ABRE-TE À EXPERIÊNCIA DO CORAÇÃO DE JESUS

Não sei se conseguimos parar um pouco e refletir sobre o que significa «experiência de Deus»! Tantas vezes damos por assumidos alguns dos termos e significados da vida cristã e nem nos apercebemos que alguns deles foram feridos no seu significado, por interpretações vagas e erróneas. Vamos simplesmente crendo, mergulhados numa corrente velozmente andante, sem paragem, com tudo o que isso significa. Reflitamos, por uns breves instantes.

Será a «experiência de Deus» um fenómeno extraordinário, uma experiência de algo, ou de um ser-objeto idealizado? Será ela uma especialização, ou uma manifestação psíquica, que confere a uma pessoa uma «qualificação» elevada? Será ela, porventura, um momento intimista do nosso «eu», qual gozo momentâneo, qual entreato de religiosidade? Será a fé e a vivência cristã o «acreditar no que não vemos», sem mais, o tal «bastante», que prescinde de «experiência de Deus»? Na verdade, é fácil desviar o essencial da nossa vida cristã para sentidos aparentemente consistentes! Fragilidades de um caminho espiritual, seguramente! Mas, recentremos esta nossa questão.

A «experiência de Deus» não é uma mera especulação individualista, ou uma manifestação psicológica interessante; não é uma memória remota, ou um plano projetado autonomamente para um horizonte temporal indefinido. Ela é, na sua essência, relação; uma relação de amor, que ocorre num presente, num «aqui e agora». O nosso Deus é Presença de Amor, no nosso coração, incansavelmente revelando-se, incansavelmente incitando-nos a uma resposta igualmente de amor. No amor fiel do seu Coração aguarda a nossa resposta e deseja que ela ocorra na justa dimensão do seu amor, porque, ao Amor, responde-se com amor: «Senhor, tu bem sabes que eu te amo!» (semelhante a Jo 21, 15-17). Da experiência deste Amor é que nasce o creio encarnado de amor. Um creio inquieto até sermos um com ele, amando, como expressava o Padre Dehon: «Ó bom Mestre, não terei repouso, enquanto não me admitirdes também no vosso Coração.»1 Esta resposta é a maior das experiências; aquela que faz toda a diferença no humano, porquanto implica o nosso ser por inteiro: corpo, alma, espírito, inteligência, sentimentos, razão, desejo, etc. Por este Coração amante, o nosso coração eleva-se, experimentando um amor dissemelhantemente pleno. E, enquanto ele se eleva, o nosso ser-pessoa igualmente se eleva, não permitindo mais que nos detenhamos em nós mesmos; antes, concentrando e com-prometendo todo o nosso ser e toda a nossa vida efetiva e afetiva no amor. Dizia o Padre Dehon: «A revelação do vosso Coração vem remover o nosso e arrebatá-lo num amor insaciável por vós.»2

Creio é um amo-te constante, dirigido diretamente ao Coração de Jesus, e onde se submetem todas as nossas ações e pensamentos. Recorda-nos Velasco que «o processo de encontro do homem com Deus não vai do ver ao crer, mas do crer ao ver, como diz expressamente Jesus a Marta diante do sepulcro de Lázaro no Evangelho de João: «Se creres, verás a glória de Deus» (11, 40)».3 No crer coabitam, unidos, dois corações dissemelhantes (o de Cristo e o nosso) e, nesta experiência, fonte inesgotável de vida, reside a nossa alegria indestrutível e irradiante (Cf.1 Pe 1, 6-8). Abre-te a este Coração Maior, num creio de amor, pois ele já te confessou TODO o seu Amor!

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1 Leão Dehon, Coroas de Amor, Lisboa: Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus, 2007, p. 291.

2 Ibidem.

3 Cf. Juan Martín Velasco, «La identidad de la mística: fe y experiencia de Dios», in FERMÍN, F. J. S. (Dir.), La identidad de la mística: fe y experiencia de Dios, Actas del Congreso Internacional de Mística, Burgos: Monte Carmelo/CITeS – Universidad de la Mística, 2014, p. 67.