Sábado – 2ª Semana da Quaresma

Lectio

Primeira leitura: Miqueias 7, 14-15.18-20

14Apascenta com o cajado o teu povo, o rebanho da tua herança, os que habitam isolados nas florestas no meio dos prados. Sejam eles apascentados em Basan e Guilead, como nos dias antigos. 15 Mostra-nos os teus prodígios, como nos dias em que nos tiraste do Egipto. 18Qual é o Deus que, como Tu, apaga a iniquidade e perdoa o pecado do resto da sua herança? Não se obstina na sua cólera, porque prefere a bondade. 19 Uma vez mais, terá compaixão de nós, apagará as nossas iniquidades e lançará os nossos pecados ao fundo do mar. 20 Mostrarás a tua fidelidade a Jacob, e a tua bondade a Abraão, como juraste a nossos pais, desde os tempos antigos.

Regressado do exílio em Babilónia, o povo de Israel confrontou-se com grandes dificuldades e teve saudades da fartura das terras da Transjordânia, tal como, ao regressar do Egipto, perante as dificuldades do deserto, teve saudades do peixe, dos pepinos, dos melões, dos alhos porros, das cebolas e dos alhos que comia no Egipto (cf. Nm 11, 6). Nesta situação, Miqueias ergue um lamento, quase que uma elegia fúnebre (v. 14): «Mostra-nos os teus prodígios, como nos dias em que nos tiraste do Egipt(J» (v. 15). E entra em cena Aquele que é o protagonista dos grandes eventos salvíficos: Deus preparou um lugar deserto onde, Ele mesmo, apascenta o seu rebanho disperso, que só n ‘ Ele encontra segurança e só n ‘ Ele confia. Então, o profeta entoa um hino cheio de emoção a Deus que perdoa (w. 18-20). Deus é como um pai que se comove diante do sofrimento dos filhos que erraram e sofrem as consequências dos seus erros (v. 19). Como nos tempos do êxodo, levado por um instinto quase materno, Deus usa de compaixão para com o seu povo, apaga as suas culpas e lança-as ao mar, do mesmo modo que nele afogou o faraó e os seus exércitos (cf. Ex 15). A sua fidelidade manifesta-se na gratuidade do perdão, para que o «resto» do seu povo possa manter-se fiel à Aliança (v. 20).

Evangelho: Lucas 15, 1-3.11-32

1 Aproximavam-se dele todos os cobradores de impostos e pecadores para o ouvirem. 2 Mas os fariseus e os doutores da Lei murmuravam entre si, dizendo: «Este acolhe os pecadores e come com eles.» 3Jesus propôs-lhes, então, esta parábola: 11 Disse ainda: «Um homem tinha dois filhos. 120 mais novo disse ao pai: ‘Pai, dá-me a parte dos bens que me corresponde. ‘ E o pai repartiu os bens entre os dois. 13 Poucos dias depois, o filho mais novo, juntando tudo, partiu para uma terra longínqua e por lá esbanjou tudo quanto possuía, numa vida desregrada. 14 Depois de gastar tudo, houve grande fome nesse país e ele começou a passar privações. 15 Então, foi colocar-se ao serviço de um dos habitantes daquela terra, o qual o mandou para os seus campos guardar porcos. 16 Bem desejava ele encher o estômago com as alfarrobas que os porcos comiam, mas ninguém lhas dava. 17 E, caindo em si, disse: ‘Quantos jornaleiros de meu pai têm pão em abundância, e eu aqui a morrer de fome! 18 Levsntsr-me-el. irei ter com meu pai e vou dizer-lhe: Pai, pequei contra o Céu e contra ti; 19já não sou digno de ser chamado teu filho; trata-me como um dos teus jornaleiros.’ 20 E, levantando-se, foi ter com o pai. Quando ainda estava longe, o pai viu-o e, enchendo­se de compaixão, correu a tençsr-se-Ihe ao pescoço e cobriu-o de beijos.

210 filho disse-lhe: ‘Pai, pequei contra o Céu e contra ti; já não mereço ser chamado teu filho. ,22 Mas o pai disse aos seus servos: ‘Trazei depressa a melhor túnica e vesti-lha; dai-lhe um anel para o dedo e sandálias para os pés. 23 Trazei o vitelo gordo e matai-o; vamos fazer um banquete e alegrar-nos, 24porque este meu filho estava morto e reviveu, estava perdido e foi encontrado.’ E a festa principiou. 250ra, o filho mais velho estava no campo. Quando regressou, ao aproximar-se de casa ouviu a música e as danças. 26Chamou um dos servos e perguntou-lhe o que era aquilo. 27 Disse-lhe ele: ‘O teu irmão voltou e o teu pai matou o vitelo gordo, porque chegou são e salvo. ,28 Encolerizado, não queria entrar; mas o seu pai, saindo, suplicava-lhe que entrasse. 29 Respondendo ao pai, disse-lhe: ‘Há já tantos anos que te sirvo sem nunca transgredir uma ordem tua, e nunca me deste um cabrito para fazer uma festa com os meus amigos; 30 e agora, ao chegar esse teu filho, que gastou os teus bens com meretrizes, mataste-lhe o vitelo gordo.’ 31 O pai respondeu-lhe: ‘Filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que é meu é teu. 32 Mas tínhamos de fazer uma festa e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e reviveu; estava perdido e foi encontrado. »

As parábolas da misericórdia (Lc 15) revelam-nos o rosto do Pai bom, disposto a perdoar, a acolher e a fazer festa com os filhos que reconhecem o seu pecado. Hoje, escutamos a parábola do filho pródigo. Este decide organizar a sua vida segundo os seus projectos, rejeitando os do pai. Por isso, exige ao pai a sua herança. Este termo equivale a vida (v. 12) ou a património. Obtido o que pede, parte e esbanja «tudo quanto possuía (a sua riqueza), numa vida desreçrsde-. Este filho perde os bens, mas perde, sobretudo, a si mesmo. A experiência da miséria (v. 17) fá-lo cair em si e dar-se conta da desgraça a que o levara a sua vida de estroina. Decide, então, regressar a casa e recomeçar uma vida nova. O pai esperava-o (v. 20), porque nunca tinha deixado o seu coração afastar-se daquele filho. Recebe-o comovido e de braços abertos, restituindo-lhe a dignidade perdida (w. 22-24).

Com esta parábola, Jesus revela o modo de agir do Pai, e o seu, em relação aos pecadores que se aproximam e dão um sinal de arrependimento. Mas os fariseus e os escribas, recusam-se a participar na festa do perdão, como o filho mais velho (v. 29), sempre bem comportado e que, por isso, até se julga credor do pai. O pai não desiste, nem diante deste filho malévolo. Por isso, sai de casa, revelando a todos o amor que sabe esperar, procurar, exortar, porque todos quer abraçar e reunir na sua morada.

Meditatio

Esta parábola é claramente dirigida aos fariseus e escribas que criticavam Jesus pelo modo como lidava e tratava com os pecadores (cf. w 1-3). A intenção principal de Jesus vê-se no fim da narração, na reacção do filho mais velho e nas palavras do Pai, que são a chave de interpretação de toda a parábola. Todos podemos ver-nos num ou noutro filho, no pecador assumido ou no justo presumido. O pai sai sempre ao encontro de um e de outro, quer venha da dispersão, como o filho pródigo, quer venha das regiões de uma falsa justiça ou de uma falsa fidelidade, como o filho mais velho. O importante, para nós, quer venhamos de uma ou de outra situação, é que nos deixemos acolher e abraçar pelo Pai bom, que quer a felicidade de todos os seus filhos.

Talvez seja relativamente fácil ver-nos no filho pródigo. Pode ser mais difícil dar-nos conta de que pensamos e reagimos como o filho mais velho, que contabiliza o que dá ao Pai e o que não recebe d ‘ Ele, tal como contabiliza o que irmão mais novo recebeu, sem dar nada em troca, e até ofendendo o Pai. E clamamos pela injustiça. Pode-se
julgar anormal manifestar tanta bondade a quem cometeu o mal. Mas o Senhor quer fazer-nos compreender que, para quem é fiel a Deus, está reservada uma recompensa ainda maior: não a alegria de receber, mas a alegria de dar. «A felicidade está mais em dar do que em receber» (Act 20, 35).

Esta é, por excelência, a parábola da misericórdia. Mais que «parábola do filho pródigo», deve ser chamada «parábola do Pai misericordioso», do Pai pródigo em misericórdia. Como Ele, havemos de aprender a abrir o coração a todos os irmãos, a estarmos com Ele para acolher os pródigos ou os pretensos justos, a vermos a todos do seu ponto de vista, que não é a justiça fria e cega.

Todo o evangelho de Jesus é uma mensagem de alegria, sobretudo para os pobres, para os infelizes, para os pecadores. A alegria por causa de um pecador que se arrepende é alegria de Deus. "As parábolas de Lc 15 são uma trilogia do perdão e da misericórdia divina e mostram-nos a estreita ligação que há entre o perdão e a alegria, entre a conversão e a festa. Tal como a ovelha tresmalhada ou a dracma perdida são causa de alegria para quem as encontra, assim também exulta de alegria o coração de Deus, quando um dos Seus filhos regressa a Ele. Mais ainda, todo o céu faz festa por um pecador que se converte, porque se trata de um irmão que estava morto e volta à vida, estava perdido e foi encontrado".

Oratio

Pai misericordioso, que estás sempre à nossa espera, para nos acolher, nos abraçar, nos perdoar e nos restituir a dignidade de filhos, acende em nós a saudade de Ti, do teu amor. Faz-nos voltar à tua intimidade, quer sejamos pródigos dispersos, quer sejamos justos presumidos. Queremos fazer festa Contigo e com todos os teus filhos, nossos irmãos. Queremos aprender que há maior alegria em dar do que em receber. Queremos aprender a ser pródigos em misericórdia para com todos os nossos irmãos, para não termos inveja dos dons que lhes fazes, para sabermos desculpar e perdoar as suas faltas, para sabermos alegrar-nos com eles e Contigo, quando manifestarem algum sinal de arrependimento, alguma vontade de regressarem à casa que, connosco e com eles, queres partilhar. Amen.

Contemplatio

Quem vem? O Pai de misericórdia que nos ama ternamente. – Chama-nos seus filhinhos: filioli. Descreveu-se com complacência na parábola do filho pródigo.

Eu sou este filho pródigo, que viveu, se não na luxúria, pelo menos na vaidade e na inutilidade.

Volto para o meu Pai, hesitante, tímido, temeroso, mas ele está lá, que me acolhe com amor. O seu coração bate fortemente no seu peito. Deseja-me com ardor, observa, procura. E se regresso, atira-se ao meu pescoço e aperta-me contra si, coração contra coração.

E chama os seus servos, os seus anjos, para me darem tudo o que perdi. Nada falta: o manto de outrora, o anel de nobreza, os sapatos, e o vitelo gordo para a festa.

 

 

o Coração de Jesus está emocionado; os seus olhos choram de ternura, mas sorriem de alegria: «Alegremo-nos, diz o bom Mestre, este filho estava morto e reviveu, estava perdido e foi encontrado» (Leão Dehon, 05P 3, p. 653).

Actio

Repete frequentemente e vive hoje a palavra: «Converteste o meu pranto em festa» (5130, 12).
 

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