Tempo Comum – Anos Ímpares – XX Semana – Quarta-feira

Lectio

Primeira leitura: Juízes 9, 6-15

Naqueles dias, 6juntaram-se todos os senhores de Siquém e toda a casa de Milo, e foram proclamar rei Abimélec, junto do terebinto do monumento que está em Siquém. 7Isto foi comunicado a Jotam. E ele foi colocar-se no cimo do monte Garizim; ergueu a voz e gritou; depois, disse-lhes: «Ouvi-me, senhores de Siquém, e que Deus vos oiça! 8As árvores puseram-se a caminho para ungirem um rei para si próprias. Disseram, então, à oliveira: ‘Reina sobre nós.’ 9Disse-lhes a oliveira: ‘Irei eu renunciar ao meu óleo, com que se honram os deuses e os homens, para me agitar por cima das árvores?’ 10As árvores disseram, depois, à figueira: ‘Vem tu, então, reinar sobre nós.’ 11Disse-lhes a figueira: ‘Irei eu renunciar à minha doçura e aos meus bons frutos, para me agitar sobre as árvores?’ 12Disseram, então, as árvores à videira: ‘Vem tu reinar sobre nós.’ 13Disse-lhes a videira: ‘Irei eu renunciar ao meu mosto, que alegra os deuses e os homens, para me agitar sobre as árvores?’ 14Então, todas as árvores disseram ao espinheiro: ‘Vem tu, reina tu sobre nós.’ 15Disse o espinheiro às árvores: ‘Se é de boa mente que me ungis rei sobre vós, vinde, abrigai-vos à minha sombra; mas, se não é assim, sairá do espinheiro um fogo que há-de devorar os cedros do Líbano!’

Tanto as grandes potências do Médio Oriente, o Egipto e a Mesopotâmia, como os pequenos povos, filisteus, arameus, Amon, Moab, Edom, Fenícia, estavam organizados em monarquias. Israel continuava em regime tribal. Cada tribo tinha autonomia e administração próprias, e só em situações de emergência se uniam duas ou mais tribos, sob a direcção de um juiz-libertador, para enfrentar o perigo. Houve várias tentativas para estabelecer a monarquia, mas esta não conseguia impor-se. A corrente antimonárquica era poderosa e fundamentava-se sobre um princípio teológico que lemos em Jz 8, 22-23. Gedeão, convidado a tornar-se rei, responde: «Não reinarei sobre vós, nem eu nem meu filho; o Senhor é que será vosso rei» (8, 23). «O Senhor é que será vosso rei». Temia-se que, interpondo uma figura humana, um rei, entre Javé e o povo, resfriasse a fidelidade de Israel para com Deus. Foi o que efectivamente aconteceu, quando se estabeleceu a monarquia em Israel. O próprio povo sofrerá bastante com muitos dos seus reis. Só o senhorio de Deus garante plena dignidade e satisfaz os desejos de paz e de liberdade do seu povo.

Evangelho: Mateus, 20, 1-16a

«Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos a seguinte parábola: Reino do Céu é semelhante a um proprietário que saiu ao romper da manhã, a fim de contratar trabalhadores para a sua vinha. 2Ajustou com eles um denário por dia e enviou-os para a sua vinha. 3Saiu depois pelas nove horas, viu outros na praça, que estavam sem trabalho, 4e disse-lhes: ‘Ide também para a minha vinha e tereis o salário que for justo.’ 5E eles foram. Saiu de novo por volta do meio-dia e das três da tarde, e fez o mesmo. 6Saindo pelas cinco da tarde, encontrou ainda outros que ali estavam e disse-lhes: ‘Porque ficais aqui todo o dia sem trabalhar?’ 7Responderam-lhe: ‘É que ninguém nos contratou.’ Ele disse-lhes: ‘Ide também para a minha vinha.’ 8Ao entardecer, o dono da vinha disse ao capataz: ‘Chama os trabalhadores e paga-lhes o salário, começando pelos últimos até aos primeiros.’ 9Vieram os das cinco da tarde e receberam um denário cada um. 10Vieram, por seu turno, os primeiros e julgaram que iam receber mais, mas receberam, também eles, um denário cada um. 11Depois de o terem recebido, começaram a murmurar contra o proprietário, dizendo: 12‘Estes últimos só trabalharam uma hora e deste-lhes a mesma paga que a nós, que suportámos o cansaço do dia e o seu calor.’ 13O proprietário respondeu a um deles: ‘Em nada te prejudico, meu amigo. Não foi um denário que nós ajustámos? 14Leva, então, o que te é devido e segue o teu caminho, pois eu quero dar a este último tanto como a ti. 15Ou não me será permitido dispor dos meus bens como eu entender? Será que tens inveja por eu ser bom?’ 16Assim, os últimos serão os primeiros e os primeiros serão os últimos.

«Muitos dos primeiros serão os últimos, e muitos dos últimos serão os primeiros», afirmou Jesus (Mt 20, 16ª). A parábola de hoje, esclarece esta afirmação. Esta parábola, contada por Jesus com tanta vivacidade, é um aviso ao povo de Irael, o primeiro a ser chamado, para que se alegre com o surpreendente uso que o Senhor faz da liberdade em relação aos «últimos», os pagãos, os publicanos, os pecadores. Mas é também um aviso a nós, cristãos de hoje, para que nos convertamos aos critérios de Deus. Não são os ricos e poderosos que entram, ou têm precedência no reino de Deus, mas os pobres e fracos. O reino de Deus não se conquista por méritos próprios, mas é um dom gratuito, a acolher com humildade e gratidão. Já pelo profeta Isaías, Deus avisara: «Os meus planos não são os vossos planos, os vossos caminhos não são os meus caminhos – oráculo do Senhor. Tanto quanto os céus estão acima da terra, assim os meus caminhos são mais altos que os vossos, e os meus planos, mais altos que os vossos planos» (Is 55, 8-9). Se ao jovem rico era exigido um salto de qualidade, a todos é pedido que se desembaracem da própria justiça, baseada em cálculos exactos, para usufruir da bondade infinita de Deus e da superabundância da sua graça.

Meditatio

A primeira leitura, o apólogo de Jotam apresenta-nos a monarquia de modo depreciativo, e até sarcástico. As árvores queriam um rei. Procuram uma árvore nobre, com grandes qualidades e capacidades, porque, para rei, não serve qualquer um. Dirigem-se à oliveira, que produz o azeite que alimenta, alumia e serve para preparar perfumes. Mas a oliveira recusa ser rei. Não queria «agitar-se por cima das árvores» (v. 9). Dirigem-se então à figueira, que produz tão saborosos frutos. Mas também a figueira recusa ser rei. Imploram, então, à videira: «Vem tu, então, reinar sobre nós» (v. 10). Ouvem a mesma resposta das outras árvores: não quero. Enquanto o povo tinha um alto conceito da monarquia, estas árvores tinham dela um conceito muito baixo: o rei não passava de uma árvore que se agitava sobre as outras!
A oliveira respondeu: «Irei eu renunciar ao meu óleo, com que se honram os deuses e os homens, para me agitar por cima das árvores?» (v. 9). A figueira também respondeu: «Irei eu renunciar à minha doçura e aos meus bons frutos, para me agitar sobre as árvores?» (v. 11). Assim é descrita a função do rei, a sua posição: agit
ar-se sobre os outros. E assim temos uma grande lição de humildade para aqueles que ambicionam o poder para estarem sobre os outros. Ser rei, ser chefe, ser superior, é uma posição de relativa esterilidade, uma vez que “mandar” não é, em si mesma, uma função produtiva. Se não houver quem trabalhe, quem faça o que é preciso, de pouco serve mandar. Mas, por outro lado, são indispensáveis administradores, dirigentes, chefes, superiores, para que os esforços produtivos dos outros contribuam para o bem comum, e não se percam, ou se oponham entre si. A autoridade deve ser um serviço efectivo à comunidade, e não um vão agitar-se sobre os outros. Nenhum grupo humano pode sobreviver sem uma cooperação recíproca, sem uma coordenação da actividade dos seus membros, sem um responsável por esta cooperação e por esta coordenação que tome, nem clima de diálogo, decisões atempadas, em ordem ao bem comum. É próprio do serviço da autoridade coordenar, controlar, decidir, caso contrário, o grupo desagrega-se na anarquia e na desordem. É por isso que as nossas Constituições afirmam: «O Superior, não sendo embora o único responsável, é o primeiro servidor desse bem comum. Estimula a fidelidade religiosa e apostólica das pessoas e da comunidade, a exemplo de Cristo-Servo que unia os seus no serviço comum ao desígnio do Pai» (Cst 56).

Oratio

Senhor Jesus, faz-me compreender que a autoridade é um serviço, e que a verdadeira grandeza consiste em servir com humildade e por amor. Foi essa a tua grandeza. Não quiseste usar em teu favor a tua igualdade com Deus, mas, por amor, humilhaste-te a Ti mesmo, obedecendo até à morte e morte de cruz. Humilhaste-te para Te pôr ao serviço de todos, para dar a tua vida em resgate de todos, para seres o Servo de Javé, tornar-te nosso Senhor e nosso irmão, graças a esse serviço. Obrigado, Senhor. Bendito sejas! Amen.

Contemplatio

Pedro é o continuador de Cristo, o substituto, o vigário de Cristo. É de certo modo o Cristo velado, como na Eucaristia. O seu ensino é o de Cristo. É o órgão do Sagrado Coração. Nosso Senhor preparou e figurou esta união com Pedro. Há várias barcas em Cafarnaum, mas é sobre a de Pedro que Jesus sobe para ensinar o povo. Há mais do que um pescador no lago, mas é a Pedro que Nosso Senhor manda fazer a pesca milagrosa, que simbolizava a propagação da Igreja. Nosso Senhor prometeu antecipadamente a Pedro a sua primazia, que é a continuação do poder de Cristo: «Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as potências do inferno não prevalecerão contra ela» (Mt 16, 18). «Dar-te-ei as chaves do reino dos céus: tudo o que ligares será ligado e tudo o que desligares será desligado» (Mt 16, 19). «Quando fores convertido, confirmarás os teus irmãos» (Lc 22, 32). Quando chegou o dia, Nosso Senhor realiza a sua promessa. Transmite a Pedro a sua autoridade de pastor: «Pedro, porque me amas muito, porque me amas mais do que os outros, apascenta os meus cordeiros, apascenta as minhas ovelhas». Pedro, pastor supremo da Igreja, é depositário e administrador de todos os dons do Coração de Jesus. Preside à administração dos sacramentos. Da sua autoridade brotam a ordem e a jurisdição na Igreja. Detém a chave das indulgências. Abre e fecha o tesouro do Coração de Jesus. Que respeito, que obediência devo a Pedro e aos seus sucessores! (Leão Dehon, OSP 3, p. 704s.).

Actio

Repete frequentemente e vive hoje a Palavra:
«Quem for grande no meio de vós, aquele que mandar,
seja como aquele que serve..» (cf. Lc 22, 26).
 

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