O estilo antropológico próprio dos Sacerdotes do Coração de Jesus

Depois de termos ontem ido em peregrinação ao Santuário Nacional de Aparecida – uma vivência muito profunda, na qual pude como que tocar na alma brasileira tão profundamente religiosa e mariana –, continuámos hoje os trabalhos do nosso seminário sobre a «Anthropologia Cordis».

O tema geral deste quarto dia era procurar, a partir dos Escritos Espirituais  do Padre Dehon, se há um determinado «estilo» antropológico que nos identifique. O tom foi dado pela comunicação do teólogo italiano Marcelo Neri, que pertence à Itália Setentrional e é professor no norte da Alemanha, num instituto próximo da Dinamarca.

O conferencista começou por identificar três dificuldades que se colocam ao leitor actual dos escritos do Padre Dehon: intimismo, devocionismo e a própria linguagem. Depois procurou fazer um ensaio hermenêutico, no sentido de identificar o seu «estilo», acabando por mostrar, reconstruindo, a riqueza teológica e espiritual do seu legado, e que se concentra nesta pergunta fundamental: qual é o Deus que é digno de ser amado? Parece ser uma questão teórica, mas na realidade do que se trata é de descobrir a amabilidade de Deus e a presença do seu amor, do seu ágape, no mundo, mesmo no homem pecador, que transporta em si os sinais de Deus.

Na linha de Santo Agostinho e mesmo de S. Francisco de Assis, trata-se de amar o homem e o mundo por Deus, a partir de Deus. Este foi o estilo do Padre Dehon; esta é a nossa herança e o nosso desafio, em torno de duas categorias ou figuras que caracterizam o seu estilo: confiança e dom.

Marcelo Neri aflorou, sem grandes desenvolvimentos, um tema que me é muito caro e sublinhá-lo foi um dos meus contributos no debate, tanto em grupo como no plenário: a geração como experiência originária, na sua vertente trinitária e na sua vertente antropológica. Como experiência originária na Trindade é a geração eterna do Verbo. Na revelação ou na economia, é a relação abbática, o ser Filho do Filho e a participação do crente nesta filiação.

Na parábola do filho pródigo, o pecado dos dois filhos consiste em não quererem ser filhos, e, por conseguinte, em não quererem ser irmãos. O pródigo, no regresso, pede para ser tratado comoservo; e o outro lamenta-se porque serviu sempre, e nunca teve um cabrito. Isto tem enormes implicações antropológicas e comunitárias. Como cristãos e como religiosos somos, de facto,irmãos, que se aceitam, não se escolhem, e perceber o que seja ser filho e ser irmão, nisso consiste a graça que distingue os cristãos e que nos deveria distinguir, e que encontraria na confiança e no dom a sua figura e o seu estilo. 

José Jacinto Ferreira de Farias, scj

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