TERÇA-FEIRA
31ª Semana do Tempo comum
Lectio
Primeira leitura: Romanos 12, 5-16a
Irmãos: os muitos que somos formamos um só corpo em Cristo, mas, individualmente, somos membros que pertencem uns aos outros. 6Temos dons que, consoante a graça que nos foi dada, são diferentes: se é o da profecia, que seja usado em sintonia com a fé; 7se é o do serviço, que seja usado a servir; se um tem o de ensinar, que o use no ensino; 8se outro tem o de exortar, que o use na exortação; quem reparte, faça-o com generosidade; quem preside, faça-o com dedicação; quem pratica a misericórdia, faça-o com alegria. 9Que o vosso amor seja sincero. Detestai o mal e apegai-vos ao bem. 10Sede afectuosos uns para com os outros no amor fraterno; adiantai-vos uns aos outros na estima mútua. 11Não sejais preguiçosos na vossa dedicação; deixai-vos inflamar pelo Espírito; entregai-vos ao serviço do Senhor. 12Sede alegres na esperança, pacientes na tribulação, perseverantes na oração. 13Partilhai com os santos que passam necessidade; aproveitai todas as ocasiões para serdes hospitaleiros. 14Bendizei os que vos perseguem; bendizei, não amaldiçoeis. 15Alegrai-vos com os que se alegram, chorai com os que choram. 16Preocupai-vos em andar de acordo uns com os outros
Anunciado o Evangelho da salvação (cf. Rm 1, 18 a 11, 36), Paulo passa a exortar a comunidade de Roma a viver de acordo com esse mesmo Evangelho (Rm 12, 1 a 15, 13). Se Deus é amor gratuito, devemos conceber a vida como dom. Da graça à gratuidade. Da “cháris” à “charísmata”. Os cristãos são os membros de um só corpo, o corpo de Cristo. Cada membro recebe uma manifestação da graça, um dom, e um modo específico de viver a gratuidade. O importante é que todos entendam o dom como dom, para o bem comum (cf. 1 Cor 12, 7), em vista da edificação da comunidade, e não como posse de algo em proveito próprio. Assim, uns com os outros, caminhamos juntos para a plena humanidade de Cristo (cf. Ef 4, 11-16). Sendo assim, é preciso cultivar a humildade e a caridade. A humildade consiste na justa avaliação de si mesmo (cf. Rm 12, 3), para servir o Senhor na comunidade, cumprindo cada um a sua parte com interesse e simplicidade. A caridade é o modo e o fim do serviço: a atitude de bendizer cada pessoa, uma compaixão que partilha os sentimentos do outro, fazendo próprias as suas alegrias e sofrimentos, confiando-se de modo sereno e perseverante à oração que atravessa os períodos de tribulação e de esperança. Para animar o mais íntimo da nossa existência, a caridade deve ser sem hipocrisia (v. 9).
Evangelho: Lucas 14, 15-24
Naquele tempo, disse a Jesus um dos que estavam com ele à mesa: 15«Feliz o que comer no banquete do Reino de Deus!» 16Ele respondeu-lhe:«Certo homem ia dar um grande banquete e fez muitos convites. 17À hora do banquete, mandou o seu servo dizer aos convidados: ‘Vinde, já está tudo pronto.’ 18Mas todos, unanimemente, começaram a esquivar-se. O primeiro disse: ‘Comprei um terreno e preciso de ir vê-lo; peço-te que me dispenses.’ 19Outro disse: ‘Comprei cinco juntas de bois e tenho de ir experimentá-las; peço-te que me dispenses.’ 20E outro disse: ‘Casei-me e, por isso, não posso ir.’ 21O servo regressou e comunicou isto ao seu senhor. Então, o dono da casa, irritado, disse ao servo: ‘Sai imediatamente às praças e às ruas da cidade e traz para aqui os pobres, os estropiados, os cegos e os coxos.’ 22O servo voltou e disse-lhe: ‘Senhor, está feito o que determinaste, e ainda há lugar.’ 23E o senhor disse ao servo: ‘Sai pelos caminhos e azinhagas e obriga-os a entrar, para que a minha casa fique cheia.’ 24Pois digo-vos que nenhum daqueles que foram convidados provará do meu banquete.»
Lucas passa espontaneamente de um banquete humano ao banquete escatológico. Por isso, liga a parábola ouvida ontem à de hoje, introduzindo a expressão: «Feliz o que comer no banquete do Reino de Deus!» (v. 15). Trata-se da participação na comunhão com Deus, quando da «ressurreição dos justos»: a dimensão escatológica da nossa fé e da nossa experiência é mais do que evidente.
A parábola refere vários convites e várias recusas daqueles que não compreenderam a novidade da presença de Jesus, nem sentiram necessidade da salvação. É interessante sublinhar como nesta parábola está delineada a história da salvação: a cada convite e a cada recusa pode-se quase pensar que correspondam outras tantas fases de uma história visitada por Deus, o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo.
O momento culminante da parábola parece ser a palavra do dono da casa: «Sai imediatamente às praças e às ruas da cidade e traz para aqui os pobres, os estropiados, os cegos e os coxos» (v. 21). Equivale a dizer que, no banquete messiânico, irão tomar parte os excluídos e serão excluídos os que a ele teriam direito. Confirma-se mais uma vez a lei da Nova Aliança, a bondade de Deus, o objectivo central da mensagem e da presença de Jesus no meio de nós.
Meditatio
Deus criou-nos à sua imagem e semelhança. Somos “uno”, não como indivíduos, mas na comunhão, no dom recíproco. Cada um de nós é único. Se não escutarmos o apelo ao dom de nós mesmos, os outros ficam empobrecidos. Dar e dar-se, não é um gesto de magnanimidade, mas a modalidade própria de ser pessoas humanas verdadeiras. Somos puro dom de Deus, com a colaboração dos nossos pais, educadores, catequistas e tantos outros. Só nos realizamos tornando-nos dom para Deus e para os outros. Deus chama-nos a redescobrir e a viver esta fundamental vocação humana. Descobri-la é tanto mais urgente quanto mais sentimos em nós, e à nossa volta, vazios de humanidade.
O evangelho esclarece estas afirmações, que recolhemos em Paulo. Jesus faz-nos compreender a mesquinhez do nosso coração, quando não está disponível para acolher os seus dons. O que o «dono da casa» mostra não é exigência mas generosidade. O dono da casa é imagem de Deus que quer encher-nos com os dons da sua munificência. Mas nós preferimos as nossas pequenas e perecíveis coisas.
O grande banquete é a ceia da caridade divina oferecida a quem tem um coração grande, e não para quem se agarra aos bens terrenos com um amor possessivo, sufocante.
«Comprei um terreno… Comprei cinco juntas de bois…Casei-me». São os nossos afectos limitados, vividos de modo possessivo, com todas as preocupações que daí derivam. Deus, pelo contrário, convida-nos ao banquete da caridade universal. É o banquete que vivemos em cada eucaristia, se nela participamos de coração aberto, apenas atentos às preocupações divinas e prontos a receber com alegria e gratidão os seus dons.
Se assim vivermos as nossas eucari
stias, elas não serão um dever pesado, mas uma necessidade de amor, para pormos ao serviço dos outros as graças que recebemos, conforme a exortação de Paulo: «se um tem o dom da profecia, que seja usado em sintonia com a fé; se é o do serviço, que seja usado a servir; se um tem o de ensinar, que o use no ensino; se outro tem o de exortar, que o use na exortação; quem reparte, faça-o com generosidade; quem preside, faça-o com dedicação; quem pratica a misericórdia, faça-o com alegria» (vv. 7-8). «Testamento do amor de Cristo que se entrega para que a Igreja se realize na unidade e assim anuncie a esperança ao mundo, a Eucaristia reflecte-se em tudo o que somos e vivemos.» (Cst 81). A Eucaristia leva-nos a dar-nos com generosidade e gratuidade, até porque fomos criados de tal modo que ninguém se basta a si mesmo, e todos precisamos uns dos outros. Somos “uno” na comunhão, no dom recíproco, à maneira de Deus, que é uno e trino, Unidade na Trindade. A Eucaristia é um excelente meio para vivemos a unidade na comunhão.
Oratio
Senhor, meu Deus, purifica-me do individualismo, que tantas vezes me fecha em mim mesmo, e não me deixa disponível para acolher os teus dons, nem reparti-los com os irmãos. Tu és Amor, Tu és Comunhão. Por isso, és Alegria, és Festa. Dá-me disponibilidade para acolher o teu convite, entrar na tua casa, e viver como membro do corpo do teu Filho Jesus Cristo. Apoia o meu compromisso em viver na caridade, amando a todos com um amor verdadeiramente fraterno. Manda-me sobre mim o teu Espírito, que me ponha em sintonia com a tua vontade e com o coração dos outros. Amen.
Contemplatio
Ó prodígio inaudito! O Senhor supremo faz-se alimento da sua pobre e miserável criatura! Enquanto comiam, nesta noite da última Ceia, Jesus estava sentado com os seus discípulos. – Ergue os olhos para o seu Pai e recolhe-se numa ardente oração. Está como que transfigurado. – Consideremos o céu aberto acima da sua cabeça: os Anjos admirados tremem de alegria e de temor… de alegria: a Eucaristia inflamará e santificará tantos corações! Acenderá no seio da Igreja uma tal fogueira de dedicação e de amor!… Escutemos as palavras de Jesus: «Tomai e comei, isto é o meu corpo; bebei, isto é o meu sangue…». – Eu vos saúdo, ó verdadeiro corpo, nascido da Virgem Maria! Verei os apóstolos aproximarem-se, tomarem o seu lugar nesta primeira comunhão… Maria, a Mãe bem-amada de Jesus! Quem poderia dizer o ardor da sua caridade! É o seu Filho que ela recebe! É a carne, é o sangue que ela lhe deu! Correntes de amor sobem para o céu nos transportes desta casta união, destes santos arrebatamentos. «Fazei isto em minha memória», acrescenta Jesus, e os seus apóstolos são feitos sacerdotes para a eternidade. Unamo-nos ao seu acto de fé e de amor. (Leão Dehon, OSP 3, p. 481s.).
Actio
Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
«Feliz o que comer no banquete do Reino de Deus!» (Lc 14, 15).