Ao longo dos séculos, aprendemos a viver a partir daquela a quem chamávamos «a mãe natureza». Como uma mãe providente, ela oferecia-nos tudo aquilo de que precisávamos ao nosso sustento. A aliança entre natureza e humanidade conhecia então um período feliz de equilíbrio e harmonia. Mais recentemente, – assim o demonstra esta crise ecológica – entramos numa espiral de abuso da criação, ao aproveitarmo-nos – sem escrúpulos – da sua extrema disponibilidade. A docilidade da natureza fez-nos pensar que podíamos fazer dela o que quiséssemos.
A natureza guarda em si o poder de nos curar e aconselhar, mas também a faculdade de nos ensinar novamente a viver de forma mais sustentável e respeitosa. Para que isto possa ser uma realidade, não podemos continuar a encará-la como um objecto que possuímos e usamos. O caminho passa antes por sermos capazes de vislumbrar a sua verdadeira beleza e toda a sua glória. As flores murcham ao serem colhidas pela mão humana. Só quando contemplamos pacientemente uma flor, sem a arrancar, é que ela exibe toda a sua beleza e nos revela o seu sentido mais profundo.
Se ousarmos contemplar a criação, sem a manipular, aprenderemos a vê-la como uma dádiva de Deus. De facto, «quando recebemos no nosso coração, com gratidão e consideração, aquilo que Deus criou, vemos a natureza como ela realmente é – uma realidade transcendente que pede reverência e respeito. Então ela torna-se transparente e a vida começa a falar uma nova linguagem, revelando-nos a bondade e a beleza de Deus» (H. Nouwen). As plantas e os animais podem ensinar-nos algo sobre o nascer, o crescer, o amadurecer e o morrer. Recordam-nos a necessidade de cuidar com carinho e de como é importante cultivarmos a paciência e a esperança. O ritmo lento da natureza dá-nos aquela paz e serenidade, que parecem uma miragem nesta sociedade da velocidade.
Esta é a base sacramental para uma ecologia saudável. O pão é mais do que pão, ao apontar para Aquele que partiu o pão com os seus amigos. A água é mais do que água, ao evocar o nosso nascimento espiritual. O vinho é mais do que o fruto da videira, ao remeter para o sangue de Cristo. De facto, «alimento e bebida, roupas e casas, montanhas e rios, oceanos e céu – tudo se torna transparente, quando a natureza se revela àqueles capazes de ver a face amável de Deus» (H. Nouwen). «Desde os panoramas mais amplos às formas de vida mais frágeis, a natureza é um manancial incessante de encanto e reverência. Trata-se duma contínua revelação do divino. […] Sentir cada criatura que canta o hino da sua existência é viver jubilosamente no amor de Deus e na esperança. Esta contemplação da criação permite-nos descobrir qualquer ensinamento que Deus nos queira transmitir através de cada coisa, porque, para o crente, contemplar a criação significa também escutar uma mensagem, ouvir uma voz paradoxal e silenciosa» (LS 85).
José Domingos Ferreira, scj