Week of Fev 13th

  • 06º Domingo do Tempo Comum – Ano C

    06º Domingo do Tempo Comum – Ano C


    13 de Fevereiro, 2022

    ANO C
    6.º DOMINGO DO TEMPO COMUM

    Tema do 6º Domingo do Tempo Comum

    A Palavra de Deus que nos é proposta neste domingo leva-nos a refletir sobre o protagonismo que Deus e as suas propostas têm na nossa existência.
    A primeira leitura põe frente a frente a autossuficiência daqueles que prescindem de Deus e escolhem viver à margem das suas propostas, com a atitude dos que escolhem confiar em Deus e entregar-se nas suas mãos. O profeta Jeremias avisa que prescindir de Deus é percorrer um caminho de morte e renunciar à felicidade e à vida plenas.
    O Evangelho proclama “felizes” esses que constroem a sua vida à luz dos valores propostos por Deus e infelizes os que preferem o egoísmo, o orgulho e a autossuficiência. Sugere que os preferidos de Deus são os que vivem na simplicidade, na humildade e na debilidade, mesmo que, à luz dos critérios do mundo, eles sejam desgraçados, marginais, incapazes de fazer ouvir a sua voz diante do trono dos poderosos que presidem aos destinos do mundo.
    A segunda leitura, falando da nossa ressurreição – consequência da ressurreição de Cristo –, sugere que a nossa vida não pode ser lida exclusivamente à luz dos critérios deste mundo: ela atinge o seu sentido pleno e total quando, pela ressurreição, desabrocharmos para o Homem Novo. Ora, isso só acontecerá se não nos conformarmos com a lógica deste mundo, mas apontarmos a nossa existência para Deus e para a vida plena que Ele tem para nós.

    LEITURA I – Jer 17, 5-8

    Leitura do Livro de Jeremias

    Eis o que diz o Senhor:
    «Maldito quem confia no homem
    e põe na carne toda a sua esperança,
    afastando o seu coração do Senhor.
    Será como o cardo na estepe
    que nem percebe quando chega a felicidade:
    habitará na aridez do deserto,
    terra salobre, onde ninguém habita.
    Bendito quem confia no Senhor
    e põe no Senhor a sua esperança.
    É como a árvore plantada à beira da água,
    que estende as suas raízes para a corrente:
    nada tem a temer quando vem o calor
    e a sua folhagem mantém-se sempre verde;
    em ano de estiagem não se inquieta
    e não deixa de produzir os seus frutos».

    AMBIENTE

    Os versículos que formam esta leitura fazem parte de um bloco de frases de Jeremias (cf. Jer 17, 5-13), apresentadas ao estilo das máximas sapienciais. Aí o profeta, recorrendo a antíteses, vai desenvolvendo o tema da confiança/esperança.
    Estas palavras de Jeremias não nos dão elementos suficientes para as situarmos, inequivocamente, num contexto histórico. No entanto, é possível que o profeta as tenha pronunciado no reinado de Joaquim (609-597 a.C.): é uma época em que o rei desenvolve uma política aventureirística de alianças com potências estrangeiras e confia a segurança da nação, não a Jahwéh, mas aos exércitos egípcios, aliados de Joaquim. O profeta ataca essa política, considerando-a um grave sintoma de infidelidade ao Deus da aliança: Judá já não coloca a sua confiança e esperança em Deus, mas sim nos homens.

    MENSAGEM

    O tema fundamental é, portanto, o da confiança/esperança. A primeira parte da antítese (vers. 5-6) denuncia o homem que se apoia noutro homem e prescinde de Deus. Não se trata de dizer que não devemos confiar nos que nos rodeiam e apoiar-nos neles; trata-se de denunciar essa autossuficiência de uma humanidade que já não precisa de Deus, nem vê n’Ele essa rocha segura que tudo sustenta. Prescindir de Deus e não contar com Ele significa construir uma existência limitada, efémera, raquítica, a que falta o essencial, como um arbusto plantado no deserto, condenado precocemente à morte.
    A segunda parte da antítese (vers. 7-8) apresenta, em imagem, a vida daquele que confia em Deus e n’Ele coloca a sua esperança: é como um arbusto plantado à beira da água, que pode mergulhar as suas raízes bem fundas e que encontra vida em plenitude. A imagem sublinha, sobretudo, a segurança, a solidez, a paz, a fecundidade, a abundância de vida.
    A oposição entre deserto e várzea pode aludir à oposição entre deserto e Terra Prometida: se Israel confiasse unicamente em Deus, lançaria as suas raízes de forma permanente na Terra Prometida e não experimentaria a aventura do exílio.

    ATUALIZAÇÃO

    Na reflexão e na aplicação à vida, ter em conta os seguintes elementos:

    • Todos conhecemos a desilusão e a frustração que resultam da confiança traída. É uma experiência bem dolorosa confiar/esperar e receber traição/ingratidão. Em certos momentos extremos, parece que tudo se desmorona à nossa volta e que perdemos a vontade de continuar a construir a nossa vida. A leitura de hoje põe-nos de sobreaviso: tudo o que é humano é efémero, limitado, finito; só em Deus encontramos o rochedo seguro que não falha e que não nos dececiona.

    • O nosso mundo conhece espantosas construções no domínio da arte e da técnica… Abismamo-nos com os progressos da medicina, com os avanços tecnológicos, com a parafernália imensa de instrumentos que nos facilitam a vida e nos permitem alcançar fronteiras nunca antes sonhadas, seja no domínio da conquista espacial, seja no domínio das novas técnicas de manipulação da vida…. No entanto, o que fizemos de Deus? Ele continua a ser a nossa indicação fundamental? É n’Ele que colocamos a nossa esperança? As conquistas da vida moderna, por mais impressionantes que nos possam parecer, são algo de efémero, de árido, de vazio e, às vezes, de monstruoso, se prescindimos dessa dimensão fundamental que é Deus.

    • Quais são as referências fundamentais à volta das quais se constrói a nossa vida? Onde está a nossa segurança e a nossa esperança? Na conta que temos no banco? Nos amigos influentes? Na importância da nossa posição social ou profissional? Nas conquistas científicas ou técnicas? Ou nesse Deus que se compromete connosco e encontra mil formas de demonstrar, dia a dia, a sua fidelidade?

    SALMO RESPONSORIAL – Salmo 1

    Refrão: Feliz o homem que pôs a sua esperança no Senhor.

    Feliz o homem que não segue o conselho dos ímpios,
    nem se detém no caminho dos pecadores,
    mas antes se compraz na lei do Senhor,
    e nela medita dia e noite.

    É como árvore plantada à beira das águas:
    dá fruto a seu tempo e sua folhagem não murcha.
    Tudo quanto fizer será bem sucedido.

    Bem diferente é a sorte dos ímpios:
    são como palha que o vento leva.
    O Senhor vela pelo caminho dos justos,
    mas o caminho dos pecadores leva à perdição.

    LEITURA II – 1 Cor 15, 12.16-20

    Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios

    Irmãos:
    Se pregamos que Cristo ressuscitou dos mortos,
    porque dizem alguns no meio de vós
    que não há ressurreição dos mortos?
    Se os mortos não ressuscitam,
    também Cristo não ressuscitou.
    E se Cristo não ressuscitou,
    é vã a vossa fé, ainda estais nos vossos pecados;
    e assim, os que morreram em Cristo pereceram também.
    Se é só para a vida presente
    que temos posta em Cristo a nossa esperança,
    somos os mais miseráveis de todos os homens.
    Mas não.
    Cristo ressuscitou dos mortos,
    como primícias dos que morreram.

    AMBIENTE

    Este texto é a continuação da catequese sobre a ressurreição que Paulo apresenta na Primeira Carta aos Coríntios e que já começámos a ler no passado domingo. Depois de ter afirmado a ressurreição de Cristo (cf. 1 Cor 15, 1-11), Paulo afirma a realidade da nossa própria ressurreição. É preciso recordar, neste contexto, aquilo que dissemos na passada semana: a ressurreição dos mortos, em geral, constituía um sério problema para a mentalidade grega, habituada a ver no corpo uma realidade negativa, que aprisionava a alma no mundo material; sendo assim, o corpo – realidade carnal, sensual – não podia seguir a alma nessa busca da vida plena, da vida divina. Havendo no homem uma realidade negativa, que não podia ascender à vida plena, como admitir a ressurreição do homem integral?
    É a esta questão que Paulo vai continuar a responder na leitura que nos é proposta.

    MENSAGEM

    Para Paulo, uma vez admitida a ressurreição de Cristo, a ressurreição dos crentes impõe-se como algo perfeitamente evidente. A fé em Cristo ressuscitado desemboca inexoravelmente na inquebrantável esperança de que também os cristãos ressuscitarão. O inverso também é verdadeiro: não esperar a ressurreição dos mortos equivale a não acreditar na ressurreição de Cristo. Não é possível desvincular uma coisa da outra.
    Paulo passa, então, a enumerar as consequências fatais que adviriam, para a vida cristã, se Cristo não tivesse ressuscitado: a vivência da fé e a aceitação das propostas de Jesus não teriam qualquer sentido e os cristãos seriam gente enganada, “os mais miseráveis de todos os homens” (vers. 19). Mas Paulo tem a certeza de que os cristãos não são um rebanho de gente iludida… A partir da ressurreição de Cristo, podemos acreditar nessa vida plena que Deus reserva para todos os que O amam. É essa perspetiva que dá sentido à caminhada que o cristão faz neste mundo.
    Chegados aqui, Paulo detém-se para lançar um grito jubiloso de fé e de esperança: “Cristo ressuscitou dos mortos, como primícias dos que morreram” (vers. 20). Jesus ressuscitou não como o único, como um caso excecional, mas como o primeiro de uma longa cadeia da qual fazemos parte. Este “primeiro” não deve ser entendido em sentido cronológico, mas no sentido de que Cristo é o princípio ativo da nossa ressurreição, o princípio que gera essa nova humanidade sobre a qual as forças da morte não têm qualquer poder. Ele arrasta atrás de Si a humanidade solidária com Ele, até à realização plena, à vida definitiva, à salvação total.

    ATUALIZAÇÃO

    Considerar, para a reflexão, as seguintes linhas:

    • A certeza da ressurreição garante-nos que Deus tem um projeto de salvação e de vida para cada homem; e que esse projeto está a realizar-se continuamente em nós, até à sua concretização plena, quando nos encontrarmos definitivamente com Deus.

    • A nossa vida presente não é, pois, um drama absurdo, sem sentido e sem finalidade; é uma caminhada tranquila, confiante – ainda quando feita no sofrimento e na dor – em direção a esse desabrochar pleno, a essa vida total em que se revelará o Homem Novo.

    • Isso não quer dizer que devamos ignorar as coisas boas deste mundo, vivendo apenas à espera da recompensa futura, no céu; quer dizer que a nossa existência deve ser – já neste mundo – uma busca da vida e da felicidade; isso implicará uma não conformação com tudo aquilo que nos rouba a vida e que nos impede de alcançar a felicidade plena, a perfeição última (a nós e a todos os homens nossos irmãos).

    • Não é possível viver com medo, depois desta descoberta: podemos comprometer-nos na luta pela justiça e pela paz, com a certeza de que a injustiça e a opressão não podem pôr fim à vida que nos anima; e é na medida em que nos comprometemos com esse mundo novo e o construímos com gestos concretos que estamos a anunciar a ressurreição plena do mundo, dos homens e das coisas.

    ALELUIA – Lc 6, 23ab

    Aleluia. Aleluia.

    Alegrai-vos e exultai, diz o Senhor,
    porque é grande no Céu a vossa recompensa.

    EVANGELHO – Lc 6, 17.20-26

    Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas

    Naquele tempo,
    Jesus desceu do monte, na companhia dos Apóstolos,
    e deteve-Se num sítio plano,
    com numerosos discípulos e uma grande multidão
    de toda a Judeia, de Jerusalém e do litoral de Tiro e Sidónia.
    Erguendo então os olhos para os discípulos, disse:
    Bem-aventurados vós, os pobres,
    porque é vosso o reino de Deus.
    Bem-aventurados vós, que agora tendes fome,
    porque sereis saciados.
    Bem-aventurados vós, que agora chorais,
    porque haveis de rir.
    Bem-aventurados sereis, quando os homens vos odiarem,
    quando vos rejeitarem e insultarem
    e prescreverem o vosso nome como infame,
    por causa do Filho do homem.
    Alegrai-vos e exultai nesse dia,
    porque é grande no Céu a vossa recompensa.
    Era assim que os seus antepassados tratavam os profetas.
    Mas ai de vós, os ricos,
    porque já recebestes a vossa consolação.
    Ai de vós, que agora estais saciados,
    porque haveis de ter fome.
    Ai de vós, que rides agora,
    porque haveis de entristecer-vos e chorar.
    Ai de vós, quando todos os homens vos elogiarem.
    Era assim que os seus antepassados
    tratavam os falsos profetas.

    AMBIENTE

    Para entendermos todo o alcance e significado deste texto, devemos recordar que ele está situado na primeira parte do Evangelho de Lucas (“atividade de Jesus na Galileia”, Lc 4, 14 – 9, 50). Nesta primeira parte do Evangelho, Lucas procura apresentar um primeiro anúncio sobre Jesus (“kerigma”) e definir o programa libertador que o Messias vai cumprir em favor dos oprimidos. Aliás, toda a primeira parte do terceiro Evangelho é dominada pelo episódio da sinagoga de Nazaré, onde Jesus enuncia o seu programa: “o Espírito do Senhor está sobre Mim porque Me ungiu, para anunciar a Boa Nova aos pobres; enviou-Me a proclamar a libertação aos cativos…” (Lc 4, 18-19).
    As bem-aventuranças de Lucas inserem-se em todo este ambiente: a libertação chegou com Jesus e dirige-se aos pobres e aos débeis. Numa planície (Mateus situa o discurso das bem-aventuranças numa montanha), rodeado dos discípulos e por uma multidão “que acorrera para O ouvir e ser curada dos seus males” (Lc 6, 18), Jesus pronuncia o discurso que o Evangelho de hoje nos propõe.

    MENSAGEM

    Lucas inicia este “discurso da planície” com quatro bem-aventuranças (que equivalem às nove de Mateus). Os destinatários destas bem-aventuranças são os pobres, os que têm fome, os que choram, os que são perseguidos. A palavra grega usada por Lucas para “pobres” (ptôchos) traduz certos termos hebraicos (‘anawim, dallim, ebionim) que, no Antigo Testamento, definem uma classe de pessoas privadas de bens e à mercê da prepotência e da violência dos ricos e dos poderosos. São os desprotegidos, os explorados, os pequenos e sem voz, as vítimas da injustiça, que com frequência são privados dos seus direitos e da sua dignidade pela arbitrariedade dos poderosos. Por isso, eles têm fome, choram, são perseguidos. Ora, serão eles, precisamente, os primeiros destinatários da salvação de Deus. Porquê? Porque a proposta libertadora de Deus é para uma classe social, em exclusivo? Não. Mas porque eles estão numa situação intolerável de debilidade e Deus, na sua bondade, quer derramar sobre eles a sua bondade, a sua misericórdia, a sua salvação. Depois, a salvação de Deus dirige-se prioritariamente a estes porque eles, na sua simplicidade, humildade, disponibilidade e despojamento, estão mais abertos para acolher a proposta que Deus lhes faz em Jesus.
    As bem-aventuranças manifestam, numa outra linguagem, o que Jesus já havia dito no início da sua atividade na sinagoga de Nazaré: Ele é enviado pelo Pai ao mundo, com a missão de libertar os oprimidos. Aos pequenos, aos privados de direitos e de dignidade, aos simples e humildes, Jesus diz que Deus os ama de uma forma especial e que quer oferecer-lhes a vida e a liberdade plenas. Por isso eles são “bem-aventurados”.
    As “maldições” (ou os quatro “ais”) aos ricos que preenchem a segunda parte do Evangelho de hoje são o reverso da medalha. Denunciam a lógica dos opressores, dos instalados, dos poderosos, dos que pisam os outros, dos que têm o coração cheio de orgulho e de autossuficiência e não estão disponíveis para acolher a novidade revolucionária do “Reino”. As advertências aos ricos não significam que Deus não tenha para eles a mesma proposta de salvação que apresenta aos pobres e débeis; mas significam que, se eles persistirem numa lógica de egoísmo, de prepotência, de injustiça, de autossuficiência, não têm lugar nesse “Reino” que Jesus veio propor.

    ATUALIZAÇÃO

    Refletir sobre as seguintes questões:

    • A proposta de Jesus apresenta uma nova compreensão da existência, bem distinta da que predomina no nosso mundo. A lógica do mundo proclama “felizes” os que têm dinheiro, mesmo quando esse dinheiro resulta da exploração dos mais pobres, os que têm poder, mesmo que esse poder seja exercido com prepotência e arbitrariedade, os que têm influência, mesmo quando essa influência é obtida à custa da corrupção e dos meios ilícitos. Mas a lógica de Deus exalta os pobres, os desfavorecidos, os débeis: é a esses que Deus Se dirige com uma proposta libertadora e a quem convida a fazer parte da sua família. O anúncio libertador que Jesus traz é, portanto, uma Boa Nova que enche de alegria os corações amargurados, os marginalizados, os oprimidos. Com o “Reino” que Jesus propõe aos homens, anuncia-se um mundo novo, um mundo de irmãos, de onde a prepotência, o egoísmo, a exploração e a miséria serão definitivamente banidos e onde os pobres e marginalizados terão lugar como filhos iguais e amados de Deus.

    • Vinte e um séculos depois do nascimento de Jesus, que é feito da sua proposta? Ela mudou alguma coisa no nosso mundo? Às vezes, contemplando o mundo que nos rodeia, somos tentados a crer que a proposta de Jesus falhou; mas talvez seja mais correto colocar a questão nestes termos: nós, testemunhas de Jesus, teremos conseguido passar aos pobres e aos marginalizados esse projeto libertador? Teremos, com suficiente convicção e radicalidade, testemunhado esse projeto, de forma que ele tivesse um impacto real na história dos homens?

    ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 6.º DOMINGO DO TEMPO COMUM
    (algumas adaptadas de “Signes d’aujourd’hui”)

    1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
    Ao longo dos dias da semana anterior ao 6.º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

    2. PÔR EM DESTAQUE O EVANGELIÁRIO E CONCRETIZAR A ORAÇÃO UNIVERSAL.
    Neste domingo em que começa a leitura do “sermão na planície”, pode-se valorizar o Evangeliário, levando-o à frente da procissão no início da celebração ou colocando-o no centro do altar, e rodeando-o com quatro velas ou lamparinas (em referência às quatro bem-aventuranças de Lucas). As “atividades caritativas” são iniciativas que pretendem levar a felicidade aos deserdados e aos marginalizados. Fazer um inventário das atividades caritativas na comunidade pode levar, neste domingo, a que a oração universal esteja mais enraizada nas realidades do terreno.

    3. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
    Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.

    No final da primeira leitura:
    “Senhor, Tu és a nossa esperança, em Ti pomos a nossa confiança, bendito sejas. O teu Espírito é como a água que torna verdejante a erva e faz crescer a árvore, ele nos irriga com a tua vida e nos faz produzir os frutos que Tu esperas.
    Nós Te confiamos os nossos irmãos e irmãs cuja fé secou. Não permitas que os nossos corações se afastem de Ti”.

    No final da segunda leitura:
    “Deus de vida, nós proclamamos que Jesus Cristo, teu Filho, ressuscitou de entre os mortos, para ser entre os mortos o primeiro ressuscitado; nós Te damos graças pela firme esperança que nos dás, de ressuscitar contigo.
    Nós Te confiamos todos os nossos irmãos que duvidam da vida e ignoram ainda a luz da ressurreição em Jesus”.

    No final do Evangelho:
    “Pai dos pobres, Deus de misericórdia, bendito sejas pela esperança que revelas aos pobres, aos pequenos e a todos os feridos da vida, aqueles que a sociedade despreza e negligencia. Tu ofereces-lhes a felicidade do teu Reino.
    Tantos companheiros à nossa volta andam à procura da felicidade e não sabemos como os ajudar. Ilumina-os com o teu Espírito”.

    4. BILHETE DE EVANGELHO.
    A felicidade de que fala Jesus está inscrita nos rostos dos seus discípulos. É, de facto, olhando-os que Ele os declara “felizes”. Duas bem-aventuranças estão no presente. Os discípulos são já felizes, porque são pobres: deixaram tudo, barco, família, para inaugurar com Jesus o seu Reino e pregar a sua carta. São felizes porque são já cidadãos deste Reino. São já felizes porque são como o seu Mestre, rejeitados, insultados. O seu discurso incomoda, porque convida a uma mudança, a um regresso a Deus: amar é já sair de si mesmo.

    5. À ESCUTA DA PALAVRA.
    Há diferenças entre as bem-aventuranças na versão de Mateus e na de Lucas. Indiciam duas tradições. Mateus apresenta nove bem-aventuranças, Lucas somente quatro. Mateus diz que Jesus subiu a montanha… Lucas diz que Ele desceu da montanha… Uma contradição apenas aparente. Dois relatos complementares. Para escutar as bem-aventuranças em Mateus, é preciso subir à montanha, elevar-se, subir para Deus. Isso sugere que, para viver segundo o espírito do Evangelho, não nos podemos fechar nos estreitos limites da terra. É preciso subir, respirar um ar mais puro, mais transparente. Isso exige, certamente, um esforço, pois trata-se de deixar o Espírito soprar em nós o ar de Deus. É preciso esforço, como para subir uma montanha, é preciso treino, paciência e também silêncio, atenção interior. Mas isso não significa que devemos desinteressar-nos desta vida muito concreta, da vida ordinária de todos os dias. O Evangelho não é uma droga que nos faria ver um mundo desencarnado. Jesus quer encontrar-nos na planície das nossas vidas muito reais, como está expresso nas situações das bem-aventuranças. Por seu lado, os ricos são infelizes porque, no fundo, se esquecem de sair de si mesmos, de subir à montanha para respirar o ar de Deus.

    6. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
    Pode-se escolher a Oração Eucarística III para a Assembleia com Crianças, pelas várias expressões relacionadas com a liturgia da Palavra.

    7. PALAVRA PARA O CAMINHO…
    Levar para as nossas vidas as palavras de felicidade escutadas neste domingo e transformá-las em atitudes de alegria e de encontro com os outros, transmitindo felicidade àqueles que vivem infelizes ao nosso lado… Fazer com que a vida da próxima semana tenha muitos momentos de alegria e de felicidade… que só o serão se partilhados e sentidos com o próximo, a começar pelos que estão na minha casa, no meu trabalho, na minha escola, na minha comunidade, na minha paróquia…

    UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
    PROPOSTA PARA
    ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
    Grupo Dinamizador:
    P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
    Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
    Rua Cidade de Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
    Tel. 218540900 – Fax: 218540909
    portugal@dehonianos.org – www.dehonianos.org

  • S. Cirilo, Monge e S. Metódio, Bispo, Padroeiros da Europa

    S. Cirilo, Monge e S. Metódio, Bispo, Padroeiros da Europa


    14 de Fevereiro, 2022

    Os Santos Cirilo e Metódio nasceram em Salónica, na primeira metade do século IX. Bizantinos de formação, tornaram-se apóstolos dos povos eslavos, na Morávia, atuais repúblicas Checa e Eslovaca, e na Panónia, atual Croácia. Para eles, traduziram A Bíblia e os livros litúrgicos para a língua paleoeslava, e reuniram discípulos. As suas iniciativas missionárias foram aprovadas pelo Papa Adriano II. Entretanto, Cirilo adoeceu, acabando por morrer na cidade, e sendo sepultado na igreja de S. Clemente. Metódio, ordenado bispo, regressou à Morávia, falecendo aí no ano de 885. Os seus discípulos, expulsos do país, refugiaram-se na Bulgária. Daí a liturgia e a literatura eslava passaram para o reino de Kiev, na Rússia e para todos os países eslavos de rito bizantino.

    Lectio

    Primeira leitura: Atos 13, 46-49

    Naqueles dias, Paulo e Barnabé disseram aos judeus: «Era primeiramente a vós que a palavra de Deus devia ser anunciada. Visto que a repelis e vós próprios vos julgais indignos da vida eterna, voltamo-nos para os pagãos,47pois assim nos ordenou o Senhor: Estabeleci-te como luz dos povos, para levares a salvação até aos confins da Terra.»48Ao ouvirem isto, os pagãos encheram-se de alegria e glorificavam a palavra do Senhor; e todos os que estavam destinados à vida eterna abraçaram a fé.49Assim, a palavra do Senhor divulgava-se por toda aquela região.

    Os pagãos escutaram com interesse e entusiasmo Paulo e Barnabé, o que suscitou a inveja e os ciúmes dos Judeus contra os missionários, que são insultados e rejeitados. E dá-se a separação entre o Evangelho e o Judaismo. Os Judeus eram os primeiros destinatários da Boa Nova. Uma vez que a rejeitaram, ela é oferecida aos pagãos, que a aceitam. Nesse contexto, Barnabé e Paulo declaram que vão passar a dirigir-se aos pagãos, baseando a sua dercisão, não só na rejeição dos Judeus, mas também nas palavras da Escritura que falam da luz das nações (Is 49, 6). Quem acolher o Evangelho e abraçar a fé torna-se herdeiro das promessas, seja judeu ou pagão. Fica destinado à "vida eterna" (v. 48).

    Evangelho: Lucas 10, 1-9

    Naquele tempo, o Senhor designou outros setenta e dois discípulos e enviou-os dois a dois, à sua frente, a todas as cidades e lugares aonde Ele havia de ir. 2Disse-lhes:«A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos. Rogai, portanto, ao dono da messe que mande trabalhadores para a sua messe.3Ide! Envio-vos como cordeiros para o meio de lobos. 4Não leveis bolsa, nem alforge, nem sandálias; e não vos detenhais a saudar ninguém pelo caminho.5Em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: 'A paz esteja nesta casa!' 6E, se lá houver um homem de paz, sobre ele repousará a vossa paz; se não, voltará para vós. 7Ficai nessa casa, comendo e bebendo do que lá houver, pois o trabalhador merece o seu salário. Não andeis de casa em casa.8Em qualquer cidade em que entrardes e vos receberem, comei do que vos for servido, 9curai os doentes que nela houver e dizei-lhes: 'O Reino de Deus já está próximo de vós.'

    Além dos Apóstolos, fundamento da missão da Igreja, Jesus escolheu outros setenta e dois discípulos e enviou-os a pregar a Boa Nova. Ao longo dos séculos escolheu muitos outros. Foi o caso de Cirilo e Metódio, enviados a missionar os povos eslavos. Quem acolhe o Reino, sente a necessidade de o anunciar. Por isso, a missão é tarefa de todos os batizados. Isso, todavia, não impede que alguns sejam particularmente destinados a pregar que Deus salva, isto é, que o seu "Reino está no meio de nós". O reino vem como "paz". Por isso, é dever dos missionários invocar a paz de Deus sobre as casas e cidades onde vão. A palavra de Jesus assegura ao missionário a possibilidade da sua mensagem ser ouvida. Mas, quando surgem perseguições, os missionários não têm outro caminho senão o de Jesus, isto é, o que leva à morte, como supremo testemunho do Evangelho.

    Meditatio

    S. Cirilo e S. Metódio sentiram a urgência de levar a salvação para fora das fronteiras do mundo helénico, tal como Paulo e Barnabé tinham sentido a necessidade de levar a Boa Nova para fora das fronteiras do mundo judaico. Isaías falava de Boa Nova e de um movimento centrípto de todos os povos em direção a Jerusalém. No evangelho o movimento é inverso. Jesus envia os discípulos para todo o mundo: "Ide pelo mundo inteiro, proclamai o Evangelho a toda a criatura... Eles, partindo, foram pregar por toda a parte." (Mc 16, 15.20). São duas dinâmicas diferentes: Isaías pensa em Jerusalém como centro do mundo, para onde devem acorrer todos os povos, e subir ao monte do Senhor, que a todos atrai. No Novo Testamento, o centro do mundo já não é Jerusalém, mas o corpo de Cristo ressuscitado, misteriosamente presente onde estão os seus discípulos. É aí que encontram a unidade todos os que acreditam em Jesus.
    S. Cirilo e S. Metódio partiram para meio dos eslavos, apesar das dificuldades das viagens e, sobretudo, do problema que era evangelizar povos que não pertenciam à cultura grega e latina. Estes santos foram verdadeiramente pioneiros naquilo que hoje se chama a "inculturação", isto é, em traduzir a fé para a cultura dos povos a evangelizar, sem querer impôr a própria cultura. Traduziram a Bíblia e os textos litúrgicos para eslavo. Esse atrevimento valeu-lhes ser denunciados em Roma pelos missionários latinos. Tiveram que rumar à cidade eterna, e explicar-se às autoridades. Felizmente foram compreendidos pelo Papa Adriano II, que aprovou o seu método missionário.
    Hoje, é questão pacífica que, uma coisa é a fé e outra a cultura, que são realidades separáveis, que a fé deve radicar nas diversas culturas como fermento que as impregna de Evangelho. Mas o mesmo se deve pensar em relação à diferentes gerações: em cada geração a fé deve ser expressa de modo novo. A fé, com efeito, é um fermento de vida que tem de crescer e encontrar novas formas de progresso. Temos de aprender a ir ao encontro dos outros, e não obrigá-los a uniformizar-se com os nosso costumes, ou àquilo que pensamos ser melhor. Há que ir aos outros como Jesus veio até nós, isto é, fazendo-se homem e aceitando tudo o que é humano para se fazer entender por nós, e poder introduzir-nos na sua intimidade.
    O P. Dehon recebeu "a graça e a missão de enriquecer a Igreja com um Instituto religioso apostólico que vivesse da sua inspiração evangélica" (Cst 1). A mística oblativa-reparadora, inspirada pela contemplação do Coração trespassado de Cristo, levou-o a viver uma espiritualidade profundamente sacerdotal e eucarística, e a empenhar-se num apostolado característico onde a atividade missionária tem um lugar importante. Essa atividade tem de ser devidamente insculturada entre os povos, "para que a comunidade humana, santificada pelo Espírito, se torne uma oblação agradável a Deus" (Cst 30. 31).

    Oratio

    Resplandeça sobre nós, Senhor, a luz incorrutível da tua sabedoria. Abre-nos os olhos da mente, para podermos entender os teus preceitos evangélicos. Que, desprezados os desejos carnais, possamos levar uma vida verdadeiramente espiritual, pensando e fazendo o que é do teu agrado. Nós to pedimos por intercessão dos Santos Cirilo e Metódio. Ámen.

    Contemplatio

    Jesus percorria as cidades e as vilas da Galileia, anunciando a boa nova e curando os doentes; mas não podia acorrer tudo sozinho e ao ver todo este povo sofrendo e abatido, foi tomado de compaixão, e disse aos discípulos: «A messe é grande, peçamos ao divino Mestre para lhe enviar operários», depois chamou os seus doze apóstolos e enviou-os dois a dois para pregarem com o poder de expulsarem os demónios e de curarem os doentes... Nosso Senhor indica aos apóstolos três condições requeridas para o sucesso da sua missão. A primeira é o espírito de desinteresse. «Recebestes gratuitamente, dai gratuitamente». Que os vossos ouvintes vejam que não é por ganho, mas pela salvação das almas e pela felicidade dos homens que trabalhais. A segunda é o desapego das coisas da terra e o amor da santa pobreza: «Não leveis convosco nem ouro nem provisões». A terceira é a mais inteira confiança nos cuidados e na proteção da divina Providência: «O trabalhador tem direito ao seu alimento». Estas condições são ainda hoje as do sucesso. (L. Dehon, OSP 4, p. 267s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
    "Rogai ao dono da messe
    que mande trabalhadores para a sua messe" (Lc 10, 2).

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    S. Cirilo, Monge e S. Metódio, Bispo, Padroeiros da Europa (14 Fevereiro)

  • S. Cláudio de La Colombière

    S. Cláudio de La Colombière


    15 de Fevereiro, 2022

    S. Cláudio de La Colombière nasceu em Saint-Symphorien d´Ozon, França, no ano de 1641. Em 1659 ingressou na Companhia de Jesus. Ordenado sacerdote em 1669, ensinou retórica e dedicou-se ao ministério da pregação. Prestou auxílio eficaz a S. Margarida Maria Alacoque na difusão do culto ao Sagrado Coração de Jesus. Enviado para Londres, como pregador da Condessa de York, sofreu calúnias, o cárcere e o exílio. Morreu em 1682, na cidade de Paray, em França, onde se pode venerar o seu túmulo. Foi canonizado por João Paulo II, em 1992.

    Lectio

    Primeira leitura: Efésios 3, 8-9.14-19.

    A mim, o menor de todos os santos, foi dada a graça de anunciar aos gentios a insondável riqueza de Cristo 9e a todos iluminar sobre a realização do mistério escondido desde séculos em Deus, o criador de todas as coisas. 14É por isso que eu dobro os joelhos diante do Pai,15do qual recebe o nome toda a família, nos céus e na terra: 16que Ele vos conceda, de acordo com a riqueza da sua glória, que sejais cheios de força, pelo seu Espírito, para que se robusteça em vós o homem interior; 17que Cristo, pela fé, habite nos vossos corações; que estejais enraizados e alicerçados no amor, 18para terdes a capacidade de apreender, com todos os santos, qual a largura, o comprimento, a altura e a profundidade... 19a capacidade de conhecer o amor de Cristo, que ultrapassa todo o conhecimento, para que sejais repletos, até receberdes toda a plenitude de Deus.

    Paulo, o antigo fariseu, "hebreu descendente de hebreus, circuncidado ao oitavo dia, da raça de Israel" (Fl 3, 5) reconhece que a graça que lhe foi concedida foi precisamente a de fazer tábua rasa do nacionalismo judaico e dirigir-se abertamente aos gentios. Este anúncio, segundo o próprio Paulo, é um mistério, algo que estava escondido nos recônditos da transcendência e que unicamente se descobre por meio de uma gratuita revelação de Deus. Nas gerações passadas não foi dado a conhecer aos filhos dos homens, como agora foi revelado pelo Espírito aos seus santos apóstolos e profetas. Paulo considera-se o último desses santos, porque a sua integração no grupo dos responsáveis foi tardia. Mas foi-lhe "concedida a graça de anunciar aos gentios a insondável riqueza de Cristo".
    A Igreja utiliza este testo na memória de S. Cláudio de La Colombière, que recebeu a graça de conhecer e divulgar as revelações do Coração de Jesus feitas a S. Margarida Maria.

    Evangelho: Mateus, 11, 25-30

    Naquele tempo, Jesus tomou a palavra e disse: «Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos entendidos e as revelaste aos pequeninos.26Sim, ó Pai, porque isso foi do teu agrado. 27Tudo me foi entregue por meu Pai; e ninguém conhece o Filho senão o Pai, como ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar.» 28«Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, que Eu hei-de aliviar-vos. 29Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito. 30Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve.»

    Nesta perícopa encontramos descrito o mistério da filiação de Jesus, Filho de Deus, da sua relação com o Pai, com a terminologia e profundidade peculiares do Quarto Evangelho. Até se diz que esta perícopa teria pertencido inicialmente ao evangelho segundo S. João. Ela consta de três pares: a) a ação de graças ao Pai pela revelação recebida; b) o conteúdo dessa revelação; o convite e chamamento. Os escribas e fariseus recusaram a revelação. O mistério do Reino não é acessível a toda a espécie de sabedoria humana. Só aqueles que se apresentam diante de Deus conscientes da sua pequenez, a podem receber. Jesus é o único revelador do Pai, a plenitude da revelação. Os que acolhem a revelação são chamados a tornar-se discípulos submissos e obedientes, tomando sobre si o "jugo" do Senhor, um jugo suave porque motivado e carregado por amor.

    Meditatio

    Cláudio de la Colombière, nascido em 1641 em S. Sinfrónio, perto de Lião, foi enviado pelo seu provincial a Paray em 1675 para ser superior da casa que os Jesuítas tinham nessa cidade. Aí conheceu a S. Margarida Maria, tornando-se seu confessor. Era precisamente o momento da grande revelação do Sagrado Coração, que data de 16 de Junho de 1675. Depois de um exame atento e prudente, o P. Cláudio de la Colombière julgou esta revelação autêntica. Adotou a devoção ao Sagrado Coração e tornou-se o seu propagador mais zeloso, depois de ter confirmado Margarida Maria e a sua superiora a Madre de Saumaise. No ano seguinte, teve de partir para Inglaterra, onde inspirou esta bela devoção em muitas almas. Banido da Inglaterra e já doente, passou por Paray, indo para Lião; aí reviu Margarida Maria, confirmou-a, fortaleceu-a; confirmou igualmente a Madre Greyfié, que tinha sucedido a Madre de Saumaise. Deus quis que viesse morrer a Paray, e que pudesse ver ainda e encorajar Margarida Maria. A sua morte aconteceu no dia 15 de Fevereiro de 1682. O próprio Nosso Senhor fez saber a Margarida Maria que tinha escolhido o P. de la Colombière para a secundar na sua missão.
    Oh! Como importa ter um bom diretor! E preciso pedi-lo a Deus e escolhê-lo com cuidado. A nossa santificação e a nossa salvação estão fortemente interessadas nisso.
    O Padre de la Colombière consagrou-se, ele mesmo, ao Sagrado Coração na sexta-feira 21 de Junho de 1675; era o dia seguinte à oitava do Corpo de Deus, o dia designado por Nosso Senhor para a futura festa. Começou desde então a inspirar esta devoção em todas as suas filhas espirituais em Paray. Chamado a Londres no ano seguinte, como pregador da duquesa de York, deu a conhecer e a amar o Sagrado Coração, a começar pela própria duquesa, que interveio mais tarde com outros príncipes e princesas junto do Papa Inocêncio XII, para o estabelecimento da nova devoção. Ele mesmo fala disso em alguns dos seus sermões da Quaresma. Regressado a França, continuou o seu apostolado, de uma maneira muito persuasiva, nas suas cartas de direção. Pedia aos superiores para a estabelecerem nas suas comunidades. Exercia o mesmo apostolado junto dos jovens religiosos de quem tinha, em Lião, a direção espiritual. É a ele que o Padre de Gallifet faz remontar a sua própria devoção ao Sagrado Coração. Mas seria sobretudo depois da sua morte que o Padre iria cumprir a sua missão. Partiu para o céu no dia 15 de Fevereiro de 1682. Dois anos depois, eram publicados os seus sermões em quatro volumes, e, num volume à parte, o diário dos seus retiros espirituais. Aí lia-se isto: "Reconheci que Deus queria que eu o servisse procurando o cumprimento dos seus desígnios no tocante à devoção que sugeriu a uma pessoa à qual se comunica de modo muito confidencial, e para a qual quis servir-se da minha fraqueza. Depois fazia o relato da grande aparição de 16 de Junho de 1675. Este escrito foi muito lido, porque o seu autor gozava de grande fama de santidade. Anexado ao diário dos retiros estava um belo ato de oferenda ou de oblação ao Sagrado Coração que também teve a sua parte no desenvolvimento da devoção. E eu, o que é que fiz até ao presente para propagar esta bela devoção segundo o desejo de Nosso Senhor? ". (Leão Dehon, OSP 3, p. 171s.).

    Oratio

    Senhor, que farei, senão unir-me à oblação do Padre de la Colombière e fazê-la também? Sim, Senhor, dou-me e consagro-me ao vosso divino Coração. Ofereço-vos tudo aquilo de que posso dispor, e proponho unir-me a vós frequentemente durante o dia (Leão Dehon, OSP 3, p. 173).

    Contemplatio

    O belo ato do Padre de la Colombière caracteriza admiravelmente a devoção ao Coração de Jesus. Começa por dizer qual o seu fim: «Esta oferenda, diz, faz-se para honrar este divino Coração, a sede de todas as virtudes, a fonte de todas as bênçãos e o retiro de todas as almas santas». «Por todas as suas bondades, diz, este divino Coração não encontra no coração dos homens senão dúvida, esquecimento, desprezo, ingratidão». O santo religioso formula então a sua oferenda: «Para reparação de tantos ultrajes e de tão cruéis ingratidões, ó muito adorável Coração do meu amável Jesus, e para evitar cair numa semelhante infelicidade, ofereço-vos o meu coração com todos os movimentos de que é capaz, e dou-me inteiramente a vós... Ofereço ao vosso divino Coração todo o mérito, toda a satisfação de todas as minhas missas, de todas as orações, de todos os atos de mortificação, de todas as práticas religiosas, de todos os atos de zelo, de humildade, de obediência e de todas as outras virtudes que praticar até ao último momento da minha vida. Não só tudo isto será para honrar o Coração de Jesus, mas ainda lhe peço que aceite a doação inteira que lhe faço, de dela dispor do modo que lhe agradar e em favor de quem lhe agradar». Este belo ato contribuiu muito para determinar e para propagar a verdadeira devoção ao Sagrado Coração. (Leão Dehon, OSP 3, p. 142s.).

    Actio

    Repete muitas vezes e vive hoje a Palavra do Senhor:
    «Aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração» (Mt 25, 30).

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    S. Cláudio de La Colombière (15 Fevereiro)

  • VI Semana – Quarta-feira – Tempo Comum – Anos Pares

    VI Semana – Quarta-feira – Tempo Comum – Anos Pares


    16 de Fevereiro, 2022

    Tempo Comum – Anos Pares

    VI Semana – Quarta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Tiago 1, 19-27

    Caríssimos irmãos: 19cada um seja pronto para ouvir, lento para falar e lento para se irar, 20pois uma pessoa irada não faz o que é justo aos olhos de Deus. 21Rejeitai, pois, toda a imundície e todo o vestígio de malícia e recebei com mansidão a Palavra em vós semeada, a qual pode salvar as vossas almas. 22Mas tendes de a pôr em prática e não apenas ouvi-la, enganando-vos a vós mesmos. 23Porque, quem se contenta com ouvir a palavra, sem a pôr em prática, assemelha-se a alguém que contempla a sua fisionomia num espelho; 24mal acaba de se contemplar, sai dali e esquece-se de como era. 25Aquele, porém, que medita com atenção a lei perfeita, a lei da liberdade, e nela persevera – não como quem a ouve e logo se esquece, mas como quem a cumpre – esse encontrará a felicidade ao pô-la em prática. 26Se alguém se considera uma pessoa piedosa, mas não refreia a sua língua, enganando assim o seu coração, a sua religião é vazia. 27A religião pura e sem mácula diante daquele que é Deus e Pai é esta: visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações e não se deixar contaminar pelo mundo.

    Para receber eficazmente a Palavra de Deus, ou outro qualquer dom, é precisa disposição recta, com capacidade de escuta, autocontrolo da língua e dos impulsos do coração, que levam ao exibicionismo, ao aborrecimento ou à indignação. É preciso cultivar a moderação. A ira do homem não realiza a justiça de Deus, isto é, o que Lhe agrada, o que Ele aprova. O que salva é o acolhimento dócil da Palavra, isto é, do Evangelho semeado no coração dos crentes pela pregação. Essa palavra, para ser eficaz, deve ser permanentemente actualizada e aplicada às situações e relações concretas da vida. A fé deve levar à acção e caracterizá-la. Se assim não for, torna-se inútil. De nada serve mirar-se ao espelho, se não se limparem as manchas observadas no rosto por meio dele. Do mesmo modo, a Palavra torna-se inútil se não se traduzir em acção.
    A observância da lei cristã é caminho de felicidade, porque é a lei perfeita que gera a liberdade, e não jugula o homem. Mais ainda: a observância da lei manifesta-se na beneficência e na benevolência para com os necessitados e no esforço para levar uma vida pura neste mundo contaminado e secularizado.

    Evangelho: Marcos 8, 22-26

    Naquele tempo, 22Jesus e os seus discípulos chegaram a Betsaida e trouxeram-lhe um cego, pedindo-lhe que o tocasse. 23Jesus tomou-o pela mão e conduziu-o para fora da aldeia. Deitou-lhe saliva nos olhos, impôs-lhe as mãos e perguntou: «Vês alguma coisa?» 24Ele ergueu os olhos e respondeu: «Vejo os homens; vejo-os como árvores a andar.» 25Em seguida, Jesus impôs-lhe outra vez as mãos sobre os olhos e ele viu perfeitamente; ficou restabelecido e distinguia tudo com nitidez. 26Jesus mandou-o para casa, dizendo: «Nem sequer entres na aldeia.»

    A cura do cego de Betsaida, propositadamente colocada por Marcos num contexto onde se fala da cegueira dos fariseus e dos discípulos, encerra a «secção dos pães».
    Jesus, mais uma vez, usa a linguagem táctil, não à maneira dos magos, mas para que a pessoa, que recebe o prodígio, esteja consciente do que se passa. O milagre realiza-se em dois tempos: primeiro o cego vê confusamente: «Vejo os homens; vejo-os como árvores a andar» (v. 24); depois, quando a cura está completa, vê claramente: «ficou restabelecido e distinguia tudo com nitidez» (v. 25).
    Jesus não quer atitudes triunfalistas. Por isso, ao despedir o cego curado, recomenda-lhe que não entre na aldeia (v. 26). O verdadeiro crente crê nos milagres, e não por causa dos milagres. Os milagres vêm depois da fé, de tal modo que, se não há fé, ou se ela é fraca, nem sequer acontecem milagres. Além disso, os milagres nunca são enquadrados numa cristologia ou eclesiologia triunfalista. São testemunhos da vinda do Messias que hão-de ser contados de modo discreto por aqueles que os receberam. De qualquer modo, Marcos insiste na «reserva messiânica».
    Os crentes não têm que medir forças com os não-crentes. Por um lado, podem perfeitamente admitir que muitos «prodígios» foram efeitos de simples forças naturais desconhecidas pela razão humana; por outro lado, estão conscientes de que a sua fé não vem dos milagres, mas que os milagres a pressupõem. Mas também têm todo o direito a pressupor que certos acontecimentos são verdadeiros «prodígios», pois crêem na força «sobrenatural» de Deus, embora não a possam demonstrar racionalmente.

    Meditatio

    Tiago dá-nos um conselho muito simples e claro, mas muito prático e útil: «cada um seja pronto para ouvir, lento para falar e lento para se irar». Esta serenidade nas relações com os irmãos, à primeira vista, só parece ter a ver com as boas maneiras naturalmente apreciadas por todos. Mas, quando é uma atitude interior de respeito e aceitação do outro, só pode brotar de um coração pacificado, dum coração que acolheu a Palavra nele semeada. Todavia é fácil iludir-nos, pensando que somos acolhedores e ouvintes fiéis da Palavra. A prova real de que a ouvimos e acolhemos é pô-la em prática. A Palavra acolhida é Palavra que incarna.
    A Palavra de Deus, «que pode salvar as nossas almas» foi semeada em nós, é verdade. Mas continuamos a precisar da graça para ver claramente a «glória do Filho de Deus», para termos uma «religião pura e sem mácula diante daquele que é Deus» (v. 17).
    O milagre de hoje, de certo modo, surpreende-nos. Estamos habituados a ver Jesus curar os doentes com uma só palavra, e não por fases. Hoje, Marcos faz-nos ver Jesus que põe saliva nos olhos do cego, lhe impõe as mãos e lhe pergunta: «Vês alguma coisa?» (v. 23). O homem começa a ver e diz o que vê: «Vejo os homens; vejo-os como árvores a andar» (v. 24). Jesus repete o gesto da imposição das mãos sobre os olhos e «ele viu perfeitamente; ficou restabelecido e distinguia tudo com nitidez» (v. 24).
    Marcos não colocou ao acaso as curas de cegos no seu evangelho. Colocou-os em momentos especiais. O milagre que hoje escutamos vem imediatamente antes do episódio de Cesareia de Filipe, onde Jesus pede aos discípulos que declarem quem ele é. A outra cura de um cego encontra-se no termo do caminho para Jerusalém, antes do grande mistério da Paixão. Jesus quer levar os discípulos a compreender que, para terem a luz, precisam duma intervenção dele. Só quem é tocado por Jesus pode compreender quem ele é. Só uma graça especial de Jesus permite entrar no mist&e
    acute;rio da sua Paixão. Resumindo: os discípulos precisavam de contactar com a humanidade de Jesus. Ele quis servir-se do seu corpo humano para realizar a obra de Deus. Por isso, usa a saliva, impõe as mãos… O cego é curado em fases sucessivas. É também através do contacto sucessivo com Jesus que os discípulos avançam, pouco a pouco, na luz. Para sermos iluminados, precisamos do contacto com Jesus e aceitar que a iluminação aconteça por etapas.
    Como tudo isto é importante para nossa caminhada de fé! Vivemos na era do «digital» e queremos tudo depressa e de uma só vez. Mas não é essa a pedagogia de Deus, como verificamos nas autobiografias dos santos. A serenidade que provém de um coração pacificado, a iluminação interior, exigem repetidos e prolongados contactos com o Senhor. E paciência para aceitar o seu ritmo!
    Se a pusermos em prática a Palavra, com a ajuda do Espírito Santo, experimentaremos uma profunda serenidade interior, seremos criaturas de paz, de alegria, de bondade e de mansidão. E, na comunhão, mesmo para além dos conflitos, e no perdão recíproco, mostraremos que a fraternidade por que os homens anseiam é possível em Jesus Cristo e dela queremos ser fiéis servidores (cf. Cst 65).

    Oratio

    Senhor Jesus, dá-me a graça de escutar a Palavra e de a pôr em prática, fixando o olhar na lei perfeita, na lei da liberdade, permanecendo-lhe fiel e deixando que ela mude em mim o que encontrar disforme. Sei que a luz é um dom teu, e que também é dom teu colaborar com a graça que nos impele a mudar. Que eu descubra, ao espelho da tua Palavra, as minhas más inclinações naturais, os meus desejos e impulsos, mas também os saiba corrigir e rectificar para me abrir aos teus. Numa palavra: que eu saiba servir-me do espelho, que é a tua Palavra, com humildade, com sinceridade, com grande confiança, porque ela é a lei da liberdade, que nos dás por amor, a fim de podermos crescer. Amen.

    Contemplatio

    Devemos receber cada inspiração como uma palavra de Deus, que procede da sua sabedoria, da sua misericórdia, da sua bondade infinita, e que pode operar em nós maravilhosos efeitos, se não lhe pusermos nenhum obstáculo.
    Consideremos o que uma palavra de Deus pôde fazer; ela criou o céu e a terra, tirou todas as coisas do nada tornando-as participantes no ser de Deus, porque não encontrou resistência no nada. Ela operaria em nós algo de mais se não lhe resistíssemos. Tirar-nos-ia do nada moral para a participação sobrenatural da santidade de Deus no estado da graça, e a participação da felicidade de Deus no estado da glória; e por bagatelas, por algumas satisfações do amor-próprio ou dos sentidos, impedimos estes grandes efeitos da palavra de Deus, das suas inspirações e das impressões do seu Espírito. Depois disso, não havemos de confessar que a sabedoria teve razão ao dizer que o número dos loucos é infinito?
    As inspirações de Deus permanecem na superfície da nossa alma, por causa da oposição que encontram em nós; mas penetram docemente nas almas que são possuídas por Deus e enchem-nas desta admirável paz que acompanha sempre o Espírito de Deus (Leão Dehon, OSP3, p. 546).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Recebei com mansidão a Palavra em vós semeada» (Tg 1, 21).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • VI Semana – Quinta-feira – Tempo Comum – Anos Pares

    VI Semana – Quinta-feira – Tempo Comum – Anos Pares


    17 de Fevereiro, 2022

    Tempo Comum – Anos Pares

    VI Semana – Quinta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Tiago 2, 1-9

    1Meus irmãos, não tenteis conciliar a fé em Nosso Senhor Jesus Cristo glorioso com a acepção de pessoas. 2Suponhamos que entra na vossa assembleia um homem com anéis de ouro e bem trajado, e entra também um pobre muito mal vestido, 3e, dirigindo-vos ao que está magnificamente vestido, lhe dizeis: «Senta-te tu aqui, num bom lugar», e dizeis ao pobre: «Tu, fica aí de pé»; ou «Senta-te no chão, abaixo do meu estrado.» 4Não é verdade que, então, fazeis distinções entre vós mesmos e julgais com critérios perversos? 5Ouvi, meus amados irmãos: porventura não escolheu Deus os pobres segundo o mundo para serem ricos na fé e herdeiros do reino que prometeu aos que o amam? 6Mas vós desonrais o pobre. Porventura não são os ricos que vos oprimem e vos arrastam aos tribunais? 7Não são eles os que blasfemam o belo nome que sobre vós foi invocado? 8Se cumpris a lei do Reino, de acordo com a Escritura: Amarás o teu próximo como a ti mesmo, procedeis bem; 9mas, se fazeis acepção de pessoas, cometeis um pecado e a lei condena-vos como transgressores.

    A autenticidade da fé manifesta-se nas obras. Tiago inculca esta verdade com um exemplo muito concreto tirado da vida das comunidades cristãs. Fazer acepção de pessoas é um pecado, porque vai contra a fé abraçada pelos cristãos. Há que lembrar-se de Cristo que se esvaziou e rebaixou a si mesmo (Fl 2, 6ss.). Os discípulos de Cristo não têm qualquer razão para estabelecer distinções entre as pessoas. Se o fizerem estão a agir contra Cristo, tornando-se semelhantes ao juiz sem consciência que se deixa levar por parcialidades e favoritismos ao pronunciar sentenças injustas. Se Deus escolheu os pobres segundo o mundo, a Igreja e os membros que a integram não podem conceder especiais atenções e privilégios aos ricos como faz a sociedade secular. É verdade que o mandamento do amor é universal. Mas uma coisa é amar e outra é prestar honras a alguém por ser rico ou por ocupar determinada posição social. Essas pessoas, por vezes, tornam-se opressoras. Por isso, nada de servilismos. Além do mais, são contra a lei da liberdade que deve regular o comportamento humano.

    Evangelho: Marcos 8, 27-33

    Naquele tempo, 27Jesus partiu com os discípulos para as aldeias de Cesareia de Filipe. No caminho, fez aos discípulos esta pergunta: «Quem dizem os homens que Eu sou?» 28Disseram-lhe: «João Baptista; outros, Elias; e outros, que és um dos profetas.» 29«E vós, quem dizeis que Eu sou?» – perguntou-lhes. Pedro tomou a palavra, e disse: «Tu és o Messias.» 30Ordenou-lhes, então, que não dissessem isto a ninguém.
    31Começou, depois, a ensinar-lhes que o Filho do Homem tinha de sofrer muito e ser rejeitado pelos anciãos, pelos sumos sacerdotes e pelos doutores da Lei, e ser morto e ressuscitar depois de três dias. 32E dizia claramente estas coisas. Pedro, desviando-se com Ele um pouco, começou a repreendê-lo. 33Mas Jesus, voltando-se e olhando para os discípulos, repreendeu Pedro, dizendo-lhe: «Vai-te da minha frente, Satanás, porque os teus pensamentos não são os de Deus, mas os dos homens.»

    O texto que escutamos é central na teologia do segundo evangelho. Aqui se opõe claramente uma cristologia do filho do homem a uma cristologia e a uma eclesiologia triunfalista, inspirada no conceito político-imperialista do Messias. O povo interrogava-se: «Quem é este?». Agora é o próprio Jesus que pergunta aos discípulos o que é que se diz sobre Ele. Em síntese, os discípulos informam que o povo O vê, não só como um profeta, mas como maior dos profetas, o precursor dos tempos messiânicos. Mas Jesus quer ir mais longe, e interpela directamente os discípulos: «E vós, quem dizeis que Eu sou?» (v. 29). Pedro responde em nome da comunidade: «Tu és o Messias» (v. 29). Mas Jesus impõe-lhes novamente o chamado «segredo messiânico» e começa a falar-lhes do mistério da cruz, que está no centro da sua messianidade: Ele é o Servo sofredor que veio carregar sobre si os nossos pecados para nos fazer passar da morte à vida. E quem quiser ser seu discípulo tem de seguir o mesmo caminho da cruz. Pedro parece perceber tudo muito bem, e é o primeiro a reagir ao escândalo da cruz. Mas Jesus chama-o à ordem: «Vai-te da minha frente» (v. 33), isto é, põe-te atrás de Mim se segue-Me.
    Pôr-se atrás de Jesus, e segui-Lo como discípulos, é a posição correcta que havemos de tomar para sermos salvos.

    Meditatio

    Na primeira leitura, Tiago sempre muito realista e concreto, evidencia a incoerência de quem julga os outros segundo os critérios do mundo e não segundo os pensamentos de Deus, que «escolheu os pobres segundo o mundo para serem ricos na fé e herdeiros do reino que prometeu aos que o amam» (v. 5). Quantas vezes, também nós, nos deixamos levar por essas reacções espontâneas!
    O episódio da confissão de Pedro, que hoje escutamos, está no centro do evangelho de Marcos. Até agora, Jesus foi guiando progressivamente os discípulos para se aproximarem do seu mistério. Agora interroga-os sobre a sua identidade: «Quem dizem os homens que Eu sou» (v. 27). Pedro responde em nome do grupo: «Tu és o Messias» (v. 29). O mesmo é dizer: «Tu és Nosso Senhor Jesus Cristo, o «Senhor da glória», como sugere a carta de Tiago. Mateus informa-nos que Jesus declarou Pedro bem-aventurado por causa desta confissão: «feliz, Simão, filho de Jonas, porque não foi a carne nem o sangue que to revelou, mas o meu Pai que está no Céu» (Mt 16, 17).
    Mas não basta dizer: «Senhor, Senhor». Reconhecê-lo como Senhor da nossa vida, quer dizer também acreditar que está vivo e presente nos irmãos. O Filho de Deus, o Dominador do universo por quem tudo foi criado, quis assumir por nosso amor o rosto do Servo sofredor, do Homem das dores, «sem figura nem beleza» (Is 53, 2). E assim nos revelou a nossa incomparável grandeza.
    Também a nós, como a Pedro, pode ser dado intuir, em alguns momentos de graça, o mistério do Deus vivo no seu esplendor. Mas a prova da nossa fé só se realiza quando não nos deixamos vencer – como Pedro – pelo escândalo da cruz. Reconhecer o Senhor Jesus, implica saber que o seu caminho passa inevitavelmente pelo Calvário, e que também nós temos de passar por lá, abraçando a nossa cruz. Ele vai à nossa frente, marcando o caminho com as suas pegadas vermelhas de sangue, até consumar a sua oblação na imolação. Não caminha como alguém que enfrenta de má vontade um destino inevitável, uma fatalidade. Caminha como um homem livre, que vive plenamente o Seu ser de Filho, que faz da vontade e, portanto, do amor do Pai o seu alimento (cf. Jo 4, 34), que livre
    mente realiza, não só a Sua missão de Messias, mas também a de Servo de Javé: «Tenho de receber um baptismo, e que angústias as minhas até que ele se realize» (Lc 12, 50). Jesus refere-se ao Seu baptismo de sangue (cf. Mc 10, 38). Lucas apresenta-nos Jesus que avança «à frente dos outros subindo para Jerusalém» (19, 28), com a mesma decisão com que tinha começado a sua última viagem: «Como estavam a chegar os dias de ser levado deste mundo, Jesus dirigiu-Se resolutamente para Jerusalém» (Lc 9, 51) e tudo isto com a máxima liberdade: «Por isto, o Pai ama-Me, porque dou a Minha vida, para tornar a tomá-la. Ninguém Ma tira; sou Eu que a dou por Mim mesmo» (Jo 10, 17-18).

    Oratio

    Senhor Jesus, livra-me da incoerência de Pedro, para que aceite serenamente os momentos de graça em que nos revelas o teu mistério de modo esplendoroso, mas também aqueles em que nos manifestas os aspectos de sofrimento e de morte desse mesmo mistério. Ninguém, nem o próprio Pai, me dá uma luz melhor que a tua. Como o cego de Betsaida foi curado, pouco a pouco, também Pedro precisou de aceitar por etapas todo o teu mistério. Dá-me a luz do teu Espírito para que, também eu, pouco a pouco, consiga ultrapassar os limites das minhas perspectivas humanas. Amen.

    Contemplatio

    «E vós, diz então Nosso Senhor, vós que sois meus discípulos, que viveis comigo, que sois as testemunhas diárias dos meus milagres e do cumprimento das profecias, estais ainda cegos como este povo? Estais suficientemente esclarecidos para que vos faça os pregadores do meu Evangelho? Numa palavra, «quem dizeis que Eu sou?».
    Simão Pedro, antecipando-se a todos os outros pelo ardor da sua fé, apressou-se a responder: «Senhor, vós sois o Cristo, vós sois o Filho de Deus; sois o Messias libertador prometido pelos profetas, sois mais do que o Filho do homem, sois o Filho do Deus vivo, o Filho único do Pai eterno».
    Nosso Senhor apressa-se a louvar esta confissão de fé tão cordial: «És feliz, diz, Simão filho de João, porque não foi nem a carne nem o sangue que te revelaram estes profundos mistérios», tu os compreendeste graças a uma luz superior; foi o meu Pai que está nos céus quem te revelou o que a razão humana, entregue às suas próprias forças, nunca teria compreendido.
    Pedro falou aqui por todos os apóstolos e em nome de todos, e assim será em todos os séculos. Terá merecido esta graça pela simplicidade da sua fé, pela docilidade da sua alma. Que lição para nós, que temos uma fé tão fraca e tão adormecida! (Leão Dehon, OSP4, p. 291s.)

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Tu és o Messias» (Mc 8, 29).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • VI Semana – Sexta-feira – Tempo Comum – Anos Pares

    VI Semana – Sexta-feira – Tempo Comum – Anos Pares


    18 de Fevereiro, 2022

    Tempo Comum – Anos Pares

    VI Semana – Sexta-feira

    Lectio

    Primeira leitura: Tiago 2, 14-24.26

    14Meus irmãos, de que aproveita, irmãos, que alguém diga que tem fé, se não tiver obras de fé? Acaso essa fé poderá salvá-lo? 15Se um irmão ou uma irmã estiverem nus e precisarem de alimento quotidiano, 16e um de vós lhes disser: «Ide em paz, tratai de vos aquecer e de matar a fome», mas não lhes dais o que é necessário ao corpo, de que lhes aproveitará? 17Assim também a fé: se ela não tiver obras, está completamente morta. 18Mais ainda: poderá alguém alegar sensatamente: «Tu tens a fé, e eu tenho as obras; mostra-me então a tua fé sem obras, que eu, pelas minhas obras, te mostrarei a minha fé. 19Tu crês que há um só Deus? Fazes bem. Também o crêem os demónios, mas enchem-se de terror.» 20Queres tu saber, ó homem insensato, como é que a fé sem obras é estéril? 21Não foi porventura pelas obras que Abraão, nosso pai, foi justificado, quando ofereceu sobre o altar o seu filho Isaac? 22Repara que a fé cooperava com as suas obras e que, pelas obras, a sua fé se tornou perfeita. 23E assim se cumpriu a Escritura que diz: Abraão acreditou em Deus e isso foi-lhe contado como justiça, e foi chamado amigo de Deus. 24Vedes, pois, como o homem fica justificado pelas obras e não somente pela fé. 26Assim como o corpo sem alma está morto, assim também a fé sem obras está morta.

    Tiago continua a sua reflexão sobre a relação fé e obras. A fé sem obras é morta, afirma, parecendo responder a alguém que afirmava o contrário. De facto, no tempo de Tiago havia pessoas que, sob a influência de várias filosofias de origem grega, centravam toda a sua atenção e interesse no «conhecimento de Deus», descuidando absolutamente a moral e as boas obras. Provavelmente também havia quem interpretava mal as afirmações de Paulo sobre a justificação pela fé, sem as obras da lei (cf. Gal 3). Recorrendo à diatribe, Tiago responde a estas questões envolvendo os seus ouvintes. Não é um absurdo despedir os irmãos necessitados sem lhes dar o que precisam? Também a fé sem obras é um absurdo, é um cadáver. A fé e as obras são inseparáveis. Não é suficiente proclamar a fé com palavras. Para ser cristãos, não é suficiente acreditar. Também os demónios acreditam… por conhecimento intelectual. Uma fé unicamente intelectual é «diabólica». O verdadeiro crente, tal como Abraão, confirma nas obras aquilo que conhece. A fé sem obras é morta, é um corpo sem alma.
    Sabemos as controvérsias que este texto suscitou a partir da leitura que dele fez Lutero e que contrapunha o pensamento de Tiago ao de Paulo. Os exegetas actuais vêem nestes textos formulações complementares, que nascem de mentalidades e de posições diferentes. Paulo tinha diante de si judeo-cristãos que procuravam a salvação nas «obras da lei», contrapondo-lhes a salvação realizada por Cristo e acolhida na fé (cf. Rm 4, 2ss. E 3, 28). Tiago sublinha a necessidade de que a fé não permaneça apenas teórica, mas se manifeste de modo activo e em obras. É esta a mensagem que a Palavra hoje nos traz.

    Evangelho: Marcos 8, 34 – 9, 1

    Naquele tempo, 34Jesus, chamando a si a multidão, juntamente com os discípulos, disse-lhes: «Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me. 35Na verdade, quem quiser salvar a sua vida, há-de perdê-la; mas, quem perder a sua vida por causa de mim e do Evangelho, há-de salvá-la. 36Que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder a sua vida? 37Ou que pode o homem dar em troca da sua vida? 38Pois quem se envergonhar de mim e das minhas palavras entre esta geração adúltera e pecadora, também o Filho do Homem se envergonhará dele, quando vier na glória de seu Pai, com os santos anjos.» 1Disse-lhes também: «Em verdade vos digo que alguns dos aqui presentes não experimentarão a morte sem terem visto o Reino de Deus chegar em todo o seu poder.»

    Jesus quer afastar definitivamente a tentação de uma cristologia e de uma eclesiologia «satânicas», isto é, de uma cristologia e de uma eclesiologia que não aceitassem Jesus como filho do homem, que pretendessem «salvar a vida» por outros caminhos que não o da cruz. Por isso, chama, não só os «discípulos», mas também «a multidão» (v. 34). Estando Jesus nas imediações de Cesareia de Filipe, esta multidão era formada sobretudo por pagãos. Parece, pois, que Jesus queria deixar bem claro, para todos, o futuro que os esperava como discípulos. Quem quiser seguir Jesus não pode pretender para si o lugar central, mas há-de cedê-lo a Jesus, dando-Lhe o primado em tudo, também sobre a própria vida. Há que tomar a cruz e, seguindo os passos de Jesus, sair com Ele da cidade, rumo ao suplício. Só ganha a Vida – que é Jesus – quem estiver disposto a renunciar a si mesmo. E para que serve ter tudo, se não se ganha a Vida?
    É agora, durante a nossa vida terrena, «entre esta geração adúltera e pecadora» (v. 37), que somos chamados a dar testemunho de Cristo. Se não nos envergonharmos dele, nem das suas palavras, também Ele não se envergonhará de nós e nos reconhecerá como seus.

    Meditatio

    Na primeira leitura encontramos o célebre texto em que Tiago parece contradizer a Paulo, que afirmava a justificação só pela fé: «De que aproveita, irmãos, que alguém diga que tem fé, se não tiver obras de fé? Acaso essa fé poderá salvá-lo?» (v. 14). Mas a contradição é só aparente. Paulo fala da fé como base da vida divina em nós, da justificação que Cristo nos alcançou ao morrer por nós pecadores e que nos comunica no Baptismo. É um absurdo pensar que nos salvamos pelas nossas obras. É Deus que, pelo seu amor, nos salva, e não as nossas obras. No Evangelho, Jesus exige sempre a fé em quem se dirige a Ele: «Credes que tenho poder para fazer isso?» (Mt 9, 27); «A tua fé te salvou!» (Mc 10, 40). Mas não podemos ficar por aqui. Tiago, tal como Paulo, afirma noutro lugar que a base é a fé, uma fé que transforma a vida; Paulo, por sua vez, também fala de obras, as obras de quem é dócil ao Senhor, da fé que actua na caridade. E apresenta-se, ele mesmo, como exemplo de uma fé operante: «São ministros de Cristo? – Falo a delirar – eu ainda mais: muito mais pelos trabalhos, muito mais pelas prisões, imensamente mais pelos açoites, muitas vezes em perigo de morte… Viagens a pé sem conta… trabalhos e duras fadigas…» (2 Cor 11, 23ss.). É esta a fé, que nos põem ao serviço de Deus e dos irm&a
    tilde;os, que também nos justifica e salva.
    No evangelho, Jesus ensina que não podemos viver como discípulos tímidos e descomprometidos. A fé é viva quando se concretiza em obras. Quem não sabe amar a Deus e aos irmãos, mais do que a si mesmo, quem não é capaz de tomar a cruz e de seguir a Cristo, passando, como Ele, pelo Calvário, acabará por se dar conta de que atravessou a vida sem a saborear, de que não conseguiu salvar os seus dias neste mundo. As palavras do Senhor são muito duras, mas dizem-nos claramente quais as obras de fé a realizar durante a nossa vida: «Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me» (v. 34). Há, pois, que carregar a cruz e segui-lo, para que se realize em nós o seu mistério até à morte e à ressurreição. Só assim a fé nos salvará e nos fará salvadores com Ele.
    A fé operante une-nos a Cristo missionário, a Cristo benfeitor da Humanidade, a Cristo sacerdote e vítima, para completarmos o que falta aos seus sofrimentos pelo Seu Corpo que é a Igreja (cf. Col 1, 24).

    Oratio

    Senhor, ensina-nos o que tem valor para a eternidade. Dá-nos uma fé viva, uma fé sincera, que se traduza em generosidade, em serviço incansável e humilde em prol da tua glória, e em favor dos irmãos. Dá-nos uma fé corajosa diante dos sofrimentos desta vida, uma fé que seja luz, uma fé que nos permita seguir a Cristo, teu Filho, carregando a nossa cruz de cada dia. Faz que, desde já, pela graça do teu Espírito, saboreemos a alegria do teu reino de amor. Amen.

    Contemplatio

    A cruz tornou-se na linguagem cristã sinónimo de sacrifício, de penitência, de reparação.
    Se a cruz nos grita que Nosso Senhor nos amou, ela diz-nos também que sofreu por nós, que expiou cruelmente os nossos pecados. Amou a cruz porque ela reparava a glória de seu Pai e porque pagava as nossas dívidas. Ele carregou-se com os nossos pecados, mas quis reservar-nos a honra de o seguirmos neste caminho. Não nos aplica os frutos das suas reparações, a não ser que neles tomemos alguma parte. Quer que partilhemos as suas disposições, os seus sentimentos. É preciso que tenhamos também o desejo, a vontade de reparar a glória do seu Pai e de pagar as nossas dívidas. É preciso, portanto, que, atrás da sua grande e dolorosa cruz, levemos a nossa pequena cruz: a cruz do trabalho quotidiano, da penitência, da obediência, do desapego; a cruz da paciência nas provações da vida. «Aquele que quiser vir atrás de mim e partilhar do meu reino, deve tomar a sua cruz e seguir-me». Aqui está o resumo do Evangelho. Nosso Senhor pregou a penitência e enviou os seus apóstolos a pregá-la em toda a terra. Não há outro caminho para ir ao céu. É preciso alguma coragem e boa vontade. O reino dos céus exige alguma força de alma e algum vigor da parte daqueles que o querem conquistar: O Reino dos céus sofre violência. (Leão Dehon, OSP3, p. 512s.)

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Se alguém quiser vir após mim, tome a sua cruz e siga-me» (Mc 8, 34).

    | Fernando Fonseca, scj |

  • VI Semana – Sábado – Tempo Comum – Anos Pares

    VI Semana – Sábado – Tempo Comum – Anos Pares


    19 de Fevereiro, 2022

    Tempo Comum – Anos Pares

    VI Semana – Sábado

    Lectio

    Primeira leitura: Tiago 3, 1-10

    Meus irmãos, 1não haja muitos entre vós que pretendam ser mestres, sabendo que nós teremos um julga-mento mais severo, 2pois todos nós falhamos com frequência. Se alguém não peca pela palavra, esse é um homem perfeito, capaz também de dominar todo o seu corpo. 3Quando pomos um freio na boca do cavalo para que nos obedeça, dirigimos todo o seu corpo. 4Vede também os barcos: por grandes que sejam e fustigados por ventos impetuosos, são dirigidos com um pequeno leme para onde quer a vontade do piloto. 5Assim também a língua é um pequeno membro, e gloria-se de grandes coisas.Vede como um pequeno fogo pode incendiar uma grande floresta! 6Assim também a língua é fogo, é um mundo de iniquidade; entre os nossos membros, é ela que contamina todo o corpo e, inflamada pelo Inferno, incendeia o curso da nossa existência. 7Todas as espécies de animais selvagens, de aves, de répteis e de animais do mar se podem domar e têm sido domadas pelo homem. 8A língua, pelo contrário, ninguém a pode dominar: é um mal incontrolável, carregado de veneno mortal. 9Com ela bendizemos quem é Senhor e Pai, e com ela amaldiçoamos os homens, feitos à semelhança de Deus. 10De uma mesma boca procedem a bênção e a maldição. Mas isto não deve ser assim, meus irmãos.

    Tiago continua a passar em revista a causa mais profunda dos problemas eclesiais do seu tempo. Hoje detém-se a tratar do controlo da língua. É coisa bem difícil. Mas é sobretudo das qualidades daquele que pretende ser mestre que o apóstolo trata. Os mestres gozavam de grande estima, tanto na Sinagoga como na Igreja. Por isso, havia quem pretendesse sê-lo, sem ter as devidas qualidades. Tiago sublinha a grande responsabilidade daqueles que eram considerados os autênticos intérpretes da lei e da vontade divina (cf. Mt 23, 6-7; 1 Cor 12, 28-29; Ef 4, 11; Heb 13, 7). Os «doutores» devem controlar a própria língua. A fé manifesta-se nas obras, mas também nas palavras. Falar com verdade e coerência é sinal de uma fé sincera. A severidade do juízo sobre as palavras, de que nos será pedida conta, é sinal da importância da língua, cujo bom uso é sinal de perfeição, entendida como autocontrolo e como correcta relação com os outros. Os exemplos do freio e do leme, aplicados à língua, são eficazes: como eles, a língua, órgão bem pequeno, pode guiar o homem. A língua descontrolada torna-se terrivelmente destruidora. A ambiguidade da linguagem é como um fogo, uma chama infernal que, quando penetra em nós, destrói a nossa vida. É impressionante a veemência com que o apóstolo apresenta o aspecto negativo da «indomável» língua, chamada «rebelde» e «carregada de veneno mortal» (v. 7). É um verdadeiro espanto que, com a mesma língua, possamos bendizer a Deus e amaldiçoar os irmãos!

    Evangelho: Marcos 9, 2-13

    Naquele tempo, Jesus, Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João e levou-os, só a eles, a um monte elevado. E transfigurou-se diante deles. 3As suas vestes tornaram-se resplandecentes, de tal brancura que lavadeira alguma da terra as poderia branquear assim. 4Apareceu-lhes Elias, juntamente com Moisés, e ambos falavam com Ele. 5Tomando a palavra, Pedro disse a Jesus: «Mestre, bom é estarmos aqui; façamos três tendas: uma para ti, uma para Moisés e uma para Elias.» 6Não sabia que dizer, pois estavam assombrados. 7Formou-se, então, uma nuvem que os cobriu com a sua sombra, e da nuvem fez-se ouvir uma voz: «Este é o meu Filho muito amado. Escutai-o.» 8De repente, olhando em redor, já não viram ninguém, a não ser só Jesus, com eles. 9Ao descerem do monte, ordenou-lhes que a ninguém contassem o que tinham visto, senão depois de o Filho do Homem ter ressuscitado dos mortos. 10Eles guardaram a recomendação, discutindo uns com os outros o que seria ressuscitar de entre os mortos.
    11E fizeram-lhe esta pergunta: «Porque afirmam os doutores da Lei que primeiro há-de vir Elias?» 12Jesus respondeu-lhes: «Sim; Elias, vindo primeiro, restabelecerá todas as coisas; porém, não dizem as Escrituras que o Filho do Homem tem de padecer muito e ser desprezado? 13Pois bem, digo-vos que Elias já veio e fizeram dele tudo o que quiseram, conforme está escrito.»

    Pedro professou a sua fé, em nome da Igreja. Jesus anunciou a cruz como seu destino e daqueles que O quisessem seguir. Agora intervém o Pai para confirmar a missão do Filho. Jesus vai a caminho de Jerusalém onde irá dar a sua vida para glória do Pai e nossa salvação. A Transfiguração confirma a justeza da sua decisão e da decisão dos discípulos em segui-l´O.
    Na narração encontramos os elementos típicos das teofanias: o monte alto, a glória, a nuvem luminosa, as tendas, a voz. A presença de Moisés e de Elias confirmam que Jesus é o profeta definitivo, o Messias esperado. A voz que se ouve é dirigida, não só ao Filho, mas também a todos quantos a ouvem e é a apresentação oficial que o Pai faz aos discípulos chamados a ser testemunhas da agonia. O destino de Jesus está a realizar-se. O segredo messiânico será completamente revelado na Ressurreição.
    Mas os discípulos, testemunhas privilegiadas da intimidade filial entre Jesus e o Pai, e com os grandes amigos de Deus do Antigo Testamento, não conseguem acreditar que o Messias deva morrer e ressuscitar. Jesus tem de intervir para afirmar que Elias já veio na pessoa de João Baptista, e que já passou pelo sofrimento e pela morte, que são passagem obrigatória para quem pretende alcançar a glória.

    Meditatio

    Tiago adverte-nos, de modo quase irritante, para os perigos da língua, pequeno músculo capaz de provocar grandes danos. É como que uma arma mortífera, poderosa e sempre pronta a espalhar veneno letal. É muito fácil pecar com ela. Por isso, há que pôr-lhe freio. Há que saber falar, mas também que saber calar. Isto é particularmente importante para quem recebeu o ministério de ensinar, de guiar, de orientar os outros. Saber controlar a própria língua é sinal de perfeição: «Se alguém não peca pela palavra, esse é um homem perfeito» (v. 2).
    O evangelho também nos fala de palavra e de silêncio. Marcos comenta a proposta de Pedro – construir três tendas – afirmando que ele «não sabia que dizer» (v. 6). E, de modo categórico, Jesus renova aos seus discípulos a ordem de não falarem do que viram no alto monte, até que Ele tenha ressuscitado dos mortos. Como interpretar esta ordem? Terá sido apenas uma medida de prudência ligada às circunstâncias, ou é também uma indicação para nós? O Pai disse: «Este é o meu Filho muito amado. Escutai-o» (v. 7). A escuta de Jesus fundamenta, para o
    cristão, tanto o silêncio como a palavra. Se permanecermos em constante escuta do Verbo, seremos verdadeiros mestres. As palavras que brotarem do nosso coração serão autênticas e não atraiçoarão o mistério de Jesus. No silêncio escutaremos, acolheremos e ofereceremos o Verbo, como fez Maria, a mulher do silêncio.
    Mas o próprio Jesus gostava de se entreter com o Pai, em momentos de solidão e silêncio, para O ouvir e Lhe falar. Também nós havemos de reservar momentos semelhantes para nos deixarmos renovar na intimidade com Cristo e nos unirmos ao seu amor pelos homens (cf. Cst 79).
    Lucas é o evangelista que mais se compraz em apresentar Jesus em oração sobre os montes e em lugares solitários: «Jesus… foi conduzido pelo Espírito ao deserto» (Lc 4, 1; cf. Mt 4, 1; Mc 1, 12); «Jesus retirava-se para lugares solitários a fim de rezar» (Lc 5, 16; cf. 9, 18; 11, 1; 22, 40-46); «Jesus subiu ao monte para rezar e passou toda a noite em oração» (Lc 6, 12; cf. 9, 28; Mc 6, 46; Jo 6, 15).
    Marcos também nos diz que Jesus, «depois de ter despedido a multidão, foi orar para o monte» (Mc 6, 46). É evidente a predilecção de Jesus pelo silêncio e pela solidão, a fim de escutar o Pai e Lhe falar, a fim mergulhar na contemplação. A oração é o lugar do Seu repouso e de encontro com o Pai. Podemos pensar numa oração muito simples, feita de amoroso silêncio, com uma única invocação: “Abbá, Pai”.

    Oratio

    Senhor Jesus, quero hoje pedir-te a graça da contemplação. Ver a tua beleza, o teu esplendor, prepara-me para Te escutar melhor, para me tornar mais disponível, para crescer no desejo de Te seguir. Dá-me, Senhor, a graça da contemplação, mas dá-me, sobretudo, o desejo de ser fiel à tua palavra, para me tornar cada vez mais semelhante a Ti, para me unir cada vez mais a Ti, para ter em mim os teus sentimentos de Filho e de Bom Samaritano da humanidade. Amen.

    Contemplatio

    Jesus toma os seus três preferidos, quer fortificar a sua fé, antes de os expor ao escândalo da sua agonia. Chegado ao cume do Tabor, retira-se à parte para orar. Qual foi o objecto da sua oração? Sem dúvida as suas provações próximas e a sua paixão, que foram também o objecto da sua conversa com Moisés e Elias. Ofereceu-se de novo ao seu Pai como vítima pela salvação dos homens. Repete o seu Ecce venio. E como a sua oferenda glorificava o seu Pai, o seu Pai glorificou-o por sua vez. A glória da sua transfiguração foi a recompensa da sua humilhação, da sua oblação voluntária; era assim que Ele tinha sido glorificado pelo seu Pai, quando se humilhou sob a mão de João Baptista no dia do seu baptismo.
    Foi enquanto rezava, que a mudança se manifestou no seu exterior. O seu rosto resplandecia como o sol; as suas vestes pareceram resplandecentes de luz e brancas como a neve. Era a alegria e a felicidade do seu Coração que se reflectiam para o exterior. Ele exultava de alegria porque ia começar o ano do sacrifício.
    Que lição para mim! Não teria esta alegria maravilhosa, mas teria pelo menos uma alegria profunda e a paz sobrenatural que ultrapassa todo o sentimento, se rezasse bem, se me oferecesse generosamente ao Coração de Jesus como vítima de amor e de reparação (Leão Dehon, OSP3, p. 250).

    Actio

    Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
    «Este é o meu Filho muito amado. Escutai-o» (Lc 9, 7).

    | Fernando Fonseca, scj |

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