a dos outros, sobretudo a dos «pequenos» (v. 2). Se é preciso evitar o escândalo, também é preciso conceder o perdão a todos, a todo o custo (vv. 3-4). O perdão é sinal de verdadeiro amor. É no perdão que se revela o amor de Deus para connosco. Jesus, que é a incarnação histórica do amor de Deus, também oferece o perdão àqueles que dele precisam.
    Ao terminar o ensinamento, Jesus elogia a fé que, ainda que seja pequena, pode mostrar toda a sua força, mesmo com um milagre. Os discípulos pedem um aumento da sua fé. Jesus responde-lhes falando da eficácia de uma fé genuína (v. 6).

    Meditatio
    A palavra de Deus, hoje, leva-nos a centrar a atenção em três tipos de pessoas: os pequenos, o irmão, os apóstolos. Ao mesmo tempo leva-nos a descobrir uma espiritualidade evangélica capaz de iluminar toda a nossa vida.
    Os pequenos mereceram uma especial atenção de Jesus. Foram os destinatários privilegiados dos seus ensinamentos e personificam sacramentalmente a sua presença no meio de nós. Não podemos escandalizá-los! Devem também merecer o nosso especial cuidado e o nosso serviço.
    O irmão, de que nos fala o evangelho, não é uma simples abstracção. É alguém de carne e osso, talvez mesmo um pecador cheio de arrependimento. Como Jesus, também nós devemos oferecer-lhe o perdão e a possibilidade de restabelecer uma relação serena e harmoniosa.
    Os apóstolos, na singularidade da sua missão, estão conscientes de que ainda carecem de aumentar a sua fé para chegarem a uma plena sintonia com o Mestre.
    Vistas assim, todas estas pessoas são modelos para nós, sempre carecidos de purificar a fé que nos foi dada. Por pequena ou grande que seja, a fé liberta sempre uma força superior a qualquer capacidade humana. É verdadeiramente miraculosa, não tanto porque possa realizar coisas extraordinárias, mas porque põe em acto o poder divino.
    A "Palavra", mas sobretudo a "partilha do Pão" (Cst 17) são um convite diário, eucarístico para nós, dehonianos, a sermos pão bom, partido pelos irmãos, de modo especial para os mais fracos e carenciados: «os pequenos e os que sofrem» (Cst 18).
    «Deveis lavar os pés uns aos outros» (Jo 13, 14). É um convite a servirmos os irmãos, tal como Cristo fez, de modo heróico, até ao dom da vida (cf. Jo 15, 13), até Se tornar alimento e bebida para nós (cf. Cst 17). Neste amor de Cristo - por nós, e com que amamos os irmãos -encontramos a certeza de alcançar a fraternidade humana e a força de lutar por ela (cf. Cst 18).
    «Como o Pai Me enviou - diz Jesus - Também Eu vos envio a vós. Depois de ter dito isto, soprou sobre eles e disse: "Recebei o Espírito Santo» (Jo 20, 21-22). O Espírito que Ele deu aos apóstolos levou-os ao mais elevado grau de fé e encheu-os de força para a missão. Esse mesmo Espírito nos foi dado para caminharmos na fé e no amor, para ser em nós força de missão e de serviço (e não de domínio) aos irmãos: «como o Filho do homem, que não veio para ser servido, mas para servir» (Mt 20, 28); «Eu estou no meio de vós como quem serve» (Lc 22, 27) e, depois do lava-pés: «Dei-vos o exemplo, para que façais como Eu fiz... Sabendo estas coisas, sereis felizes se as puserdes em prática» (
    Jo 13, 15.17).

    Oratio
    Senhor, Pai santo, derrama sobre nós o teu Espírito, que ilumine a nossa responsabilidade e a nossa consciência, nos faça crescer na fé e no amor, e progredir espiritualmente. Não deixes que fechemos os olhos, e não nos deixemos iluminar pelo Espírito, permanecendo na ilusão de sermos bons. Faz-nos conhecer a verdade, desapegar-nos do mal e confiar na tua misericórdia. Revela-nos o teu coração de Pai, disposto a perdoar, não sete, mas setenta vezes sete. Ensina-nos a perdoar, não só aos outros, mas também a nós mesmos. Ensina-nos a aceitar-nos, com humildade e confiança, tal como Tu mesmo nos aceitas para atingirmos a plena maturidade humana e espiritual. Que a graça, nem sempre agradável, mas preciosa de nos conhecermos a nós mesmos, nos dispunha a acolher a tua misericórdia e a tornar-nos instrumentos dela para os outros. Amen.

    Contemplatio
    «O meu Pai e eu, diz o Senhor, somos assim glorificados». É, de facto, o amor divino pelos homens que é imitado e continuado. A nossa união fraterna faz a alegria de Deus nosso Pai. Ela faz também a nossa força e a nossa consolação. As obras da caridade fraterna são também um poderoso meio de apostolado e o instrumento da conversão dos povos. O mundo vê que nos amamos e fica emocionado.
    Esta caridade tem tido os seus inumeráveis mártires, que têm fecundado a Igreja e enchido o céu. Todos aqueles que sacrificaram a sua vida nos trabalhos e nos perigos do apostolado sob todas as suas formas são mártires da caridade. Enfrentaram as fadigas, as doenças, as dificuldades do clima, a hostilidade dos infiéis para irem em socorro dos que sofrem ou que estão nas trevas da idolatria. Era o espírito da caridade que os conduzia.
    Dando-nos o seu preceito novo, Nosso Senhor dá-nos, no Espírito Santo, a graça de o cumprirmos.
    Se correspondermos a este espírito de caridade, havemos de praticar entre nós a doçura, a paciência, a benevolência. As obras de misericórdia ser-nos-ão caras e fáceis. Teremos gosto em tomar conta dos pequenos, dos pobres, dos ignorantes, daqueles que sofrem. Havemos de nos recordar da palavra do bom Mestre: «O que fazeis aos pequenos e aos deserdados, tenho como feito por mim».
    Se tivermos uma caridade ardente e abundante, levá-la-emos até ao sacrifício. Despojar-nos-emos, afadigar-nos-emos para socorrer o nosso próximo, e, se for preciso, daremos a nossa vida por ele como Nosso Senhor a deu por nós. (Leão Dehon, OSP 3, p. 419s.).

    Actio
    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Senhor, Aumenta a nossa fé» (cf. Lc17, 5).
    | Fernando Fonseca, scj |

  • XXXII Semana - Terça-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    XXXII Semana - Terça-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    8 de Novembro, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares

    XXXII Semana - Terça-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Tito 2, 1-8. 11-14
    Caríssimo: 1Ensina o que é conforme à sã doutrina. 2Os anciãos sejam sóbrios, dignos, prudentes, firmes na fé, na caridade e na paciência. 3Do mesmo modo, as anciãs tenham um comportamento reverente, não sejam caluniadoras nem escravas do vinho, mas mestras de virtude, 4a fim de ensinarem as jovens a amar os maridos e os filhos, 5a serem prudentes, castas, boas donas de casa e dóceis aos maridos, de modo que a palavra de Deus não seja difamada. 6Exorta igualmente os jovens a serem moderados, 7apresentando-te em tudo a ti próprio como exemplo de boas obras, de integridade na doutrina, de dignidade, 8de palavra sã e irrepreensível, para que os adversários fiquem confundidos, por não terem nada de mal a dizer de nós. 11Com efeito, manifestou-se a graça de Deus, portadora de salvação para todos os homens, 12para nos ensinar a renúncia à impiedade e aos desejos mundanos, a fim de vivermos no século presente com sobriedade, justiça e piedade, 13aguardando a bem-aventurada esperança e a gloriosa manifestação do nosso grande Deus e Salvador Jesus Cristo. 14Ele entregou-se por nós, a fim de nos resgatar de toda a iniquidade e de purificar e constituir um povo de sua exclusiva posse e zeloso na prática do bem.
    Paulo dirige esta carta ao responsável pela comunidade de Creta. Mas os seus ensinamentos interessam a todos e a todas as comunidades. Para que a mensagem de Cristo ressuscitado ultrapasse os limites da comunidade, é preciso que todos se empenhem no testemunho. Sem isso, o Evangelho pode tornar-se ineficaz. Na comunidade vivem diversas categorias de pessoas. Paulo dá, a cada uma delas, um conselho oportuno, uma palavra de conforto. Recomenda aos anciãos e anciãs a sobriedade, um estilo de vida digno, perseverança na fé, generosidade no amor fraterno (vv. 2s.). Assim se podem tornar modelo para os jovens e para as famílias. A palavra de Deus pode espalhar-se, graças à sua colaboração. Aos jovens, o Apóstolo dirige palavras muito exigentes, mas cheias de luz e de graça (vv. 6-8): devem dar o bom exemplo aos da sua idade, por meio «do exemplo das boas obras» e pelo respeito recíproco e pela «palavra sã e irrepreensível». O seu principal inimigo, lembra Paulo, é Satanás.
    A motivação teológica para todos estes comportamentos, ou programa de vida, também é explicitada: «manifestou-se a graça de Deus, portadora de salvação para todos os homens, para nos ensinar a renúncia à impiedade e aos desejos mundanos, a fim de vivermos no século presente com sobriedade, justiça e piedade» (vv. 11b-12). Trata-se do evento salvífico de Jesus Cristo, isto é, do seu mistério de vida, morte e ressurreição.

    Evangelho: Lucas 17, 7-10
    Naquele tempo, disse o Senhor: 7«Qual de vós, tendo um servo a lavrar ou a apascentar gado, lhe dirá, quando ele regressar do campo: 'Vem cá depressa e senta-te à mesa'? 8Não lhe dirá antes: 'Prepara-me o jantar e cinge-te para me servires, enquanto eu como e bebo; depois, comerás e beberás tu'? 9Deve estar grato ao servo por ter feito o que lhe mandou? 10Assim, também vós, quando tiverdes feito tudo o que vos foi ordenado, dizei: 'Somos servos inúteis; fizemos o que devíamos fazer.'»
    Jesus, depois de ter falado da fé, dirige-se aos apóstolos e, por meio da parábola do servo (seria mais exacto traduzir «escravo»), recomenda-lhes que se façam servos («escravos») de todos. Mais uma vez, Jesus acentua que, na lógica do Reino, não conta tanto o que se faz quanto a intenção, o estilo, o método com que se faz. Não recomenda uma humildade genérica, ou protocolar: o que Lhe interessa realmente é o que pensam e pretendem fazer os apóstolos, quando se põem ao seu serviço e ao serviço da sua causa. Deus não precisa de nós, nem das nossas ajudas; mas quer colaboradores em total sintonia com o seu projecto de salvação, aqui e agora personificado em Jesus de Nazaré.
    «Escravos inúteis» (v. 10), isto é, comuns, simples... O que Jesus quer que os apóstolos interiorizem é a atitude que, Ele mesmo, demonstrará na véspera da paixão: depor o manto, servir os irmãos e, no fim, julgar-se e declarar-se «escravos inúteis» (cf. Lc 22, 24-27; Jo 13, 1-17).

    Meditatio
    O Senhor Jesus põe-nos decididamente no nosso lugar: «quando tiverdes feito tudo o que vos foi ordenado, dizei: 'Somos servos inúteis; fizemos o que devíamos fazer». Este ensinamento que, em primeiro lugar se destina aos apóstolos, é para todo o cristão, para todos nós. Somos servos inúteis porque, quando demos tudo o que tínhamos a Deus, não fizemos mais do que restituir-Lhe o que antes nos tinha dado. Somos sempre seus devedores, porque tudo recebemos dele.
    O Vaticano II lembra a todos o dever de viver como servos na Igreja e no mundo, para bem dos irmãos. É uma tarefa que deriva da graça do Baptismo, que faz nascer em nós o direito e o dever de nos interessarmos pelo bem-estar dos irmãos, em força da graça recebida.
    O que Jesus diz aos apóstolos, Lucas também o atribui a Maria. Na Anunciação, Maria responde ao Anjo: «Eis a serva (literalmente «a escrava») do Senhor» (Lc 1, 38). Mais adiante, no Magnificat, oração de louvor e de acção de graças, Maria exclama: «Ele olhou para a sua humilde serva («escrava»)» (Lc 1, 48).
    Também Paulo, na carta aos Filipenses, diz de Cristo: «Assumiu a condição de servo (literalmente, «escravo») e humilhou-Se a Si mesmo» (literalmente: «abaixou-se a si mesmo») (2, 7b.6ª). Estamos sempre perante as mesmas expressões que, não por acaso, ocorrem nos escritos de Paulo e de Lucas, seu discípulo.
    Não certamente é preciso sublinhar a actualidade desta mensagem. Vemos, hoje, muitas pessoas dispostas a ser úteis aos outros, sem se considerarem «inúteis» diante de Deus. Por vezes encontramos pessoas dispostas a servir os outros, mas sem mostrarem vontade de assumir este comportamento evangélico, cheio de caridade, de absoluta gratuidade e de profunda humildade.
    O "Ecce venio" de Cristo, que exprime disponibilidade amorosa e gratuita, foi preanunciado por muitos servos e amigos de Deus do Antigo Testamento. Desde Abraão, disposto a sacrificar o filho Isaac ("Eis-me aqui", Gn 22, 1), desde Moisés que se prepara para libertar os hebreus da escravidão do Egipto ("Eis-me aqui", Ex 3, 4) até Samuel e Isaías, disponíveis para o serviço da profecia, isto é, para falar ao povo de Israel em nome de Deus ("Eis-me aqui", 1 Sm 3, 4; Is 3, 4). A atitude que estes "Eis-me aqui" significam, deve ser a atitude de todo o verdadeiro discípulo. Há-de ser particularmente a nossa atitude de dehonianos. O nosso "Ecce venio", unido ao "Ecce venio" de Cristo, exp
    rime a nossa vocação e missão, o serviço amoroso a gratuito a prestar a Deus, à Igreja e ao mundo: «somos chamados na Igreja a procurar e a realizar, como o único necessário, uma vida de união à oblação de Cristo» (Cst 26).

    Oratio
    Senhor, as tuas palavras são claras, são exigentes. Mas não as pronunciaste para me fazer sofrer, para me humilhar. Pronunciaste-as para me mostrar o caminho da alegria: servir de modo gratuito e humilde. De facto, quem se deixa levar por reivindicações, jamais estará satisfeito, porque pretende sempre mais. Mas, quem se julga indigno dos teus favores, sabe que tudo recebe de Ti e que, servir-Te, em tudo e sempre, é uma graça que nos enche de satisfação e alegria. Que eu jamais me preocupe em contabilizar méritos, mas me julgue servo inútil não tendo feito mais do que o meu dever. E não deixarás de me surpreender com os teus dons, porque és sempre generoso com os teus servos. Aumenta em mim a fé, e isso me basta! Amen.

    Contemplatio
    Por nós mesmos, nós não podemos ir a Deus senão pelo Sagrado Coração; é no Coração de Jesus que nós devemos unir-nos a Deus e comunicar com Deus; lá nós encontraremos o Pai e o Espírito Santo no Coração do Filho.
    Nós devemos unir-nos a Ele pelo amor e pela oblação de nós mesmos continuamente repetida, a fim de que a nossa vida esteja continuamente escondida no Sagrado Coração. Ele quer velar sobretudo pelos desejos e os afectos, de modo que todos os nossos actos tenham como objecto o Sagrado Coração imediata ou mediatamente: imediatamente pela contemplação pura, mediatamente pelo amor das criaturas reportado ao Sagrado Coração; evitar as acções que fazemos unicamente por amor próprio e vaidade. Todas as vezes que fazemos um acto de amor próprio, nós roubamos alguma coisa ao Coração de Jesus. Que diríeis de alguém que de manhã levasse um dom para o altar e que viesse retomá-lo durante o dia? Se uma pessoa depositasse uma peça de ouro na caixa das esmolas do Sagrado Coração para servir para honrar este divino Coração por alguma coisa de grande no seu culto, e viesse depois abrir furtivamente a caixa das esmolas para retomar o seu ouro, o vosso coração não se revoltaria num sentimento de indignação? Eis o que nós fazemos quando o amor-próprio rouba ao Sagrado Coração o mérito das nossas obras. Não é isto uma rapina no holocausto? Não é isto uma espécie de sacrilégio? O que foi deposto sobre o altar do Coração de Jesus é consagrado, santificado; roubá-lo, não é isso apropriar-nos do que pertence a Deus? Haverá sem dúvida ainda entre nós pensamentos de amor-próprio, movimentos primários que escaparão à nossa fraqueza; mas, de facto, actos deliberados, já não deve haver um acto que seja feito por amor-próprio.
    Para que a vida esteja inteiramente escondida em Deus, é preciso que o amor seja desinteressado. O Sagrado Coração não procurava nem a sua própria glória, nem os seus próprios interesses, mas unicamente os de Deus. Este desinteresse entra na nossa vocação, porque nós consagramos os nossos méritos ao Sagrado Coração. Por isso é necessário que nos mantenhamos na humildade, no abandono, e não nos inquietarmos por saber qual é o nosso grau de santidade; não ter perturbações acerca das nossas imperfeições e os nossos defeitos; numa palavra, olhar pouco para nós mesmos, mas olhar primeiro para o Sagrado Coração, para o servir, contentar e amar. (Leão Dehon, OSP 2, p. 228s.).

    Actio
    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Manifestou-se a graça de Deus» (Tt 2, 11).
    | Fernando Fonseca, scj |

  • Dedicação da Basílica de Latrão

    Dedicação da Basílica de Latrão


    9 de Novembro, 2022

    A Basílica do Santíssimo Salvador, ou de S. João de Latrão, foi fundada pelo Papa Melquíades (311-314) sobre a colina de Latrão. Aí se celebraram sessões de cinco Concílios Ecuménicos. Aí o Papa celebra a Missa da Ceia do Senhor, em quinta-feira santa. Aí multidões de presbíteros e bispos foram ordenados ao longo dos séculos. Daí partiram muitos missionários para os cinco continentes. Uma vez que o Bispo de Roma, Sucessor de Pedro, tem a sua sede na Basílica de Latrão, essa igreja é justamente chamada "mãe e cabeça de todas as igrejas", como se lê no seu frontispício. O aniversário da sua Dedicação é celebrado como festa litúrgica, desde o século XII.

     

    Lectio
    Primeira leitura: Ezequiel 47, 1-2.8-9.12

    Naqueles dias, o Anjo conduziu-me para a entrada do templo, e eis que saía água da sua parte subterrânea, em direcção ao oriente, porque o templo estava voltado para oriente. A água brotava da parte de baixo do lado direito do templo, a sul do altar. 2Fez-me sair pelo pórtico setentrional e contornar o templo por fora, até ao pórtico exterior oriental; vi rebentar a água do lado direito. 8Ele disse-me: «Esta água corre para o território oriental, desce para a Arabá e dirige-se para o mar; quando chegar ao mar, as suas águas tornar-se-ão salubres. 9Por onde quer que a torrente passar, todo o ser vivo que se move viverá. O peixe será muito abundante, porque aonde quer que esta água chegar, tornar-se-á salubre; e a vida desenvolver-se-á por toda a parte aonde ela chegar. 12Ao longo da torrente, nas suas margens, crescerá toda a sorte de árvores frutíferas, cuja folhagem não murchará e cujos frutos nunca cessam: produzirão todos os meses frutos novos, porque esta água vem do santuário. Os frutos servirão de alimento e as folhas, de remédio.

    O tema da manifestação da Glória de Javé na terra de Israel, no meio do seu povo, no templo, como centro vivificante, atinge, a sua máxima expressão no texto de Ezequiel, que hoje escutamos. A presença da Glória de Deus no meio de Israel provocará transformações, que trarão ao povo as mesmas condições de vida do início, da criação. Os quatro rios paradisíacos são agora uma única torrente que irrompe da entrada do templo e desce até Arabá pelo lado direito do mesmo templo. Começando por ser um simples arroio, vai crescendo até se tornar uma torrente intransponível, que fertiliza os campos até ao Mar Morto. O próprio Mar Morto volta a encher-se de vida, porque as suas águas salgadas se tornam salubres. Na nova Jerusalém dos tempos escatológicos, a presença de Javé será uma bênção manifestada em poder vivificante e criador. Este simbolismo da água é retomado pelo Novo Testamento: do Lado aberto de Cristo, templo de Deus no meio dos homens, brotará o Espírito que tudo renova e recria, verdadeira fonte de águas vivas que jorram para a vida eterna.
    Segunda leitura: 1 Coríntios 3, 9c-11.16-17

    Irmãos: Vós sois o edifício de Deus. 10Segundo a graça de Deus que me foi dada, eu, como sábio arquitecto, assentei o alicerce, mas outro edifica sobre ele. Mas veja cada um como edifica, 11pois ninguém pode pôr um alicerce diferente do que já foi posto: Jesus Cristo. 16Não sabeis que sois templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós? 17Se alguém destrói o templo de Deus, Deus o destruirá. Pois o templo de Deus é santo, e esse templo sois vós.

    A construção da Igreja é realizada por impulso da misteriosa dinâmica divina, sob o alicerce que é Jesus Cristo. O contributo humano necessário, por vontade de Deus, será avaliado, não segundo a dignidade da tarefa encomendada, mas segundo o esforço voluntário de cada um. Tanto faz ser arquiteto como pedreiro! Mas o templo de Deus é a própria comunidade humana. É aí que Deus quer habitar. Os outros templos, mais ou menos grandiosos, hão-de ajudar a que, todos e cada um, se tornem templo do Deus vivo.
    Evangelho: João 12, 13-22

    Estava próxima a Páscoa dos judeus, e Jesus subiu a Jerusalém. 14Encontrou no templo os vendedores de bois, ovelhas e pombas, e os cambistas nos seus postos. 15Então, fazendo um chicote de cordas, expulsou-os a todos do templo com as ovelhas e os bois; espalhou as moedas dos cambistas pelo chão e derrubou-lhes as mesas; 16e aos que vendiam pombas, disse-lhes: «Tirai isso daqui. Não façais da Casa de meu Pai uma feira.» 17Os seus discípulos lembraram-se do que está escrito: O zelo da tua casa me devora. 18Então os judeus intervieram e perguntaram-lhe: «Que sinal nos dás de poderes fazer isto?» 19Declarou-lhes Jesus, em resposta: «Destruí este templo, e em três dias Eu o levantarei!» 20Replicaram então os judeus: «Quarenta e seis anos levou este templo a construir, e Tu vais levantá-lo em três dias?» 21Ele, porém, falava do templo que é o seu corpo. 22Por isso, quando Jesus ressuscitou dos mortos, os seus discípulos recordaram-se de que Ele o tinha dito e creram na Escritura e nas palavras que tinha proferido.

    Jesus entrara em Jerusalém como vencedor da morte e senhor da vida - ressuscitara Lázaro; entrara no ambiente próprio de um rei triunfante, como indicavam os ramos de palmeira associados ao triunfo dos Macabeus (cf. 1 Mac 13, 50-52; 2 Mac 10, 1-9). Mas é ele próprio que encontra um jumento e monta nele. Não é, pois, o Messias no sentido que o povo esperava, mas o Messias anunciado por Zacarias (cf. Zc 9, 9). Só a partir da sua morte e ressurreição, graças à presença do Espírito, é que tudo isto é entendido pelos próprios apóstolos. Ao contrário do que se pensava, não é o povo que dá autoridade a Jesus, mas o Pai. O seu reino também não é deste mundo. Por isso, os judeus nada tinham a temer, quando verificaram: "toda a gente vai atrás d´Ele."
    Meditatio

    Hoje a Igreja-Mãe chama-nos para Roma a fim de, ao menos em espírito, celebrarmos com ela o aniversário da Dedicação da Sé Catedral do Papa, que não é, como muitos julgam, a Basílica de S. Pedro do Vaticano, mas é exatamente a Basílica de S. João de Latrão.
    A liturgia hodierna sublinha claramente o significado da igreja-edifício, como sinal visível do único verdadeiro templo que é o corpo pessoal de Cristo e o seu corpo místico, que é a Igreja, que celebra num determinado lugar o culto em espírito e em verdade (cf. Jo 4, 23; At 2, 46s.). Para além da sacralização do espírito material, somos estimulados a colher em Cristo homem-Deus a verdadeira sacralidade que, a partir dele, se comunica a todo o povo santo e sacerdotal, batizado e crismado no Espírito, unido ao sumo e eterno sacerdote na única oblação (Heb 10, 14).
    A casa do povo de Deus, no que diz respeito à estrutura, ao decoro e à funcionalidade, deve ser tida a peito por todos os crentes, que nela renascem para a vida divina, e que nela serão abençoados para o último êxodo pascal, rumo à pátria. É casa de todos e, como tal, deve ser cuidada e guardada com amor também no seu aspeto exterior, que é sinal da nossa pureza interior" (CEI, Rito da Dedicação de uma igreja, Orientações Pastorais, Roma 1981, 12-14).
    Na festa da Dedicação da Catedral de Roma, sigamos um conselho do P. Dehon: "Renovemos a nossa devoção e a nossa confiança para com a Igreja romana. Sejamos dóceis a todos os seus ensinamentos, a todas as suas orientações. Amemo-la, veneremo-la tanto mais quanto mais ela for atacada e combatida. Rezemos pelo Soberano Pontífice e pela Igreja". (Leão Dehon, OSP 3, p. 70).
    Oratio

    Senhor, Pai santo, nós vos damos graças. Nesta casa visível, que nos destes a graça de construir, incessantemente concedeis os vossos favores à vossa família, que, neste lugar, peregrina para Vós. Aqui nos dais o sinal admirável da vossa comunhão connosco e nos fazeis participar no mistério da vossa aliança: aqui edificais o vosso templo, que somos nós, e fazeis crescer a Igreja, presente em toda a terra, na unidade do Corpo do Senhor, que, um dia, tornareis perfeita na visão da paz da celeste Jerusalém. Com os Anjos e os Santos, nós Vos louvamos, no templo da vossa glória. Ámen. (cf. Prefácio da Missa).
    Contemplatio
    As grandes ordenações em S. João de Latrão são realmente emocionantes. A cerimónia é feita no coro da Basílica, ao pé da mesa da Ceia, testemunha da primeira ordenação no Cenáculo, junto das sagradas cabeças de S. Pedro e de S. Paulo, que depois de Jesus, são a nascente do sacerdócio, e nesta igreja que é a cabeça e a mãe de todas as igrejas. Sobre estas lajes prostraram-se, depois de S. Silvestre e de Constantino, muitos milhares de padres que vinham receber a unção sacerdotal ou a consagração episcopal. Daí partiram os apóstolos de tantas nações. Aí renova-se cada ano a nascente do apostolado pelas ordenações de clérigos de todas as nações. Experimentei aí as mais profundas e as melhores emoções da minha vida. (Leão Dehon, Memórias (NHV), 65-66).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "O templo de Deus é santo, e esse templo sois vós" (1 Cor 3, 17).

     

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    Dedicação Da Basílica De Latrão (9 de Novembro)

    XXXII Semana - Quarta-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    XXXII Semana - Quarta-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    9 de Novembro, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares

    XXXII Semana - Quarta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Tito 3, 1-7
    Caríssimo: 1Recorda-lhes que sejam submissos e obedientes aos governantes e autoridades, que estejam prontos para qualquer boa obra, 2que não digam mal de ninguém, nem sejam conflituosos, mas sejam afáveis, mostrando sempre amabilidade para com todos os homens. 3Pois também nós éramos outrora insensatos, rebeldes, extraviados, escravos de toda a espécie de paixões e prazeres, vivendo na maldade e na inveja, odiados e odiando-nos uns aos outros. 4Mas, quando se manifestou a bondade de Deus, nosso Salvador, e o seu amor para com os homens, 5Ele salvou-nos, não em virtude de obras de justiça que tivéssemos praticado, mas da sua misericórdia, mediante um novo nascimento e renovação do Espírito Santo, 6que Ele derramou abundantemente sobre nós por Jesus Cristo, nosso Salvador, 7a fim de que, justificados pela sua graça, nos tornemos, segundo a nossa esperança, herdeiros da vida eterna.
    Paulo faz chegar a sua mensagem a toda a comunidade, por meio de Tito. Assim, colabora, com o responsável da comunidade, na construção de uma Igreja que pretende digna de tal nome e capaz de testemunhar o Evangelho.
    Começa por sublinhar a dimensão pública do ser cristão. A fé em Cristo não pode ser reduzida a uma experiência privada; deve manifestar-se publicamente e penetrar na trama das relações sociais. Depois, descreve a passagem decisiva da maldade e do ódio a um presente iluminado pela graça de Deus: «Também nós éramos outrora insensatos, rebeldes, extraviados, escravos de toda a espécie de paixões e prazeres, vivendo na maldade e na inveja, odiados e odiando-nos uns aos outros. Mas, quando se manifestou a bondade de Deus, nosso Salvador» (vv. 3-4). Esta passagem marca a grande novidade de Jesus, incarnação pessoal do amor misericordioso do Pai.
    Esta «Boa Nova» é destinada a cada um de nós, tal como foi destinada aos crentes confiados aos cuidados pastorais de Tito. Hoje, como ontem, estamos perante um dom gratuito e inesperado de Deus. Sempre que contactamos com a palavra escrita, temos oportunidade de fazer memória do grande evento anunciado por Paulo, evento que nos regenera e renova pelo poder do Espírito Santo.

    Evangelho: Lucas 17, 11-19
    Naquele tempo, 11Quando caminhava para Jerusalém, Jesus passou através da Samaria e da Galileia. 12Ao entrar numa aldeia, dez homens leprosos vieram ao seu encontro; mantendo-se à distância, 13gritaram, dizendo: «Jesus, Mestre, tem misericórdia de nós!» 14Ao vê-los, disse-lhes: «Ide e mostrai-vos aos sacerdotes.» Ora, enquanto iam a caminho, ficaram purificados. 15Um deles, vendo-se curado, voltou, glorificando a Deus em voz alta; 16caiu aos pés de Jesus com a face em terra e agradeceu-lhe. Era um samaritano. 17Tomando a palavra, Jesus disse: «Não foram dez os que ficaram purificados? Onde estão os outros nove? 18Não houve quem voltasse para dar glória a Deus, senão este estrangeiro?» 19E disse-lhe: «Levanta-te e vai. A tua fé te salvou.»
    Jesus retoma a viagem para Jerusalém, onde como os profetas, será chamado a dar a vida. Entra numa aldeia de samaritanos e deixa-se interpelar por um grupo de leprosos. Eram samaritanos, estrangeiros para os judeus; eram leprosos e tornavam impuro quem se aproximasse deles (vv. 12s.). Mas Jesus é o salvador de todos, o irmão universal. Veio para todos: não faz acepção de pessoas, não despreza ninguém por pertencer a um determinado povo ou a uma certa raça; muito menos despreza alguém por estar doente. Jesus realiza este milagre com a sua habitual discrição e abertura aos mais pobres entre os pobres, àqueles que mais precisam da sua intervenção salvadora.
    São curados os 10 leprosos; mas só um deles sente a obrigação de agradecer (v. 15). O gesto de se lançar aos pés de Jesus significa, não só a sua gratidão pelo milagre, mas também a decisão de se tornar discípulo (v. 16). E só ele é plenamente curado, no corpo e na alma. Não basta encontrar Jesus. É preciso escutar a sua palavra, deixar-se atrair pela graça e segui-lo para onde quer que vá. O caminho da salvação vai da graça recebida, à gratidão, ao louvor.

    Meditatio
    O evangelho de hoje permite-nos compreender melhor aquilo que dizemos no prefácio da celebração eucarística: «é verdadeiramente nosso dever, é nossa salvação, dar-vos graças». Os leprosos curados foram dez. Mas apenas um sentiu o dever de agradecer. Estamos tão habituados às graças de Deus que já não nos admiramos com elas. Damo-las por pressupostas e, muitas vezes, não as agradecemos. E, todavia, é nosso dever reconhecer os dons de Deus e dar-Lhe graças por eles. Essa gratidão é fonte de salvação para nós. Foi o que aconteceu com o leproso curado, que foi agradecer a Jesus. Impressionam-nos as perguntas que Jesus lhe faz. Impressiona-nos especialmente a exclamação final: «Levanta-te e vai. A tua fé te salvou» (v. 19). Jesus mostra-se admirado por um só dos leprosos curados ter voltado para agradecer. E declara que foi a fé que o curou plenamente.
    Vejamos o itinerário que este homem percorreu: era um leproso como os outros; como os outros invocou a compaixão de Jesus; como os outros foi mostrar-se aos sacerdotes. Mas só ele voltou atrás para agradecer a Jesus. Jesus reconheceu nesse agradecimento uma manifestação de fé pura. Assim, verificamos que o encontro pessoal com Jesus não só lhe renovou o corpo, mas também lhe transformou profundamente a alma. O leproso curado não ficou satisfeito unicamente por ter resolvido um problema pessoal. Parecia-lhe pouco e, sobretudo, pouco digno de um homem que tinha intuído ter encontrado uma pessoa extraordinária. O seu verdadeiro desejo foi voltar atrás para conhecer... conhecer para reconhecer aquele que o curou... reconhecê-lo para lhe agradecer e segui-lo... Estamos perante um caminho de iniciação cristã, que todo o fiel deveria percorrer e reviver nos momentos decisivos da sua existência. Uma graça material é pouca coisa em comparação com aquilo que Deus tem para nos dar quando reconhecemos o seu amor e damos graças.
    Na Eucaristia, «unidos à acção de graças... de Cristo, somos chamados a colocar toda a nossa vida ao serviço da Aliança de Deus com o seu Povo» (cf. Cst 84). Vivendo esta disposição, de modo habitual, não só damos graças na celebração eucarística, na adoração e noutros momentos de oração, mas a nossa vida se torna acção de graças, comunhão de amor e de fé com Jesus Cristo.

    Oratio
    Senhor, a tua palavra alerta-me hoje para o dever e para a necessidade de Te dar graças por todos os teus dons. Agradecer-Te é, de verdade, nosso dever e nossa salvação. De quantas doenças me tens curado, desde a grande cura que foi o meu baptismo. Obrigado, S
    enhor. Quantas vezes me envolveste na tua misericórdia, e renovaste em mim a beleza da criação. Obrigado, Senhor! Que a Eucaristia diária seja de verdade «acção de graças» e que o encontro contigo, que me dás tanto amor, seja um encontro pessoal de amor e de fé, que faça da minha vida uma eucaristia permanente. Amen.

    Contemplatio
    A vossa mais doce ocupação deveria ser evocar sem cessar a recordação dos benefícios do vosso Pai celeste, meditá-los, aprofundá-los.
    É uma matéria inesgotável, nela não há nada que não seja cheio de consolação e de enternecedor para o coração, está ao vosso alcance e não exige uma grande contenção do espírito. A intenção do vosso Pai celeste é que penseis nisso mais frequentemente do que em nenhuma outra coisa e que os não percais jamais de vista. Assinalou-a em centenas de lugares da Sagrada Escritura. Muitas vezes censurou Israel de esquecer o seu Criador e o seu Deus (Dt 32; Is 51, etc.). Convida-vos a guardar esta recordação; ordena-vos que o recordeis para a sua glória e para o vosso benefício; ligou-lhe graças infinitas.
    E vós, ingratos e insensatos, gozais dos benefícios de um Deus criador, de um Deus salvador, e com dificuldade vos acontece reflectir nisso e assinalar o vosso reconhecimento. Rezais bastante para lhe pedir, não rezais quase nunca para lhe agradecer e o glorificar.
    Seria demasiado dar cada dia uma meia hora, um quarto de hora pelo menos para meditar nos inefáveis benefícios do vosso Deus, prestar-lhe acções de graças, excitar em vós os sentimentos que a sua bondade merece? Não seria este o melhor emprego do tempo do que dais cada dia a exercícios de piedade muitas vezes bem vazios? Ó como vos encontraríeis bem com esta prática e como o amor de Deus tomaria o melhor crescimento na vossa alma!
    Deus pedir-vos-á contas do emprego do vosso tempo e das vossas faculdades. Porque é que, dir-vos-á, quase nada tendes pensado nos meus benefícios? Porque é que os mistérios da religião não estiveram sempre presentes no vosso espírito? Porque é que não tendes reflectido em tantas graças pessoais de que a vossa vida não era mais do que um tecido?
    Mesmo as pessoas do mundo têm este dever. As riquezas têm os seus inconvenientes e os seus perigos, mas têm também as suas vantagens em relação à salvação e à santidade, na medida em que proporcionam mais liberdade para se ocuparem das coisas da religião e, ordinariamente, uma educação que dispõe a melhor as conceber e a delas tirar mais fruto. Permitem que se procurem bons livros de piedade. Os que têm estas vantagens serão porventura desculpados, se negligenciam alimentar em si a recordação dos benefícios de Deus através das leituras e meditações diárias; se despendem todos os seus tempos livres em visitas, no jogo, nos espectáculos, nos divertimentos frívolos; se as suas leituras se limitam aos livros de ciência profana ou mesmo a matérias pueris e perigosas? (Leão Dehon, OSP 2, p. 31s.).

    Actio
    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Ele salvou-nos pela sua misericórdia» (Tt 3, 5).
    | Fernando Fonseca, scj |

  • XXXII Semana - Quinta-feira- Tempo Comum - Anos Pares

    XXXII Semana - Quinta-feira- Tempo Comum - Anos Pares


    10 de Novembro, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares

    XXXII Semana - Quinta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Filémon 7-20
    Caríssimo: 7Foi grande a alegria e a consolação que tive com o teu amor, porque os corações dos santos foram reconfortados por meio de ti, irmão. 8Por isso, embora tenha toda a autoridade em Cristo para te impor o que mais convém, 9levado pelo amor, prefiro pedir como aquele que sou: Paulo, um ancião e, agora, até prisioneiro por causa de Cristo Jesus. 10Peço-te pelo meu filho, que gerei na prisão: Onésimo, 11que outrora te era inútil, mas agora é, para ti e para mim, bem útil. 12É ele que eu te envio: ele, isto é, o meu próprio coração. 13Eu bem desejava mantê-lo junto de mim, para, em vez de ti, se colocar ao meu serviço nas prisões que sofro por causa do evangelho. 14Porém, nada quero fazer sem o teu consentimento, para que o bem que fazes não seja por obrigação, mas de livre vontade. 15É que, afinal, talvez tenha sido por isto que ele foi afastado por breve tempo: para que o recebas para sempre, 16não já como escravo, mas muito mais do que um escravo: como irmão querido; isto especialmente para mim, quanto mais para ti, que com ele estás relacionado tanto humanamente como no Senhor. 17Se, pois, me consideras em comunhão contigo, recebe-o como a mim próprio. 18E se ele te causou algum prejuízo ou alguma coisa te deve, põe isso na minha conta. 19Sou eu, Paulo, que o escrevo pela minha própria mão: serei eu a pagar. Isto, para não te dizer que me deves a tua própria pessoa. 20Sim, irmão, possa eu sentir-me satisfeito contigo no Senhor: reconforta o meu coração em Cristo.
    Esta carta não é mais do que um pequeno bilhete de recomendação em favor de Onésimo, um escravo, que Paulo defende diante de Filémon, seu senhor. Onésimo tinha fugido ao dono, e estava numa situação delicada. Paulo tenta que Filémon não aplique a justiça, mas actue de acordo com a sua fé cristã, usando a caridade evangélica.
    O apóstolo realça, neste breve escrito, dois valores: a caridade, que é a fonte do agir moral e a base das suas relações sociais, além de ser a meta suprema a atingir. A isso obriga a caridade de Deus revelada em Jesus Cristo. O outro valor em que o Apóstolo fundamenta a sua argumentação é a liberdade oferecida por Cristo, que ninguém deve negar ou limitar aos outros. Essa liberdade dá a Paulo audácia para fazer o seu pedido, e deve inspirar a Filémon um comportamento consequente em relação a Onésimo. Quem é livre diante de Deus e de si mesmo não pode negar essa mesma liberdade a quem lhe pede.
    Caridade e liberdade, juntas em vista da verdade, podem transformar as relações sociais, para além de qualquer conveniência pessoal ou interesse colectivo.

    Evangelho: Lucas 17, 20-25
    Naquele tempo: 20Interrogado pelos fariseus sobre quando chegaria o Reino de Deus, Jesus respondeu-lhes:«O Reino de Deus não vem de maneira ostensiva. 21Ninguém poderá afirmar: 'Ei-lo aqui' ou 'Ei-lo ali', pois o Reino de Deus está entre vós.» 22Depois, disse aos discípulos: «Tempo virá em que desejareis ver um dos dias do Filho do Homem e não o vereis. 23Vão dizer-vos: 'Ei-lo ali', ou então: 'Ei-lo aqui.' Não queirais ir lá nem os sigais. 24Porque, como o relâmpago, ao faiscar, brilha de um extremo ao outro do céu, assim será o Filho do Homem no seu dia. 25Mas, primeiramente, Ele tem de sofrer muito e ser rejeitado por esta geração.
    Escutamos hoje o chamado "Pequeno discurso escatológico" do evangelho de Lucas (cf. Lc 21, onde encontramos o "Grande discurso escatológico"). Trata-se de um breve mas intenso ensinamento de Jesus, provocado por uma pergunta dos fariseus acerca do tempo em que há-de vir o Reino de Deus. Jesus não condescende com a miopia espiritual nem com interesses egoístas. Por isso, não dá uma resposta exacta. Não veio para satisfazer curiosidades. Começa por se exprimir de modo negativo, para que não caiamos em ilusões, mas aprendamos a discernir situações e pessoas que possam hipnotizar a nossa atenção ou desviar a nossa fé. Como verdadeiro mestre, alerta-nos para possíveis desvios, e indica o caminho que devemos seguir.
    Mas há duas afirmações positivas neste discurso de Jesus, que devemos notar. Primeiro, fala do desejo do crente em «ver um dos dias do Filho do Homem» (v. 22), que todos havemos de sentir e que Ele quer satisfazer; depois, afirma a necessidade de «primeiramente, ter de sofrer muito e ser rejeitado» (v. 25). Antes da escatologia, tem se realizar-se a Páscoa de Jesus. Quem aceitar ir com Ele até Jerusalém e partilhar a sua Páscoa, prepara-se para ir ao encontro final com o Salvador.

    Meditatio
    Os fariseus procuravam manifestações espectaculares do Reino de Deus. Jesus responde-lhes: «o Reino de Deus está entre vós» (v. 21). Podia traduzir-se: «está em vós». Temos aqui elementos preciosos para o discernimento dos espíritos: o Reino de Deus não deve ser procurado em manifestações extraordinárias, mas na correspondência habitual, no dia a dia, à voz do Espírito Santo.
    Temos em nós vários níveis de vida: os instintos naturais, a razão que ordena e domina os instintos, mas também o Espírito de Jesus que nos permite viver em novidade de vida e ver coisas que a simples razão não consegue enxergar. Deixar-se guiar pela razão, dominando os instintos, e vivendo de modo naturalmente virtuoso, já é coisa boa. Mas ainda não é vida cristã, porque o cristão, em todas as circunstâncias da vida, deixa-se conduzir pelas moções e pelas inspirações do Espírito. Não é fácil fazer um bom discernimento, porque há em nós princípios recebidos do mundo, outros recebidos da razão e outros recebidos do Espírito, que se misturam dentro de nós. É pois necessário, em cada circunstância, perguntar a nós mesmos: que é que me leva a fazer isto ou, a fazer aquilo. Por vezes, um pensamento que à primeira vista parece bom, tem uma raiz má: a busca do interesse pessoal, o instinto da vaidade, a ambição, o desejo de uma vida cómoda. Só escutando o Espírito Santo, na oração, na reflexão, com grande disponibilidade pessoal, podemos conhecer a verdade, a vontade de Deus.
    Paulo convida muitas vezes os cristãos a deixar-se renovar no Espírito para compreenderem a vontade de Deus. De facto, é muito fácil deixar-nos levar pelas tendências instintivas ou simplesmente racionais. Precisamos do Espírito criador, que nos faz descobrir coisas novas, de que não suspeitávamos, mas nos enchem de alegria.
    A carta a Filémon dá-nos um exemplo concreto do que acabamos de dizer. Paulo tinha para resolver um caso de consciência bastante complicado. Onésimo tinha fugido de casa do seu dono, Filémon, cri
    stão da igreja de Colossos. Segundo a lei, Onésimo era um delinquente. Paulo acolheu o escravo em fuga. Acolheu-o com tanta bondade que o fugitivo acabou por se converter. Sendo assim, Paulo podia actuar perante Filémon. Podia remeter o escravo ao seu dono, que tinha direito a puni-lo com rigor. Mas Paulo também dispunha de uma solução nova, progressista: pensar que a escravidão não tinha qualquer valor para um cristão, que era contra o Evangelho porque em Cristo somos todos iguais. Portanto, Onésimo podia considerar-se livre e Filémon nada podia dizer. O Apóstolo encontrou uma solução completamente nova: mandou o escravo ao seu dono, com uma carta a pedir que Filémon recebesse Onésimo como um irmão em Cristo. Não lhe faz imposições. Apela para a sua caridade, para a sua fé, para a gratidão que lhe deve a ele, Paulo, que o gerou para a fé. Faz, pois, um apelo, guiado pelo Espírito, ao mesmo Espírito que habita em Filémon, e propõe-lhe uma solução revolucionária para aquele tempo: Filémon, o dono ofendido, receba com honra o escravo fugitivo! O Espírito inspirou a Paulo uma solução equilibrada; Paulo está certo de que também a inspirará a Filémon: «embora tenha toda a autoridade em Cristo para te impor o que mais convém, levado pelo amor, prefiro pedir como aquele que sou: Paulo, um ancião e, agora, até prisioneiro por causa de Cristo Jesus».
    Se a coisa mais importante da nossa vida religiosa pessoal e comunitária é fazer, como Cristo, a vontade do Pai, compreendemos a importância fundamental do discernimento da vontade de Deus, para a realizarmos na nossa vida. Fazer discernimento é, antes de mais, pôr em prática o preceito de Jesus: «É preciso rezar sempre, sem desfalecer» (Lc 18, 1), isto é, «É preciso amar sempre e jamais se cansar de amar».
    A oração faz-nos dóceis às inspirações e às moções ou graças actuais do Espírito, naquela pobreza e liberdade interior que nos tornam capazes de captar as mensagens que o Espírito nos faz chegar por meio das mais diferentes mediações: «a Palavra de Deus acolhida na Igreja» (Cst 57), a Regra de vida, particularmente as Constituições, o superior, a comunidade, a caridade, os sinais dos tempos, «os acontecimentos da vida» (Cst 57), as necessidades do Povo de Deus (cf. Cst 27).
    Para isto, havemos de ter uma sólida devoção ao Espírito Santo e implorar-Lhe permanentemente: «Vem, Espírito Santo...; Vem, pai dos pobres..., ver, dador dos dons...; vem, luz dos corações».

    Oratio
    Vem, Espírito Santo! Ilumina os meus olhos para que me dê conta da presença do Reino no meio de nós, em mim próprio. Vem, Espírito Santo! Abre o meu coração à Palavra que é esperança, criatividade, imaginação, horizonte novo. Vem, Espírito Santo! Faz-me saborear os dons do Pai, no presente; faz-me esperar o futuro como lugar de uma nova e definitiva manifestação do seu poder salvador. Vem, Espírito Santo! Que no meu dia a dia tenha os ouvidos aplicados para Te escutar, os olhos abertos para Te ver, a mente atenta às tuas alternativas, o coração palpitante para me deixar conduzir por Ti. Amen.

    Contemplatio
    Como é que se possui Deus e a paz que resulta da sua amizade? Pela conformidade a sua santa vontade. Jesus di-lo no Evangelho: «não são aqueles que dizem: 'Senhor, Senhor', que entrarão no céu, mas aqueles que fazem a vontade de meu Pai».
    A graça ajuda as almas a fazer esta vontade santa. Corresponder à graça que leva as almas a fazerem a vontade de Deus é, portanto, o grande meio de chegar á paz da alma.
    Esta vontade divina é fácil de conhecer. O fiel conhece os mandamentos. Aquele que tem a consciência de os observar bem goza de uma grande paz mesmo no meio das provações e das agitações da vida. /154 Espera com confiança a sua última hora. Os privilegiados de Nosso Senhor, os que ele chama a uma vida mais perfeita conhecem também os seus deveres e encontram a paz no cumprimento destes deveres.
    Mas tanto para uns como para os outros, as intenções directrizes, as considerações que sustêm a alma, os meios práticos enfim podem ser vistos sob três aspectos diferentes e apoiar-se sobre três bases sólidas: a fé, a esperança e a caridade. A fé torna meritórias as acções que inspira, a esperança das recompensas prometidas sustém nos desfalecimentos da vida. Estas duas bases escolhidas como ponto de apoio principal, sem excluir um certo grau de caridade, são suficientes para nos ajudar poderosamente na conformidade à vontade divina. Socorrer-se destes meios, é agradar a Deus, mas há um outro meio bem mais poderoso, bem mais agradável a Deus. Este meio é a caridade, é o amor de Deus. A fé e a esperança supõem sempre um certo grau de caridade, mas pode ser fraco. A caridade encerra em si as duas outras virtudes, porque não podemos amar a Deus sem acreditar e sem esperar n' Ele. (Leão Dehon, OSP 2, p.153s.)

    Actio
    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «A tua caridade causa-me alegria e consolação» (cf. Flm 7).
    | Fernando Fonseca, scj |

  • S. Martinho de Tours, Bispo

    S. Martinho de Tours, Bispo


    11 de Novembro, 2022

    S. Martinho nasceu na Panónia, na atual Hungria, no ano 316. O pai orientou-o para a carreira militar. Ainda catecúmeno, deu prova de coerência e de amor cristão para com os pobres. Recebido o batismo, orientado por S. Hilário de Poitiers, deixou as armas e consagrou-se a Deus na vida monástica. Começou por viver como eremita. Depois, sempre aconselhado por S. Hilário, fundou em Ligugè o primeiro mosteiro cristão do Ocidente. Em 373 foi escolhido para bispo de Tours. Até à morte, ocorrida em 397, dedicou-se com incansável solicitude à formação do clero, à pacificação entre os povos e à evangelização. Foi um dos primeiros santos, não mártires, a ser honrado pela liturgia da Igreja.
    Lectio
    Primeira leitura: Da féria ou do Comum
    Evangelho: Mateus 25, 31-40

    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: "Quando o Filho do Homem vier na sua glória, acompanhado por todos os seus anjos, há-de sentar-se no seu trono de glória. 32Perante Ele, vão reunir-se todos os povos e Ele separará as pessoas umas das outras, como o pastor separa as ovelhas dos cabritos. 33À sua direita porá as ovelhas e à sua esquerda, os cabritos. 34O Rei dirá, então, aos da sua direita: 'Vinde, benditos de meu Pai! Recebei em herança o Reino que vos está preparado desde a criação do mundo. 35Porque tive fome e destes-me de comer, tive sede e destes-me de beber, era peregrino e recolhestes-me, 36estava nu e destes-me que vestir, adoeci e visitastes-me, estive na prisão e fostes ter comigo.' 37Então, os justos vão responder-lhe: 'Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos de comer, ou com sede e te demos de beber? 38Quando te vimos peregrino e te recolhemos, ou nu e te vestimos? 39E quando te vimos doente ou na prisão, e fomos visitar-te?' 40E o Rei vai dizer-lhes, em resposta: 'Em verdade vos digo: Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes".

    O discurso sobre o "juizo final", é o ponto final e culminante do ministério público de Jesus, segundo Mateus. Retomando o capítulo 7 de Daniel, Jesus fala do Filho do homem como juiz glorioso que introduz no reino de Deus. Todos passam por um discernimento inevitável (vv. 32s.), cujo critério surpreende. Nesse momento, de fato, fica-se a compreender que o Filho do homem vindo na glória "com todos os seus anjos" (v. 31), estava desde sempre presente em todos os pobres e fracos. O Filho do homem, agora sentado no trono de glória, identifica-se com todos os "irmãos mais pequeninos" (v. 40). Felizes o que neste mundo tiverem partilhado a sua porção dealegria com os aflitos. Com surpresa, irão herdar o reino para eles preparado pelo Pai "desde a criação do mundo" (v. 34).
    Meditatio

    Deus, misericordioso para com todos, particularmente para com os pobres, os famintos, os aflitos, revela o seu poder e a sua bem-aventurança realizando generosamente as obras de misericórdia. Os que, ensinados por Cristo, e com a graça do Espírito Santo, imitam a Deus Pai na sua misericórdia, são verdadeiramente bem-aventurados. S. Martinho de Tours é um desses bem-aventurados, porque sobre partilhar a sua capa, e tudo quanto era e quanto possuía, com os mais pobres e aflitos. O povo cristão admirou a sua generosidade e reconheceu a sua bem-aventurança, venerando-o, celebrando-o e criando sugestivas tradições ligadas à sua memória. A sua vida, escrita por Sulpício Severo, chegou bem depressa a todo o Império romano. Durante a Idade Média fizeram-se peregrinações ao seu sepulcro, quase tantas como aos sepulcros dos Apóstolos, em Roma. A sua fama de taumaturgo transportava toda a espécie de enfermos e necessitados, com a esperança de alcançarem cura das suas doenças e males.
    Nascido de pais pagãos, Martinho converteu-se ao cristianismo, recebendo o batismo. Cheio de Espírito Santo, amou a todos com o coração de Cristo, dando o que tinha recebido, sem fazer cálculos. A sua caridade era intuitiva e preveniente. Começou por dar a todos o que tinha de mais precioso: a vida da graça. Como monge, deu a sua oração perene de louvor, de ação de graças e de intercessão. Como bispo, prodigalizou-se em favor dos doentes e pobres, que o aguardavam à porta da igreja, esperando a cura, e a generosidade das suas esmolas. Chegou a dar a sua própria roupa, logo depois de endossar os paramentos litúrgicos. Descobriu a Cristo nos pobres quando ainda era militar e catecúmeno e, desde então, a sua vida tornou-se milícia em prol do evangelho.
    "É na disponibilidade e no amor para com todos, especialmente para com os pequenos e os que sofrem, que viveremos a nossa união a Cristo. Como poderíamos, efetivamente, compreender o amor que Cristo nos tem, senão amando como Ele em obras e em verdade? Neste amor de Cristo encontramos a certeza de alcançar a fraternidade humana e a força de lutar por ela." (Cst 18). S. Martinho, amando como Cristo, compreendeu e experimentou o seu amor.
    Oratio

    S. Martinho, a piedade, o amor por Nosso Senhor, o zelo pela perfeição, a caridade para com o próximo são uma bela regra de vida. Todas estas virtudes estão interligadas. O desapego e a austeridade são a sua condição, mas é o amor que dá asas à alma para avançar rapidamente pela via da santidade. Grande santo, fazei-me participar no vosso grande amor por Nosso Senhor. Amén. (cf. Leão Dehon, OSP 4, p. 448s.).
    Contemplatio

    A caridade é a virtude caraterística de S. Martinho. É apresentado dando metade do seu manto a um pobre. Foi este grande ato de caridade que lhe ganhou o Coração de Nosso Senhor e que lhe preparou todas as suas graças. Foi um apóstolo infatigável. Percorreu a Gália, convertendo os pagãos pelas suas pregações e pelos seus milagres. Destruía os templos e mandava construir igrejas para os substituir. Na sua bondade, solicitava junto dos príncipes, em Tréveris, o perdão dos criminosos, a liberdade dos cativos, o regresso dos exilados ou o alívio dos pobres e dos infelizes. Sabia persuadir o imperador de que todas estas obras serviam para a sua glória. Ao cair doente, está pronto para retardar a alegria da sua recompensa, se Nosso Senhor ainda o quiser utilizar na terra. Quando os seus discípulos em lágrimas lhe suplicam que os não deixe, dirige a Nosso Senhor esta oração tão conhecida: «Senhor, se sou ainda necessário ao vosso povo, não me recuso a trabalhar. Seja feita a vossa vontade!» Este era o segredo dos seus sucessos apostólicos e dos seus progressos incessantes na virtude: a conformidade à vontade divina em todas as coisas. Esta admirável vida convida-nos ao louvor de Deus, ao reconhecimento e à imitação das virtudes deste amável santo. (Leão Dehon, OSP 4, p. 449).
    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Senhor, se ainda sou necessário ao vosso povo, não me recuso a trabalhar. Seja feita a vossa vontade!" (S. Martinho de Tours).

     

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    S. Martinho de Tours, bispo (11 de Novembro)

    XXXII Semana - Sexta-feira - Tempo Comum - Anos Pares

    XXXII Semana - Sexta-feira - Tempo Comum - Anos Pares


    11 de Novembro, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares

    XXXII Semana - Sexta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Segunda Carta de João 4-9
    Senhora eleita de Deus: 4Muito me alegrei por ter encontrado entre os teus filhos quem caminha na verdade, conforme o mandamento que recebemos do Pai. 5E agora rogo-te, Senhora - e não como quem te escreve um mandamento novo, mas sim aquele mandamento que temos desde o princípio - que nos amemos uns aos outros. 6Nisto consiste o amor: em caminharmos segundo os seus man-damentos. E este é o mandamento, segundo ouvistes dizer desde o princípio: que caminheis no amor. 7É que apareceram no mundo muitos sedutores que afirmam que Jesus Cristo não veio em carne mortal. Esse é o sedutor e o anticristo! 8Acautelai-vos, para não perderdes o fruto do vosso trabalho, mas receberdes a plena recompensa. 9Todo aquele que passa adiante e não permanece na doutrina de Cristo não tem Deus consigo; mas aquele que permanece na doutrina, esse tem em si o Pai e o Filho.
    Nesta breve carta, S. João oferece-nos como que uma síntese do seu evangelho, uma vez que recorda à sua comunidade o essencial para a salvação: "caminhar na verdade" e "acreditar que Jesus é o Filho de Deus". O apóstolo interpreta o mandamento novo que ele mesmo recebeu do Senhor.
    As duas condições para a salvação podem, por sua vez, resumir-se a uma: acreditar em Jesus Cristo e, assim entrar na verdade de Deus. Mas João também se preocupa com a fidelidade dos seus destinatários, porque há muitos «sedutores» (v. 7), que não reconhecem Jesus e pretendem levar os outros a não o reconhecerem também. É sempre possível perder o fruto do nosso trabalho, isto é, a fé que pode transformar a nossa vida (cf. v. 8).
    Aquele que crê tem a sorte, não só de conhecer a verdade, mas também ter connosco Deus (cf. V. 9), não só de tender para um futuro incerto, mas de caminhar com Cristo para Deus, não só de praticar uma qualquer filantropia, mas de amar a Deus no próximo, em nome de Cristo.

    Evangelho: Lucas 17, 26-37
    Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 26Como sucedeu nos dias de Noé, assim sucederá também nos dias do Filho do Homem: 27comiam, bebiam, os homens casavam-se e as mulheres eram dadas em casamento, até ao dia em que Noé entrou na Arca e veio o dilúvio, que os fez perecer a todos. 28O mesmo sucedeu nos dias de Lot: comiam, bebiam, compravam, vendiam, plantavam, construíam; 29mas, no dia em que Lot saiu de Sodoma, Deus fez cair do céu uma chuva de fogo e enxofre, que os matou a todos. 30Assim será no dia em que o Filho do Homem se revelar. 31Nesse dia, quem estiver no terraço e tiver as suas coisas em casa não desça para as tirar; e, do mesmo modo, quem estiver no campo não volte atrás. 32Lembrai-vos da mulher de Lot. 33Quem procurar salvar a vida, há-de perdê-la; e quem a perder, há-de conservá-la. 34Digo-vos que, nessa noite, estarão dois numa cama: um será tomado e o outro será deixado. 35Duas mulheres estarão juntas a moer: uma será tomada e a outra será deixada. 36Dois homens estarão no campo: um será tomado e o outro será deixado.» 37Tomando a palavra, os discípulos disseram-lhe: «Senhor, onde sucederá isso?» Respondeu-lhes: «Onde estiver o corpo, lá se juntarão também os abutres.»
    Jesus quer ensinar aos discípulos a verdadeira esperança. Por isso, completa o discurso sobre a sua última vinda. Para que a esperança não se torne utópica e não crie ilusões fáceis, Jesus une-a à fé. A fé, por sua vez, une-nos, desde já, ao Senhor e à sua morte e ressurreição. Unindo a esperança à fé, ficamos a saber quem esperamos, e não nos interessa quando ou como isso acontecerá.
    Jesus ilustra o ensinamento com dois exemplos: o de Noé (vv. 26s.) e o de Lot (vv. 28s.). Só aparentemente estes dois factos históricos evidenciam o carácter improviso e repentino do dilúvio, no caso de Noé, e da chuva de fogo, no caso de Lot. O que Jesus quer acentuar é a necessidade de estar prontos quando Deus se manifestar no seu poder: prontos a reconhecê-lo, prontos para ser introduzidos na alegria eterna e na comunhão com Ele. O verdadeiro ensinamento de Jesus é, pois, este: não devemos considerar apenas Noé e Lot como figuras de crentes, mas também os seus contemporâneos, representados pela mulher de Lot (v. 32). Viviam esquecidos de Deus e preocupados com os bens terrenos: foi nessa situação que foram surpreendidos pelo castigo de Deus. É a sua indiferença perante a imprevisível intervenção de Deus, e a sua cegueira espiritual, é a sua incapacidade para se darem conta da dramaticidade dos tempos que atrai a atenção de Jesus, do evangelista e a nossa.

    Meditatio
    Jesus convida os seus discípulos a fazer bom uso da memória. É bom revisitarmos a história, para nos darmos conta das visitas de Deus, e adquirirmos sabedoria que nos permita viver adequadamente o presente e preparar o futuro. A história é mestra de vida, diziam os antigos. No caso de hoje, somos convidados a revisitar o Antigo Testamento que, para nós cristãos, é uma fonte de ensinamentos sempre válidos e actuais.
    A memória do crente leva-o a captar nos eventos históricos as mensagens que Deus nunca deixa faltar àqueles que O reconhecem. Quem recorda os factos históricos do Antigo Testamento, disposto a compreender as motivações e os modos como Deus intervém, aprende a viver no tempo presente e a orientar-se no futuro, rumo à meta final.
    A memória do passado, e a contemplação das intervenções de Deus, tornam-se, pois, critério de diagnóstico de quanto acontece aqui e agora, e permite-nos prosseguir a nossa caminhada, rumo ao futuro. Ao mesmo tempo, a memória do passado, convida-nos e habilita-nos a ultrapassar perigosas distracções, provocadas pelas coisas e pessoas que nos rodeiam, e a realizar aquele desapego e distanciação que tornam possível uma avaliação serena e correcta de tudo e de todos. A memória ensina-nos a perder o que deve ser perdido e a conservar o que deve ser conservado. É claro o contraste entre uma vida apenas aparente e uma vida nova adquirida por quem está disposto a sacrificar a sua vida terrena. A orientação para o futuro de Deus é clara.
    A nossa vida pessoal, com todos os seus capítulos mais felizes ou menos felizes, com todo o bem que recebemos e fizemos, com todo o mal de que fomos vítimas ou cometemos, é uma pequena história de salvação, porque nela fomos, muitas vezes, visitados por Deus. Há que dar-nos conta dessas visitas e das mensagens semeadas no nosso coração. Quanta sabedoria podemos adquirir ao revisitar a nossa história pessoal! Quanta oração nos pode inspirar! Quanta serenidade para o presente e para o futuro!
    A vida da congregação também é história da salvação. O Deus de Abraão, Isaac e Jacob, o Pai de Jesus, não são abstracções filosóficas, mas revelam-se concretamente actuando na história e na vida, em particular na Igreja, por meio do Espírito, fonte de todo o carisma e, portanto, do carisma de fundador do P. Dehon. A história da congregação desenvolve-se a partir da graça das origens, nutrindo-se daquilo que a Igreja, iluminada pelo Espírito, retira constantemente do tesouro da sua fé (cf. Cst 15). Esta história é visitada por Deus que nela deixa as suas mensagens. Em todos os acontecimentos há que perguntar: que nos diz o Senhor nesta situação?
    De facto, Jesus convida-nos a entrever a vontade de Deus nos eventos da história, da vida, nos sinais dos tempos: «Quando vedes uma nuvem levantar-se do poente, dizeis logo: Vem lá chuva, e assim sucede. E quando sopra o vento sul dizeis: "Vai haver calor", e assim acontece. Hipócritas, sabeis interpretar o aspecto da terra e do céu; como é que não sabeis interpretar o tempo presente?» (Lc 12, 54-56).

    Oratio
    Apóstolo S. João, que nos apresentas uma síntese tão bela do Evangelho de Jesus Cristo, intercede por nós, para que cultivemos a vida interior, procurando juntos a verdade e vivendo o amor. A verdade, para ti, é Jesus, o Verbo Incarnado por nosso amor. Ensina-nos a crescer na união e no amor a Jesus Cristo, observando os seus mandamentos. Ensina-nos a permanecer no Filho para possuirmos o Pai; ensina-nos a permanecer na verdade para viver o amor; ensina-nos a ser dóceis aos mandamentos para vivermos na verdade e no amor. Ensina-nos a fazer uma síntese vital entre verdade e amor, entre obediência aos mandamentos e espontaneidade de espírito, uma síntese fundada na união com Jesus e, nele, com o Pai e o Espírito Santo. Amen.

    Contemplatio
    Jesus possuía toda a sabedoria como Deus, e mesmo como homem por uma graça infusa, mas quer também possuir a ciência adquirida, para nos dar o exemplo e para nos merecer a graça do amor do trabalho e do gosto pela sabedoria.
    Segue as lições da Sinagoga, estuda a lei, os profetas, a história e os livros ascéticos. Lê os livros sagrados, medita-os. Não tem necessidade deles para si, mas tem necessidade por nós. Assumiu a humanidade tal como ela é, com os seus deveres de estudo e de trabalho.
    A sua ciência adquirida torna-se maravilhosa. Já aos doze anos espanta os doutores da lei no Templo. Explica a Escritura, ficam surpreendidos com a sua prudência e com as suas respostas.
    Durante a sua vida pública, citará constante e abundantemente a Escritura. Na sinagoga de Nazaré, passam-lhe o livro de Isaías, lê, comenta, mostra-lhes como as suas obras tinham sido anunciadas, cita os livros dos reis. As pessoas exclamam: «Donde lhe vem esta ciência, não é ele o filho do carpinteiro que nós conhecemos?» (Lc 2; Mc 6).
    Quando prega na região de Tiberíades, antes e depois do sermão da montanha, cita o Levítico e o Deuteronómio, os Reis, Amós, Isaías, Tobias. Muitas vezes faz alusão aos Salmos (Lc 6).
    Aos enviados de S. João Baptista, comenta e explica as profecias de Isaías (Lc 7,22).
    Os salmos são o alimento da sua vida interior e das suas orações, mesmo sobre a cruz: «Meu Deus, meu Deus, porque me abandonastes?» (Sl 21). «Meu Pai, entrego a minha alma nas vossas mãos» (Sl 30). Repassa no seu espírito toda a Escritura para se assegurar de que tudo cumpriu. Faltava ainda na sua Paixão a amargura do fel e do (Sl 68). Para a provocar, diz: «Tenho sede».
    Enfim, vendo que tudo está cumprido, verifica-o antes de morrer: Consumatum est. (Leão Dehon, OSP 3, p. 144s.).

    Actio
    Repete frequentemente e vive a palavra:
    «Caminhai no amor» (cf. 2 Jo 6).
    | Fernando Fonseca, scj |

  • XXXII Semana - Sábado - Tempo Comum - Anos Pares

    XXXII Semana - Sábado - Tempo Comum - Anos Pares


    12 de Novembro, 2022

    Tempo Comum - Anos Pares

    XXXII Semana - Sábado

    Lectio

    Primeira leitura: 3 Jo 5-8
    Caríssimo Gaio: 5em tudo o que fazes aos irmãos, mesmo sendo estrangeiros, tu procedes como é próprio de um fiel. 6Eles deram testemunho da tua caridade, diante da igreja. Farás bem em os prover do necessário para a sua viagem, de um modo digno de Deus, 7pois foi pelo seu nome que eles se puseram a caminho, sem nada receberem dos gentios. 8Por isso, nós devemos acolhê-los, a fim de sermos cooperadores da causa da verdade.
    Esta carta de João deixa-nos entrever uma comunidade cristã que vive o drama da divisão interna, que ameaça paralisar a sua actividade missionária. Dirigindo-se a um dos seus membros, o apóstolo quer encorajar toda essa comunidade à fidelidade, à comunhão eclesial e ao testemunho corajoso.
    João aponta a caridade que desperta a atenção de todos. Essa caridade torna-se tanto mais credível quanto não se limita a favorecer os que partilham a mesma fé, mas também quando tem em atenção os «estrangeiros» (v. 5). A caridade cristã não tem limites, porque Jesus também veio para todos e não fez acepção de pessoas. A caridade manifesta-se no acolhimento, que também vemos em Jesus, em relação aos pobres, doentes e pecadores. Acolher em seu nome os que estão em necessidades, significa acolhê-lo a Ele e ser «cooperadores da causa da verdade» (v. 8). A verdade de Deus, particularmente a revelada em Jesus Cristo, quer ser difundida não só por palavras, mas, sobretudo, pela caridade.
    Ao mesmo tempo, a actividade missionária é tarefa de toda a Igreja. Quando um dos seus membros se dedica à missão é toda a comunidade que se dedica com ele. O missionário representa a igreja e a Igreja toma a seu cuidado o missionário.

    Evangelho: Lucas 18, 1-8
    Naquele tempo: 1Depois, disse-lhes uma parábola sobre a obrigação de orar sempre, sem desfalecer: 2«Em certa cidade, havia um juiz que não temia a Deus nem respeitava os homens. 3Naquela cidade vivia também uma viúva que ia ter com ele e lhe dizia: 'Faz-me justiça contra o meu adversário.' 4Durante muito tempo, o juiz recusou-se a atendê-la; mas, um dia, disse consigo: 'Embora eu não tema a Deus nem respeite os homens, 5contudo, já que esta viúva me incomoda, vou fazer-lhe justiça, para que me deixe de vez e não volte a importunar-me.'» 6E o Senhor continuou: «Reparai no que diz este juiz iníquo. 7E Deus não fará justiça aos seus eleitos, que a Ele clamam dia e noite, e há-de fazê-los esperar? 8Eu vos digo que lhes vai fazer justiça prontamente. Mas, quando o Filho do Homem voltar, encontrará a fé sobre a terra?»
    Esta parábola, por um lado, alerta para a necessidade de perseverar na oração; por outro, lembra o ensinamento de Jesus sobre a certeza do seu regresso e sobre a gravidade do juízo que há pronunciar sobre aqueles que não seguem a justiça.
    Devemos notar a interrogação de Jesus no v. 7: «E Deus não fará justiça aos seus eleitos, que a Ele clamam dia e noite, e há-de fazê-los esperar?» Pensando em Deus, este «fazer justiça» tem a ver com a sua fidelidade às promessas e, portanto, com a sua vontade de perdão e de salvação. Deus é justo enquanto justiça: é essa a concepção bíblica de justiça.
    «Há-de fazê-los esperar?» (cf. v. 7b). Esta pergunta também ilumina a nossa busca. Deus, de facto, de acordo com o ensinamento bíblico, não é apenas justo, mas também paciente e bom. Manifesta a sua arte pedagógica não só ao ouvir as nossas orações, mas também ao estabelecer os tempos e os modos em que irá intervir. Este comportamento de Deus causa um certo escândalo, porque Ele espera, talvez demasiado tempo, antes de fazer justiça. Esta paciência de Deus, por vezes, torna impacientes os crentes.
    «Eu vos digo que lhes vai fazer justiça prontamente» (v. 8ª). Está aqui o fim da parábola; o que segue pode considerar-se um acrescento posterior. É deste modo que Jesus pretende confirmar a nossa fé em Deus-Pai, que contrariamente às nossas incertezas e crises, toma conta de todos aqueles que, na pobreza, O escolhem como único Senhor.

    Meditatio
    O texto evangélico de hoje termina com uma forte provocação de Jesus: «Mas, quando o Filho do Homem voltar, encontrará a fé sobre a terra?». O tema da fé está no centro do discurso de Jesus. Trata-se de um dom precioso de Deus, que havemos de conservar, custe o que custar. Isso não parece nada fácil. Se olharmos à nossa volta, ficamos com a impressão de que a humanidade está a caminho de um futuro menos rico de fé, e cada vez mais ligado aos bens terrenos e aos próprios interesses. O que vemos à nossa volta leva-nos facilmente a responder de forma negativa à pergunta de Jesus. Mas não basta usar a lupa para ver engrandecido o que acontece à nossa volta. É bom usar também os binóculos para fazermos uma observação panorâmica da realidade. Então veremos que a semente da fé está presente e escondida no coração de não poucas pessoas, e é isso o que mais conta. O que faz a diferença não é tanto a visibilidade externa ou a eficiência das estruturas criadas pelos crentes, mas o dom de Deus que, por sua natureza, tende a criar relações profundas e gosta de se esconder nelas.
    A pergunta/provocação de Jesus pode ser vista como uma missão para nós, os crentes: pertence ao «resto de Israel» fazer tudo o que estiver ao seu alcance para que, quando vier o Filho do homem, possa encontrar a fé sobre a terra. Sendo a fé, em primeiro lugar, dom de Deus, há que pedi-lo com perseverança, para nós e para os outros. E há que pedir também a graça da perseverança e do crescimento na fé, com a certeza de que Deus é um juiz piedoso, cheio de graça e de fidelidade e que, junto dele, temos a Virgem Maria, sempre disposta a defender a nossa causa.
    Lemos nas Constituições: «sem oração comunitária definha a comunidade de fé». Cada comunidade deve interrogar-se acerca do ritmo da sua oração comunitária, de acordo com a sua missão e o seu estilo de vida, para ser uma comunidade de fé, uma comunidade dehoniana que dá um testemunho profético de amor e de oblação, que faz a reparação, não só de cada uma das pessoas, mas também de toda a comunidade, porque aberta ao acolhimento do Espírito (cf. Cst 23.78), porque responde ao amor de Cristo, em comunhão com o Seu amor pelo Pai, cooperando na Sua obra de redenção e de reconciliação no mundo de hoje (cf. Cst 23).

    Oratio
    Senhor, acende em mim o fogo da oração, do diálogo permanente e amoroso contigo, pois sei me amas. Com esse fogo, serei renovado na intimidade contigo e, por Ti e em Ti, com o Pai, no Espírito Santo; com esse fogo, crescerei na união contigo, com teu amor e no serviço generoso aos homens, meus irmãos. Acende em mim o fogo da oração, para que não esmoreça no diálogo contigo; acende na minha comunidade o fogo da oração, para que a sua fé não definhe. Acende em todos nós o fogo da oração, para progredirmos no conhecimento de Ti, estreitarmos os laços da nossa vida comum e nos abrirmos constantemente à missão. Amen.

    Contemplatio
    Beati qui crediderunt et non viderunt.- Bem-aventurados os que, sem terem visto, acreditam (Jo 20, 29). São as palavras de Nosso Senhor ao Apóstolo S. Tomé. Nosso Senhor gosta da fé viva, da fé pura e sem ambiguidades, que não procura consolações e que sabe agir tanto na aridez como na alegria espiritual. A fé pura é urna verdadeira imolação do coração.
    Exemplo de fé viva e autêntica é Abraão, disposto a o imolar o filho da promessa. Fé viva, foi a dos Magos que acreditaram no presságio da estreia e persistiram no seu objectivo, mesmo depois do desaparecimento da estrela. Exemplo de fé viva e verdadeiramente admirável, a S.José, que acreditou nos mistérios da redenção, apesar de todas as contradições e dificuldades. Aceitou todas a mensagens angélicas. Foi testemunha de todas as humilhações de Nosso Senhor em Belém, no Egipto, e Nazaré.
    José permanece sempre fiei à sua fé. Morre ante dos grandes milagres de Jesus, antes da sua ressurreição; contudo morre na fé mais viva e meritória.
    E sobretudo no momento das provações que a fé deve ser firme e perseverante. É nestas crises que alcança a fé as suas mais belas vitórias e prepara o sucesso das obras. Deus castiga as dúvidas contra a fé. Temo disso numerosos exemplos na Sagrada Escritura.
    Nada devemos temer, mesmo quando não compreendemos os desígnios de Deus.
    Ele pedir-nos-á o sacrifício de Moriah, um sacrifício que parecerá destruir as suas promessas. A nossa humilde submissão será recompensada por uma superabundância de favores divinos. (Leão Dehon, DSP n. 156).

    Actio
    Repete frequentemente e vive a palavra:
    «Resplandece nos justos a bondade do Senhor» (da Liturgia).
    | Fernando Fonseca, scj |

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