Solenidade do Sagrado Coração de Jesus – Ano C [atualizada]

ANO C

SOLENIDADE DO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS

Tema da Solenidade do Sagrado Coração de Jesus

Na Solenidade do Sagrado Coração de Jesus, a liturgia convida-nos a contemplar e a celebrar a bondade, a ternura e a misericórdia de Deus pelos homens – por todos os homens, sem exceção. Para expressar a atitude de Deus para com os seus filhos, os textos recorrem a uma imagem importada do passado nómada de Israel: Deus é o “Pastor bom” que, com amor infinito e dedicação total, cuida do seu rebanho.

Na primeira leitura Deus anuncia aos exilados na Babilónia que vai, Ele próprio, tomar conta do seu povo, do seu “rebanho”. Os habitantes de Judá foram, durante muito tempo, conduzidos por “pastores maus”, que se aproveitaram das “ovelhas” e as levaram por caminhos errados. Mas agora Deus, o “Pastor bom”, vai reunir as suas “ovelhas” dispersas, conduzi-las de volta à terra da liberdade, dar-lhes pastagens excelentes, cuidar amorosamente de todas. A parábola é um magnífico hino ao amor de Deus.

No Evangelho Jesus, acusado pelos fariseus e doutores da Lei de se dar com gente pouco recomendável, conta a história de um pastor que deixa tudo o que tem em mãos para ir à procura de uma ovelha tresmalhada. Segundo Jesus, esse “pastor” é Deus. Deus ama cada um dos seus filhos com um amor absoluto e não deixa nenhum para trás; o coração de Deus enche-se de alegria quando encontra a sua “ovelha” perdida e a reintegra no seu “rebanho”.

Na segunda leitura Paulo de Tarso lembra a todos os crentes que são filhos queridos e amados de Deus. Foi por nos amar tanto que Deus enviou Jesus, o seu Filho Unigénito, ao nosso encontro. Enfrentando a injustiça, a mentira, a violência, até mesmo a morte, Jesus mostrou-nos o caminho que conduz à vida verdadeira. Salvos por Jesus, passamos a integrar a família de Deus.

 

LEITURA I – Ezequiel 34,11-16

Eis o que diz o Senhor Deus:
«Eu próprio irei em busca das minhas ovelhas
e hei de encontrá-las.
Como o pastor que vigia o rebanho,
quando estiver no meio das ovelhas que andavam tresmalhadas,
assim Eu cuidarei das minhas ovelhas,
para as tirar de todos os sítios em que se desgarraram
num dia de nevoeiro e de trevas.
Arrancá-las-ei de entre os povos
e as reunirei dos vários países,
para as reconduzir à sua própria terra.
Apascentá-las-ei nos montes de Israel,
nas ribeiras e em todos os lugares habitados do país.
Eu as apascentarei em boas pastagens
e terão as suas devesas nos altos montes de Israel.
Descansarão em férteis devesas
e encontrarão pasto suculento sobre as montanhas de Israel.
Eu apascentarei o meu rebanho,
Eu o farei repousar, diz o Senhor Deus.
Hei de procurar a ovelha que anda perdida
e reconduzir a que anda tresmalhada.
Tratarei a que estiver ferida,
darei vigor à que andar enfraquecida
e velarei pela gorda e vigorosa.
Hei de apascentar com justiça».

 

CONTEXTO

Em 598 a.C. Nabucodonosor, rei da Babilónia, põe cerco a Jerusalém. O rei de Judá, Joaquim, desaparece de circulação, talvez morto nos combates, ou então aprisionado e deportado para a Babilónia. Jeconias sucede a Joaquim no trono de Judá; mas, depois de três meses de resistência, rende-se às tropas de Nabucodonosor. Os notáveis de Jerusalém são aprisionados e enviados para o cativeiro, na Babilónia (597 a.C.). Entre os deportados está um jovem chamado Ezequiel, de família sacerdotal.

Nabucodonosor coloca no trono de Judá um homem da sua confiança, um tal Sedecias. Durante algum tempo, Sedecias manteve-se tranquilo, pagando pontualmente os tributos devidos aos babilónios; mas, ao fim de algum tempo, aproveitando a conjuntura política favorável, Sedecias aliou-se com os egípcios e deixou de cumprir os compromissos que tinha com os babilónios. Nabucodonosor enviou imediatamente um exército que cercou novamente Jerusalém. Apesar do socorro de um exército egípcio, Jerusalém teve de se render aos babilónios (586 a.C.). A cidade foi destruída; Sedecias foi levado prisioneiro para a Babilónia, juntamente com a maior parte da população de Judá. Jerusalém ficou para trás, transformada num montão de ruínas.

Ezequiel, chamado “o profeta da esperança”, exerceu a sua missão profética junto dos exilados judeus na Babilónia. A primeira fase do ministério de Ezequiel decorreu entre 593 a.C. (data do seu chamamento à vocação profética) e 586 a.C. (o ano em que Jerusalém foi conquistada pela segunda vez pelos exércitos de Nabucodonosor). Nesta fase, o profeta preocupou-se em destruir as falsas esperanças dos exilados (convencidos de que o exílio terminaria em breve e que iam poder regressar rapidamente à sua terra) e em denunciar a multiplicação das infidelidades a Javé por parte dos judeus que tinham escapado ao primeiro exílio e que tinham permanecido em Jerusalém. A segunda fase do ministério profético de Ezequiel decorre a partir de 586 a.C., data em que Jerusalém foi destruída e uma nova vaga de deportados judeus chega à Babilónia. Nesta nova fase, a mensagem de Ezequiel vai ser, sobretudo, uma mensagem de salvação, destinada a consolar os exilados e a alimentar a esperança num futuro novo de felicidade e de paz.

O texto que a liturgia da Solenidade do Sagrado Coração de Jesus nos propõe como primeira leitura pertence a esta segunda fase. O profeta, falando em nome de Deus, reconhece que os líderes de Judá foram pastores indignos, que não cuidaram do Povo que lhes foi confiado por Deus. Olharam apenas para os seus próprios interesses e deixaram o “rebanho de Deus” indefeso, à mercê de “animais selvagens”. A catástrofe nacional que atingiu Judá e que levou os seus habitantes para o cativeiro na Babilónia resultou da negligência e do egoísmo desses pastores indignos (cf. Ez 34,1-10). Ora Deus, não pode ficar indiferente diante de tudo isto.

Na tradição dos povos do Antigo Médio Oriente, nomeadamente os sumérios, os babilónios, os egípcios e os cananeus, a imagem do “pastor” era frequentemente associada aos deuses e aos reis. Também a catequese de Israel usava a mesma imagem para falar de Deus (cf. Sl 23; 80; Jr 23,1-8).

 

MENSAGEM

Ezequiel, o profeta convocado por Deus para animar os exilados de Judá, anuncia àquela comunidade desiludida, sem esperança e sem futuro, que, doravante, será o próprio Deus a pastorear o seu Povo.

O primeiro gesto de Deus, o “Pastor bom”, será ir à procura das suas ovelhas perdidas (“Eu próprio irei em busca das minhas ovelhas e hei de encontrá-las” – vers. 11). É Deus que toma a iniciativa. O “Bom Pastor” não ficará comodamente instalado, à espera que as suas ovelhas se decidam a procurá-l’O para lhe pedir perdão pelas opções erradas que tomaram; irá, Ele próprio, ao encontro delas. Quem ama a sério dispõe-se sempre a dar o primeiro passo; e Deus ama o seu Povo.

Depois, o “Bom Pastor” vai reunir as ovelhas tresmalhadas, que andam por aqui e por ali, sem rumo e sem objetivo. Não as deixará sozinhas, indefesas diante dos perigos e das ameaças. Juntá-las-á à sua volta, reuni-las-á num rebanho, colocá-las-á sob a sua proteção. Aquele povo que, abandonado pelos seus líderes, se dispersou e perdeu o norte, sob a direção de Deus recuperará a sua identidade, voltará a ter objetivos saberá para onde caminhar.

Depois, o “Bom Pastor” conduzirá as ovelhas de regresso a casa, à terra boa onde há pastagens abundantes (vers. 12-13b). Será um novo Êxodo, que trará o “rebanho” de Deus da terra da escravidão para a terra da liberdade. Já aconteceu outrora, quando Deus conduziu o seu Povo do Egito para a Terra Prometida; acontecerá agora outra vez. Conduzido pelo seu “Pastor”, o “rebanho de Deus” reencontrará a liberdade e a vida em abundância.

Com a chegada dos exilados à terra da liberdade, estará concluída a ação de Deus em favor do seu Povo? Não. Mesmo depois de as “ovelhas” terem reencontrado a sua terra e as suas raízes, o “Pastor” (Deus) continuará a dispensar-lhes os seus cuidados… As imagens utilizadas (vers. 13c-15) sublinham, por um lado, a abundância de vida (“Eu as apascentarei em boas pastagens”; “terão suas devesas nos altos montes”; “encontrarão pasto suculento”), por outro lado, a tranquilidade e a paz (“descansarão em férteis devesas”; “eu os farei repousar”) que Deus Se propõe proporcionar ao seu Povo.

A ação salvadora e amorosa de Deus concretizar-se-á, ainda, na solicitude com que Ele tratará as ovelhas perdidas, desgarradas, feridas, enfermas (vers. 16). Aí manifestar-se-á a “justiça” de Deus que é amor, solicitude, ternura, misericórdia para com os mais pobres, marginalizados e débeis.

Esta parábola é um magnífico hino ao amor de Deus. Estamos diante de um dos pontos mais altos da revelação de Deus aos homens.

 

INTERPELAÇÕES

  • Quem é Deus? Como é Ele? Como é que Ele se relaciona com a humanidade que criou? Para responder a estas questões, os teólogos de Israel, olharam para a história do seu povo e tiraram conclusões a partir de alguns acontecimentos “improváveis”, que pareciam sem explicação racional. Notaram como um grupo de escravos maltratados no Egito, contra todas as probabilidades, conseguiu salvar-se; notaram que esse grupo de homens e mulheres libertados da escravidão caminhou através do deserto em direção à liberdade e que, ao longo do caminho, encontrou miraculosamente água e comida; constataram como essa gente, no sopé de uma montanha, se encontrou com o Deus que os tinha tirado da escravidão e recebeu d’Ele indicações para construir um projeto de vida com sentido; viram como esse povo chegou a uma terra boa e nela se estabeleceu, apesar da oposição de outros povos; verificaram como, ao longo do tempo, Deus continuou a falar a esse povo, através dos profetas, para lhes indicar o caminho que conduz à vida… Os catequistas de Israel recorreram a uma imagem tomada do seu passado nómada para descrever esta experiência: Deus é o nosso “pastor”; Ele ama o seu povo como um “pastor bom” ama as suas ovelhas; Ele tem conduzido o seu povo como um “pastor bom” conduz as suas ovelhas. Como é a nossa experiência de Deus? Somos capazes de olhar para a nossa história de vida e de descobrir nela as marcas da presença desse Deus/Pastor bom que nos ama com um amor sem igual?
  • O profeta Ezequiel sublinha especialmente a preocupação de Deus com as “ovelhas” perdidas, tresmalhadas, feridas, enfraquecidas. Sim, Deus tem um “fraco” pelos seus filhos e filhas que perderam o rumo, que foram feridos pelos acidentes da vida ou pela maldade dos homens; Deus tem um carinho particular pelos rejeitados, pelos abandonados, pelos que ninguém quer e ninguém ama; Deus preocupa-se especialmente com os “diferentes”, com os que se sentem abandonados e esquecidos pelos políticos e pelas igrejas; Deus ama incondicionalmente os pequenos, os simples, aqueles que todos esquecem, os que nunca entram nas estatísticas, os que a sociedade considera descartáveis e abandona nas bermas das estradas da vida… Ora, que lugar têm esses nossos irmãos e irmãs no nosso coração? Esses irmãos e irmãs são prioridade nos projetos pastorais que desenhamos e que aplicamos nas nossas comunidades cristãs?
  • A imagem do “bom pastor” é apresentada, neste texto do livro do profeta Ezequiel, em contraste com os “maus pastores” (os líderes de Judá). Esses “maus pastores” não cuidam nem amam as suas ovelhas. Exploram-nas, maltratam-nas e não querem saber delas. Só estão preocupados com os seus próprios projetos e usam as ovelhas para os concretizar. O que os move não é o bem das ovelhas que lhes foram confiadas. Isto pode servir-nos de aviso. Ao longo do caminho da nossa vida deparar-nos-emos, certamente, com líderes, com mestres, com “chefes”, com pessoas que erigimos como nossa referência e nosso modelo. Muitos deles poderão, genuinamente, ajudar-nos a fazer opções certas, indicar-nos objetivos a atingir, orientar-nos na direção a imprimir à nossa vida; alguns far-nos-ão, simplesmente, perder tempo; outros tentarão aproveitar-se de nós e levar-nos para caminhos sem saída. Temos de ser prudentes na avaliação dos “líderes” humanos que reclamam a nossa atenção. Não devemos passar-lhes “cheques em branco” e segui-los sem critério. Temos de manter um certo sentido crítico e avaliar a cada passo, quer os comportamentos que assumem, quer as indicações que nos dão. É assim que procedemos?
  • A imagem de um Deus que é como um “Pastor bom”, constitui uma interpelação e um desafio para todos aqueles que têm responsabilidades na sociedade, na Igreja, na comunidade. Exige que o serviço da autoridade seja exercido com solicitude e amor; lembra a todos aqueles que exercem o serviço da autoridade que a prioridade é cuidar dos homens e mulheres que Deus lhes confiou; requer que a autoridade seja exercida sem autoritarismo, prepotência ou arrogância; pede que nos gestos dos que exercem a autoridade se manifeste o amor e a misericórdia de Deus. É assim que procedemos e que tratamos os irmãos que Deus nos confia, incluindo os mais pobres e os mais humildes?

 

SALMO RESPONSORIAL – Salmo 22 (23)

Refrão: O Senhor é meu pastor: nada me faltará.

O Senhor é meu pastor: nada me falta.
Leva-me a descansar em verdes prados,
conduz-me às águas refrescantes
e reconforta a minha alma.

Ele me guia por sendas direitas por amor do seu nome.
Ainda que tenha de andar por vales tenebrosos,
não temerei nenhum mal, porque Vós estais comigo:
o vosso cajado e o vosso báculo me enchem de confiança.

Para mim preparais a mesa
à vista dos meus adversários;
com óleo me perfumais a cabeça
e meu cálice transborda.

A bondade e a graça hão de acompanhar-me
todos os dias da minha vida
e habitarei na casa do Senhor
para todo o sempre.

 

LEITURA II – Romanos 5,5b-11

Irmãos:
O amor de Deus foi derramado em nossos corações
pelo Espírito Santo que nos foi dado.
Quando ainda éramos fracos,
Cristo morreu pelos ímpios no tempo determinado.
Dificilmente alguém morrerá por um justo;
por um homem bom,
talvez alguém tivesse a coragem de morrer.
Mas Deus prova assim o seu amor para connosco:
Cristo morreu por nós, quando éramos ainda pecadores.
E agora, que fomos justificados pelo seu sangue,
com muito maior razão
seremos por Ele salvos da ira divina.
Se, na verdade, quando éramos inimigos,
fomos reconciliados com Deus pela morte de seu Filho,
com muito maior razão, depois de reconciliados,
seremos salvos pela sua vida.
Mais ainda: também nos gloriamos em Deus,
por Nosso Senhor Jesus Cristo,
por quem alcançámos agora a reconciliação.

 

CONTEXTO

Roma, a capital do império, era, na época de Paulo, uma cidade com cerca de um milhão de habitantes. Neste número estavam incluídos cerca de 50.000 judeus.

Não se conhece, com pormenor, a origem da comunidade cristã de Roma. Provavelmente, o cristianismo chegou a Roma levado por judeus palestinos convertidos a Cristo. Uma antiga tradição diz que foi Pedro quem anunciou o Evangelho em Roma, por volta do ano 42, e que da sua pregação resultou uma florescente comunidade cristã. No entanto, essa informação não é certa. Paulo, na carta que escreve aos cristãos de Roma, não lhe faz qualquer referência.

Paulo decide escrever aos cristãos da comunidade de Roma quando está prestes a terminar a sua terceira viagem missionária. Prepara-se para retornar à Palestina, onde vai entregar os donativos recolhidos em diversas igrejas do oriente, destinados a ajudar financeiramente os cristãos de Jerusalém. Sente, contudo, que terminou a sua missão no Mediterrâneo oriental, pois as igrejas que fundou e acompanhou estão organizadas e já podem caminhar sozinhas. Tem planos para se dirigir para ocidente, pensando inclusive em ir até à Espanha para aí anunciar o Evangelho (cf. Rm 15,24-28).

Dirigindo-se por carta aos cristãos de Roma, Paulo aproveita para estabelecer laços com eles e para lhes apresentar os principais problemas que o preocupam, entre os quais sobressai a questão da unidade (um problema que a comunidade cristã de Roma, afetada por dificuldades de relacionamento entre judeo-cristãos e pagano-cristãos, conhecia bem). Com serenidade e lucidez, evitando qualquer polémica, expõe-lhes as linhas mestras do Evangelho que anuncia. A Carta aos Romanos é uma espécie de resumo da teologia paulina. Estamos no ano 57 ou 58.

Na primeira parte da Carta (cf. Rm 1,18-11,36), Paulo vai fazer notar aos cristãos divididos que o Evangelho é a força que congrega e que salva todo o crente, sem distinção de judeu, grego ou romano. Embora o pecado seja uma realidade universal, que afeta todos os homens (cf. Rm 1,18-3,20), a “justiça de Deus” dá vida a todos, sem distinção (cf. Rm 3,1-5,11); e é em Jesus Cristo que essa vida se comunica e que transforma o homem (cf. Rm 5,12-8,39). Batizado em Cristo, o cristão morre para o pecado e nasce para uma vida nova. Passa a ser conduzido pelo Espírito e torna-se filho de Deus; libertado do pecado e da morte, produz frutos de santificação e caminha para a Vida eterna. Na segunda parte da carta (cf. Rm 12,1-15,13) Paulo, de uma forma bastante prática, exorta os cristãos a viverem de acordo com o Evangelho de Jesus.

O texto que nos é proposto integra a parte dogmática da carta (cf. Rm 1,18-11,36). O facto de alguém ser de origem judaica ou de origem pagã não significa que tenha mais méritos ou que esteja em vantagem em relação a outros – considera Paulo. Na verdade, todos são pecadores e todos estão em igualdade diante de Deus (cf. Rm 1,18-3,20). É Deus que, por Jesus Cristo, a todos salva, sem distinção (cf. Rm 3,21-5,11). As divisões e tensões entre cristãos oriundos do judaísmo e cristãos oriundos do paganismo são, portanto, completamente incongruentes.

 

MENSAGEM

Essa salvação que Deus oferece a todos os seus filhos e filhas, sem distinção, que consequências tem para a vida do crente? Em primeiro lugar, é fonte de paz. Garante-nos que Deus não nos condena por causa das nossas faltas; mas assegura-nos, além disso, o acesso a Deus e aos bens que Deus nos quer oferecer (cf. Rm 5,1-2). Agraciados e renovados por esses dons, sentimo-nos totalmente em paz com Deus.

A salvação que Deus nos oferece também é fonte de esperança. Com o coração cheio dessa esperança, temos forças para enfrentar e superar as adversidades que a vida nos colocar à frente (cf. Rm 5,3-4); mas, de forma especial, tornamo-nos capazes de atravessar a vida presente de olhos postos nas realidades futuras. Isso não significa que nos alheemos do mundo e dos problemas da vida; significa, sim, que enfrentamos a vida e todas as suas vicissitudes com a certeza de que as forças da morte nunca terão a última palavra.

Finalmente, a salvação que Deus nos oferece é fonte de confiança, de uma confiança ilimitada em Deus. Na base dessa confiança está a certeza de que Deus nos ama com um amor sem igual (cf. Rm 5,5). Como chegamos a essa certeza? Basta olhar para aquilo que Deus nos ofereceu através de Jesus: sendo nós pecadores, Deus enviou o seu Filho ao mundo para nos dar vida. Paulo convida-nos a reparar neste facto espantoso: Deus, o Pai, não passou a amar-nos quando nos convertemos; amou-nos desde sempre e, por isso, enviou o Filho ao nosso encontro “quando éramos ainda pecadores”. Deus não se preocupou em contabilizar os nossos pobres méritos, ou em tomar nota da nossa fragilidade e do nosso pecado; Deus interessou-se apenas em enviar-nos Jesus para nos conduzir à vida, mesmo que isso significasse, para o Filho de Deus, enfrentar o suplício da cruz (cf. Rm 5,6-8). Diante disto, como não ter a certeza do amor de Deus por nós?

Para Paulo, a conclusão é óbvia: se Deus nos amou assim quando ainda éramos pecadores, quanto mais nos amará agora, depois que fomos justificados pelo sangue do seu Filho e nos tornamos, também nós, seus filhos (cf. Rm 5,9-11)!

 

INTERPELAÇÕES

  • Quem sou eu? Um insignificante grão de pó perdido na imensidão do universo? Um ser frágil, “de barro”, marcado pela debilidade e pela finitude, que hoje existe e que amanhã deixou de respirar? Uma pessoa com uma história de fracasso, que falha uma e outra e outra vez, que não consegue concretizar os seus melhores sonhos e projetos? Alguém ridículo, insignificante, que ninguém leva a sério e que quando desaparecer não terá deixado no mundo e na memória dos homens qualquer marca? Paulo de Tarso, apóstolo de Jesus, vê em cada homem ou em cada mulher alguém que é profundamente amada por Deus, independentemente da sua fragilidade, da sua pequenez, da sua miséria, do seu pecado, da sua indignidade. Não, não somos seres miseráveis, que vivem uma vida efémera até desaparecerem no nada; somos seres que Deus ama absolutamente; seres que Deus quer salvar e integrar na sua família. Somos pessoas que Deus criou com amor e com quem Deus quer escrever uma história de amor. O amor de Deus valoriza o nosso “barro”, dignifica-nos, enobrece-nos, eleva-nos, salva-nos, dá pleno significado à nossa vida. Temos consciência disso? O que sentimos ao saber que temos um lugar especial, absolutamente único, no coração e no projeto de Deus?
  • O amor de Deus faz com que cada pessoa seja única, especial, insubstituível. A consciência desse facto deve levar-nos a olhar com respeito e consideração cada homem e cada mulher que encontramos no caminho da vida, independentemente do seu aspeto físico, da cor da sua pele, da sua idade, da sua ideologia política, das suas convicções religiosas, da sua orientação sexual, da sua importância social, do seu dinheiro ou do seu poder. Como vemos e como tratamos cada pessoa que passa na nossa vida? Respeitamos a dignidade de cada irmão, defendemos os direitos de todos, lutamos objetivamente contra todos os mecanismos que trazem discriminação, exploração, injustiça, sofrimento a esses homens e mulheres que Deus tanto ama? Somos, junto dos nossos irmãos magoados pela doença, pela solidão, pelo abandono, testemunhas e sinais do amor que Deus lhes tem?
  • Paulo de Tarso lembra-nos que Jesus, o Filho de Deus que veio ao encontro dos homens, nos apontou o caminho que leva à salvação. Ele ofereceu a própria vida até à última gota de sangue para que nós tivéssemos vida em abundância. Deixou-nos, na cruz, a lição do amor que se dá até às últimas consequências, até ao último alento. Ensinou-nos a amar, sem cálculo e sem medida. Que impacto têm as lições de Jesus na nossa vida? O que Ele nos disse, o que Ele nos propôs, com as suas palavras e com os seus gestos, entra no nosso projeto de vida? A forma como Jesus amou é o modelo que temos sempre presente diante dos olhos quando se trata de acolher, de cuidar, de ajudar, se curar os nossos irmãos?

 

ALELUIA – Mateus 11,291b

Aleluia. Aleluia.

Tomai o meu jugo sobre vós, diz o senhor,
e aprendei de Mim,
que sou manso e humilde de coração.

(ou João 10,14):

Eu sou o bom pastor, diz o Senhor:
conheço as minhas ovelhas e elas conhecem-Me.

 

EVANGELHO – Lucas 15,3-7

Naquele tempo,
disse Jesus aos fariseus e aos escribas a seguinte parábola:
«Quem de vós, que possua cem ovelhas
e tenha perdido uma delas,
não deixa as outras noventa e nove no deserto,
para ir à procura da que anda perdida, até a encontrar?
Quando a encontra, põe-na alegremente aos ombros
e, ao chegar a casa,
chama os amigos e vizinhos e diz-lhes:
‘Alegrai-vos comigo, porque encontrei a minha ovelha perdida’.
Eu vos digo:
Assim haverá mais alegria no Céu
por um só pecador que se arrependa,
do que por noventa e nove justos,
que não precisam de arrependimento».

 

CONTEXTO

Dentro da grande secção em que Lucas descreve a viagem de Jesus com os discípulos da Galileia para Jerusalém (cf. Lc 9,51-19,28), o cap. 15 ocupa um lugar especial. Alguns consideram este capítulo o centro do Evangelho de Lucas. As três parábolas que o integram (a “parábola da ovelha tresmalhada” – Lc 15,3-7; a “parábola da moeda perdida” – cf. Lc 15,8-10; e a “parábola do pai misericordioso” – cf. Lc 15,11-32) são conhecidas como “as parábolas sobre a misericórdia de Deus”. O tema da bondade de Deus para com todos os seus filhos, nomeadamente para com os pecadores e os marginais, é um tema muito caro ao evangelista Lucas.

Neste ano, o Evangelho da Solenidade do Sagrado Coração de Jesus traz-nos a primeira dessas parábolas: a “parábola da ovelha tresmalhada”. Não é uma parábola exclusiva de Lucas, pois também aparece no Evangelho de Mateus (cf. Mt 18,12-14); mas, enquanto que em Mateus ela é aplicada à responsabilidade dos chefes da Igreja para com os mais “pequenos” e débeis, em Lucas a parábola serve para ilustrar a misericórdia de Deus para com os pecadores. Os biblistas consideram que o enquadramento de Lucas estará mais próximo da intenção original de Jesus quando contou esta parábola.

No cenário proposto por Lucas, as “parábolas sobre a misericórdia de Deus” são a resposta de Jesus àqueles que O criticavam por acolher os publicanos e os pecadores que vinham escutá-l’O: “Este homem acolhe os pecadores e come com eles” (vers. 2). Os cobradores de impostos (“publicanos”) eram considerados exploradores do povo, ao serviço dos romanos, e tinham fama de explorar os seus concidadãos, exigindo-lhes mais do que o imposto estipulado pelas autoridades. Na época, um cobrador de impostos não podia fazer parte da comunidade farisaica; não podia ser juiz, nem prestar testemunho em tribunal sendo, para efeitos judiciais, equiparado ao escravo; estava também privado de diversos direitos cívicos, políticos e religiosos. Os “pecadores” eram todos aqueles que não cumpriam a Lei, não frequentavam a sinagoga ao sábado, não jejuavam, não rezavam três vezes ao dia, não pagavam o tributo ao tempo nem os dízimos, não observavam as leis da pureza.

Ora, Jesus não evitava esta gente. Chegava a sentar-se com eles à mesa, o que significava que os aceitava como amigos e iguais e que tolerava o seu estilo de vida. Isso era absolutamente inaceitável para os fariseus e os doutores da Lei.

 

MENSAGEM

Chamamos-lhe a “parábola da ovelha tresmalhada”; contudo, não é uma ovelha, mas sim um pastor o protagonista da história. A atenção dos que escutam esta história deve dirigir-se para o pastor.

Na Palestina do tempo de Jesus, os pastores não estavam muito bem vistos. Antes de mais, porque levavam sempre consigo, no corpo e nas vestes, o cheiro das ovelhas. Mas, além disso, eram considerados gente violenta, dura e má, que vivia afastada da comunidade, não frequentava a sinagoga, não cumpria a Lei, deixava que os rebanhos destruíssem as colheitas, entrava facilmente em conflito com qualquer um que se lhe atravessasse no caminho. Contudo, nada disso entra nesta parábola. O pastor da história de Jesus é, simplesmente, um pastor que gosta de cada uma das suas ovelhas e que, portanto, não se conforma com a perda de qualquer uma delas. Quando percebe que uma das ovelhas do seu rebanho se perdeu, “perde a cabeça”: deixa as outras noventa e nove para ir à procura da ovelha perdida. A decisão de deixar as outras noventa e nove ovelhas no deserto (não se diz que ele as deixou no curral, ou que confiou a outro pastor o cuidado do seu rebanho) para ir procurar apenas uma, parece ilógica, irrefletida, quase irracional; mas expressa bem a importância que o pastor dá àquela ovelha.

Depois de caminhar pelo deserto sob o sol inclemente, enfrentando perigos e canseiras, o pastor encontrou a ovelha perdida. Não a censurou, não lhe bateu, não a trouxe arrastada por uma corda para que ela não fugisse outra vez. Cheio de alegria, pô-la aos ombros e trouxe-a assim, como se ela não lhe pesasse. Pôr a ovelha aos ombros é um gesto de solicitude, de ternura. Aquela pobre ovelha, depois do tempo que passou sozinha, num ambiente hostil, está cansada e assustada; precisa de carinho, precisa de recuperar as forças. O gesto de pô-la aos ombros é, portanto, um gesto de amor.

Finalmente, o pastor chega a casa com a sua ovelha aos ombros. Está muitíssimo feliz. “Chama os amigos e vizinhos e diz-lhes: ‘alegrai-vos comigo, porque encontrei a minha ovelha perdida’” (vers. 6). Não é excessivo? O facto de perder e de reencontrar uma ovelha é bem banal; merecerá tanto espalhafato? Para o pastor, aquela é “a sua” ovelha. Não a pode perder. Por isso, o reencontro com “a sua” ovelha encheu-o de alegria; e, na perspetiva do pastor, essa alegria tem de ser partilhada.

Chegados aqui, o cenário da parábola muda totalmente. Somos transportados da aldeia onde o pastor está a celebrar com os amigos e vizinhos, para o céu, para o espaço de Deus. Segundo Jesus, “haverá mais alegria no Céu por um só pecador que se converta, do que por noventa e nove justos, que não precisam de conversão” (vers. 7). O coração de Deus enche-se de alegria quando reencontra, quando recupera e traz para casa, um dos seus filhos “perdidos”.

Era aqui que Jesus queria chegar. Ele tinha sido acusado de se dar com gente reprovável, apontada a dedo pela sociedade, como os cobradores de impostos e as mulheres de má vida. Era verdade. Ele convivia com gente duvidosa, com pessoas a quem os “justos” preferiam evitar, com pessoas que eram anatematizadas e marginalizadas por causa dos seus comportamentos escandalosos. Certamente não foram os discípulos a inventar para Jesus o injurioso apelativo de “comilão e bêbedo, amigo de publicanos e de pecadores (Mt 11,19; cf. 15,1-2). Porque é que Jesus se dava com essas pessoas?

Porque Ele conhecia o coração do Seu Pai. Sabia que o coração de Deus é um coração de Pai e de Mãe, um coração cheio de amor pelos seus filhos. E Jesus veio, enviado pelo Pai, para dizer isso aos homens. A solicitude de Jesus para com os pecadores mostra-lhes que Deus não os rejeita, que Deus os convida a fazer parte da sua família. O projeto de salvação de Deus não é um condomínio fechado, com seguranças armados ao portão, que têm por missão evitar a entrada de indesejáveis; mas é uma proposta universal, onde todos os homens e mulheres têm lugar, porque todos, todos, todos – maus e bons – são filhos queridos e amados do Pai/Deus.

A “parábola da ovelha perdida” pretende, dar conta desta realidade. A atitude desproporcionada de “deixar as noventa e nove ovelhas no deserto para ir ao encontro da que estava perdida” sublinha a imensa preocupação de Deus por cada homem que se afasta da comunidade da salvação e o singular amor de Deus por todos os homens que necessitam de libertação. O “pôr a ovelha aos ombros” significa o cuidado e a solicitude de Deus, que trata com amor e com cuidados de Pai os filhos feridos e magoados; a alegria desmesurada do “pastor” significa a felicidade imensa de Deus sempre que o homem reentra no caminho da felicidade e da vida plena.

Jesus anuncia, aqui, a salvação de Deus oferecida aos pecadores, não porque estes se tornaram dignos dela mediante as suas boas obras, mas porque o próprio Deus Se solidariza com os excluídos e lhes oferece a salvação. Cumpre-se assim a profecia de Ezequiel que nos foi apresentada na primeira leitura: Deus vai assumir-Se (através de Jesus) como o “Bom Pastor”, que cuidará com amor de todas as ovelhas e, de forma especial, das desencaminhadas e perdidas.

 

INTERPELAÇÕES

  • A parábola do pastor que deixa tudo o que tem em mãos para procurar a sua ovelha perdida, que manifesta o seu carinho à ovelha reencontrada trazendo-a aos ombros no regresso a casa, que faz festa com os amigos e vizinhos porque no seu coração há uma alegria incomensurável, fala-nos de um Deus que tem coração, de um Deus que ama sem medida, de um Deus que nunca deixará para trás os seus queridos filhos, façam eles o que fizerem. Podemos, em determinados momentos da nossa vida, sentirmo-nos abandonados, desanimados, esquecidos, perdidos; mas Deus anda sempre à nossa procura e, mais tarde ou mais cedo, encontra-nos. A certeza do amor de Deus fortalece cada um dos nossos passos, alimenta a nossa esperança, enche de significado os nossos esforços, aponta ao futuro de felicidade e de vida plena que nos espera quando o nosso caminho na terra chegar ao fim. Jesus quis que conhecêssemos o amor de Deus. Mostrou-o nas suas palavras, nos seus gestos, na sua entrega até ao extremo na cruz. Celebrar a Solenidade do Coração de Jesus é contemplar o amor de Deus e deixar-se tocar por esse amor. Sentimos verdadeiramente que, a cada passo, caminhamos envolvidos pelo amor de Deus?
  • Jesus experimentava a cada instante o amor de Deus, vivia mergulhado no amor de Deus. “Tocado” por esse amor, testemunhava-o nas suas palavras e nos seus gestos. Quando alguém se sente tão profundamente amado como Jesus se sentia, percebe que tem de dar testemunho do amor. Por isso, Jesus curava os doentes, abraçava as crianças, defendia as mulheres privadas dos seus direitos e da sua dignidade, sentava-se à mesa com os publicanos e pecadores… Jesus era autenticamente um “profeta do amor”. Ora, nós frequentamos a “escola” de Jesus. Através d’Ele conhecemos e experimentamos o amor de Deus. Vimos como Jesus, na cruz, amou até ao extremo, até ao dom total de si mesmo. Comprometemo-nos a segui-l’O, a viver ao seu estilo. Aceitamos ser “profetas do amor”, obreiros da paz, servidores da reconciliação junto dos irmãos que “viajam” ao nosso lado pelos caminhos da vida? Somos, pelos gestos que fazemos, pela misericórdia que manifestamos para com todos, pela maneira bondosa como acolhemos cada pessoa, sinais vivos do amor que Deus tem por todos os seus filhos?
  • A proximidade de Jesus com os mais frágeis, os mais pequenos, os doentes, as crianças, as mulheres, os marginalizados, os que eram considerados “malditos” pela religião do Templo, sugere o especial carinho de Deus pelos seus filhos e filhas mais necessitados de salvação. Sim, Deus ama todos os seus filhos, sem exceção; mas olha com uma ternura especial para aqueles e aquelas que ninguém quer, que ninguém ama, que não têm espaço na mesa onde a sociedade todos os dias se alimenta. Como olhamos para as pessoas mais simples e mais humildes, as mais abandonadas, as mais esquecidas, as que a sociedade rejeita, as que nunca contam para nada, as que são invisíveis mesmo quando estão presentes, as que todos desprezam, as que nunca ninguém escuta, as que nunca se impõem nem defendem os seus direitos, as que nos inspiram repulsa? Conseguimos olhar para elas com o mesmo olhar de Jesus e amá-las como Jesus amava?
  • Tornar o amor de Deus uma realidade viva no mundo significa também lutar objetivamente contra tudo o que gera ódio, injustiça, opressão, mentira, sofrimento. Foi exatamente isso que Jesus fez. Ele nunca se conformou com uma sociedade construída sobre o egoísmo, a violência, a maldade, a exploração dos mais fracos. Para Jesus, uma sociedade que não se construísse sobre o amor e a misericórdia era uma sociedade iníqua, que subvertia o projeto de Deus para os homens. Combatemos tudo aquilo que desfeia o nosso mundo e destrói o amor, a justiça e a paz? O nosso silêncio, a nossa indiferença, a nossa cobardia diante da injustiça e da maldade não nos tornará cúmplices daqueles que desumanizam o mundo e matam o amor?
  • O grande projeto de Jesus era construir o Reino de Deus, isto é, um mundo onde o amor fosse o valor supremo. Foi para construir a civilização do amor, que Ele deu a sua vida até ao extremo, até à última gota de sangue. Estamos realmente a construir um mundo humanizado pelo amor? As nossas comunidades cristãs e religiosas, os nossos cartórios paroquiais e as receções das nossas igrejas, as nossas obras sociais, os nossos serviços de acolhimento e de hospitalidade, os nossos infantários, os nossos colégios para a educação da juventude, os nossos centros de dia, os nossos lares de idosos, os nossos hospitais, são espaços onde se constrói a civilização do amor?

 

ANEXO: LEITURA PARA MEDITAÇÃO

“Meus caríssimos filhos! Deixo-vos o mais maravilhoso de todos os tesouros: o Coração de Jesus!”

Com estas palavras, o Padre João Leão Dehon inicia o testamento espiritual que legou aos Sacerdotes do Coração de Jesus e a todos os que querem centrar a sua vida no Coração de Jesus.

A Igreja mergulha as suas raízes em Cristo, no seu Coração, no Amor que transforma os corações e as sociedades. A Igreja deve lutar pela partilha, pelo amor, pelas condições justas de trabalho, pela habitação para todos… A Igreja aponta para o reino do Coração de Jesus que deve começar nos indivíduos, penetrar nas famílias e envolver toda a sociedade.

“É necessário que o culto do Coração de Jesus, começado na vida mística nas almas, desça e penetre na vida social dos povos. Ele trará o soberano remédio para os males cruéis do nosso mundo moral” (Padre Dehon, Obras Sociais I, 3).

O Coração de Jesus foi a força interior que moveu continuamente o Padre Dehon. Como homem de Igreja no seu tempo, contribuiu para que o Coração de Jesus reinasse nas almas e nas sociedades. Sonhou com isso, lutou por esse projeto, tentou que ele se tornasse realidade. Fê-lo pela contemplação, pelo silêncio interior, pela intensa vida contemplativa. Fê-lo também pela ação apostólica, pela luta social.

Aponta o Coração de Jesus como caminho do homem, como caminho da Igreja, como caminho da sociedade.

O Padre Dehon torna-se arauto do reino do Coração de Jesus, como resposta às interrogações do coração humano. Conversão pessoal e justiça social: os alicerces do reino assentam na prática destas dimensões.

Bebendo da fonte que é o Coração de Jesus, o Padre Dehon pratica a contemplação na ação e a ação na contemplação. Só assim faz sentido o ser e o agir da Igreja, na atenção constante ao homem. Como diz um dos seus discípulos hoje:

“O que faltava era arregaçar as mangas. O problema da sua Igreja não eram ideias ou diretivas; era fé na pessoa humana e coragem de mudar o que devia ser mudado… Era preciso mergulhar na política para mudar a Sociedade, mas antes disso era urgente tornar o coração humano semelhante ao de Jesus!” (Padre Zezinho, Por causa de um certo reino, 26).

O amor de Deus vivo torna-se presente no amor do Coração de Cristo: o Coração de Jesus como aquele que nos chama e nos congrega em Igreja. Nas palavras iluminadas do Padre Dehon:

“O Coração de Jesus é o sol que nos ilumina através da sua Igreja, esta Igreja que Jesus concebeu na atenção do seu Coração por nós, que ele adquiriu e fundou pelo sangue do seu Coração. O Coração de Jesus aparece no seio da Igreja como o astro que tudo ilumina, tudo anima e tudo vivifica” (Padre Dehon, Obras Espirituais I, 504).

A Igreja é gerada no Coração de Jesus, a Igreja procura espalhar o reino do Coração de Jesus nas almas e na sociedade, a Igreja luta pela promoção dos valores do Reino, como a vida, a dignidade, o bem, a verdade, a justiça, o amor, a paz…, a Igreja constrói a civilização do Amor!

O Padre Dehon não é único nesta luta, é certo. Mas, no seu tempo, a grande novidade da sua proposta está na insistência, sem cessar e sem se cansar, da reflexão e das ações tendentes a construir o reino do Coração de Jesus na sociedade. Está convicto da fidelidade ao Coração de Jesus, como autêntico profeta que tem a coragem de ir contra a corrente. Isto num mundo que se regulava quase exclusivamente (tal como hoje!) pelas leis da economia e da finança. O Padre Dehon anuncia o caminho radical do Evangelho e do Coração de Jesus:

“Só o Coração de Jesus pode dar à terra a caridade perdida. Só ele reconquistará o coração das massas, o coração dos operários, o coração da juventude. Esta nova conquista dos corações começou manifestamente com o Sagrado Coração” (Padre Dehon, Obras Sociais I, 5).

O Venerável Padre Dehon termina o seu testamento espiritual, escrito em 1914, com uma oração centrada no Coração de Jesus:

“Ofereço uma vez mais e consagro a minha vida e a minha morte ao Sagrado Coração de Jesus, por seu amor e segundo todas as suas intenções. Tudo por vosso amor, ó Coração de Jesus!”

[Construir a civilização do amor. Espiritualidade dehoniana para os tempos atuais. Col. Estudos Dehonianos 1, Lisboa 2007, 27-29]

 

UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
PROPOSTA PARA ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA

Grupo Dinamizador:
José Ornelas, Joaquim Garrido, Manuel Barbosa, Ricardo Freire, António Monteiro
Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
Rua Cidade de Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
www.dehonianos.org